Faculdade de Medicina da Bahia THESE APRESENTADA Á FAGOIDADH DE MEDICINA DA BAHIA hum :;i i>u: outubro iotg tyor» PARA SER BEFEKQIDA POR Amabilio Torres Continho NATURAL DO ESTADO DE ALAGOAS AFIM DE OBTER O GRÃO DE DOUTOR EM MEDICINA DISSERTAÇÃO CADEIRA DE THERAPEUTICA Alguns especimens da Flora Brazileira PROPOSIÇÕES TRES SOBRE CADA UMA DAS CADEIRAS DO CURSO DE'SCIENCIAS MEDICAS E CIRÚRGICAS BAHIA OFFICINAS DO «DIÁRIO DA BAHIA» 101 — PHAÇA CASTRO ALVES —101 1905 FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA DIRECTOR —Dr. Alfredo Britto VIGE-DIRECTOR —Dr. Manoel José de Araújo LENTES CATHEDRATICOS SECÇÃO MATÉRIAS Q.UE LECCIONAM Dr. J. Carneiro de Campos I .a Anatomia descriptiva Dr. Carlos Freitas 7> Anatomia medico-cirurgica Dr. Antonio Pacifico Pereira 2.a Histologia Dr. Augusto C. Vianna » Bacteriologia Dr. Guilherme Pereira Rebello Anatomia e Physiologiâ patho- logicas Dr. Manoel José de Araújo 3-a Physiologiâ Dr. |osé Eduardo E. cfe Carvalho Filho. . » Therapeutica Dr. Raymundo Nina Rodrigues 4-a Medicina legal e Toxicologia Dr. Luiz Anselmo da Fonseca » Hygiene Dr. Braz Hermenegildo do Amaral .... 5-a Pathologia cirúrgica Dr. Fortunato Augusto da Silva Júnior t . » Operações e apparelhos Dr. Antonio Pacheco Mendes » Clinica cirúrgica, i .a cadeira Dr. Ignacio Monteiro de Almeida Gouveia. . » Clinica cirúrgica, 2.a cadeira Dr. Aurélio R. Vianna 6.a Pathologia medica Dr. Alfredo Britto » Clinica Propedêutica Dr. Anisio Circundes de Carvalho .... » Clinica medica, i.a cadeira Dr. Francisco Braulio Pereira » Clinica medica, 2.a cadeira Dr. José Rodrigues da Costa Dorea . . . 7-a Historia natural medica Dr. A. Victorio de Araújo Falcão .... » Matéria medica, Pharmacolo- gia e Arte de formular Dr. José Olympio de Azevedo » Chinica medica Dr. Deocleciano Ramos 8.a Obstetricia Dr. Climerio Cardoso de Oliveira .... )> Clinica obstétrica e gynecolo- gica Dr. Frederico de Castro Rebello 9_a Clinica pediátrica Dr. Francisco dos Santos Peredra 10.a Clinica ophtalmologica Dr. Alexandre E. de Castro Cerqueira . . n.a Clinica dermathologica e sy- philigraphica Dr. J. Tillemon Fontes 12.a Clinica psvchiatrica e de molés- tias nervosas Dr. João E. de Castro Cerqueira » Em disponibilidade Dr. Sebastião Cardoso » » » LENTES SUBSTITUTOS Dr. José Affonso de Carvalho (interino). ...... i.a secção Dr. Gonçalo Moniz Sodré Aragão ' . . 2.a » Dr. Pedro Luiz Celestino 3.a » Dr. Josino Correia Cotias 4.a » Dr. Antonino Baptista dos Anjos (interino) 5.a » Dr. João Américo Garcez Fróes 6.a » Dr. Pedro da Luz Carrascosa e J. J. de Calasans 7_a » Dr. J. Adeodato de Souza 8.a » Dr. Alfredo Ferreira de Magalhães 9_a s> Dr. Clodoaldo de Andrade io.a » Dr. Carlos Ferreira Santos ii.a » Dr. Luiz Pinto de Carvalho (interino) 12.a » SECRETARIO — Dr. Menandro dos Reis Meirelles SUB-SECRETARIO — Dr. Matheus Vaz de Oliveira A Faculdade não approva nem reprova as opiniões exaradas nas theses dos seus auctores. DUAS PALAVRAS Este modesto trabalho, escripto sem constragimento, constitue o meu orgulho, por isto que rrelle vejo reprezentados unicamente os meus esforços; e considero-o como o ultimo adeus a vida nobre e altivo de estudante. Quem o ler, de certo, não encontrará rasgos de um talento previ- legiado, mais cerleza terá que o seu auctor tem como Iemma provar somente a grandeza de nossa flora é superior a outra qualquer do mundo inteiro. DISSERTAÇÃO Alguns especiraens ia Flora Braziluira CAPITULO 1 HISTORICO Ubérrima e bella, cheia de mysteriosos encantos, prenhe de incalculáveis riquezas apresenta-se a Flora Brasiliense. Muitas vezes, em tempos que já se foram, na vastidão soberba e quasi impenetrável de suas mattas, achava o aborígene o abrigo os alimentos de que necessi- tava, armas para as suas luctas, e ainda os remedios que lhe curavam as feridas abertas no fragor dos combates terríveis. Rico, grandioso, verdadeiramente fértil e exhube- rante é este Brasil, colosso cheio de cicatrizes de mil luctas para a sua formação definitiva, semelhante- • mente a um guerreiro illustre, em cujo corpo se desenhassem os sulcos feitos por mil espadas em com- mettimentos grandiosos. Nas suas praias, o viandante vê a riqueza mineral re- saltar no brilho extranho de suas areias finíssimas; então, num deslumbramento, em que claro se levanta seu en- tendimento, elle procura na verde relva, que diante se es- 6 tende, uma expressão mais doce e mais suave e estende sobre grandezas ainda maiores, os olhos que lêm a gran- deza toda de sua terra. Replecto de gozar, elle ligeiro avança para a sombria e hospitaleira matta: «aqui, diz elle, este encanto se desfaz e a cubica de tanta grandeza vae morrer dentro de mim!...» Mas, oh! engano cruel!.., Elle vê novas grandezas em baixo de um como ceo estrellado de flores; e, tomado de extranha e suprema admiração bemdiz o solo em que piza, abençoando a natureza que a um tempo o formou rico e saudavel. Para fazer o historico da Flora Brasiliense seria preciso que fossemos além pelo Brasil selvagem. Naquelles tempos, quando as nãos de Portugal ainda não haviam desvirginado as aguas dos nossos mares, com os primeiros habitantes civilizados já existia a idéa da medicina, como a idéa de um medico. O Pagé aconselhava os medicamentos, preparava as bebidas deliciosas para os festins, e também, o fulmi- nante veneno que devia arrancar a vida ao guerreiro vencido. Entre as tradicções dos primitivos abori- genes existia o habito de envenenarem o seu chefe, si por accaso elle, num combate era ferido por arma inimiga. Entre os indios os pagés representavam vários papeis, entre os quaes o de medico. Envenenavam suas armas e si por ellas mesmas eram tocados, conheciam-lhes os venenos e os antidotos. E estes factos provam já a existência de uma therapeutica que progessos não teve devido aos descuidos que nós, brasileiros, temos por tudo aquillo que é nosso, para só nos dedicarmos ás importações de productos europeus, as mais das vezes falsos e, nocivos á nossa saude e ao nosso commercio. 