THESE INAUGURAL DE FABRICIANO DE ABREU TEIXEIRA 1909 9 1W Faculdade de Medicina da Bahia THESE APRESENTADA Á FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Em 30 «lo Outubro de 1909 PARA SER DEFENDIDA POR vffiá/émano r/e //etcceúa NATURAL DO ESTADO DO PARA’ Filho legitimo de Antonio Alves Teixeira e D. Maria da Gloria Teixeira Ex-interno de Psychiatria e de Moléstias Nervosas AFIM DE OBTER 0 GRÁO DE DOUTOR EM MEDICINA imiitaiá® CADEIRA DE CLINICA PSYCIIIATRICA E DE MOLÉSTIAS NERVOSAS Tratamento de Epilepsia PROPOSIÇOES Tres sobre cada uma das cadeiras do curso de sciencias medicas e cirúrgicas BAHIA Typ, do Salvador—Cathodral 1909 FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Director-Dr. AUGUSTO C. VIANNA Vico-Director—Dr. MANOEL JOSE’ DE ARAÚJO LENTES CATIIEDRATICOS OS DRS. MATÉRIAS QUE LECCIONAM l.a SECÇÃO Carneiro de Campos Anatomia descriptiva. Carlos Freitas ‘ • Anatomia medico-cirurgica. 2.» Antonio Pacifico Pereira Histologia normal. Augusto C. Vianna Bacteriologia. Guilherme Pereira Rebello .... Anatomia e Physiologia patbologicas. 3. a Manoel José de Araújo Physiologia. José Eduardo F. de Carvalho Filho . Therapcutica. 4. a Luiz Anselmo da Fonseca .... Hygiene. Josino Correia Cotias Medicina legal e Toxicologia. 5. a Antonino Baptista dos Anjos . . . Pathologia cirúrgica Fortunato Augusto da Silva Júnior . Operações e apparelhos. Antonio Pacheco Mendes Clinica cirúrgica 1.* cadeira. Braz Hermenegildo do Amaral . . . Clinica cirúrgica 2.a cadeira. 6. a Aurélio R. Vianna Pathologia medica. Clinica Propedêutica. Anisio Circundes de Carvalho . . . Clinica Medica l.a cadeira Francisco Braulio Pereira . r Clinica Medica 2.a cadeira 7a A. Vietorio de Araújo Falcão . . . Matéria medica, Pharmacologia o arte de Formular José Rodrigues da Costa Dorea . . Historia natural medica. José Olympio de Azevedo .... Chimica Medica. 8,a Deocleciano liamos Obstetrícia. Climerio Cardoso de Oliveira . . . Clinica obstétrica c gynecologica. 9.a Frederico de Castro Rebello . . . Clinica pediátrica. 1(1.a Francisco dos Santos Pereira . . . Clinica oplitalmologica. Alexandre E. de Castro Cerqueira . . Clinica dermatológica e syphiligraphica. 12.a Luiz Pinto de Carvalho Clinica psvchiatrica e de moléstias nor- João E. de Castro Cerqueira . . . T, .. ., .... , Sebastião Cardoso . . Em disponibilidade. LENTES SUBSTITUTOS OS DOUTORES José Affonso de Carvalho . . 1.» Gonçalo Moniz Sodré de Aragão . ( 2.a Julio Sorgio Palma ( « Pedro Luiz Celestino .... 3.» Oscar Freire de Carvalho . . 4.a Caio O. F. do Moura .... 5.» João Américo Garcez Froes . . 6.» Pedro da Luz Carrascosa e J. J. de Calasans . . ' . . 7.a J. Adeodato de Souza . . . . 8.a Alfredo Ferreira do Magalhães . 9.a Clodoaldo de Andrade . . . .10. Albino Leitão 11. Mario Leal • .12. Secretario-Dr. MENANDRO DOS REIS MEIRELLES Sub-Secretario Dr, MATHEUS VAZ DE OLIVEIRA A Faculdade não approva uein reprova as opiniões exaradas nas theses pelos seus auclorcs Que a sorte não seja por demais ríspida comtigo, minha cara amiguinha, caro producto de algumas horas de trabalho. Compenetra-te de que nada vales a não ser como objecto de cumprimento do dever a que te destinas e propara-te para luctares com as traças que te esperam esfaimadas. Não quiz o accaso *que fosses viver nas ricas estantes ao lado de valorosos trabalhos que os homens de saber guardam e zelam carinhosamente. Bem sei que disto não és culpada como ninguém: a natureza é que leva a culpa não só porque negou a quem te escreveu o genio inventivo, descobridor, senão também porque negou a elle as diversas manifestações do talento que dão ás formas as palpitações mais harmoniosas e aos factos as idéas mais suggestivas. Pequena e simples, timida e invaliosa, todavia,lembrarás ao teu autor, que te guardará com lembrança carinhosa " e como saudosa recordação, o seu tempo académico e esta terra hospitaleira onde naceste infeliz. E’s só isto. Mais do que isto és uma sombra que se desfaz se a luz incide sobre ella. Vêde aqui neste trabalho não ura homem que escreve mas ura homem que é obrigado a escrever. Montesquieu. Chegando ao fim do curso médico e precisando defender these, escolhi para assumpto o tratamento da epilepsia que esplano nas linhas despretenciosas que se seguem. Foi este o thema escolhido por amor á cadeira da qual fui interno e que tão brilhantemente illustra o meu erudito mestre Dr. Pinto de Carvalho. Nem este, certamentc, nem os seus collegas deixarão de ver aqui um trabalho de discípulo, nem ainda aquelles que porventura folhearem estas paginas deverão encaral-as senão como um serviço de quem não tem o habito de escrever para o publico. Neste trabalho darei primeiramente em resumo uma idéa da epilepsia, fazendo o seu diagnostico diíTerencial com a histeria que é a doença que com ella mais se pode confundir na pratica, em seguida alludirei atravez essas reflexões diversos meios de tratamento postos em uso de alguns annos a esta parte e, finalmenle, falarei das vantagens que o methodo proposto por Gilles de la Tourette apresenta para a cura do mal comicial. Bahia,—26-10—1909. (3 @luior DISSERTAÇÃO CLINICA PSYCHIATRICA E DE MOLÉSTIAS NERVOSAS Tratamento da Epilepsia ldéa geral da epilepsia 9 epilepsia é um syndroma nervoso que se traduz por accessos intermitentes caracterisados ora por convulsões, perda súbita do conhecimento e uma modificação notável da respiração—'grande mal intellectual, ora por vertigens ou ausências ou delírios—pequeno mal intellectual. A epilepsia, que já era conhecida desde Hypocrates, tem uma vasta synonimia que alludo aqui apenas porque tenho de lazer uso delia no correr do assumpto. À epilepsia, nome dado por Paré, tem sido chamada, através dos tempos, segundo certas circumstancias, mal comicial, mal sagrado, mal caduco, mal de Hercules, alto mal, grande mal, moléstia do diabo, doença divina, além de muitos outros. Considerado por muito tempo como uma nevrose, isto é, uma doença sem lesão, o mal sagrado tem perdido grande parte do seu dominio. Os estudos das convulsões epileptiformes da grande histeria, das convulsões eclampticas, os trabalhos de Bravais assignalando a epilepsia hemiplegica e os de Jackson mostrando que lesões localisadas nas circumvoluções cere- 4 braes podiam provocar convulsões parciaes ou geraes dos membros e as experiencias demonstrando que certas substancias introduzidas no organismo podem dar lugar ás reacções syndromicas da epilepsia, vieram restringir de maneira notável os dominios da nevrose comicial. Actualmente não é razoavel conceber a epilepsia senão ligada a lesões mesmo que estas não sejam por ora conhe- cidas ou a perturbações funccionaes, e o qualificativo idiopathica, ainda usado, não quer dizer que a doença seja sem causa, porem que esta nos escapa aos meios actuaes de observação sem comtudo nos íugir áintelligencia. A epilepsia não é, pois, uma moléstia propriamente íalando, mas um syndroma clinico que assenta suas bases sobre um systema nervoso defeituoso que reage de maneira convulsiva, lipothymica ou delirante. Alguns scientistas têm procurado as lesões caracte- risticas da epilepsia nas differentes porções do eixo cerebro-espinal, emquanto outros têm pensado que a sua causa reside em uma alteração do sangue. Tem-se encontrado em certos casos de mal eomicial lesões cerebraes grosseiras, em outros em que este syndroma existe não se tem absolutamente notado, nem mesmo ao microscopio, lesão alguma, emquanto que em certos indivíduos nos quaes ha lesões cerebraes evidentes não se tem observado o minimo signal do mal divino. O que parece mais racional é que, como já disse, essas lesões existam, seja no systema nervoso, seja no sangue, dando lugar a perturbações funccionaes do cerebro. 5 Ghaslin acha que a epilepsia está ligada a alterações cerebraes mais ou menos apreciáveis e afíirma haver encontrado, ao exame microscopico, uma sclerose nevro- glica ou gliose que ó para elle o resultado dum processo hereditário. A hypothese da lesão do sangue e perturbação íun- ccional do cerebro é admittida pela maior parte dos autores. Uns scientistas explicam a perturbação íunccional pela congestão e outros pela anemia; quando chegam, porem, a indagação da causa productora destas ou do modo por que ellas se verificam, collocam-se novamente em desaccordo. Uns autores querem com Marshall Iiall e Nothnagel que a causa determinante do accesso da epilepsia resida na excitação anormal do bulbo. Primitiva ou reflexa, esta excitação e as irradiações cerebraes que a acompanham explicam até certo ponto as convulsões, a perda de conhecimento e a pallidez inicial da face. Outros pensam que ella tem sua séde no centro das circumvoluções. Esta ultima maneira de ver, depois dos trabalhos de Ferrier, Fritsch e Hitzig, tem encontrado apoio e as auras sensoriaes ou motoras confirmam estes dados phy- siologicos. À excitação da zona cortical provoca a supera- ctividade dos elementos do bulbo e da medulla. Alguns têm admittido com Ramon y Cajal, no córtex cerebral anterior, tres especies de elementos nervosos, de neuronas: os receptivos, os de elaboração e os de des- carga e com estes têm explicado os phenomenos comi- 6 ciaes. As convulsões, de accordo com esta theoria engenhosa, são devidas para elles á excitação dos neuronas de descarga como a aura á excitação dos neuronas de recepção e a perda do conhecimento á inhibiçâo dos neuronas de associação. Zichen sustentou que o córtex cerebral presidia as convulsões tónicas e os glanglios da base as convulsões clonicas. J. Voisin acredita com Feré, Marinesco e Franck que as convulsões tónicas são o facto da excitação primi- tiva, o indicio do esgotamento nervoso e as convulsões clonicas o facto do esgotamento. Os autores têm procurado explicar todos os pheno- menos epilépticos. A perda do conhecimento tem tido outras explicações : a anemia e a congestão têm sido invocadas para explical-a. O grito é considerado ora como um acto reflexo de origem bulbar, analogo ao que se observa nos anencephalos, ora produzido pela excitação do centro laryngeu cortical estu- dado por Krause e Horsley. A quéda tem sido explicada pela perda do conheci- mento que na verdade pode dar lugar a ella; como, porem, a perda do conhecimento e a quéda não são factos coro- llarios pois se tem observado casos comiciaes em que ha perda de conhecimento sem quéda, procura-se também explicar esta por uma falta de equilibrio, de estatica mus- cular, que se relaciona com o apparelho de coordenação. As modificações da pupilla encontradas por occasião dos accessos, consistindo na sua dilatação e insensibi- 7 lidade á luz, dependem, segundo Voisin, de uma irritação cerebral e não está sob a dependencia de perturbações circulatórias ou respiratórias como se tem acreditado. A incontinência das fezes e da urina é attrribuida á contracção do abdómen e da bexiga; quando ella se manifesta após a crise corre por conta de paralysias dos sphincteres. A espuma é produzida pelos movimentos da bocea e o excesso da saliva é attribuido por Albertoni á excitação da corda do tympano; o sangue que a acompanha é devido cá mordedura da lingua ou a hemorragias capillares da bocca. Finalmente as paralysias passageiras dos membros, da face, da lingua, têm sido explicadas pela congestão ou pela anemia cerebraes ou ainda pelas modificações da vida intima das cellulas, do seu protoplasma, dos centros motores. Estas modificações são traduzidas por um esgo- tamento que impede a reacção normal das cellulas, impos- sibilitando momentaneamente as suas funcções até que ellas recuperem o seu primitivo vigor. Muitos autores têm nestes últimos annos considerado a epilepsia causada por uma intoxicação ou uma auto- intoxicação.As analogias dos ataques epilépticos de causas desconhecidas com as crises epileptiformes da uremia, da acetonemia são muito fortes para fazer acreditar em uma mesma causa productora desses syndromas eos trabalhos do professor Bouchard affirmam que a uremia e a aceto- nemia são verdadeiras intoxicações do organismo. 