8878 Secção medica. Diagnostico differencial entre as moléstias cutâneas de origem syphilitica e não syphilitica SfcCÇÃO accessoria.— Flor Secção ciruroica. — Ligadura da carótida primitiva. Secçâo medica. — As boubas, sua origem e seu tratamento A THESE APRESENTADA FACULDADE Dl 1IDICIA DO 1110 Dl JANEIRO FM 14 riE AGOSTO DE fl§3;i E PFÜANTE 1CLLA SI ISTKNTADA Era 14 de Dezembro ti o mesmo anuo (sendo anui ovaria com riistinccjk)) POlí S Irancisco Sifuiaud tle Jtfmeula ímiutlíío DOUTOR EM MEDICINA PELA MESMA FACULDADE ^- natural +^>4C>- KIO DE JANEIRO TYPOüRAPHIA UNIVERSAL DE E. cfe H. LAEMMERT 71, Rua dos Inválidos, 71 lS7f) mitix roít Conselheiro Dr. Visconde de Santa Izabel. vice-rtrector Conselheiro Dr. Barão de Theresopolis. SECRETARIO Dr. Carlos Ferreira de Souza Fernandes. LENTES CATIIEI>KATICOS Doutorei! PRIMEIRO \\\D F. J. do Canto e Mello Castro Mascarenhas.(!a cadeira). Physica em geral, e particularmente em suas appli- Manoel Maria de MoraeseValle. . . .(2a » ). Joaquim Monteiro Caminhoá Domingos José Freire Júnior Francisco Pinheiro Guimarães Francisco Pinheiro Guimarães . . Conselheiro Antônio Teixeira da Rocha Francisco de Menezes Dias da Cruz . cações á Medicina .(2a » ). Chimica e Mineralogirt. .(3a » ). Anatomia descriptiva. SE(,ll\I)(l 1WO .(Ia cadeira). Botânica e Zoologia. .(2a » }. Chimica orgânica. .(3a » ). Physiologia. .(4a » ). Anatomia descriptiva. TERCEIRO AVVO .(1" cadeira). Physiologia. .'v2a » ). Anatomia geral e pathologica. .(3a » ). Pathologia geral. QUARTO AX1MO Antônio Ferreira França......(Ia cadeira). Pathologia externa João Damasceno Peçanha da Silva. . .(2a » ). Pathologia interna Luiz da Cunh* Feijó Júnior.....(3a » ). Partos, moléstias'de mulheres pejadas e paridas \r- . n j-j t- • i r, . • e f'° recém-nascidos. Vicente Cândido F.gueira de Saboia . .(4a » ). Clinica externa (3o e 4» anno). QUI\ TO AMVO João Damasceno Peçanha da Silva . . .(1» cadeira). Pathologia interna hrancisco Praxedes de Andrade Pertence.(2a » ). Analomia topographica, medicina opera-oria e ... • r, j • i.i apparelhos. Alb.no Rodrigues de Alvarenga . . . . (3. » ). Matéria medica e therapeutica. SEXTO AXJVO pn^p^r^ ^^iít-y-í-. fe^iada M"Jicina- Vicente Cândido Figueira deSaboia. .(4a » ). Clinica interna (5o e 6o anno). ). Clinica interna. João Vicente Torres-Homem JExaminador). (4" L.ENTES SUBSTITUTOS Agostinho José de Souza Lima (Eiaminador). . 1 BenjaminFranklin Ramiz Galvão . ... '/ João Joaquim Pizarro ... " ' ç„„. 1 o ■ João Martins Teixeira . ....'..'* " 1 Ç Scienc.as Accessorias. Augusto Ferreira dos Santos .*.!."]"' 1 Luiz Pientzenauer......[ ' ' \ Cláudio Velho da Motta Maia. '.'.'" '/ José Pereira Guimarães. . . ' "(.e„„„- a o- „. Pedro Affonso de Carvalho Franco '.*.'" " ( Ç ' ?c,enL,as Cirúrgicas. Antônio Caetano de Almeida (Examinada) ', ' \ José Joaquim da Silva .... João José da Silva . . JoãoBaptistaKossuth Vinelli '(Examinado^ \ . \ Secção de Sciencias Médicas /V.B. A Faculdade níu approvanem reprova as opiniões emittidas nas TheseT^uTíhTTà^.pTe^i. 5145 74 9ÊÊS*MmmmÊMMmsWÈWÊMKÊ^ÊStwimÊmmmÊMWÊWÈWÊWÊwm Á MEMÓRIA m: MEU SEMPRE CHORADO E DESDITOSO PAI A vossa lembrança nunca se apagará do espirito de vosso filho, que tanto vos mereceu e pani quem a vossa perda foi tão dolorosa; ella será sempre recordada com profunda veneração e pungente saudade. Intercedei junto ao Altíssimo, agora, que gloriosamente se acha terminada a ingente luta de honra em que vosso filho se havia empenhado, para que o caminho por elle trilhado seja sempre o da honestidade, dever e probidade. à MINHA CARINHOSA MAl, Á MINHA IDOLATRADA ESPOSA Recebei esta pequena prova do muito amor que vos consagro. É pouco, mas tem grande significação : indica o termo de longos e insanos labores, é o resultado de muito esforço de muita vigília, de muita perseverança. I 