7 Raros têm sido os médicos que têm procurado provar não precisarmos tanto, como parece, da Europa; e esses mesmos não dizem com firmeza o valor dos medicamentos extrahidos da nossa Flora, sendo que lhes occorre como um crime de lesa-sciencia o sustentar que os nossos productos são superiores aos europeus, apesar de nestes serem encontrados muitos medicamentos extrahidos de nossa Flora e que nos são remettidos com o titulo de verdadeiras novidades scientificas. A questão da preferencia pelas drogas estrangeiras não é somente devido á falta de bôa vontade nos nossos médicos para com os nossos productos e sim devida a elogios feitos aos medicamentos estrangeiros, a maior parte das vezes verdadeiras panacéas. E si, entretanto, procurássemos entre elles quantos são aquelles que gozam de nomeada, por suas antigas tradicções, encontrariamos um numero bastantemente elevado delles, de cuja efficacia existissem, apenas, reflexos, cujo palor attestasse o seu pouco valimento. No século XVI já se falava com enthusiasmo sobre os productos therapeuticos de algumas de nossas plantas; e dahi para cá tem a Flora Brasiliense entrado na medicina, embora lentamente, offerecendo optimos resultados. No século passado, anno de 1867, entraram na Expo- sição de Vienna d’Áustria productos medicinaes ex- trahidos de plantas brasileiras e foram lá bem recebidos. Entre as plantas escolhidas para extracção destes pro- ductos fez parte a Jurubeba, empregada naquelle tempo unicamente como tonico. Depois, na Exposição de Paris, de 1885, dos nossos productos de origem vegetal fizeram parte diversas plantas, todas empregadas em medicina, tendo aquelles productos sido cercados das melhores referencias; alguns dos quaes foram premiados. E conveniente declararmos 8 que muitos outros de valor medicinal superior aqui ficaram esquecidos, sendo ainda hoje conhecidos diffi- cultosamente. No ultimo anno do século XIX foi escripto pelo Sr. Dr. Rigeira Costa uma these sobre um dos especi- mens da nossa Flora e de então até hoje ninguém mais escrevera sobre tão rica e fecunda therapeutica. E, no entanto, já lá vão 6 annos e si nós brasileiros não tomarmos o encargo de, com muito trabalho embora, estudar a nossa Flora, possivel será que mais tarde tenhamos que ver o estrangeiro conhecel-a melhor do que nós. Não é sem razão que penso assim; pois isso que prescrevemos a quinina e logo, recommendamos que este seja inglês!... Donde é a quina? E do Brasil, é da America, ou da Inglaterra? E não são elles os inglezes verdadeiros usur- padores, elles que a levaram daqui e nos vendem agora como producto seu! E de quem é a culpa, sinão exclusivamente nossa, por não havermos estudado, e só depois dos estudos feitos pelos extranhos é que chegamos a saber quaes os productos medicinaes que as nossas plantas ou nossas hervas encerram ?. . . As plantas do nosso Paiz, especialmente no centro dos Estados, são empregadas a titulo de remedios caseiros, cousa que vem de longos annos até o nosso tempo. As mesinheiras, aos curandeiros deixam os médicos o cuidado de conhecer-lhes as virtudes e as vantagens. Uma ou outra personalidade scientifica é que, ás vezes, se levanta para lançar mão dessas virtudes, cuja efficacia é por vezes empregada em casos desesperados e de salvação geral. 9 Assim é que o Dr. Mello Moraes Pae, por occasião da epidemia de Zamparini, que assolara o Rio de Janeiro, lançou mão da Herva de bicho, com a qual tirou grandes resultados. A Flora Brasiliense não tem, verdadeiramente, um historico bem conhecido, pois poucas são as referencias que os scientistas lhe fazem. É unicamente rica em tradicções populares e assim é que em muitas cidades de nossos Estados só é exercida a medicina vegetal brasiliense pelos curandeiros, que lhe conhecem os segredos, guardando os verdadeiros sigillos para que certas plantas não possam ser conhe- cidas pelos homens da sciencia. Culpa bem grave cabe também aos nossos pharmaceu- ticos que não trabalham, não investigam; e, quando por ventura chegam a conhecer algumas virtudes de uma planta, exercem verdadeiro monopolio, do qual tiram pro- veitos materiaes para enriquecerem e progredirem a custa da ignorância dos que os procuram. Os proprios médicos, em taes casos, nem sempre podem fazer públicos taes segredos ou virtudes, devido ás difficuldades que encontram na occasião de apre- sental-as ás investigações'da sciencia, ficando então exclusivamente para elles, extinguindo-se seu conheci- mento com o desapparecimento do possuidor. Assim, presa entre duas muralhas: uma—a do egoismo estúpido e ignorante; outra—a dos nossos descuidos e da nossa indifferença, doentia e somnolenta, tem atraves- sado a nossa Flora séculos de silencio e de despreso. CAPITULO II Alguns Espeoimens da Flora Brasiliense. — Sua Morphologla. — Sua Situação, etc. BICHA BRAVA Família das Cucljrbitaceas. — Planta trepadeira que habita no nosso paiz. principalmente nos estados de Alagoas, Pernambuco, Ceará, Sergipe e Bahia, onde é conhecida com os nomes de Bucha Brava e Melão Bravo. Sua raiz é ramosa, fibrosa; o caule é herbáceo, guar- necido de gavinhas de comprimento variavel, de diâmetro também variavel. Quanto ás suas folhas são largamente pecioladas, cordiformes e guarnecidas de pellos na parte dorsal; suas flores são grandes, de cor amarello-clara; o fructo oval. desenvolvendo-se muito mais no sentido de seu maior diâmetro, secco, envolvido em uma unica carpella, de epicarpo verde. Este fructo, quando maduro, fica amarello-claro, transformando-se mais tarde em amarello-escuro. O mesocarpo, parte essa a mais importante do fructo, 12 conjunctamente com o endocarpo, em virtude de serem essas partes as únicas da planta dotadas.de qualidades medicinaes, são as únicas aproveitáveis em emprego therapeutico. Elle é formado de um tecido fibroso, rectiforme, que se estende até á parte interior do fructo, terminando por uma camada compacta, dando assim formação ao endo- carpo, o qual, por