8 J. Voisin vê nos syrnptomas do mal hercúleo a maior possível com as intoxicações e íaz a comparação do syndroma comicial com a intoxicação alcoolica. Chama em seguida a attenção para as perturbações digestivas e a hypotoxidez da urina que são notadas por occasião dos accessos e para o desapparecimento do estado gástrico e a volta da hypertoxidez da urina quando os accessos desapparecem. Para Voisin estas provas parecem incon- testáveis de que existe um veneno retido no organismo ou fabricado por elie determinando no indivíduo predis- posto hereditariamente as manifestações do mal sagrado, sendo ainda o sangue pelo seu aspecto negro, sua rapida coagulação quando sae dos vasos e pela presença de staphylococcus, uma prova de intoxicação. Comberale eV. Buê encontraram no sangue dos eclam- pticos staphylococcus aureuse albus e consideram as suas toxinas uma substancia eclamptisante, Voisin as considera também como uma substancia convulsivante que intro- duzida na torrente circulatória e diffundida por ella irá irritar as cellulas nervosas cerebraes e medullares deter- minando o cortejo dos syrnptomas do mal divino; alem disso estas toxinas agem directamente sobre as cellulas cerebraes modificando o seu protoplasma, impedindo por momento a funeção destas e trazendo consequentemente paralysias por inhibição. Poder-se-ia oppor a esta theoriada intoxicação os casos de epilepsia traumatica e parcial e ainda casos comiciaes em que não se tem notado nenhuma perturbação diges- 9 tiva, mas lembrar-se-ia nestes casos a predisposição que deve ser considerada como o elemento dominante da epilepsia, sem a qual não pode haver mal comicial. Em casos de lesões ccrebraes visíveis, de perturba- ções gastro-intestinaes graves ou chronicas não ha as vezes manifestações epilépticas porque não existe essa predisposição que é o estado de equilíbrio instável da cellula nervosa. Diversas causas podem pôr em evidencia esta predispo- sição, seja uma intoxicação, seja uma lesão ou uma com- pressão cerebraes, seja ainda uma irritação das terminações nervosas, seja, emfim, uma influencia moral ou physica. A irritação pode partir de um ponto qualquer, mas é sempre a cellula nervosa que recebe a impressão ; esta cellula se tem um equilíbrio instável é então modificada no seu funccionamento e reage de maneira convulsivante. «O mal comicial, diz criteriosamente Gilles de la Tourette, não é, pois, como se acreditava outrora, uma moléstia essencial. E’ uma expressão symptomatica reco- nhecendo causas as mais diversas, em todas as idades, com a condição que estas produzam a hyperexcitabilidade cortico-motora da substancia cerebral. » Uma causa que tem sido estudada nestes últimos tempos como responsável pelos accidentes epilépticos, ao lado das infecções da iníancia, é o parto laborioso. Este, quer tenha ou não havido emprego de instrumentos cirúr- gicos, pode trazer hemorragias meningéas quasi sempre sub-arachnoidianas como observou Richardière. 10 Cruveilhier que íez numerosas autopsias em creanças nascidas mortas ou que morreram logo após o nascimento, depois de um parto laborioso, achou que um terço do numero íoi victima de hemorragia meningéa. Little estu- dando a rigidez spasmodica congénita generalisada em que se encontrou sclerose cerebral acompanhando-se as vezes de epilepsia, notou a influencia da dystocia e do parto laborioso. Gilles de la Tourette diz possuir nume- rosos exemplos de partos difflceis aos quaes elle attri- bue a producção do mal sagrado. Alguns autores têm observado que as infecções infan- tis podem produzir meningo-encephalite que pode dar lugar a lesões cicatriciaes de sclerose encephalica perma- nente que podem ser no correr do tempo geradoras da epilepsia. Outros têm observado ainda, como P. Marie, que entre o parto laborioso ou as convulsões, isto é, entre o tempo do estabelecimento da lesão e o apparecimento do mal epiléptico, ha um periodo intercalar as vezes bastante longo de maneira que os phenomenos comiciaes somente surgem em um periodo da vida as vezes bem afastado da infancia. Este facto clinico tem sido confirmado experimental- mente. Luciani notou em cães que elle tornou epilépticos fazendo lesões corticaes, que o syndroma sagrado podia apparecer depois de longo tempo após o estabelecimento da lesão experimental. O professor Cario Ceni tem feito incansavelmente de 11 alguns annos para cá diversas pesquizas sobre o sangue dos epilépticos que parecem destinadas a lançar luz sobre a pathogenia e o tratamento da epilepsia. Antes delle, Bra, em 1902, isolou um parasita encon- trado no sangue dos epilépticos que elle considera como o agente causador do syndroma comicial. Os trabalhos posteriores, porem, não têm confirmado esta maneira de ver. Ceni injectou serum do sangue de um epileplico em animaes e verificou que este sempre era toxico, mas, cousa interessante, o serum era mais ou menos toxico segundo o caso. Eis a origem de todos os trabalhos pos- teriores que têm sido publicados a que este professor tem se dedicado nestes uitimos annos, seja só, seja com a collaboração de Besta, de Tiengo e ainda outros. Ao Congresso de Génova, em 1904, o notarei professor apresentou o resultado das suas experiencias da maneira seguinte: Injectando em dóses repetidas e progressivas serum de um epiléptico ao proprio indivíduo, elle notou que este serum ora aggràvava a doença, ora agia como um medicamento especifico. Estas difTerentes modalidades parecem estar em relação com as exacerbações e as phases de calma da doença. O professor Catola se recusou a dar credito á acção therapeutica do serum epiléptico. No anno seguinte o problema foi mais de perto estudado pelo professor italiano que tirou outras conclusões que vou referir. No intervallo dos accessos, o serum injectado, seja no 12 proprio doente, seja noutro epiléptico em dose de 10 centímetros cúbicos é geralmente bem supportado; ao contrario, ao momento dos paroxysmos, o sangue dos epilépticos torna-se hypertoxico. Si se o injecta então a um outro epiléptico, determina accidentes de intoxicação aguda e reacções locaes que se traduzem por intumesci- mento e dor; a intoxicação geral é caracterisada por dor de cabeça, confusão mental, elevação de temperatura e pelo aggravo das manifestações comiciaes. Existe eviden- temente de um indivíduo a outro variações individuaes, mas em these geral os que supportam melhor o anti- serum são os que reagem menos ao serum hypertoxico. O anti-serum humano é o serum dum indivíduo ao qual se injectou sem qne se produza reacções, serum de um outro epiléptico mais gravemente atacado do que elle, em dóse de 10 centímetros cúbicos e no qual se produz, em seguida de uma ou varias destas injecções, um melhora- mento do estado geral e uma diminuição das crises. Si se injecta a um epiléptico seu proprio serum alguns dias após o abrandamento de fortes symptomas da doença, isto é, logo que o doente voltou ao seu estado habitual, nota-se phenomenos de 'jntoxicação idênticos aos que este serum produziria sobre outro indivíduo. Injectado a um homem normal, o serum hypertoxico determina phenomenos locaes e geraes mas nunca acci- dentes epilépticos verdadeiros; nos animaes elle não age senão como o serum epiléptico humano. Esta reacção hypertoxica, conclue Geni, é especifica para nossa especie. 13 0 semm hypotoxico é aqaelle que, injectado em dóse de 10 centímetros cúbicos, não produz accidente algum, nem geral, nem local; o hypertoxico ao contrario. Nunca ha acção do serum epiléptico nas formas mentaes que não estejam ligadas á natureza comicial, como histeria, mania e outras; a toxidez parece augmentar com a approximação dos estados de crise e diminuir nos intervallos. Depois destas conclusões das suas esforçadas pesqui- zas, Ceni e Tiengo acreditam existir no serum dos epi- lépticos dois princípios activos de propriedade e origem differentes: um que circula livremente no sangue dos epilépticos e é dotado de propriedades puramente toxicas, outro que existe em estado latente e é dotado de pro- priedades estimulantes sobre alguns elementos cellulares nos quaes effectuam-se trocas e são provavelmente a séde anatómica da epilepsia. Estas propriedades estimu- lantes se manifestam, para estes autores, somente como consequência mediata de modificações do estado geral do indivíduo que ainda não foram precisas. Em 1907, De Buck, tratando dapathogenia e do diagnos- tico do mal sagrado, diz que a causa primordial da epilepsia chamada essencial é uma neuroautocytotoxina ; a crise seria devida a descargas nervosas das cellulas corticaes atacadas e postas em estado de desassiinilação pelos fermentos neurolyticos. Sobre os outros pontos, os trabalhos de De Buck con- firmam os de Ceni e seus companheiros. 14 Estes estudos recentes nos trazem a esperança do conhecimento exacto da causa intima do mal comicial e do seu remedio especifico. A epilepsia se apresenta sob duas formas caracteris- ticas: a convulsiva que é o grande mal ea nào convul- siva que é o pequeno mal. O grande mal constitue o ataque de epilepsia que é precedido geralmente, ao momento de surgir, por uma especie de advertência súbita e rapida que chama-se aura. A aura epiléptica é sensitiva, motora, vaso-motora e psychica, segundo os aspectos differentes que reveste. Dura alguns segundos, alguns minutos, e, em alguns casos, constitue por si só um esboço do ataque epiléptico. Alguns autores, como Feré e Yoisin, têm reunido os symptomas epilépticos, segundo sua predominância em quatro grupos: o motor,o sensorial,o visceral e o psychico que podem apparecer reunidos no mesmo doente, com- binados ou isolados, dando lugar aos accessos completos e incompletos. O ataque completo e sobretudo o accesso convulsivo constitue o grande mal epiléptico e o incompleto : verti- gens, ausências, constitue o pequeno mal. O ataque epiléptico nem sempre se manifesta como vamos descrever; diversos phenomenos faltam muitas vezes, até mesmo certos dentre elles, como o grito e 15 a quéda, considerados essenciaes para caracterisar o syndroma comicial. Esta circumstancia traz írequente- mente sérios embaraços ao diagnostico. O que caracterisa sobretudo a epilepsia é o ictus com a convulsão, perda de conhecimento e amnésia completa de tudo que se passa durante o accesso. Precedido ou não pela aura, o ataque epiléptico assim se manifesta: O doente dá mais frequentemente um grito, é o grito inicial, produzido certamente pelo spasmo dos musculos do larynge, perde o conhecimento, cae como fulminado sem escolher lugar, ferindo-se pela queda muitas vezes, a face torna-se pallida, ao mesmo tempo os membros são agitados por convulsões que invadem os musculos do tronco, predominando quasi sempre de um lado do corpo, caracter este que Trousseau dá grande valor sob o ponto de vista médico-legal, a lingua que pode ser ferida projecta-se entre as duas arcadas dentarias. E’ este o periodo tonico que dura vinte a quarenta segundos ou mais. Segue-se o periodo clonico que dura de meio a dois minutos. A duração total do ataque é de dois a tres minutos. As convulsões succedem-se a principio de segundo a segundo, depois tornam-se repetidas crescendo a sua amplitude gradualmente. Todos os musculos agitam-se então com violência e os membros fazem grandes movi- mentos alternativos de flexão e de extensão, a face, pallida a principio, torna-se congestionada, dando lugar 16 pela contracção dos másculos do rosto a mimicas diversas, os olhos rolam nas orbitas e os movimentos da bocca provocam a formação de uma baba espumosa, as vezes sanguinolenta pelas mordeduras da lingua, que se escapa dos lábios. Em seguida as convulsões cessam e uma inspiração profunda indica o fim da crise. Dahi o doente passa geralmente a um terceiro periodo, o de stertor, que é um estado apoplectiforme em que os seus membros relaxam-se e a respiração torna-se ruidosa. Depois segue-se um somno profundo que pode durar varias horas e que lhe repara a fadiga extrema produzida pelo ataque. Quando termina este, o doente recobra a consciência suspensa, lançando em torno um olhar espantado, mas conserva ainda por certo tempo a confusão de idéas, dores de cabeça e as vezes nota-se uma aphasia transitória ou uma hemiplegia passageira. Durante o ataque a anesthesia é completa e a amnésia consecutiva é absoluta. Muitas vezes estes ataques succedem-se em curtos inter- vallos: é o estado de mal que acompanha-se de um estado comatoso sempre grave que pode ser mortal. Os accessos incompletos da epilepsia são os mais frequentes, é raro encontrar-se o ataque completo; muitas vezes falta o ultimo ou os dois últimos períodos. Trou- sseau cita um caso em que o periodo comatoso veio ao mesmo tempo que a quéda havendo perda de conheci- mento e J. Yoisin fala de outro em que o indivíduo teve 17 perda súbita do conhecimento e immediatamente um periodo calmo de somno sem nenhuma manifestação do periodo tonico e clonico. O