1IEÍS PROTECTORES E SEGMOS MIS VIGÁRIO, ANTÔNIO SANCHES DE LEMOS MAJOR, FRANCISCO DE PAIVA BUENO TENENTE-CORONEL, JOSÉ ANTÔNIO DE LEMOS Foião os vossos bons conselhos, os vossos bons exemplos, e mais que tudo a vossa nunca desmentida e sempre comprova-la bondade para commigo, que me íizerão homem ; a vós devo o que hoje sou, a posição que occupo na sociedade. Aceitai, pois, esta prova, exi^ua embora do meu coração agradecido, do meu eterno reconhscimento. AOS MEUS MUITO ESTIMADOS E QUERIDOS IRMÃOS JOSÉ CLARO DE ALMEIDA BRANDÃO UMBELIVA SANCHES DE ALMEIDA E MELLO RITA CLARA DE ALM IDA TAVARES BEATRIZ CONSTANÇA DE ALMEIDA MUMZ THEODORO A. DE ALMEIDA BRANDÃO MARIA ISABEL DE ALMEIDA BRANDÃO FELISBERTO CAND DO DE ALMEIDA BRANDÃO JOSÉ CLARO DE ALMEIDA RAMOS BRANDÃO O vosso socego, o vosso bem-estar, a voss i felicidade, serão sempre para mim objeotos muita solicitude. Segui sempre o caminho da honra e do dever, e contai sempre com vosso irmão. AOS MEUS (BRADOS, COMPADRES E AMIGOS JOÃO LINO DE MELLO POSSIDONIO TAVARES PAES E Á MIMA ESTIMADA CU11DA E COMADRE D. ANNA JUST1NA DE MELLO BRANDÃO Coutai sempre com a minha amizade. ÁS mm ROAS E MUITO ESTIMADAS TIAS D. FRANCISCA SANCHES DE PAIVA D. URSÜLINA SANCHES DE LEMOS D. RITA SANCHES DE LEMOS D. ANNA JOAQUINA DE ALMEIDA E SILVA D. ANNA BARBARA DE GOUVÉA E A MINHA RESPEITÁVEL AVÓ D. FRANCISCA SANCHES DE LEMOS Muita <;iati<1fK>, amizade c respeito JOSÉ PORPHIRIO BUENO BRANDÃO JOAQUIM HONORATO D 3 ALMEIDA MODESTO ANTÔNIO DE ALMEIDA JOÃO ROBERTO SANCHES DE LEMOS SABINO SANCHES DE LEMOS ruva do muito apreço e amizade. A meus afilhadinhos AMBROSIA, JOÃO LINO E IOSE CLARO Amizade. 4 meu primo e particular amig » DR. JOSÉ BELISAITO DE LEMOS CORDEIRO Amizade fraternal. Aos meus primos-irmãns, muito amigos TENi NfE FRANCISCO AUGUSTO DE PAIVA BUEXO BRANDÃO MARTINIANO DE PAULA BRANDÃO DR. PEDRO SANCHES DE LEMOS CHRISTIANO AUGUSTO DE PAIVA BUÈNO OCTAVIO CÂNDIDO CASTELLO BRANCO JÚLIO SANCHES DE PAIVA BiANDÃO Eterna amizacte. A meu padrinho e particular amigo FRANCISCO DE A^SIS PINTO E ás minhas estimadas madrinhas D. MARIA LUIZA DE OLIVEIRA (SINHà ) D. JOSEPHA LEONEL DE AZEVEDO D. FRANCISCA DE PAIVA BUENO Muita estima e consideração. \ meus parentes c amigos TENENTE-CORONEL MARTINIANO DA SILVA REYS BRANDÃO DR. CLEOPHANO PITAGUARY DE AUAUJO DR. JOÃO CARLOS TEIXEIRA BRANDÃO DR. JOAQUIM LOBO LEITE PEREIRA DR. JÚLIO CÉSAR FERREIRA BRANDÃO DR. AMÉRICO LOBO LEITE PEREIRA DR. FRANCISCO LOBO LEITE PEREIRA DR. FERNANDO LOBO LEITE PEREIRA JOÃO DE LEMOS PINHEIRO RODRIGO DE LEMOS PINHEIRO EZEQUIEL MANOEL DE ARAÚJO CAPITÃO JOAQUIM PEDRO DE ALCÂNTARA JOAQUIM PEDRO DE ALCÂNTARA JÚNIOR DR. JOSÉ ANTÔNIO DE FREITAS LISBOA JOSÉ MARIA LOUREIRO LUIZ EMÍLIO DE SIQUEIRA BARBEDO JOSÉ RUY POSSOLLO JOSÉ RIBEIRO DE MIRANDA LUIZ ALVES DE LEMOS LÚCIO ANTÔNIO DE LEMOS FERNANDO ANTÔNIO DE LEMOS JÚNIOR POSSIDONIO DE PAIVA BUENO E SILVA DR. EVARISTO XAVIER DA VEIGA TENENTE CORONEL AURELIANO B. PINTO DE ALMEIDA LUIZ AMERICANO PINTO DE ALMEIDA DR. AFEONSO DA SILVA BRANDÃO E á minha e-timada parenta D. ANNA DE LEMOS ALMEIDA Prova de muita consideração e amizade. Ao meu particular amigo Dr AUGUSTO AMÉRICO DE FARIA ROCHA E Á SUA EXMA. ESPOSA D. ENGRACINHA Gratidão e muita amizade Aos meus primeiros mestres PÈRE CHARLES MARIE TERRIER CONEGO FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES JOSÉ GUILHERME CHRISTIANO JOÃO CARLOS SMITH ANTÔNIO NUNES BRIGAGÃO Exigua provado muito reconhecimento que vos devo. Aos meus antigos collegas e amigos Dr. ACACIO POLYCARPO FIGUEIRA DE AGUIAR Dr. PORFIRIO ABDAJERO FIGUEIRA DE AGUIAR Dr. ALBERTO SALADINO FIGUEIRA DE AGUIAR Dr. SAMUEL SEVERIANO FIGUEIRA DE AGUIAR Du. ANTÔNIO PEREIRA DA SILVA BARROS Dn. JERONYMO FRANCISCO RIBEIRO Dr. BENEDICTO CORDEIRO DOS CAMPOS VALLADARES ANTÔNIO LIBANIO GOMES TEIXEIRA FELICIANO GOMES TEIXEIRA