sua vez, fórma as paredes de tres cavidades multiloculares, cada uma das quaes contendo no seu centro uma trophosperma; é, justamente, nesses trophospermas que se contêm as sementes. São estes os principaes caracteres de uma das plantas que vamos descrever. Os logares onde florecem são húmidos e proximos ás habitações; nestes logares, pois, devemos procural-a, por isso que não medra em logares seccos. O mesmo, porém, não se observa com relação á Bucha de Caçador, que, apesar de pertencer á mesma familia, comtudo é de hábitos inteiramente contrários aos da Bucha Brava. A Bucha de Caçador é toxica e por isso mesmo não é usada em medicina, senão demandando muito cui- dado no modo de usal-a. 0 SAMBACAITÂ . > E esta uma das plantas da Flora Brasiliense, que bons resultados pode offerecer aos médicos do nosso Paiz. O Sambacaitá foi classificado pelo illustre botânico brasileiro Dr. Arruda Camara, na Familia das Labiadas, e teve o nome de Hyssopus Cryspapilla, planta que é conhecida nos centros de alguns Estados do norte do 13 Brasil com os seguintes nomes: Alfazema de Caboclo, Alfazema Brava, Neve ou Flor de Neve. Estes dous últimos nomes são os pelos quaes o Sambacaitá é conhecido no Estado da Bahia, sendo que em outros Estados o é pelos outros nomes acima men- cionados. É um arbusto esgalhado, de caule quadrado, cujas folhas são pequenas e oppostas, pouco ou quasi nada pecioladas. São folhas muito aromaticas e, por isso mesmo, foi que, primitivamente, fizeram uso delias em banhos, até que se descobriram as suas propriedades medicinaes. As flores são dispostas em espiga pyramidal, cuja cor é de um lindo roxo-violeta e, ás vezes, de um cinzento avelludado; abastecida de pevides palheosas e miudís- simas; o fructo é muito pequeno e secco. Este arbusto vegeta não só nas mattas, como nas varzeas, nos taboleiros e á beira das estradas. ALEGKIH DOS JARDINS Rosmarinus officinalis. — Linn. — Pertence á Família das Labiadas. É uma planta exótica, muito conhecida, geralmente cultivada em todos os Estados do Brasil. É um pequeno arbusto que tem, ordinariamente, no seu maior desenvolvimento, dous pés de altura, tendo o caule lenhoso e cylindrico, de folhas verdes, estreitas, um pouco compridas, duras e dotadas de um perfume delicioso; suas flores, que raramente são encontradas, têm uma cor roxo-pallida. Devido ao delicado perfume de que é dotado o alecrim dos jardins, os antigos empregavam-no nas orna- mentações dos Templos Sagrados. 14 Ainda hoje se prepara com elle uma essencia de cheiro delicado e muito activo, para cujo fabrico são preferiveis ramos floridos. E também empregado o alecrim, depois de seccos os seus ramos, para defumação de quartos e mais com- partimentos das habitações que estão empestadas de miasmas maléficos e serve, outrosim, nos defumadores domésticos. No segundo capitulo deste nosso trabalho encaral-o- hemos debaixo do ponto de vista das propriedades medicas. MlíBEIH 01! JUPEBA Solanum paniculatum — Linneo. — Pertence á Familia das Solanacects. E’ também chamada Juripeba Sua historia é de alguma forma conhecida, assim como alguma de suas propriedades medicinaes; e tanto assim é que, em 1867, entraram productos da Jurnbéba, na Exposição de Vienna d’Austria, tendo sido levados de Pernambuco, aonde ha muito desta planta, assim como em Alagoas, Sergipe, Bahia e mais alguns Estados. Um facto interessante se dá com a Jurubeba— é o seguinte: —ella apparece sempre nos logares proximos ás habitações, ou em logares, pelo menos, que já tivessem sido habitados. Isto ó sabido e tradiccional entre os sertanejos; e, nós, em Alagoas, quando via- jamos pelo centro deste Estado, é bastante encontrarmos uma Jnrubebeira para termos a certeza de que perto de nós existe ou existiu habitação. A Jurubeba é um arbusto de caule lenhoso, apre- sentando aculeos semelhantes aos da roseira; suas 15 folhas são cordiformes, tendo na nervura principal aculeos que só são encontrados na parte dorsal delias O parenchyma da folha, na sua parte central, é liso e de um verde-escuro-carregado; a sua parte dorsal é eriçado de pellos, os quaes lhe fazem tomar uma cor esbranquiçada. São folhas pecioladas. Suas flores são em cacho e de coloração azul-clara, meio pallida, sem perfume quasi nenhum, isto é, de perfume pouco pronunciado. O fructo é uma baga e se apresenta em cachos, cada um dos quaes contendo muitas d’estas mesmas bagas. E justamente o fructo que é empregado em medicina, vindo logo depois as folhas, que são empregadas exte- riormente para curar as feridas provenientes de queima- duras. O caule é apenas e unicamente empregado na fabricação de palitos. Á raiz não se lhe attribue qualidades medicamentosas, nem tão pouco industriaes. AC.4T1A Ot IIEIiYA DE BICHO Folygonum acre. —Polygonum. - anti-hemorrhoidale,— Martins Família das Polygonaceas. — Planta herbacea, cujo caule é gretado, apresentando nós com estrias vermelhas, de consistência molle, quebradiço, unico, desprovido de galhos. As folhas são estreitas e oblongas, verdes, uniformes, largamente pecioladas. Os peciolos são estriados, como o caule, de roxo. Suas flores são pequenas e vermelhas, gamopetalas, pedunculadas, sendo que o seu pendunculo é também roxo. A raiz é cabelleira, 16 Esta planta vegeta nas aguas doces ou nas suasimme- diações, e é encontrada em muitos estados, notada- mente em Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. Do acatiá, as partes usadas em medicina são aí folhas e o caule, d’onde se extrahe um sueco acre, qm é empregado com effeitos medicinaes e para mistéres industriaes, como seja no fabrico do assucar de canna. para classifical-o e dando-lhe a sua verdadeira cor; iste é, transforma o assucar vermelho ou melhor queimado, em uma cor semelhante á do pello do rato. CAPITULO III Usos em medicina popular. — Effeitos therapeuticos.