pequeno mal, expressão que serve para designar a epilepsia não convulsiva, é representado por ausências, vertigens e delirio cujas variedades são^multiplas. A ausência é assignalada por um modo de abstracção em que o doente fica bruscamente podendo realisar actos sem delles conservara lembrança. O indivíduo, neste caso, se fazia um movimento, um trabalho qualquer, se lia por exemplo em voz alta, pára, fica pallido e ao fim de alguns segundos volta a si, continua a sua leitura ou o trabalho interrompido como se nada houvera acontecido, sem lem- brança do que occorreu durante a interrupção. A vertigem é um accidente mais forte que a ausência se bem que não seja menos grave do que ella. Na vertigem o conhecimento também é suspenso de maneira brusca, o indivíduo perde a estabilidade e cae; as vezes agita-se ligeiramente ou deixa escapar algumas gottas de urina, mas tudo isto é breve, rápido e o doente levanta-se sempre um pouco abatido. O vertiginoso não pode geralmente evitar a quéda e por isso fere-se muitas vezes. Tanto a vertigem como a ausência podem manifestar-se em grande numero durante o mesmo dia. Em alguns indivíduos o pequeno mal reveste a forma chamada procursiva. O indivíduo, as vezes antes do ataque, outras vezes depois, anda inconscientemente remo- 18 vendo os obstáculos. Em certos casos o aclo procursivo constitue por si todo o ataque. Em outros indivíduos o pequeno mal se traduz por um delirio mais ou menos violento de palavras ou acções. Os impulsos são manifestações comiciaes que tornam o doente perigoso. Na epilepsia convulsiva este é o paciente dos seus proprios males, mas na forma psychica * pode ser aggressivo, nocivo á sociedade em que vive. O homicídio, o incêndio, o suicídio, a dipsomania, a clopemania, são actos frequentemente praticados pelos epilépticos por occasião dos seus impulsos irresistíveis. Ha uma forma especial de impulso representado pela tendencia que o epiléptico tem de andar longos caminhos sem cessar e sem causa nem destino: é o automatismo comicial ambulatório. Ha indivíduos que andam assim incessantemente léguas inteiras, fazem viagens como se estivessem em estado normal, mas tudo automaticamente, no seu impulso de andar sempre, como se quizessem lembrar a lenda do Judeu Errante. Nestas occasiões não ha as vezes incon- sciência absoluta; ha um estado de sub-consciencia, de obnubilação em que o doente fica como se estivesse som- nolento, entorpecido. Deve-se distinguir o automatismo comicial ambulatório de histérico e do somnambulismo: o histérico é mais coordenado, mais regular e cede facilmente ao hypno- tismo e o somnambulismo se assignala pela physionomia espantada que o indivíduo apresenta. 19 Uma das moleslias com que a epilepsia mais se pode confundir na pratica é a histeria. E o diagnostico differencial entre estes dois syndromas é importante por causa do tratamento, pois, sendo aquella ligada á hyper- excitabilidade cortico-motora e esta a um hypodynamismo cerebral, parece justo que se não use, como para o mal comicial, o bromureto que diminue o dynamismo cerebral. Na histeria o ataque é, como na epilepsia, constituído por differentes períodos dos quaes alguns também podem faltar. O primeiro periodo do ataque hysterico, chamado epileptoide, é o que mais faz pensar em epilepsia prin- cipalmente quando elle constitue por si todo o ataque, sem haver sequencia dos outros períodos consecutivos. E’ difíicil em certos casos estabelecer o diagnostico destes dois syndromas que não muito raro podem viver abraçados em um mesmo indivíduo e, como observa Feré, «a clinica não pode ter a pretenção de estabelecer limites onde a natureza não collocou.» Diversos são os caracteres differenciaes entre o ataque epiléptico e o histérico e que nos podem levar ao diagnos- tico de um desses syndromas. No epiléptico ha um grito inicial estridente, quéda brusca sem consciência nem sensação no mesmo ponto cm que elle se achava quando foi surprehendido pelo ataque, o doente não escolhe o lugar, si cae no fogp ou n’agua ahi mesmo fica. No hysterico não ha grito inicial, 20 ha gritos fortes e repetidos no correr do accesso e o doente escolhe em geral o lugar para cair; na hysteria major o doente cae com arte que faz pensar que elle cae â tôa e na hysteria minor vê-se distinctamente a queda ser amparada. Não quer isto dizer que haja sempre grito inicial na epilepsia, pois já dissemos anteriormente que certos phenomenos faltam constantemente nesta moléstia, nem que o histérico caia sempre desamparado porque aponta-se exemplos raros em que este escolho o lugar para cair, nem que o histérico não se bata nunca pois são conhecidos hoje casos, raros na verdade, cm que elle experimenta contusões por occasião da quéda. O meu sabio mestre dr. Pinto de Carvalho, em uma das suas encantadoras aulas sobre histeria, citou um caso de sua observação em que houve traumatismo por occasião da quéda. E’ digno de nota o modo por que o histérico e o epi- léptico se levantam após o paroxysmo: este olha espantado em torno de si e está fatigado, abatido, prostrado, emquanto que aquelle levanta se disposto e capaz de todo serviço intellectual, exceptuados certos casos de histeria que alludo acima em que o indivíduo pode bater-se, con- tundir-se, levantando-se indisposto. A aura histérica por menor tempo que dure se estende sempre mais do que a epiléptica, cuja duração è compa- rada á rapidez do relampago e este é um dos motivos por qye o histérico escolhe o lugar para cair. Os ataques nocturnos dos histéricos são raros si é que 21 elles existem ; quando dormem não têm paroxysmos, ao acordar ou ao correr do dia é que elles surgem. Os accessos nocturnos são frequentes nos epilépticos; estes muitas vezes sonham que tiveram ataques e actualmente, pela observação do somno, acredita-se que elles podem ter accessos por occasião deste. O ataque epiléptico dura sempre menos de dez minutos, ao passo que o histérico pode durar duas horas, trcs, ou mais. O accesso é mais tumultuoso na histeria; nesta clle é espectaculoso, as convulsões são representadas por grandes movimentos e torna-se necessário as vezes o concurso de pessoas para conter o doente que se agita em todos os sentidos, emquanto que o epiléptico fica no proprio lugar do ataque, não se levanta, nem se lança para pontos differentes. * O epiléptico pode morder nas convulsões a lingua; o histérico ial-o nos lábios, nos dedos e nas pessoas que se lhe avisinham. Ha exemplos, porem, cm que histéricos mordem a lingua, frequentemente só a ponta, pelo que o traumatismo feito em qualquer outro ponto desta é attri- buido á epilepsia. Na epilepsia ha algumas vezes expulsão de fezes e de urina o que não acontece na histeria. No mal comicial ha inconsciência absoluta do que se passa durante o ataque e na histeria ha geral mente con- servação da consciência; o histérico vê tudo que se passa 22 em torno de si. Na histeria minor o doente narra bem o seu accesso ; si, porem, o ataque se limitar ao primeiro periodo, o que em certos casos acontece, o paciente pode nada saber contar. O histérico apresenta as vezes delirio como o epiléptico. Este acaba de ter sua crise levanta-se e pode realisar actos absurdos como incêndios e homicidios; o histérico não procede desta maneira e se o hypnotisarmos contará o o seu delirio todo. Os paroxysmos epilépticos trazem, segundo as analyses de Lépine e Mairet, uma elevação considerável dos prin- pios constitutivos da urina. Gilles de la Tourette e Cathe- lineau observaram durante os paroxysmos histéricos uma diminuição do residuo fixo da uréa e dos phosphatos e a inversão da formula destes. Deve-se pensar mais em um ataque histérico na mulher o epiléptico no homem, porque a histeria é mais frequente naquella como a epilepsia neste. A emoção também pre- cede mais frequentemente o ataque histérico do que o epiléptico. Além disso, diz Trousseau, «a physionomia dos histé- ricos apresenta uma expressão muito differente da dos epilépticos. A vertigem epiléptica é distinguida da histérica pela amnésia consecutiva naquella e que nesta não se observa. Não quero terminar este capitulo sem falar do prognos- 23 tico da epilepsia e o faço em synthese com as palavras de um autor notável. «0 prognostico da epilepsia, diz Dieulafoy, é extre- mavemente grave, porque ella conduz constantemente á decadência do indivíduo, ao enfraquecimento das facul- dades e a differentes formas de alienação mental.» Tratamento Çaras doenças, como a epilepsia, têm dado lugar a tantas tentativas therapeuticas. Innumeraveis são os agentes therapeuticos que têm sido propostos e empre- gados quer para combater as crises, quer para effectuar a cura radical. Cada um, por sua vez, segundo o seu modo de comprehender a causa desta doença, tem ido a qualquer dos reinos da natureza em busca do remedio e ha feito a sua indicação, creando as vezes verdadeiros methodos de cura; desde os medicamentos pouco activos como o borax até os que são perigosos como abelladona, têm sido aconselhados quasi sempre sem resultado algum e as vezes com funestas consequências, além de diversos líquidos orgânicos, de processos operatorios difficeis e por isso mesmo arriscados como aresecção do sympathico e a trepanação, do hypnotismo, sem esquecer os diversos meios hygienicos dos quaes proveitosamente se tem lan- 26 çado mão. Decorre daqui que o grande numero dos meios para o tratamento indica não a riqueza mas a pobreza da therapeutica para a cura do mal sagrado. O mal comicial é em syndroma clinico: até hoje não se chegou a um acôrdo quanto á sua etiologia. Sabemos que a syphilis, a diabete, os traumatismos, a uremia, podem dar lugar ao apparecimento dos accessos e que estes são melhorados ou curados si se vae ao encontro dessas causas apparentes; quando, porém, não se conhece a causa que actua na producção destes, é preciso inter- rogar como se deve proceder: é o caso da epilepsia chamada essencial. Bastarão certas condições organicas para produzir o mai comicial ou será necessário a presença dum microbiò especifico para realisal o, aproveitando-se apenas dessas condições para adquirir acção e virulência? Nenhuma das theorias sobre a etiologia resolveu ainda o pro- blema. Muitos acham que uma infecção qualquer basta para produzir em certas circumstaneias a epilepsia uma vez que o indivíduo já traz a predisposição nervosa, jà nasce epiléptico para melhor dizer, mas outros pensam que é preciso um germen como o tétano e certamente na raiva. Bra, em 1902, isolou um microbio que eile julga res- ponsável pelo mal sagrado, emquanto que o professor Geni, em 1904, communicou ao congresso de Génova o resultado de diversas experiencias mostrando que o serum 27 dum epiléptico, injectado em doses repetidas e progre- ssivas no proprio doente ou noutro epiléptico, fazia augmentar os accessos injectado por occasiao dos paro- xysmos ou agia como um medicamento especifico quando injectado no intervallo dos accessos. De Buck, em 1907, afíirmou que a causa da epilepsia essencial era uma neuroautocytotoxina. Neste pé a questão, uma vez que a saneção scientifica ainda não se manifestou estabelecendo a verdadeira etio- logia do mal sagrado e o seu remodio especifico, é logico concluir que o melhor caminho a seguir.é o tratamento ser dirigido á hyperexcitabilidade quando se trate da epilepsia essencial e á syphilis, á helminthiase, á uremia, etc., quando estas manifestações pareçam ser a causa provocadora do mal. A questão, portanto, é apenas de diagnostico diíferencial. A clinica tem demonstrado írequentemente que os accessos podem desapparecer nestes últimos casos, quando se vae de encontro a estas causas despertadoras e diminuir ou mesmo desapparecer no primeiro caso, quando o tratamento é dirigido á exaltação da excitabilidade cortico-motora. As crises epileptiformes devidas á demencia paralytica e aos tumores cerebraes devem ser, no estado actual dos nossos conhecimentos, tratadas como a epilepsia franca na impossibilidade em que estamos, salvo raríssimas excepções, de agir sobre suas causas. Passemos agora ligeira revista sobre os meios que têm sido empregados para o tratamento do mal comicial. 