JOAQUIM LIBANIO GOMES TEIXEIRA BELISARIO HENRIQUE DE ARAÚJO CINTRA JOÃO PEDRO XAVIER DA VEIGA CASSIANO PEREIRA DE ARAÚJO Saudade Aos meus prezados atrigos c da minha família Dr. PAULINO CORRÊA V1DIGAL Dr. FRANCISCO MOREIRA DA ROCHA Dr. AUGUSTO CÉSAR DE MIRANDA AZEVEDO Dr. THEOPHILO CARLOS BENEDICTO OTTONI VIGÁRIO CAMILLO JOSÉ DE FARIA DOMINGOS CÂNDIDO CORRÊA DE ALMEIDA FERNANDO ANTÔNIO DE MELLO MANOEL PINTO DE MELLO MAJOR JOSÉ DIAS DELGADO DE CARVALHO TENENTE CORONEL BENTO GOMES DE ESCOBAR TENENTE CORONEL EDUARDO TAVARES PAES Dr. ILDEFONSO DE ASSIS PINTO VIGÁRIO FIGUEIREDO CARAMURU D ií. FRANCISCO THEODORO FRANCA CAPITÃO CYRINO MARQUES TEIXEÍRA MAJOR MESSIAS JOSÉ TEIXEIRA Dr. EDUARDO ANTÔNIO DE BARROS Dr. NICOLÀO ANTÔNIO DE BARROS TENENTE CORONEL FRANrlSGO IGNA 10 DE ALVARENGA Dr. MANOEL D'ALMEIDA CABRAL LEITE Dr. GABRIEL PIO DA SILVA VIGÁRIO JOÃO MARTINS DE BRITO VIGÁRIO J. A. SARAIVA ANTÔNIO DA COSTA RIOS FRANCISCO ANTÔNIO ROMANO Dr PAULINO CYRILLO LEÃO DA SILVEIRA ANTÔNIO GOMES DE ESCOBAR JOSÉ EVAR1ST0 TAVARES PAES RODRIGO PEREIRA DE CASTRO Dr. LUIZ PEDRO DRAGO Lembrança e amizade Aos meus mestres, particularmente aos Srs. Doutores : FRANCISCO DE MENEZES DIAS DA CRUZ ALBINO RODRIGUES DE ALVARENGA KZEQUTEL CORRÊA DOS SANTOS FRANCISCO PRAXEDES DE ANDRADE PERTENlE VICENTE CÂNDIDO FIGUEIRA DE SABOlA CLÁUDIO VELHO DA MOTTA MAIA LUIZ DA CUNHA FEI.IO- FILHO ANTÔNIO CORRÊA DE SOUZA COSTA JOÃO VICENTE TORRES HOMEM ANTÔNIO CAETANO DF ALMEIDA JOÃO .IOAQUTM PIZARRO Reconhecimento. Aos meus eollegas, particularmente aos Srs. Doutures : ANTÔNIO TEIXEIRA DE SOUZA MAGALHÃES ARTHUR JERONYAJO DE SOUZA AZEVEDO JACINTHO JOSÉ DE CARVALHO ALFREDO CARNEIRO RIBEIRO DA LUZ ANTÔNIO VIEIRA DE REZENDE DOMICIANO DA COSTA MOREIRA JÚNIOR CARLOS DIAS DELGADO DE CARVALHO NUNO FERREIRA DE ANDRADE DOMINGOS DE ALMEIDA MARTINS C( >STA MANOEL RODRIGUES DE CARVALHO MANOEL TEIXEIRA MACIEL JÚNIOR MANOEL LUIZ VIEIRA JOAQUIM GONÇALVES RAMOS FILHO FRANCISCO DE PAULA FERREIRA VELLOSO CÂNDIDO BRASILIO DE ARAÚJO CONSTANTINO MACHADO COELHO JOSÉ JERONYMO DE AZEVEDO LIMA CARLOS BARBOSA GONÇALVES ALBERTO LEITE RIBEIRO CORNELIO PEREIRA DE MAGALHÃES FRANCISCO DE MENEZES DIAS DA CRUZ JÚNIOR EMÍLIO ARTHUR RIBEIRO DA FONSECA HENRIQUE DE ALMEIDA REGADAS JÚNIOR JOÃO HENRIQUE BRAUNE JOSÉ BORGES RIBEIRO DA COSTA ANTÔNIO LUIZ MONTEIRO DA SILVEIRA JOSÉ CÂNDIDO DA COSTA SENA JOSÉ DA CUNHA FERREIRA JÚNIOR CHRISTIANO ALVES DE ARAÚJO ROÇAS SATURNINO SIMPLICIO DE SALLES VEIGA LYCURGO DE CASTRO SANTOS JOSÉ LUIZ ALVES DE 4.RAUJO DIAS JOAQUIM SOARES PEREIRA DE FREITAS JÚLIO VAHIA DE OLIVEIRA DURÃO CONSTANTE DA SILVA JARDIM Felicidade. A FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO BMragffirars^^ A MEMÓRIA JOÃO AHTOUIO DE ALMEIDA (9IH9A) E JOAQUIM LEONEL DE AZEVEDO A MEMÓRIA DE MEÜ CUNHADO JTTSTXlTXAlfO ATTG-TJSTO 1OT1TXZ E DE MEU TIO HYGINO IGNAGIO BRANDÃO Uma lagrima de saudade. A MEMÓRIA DO GRANDE E SEMPRE LEMBRADO PATRIOTA MINEIRO T. OTTOITI Admiração. Á MEMÓRIA DE MEU MESTRE E COMPROlfUNAHO à memória fle meus iesiitosos colleps e amips ALBERTO DIAS FERRAZ DA LUZ FIRMINO EUSEBIO DE SÁ JOÃO JSAXIIWIANO COITIMIO AIMORÉ JOAQUIM RODRIGUES PEREIRA MILAGRES Avelino Pereira de Freitas A jornada era longa..... não vos foi dado chegar ao termo. 2978 INTRODUCCÃO » Quand on debute dans 1'étude dcs maladies de Ia peau, on est frappé tout d'abord du grand nombre de ees affections et de leurs variétés infinies. (Hardy.