— Acções physiologicas BUCHA BRAVA Tomado em dóse moderada o extracto de bucha brava, produz nas pessoas sadias uma sensação de calor e peso no estomago; sensação que, pouco tempo depois, torna- se dolorosa, desapparecendo dentro de algumas horas. Nas pessoas doentes o contrario se dá, quando se emprega o extracto da planta que agora descrevo: sen- sação de calor e peso pouco pronunciado, emquanto que o individuo accusa uma oppressão precordial, res- piração estertorosa e accelerada. Applicada em alta dóse, ella produz vomitos, dores epigastricas agudas, que, entretanto, são passageiros, desapparecendo com breve tempo. A buclia tem sido empregada no interior do nosso Paiz como hemostatico nas hemoptises tuberculosas, como emenagogo, como anti-amenorrheico e nas affeições hepaticas. Ouanto á sua dosagem, ella póde ser feita em alto gráo, pois, de modo nenhum, ella é toxica. 18 Os nossos sertanejos a emprega em infusão nas hernor- rhagias, e contra o catarrho chronico dos bronchios, obtendo sempre resultados vantajosos. Também empregam-na em fórma de pó o que con- seguem da maneira seguinte: com o mesorcapo do fructo secco, desprovido de sementes, fabricam o pó por meio da trituração. Uma vez preparado assim o pó, elles o usam nos casos de hemorrhagias, em porções equivalentes ás colheres das de chá, com espaços de tres horas de uma para outra, até passar a hemorrhagia, que, quasi sempre, obedece á primeira colherada. Ainda mais, pode-se empregar o melão bravo em fórma de extracto na dóse de 15 a 20 centigrammas num vehiculo composto d’agua e de um xarope qualquer na proporção seguinte: 15 centig. do extracto de bucha para 200 grams. do vehiculo; para ser tomada as colheres de sopa de duas em duas horas, sendo o resultado o melhor possivel nos casos de diarrhea ou desinteria, na mesma proporção, sendo, porém, diminuído o espaço entre uma colher e outra, isto é, sendo dado de 15 em 15 minutos uma colher das de sopa, obtem-se os melhores resultados nos casos de hemoptises. O xarope da bucha brava è de bom emprego nos casos de catharros chronicos dos bronchios, a formula que tenho subscripto para estes casos éa seguinte: xarope de fructo de melão bravo 200 grammas. Para tomar uma colher das de sopa de meia em meia hora. 19 0 SAMBACAITÁ Uso em medicina popular. — Eííeitos therapeuticos.— Acção physiologica As moléstias contra as quaes se têm empregado em medicina popular a alfazema brava são as seguintes: metrorhagia, suspensão das regras, pertubaçõescerebraes, congestão de qualquer orgão, cólicas uterinas ou quaes- quer manifestações graves de pertubação menstrual, além dos quaes é também empregado para facilitar o parto, para expulsão das secundinas, nas dores uterinas depois do parto, e ainda como preventivo dos incidentes que podem sobrevir depois da expulsão do feto. O sambacaitá empregado em alto dose é um toxico um pouco violento, sendo, portanto, preciso usal-o com cuidado, podendo ser empregado em tinctura, infusão, em xarope, etc. Uso interno. Dose geral—4 —gottas de tinctura do sambaicatá de mistura com 8 colheres d'agua; sendo administrada uma colherada de sopa de 2 em 2 horas é de effeito certo e quasi sempre o bastante para fazer desapparecer os incommodos de pouca gravidade pro- veniente de pertubações menstruaes ou do utero e seus an nexos. Nos casos, porém, de maior gravidade como naquelles da metrorhagia, suspensão das regras, pertubações cerebraes, ou qualquer manifestação grave de pertubação menstiual, ahi então deve-se augmentar a dosagem, o que se faz da seguinte maneira: numa colher d’agua deixa-se cahir uma gotta ou mesmo duas da tintura do sambacaitá, dando-se ao doente uma colher assim com- posta, de 10 em 10 minutos de intervallo, tendo-se, 20 porém, o cuidado de prolongar os mesmos intervallos a medida que as melhoras forem apparecendo. Uma ou duasgottasda tintura de alfazema brava em 120grams. d’agua distillada e sendo dado uma colher das de chá desta mistura facilita o parto e a expulsão das secundinas, fazendo também a mesma mistura desapparecer os antojos e as cólicas uterinas que sobievêm algumas vezes pouco depois do parto. Devendo-se nestes últimos casos augmentar os inter- vallos para de meia em hora, isto é, em vez de ser de 15 em 15 minutos. Uso interno. — E muito melhor e de effeito mais prompto o sambacaitá, do que a arnica, e é empregado nos mesmos casos que ella. A infusão n’agua fervendo, na razão de 1 a 5 °/0 das folhas, peciolos, pedúnculos é muito empregada para lavar feridas e também se emprega nas irrigações vaginaes e uterinas; nestes últimos casos é de grande utilidade se usar também a tintura da mesma planta internamente pelo espaço de 10 a 15 dias. O sueco das folhas ou estas mesmas folhas bem pisadas têm effeito prompto nos casos de golpes, con- tusões, queimaduras, darthos, e para a cauterisação das feridas vaginaes ou uterinas. O mesmo sueco tem também sido empregado em medicina popular contra as bebidas da cornea e é facto verdadeiro o já se haver curado com elle diversas pessoas. O alcoolato de sambacaitá é muitissimo proveitoso em qualquer dos casos acima referidos devendo-se eva- porar o álcool quando não convenha fazer uso delle. Emprega-se, porem, nos talhos, contusões, frieiras e queimaduras o alcoolato puro ou em solução de 50 %. Não é, no entanto, a mesma dosagem do alcoolato 21 para os caso de irrigações vaginaes e uterinas, bastando uma solução de 2 ou 3 °/0 para se obter resultado desejado. Quando se emprega nos banhos de aceio é elle um bom e poderoso fortificante do utero. Havendo neces- sidade de empregarmol-o nos casos de uma parturente, devemos então preparar uma solução fraquissima, fazendo apenas mudar ligeiramente a cor do liquido destinado ao banho com um pouco de aícoolato de sambacaitá. A Jlor de Neve cauterisa, descongestiona, absorve as humidades, age pela constricção dos vasos. ALECRIM Usos em medicina popular. — Effeitos therapeuticos.