28 De duas categorias têm sido esses meios: os cirúrgicos e os chamados médicos. Os fracassos frequentes da therapoutica médica con- duziram os cirurgiões a intervir no tratamento da epi- lepsia. As intervenções neste sentido têm sido numerosas: compressão ou ligadura dos vasos, cauterisação do larynge, tracheotomia, sangria, resecção do sympathico cervical, puncção lombar, trepanação, ligadura do cordão esper- matico, extirpação dos ovários, castração, incisão do couro cabelludo, etc. A ligadura da vertebral foi suggerida e praticada por Alexander com o fim de diminuir a circulação cerebral; repetida por muitos outros como Spanton e Chalot, esta operação pareceu trazer beneficos eífeitos, mas acabou-se reconhecendo que a vantagem não era senão temporada. Mais tarde Jaksch observou que talvez os successos obtidos com a ligadura eram devidos ao córte do sym- pathico e propoz limitar-se a operação somente ao córte deste nervo, agindo desta maneira sobre a circulação cerebral. Schapiro acreditava também que a resecção do sympathico influía na circulação cerebral modificando-a beneficamente, augmentando a vitalidade de todos os elementos nervosos do encephalo e Jonnesco ainda fazia notar que ella impedia a transmissão das excitações reflexas dos orgãos thoraco-abdominaes para o cerebro. Ainda esta operação, como a que consiste na extirpação 29 do ganglio cervical superior, que trazia como consequência a producção duma ligeira ptosis, acompanhada de estrei- tamento pupillar, ambas aconselhadas por Alexander que considerava a lesão primordial da epilepsia como uma anemia bulbo-cerebral, deu lugar a resultados contra- ditórios ou nullos apezar de ser largamente experi- mentada. Nem os estudos experimentaes de François-Franck e Laborde, nem as observações clinicas de Jonnesco, de Ghipault, nem a estatística de Jaboulay confirmaram o valor real da sympathitectomia que caiu em legitimo esquecimento. A incisão da dura-mater também joi aconselhada sem resultados definitivos e Kocher, inspirado nesta operação, observou que a pressão do liquido cephalo-rachidiano augmentava durante os accessos e que estes podiam abortar si se provocasse a saida deste liquido restabele- cendo a normalidade da pressão. Dahi o emprego da puneção lombar. Ghipault que em cinco epilépticos produzio evacuações do liquido cephalo-rachidiano, obteve, diz elle, diminuição sensível dos ataques em dois delles, sendo que nos outros tres o estado foi menos satisíactorio. E’ natural que esta operação, que tão bons serviços presta actualmente ao diagnostico de certas moléstias, influa apenas sobre os ataques pela modificação temporária que a pressão expe- rimenta e não sobre a moléstia e a crer nisto nos levam os trabalhos de Navratzki e Arndt mostrando que o 30 augmento de pressão por occasião dos accessos não é a origem mas uma consequência secundaria delles devido á extase venosa produzida pela parada respiratória. A ablação dos ovários, a ligadura dos cordões esper- maticos e a extirpação dos testículos foram meios acon- selhados para a cura do mal caduco por Chapman, Rooker e outros e Hinsdale publicou observações em que ello vio a cura apòs a castração. Estes processos não têm justi- ficação actualmente ; a extirpação dos ovários ou dos testículos só se justifica hoje quando moléstias atacam estes orgãos de maneira que, na falta de outros meios, só a cirurgia possa ter a sua bonefica interíerencia; fóra destes casos, pelo simples facto de suppor-se que estes orgãos são responsáveis polo mal caduco, é um crime a privação aos indivíduos dos orgãos pelos quaes elles têm o direito de se constituírem paes. Não temos o direito de extirpar um orgão, de privar o exercício duma funcção senão quando isto se faça irremediavelmente necessário e quando os benefícios trazidos sejam maiures que os pre- juízos que existam ou possam certamente existir. O mesmo acontece com a ablação do clitóris praticada por Baker- Brown e approvada por Braun contra as opiniões de Ullerspreger, sob o protesto de que a epilepsia bem podia ser a consequência duma irritação peripheriea do nervo pudendo. A circumcisão que Fleury insiste sobre a sua utilidade em alguns casos de epilepsia e que alguns autores dizem haver confirmado, foi praticada, como medida 31 hygienica por malformação, em 18 epilépticos ao serviço de Feré e, este é quem sustenta, sem absoluta modifi- cação dos accessos. Corning affirma haver suspendido as crises pela com- pressão das carotidas de uma maneira permanente e Alexander diz não ter tido menos feliz exito. Voisin expe- rimentou esta operação em diversos doentes e não obteve nenhum resultado satisfactorio. Com o fim ainda de modificar a circulação cere- bral, Marchall ílall preconisou a tracheotomia e a fistula tracheal e Peraire e Anglade, para diminuir a congestão do cerebro, praticaram incisões do couro cabelludo; os resultados não corresponderam ás esperanças dese- jadas. O alongamento dos nervos não trouxe resultados animadores para a cura do mal hercúleo. Voisin praticou esta operação em um seu doente, no plexo brachial; os accessos se tornaram menos numerosos para em seguida retomarem a sua frequência. Além de inútil, esta operação pode se tornar nociva trazendo como consequência a degenerescencia dos nervos. A sangria tem sido apontada por sua vez como meio de cura principalmente nos plethoricos; Lépine diz haver obtido nestes vários successos. Bondurant louva a sangria e mais recentemente Houzel, em 1900, preconisa este velho remedio efficaz sobretudo na uremia. Depois que nos craneos prehistoricos e de preferencia nos asymetricos foram encontrados vestígios de que os 32 nossos antepassados, servindo-se talvez de silex, pratica- vam a trepanação provavelmente para o tratamento de moléstias que têm sua origem fóra dos traumatismos, pois não se encontra nesses craneos traço algum da mais leve fractura, depois que Lasègue, antes mesmo dos trabalhos de Morei, de Prosper Lucas e de Magnan, mostrou que a asymetria era um caracter primordial do craneo dos epilépticos, concluio-se que esta operação havia sido praticada nesses tempos para o tratamento da epilepsia, entre outras doenças cerebraes. Foi então que se ousou experimental-a, após os trabalhos de Bouilaud, de Broca, de Duret, e a sua pratica, relativamente ao mal sagrado, cresceu com as esperanças que trouxeram as theorias de Bravais e de Jackson e íoi até á epilepsia essencial. Nesta póde-se dizer que os resultados têm sido nullos, porque as melhoras que os doentes têm experimentado são meramente passageiras e são attribui- das a modificações que se devem passar na intimidade dos tecidos cerebraes por occasião da operação, modifi- cações que são corroboradas certamente pela saída de líquidos, como acontece na puncção lombar. Os meios revulsivos podem dar resultados semelhantes. Feré diz que esta acção devida à excitação local em nada deve surprehender, pois que a dor produz, quer provocada ou expontânea, quer consciente ou inconsciente, assim como os spasmos, uma descarga do systcma ner- voso, a tal ponto que frequentemente os phenomenos 33 dolorosos supprem, nos epilépticos, os phenomenos con- vulsivos. Realmente, a pratica tem demonstrado que toda inter- venção violenta pode influir sobre a marcha da epile- psia e a clinica tem mostrado que a influencia de moléstias intercorrentes é capaz de modificar os ataques, chegando mesmo a suspendel-os definitivamente. Mac-Saren vio os accessos serem suspensos por uma fractura do humerus, Feré pela intercorrencia duma pneumonia e Brown—■ Séquart cita um caso em que a erysipela deu lugar a uma cura definitiva. A cirurgia deve então ser desprezada? Absolutamente não. Ella, que tem levado hem longe os seus esforços e arrojos, ha conquistado excellentes resultados no trata- mento da epilepsia, porem fóra dos dominios da epilepsia essencial. E’ assim que a sua intervenção tem dado bons resultados na extracção de corpos estranhos collocados nas cavidades ou mesmo no seio dos tecidos produzindo irritações que se traduzem por accessos epileptiformes e ainda nos casos em que os accessos são provocados por lesões dos nervos periphericos. Lowe, Makenzie, Hack, Finck, observaram accessos epileptiformes devidos á presença de polypos nas fossas nasaeseeste ultimo affirma que a extirpação destes (rouxe o desapparecimento definitivo daquelles. A trepanação pode ser, pois, aconselhada em todos os casos de traumatismo em que haja um agente irritante capaz de ser removido e extincto e ainda nos casos de 34 tumores bem circumscriptos agindo como causa epilepto- gena. Si nas lesões tuberculosas cila quasi sempre falha por causa da multiplicidade ou extensão destas, em outros casos, porém, quando se trata, por exemplo, de uma esquirula ossea ou de um neoplasma, ninguém actualmente melhor que o cirurgião pode intervir. O que é necessário é a observação rigorosa dos phe- nomenos, a indagação dos factos, o conhecimento profundo da physiologia nervosa e a topographia da região para que se possa agir criteriosamente. Ha casos em que vale antes não intervir e são todos aquelles em que as lesões forem disseminadas pelo cerebro ou em que se tiver de fazer largas extirpações na massa cerebral, pois podem sobrevir phenomenos paralyticos ou a morte do paciente. Quando não exista nenhum antecedente traumático, nenhum indicio de tumor, nenhum signal de localisação, não se deve intervir. Feré entretanto, pensa que a inter- venção pode ser indicada quando haja cephalalgia intole- rável, mesmo diffusa e sem localisacão precisa e tanto mais justificável quando os ataques são graves e fre- quentes, constituindo o estado de mal, em que ella appa- rece como o ultimo recurso, desde que os medicamentos internos e as revulsões não têm sido efficazes. Yoisin assim se exprime sobre a trepanação: «Quando a epilepsia é de origem traumatica, a trepanação é indicada e a cura possível. A antiguidade da moléstia é uma condição desfavorável mas não é uma contra-indicação porque casos 35 de cura perfeita existem na sciencia.» E aconselha que se deve regeital-a quando não houver signaes certos de localisação cerebral. O professor Tanzi assim se expressa neste sen- tido : «Na realidade a trepanação do craneo não en- contra hoje uma indicação sanccionada pela experien- cia senão nos casos de pura epilepsia traumatica quando se deve admiltir que se estabeleceu uma irritação local da qual as mais das vezes originam-se accessos jackso- nianos. Mas também neste caso se tem probabilidade de exito somente se a doença não è inveterada e princi- palmentc se os accessos, antes localisados, não se torna- ram geraes.» Do que ficou exposto, vê-se que não podemos nos afastar ainda, até nova ordem, dos domínios da thera- peutica médica. E neste sentido os meios têm se dirigido ora aosaccessos, ora âs causas que determinam a doença. A experiencia tem mostrado que os accessos podem as vezes ser modificados ou evitados quando se attende às causas que os podem provocar, impedindo-as, porque muitos doentes experimentam estes sob a influencia de uma mesma causa, duma mesma excitação genesica ou alcoolica, duma mesma emoção ou duma visão ou audição. Tem-se observado que em certos indivíduos, cuja aura parte da mão ou do pé, os accessos têm sido evitados 36 pela compressão das partes subjacentes a ella e Pierre Marie e Kovalevski recommendam este processo jà indi- cado por Galeno; a flexão, a extensão forçada ou ainda a torção dum dedo pode fazer abortar um accesso; o uso de certas bebidas e alimentos pode conduzir em caso de uma aura gastrica á abstenção do ataque. Os autores citam numerosos exemplos destes casos. Deve-se ter muito cuidado na occasião em que se mani- festam as crises porque o doente pode cair e ficar trau- matisado, o que pode ser nova fonte para a producção delias. Sizaret diz que as inhalações de oxygeno fazem as vezes parar as crises e outros aconselham o decúbito lateral esquerdo. Em casos de suffocação, a respiração artificial é um excellente meio para impedir a asphyxia. Nos casos de estado de mal, quando o doente recusa até mesmo a alimentação, podemos recorrer ao emprego dos medicamentos, como bromureto, pela via rectal e aos clysteres alimentícios, si não fôr possível o uso da sonda esophagiana para a conducçao dos alimentos. Gilles de la Tourelte faz notar que, após este estado, o doente experimenta grande depressão physica que se acompanha de depressão arterial e que neste caso a injecção de cafeina é bem util, sendo necessário empre- gal-a não entre as crises porque augmentaria a pressão já exagerada, mas depois que o estado de mal está ter- minado. Para tratar da doença em si já tive occasião de dizer que os meios são numerosos. 