—Maladies dartreuses.) Não tanto pela indeclinável necessidade de satisfazer ás terminantes prescripções da lei, como pelo ardente desejo de reunir um exiguo cabedal scientifico sobre dermatologia, escolhemos, para a dissertação da nossa these inaugural, o ponto cujo enunciado adiante se lê. Não nos dissimulamos as difficuldades com que tinham os de nos ver a braços, sabíamos que arrojado era o nosso empenho: tratar, embora de uma maneira succinta e summaria, das variadas ma- nifestações da syphilis sobre a membrana tegumentaria externa, assim como das innumeraveis affecções cutâneas não especificas que com ellas podem offerecer analogias, procurando extremar claramente umas de outras, quando as opiniões sobre todos esses pontos são as mais contradictorias, as mais divergentes, de modo que em geral pôde dizer-se que em dermatologia cada autor é representante de uma doutrina, ê chefe de uma escola, e quando é verdade que infelizmente no nosso paiz ainda não existem, para o estudo das moléstias cutâneas, serviços regularisados, enfermarias especiaes, onde nos seja permittido observar a theoria de mãos dadas com a sua irmã gêmea, a pratica : eis por sem duvida uma tarefa árdua e espi- nhosa, digna por certo de melhor empreiteiro, e que nos impuzemos somente por considerar que nzada era a occasião de adquirirmos 3 1 — 2 — uma somma, pequena embora, de conhecimentos sobre as infinitas affecções da pelle, tão importantes e tão communs no nosso paiz. A nossa escolha foi, pois, antes filha de uma vontade reflectida do que de uma inspiração de momento. Justificada a escolha, exporemos brevemente o plano adoptado. Dividimos a nossa dissertação em três partes, tratando na primeira das moléstias cutâneas de origem syphilitica, na segunda das mo- léstias cutâneas de origem não syphilitica, e na terceira do diagnostico differencial entre umas e outras. Como se vê, estas três partes da dissertação constituem um verdadeiro syllogismo, cujas premissas são representadas pelas duas primeiras partes e cuja conclusão é* representada pela terceira. Foi esse o pensamento fundamental que nos guiou na elaboração do nosso imperfeito trabalho. Terminamos formulan do proposições sobre matérias das cadeiras de botânica, de operações e de pathologia interna. Esforçámos-nos sobretudo para que houvesse methodo na divisão das matérias e clareza na exposição. Se o conseguimos ou não, os leitores o dirão. DISSERTAÇÃO DIAGNOSTICO DIFFERENCIAL ENTRE AS MOLÉSTIAS CUTÂNEAS DE ORIGEM SYPHILITICA E NÃO SYPHILITICA. ( CADEIRA DE PATHOLOGIA INTERNA. PRIMEIRA PARTE Das moléstias cutâneas de origem syphilitica. As múltiplas e variadas manifestações da syphilis sobre a mem- brana tegumentaria externa, são modernamente conhecidas pela denominação de — syphüides, palavra introduzida na sciencia por Alibert e geralmente aceita pelos práticos. Dividiremos o estudo das syphilides em dons capitulos: no primeiro tractaremos destas erupções cutâneas, considerando-as sob o ponto de vista da sua generalidade; no segundo, nos occuparemos de cada espécie de syphilide em particular. 7681 __ 4 - CAPITULO I. Das syphilides em geral. ARTIGO I. Esboço histórico, definição e synonymia. Não nos parece fundada a opinião daquelles que admittem que a syphilis tenha sempre existido de toda a antigüidade, desde tempos immemoriaes; pensamos, ao contrario, que ella é de data moderna, só fez o seu apparecimento na Europa no XV século. Não entraremos aqui na apreciação dos argumentos d'aquelles que sustentam a opinião da antigüidade de origem, opinião que não resiste a uma critica severa; isso seria longo, fastidioso e inútil ao fim deste trabalho; apresentaremos succintamente as principaes razões que pesam sobre o nosso espirito, fazendo-o pender para a opinião contraria, a da origem moderna. Para as pessoas alheias á medicina, e mesmo para muitos autores^ todos os accidentes mórbidos, resultantes de actos venereos, devem ser referidos á syphilis; para elles venereo é synonymo de syphilitico. E por fazer esta confusão entre os accidentes venereos e syphili- ticos, que regeitão a opinião daquelles que fazem datar a syphilis dos fins do XV século; como encontraram, nos autores antigos, a descrip- ção das ulceras venereas e