— Acção physioloyica Encarado sob o ponto de vista medicinal este vegetal possue as propriedades seguintes: excitante estromadrico, carminativo e emenagogo e é empregado; nas moléstias do apparelho respiratório, na anemia, chlorose, irregu- laridades de menstruação, nas pedras da bexiga, na opilação, bronchite aguda, etc. O Alecrim pode ser usado em dose alta; pois não possue qualidades toxicas. Nos casos de bronchites agudas se emprega-se a tintura de alecrim na formula seguinte: Tintura de alecrim 4 grammas Xarope simples 120 grammas Toma as colheres de chá de cm x/2 hora. As suas folhas postas em maceração no vinho durante 48 horas dão em resultado a formação de um excellente reconstituinte; reconstituinte este que tomado um cálice 22 em cada refeição fortifica o estomago, facilita admira- velmente a digestão, promove a menstruação e activa a secução das urinas. O chá feito com as folhas desta planta é efficaz quando empregado com o fim de combater as emoções moraes de grande pezar ou de mortificação. Prepara-se ainda com elle um importante vinho de meza que alem de ser de um paladar agradabilissimo é também optimo contra a anemia, chlorose, e moléstias do coração, convindo para este ultimo caso ser cri- teriosa e muito moderada a dosagem, pois só em pouca dose tem o alecrim propriedades calmantes; podemos empregal-o também nas hydropesias em geral. Para o tratamento de qualquer destas moléstias acima referidas é bastante que o doente use 3 cálices por dia, do vinho de alecrim. Uso externo.—Em oleo é applicada em fricções e entra nas diversas preparações pharmaceuticas, assim elle faz parte da composição do Vinagre dos sete ladrões, na agua da Rainha da Hungria, e n’agna de Colonia. As folhas do alecrim, piladas e de mistura com um pouco de alho tendo-se o cuidado de infundir em agua doce e depois levar se ao fogo até a ebulição, constitue um excellente remedio para curar a paralysia, usando-se esta mistura em fricções nas partes lesadas. A tintura feita com esta planta e preparada no álcool, presta-se além do mais para lavagens de feridas ou para fumentar as partes dolorosas, devido ao rheumatismo ou a contusões. 23 JIKIBEBA Usos em medicina popular. — Effeitos therapeuticos.— Acção physiologica. As moléstias do apparelho respiratório encontram nesta planta um valente adversário e nestes casos po- demos prescrevel-a em tintura, xarope ou mesmo como fazer em medicina vulgar, mandando o doente comer os fructos da jurubeba, de qualquer forma que se possa ou queira applicar o resultado é sempre prompto e satis- factorio. -v Na anemia, nas dispepsias, icterícia, etc., é ella também empregada e sempre tenho notado que é um excellente medicamento nestes casos. Dosagem. — Quanto a sua.dosagem não ha perigo em dar-se uma quantidade mais ou menos maior da tintura ou de qualquer outro composto da jurubeba, pois está provado que não é toxica. Alguns pharmaceuticos têm até preparado um vinho com o sueco de seus fructos, vinho este que tem sido empregado como reconstituinte e nos casos de chlorose e ictericia, sendo de notar que neste ultimo caso é elle de effeito muitissimo satisfatório, e basta que se faça reparo no doente atacado de ictericia e que se acha sob a acção da jurubeba para verivicarmos no fim de 5 ou 6 dias melhoras bem accentuadas. A tintura tem sido empregada nas affecções dos pul- mões da seguinte forma: em uma chicara de leite bota-se uma colher das de chá da referida tintura, devendo o doente fazer uso desta mistura 5 ou 6 vezes ao dia e de cada vez uma colher das de chá e uma chicara de leite, 24 Na anemia e na chlorose, pode-se mesmo mandar o doente fazer uso das fructas da nossa planta caso seja possivel encontral-as com facilidade e o doente possa supportar o amargo de que ellas são dotadas. Em caso contrario, facil será adcionar a tintura ao vinho ou qual- quer outro venhiculo. Uso externo.—Somente as folhas são empregadas externamente, e para feridas de qualquer caracter. Quanto ao seu uso externo não posso e nem devo attestar a sua efficacia, pois temos muitos outros medi- camentos que melhor podem nos levar ao resultado desejado. Acção physiologicct. — A jurnbeba no organismo só não apresenta quassi nada de notorio, no entanto pessoas ha que, tomando uma colher das de chá da tintura delia e estiver com saude, sentirá nauseas e termina vomitando, ficando por muito tempo com a sensação de calor na região epigastrica; ella faz também accelar a secução da saliva, porém é de suppor que isto seja devido ao amargo de que ella é dotada, ainda sendo a jurnbeba applicada nas pessoas doentes e mormente de anemia, ellas se queixam de fogo na cabeça e de muito calor na região toraxica. Já não se dá o mesmo com a tintura da raiz de jurnbeba que mesmo sendo dado apenas uma gramma desta tintura á um individuo são, dentro de poucos minutos elle appresentará os mesmos symptomas da embriaguez pelo álcool. A infusão destas raizes tem dado muitos bons resultados nos casos de retenção de urinas. 25 ACATIÁ OU HERVA DE BICHO Uso em medicina popular. —Effeitos therapeuticos,— Acções physiologicas Em medicina popular tem sido applicado contra as febres perniciosas em fôrma de clysteres, e tem dado sempre bom resultado; bem assim, nas congestões cerebraes O sueco extrahido desta planta ó acre, excitante geral, vermicida, antFhemorroidal, e é ainda diurético segundo a opinião do distincto facultativo Dr. José Lourenço de Castro Silva. O Açatiá é empregado em medicina popular, quer interna, quer externamente, em clyster e banhos, nos casos de gonorrhéas, retenções de urinas e ataques hemorroidaes. Diz Almeida Pinto que segundo experiencias por elle feitas, que com vantagens pode-se a empregar contra a gôtta. Internamente a Herva de Bicho pode ser applicada, demandando de cuidado, pois se bem que não seja toxica em todo caso é muito caustica e como tal não deve ser ingerida em grande porção. Nas febres palustres ella é de effeito tão prompto como o proprio quinino e talvez mesmo em alguns casos de mais vantagens O Acatiá é uma planta mais ou menos conhecida de alguns dos nossos facultativos entre os quas se encontra os seguintes: Dr. Mello Moraes, que