37 Não precisávamos falar aqui, mas não faz mal fazel-o, da hygiene que deve ter o epiléptico, pois todas as molés- tias necessitam o seu auxilio poderoso e, fóra mesmo destas, ninguém desconhece a importância que ella presta á vida dos indivíduos. Em certos paizes adiantados, as famílias, ao envez de somente chamarem os médicos em occasião de moléstias, procuram estes para lhes ensinar a conservara saúde c é com os princípios de hygiene que o médico lhes ensinaessa felicidade. O epiléptico é um ser eminentemente excitável e impul- sivo. O modo de viver geral, a alimentação, a habitação deste e ainda mais a educação e a instrucção, si trata-se duma creança, devem ser objecto de serias attenções e cuidados. Os serviços violentos são nocivos aos epilépticos assim como o trabalho intellectual assiduo. A equitação, a natação, a esgrima e ainda outros exercícios physicos, na maioria dos casos, devem ser prohibidos. O trabalho, qualquer que elle seja, deve ser methodico e não forçado afim de que não seja prejudicial. A vida do campo, longe do ar impuro e das excitações frequentes, é a mais própria para estes doentes e todos os autores estão de acôrdo com este modo de ver. O regimen alimentar dos epilépticos não offerece con- siderações especiaes. A sua alimentação, entretanto, deve ser vigiada com cuidado, pois sabe-se como é frequente o apparecimento dosaccessos por causa de perturbações gastro-intestinaes. O álcool deve ser banido e todas as bebidas que este 38 contenham. Uma nutrição ligeira, facilmente assimilável e substancial, nelia incluindo o leite, é o que deve ser prescripto. Jackson reeommenda uma nutrição variada e substancial. Gilles de la Tourette aconselha as refeições repetidas, pouco copiosas e bastante nutritivas afim de evitar con- gestões e indica particularmente a qualidade e a quantidade dos alimentos, descrevendo mesmo o modo por que a refeição deve ser realisada. Uma grande sobriedade deve ser a regra da conducta do epiléptico. A. simples dieta, em certos casos, tem feito espaçar os accessos de tal maneira que faz pensar na cura. Wistocki aconselha a dieta lactea; Haig, partindo da sua lheoria que attribue a epilepsia ao accumulo de acido urico no sangue, indica a dieta mista prevalecendo a vegetal e gaba os seus effeitos. O professor Tanzi diz que ha epilépticos que não apresentam senão raros accessos e sempre depois de intemperanças, e muitos desses doentes que são admitti- dos em casas apropriadas, porque apresentam accessos frequentes e repetidos, melhoram muitissimo devido somente á dieta regular a que são submettidos. O que não resta a menor duvida 6 que a regularidade na dieta, a sobriedade, ô um meio seguro para espaçar as crises. Passemos agora a outros meios. 39 A hydrotherapia, a electricidade e o hypnotismo têm sido empregados no tratamento do mal comicial. A hydrotherapia é um bom auxiliar dos medicamen- tos; com elia tem-so visto os accessos diminuirem de numero e o estado geral experimentar henefica modifi- cação. Ella favorece as funcções da pelle dando lugar á saída das toxinas da economia e é um excellente meio para obter a sedação e a tonificação do syslema nervoso. Jules Voisindiz que abalneação e a hydrotherapia devem ser recommendadas e prescriptas com methodo. Voisin aconselha que os banhos não devem exceder de 15 minutos e a ducha que durará apenas de 15 a 20 segun- dos, não devendo tocar a cabeça, deve ser quebrada, terminando-se por um forte jacto na planta dos pés. Quando o doente repugna a agua fria, elle applica a ducha quente e vae gradualmente até chegar á tempera- tura do meio exterior. Gilles de la Tourette também aconselha a hydrothera- pia como auxiliar dos medicamentos. A ducha é applicada em jacto quebrado por elle, á temperatura de 10° a 12° centígrados, sobre as partes anterior e lateraes do tronco ê e a columna vertebral, terminando-se por um forte jacto sobre os membros inferiores e pés, sendo poupada a cabeça. A electricidade foi empregada por Benedikt, Remak e outros mais. Feré diz que Althaus recommendaa galvani- sação transversal pelas apophyses mastoides e a galvani- sação do sympathico. 40 Erb empregou a electricidade fazendo-a agir sobro os hemispherios cerebraes e a modulla alongada. Fischer e Rockwell aconselharam a faradisação geral. Este ultimo praticou ao mesmo tempo a galvanisação central, da qual diz haver obtido resultados satisfactorios como adjuvante da acção dos bromuretos e da sua tolerância. A pedra de iman, empregada por Paracelse e substituida artificialmente por outras formas variadas, como os capa- cetes imantados que traziam a Maggiorani a crença de que a cura podia resultar da sua applicação repetida e prolongada, não representa hoje senão uma simples lem- brança do passado e as experiencias de Bourneville e Bricon feitas neste sentido foram totalmente negativas. A electricidade não tem dado resultados na cura da epilepsia. A suggestão tem sido ensaiada também sem resulta- dos lisongeiros; Bernheim, entretanto, diz haver obtido o abortamento de um accesso de epilepsia e a cura total por suggestão. Depois dos estudos de Brown-Séquart sobre a secre- ção interna das glandulas e da descoberta da organo- therapia, foram ensaiados diversos liquidos orgânicos no tratamento da epilepsia. Feré ensaiou o liquido testicular do carneiro em injecção sub-cutanea de 10 c. c. durante 20 dias, sem vantagens. Bourneville também fez uso do suco testicular não obtendo resultado algum e Toulouse e Marchand se mostraram mais satisfeitos com o emprego do suco ovarico. 41 Mairet e Bosc experimentaram o suco da glandula petuitaria em injecções sub-cutaneas e a ingestão da glandula triturada em glycerina; observaram então que os ataques, ao envez de diminuírem de numero, augmen- taram, havendo aproducção de accessos delirantes. Estes autores fizeram ainda experiencia com o suco renal empre- gado por Bra e concluíram que era inefficaz e mesmo nocivo porque produzia o augmento das crises convulsivas. Havendo-se notado que os doentes de bocio exopthal- mico eram as vezes atacados de convulsões e que os animaes aos quaes se arrancava a glandula thyroide podiam apresental-as também, deduziu-se que esses acci- dentes estavam ligados a uma lesão desta glandula e empregou-se a thyroidina em injecções e a glandula na alimentação dos epilépticos. Os resultados foram contra- ditórios ou nullos. O dr. Geri diz haver empregado a thyroidina com successo no tratamento da epilepsia essencial, emquanto que Feré affirma não haver obtido resultados favoráveis. O dr. Rebuschini diz que Babés, em doze epilépticos com accessos violentos e diários, obteve a parada quasi immediata dos ataques com injecções de substancia nervosa emulsionada; esta desapparição dos paroxysmos e a melhora do estado geral foram mantidas durante algumas semanas, voltando em seguida os accessos já menos frequentes e violentos. Estes resultados parecem ter sido inconstantes, todavia Levi-Bianchini tem-se dado bem com este methodo. 42 Bra diz que Constantino Paul usava, em injecções de 1 a â c. c., nos seus doentes, com algum proveito, um filtrato que era o resultado final da maceração de 15 gr. de glycerina durante 24 horas, a que se juntava, em seguida, 75 gr. de agua destillada, sendo collocada a mistura em um filtro no apparelho de Arsonval a uma pressão de 50 a 60 atmospheras. Até hoje nenhum liquido da economia é considerado como remedio do mal caduco. E’ verdade que em certos casos elles podem ter a sua indicação, pois sabe-se actual- mente que a perturbação de uma glandula da economia, que traz constantemente o desiquilibrio de outras, pode influir na producção dos accessos comiciaes. O serum artificial foi também posto em uso não como meio de cura, mas para contrabalançar o effeito das toxinas concorrendo ao mesmo tempo para eliminal-as. Com este fim tem-se empregado o serum de Hayem e o de Chéron; este ultimo apresenta a desvantagem de ser doloroso e conter acido phenico que é um corpo estranho ao liquido vascular e por isso o seu emprego tem sido abandonado. Nos casos dos accessos se manifestarem em serie e no estado de mal, Voisin diz haver empregado o serum de Hayem em injecção de 40 a 60 gr. cada vez, â temperatura de 32 a 34°, no tecido cellular ou nas veias, obtendo sempre optimos effeitos. À ergotina foi empregada por Lépine nos casos de epilepsia congestiva e observou osaccidentes se attenuarem sob o emprego desta medicação associada ao uso do 43 bromureto; Yeats, Voisin, fizeram a applicação do centeio espigado, notando ambos uma diminuição dos accessos para mais tarde reapparecerem com a mesma intensidade. A camphora é recommendada por alguns autores especialmente nos epilépticos que se entregam ao ona- nismo; a sua propriedade curativa não foi verificada e nos casos do emprego do bromureto de camphora em que se tem visto certos resultados, attribue-se os effeitos ás propriedades sedativas do bromo. Certos autores apontam alguns casos de feliz exito com o emprego do nitrato de prata e do sulfato de cobre ammoniacal, entretanto não se deve tomar esse facto senão como melhoras passageiras e Feré, que empregou o nitrato de prata, vio os accessos serem melhorados a principio para retomarem o seu curso habitual. Os compostos de zinco também foram introduzidos na therapeutica da epilepsia. O oxydo de zinco foi adminis- trado por Herpin que methodisou o seu uso, empregando-o em doses crescentes até o individuo supportar doses elevadas; elle diz haver obtido bons resultados e Voisin não tem visto absoluta modificação dos accessos convul- sivos. O emprego do valerianato e do lactato de zinco não trouxe resultados positivos. Os medicamentos empregados têm sido em grande numero e muitos estão còmpletamente esquecidos do uso da therapeutica comicial. O borax foi aconselhado por Gowers na dose de 1 gr. cada dia que se elevava, segundo a tolerância, até 6 gr. 44 quotidianas. Folsom, Voisin e Mairet também o empre- garam, este observou melhor acção sobre a epilepsia symptomatica do que na essencial; Ferè, que empregou-o na dose de 2 a 3 gr., diz não haver encontrado bons resultados e Voisin que fez uso delle em seus doentes, na dose de 2 gr., não achou modificação sensivel nos accessos, ao contrario estes tendiam a augmentar. Hill aconselha o borato de sodio e Huchard indica também uma formula onde este medicamento entra para o trata- mento do mal sagrado. A experiencia tem demonstrado que este medicamento, que esteve em voga por algum tempo, não traz proveito para a cura da epilepsia ; produz até as vezes um grave estado cachetico, acompanhado de perturbações trophicas, gastro-intestinaes, em certos casos nephrite, alem de outros accidentes. Estes phenomenos podem ser sustidos pela suspensão do medicamento e Gowers, para combater certas manifestações para o lado da pelle, fez uso do arsénico; não é justo, entretanto, o seu emprego cujos prejuizos são numerosos á vista dos poucos bene- fícios, si é que elles existem, que traz ao mal comicial. O curara também foi experimentado; Liouville e Voisin o empregaram sem resultados animadores. Rossbach e Nothnagel affirmam haver visto a ingestão de um pouco de sal marinho supprimir o accesso quando a aura parece ter sua séde na esphera do pneumogastrico; Schultz e Voisin obtiveram o mesmo resultado; mas este ultimo affirma que somente teve este exito quando 45 a «doença era realmente de origem reflexa ou par- cial.» O ether foi empregado sem successo por diversos scientistas, quer pela via gastrica, quer em inhalação. O mesmo acontece com o opio e a morphina que podem arrastar os doentes ao morphinismo que lhes será por demais prejudicial; cumpre, entretanto, dizer que a mor- phina, empregada com largos intervallos, calma por momento muitas vezes os accessos. Weir Mitchell, pensando que a epilepsia estava ligada á anemia cerebral e sabendo que o nitrito de amylo tem a propriedade de congestionar o cerebro, introduziu o emprego deste na therapeutica comicial, cujos resultados foram desfavoráveis; todavia Bourneville viu accessos abortarem sob a influencia de inhalações deste medi- camento, contra as experiencias de Voisin e outros que não confirmam esta maneira de ver. Manquat diz que este desacordo parece devido a que não sendo o mecha- nismo dos accessos sempre o mesmo, as indicações não devem ser idênticas e accrescenta que si o rosto se apresenta cyanotico por occasião do ataque este medica- mento deve ser contra-indicado. A casca do Levante e a picrotoxina, seu alcaloide, foram empregadas por