da blennorrhagia, concluiram que a syphilis tinha sempre existido. Entretanto, não attendem a que nenhum autor mostrou que esses — 5 — accidentes, venereos, podessem infeccionar a economia, produzindo accidentes constitucionaes. Ao contrario, os autores que primeiro escreveram sobre a syphilis no começo do XVI século, cons derarani esta moléstia como inteira- mente nova. listes mesmos autores tinham feito a distincção entre os accidentes venereos e syphiliticos, não considerando a blennorrhagia e a ulcera contagiosa dos órgãos genitaes como dependentes de syphilis. Foi só de 1508 a 1551 que começou a confusão entre os accidentes venereos e syphiliticos, considerando-se como syphilitico todo o acci- dente mórbido que fosse o resultado de actos venereos; ficando assim o cancro simples e a blennorrhagia considerados como manifestações dependentes da syphilis. Hoje, á vista dos trabalhos aturados e conscieneiosos a que se têm entregado numerosos autores de incontestável e incontestado mereci- mento ; á vista das experiências numerosas e variadas, das observa- ções consoantes e criteriosas que modernamente tem sido feitas, não ê possivel que haja mais semelhante confusão: o edifício da syphilo- graphia moderna está sobre bases tão sólidas que é* impossivel ser alluido (Dr. Saboia). Assim, pois, para nós a syphilis só appareceu na Europa nos fins do XV século. Com quanto, entretanto, a syphilis fosse conhecida desde os fins do XV século, todavia decorreu-se muito tempo, sem que nenhum trabalho fosse emprehendido sobre as manifestações cutâneas cVessa moléstia. Willan e Bateman, ligan do demasiada importância á lesão ele- mentar, descreveram as syphilides conjunctamente com as outras moléstias cutâneas, não formando para ellas uma classe particular. O primeiro trabalho que appareceu sobre as manifestações cutâneas da syphilis é devido a Trappe, antigo interno dos hospitaes, trabalho que appareceu no anno Xda Republica Franceza. Outros trabalhos appareceram sobre essas manifestações, mere- cendo menção o de Lagneau, o de Cullerier o Antigo, e o de Alibert. Todos estes trabalhos, se bem que incompletos, não deixaram de trazer alguma ordem no estudo das manifestações cutâneas da syphilis, as quaes foram designadas por Alibert pela denominação de syphili- des, expressão hoje sanccionada pela linguagem medica. O verdadeiro progresso, entretanto, no estudo das manifestações cutâneas da syphilis data incontestavelmente de Biett, espirito emi- nentemente observador, medico no hospital S. Luiz ao mesmo tempo que Alibert. Aceitando a denominação syphilides, creada por seu collega, Biett dividio-as em exanthematicas, vesicidosas, bôlhosas, papulosas, escamo- sas, pustulosas e tuberculosas, attendendo para isso, segundo omethodo de Willan, ás lesões elementares. Elle deu uma descripção perfeita dos caracteres geraes das syphilides, e traçou com mão de mestre o diagnostico das differentes espécies. Este illustre medico elevou o estudo das manifestações cutâneas da syphilis a tal ponto, que pouca cousa tem sido ajuntada aos seus trabalhos. Algumas addições, entretanto, têm sido feitas por seus discipulos Cazenave, Legendre, Bassereau, pelos médicos de Lyon, Diday e Rollet, e mais modernamente algumas modificações têm sido feitas, sobretudo em relação á classificação, pelos distinctos dermatologistas Hardy e Bazin. Hoje, graças a estes numerosos trabalhos, o estudo das syphilides é um dos mais adiantados da dermatologia, e todos os médicos as con- sideram como as moléstias cutâneas mais bem conhecidas, relati- vamente ao prognostico e ao tratamento. Dissemos que a Alibert reverte o mérito de ter inventado e introdu- zido na sciencia a expressão syphilides para designar as dermatoses aue se desenvolvem sob a influencia da syphilis. Antes de Alibert,todas as erupções especificas