já a empregou contra a erysipéla, em cosimento e tomado pela manhã. - Pelo Dr. Fr. Allemão Sobrinho e Dr. Adolpho de S. Freire. Capitulo iv OBSERVAÇÕES BUCHA BRAVA Em Dezembro do anno de 1904 estando na cidade de S. Miguel dos Campos tive occasião de experimentar os effeitos da Bucha Brava e com cuidado e attenção, por- quanto o doente em questão não era para mim somente um cliente (o que aliás já era bastante para merecer todo cuidado e desvellos) e sim pessoa de minha familia. O doente estava atacado de fortes hemoptises as quaes não cederam a ergotina e de momento a momento se repetiam, lembrei-me nesta occasião de applicar a Bucha Brava pois amigo meu, já havia em idênticas circum- stancias usado-a e com resultado mais que satisfactorio. Applicada que foi a primeira colherada da tinctura desta planta addcionada a 100 grammas d’agua já não se notava nos escarros expellidos pelo doente a mesma côr que dantes tinham, isto é, já não vinham com a côr vermelha rutilante e sim escuros e mais ou menos coagulados; horas depois os escarros eram mais livres dè sangue. 28 Em vista do que observei ordenei que lhe fosse admi- nistrado a seguinte formula: Tintura de Bucha Brava 20 grammas Agua distillada 200 grammas formula esta que devia ser tomada pelo doente as colheres das de chá de hora em hora, e que foi pot-mim aviada em vista de não haver nas pharmacias a tinctura da Bucha Brava, sendo de crer que só eu no logar a possuia porque neste tempo já havia pensado em escrever a minha these sobre plantas da flora brasileira. No entanto só por este caso não podia com critério e lealdade garantir as propriedades hemostaticas deste vegetal da nossa flora, porquanto havia sido applicado ao doente outros*medicamentos entre os quaes a ergotina, cujos os effeitos todos sabem nos casos desta ordem. Não tardou muito que eu não tivesse a certeza que a Bucha é de facto um remedio poderoso no caso de hemoptises, e tanto assim que dias depois 0 mesmo doente teve de soffrer um novo ataque de hemorrhagia pulmonar, valendo-se logo da Bucha e conseguio ainda desta vez bom resultado com a sua applicação. Continuando o mesmo doente todas as vezes que era ameaçado de hemoptises a fazer 0 uso deste vegetal, sendo de notar que já hoje elle não tem escarros de sangue pois segundo elle diz, todos os dias pela manhã addiciona 6 gottas da tintura de Bucha a um copo de leite, o qual é por elle ingerido de duas vezes, sendo uma pela manhã e a outra ao meio dia. Conveniente e preciso é declarar que 0 diagnostico feito pelos médicos da localidade no nosso doente foi de tuberculose. Outras occasiões tive ainda de apreciar os effeitos desta planta nos* casos de hemorrhagias e assim vou 29 descrever uma outra observação que tive occasião de fazer: No engenho Santa Ritta na cidade de S. Miguel Estado de Alagoas fui chamado para ver uma doente que havia dado á luz uma creança, e que depois do parto continuava a deitar uma quantidade de sangue mais ou menos desusada e como não houvesse medico no logar attendi ao chamado. De facto a quantidade de sangue extravasado não era commum e sim era devido a uma hemorrhagia das que lhe sobrevem em alguns casos logo após ao parto. O meu primeiro pensamento foi recahir sobre a Bucha Brava unico hemostatico que possuia na occasião e não me fiz demorar entre o pensar e a acção appliquei-o a seguinte formula: Tinctura de Bucha 10 grammas Agua distillada 6o grammas Mandei que a doente tomasse uma colher das de sopa de 5 em 5 minutos emquanto que eu fiquei observando o resultado da primeira colher pois não era justo esperar os 10 minutos que deviam decorrer entre a primeira e a ultima colher disposto a intervir de outra maneira caso o meu remedio não tivesse o effeito que eu desejava, não tive que esperar muito, pois um ou dous minutos após a applicação da primeira colherada já não havia a abundancia de sangue que tanto me empressionara; esperei o tempo marcado para a segunda colher e ainda até a terceira, retirando-me depois desta ultima pois já não havia hemorrhagia. Maceió capital do Estado de Alagoas no anno de 1904 foi victima de uma epidemia a que os médicos chamaram «epidemia de camara de sangue»; esta moléstia mani- festava-se com tal caracter e produzindo tal mortandade 30 que apezar dos esforços dos médicos de ahi só a custo foi derimida Neste tempo estando eu em Maceió fui convidado para ver um doente atacado desta moléstia. Chegando ao leito do doente encontrei-o num estado que pouco promettia, era desesperador, elle queixava-se ter tido forte diarrhea, a qual a principio era acompanhada de dores não muito fortes na região do abdómen e de fezes também mais ou menos naturaes, horas depois de ter principiado a sua moléstia as dores augmentaram e as fezes tornaram se sanguineas na occasião em que eu havia ahi chegado a quantidade de sangue que elle expeliia era bastante grande e as dores agudíssimas. Resolvi ainda desta vez empregar o melão bravo, mandei que fosse dado ao doente a seguinte formula: Tinctura de melão bravo io grammas Agua distillada 150 grammas Para tomar uma colher de sopa de 2 em 2 horas. Quando fiz applicação desta formula levava apenas 0 fito de fazer passar-a hemorrhagia e depois então de ter produzido a hemostase trataria 0 doente com os diffe- rentes desinfectantes intestinaes, 4 horas depois voltei a ver o doente 0 qual me disse se achar melhor por não ter mais as dorçs intestinaes e não ter ainda nestas 4 horas lhe apparecido a dearrhea. Estas mesmas melhoras foram-se accentuando e 24 horas depois o doente se achava bastante melhorado, não querendo eu arriscar 0 tratamento resolvi applicar Uma fórma com diversos disinfectantes, isto por não conhecer na planta que descrevo propriedades desin- fectantes; com auxilio desta fórma consegui 0 restabe- lecimento completo do doente. 