Planat, cuja opinião é favoravel á sua acção therapeutica. Couyba e Hambursin obtiveram os mesmos eííeitos e Voisin não encontrou no emprego destas substancias os resultados annunciados. A santonina também appareceu na therapeutica do mal 46 sagrado. Lydston, observando que ella administrada como vermífugo às creanças tomadas de convulsões podia fazer desapparecer estas sem haver expulsão de nenhum helmintho, fez uso desta substancia e satisfeito com o exito obtido, aconselhou-a em quantidade progressiva até altas doses que a tolerância, revelada então por cystite, possa permittir. Lydston julga ver ainda nella certas vantagens sobre os bromuretos. O emprego da santonina nos accessos que se prendem cá existência de helminthos no intestino é de incontestável valor; quanto ao seu uso, porém, nas outras formas da epilepsia, os resultados não parecem satisíactorios. A valeriana tem sido empregada em todas as suas formas, ora só, ora combinada formando o valerianato de zinco, de ferro, sem que tenha trazido modificações sensíveis para os accessos. Da mesma fornia acontece com a assa-fétida, o estramonio, a hyosciamina, o aconito que são indicados cada um por sua vez ou associados entre si. A antipyrina, a chloralose, a antífibrina, a trinitina, o sulfonal, etc., calmam as vezes o erethismo nervoso, mas não têm nenhuma acção sobre as crises. Voisin costuma juntar a acção da antipyrina aos outros medicamentos quando ha phenomenos dolorosos e tem visto o desapparecimento destes sem abolição dos accessos convulsivos. O azul de methyleno foi ensaiado pelos Drs. Wahl e Vallon sem resultados esperançosos. A belladona e a atropina, seu alcaloide, têm sido muito 47 empregadas no tratamento do mal sagrado. Aacção destas substancias sobre o systema nervoso está ainda mal deter- minada e por isso não se conhece verdadeiramente o me- chanismo por que ellas agem contra a epilepsia. Pierret demonstrou que, sob a influencia da belladona em dose therapeutica, as crises motoras podem ser desenvolvidas e accentuadas quando já existem ou provocadas nas íocmas larvadas do mal divino. Alguns têm admittido com Soulier que si a belladona é um excitante da cellula cerebral no estado physiologico, pode ter uma acção sedativa, mesmo curativa, sobre ella, no estado pathologico. Si esta ultima hypothese não fôr verdadeira também não será impossível; entretanto parece não ser desagradavel pensar que a belladona tem modos differentes de acção segundo as formas comiciaes; é assim que Pierret dá este medica- mento na epilepsia com estupor, vertigens e impulsões e tem visto, ao passo que as crises augmentam, melhorar o estado intellectual, aclarando-se a intelligencia, adoçando-se o caracler e desapparecerem as vertigens e as impulsões, assim como o estupor e o gatismo; quando, porém, a belladona é applicada nos casos contrários, onde não se nota perturbações intellectuaes apparentes, produz geral- mente uma diminuição do numero das crises. Gomo quer que seja, o que não resta duvida é que a belladona pode espaçar os ataques e estes efíeitos são attestados peias observações de Leuret, Ricart, Stoll, Skoda, Dereyne, Bretonneau, Nothnagel, Rossbach e muitos outros; entretanto o que também parece ra- 48 soavel dizer é que não se trata nestes casos de uma cura mas duma melhora mais ou menos notável. Trousseau diz haver empregado a belladona mais de trinta annos,obtendo melhora dos accessos e «um certo numero de cura solida». Eis o modo como elle prescreve este medicamento : Extracto de belladona Pó de belladona ãa 0,01 centigr. F. s. a. 4 pillula e mais 400 iguaes. Durante um mez, o doente toma cada dia uma destas pillulas, sendo pela manhã si os accessos apparecem de dia e á tarde si elles costumam apparecer á noite. Cada mez, o paciente toma uma pillula de mais e, quaesquer que sejam as doses, o medicamento deve ser tomado sempre ao mesmo momento; o indivíduo chega a tomar assim cinco, dez, quinze, vinte e as vezes ainda mais até que a tolerância, revelada pela dilatação excessiva da pupilla, seccura da garganta, mostre que se deve parar, mantendo a principio a ultima dose administrada, quando a doença parece feliz- mente se modificar e depois descendo gradualmente numa progressão perfeitamente inversa da primeira até a dose primitiva. Trousseau prefere o emprego da atropina ao da belladona e formula, quando faz uso daquella, da seguinte maneira: Sulfato neutro de atropina 5 centigr. Agua-de-vida branca 5 gr. Para usar uma gotta por dia em um pouco dagua. 49 De mez a mez, elle manda que a dose seja augmentada de uma gotta, ficando o tratamento todo sujeito ás mesmas regras estabelecidas para as pillulas. Algumas vezes elle diz haver alternado, com certo exito, este tratamento com o uso do nitrato de prata, limalha de cobre ou lactato de zinco. Já falei anteriormente que a maior parte dos epilépticos apresentam perturbações gastro-intestinaes que coincidem com os accessos e que estes podem ser evitados ou modi- ficados com os cuidados que se dispensa ao apparelho intestinal. Nos casos em que estas perturbações existem, pode-se empregar com vantagem os laxativos dentre os quaes avulta o velho oleo de ricino que é um doce laxativo mechanico; com elles consegue-se muitas vezes evitar uma serie de accessos e, nos casos mesmo em que estes apparecem, a sua utilidade não pode ser contestada. Voisin,alem dos purgativos, recorre, as vezes nestes casos, aos vomitivos, particularmente á ipeca estibiada em pó na dose de 1 gr. 50, e, ainda outras vezes, quando não obtem resultados com estes meios, ás lavagens do estomago com dois ou tres litros de agua de Vichy morna de cujo emprego ha registado felizes proveitos sobre os accessos. Elle aconselha também, quando ha prisão de ventre, ainda mesmo ligeira, mormente quando a tempe- ratura acha-se elevada, os clysteres frios com betol ou naphtol dos quaes aifirma haver tirado vantagem. Não resta duvida que todos estes meios doacção sobre o tubo digestivo são proveitosos, pois os intestinos e 50 conseguintemente o organismo ficarão desembaraçados de uma certa quantidade de productos toxicos que podiam influir sobre os ataques, readquirindo nova actividade defensiva. A limpeza do appardho gastro-intestinal deve ser feita até como simples medida hygienica e lembro agora, para bem frisar o assumpto, que alguém vío, nos intestinos, a causa da velhice. Alguns empregam ainda, para eliminar as substancias toxicas do organismo, a scilla e a digitalis que não devem ser continuadas por muito tempo e merecem da parte do médico, conforme aconselham os tratados de pathologia, seria attenção; o leite neste caso ou ainda a lactose na dose de 50 a 100 gr. devem ser preferidos, .is injecções de serum artificial e as fricções cutaneas tam- bém têm sido aconselhadas com este fim. A pilocarpina, que produz uma sudorese abundante, foi também empre- gada por alguns médicos; Feré viu ao contrario este medicamento provocar crises, as vezes mesmo em serie, nos individuos sujeitos a ella. Estes meios, laxativos e diuréticos, são todos uteis para auxiliar o tratamento do mal comicial. Os bromuretos, desde que Locock, em 1851, empre- gou o bromureto de potássio, começaram a ser usados na therapeutica da epilepsia e ainda hoje elles são lar- gamente empregados na clinica diaria para o tratamento do mal caduco. E actualmente, para bem dizer, de todos os medicamentos, elles são os únicos que tèm sido conservados pela sua utilidade e pelos serviços que prestam 51 neste sentido, especialmente o bromureto de potássio, na falta de um remedio especifico para o mal comicial, são de incontestável valor. Os benefícios que traz o bromureto á epilepsia são attestados porquasi todos os autores; um ou outro que não exalta a utilidade brornica. Feré diz que muitos casos considerados rebeldes á acção do bromureto pare- cem hoje justificáveis porque não foram tratados por elevadas doses deste medicamento; quanto ao arruina- mento do systema nervoso que alguns pensam que elle produz, parece não ser real e Manquat diz que o «bro- mureto de potássio tem uma influencia muito feliz sobre o estado intellectual dos epilépticos, que levanta de maneira muito accentuada ». A experiencia geral ha sempre consagrado que os preparados bromicos são antiepilepticos por excellencia; todas as outras substancias que enumero anteriormente e ainda muitas que não foram lembradas não devem ser justificadamente empregadas senão em caso de inefficacia delles ou quando a intolerância por todos os meios seja absolutamente manifesta. O bromo tem sido combinado com toda sorte de metaes até mesmo com o ouro. Entre os bromuretos, têm valor pratico o de potássio, o de sodio e o de ammonio. Para, evitar o bromismo, pelo uso dos bromu- retos, foi introduzida na therapeutica a brometilíorrnina que é menos efficaz que elles e em doses altas não isenta de perigos e a bromipina de Merck, combinação 52 do bromo com gorduras, que pode ser administrada mesmo por via hypodermica e é melhor que aquella. Lembramos que o bromureto de potássio foi substi- tuido pelo de sodio ou de ammonio por Iluchard, pelo de stroncio por Laborde, pelo de camphora por Bourne- ville; outros autores preconisaram os bromuretos de lithio, de zinco, de cálcio, de rubidio, de nickel, etc.. O dr. Goubert usa o bromureto de ouro em grânulos na dose quotidiana de dois a cinco milligrammas. Nothnagel, Rossbach, Chéron,’ Franquez preferem o bromureto de sodio ao de potássio e esta substituição é particularmente indicada nas creanças e nos adultos cujo coração elles suppõem enfraquecido pelo uso do bromureto de potás- sio; Deneffe e Bourneville indicam o bromureto de camphora na epilepsia vertiginosa e no estado de mal. Os bromuretos têm sido usados ora isolados, ora reunidos alguns entre si, ora ligados a outras substancias. Eis uma fórmula simples preconisada pelo dr. Comby: Bromureto de potássio 25 gr. Xarope de cascas de laranja 500 gr. Para usar 2 a 4 colheres das de sopa por dia. 0 dr. Wahl, que trabalha em um hospital de alienados, costuma juntar írequentemente á fórmula chamada dos polybromuretos o chloral e o opio, com a qual diz haver obtido sempre bons resultados, administrando-a em infuso de camomilla ou de tilia durante quinze dias por mez. 53 Eis a fórmula: Bromureto de potássio. » « sodio » » ammonio íi a. 1 gr. por dia Hydrato de chloral 3 gr. Tintura de opio, 0,l0centigr. Xarope de cascas de laranjas amargas 30 gr. Agua • • 90 gr. Os bromuretos devem ser despidos das substancias que ordinariamente o impurificam afim de que não sejam nocivos ao estomago quando usados. A dose empregada varia segundo a idade e a constituição dos individuos: Gowers afíirma que existem casos em que uma dose de trinta centigrammas basta para creanças de dez annos. A. Yoisin, Martin-Demourette e Pelvet introduziram na therapeutica o emprego dos bromuretos alcalinos em alta dose; certos autores inglezes indicam doses de 20 a 25 gr. o que não é isento de inconvenientes, pois são observados casos em que o bromismo tem conduzido cá morte. Classicamente se dá o bromureto de potássio na dose de 4 a 5 gr. durante annos com curtas interrupções. Feré diz que as creanças de quatro a cinco annos suppor- tarn perfeitamente 4 gr. de bromureto e de dez a quinze annos toleram esta substancia quasi tão bem como os adultos e estabelece para estes a dose maxima de 12 gr., ainda que Namias haja prescripto até 14 gr. e outros ainda maior porção. O bromureto é prescripto quer em dose constante e 54 neste caso o doente toma a mesma quantidade todos os dias, quer em doses graduaes alternantes. Estas devem ser preferidas àquellas porque o organismo vae insensi- velmente tolerando este medicamento. Gillcs de la Tourétte emprega a dose crescente e decrescente que na realidade é muito racional. Feré aconselha que o bromureto não deve ser suspenso nem eliminado no curso de um tratamento eíficaz sob pretexto algum, excepto nos casos de uma doença adyna- mica onde é formalmente contra-indicado ; a diminuição ou as suspensões prematuras podem não somente compro- metter a cura senão também pôr em perigo a vida do doente. O bromureto é incontestavelmente para o indi- víduo atacado do mal comicial tão necessário como as próprias substancias de que se nutre e é por isso que A. Voisin diz que o bromureto de potássio deve constituir um alimento para o epiléptico. De poucos annos a esta parte, têm apparecido alguns methodos para o tratamento do mal caduco. Notaremos o de Flechsig, o de Richet e Toulouse e o de Gilles de la Tourette, todos fundados no bromureto. Bechterw também, tomando por base ainda o bromu- reto preconisa a fórmula seguinte, tres semanas por mez, da qual diz haver obtido bons resultados: Infuso de adónis vernalisde 2 ai3,75 para 180 liq. Bromureto de potássio.... 