eram designadas pela expressão genérica de pústulas. A creação da palavra syphilides teve uma dupla vantagem : consti- tuiu na pathologia cutânea uma familia das mais naturaes, e tirou á palavra pústula a significação errônea que lhe era dada. Entretanto, como observa Bazin,, considerada etymologicamente, essa expressão é má, pois quer dizer: que tem a fôrma de sy- philis . Todavia é palavra hoje consagrada na sciencia e sanccionada pelo uso, mas com a significação que Alibert lhe deu. As expressões syphilose, proposta por Fuchs, e syphüodermia, pro- posta por Erasmus Wilson, não prevaleceram. Bazin, a exemplo de Alibert, creou as denominações de herpetides, scrophidides e arthritides, para designar as manifestações cutâneas do herpetismo, da scrophula e da arthritis. A primeira ê geralmente admittida pelos dermatologistas; a segunda é aceita por uns e rejeitada por outros ; a terceira é geralmente rejeitada. ARTIGO II. Symptomas geraes e precursores. Algumas semanas depois da apparição do cancro, observam-se certos symptomas,que ora coincidem com a apparição das syphilides, ura precedem um pouco estas manifestações cutâneas. Um dos primeiros effeitos da syphilis sobre a economia é a producção da chloro-anemia, que, de ordinário, é mais pronunciada nas mulheres e nos indivíduos já anteriormente debilitados : a cor da membrana tegumentaria externa, sobretudo a que forra a face, torna-se pallida, — 8 — amarellada, sub-icterica, acontecendo o mesmo para as mucosas ac- cessiveis á inspecção, sobretudo para as conjunctivas ; ha fadiga, máo estar, fastio ; observam-se palpitações de coração, coincidindo muitas vezes com ruidos de sopro nos vasos do pescoço; os glóbulos do sangue diminuem, a albumina augmenta, factos demonstrados pelas analyses de Grassi, feitas sob a inspiração de Ricord. Além dos symptomas próprios da chloro-anemia, phenomenos nervosos diversos podem preceder a apparição das syphilides : vertigens, tonteiras, e principalmente dores de cabeça e dores articulares. As cephalêas, de ordinário, são intensissimas, a ponto de cau- sarem insomnias, e arrancarem gritos aos pacientes, ellas se exasperam para a tarde e para a noite, e muitas vezes desappa- recem durante o dia. São cephalalgias ordinariamente bi-temporaes, pois quasi sempre se localisam dos dous lados da cabeça, ou quando isso não aconteça, são medianas, isto é, localisam-se no meio da cabeça ; e por ahi se distinguem das enxaquecas e ne- vralgias ordinárias. Este caracter de sede bi-lateral ê importante, porque muitas vezes, guiados somente por elle, podemos denun- ciar a existência de uma syphilis, ou predizer a apparição de uma syphilide, que nada mais faria suspeitar. Do que levamos dito, entretanto, não se conclua que as cephaléas de natureza syphili- tica sejam sempre bi-temporaes, não: freqüentemente assestam-se nas têmporas, mas podem localisar-se também em outros pontos da cabeça; não é raro observarem-se cephaléas syphiliticas supra orbitarias; e mesmo casos têm sido observados nos quaes todo o tegumento do craneo achava-se completamente hypersthe- siado. As dores symptomaticas da syphilis não se localisam somente sobre a cabeça; ellas podem occupar outros pontos do corpo (e isso não é raro), principalmente as articulações, e o systema muscular. São as grandes juntas, as espaduas, os joelhos, os — 9 — cotovellos, as que de preferencia são escolhidas para sede d'estas dores. Nos músculos ellas tomam a fôrma crampoide. Estas dores articulares e musculares offerecem o mesmo caracter que ns cephaléas devidas á mesma causa: exasperam-se para a tarde e para a noite, cessando muitas vezes durante o dia ; ellas não se exageram pela pressão, como acontece com as que são devidas a uma exastose; de ordinário se extinguem pólos movimentos, ao inverso das que são devidas a um estado innammatorio ; ás vezes são fugazes e desapparecem rapidamente, e por abi se distinguem das dores osteocopas, devidas á mesma causa, mas do 3o período da syphilis, e que são fixas e constantes. Ao lado d'estas dores rheumatoides e crampoides, assignalaremos outras affecç.