31 Em Alagoas na villa do Bello Horisonte tive occasião de encontrar uma senhora de 27 annos de idade casada, de cor branca, constituição forte. Consultando-me refe- riu-se aos seus males da seguinte maneira: 4 annos havia que lhe desappareceram as regras, e ha 2 annos destes 4 ella não gosava saude. Dias havia que a cabeça lhe pesava de tal fôrma que não podia conservar-se em pé, de outras vezes appare- cia-lhe tamanha cephalalgia que a levava ao ponto de querer abandonar a casa e procurar correndo pelo campo a fóra uma melhora que de certo não encontraria, todos os mezes em tempos mais ou menos certo sentia no baixo ventre dores fortissimas. Examinei a doente e procurei tratal-a desta suspensão menstrual em vista de acreditar ser ella a causa unica desta pertubações. Dei-lhe a seguinte formula: Tinctura de Sambacaitá i gramma Agua distillada i20grammas * Para tomar 5 colheres das de chá durante o dia sendo de notar que só principiei o tratamento quando faltava apenas 3 dias para o apparecimento das cólicas utherinas que ella havia me dito de apparecerem mensalmente. Depois do uso deste medicamento a doente não sentiu no fim dos tres dias que segundo ella dizia lhe faltava para apparecerem as cólicas as dores que tanto soffrer lhe causava, continuei o tratamento durante o mez seguinte fazendo-a tomar esta mesma formula durante 3 dias seguidos e suspendendo o seu uso pelo espaço de 5 dias findo os quaes recomeçava a tomal-o pèlo espaço de outros 3 dias dias e assim seguisse a medi- cação até o fim do segundo mez e desta vez eu alcancei o resultado que esperava, as regras que ha tanto tempo 32 haviam desappàrecido reappareceram embora fracas e pouca cheio de esperança continuei o tratamento ainda durante o mez seguinte no fim do qual obtive o melhor resultado possivel. A doente não apresentava mais as pertubações que anterior mente descrevi, suas funcções menstruaes foram pouco a pouco tornando-se regulares e com ellas a saucle appareçera, PROPOSJÇOES TRES SOBRE CADA UMA DAS CADEIRAS DO CURSO DE SCIENCIAS MEDICAS E CIRÚRGICAS ANATOMIA DESCRIPTIVA I Durante a gravidez o utero se hypertrophia, tornando sua massa 24 vezes mais considerável, segundo Mekel. ii No fim da prenhez elle offerece uma extensão de 7 centimetros, uma largura de 26 e uma espessura de cerca de 2 centimetros. m Nos 5 primeiros mezes elle se dilata, ao mesmo tempo que se espessam nas paredes; nos 4 últimos, porém elle se adelgaça, á proporção que se dilata. ANATOMIA MEDICO-CIRURGICA i Duas ordens de vasos se distribuem no utero. ii As artérias uterinas que entram em sua substancia pelo lado do collo e as ovarias ou utero-ovarianas que 36 se distribuem em parte no ovário indo terminar no corpo do útero. iii Estes vasos comprimidos fóra da gestação e dobrados sobre si mesmo grande numero de vezes tomam um volume considerável durante a gravidez. HISTOLOGIA i A pelle do mamillo e aureola, é fortemente pigmen- tada durante a gravidez devido a presença de grânulos de pigmento que occupam as camadas profundas da epiderme. ii Na superfície da pelle vem se abrir tres variedades de glandulas: suporiperas, sebaceas simples e sebaceas muito volumosas, que se hypertrophiam no decurso da gravidez. iii São ellas que formam os tubérculos de Montgmery e alguns consideram-nas como glandulas accessorias. BACTERIOLOGIA i O Bacillo da tuberculose é conhecido com o nome de Bacillo de Kock. 37 II Este bacillo é sempre encontrado nos escarros dos tuberculosos pulmonar. iii Tem a forma de um bastalette quando se o vê no campo do microscopio. ANATOMIA E PHYSOLOGIA PATHOLOGIGAS i Hallier notou em 1872 a presença do Micrococcus no pús da blenorrhagia e reconheceu a sua presença possi- vel no interior dos globulos de pús. ii Neisser demonstrou a constância desta especie na blenorrhagia na ophtalmia purulenta. ni ■«* Elles coram-se com as cores de anilina e descoram sempre pelo methodo de Grani. PHYSIOLOGIA i O ponto de partida dos reflexos da expulsão do utero acha-se nelle mesmo; porém excitações muito diversas e em pontos affastados da bacia podem produzir o mesmo resultado. 38 II Schesinger excitando a extremidade central dos nervos rachidianos e a do pneumo-gastrico produziu contrações uterinas. iii O mesmo experimentador excitando o mamillo nos animaes obteve igualmente contracções uterinas, mos- trando assim a correlação que ha entre o mamillo e o utero. THERAPEUTICA i Os Saes de mercúrio são os mais poderosos antise- pticos, porém, muito toxicos. ti O bichlorureto de mercúrio é de todos elles o mais empregado como antiseptico, na proporção de 1:1000. III O sublimado na proporção indicada no licor de Van Suwiten presta bons serviços na gravidez mas deve ser empregado com cuidado por cansa de suà caustici- dade e toxicidade. MEDICINA LEGAL E TOXICOLOGIA i Nem sempre o morto por submerçao succumbe devido a não entrada do ar nos pulmões. 39 II A prompta mudança de temperatura e o choque da queda podem produzir a morte antes delle ter precisão de respirar. m Assim como uma lesão cardiaca, que devido ao susto o pode matar promptamente. HYGIENE i A analyse bacteriológica da agua tem hoje muita importância para o reconhecimento dos micro-organis- mos que ella contem e a que deve sua insalubridade. ii Ella comprehende duas ordens de operações de um interesse bem differente sob o ponto de vista hygienico. III Uma consiste na determinação da riqueza em micro- organismos sem preoccupar-se com sua natureza eacção, a outra na pesquiza de um germen dado que se desconfia sua presença na agua. PATHOLOGIA CIRÚRGICA i A metrite aguda é descripta também com os nomes de metrite interna aguda, endometrite aguda e catharro uterino agudo. 40 II Tem-se attribuido a sua origem diversas causas, porém a verdadeira deve ser procurada na penetração dos ele- mentos sépticos na superfície e espessura da mucosa uterina. m São verdadeiras causas de metrite aguda ou sub-aguda a infecção séptica depois do parto ou aborto, a propaga- ção da viginite blenorrhagica ao collo e corpo do utero, as masturbações. OPERAÇÕES E APPARELHOS i As operações de mutilação fetal tem por fim a reducção da cabeça foetal ou a secção de uma parte. ii A reducção se obtem pela craneotomia ou pela cepha- lotripsia sendo esta a preferivel por ser mais completa. m A secção como o nome indica, é operação que tem por fim seccionar-se uma parte foetal, ou embriotomia. CLINICA CIRÚRGICA (lA CADEIRA) i Pubiotomia é a operçaão que consiste na secção da articulação pubiana ou dos ramos osseos que concorrem para sua formação. 