7,50 a 11,25 Codeína 0,12 a o,18 Para tomar 4, 6, até 8 colheres das de sopa por dia. 55 As razões em que Bechterew se íunda para empregar esta fórmula são as seguintes: «Desde que os ataques da epilepsia têm como substratum physiologico uma alte- ração vaso-motora do encephalo, com affluxo de sangue na cavidade craneana, é legitimo diminuir a excitabi- lidade cerebral e particularmente do córtex por meio do brometo e ao mesmo tempo fazer o sangue circular, por meio do reerguer da pressão arterial e estreitamento da luz dos vasos.» FJecbsig põe em pratica o seu methodo da seguinte forma: Submette a principio o seu doente, durante seis semanas, á dose de 15 a 25 centigrammas de extracto de opio cada dia. Em seguida suspende esta bruscamente e faz tomar 7 gr. 50de bromureto de potássio durante dois mezes; diminue então a quantidade deste até 2 gr. e continha com esta dose por muito tempo. O periodo do opio parece preparar o do bromureto porque os ataques não são modificados senão depois do uso deste. Este methodo tem sido bastante experimentado por muitos médicos sem resultados animadores. Si ha quem gabe melhoramentos notáveis, muitos outros obtiveram resultados incertos ou decididamente prejudiciaes. Aos successos de Wulff encontrados na associação do opio ao bromureto de potássio, pode-se oppor nove insu- ccessos de Fraenkel sobre dez casos. Bratz attribue a este methodo phenomenos de intoxicação e mesmo casos de morte. Este methodo é desagradavel porque o tratamento é acompanhado frequentemente de vomitos, constipação, 56 allucinação, delírios e obriga o paciente ao leito, privando-o dos serviços diários. O opio si umas vezes é util como sedativo, outras è prejudicial pela sua accão geral. O dr. Wahl, ainda este anuo, fez notar que elle conduz frequentemente ao enfraquecimento physico e intellectual e mesmo á morte e o prof. Tanzi, muito antes delle, o considerava violento e perigoso. Ziehen, alem de ligeiras modiíicações que fez no methodo de Flechsig, juntou-lhe uma parte dietetica que consiste em supprimir os condimentos, o álcool, o café, o chá, o tabaco. A abstenção das funcções de repro- ducção e o repouso physico e psychico são aconselhados por Ziehen. Toulouse e Richet, depois de Flechsig, partindo das noções da analogia chimica que une o chloro ao bromo, foram conduzidos a pensar que si nas cellulas cerebraes se podesse substituir molécula a molécula o chloro pelo bromo, chegar-se-ia assim a uma saturação bromica do organismo e portanto ao desapparecimento da epilepsia. Elles empregam o bromureto em dose moderada reduzindo com proposital dieta o uso dos chloruretos da alimentação; assim a deficiência dos chloruretos no organismo deter- minaria segundo estes autores a sua substituição por meio dos bromuretos, e estes então, não mais presentes como substancia estranha mas introduzidos no mechanismo das trocas e na extructura chimica do tecido nervoso, teriam maior efficacia. Este methodo também tem sido largamente experimen- 57 tado e emquanto de urna parte tem suscitado approvações, de outra tem sido censurado como prejudicial e até peri- goso. Pand notou que este methodo facilita o bromismo e pode conduzir á morte por fraqueza cardiaca. A dieta regular e mista que se observa no methodo de Toulouse e Richet é talvez o elemento mais importante para a modificação dos accessos, depois da acção directa do bromureto. O methodo de Gilles de la Tourette se baseia na acção do bromureto sobre a hyperexcitabilidade excito -motora do cerebro e é chamado por elle methodo da dose sufficiente. O emprego deste methodo comprehende tres periodos: o primeiro em que se observa os signaes physicos precisos tanto locaes como geraespara estabelecer adose sufficiente, isto é, aa que cura»; o segundo em que esta dose é mantida, tendo em mira aquelles signaes, durante um espaço de tempo que o critério julga necessário para fazer parar a hyperexcitabilidade cortico-motora e com esta os accessos; o terceiro em que se diminue progressivamente o medi- camento supprimindo-o definitivamente. A fórmula empregada por Gilles de la Tourette é a seguinte: Bromureto de potássio 40 gr. » » sodio » » ammonio Benzoato de.'sodio ãa 42 gr. Agua fervida ou destillada. 1000 c. c. 58 Cada colherada das de sopa desta solução, contem uma gramma de bromureto. Gilles insiste no uso de uma medida certa e faz usar pelos seus doentes um calix graduado para uma gramma e para meia. Elle prefere aqui o emprego do benzoato de sodio ao salycilato do bismutho e ao naphtol por exemplo que sào aconselhados por alguns autores, fundando-se em expe- riências feitas com o acido benzoico em que se verificou não ser este medicamento offensivo ao apparolho gastro- intestinal ; na realidade elle é empregado até com successo na therapeutica das moléstias do fígado, dos rins e dos pulmões. O benzoato é aqui aconselhado porque, impe- dindo as fermentações, regularisa a absorpção do bromu- relo, alem de ser um diurético. As doses variam segundo as idades tendo-se apenas em vista a dose sufficiente; entretanto ellas não devem nunca exceder de 12 gr. e apenas uma só vez elle diz haver excepcionalmente chegado a 14 gr. Gilles dá na primeira semana 3 gr., na segunda 4, na terceira 5. Estas quantidades, que devem ser usadas em doses crescentes ou decrescentes, são augmentadas ou diminuídas segundo certas circumstancias. Assim se pode empregar 4, 5, 6 gr., 6, 7, 8 gr., conforme a necessidade para effectuar a dose sufficiente. Para que a dose seja sufficiente é necessário que o doente reconheça que está sob a acção do bromureto pelos phonomenos subjectivos que experimenta. A pupilla 59 é um signal certo para o médico saber si já se chegou á dose desejada, Chegando a esta dose, Gillesmandaque ellaseja mantida por certo espaço de tempo no qual precisa-se as vezes augmental-a ainda, porque vae tornando-se insufficiente. A supressão pode ser feita quando, depois de longo periòdo de tempo, o doente não apresenta mais os accidentes comi- ciaes, mas eila deve ser realisada progressivamente na ordem decrescente. O epiléptico somente pode, até certo ponto, ser considerado curado depois de dois annos apõs o ultimo ataque. A este tratamento Gilles de la Tourette liga com van- tagem a hydrotherapia, o leite e as vezes o < serum artificial. Este methodo, tem, alem de outras, a vantagem de nos indicar precisamente, pelo exame do reflexo pupillar, a dose alem da qual não devemos passar, sabendo-se como é variavel a tolerância dos diversos medicamentos e conse- guintemente do bromureto; além disso os indivíduos não serão obrigados constantemente ao leito, como acontece em outros processos de tratamento. Gilles de la Tourette diz haver obtido com seu methodo, que elle põe em pratica desde longos annos, os melhores resultados possíveis. Eu sempre vi os accessos serem suspensos com o uso deste methodo, no ílospital de S. Isabel, em vários doentes, sob a direcção do dr. Pinto de Carvalho, professor de 60 moléstias nervosas, que também íaz uso delle na sua clinica particular onde .tem obtido vários successos. Nos casos em que a epilepsia estava ligada â histeria não observei melhora alguma, ao contrario o estado do doente ainda, as vezes, mais se agravava. Diremos, para concluir , que o tratamento da epilepsia está, até nova ordem, resumido por assim dizer, no bromureto, auxiliado por uma dieta regular, pelo repouso physico e psychico, pelos purgativos, pelo serum artificial, pela hydrotherapia, exceptuados certos casos especiaes como a helminthiase em que se deve recorrer aos vermi- fugos, a syphilis em que os saes de mercúrio e os de iodo devem ser indicados, os traumatismos em que algu- mas vezes se pode encontrar o remedio na cirurgia; mas ainda nestes casos, deve-se recorrer, as vezes, ao mesmo tempo, fazendo um tratamento misto, ao uso do bromureto. PROPOSIÇÕES Tres sobre cada uma das cadeiras do curse de sciencias medicas e cirúrgicas PROPOSIÇÕES ANATOMIA DESCRIPTIVA I As artérias que se distribuem no córtex cerebral são: a cerebral anterior, a média e a posterior. li A cerebral anterior se distribue ás l.a e 2.acircumvo- luções írontaes, á íace interna do hemispherio cerebral, ao lobo paracentral, ao lobo quadrado e á circumvolução do corpo calloso. A cerebral média se aloja no fundo da scisura de Sylvius pelo que recebe o nome de artéria sylviana e leva especialmente a sua influencia sobre a zona motora ; ahi na scisura ella se divide em diversos ramos. A cerebral posterior se distribue ao lobo occipi- tal, a uma parte do lobo parietal e ás 2.a e 3.a circumvo- luções temporaes. ui Destas tres artérias, a mais importante é a cerebral média não só pelo modo de distribuição como pela ori- gem frequente de hemorragia e amollecimento cerebraes a que dá lugar. 64 ANATOMIA MÉDICO-CIRÚRGICA I O córtex cerebral apresenta scisuras e circumvoluções. II E’ ahi no córtex que se acham os centros sensitivo-mo- tores dispondo-se em torno da scisura rolandica e com- prehendendo toda a frontal e a parietal ascendentes, o lobulo paracentral e o operculo rolandico. m As lesões desta zona, chamada motora ou excitável ou ainda epileptogena, são traduzidas quer por paralysias, quer por convulsões, segundo ha destruição ou irritação dos elementos nervosos. HISTOLOGIA I A massa cerebral é formada por duas substancias: uma cinzenta composta de cellulas das quaes partem as vo- lições e onde chegam as sensações, outra branca formada de tubos conductores. li A substancia cinzenta está espalhada por toda a super- fície exterior do cerebro formando o córtex e entra em grande parte na constituição das circumvoluções. m Na parte central do cerebro, encontra-se também a snbstancia cinzenta não mais disseminada, mas formando 65 montículos denominados ganglios cerebraes ou encepha- licos e núcleos cinzentos centraes. BACTERIOLOGIA I * Bactérias são seres vegetaes vivos e microseopícos. Elias podem ser saprophytas e parasitas. Estas têm maior importância médica do que aquellas devido ás múl- tiplas moléstias qne produzem. íl Elias fabricam quasi sempre substancias capazes de envenenar o organismo e produzir a morte: são as toxinas. III Estas, pelas perturbações organicas que podem dar lugar, são as vezes a causa provocadora dos accessos comiciaes. ANATOMIA E PHYSIOLOG1A PATHOLOGICAS I Tem-se observado, por occasião dos paroxysmos, uma diminuição da oxyhemoglobina no sangne dos epilépticos. n Uma diminuição dos globulos vermelhos também se tem verificado; esta não se manifesta em geral parallela á diminuição da oxyhemoglobina. m À necropsia dos epilépticos mortos em estado de mal 66 indica uma congestão do systema venoso, principalmente oncephalico. PHYStOLOGIA I As fibras nervosas da via motora central, ainda que tenham todas o mesmo valor morphoiogico, são agrupadas ordinariamente ein dois feixes: o geniculado queé pequeno e se termina no bulbo e o pyramidal que é maior e se dirige á medulla. TI O feixe geniculado, assim designado porque occupa na capsula interna a região chamada joelho, é a reunião das fibras que provêm da parte inferior da zona sensitivo- motora do córtex ás quaes está ligada a funcção da transmissão das incitações motoras cerebracs aos nuclecs de origem dos nervos motores bulbo-protuberanciaes. III O feixe pyramidal, assim chamado porque forma, ao nivel do bulbo, dois cordões conhecidos por pyramides anteriores, é a reunião das fibras da via motora central que vão da zona sensitivo-motora á medulla espinal e têm sua origem nas partes média e superior desta zona. A funcção do feixe pyramidal é transmittir as incitações motoras cercbraês aos núcleos de origem das raizes ante- riores dos nervos rachidianos. 