Ões nervosas, que, em alguns casos, podem existir no principio do segundo período da syphilis, como symptomas precursores das syphilides: são nevralgias e paralysias diversas, que podem oecupar todos os nervos da economia, offerecendo um diagnostico diíficil, que só poderá ser estabelecido, tendo-se em consideração os antecedentes do doente, assim como o tratamento a que for submettido. Estas affecções nervosas, próprias do 2o periodo, se distinguem das do 3o, porque estas, mais fixas e mais continuas, são devidas, seja a um tumor gommoso, desenvolvido no trajecto do nervo, seja a uma exastose produzindo paralysia por compressão. Além d'estes, ha ainda ura outro symptoma precursor das syphilides (podendo mesmo acom- panhar o 2o periodo), que merece muito especial menção: queremos fallar da febre syphilitica, a qual, quando existe, indica sempre maior gravidade no estado geral do doente. Ordinariamente esta febre é intermittente, affectando quasi sempre o tvpo quotidiano, mas podendo também affectar, embora raramente, os tvpos terção e quartão. Os seus accessos se mostram ora á tarde, ora á noite; elles se caracterisam de ordinário por calor e suor, não ha calafrio inicial. Ura 3 2 10 — caracter muito importante d'esta febre é que ella resiste ao sulphato de quinina. Ao lado de todos estes sjmiptomas precursores, os doentes são de ordinário enfraquecidos, abatidos, desanimados, incapazes para exer- cidos corporaes ou para esforços de intelligencia. Taes são os symptomas que precedem ou coincidem com o appa- recimento das syphilides; elles, entretanto, força é confessar, estão longe de ser constantes: muitas vezes o indivíduo sob a acçào do vírus syphilitico continua a passar bem, nenhuma perturbação experimenta que possa annunciar o apparecimento de accidentes secundários. Estes, n'esses casos, se manifestam sem prodromos, e podem mesmo çm alguns casos, se bem que raros, assestando-se em pontos pouco apparentes, passar ao menos por algum tempo ignorados pelo próprio doente. ARTIGO III. Signaes próprios e communs. As affecções cutânea» de natureza syphilitica se apresentam, em geral, com caracteres tão bem accentuados, tão bem delimitados, que na grande maioria dos casos são facilmente reconhecidas. Cada um d'estes caracteres, considerado isoladamente, não tem um valor abso- luto; mas, reunidos em maior ou menor numero, dão a essas affec- ções uma physionomia própria, imprimem-lhes um cunho especial, que as faz perfeitamente distinguir das demais affecções cutâneas. E d'ahi se deprehende que o estudo d'esses caracteres é por demais interessante, por demais importante, e merecerá da nossa parte muito especial attenção, pois constitue um dos principaes elementos de que nos serviremos para estabelecer as differenças entre as affecções cutâneas de natureza syphilitica e não syphilitica. - II - Procuraremos, pois, faz:r o estudo cVesses caracteres com algum desenvolvimento. Estes signaes próprios e communs ás syphilides, e que, por sua importância em relação ao diagnostico, tanto interesse despertam. devem ser procurados: 1°, na associação e mistura de muitas espécies de syphilides — polymorphia; 2", na sede das erupções : 3°, na fórum-; 4o, na fxidade; 5o, no colorido; 6o, na ausência de dôr e de prurido', Io, nos phenomeuos secundários das erupções ; 8o, na marcha e duracào ; 9o, na terminação; 10, no contagio e inoadabilidade: 11, no tratamento mercurial. Io. Polymorphia. — Um caracter muito importante, especial ás manifestações cutâneas da syphilis. é o de se apresentarem ao mesmo tempo debaixo