41 II Ella tem por fim augmentar os diâmetros da bacia para permittir ou facilitar o parto nos casos de stenose pelviana» m Foi preconisada por Sigault em 1768 e praticada pela primeira vez com successo por Simple em 1777. CLÍNICA CIRÚRGICA (2a CADEIRA) i As vegetações da vulva devem ser destruídas em sua base de implantação, devido á grande facilidade que tem de se reproduzir. ii Quando são volumosas e extensas, a ablação deve ser praticada com a coreta cortante e a superfície sangrenta tocada com o pechlorureto de ferro ou thermo-cauterio. m Elias só devem ser tratadas durante a gravidez, quando determinam phenomenos geraes ou dolorosos e ainda quando podem trazer um obstáculo ao parto. PATHOLOGIA MEDICA i A gravidez no curso de uma diabetes activa esta moléstia e a quantidade de assucar, pode duplicar no 6.° mez de gravidez. 42 II A diabetes da gravidez é terrível para o producto da concepção não só antes do termo, como no fim do 9.° mez que neste caso tem uma mortalidade de 50 % quer durante, quer algumas horas ou dias depois do parto. iii A mortalidade no parto das mulheres diabéticas, tem uma porcentagem de 30 a 40 quer em coma quer em accidentes uterinos. CLINICA PROPEDÊUTICA i Frequentemente observa-se, o pulso raro, no estado puerperal. ii Tem-se attribuido a acção reflexa produzida sobre a superfície da madre em involução. iii Olshausen tem tendências a explicar o facto pela lipemia a que estão sujeitas as mulheres gravidas. CLINICA MEDICA (1A CADEIRA) i Olivier foi o primeiro a mostrar que na gravidez pode ser a occasião de manifestar-se endocardite. 43 II As mais das yezes a gravidez é uma causa de aggra- vação de cardio-palhias preexistentes, pela surmenagem que este estado impõe ao myocardio ja alterado. m A syncope cardiaca, a assystolia aguda, quer durante quer post-partum, são as terminações fataes entreos phenomenos gravido-cardiacos. CLINICA MEDICA (2.a Cadeira) • i A influencia da gravidez sobre a tuberculose é desas- trosa. ii Durante a gravidez a tuberculosa pode succumbir por esgotamento ou em seguida por hemoptyses fulmi- nan tes. m Si ella chega a termo, frequentemente morre depois; si sobre-vive, seu estado aggrava-se, de modo que cada gravidez é um passo para a morte. HISTORIA NATURAL MEDICA i O ovo da mulher pode servir como typo para o estudo de um ovo tão simples quanto possivel. 44 II Elle se apresenta por uma cellula espherica tendo mais ou menos dous décimos de millimetro com um protoplasma o vitellus. iii Contem um núcleo espherico chamado vesiculagermi- nativa e um nucleolo, mancha germinativa. MATÉRIA MEDICA PHARMACOLOGIA E ARTE DE FORMULAR i As formulas pharmaceuticas empregadas no tracta- mento local das muccosas são as injecções, as pomadas, os suppositorios, crayons, etc. ii As injecções vaginaes tem uma composição variavel: podem ter por base antisepticos, plantas medicinaes, etc. iii São as injecções antisepticas, aquellas de que se faz uso no percuso da gravidez. CHIMICA MEDICA i O ar que nos cerca é uma mistura e não uma com- binação. 45 II São muitos os corpos simples que entram nesta mistura. ni O oxygeneo representa papel importante na respiração animal e vegetal. OBSTÉTRICA i O toque obstétrico por excellencia é o toque vaginal. u Por elle se reconhece a situação, a forma, a longitude, a consistência, e o estado do orifício do collo uterino. m Suas modificações são mais accentuadas e precoces nas multiparas do que nas primiparas. CLINICA OBSTÉTRICA E GYNECOLOGIA i O parto é a expulsão do producto da concepção do organismo materno. ii Os phenomenos phj/siologicos exclusivamente mater- nos tem por origem a presonça no utero de conteúdo que tem por fim a expulsão, 46 III Os phenomenos mecânicos acham-se ligados inteira- mente á forma e a situação da apresentação, sendo aqui o principal agente o foeto. CLINICA PEDIÁTRICA i A icterícia dos rescem-nascidos é algumas vezes espo- rádica pode ser causada por um vicio de conformação das vias biliares ou por uma alteração syphilitica do fígado. ii Quando ella é infecciosa grave e então ha febre, diarrhéa e vomitos. ui Quando ella é infecciosa isola-se as creanças, des- infectando cuidadosamente as roupas servidas. CLINICA OPHTALMOLOGICA i A maior parte das cegueiras ditas congénitas são á dividas á ophtalmia dos recemnascidos. ii A causa da ophtalmia purulenta é o contagio quer de outras crianças, quer de uma inoculação de pus proveniente de uma ferida infecciosa. 47 III Na immensa maioria dos casos ella é devido a con- taminações da criança na occasião da passagem pelas vias genitaes infectadas pelo microbio de Neisser. CLINICA DERMATHOLOGICA E SYPHI- LIGRAPHICA i Si a mulher gravida é uma syphilitica, é necessi- dade o tratamento especifico. n Durante o parto, si a mulher está em estado de accidentes secundários, os cuidados devem ser parti- culares para evitar-se a inoculação. iii Depois do parto, a opinião geral é que ella deve amamentar a par de um tratamento especifico. CHIMICA PSYCHIATRICA E DE MOLÉSTIAS NERVOSAS i A forma mórbida que toma a loucura na gravidez, é ordinariamente melancólica: raramente a mania. 48 II A alienação mental, muito rara, que se declara nos primeiros mezes da gravidez, é geralamente de curta duração e de prognostico favoravel. m A loucura dos últimos mezes porém não dessap- parece com o parto e algumas vezes transforma-se depois delle em mania, tendo reincidências frequentes nas gravidezes seguintes. Visto. Secretaria da Faculdade de Medicina da Bahia, 31 de Outubro de 1905. 0 Secretario, Dr. Menandro dos Reis Meirelles.