67 THERAPEUTICA I A atropina é uma substancia muito activa e por isso mesmo o seu emprego requer certa cautela. t» ii A absorpçcão deste alcaloide faz-se facilmente pela mu- cosa, tecido cellular e pelle desprovida de epiderme e a sua eliminação se verifica rapidamente de 10 a 20 h. ill O sulfato é o mais usado dos saes de atropina. HYGIENE I A agua é, como o oxygeno, um iluido vital por exce- llencia. Ella que faz parte de todos os líquidos orgânicos, alem de servir para levar através o organismo os mate- riaes necessários á formação e reparação dos tecidos e acarretar comsigo os que se tornaram impróprios á vida destes, facilitando ao mesmo tempo todo o metabulismo orgânico—-constitue por si um alimento cá vista de prin- cipios nutritivos que contem. Ella tem por isso, para a hygiene, uma importância capital. il A agua, para ser distribuida a uma população, deve ser examinada scientificamente, depois filtrada ou ainda mais ozonisada afim de que seja purificada das substancias imprestáveis e dos micro-organismos nocivos á saude. 68 Mas não basta ainda este trabalho: ella deve ser inspe- ccionada frequentemente porque pode ser alteradar Um bom meio para extinguir o receio que ao indivíduo inspira uma agua, ainda que dispendioso, é fervel-a e deixal-a ao repouso e arejamento por algum tempo para que os princípios precipitados pelo calor sejam dissolvidos e ella readquira suas propriedades. m Muitas moléstias vão buscar na agua o seu íactor etio- logico e a epilepsia pode encontrar nella o motivo pro- vocador do accesso. MEDICINA LEGAL E TOXICOLOOIA I 0 crime é todo o acto que lesa a liberdade de pro- ceder de um indivíduo da mesma especie do autor do. acto. Àlguem junta á palavra acto o adjectivo consciente. A responsabilidade e a irresponsabilidade é, em direito, uma questão séria, que só deve ser resolvida com o auxilio do critério médico, pois somente o médico tem obrigação do conhecer profnndamente a vida nas suas minúcias mais elementares. li Diversas têm sido até hoje as opiniões relativamente á responsabilidade dos epilépticos: uns os consideram sim- plesmente responsáveis; outros, responsáveis ou meio responsáveis segundo certas circumstancias e ainda outros, inteiramente irresponsáveis. 69 III Não póde u in epiléptico ser considerado irresponsável senão em um dos casos seguintes: l.° si o acto comme- ttido se verifica por occasião de um accesso delirante; 2.° si elle está demente; 3.° si é idiota ou imbecil. Si o acto foi realisado fóra dos accessos, em um intervallo Incido, sem enfraquecimento intellectual evidente, o indi- víduo deve ser considerado responsável pelo menos attenuadamente porque se deve levar em conta a vida do seu psychismo revelado quasi sempre pelo seu caracter irritável e impulsivo. PATHOLOGIA CIRÚRGICA I Os traumatismos do craneo podem dar lugar a pheno- menos epilépticos. II Estes phenomenos ligam-se directamente ou a uma esquirola ou a um sequestro ou a um hematoma ou a quaesquer outras consequências traumaticas que possam entreter a irritação cerebral. m Para os fazer cessar é preciso intervir logo fazendo desapparecer a causa irritadora. OPERAÇÕES E APPARELHOS I A trepanação é a operação cirúrgica que consiste em perfurar o osso, tirando-lhe uma rodella por meio da corôa do trépano. 70 II Ella tem sido aconselhada para a extirpação dos tumores. m E’ uma operação que depende do serio diagnostico da existência e da localisação dos neoplasmas; grave o incerta mesmo nos seus resultados immediatos, ella torna-se, entretanto, as vezes necessária. CLINICA CIRÚRGICA (l.a cadeira) I E’ diííícilimo íazer-se o diagnostico dos tumores intra- craneanos e estabelecer a sua localisação. ii Certos signaes e os commemorativos do doente têm grande importância para o diagnostico. Dentre os signaes, avultam a cephaléa, os vomitos, as perturbações da visão e as perturbações motoras que devem ser observadas com rigoroso critério. III O conhecimento da physiologia presta immenso serviço á localisação neoplasica: é assim que pensaremos logo numa lesão do córtex, devida ao neoplasma, si houver crises epileptiformes e da parte posterior da 3.a circum- volução frontal esquerda si existir aphasia motora. 71 CLINICA CIRÚRGICA (f.a cadeira) I As variedades dos tumores intracraneanos são nume- rosas. II Os sarcomas representam uma dessas variedades. III Os neoplasmas, quando localisados no cerebro, deter- minam muitas vezes uma irritação cerebral á distancia. PATHOLOGIA MÉDICA I A tuberculose é devida ao bacillo de Koch. li Elle se pode localisar em qualquer tecido do organismo. ui No cerebro encontram-se frequentemente tubérculos dando lugar as vezes a phenomenos epileptiformes. CLINICA PROPEDÊUTICA I Antigamente o sonho era considerado como um deva- neio da alma que saía do seu envolucro para vaguear pelas regiões da phantasia ou do terror; hoje elle é inter- pretado como a expressão viva de factos puramente orgâ- nicos e tem sido collocado entre os diversos signaes semeiologicos. 72 li No alcoolismo chronico,os sonhos, que podem surgir na latencia mesmo do delirio, são, através um somno raro e agitado, frequentemente penosos: dramas horrorosos angustiam o doente, martyrios diversos o affligem e elle acorda as vezes coberto de suor sob o peso ainda forte dos seus tormentos. Neste caso se não lhes pode negar, pela frequência que se observa, o valor real de um symptoma. III O hysterico sonha abundantemente chegando mesmo a lembrança dos seus sonhosdespertar, como na epilepsia, a producção das crises. Na histeria o sonho se prolonga muitas vezes durante a vigilia influindo nos pensamentos e aclos dos histéricos; na epilepsia o indivíduo sente as vezes, sonhando, atravessar as phases do seu accesso. CLINICA MÉDICA (l.a cadeira) I A syncope é caracterisada pela pallidez da face, absten- ção do pulso, suspensão da respiração e dos movimentos voluntários. II Este estado syncopal pode ser confundido com a vertigem epiléptica. III Na syncope, porem, o conhecimento persiste, ao passo que na vertigem epiléptica este é completamente suspenso. 73 CLINICA MÉDICA (2.11 cadeira) I A uremia é um syndroma clinico revelado por um conjuncto de accidentes devidos a insufficiencia da excre- ção urinaria. II Na uremia distingue-se clinicamente diversas formas: a cerebral, a respiratória, a articular, a gastro-intestinal. iii A fórma cerebral pode differir em sua expressão symptomatica, mas os accidentes convulsivos são os que mais constantemente a caracterisam. MATÉRIA MÉDICA, PHARMACOLOGIA E ARTE DE FORMULAR I A belladona contem alcaloides dos quaes a atropina é o mais importante pelas suas propriedades narcóticas e venenosas. ii Extrae-se a atropina do sueco da belladona, tratando- se esta pelo carbonato de potássio que põe o alcaloide em liberdade, depois pelo chloroformío que o dissolve. À atropina apresenta-se sob a íorma de crystaes bran- cos e leves, sem cheiro e amargos; é solúvel em 300 partes de agua fria, 30 de agua fervendo, em 60 de ether, em 8 de álcool a 90° e 43 de glycerina. Deve ser empregada internamente na dose de meio 74 a um milligramma por dia e pode ser usada com a mor- phina que é considerada como tendo propriedades que lhe são antagónicas. m O meio mais certo de caracterisal-a é verificar a sua acçãp mydriatica: apenas uma gotta de um soluto que contenha uma dose infinitesimal de atropina basta para dilatar a pupilla. HISTORIA NATURAL MÉDICA I À belladona é uma planta da familia das solonaccas. II As folhas são grandes e ovaes, de sabor amargo e nauseante; as flores, solitárias e largamente pediculadas, apresentam uma corolla tubulosa ou campanulada de côr purpurea violacea; o fructo verde a principio, em seguida vermelho e finalmente preto quando se torna maduro; a raiz de côr parda amarellada. III Pelas suas propriedades narcóticas tem sido indicada para o tratamento de diversas moléstias entre as quaes a epilepsia. CHI MI CA médica I 0 acido carbonico e o acido láctico são compostos chimicos que fazem normalmente parte da nossa vida vegetativa. 75 ii As convulsões epilépticas dão lugar a perturbações na constituição chiinica dos musculos, tornando acida a substancia destes por um excesso de acido láctico e de acido carbonico. Hl Este trabalho de oxydação dá lugar a uma elevação de temperatura mais considerável quando se trata duma convulsão tónica do que clonica porque o trabalho mecha- nico da convulsão clonica representa uma certa quanti- dade de calor já transformado. obstetrícia I A eclampsia não é senão urna epilepsia aguda. II Os accessos eclampticos são um dos mais temíveis accidentes da gravidez porque põem em perigo não só a vida do feto como ainda a própria vida da mulher. iii A eclampsia puerperal, como todas as outras, pode se terminar pela cura, mas também pode passar ao estado chronico e se transformar em epilepsia vulgar. CLINICA OBSTÉTRICA E GYNECOLOGICA I A eclampsia apparece as vezes ao curso da gravidez ou por occasiao do parto. 76 II Quando ella se manifesta no curso da gravidez, pode-se empregar com grande vantagem os bromuretos, po- dendo-se usal-os também como preventivos quando a mulher já tem tido accessos epileptiformos em parto anterior ou mesmo quando ella tem um temperamento capaz de dar lugar por occasião do trabalho puerperal a uma hyperexcitabilidade dessa natureza. As que são reconhecidamente comiciaes, devem estar regularmente, antes do parto e até o momento deste, sujeitas â acção do bromureto. Os antispasmodicos e os anesthesicos têm sido muito empregados na eclampsia, sendo que estes com resultados relativamente bons nas mulheres com antecedentes histé- ricos. O emprego do chloroformio e do chloral tem tido algum proveito. As emissões sanguíneas têm dado pouco resultado. Logo que a albumina se manifesta, a dieta lactea é um poderoso auxiliar contra os phenomenos eclampticos. III Se os accessos apparecem por occasião do trabalho do parto, deve-se activar este, provocal-o, forçal-o até, intervindo para que o féto, ainda que morto, seja expulso, afim de terminarem taes accessos que podem as vezes continuar mesmo após o delivramento; em circumstancias outras parece que não ha grande inconveniente em adiar a intervenção. 77 A syncope é um dos accidentes dos paroxysmos eclam- pticos e a respiração artificial neste caso é um bom meio para dar tempo de terminar o parto. CLINICA PEDIÁTRICA I O diagnostico das convulsões da iníancia é extrema- mente delicado. II Elias podem estar ligadas seja á meningite, seja á presença de vermes no intestino, seja ainda a outras causas quaesquer; as vezes trata-se apenas de um accesso do mal sagrado. m As convulsões iníantis devem ser tratadas segundo a causa que lhes deu origem. CLINICA OPHTALMOLOGICA I 0 estudo do campo visual interessa tanto á neurologia como á psychiatria e á medicina. ii Os epilépticos apresentam uma diminuição concêntrica do campo visual. III Esta diminuição se encontra não só depois dos accessos como nos intervallos paroxysticos! 78 CLINICA SYPHILIGRAPHICA E DERMATOLÓGICA I Entre as doenças iníectuosas, a syphilis é talvez a que mais provoca accidentes epileptiíormes. Estes são prece- didos irequentemente por cephaléa nocturna intensa que impede o somno. O ataque convulsivo é em tudo seme- lhante ao ataque epiléptico ordinário. li E’ no 2.° e 3.° periodo da syphilis que os accidentes epileptiíormes costumam se manifestar: elles ou são devidos simplesmente á acção dos princípios fabricados pelo treponema ou aos productos de desassimilação resul- tantes da acção destes sobre os tecidos, sendo talvez melhor acreditar nestas duas acções combinadas, ou ainda a uma gomma e a uma exostose. Os accidentes epilepti- formes do 2.° periodo da syphilis são as vezes a primeira manifestação desta. m O tratamento pelo iodureto de potássio e pelas injecções intra-musculares de bi-iodureto de mercúrio têm aqui óptima applicação. Quando, porém, o tratamento especi- fico não foi feito em tempo e as lesões já se installaram permanentemente, já se tornaram cicatriciaes com persis- tência dos accessos, então o bromureto tem também neste caso benefica applicação. 79 CLINICA PSYCHIATRIOA E DE MOLÉSTIAS NERVOSAS I A histeria é considerada devida a um hypodynamismo da cellula nervosa trazendo como consequência um adorme- cimento de territórios cerebraes. Assim bem se explicarão diversos symptomas que o hysterico pode apresentar, seja uma hemiplegia, seja uma amaurose, seja ainda outro phenomeno qualquer. il Todos os phenomenos que apresenta um hysterico, quaesquer que elles sejam, pode-se produzil-os identi- camente em um indivíduo sadio por suggestão e desfa- zel-os por persuasão. Tanto esta como aquella têm grande valor no tratamento da histeria. ui Os phenomenos histéricos podem apparecer conjuncta- mente com os epilépticos em o mesmo indivíduo. Cpisio. Secretaria da Faculdade de Medicina da Baliia, em 30 de Outubro de 1909. O Secretario, l)r. Menandro dos Beis Meirelles.