de muitas fôrmas elementares; é assim que, de ordi- nário, encontram-se sobre o mesmo indivíduo manchas, papulas) escamas, pústulas, vesicidas c tuberculos; é muito raro encontrar-se uma erupção syphilitica única, isto é, revestindo uma só fôrma elementar, e quando isso aconteça, ella não perdura isolada, é logo acompanhada de outras erupções. Em alguns casos, esta associação dos elementos eruptiros é tão manifesta, que mesmo em uma super- fície muito limitada do corpo, ella pôde ser observada; é assim que sobre uma mancha erythematosa podem-se encontrar papidas, escamas, vesiculas, pústulas e tuberados, em suas differentes phases de evolução. A este caracter é que dão os autores o nome de—polymorphia. 2*. Sede.—As syphilides podem-se desenvolver em todos os pontos - Vi — da superfície do corpo; entretanto alguns existem que são, por assim dizer, a sede predilecta d'essas erupções. Segundo Dévergie, que liga uma importância capital para o diagnostico á sede das syphilides, os logares de eleição que ellas occu- pam são, por ordem de freqüência, o contorno das azas do nariz e da boca, a raiz dos cabellos sobre a fronte e parte posterior do pescoço, o angulo interno dos olhos, o centro do peito, a parte interna dos membros, a visinhança das axillas e das virilhas. Segundo este autor, 80 vezes sobre 100 as erupções cutâneas syphiliticas serão limitadas ás partes mencionadas, e de todas estas partes a face é a que mais freqüentemente é a sede d'estas erupções. Segundo Hardy, a syphi- lide papulosa occupa principalmente a parte posterior do pescoço ; a roseola syphilitica se mostra quasi sempre na parte interna dos mem- bros ; o psoriasis syphilitico se mostra de ordinário nas mãos e nos pés, e ahi escolhe freqüentemente as regiões palmar e plantar; a syphilide pustulosa superficial ordinariamente se localisa no couro cabelludo; a placa mucosa da pélle (syphilitica de Bazin ) se desenvolve quasi sempre perto dos orifícios forrados pelas mucosas, nos pontos em que a pélle é mais fina e mais delicada, nos logares onde existe um attrito habitual. 3.° Forma.—As erupções cutâneas syphiliticas, como vimos, não affectam uma só fôrma elementar; o que n'ellas se observa é a po- lymorphia. Pois bem: quaesquer que sejam as lesões elementares das erupções syphiliticas, ellas se repetem ma's ou menos , e, o que é digno de nota, em certa ordem, em certo arranjo symétrico, de modo que os productos mórbidos affectam quasi sempre uma fôrma circular, semi-circular ouelliptica. Assim, vêm-se erupções dispostas em cír- culos completos, em segmentos de circulo mais ou menos extensos ou em linhas curvas mais ou menos ellipticas. Estes círculos, estas linhas curvas ellipticas, está claro, terão proporções relativas ás partes affectadas: assim, a disposição elliptica das erupções das azas do nariz, por exemplo, não é para comparar-se , em extensão , com as — 1.1 - erupções da moina forma desenvolvidas no centro do peito. Segundo todos os autores, esta disposição das erupções é muito mais accen- tuada nas syphilides tardias que nas precoces. Dévergie liga á dis- posição clliptica das erupções syphiliticas summa importância, como signal precioso de diagnostico ; todavia, como bem observa Hardy, este caracter por si só, isoladamente, não é sufficiente para estabele- cer-se o diagnostico, porque pôde ser encontrado em outras erupções que não as syphilides, taes como o psoriasis simples, a herpes cir- cinada, etc. Mas, diz Dévergio, isso é a excepção 4." Fixidade das erupções.—As syphilides são fixas, isto é, não mudam de um logar } ara outro, não viajam como as erupções dar- trosas que, muitas vezes, desapparecem de um ponto para appare- cerem em um outro. As erupções syphiliticas nào reincidem sob a mesma fôrma , isto é, desde que desapparecem não apparecem de novo sob a mesma fôrma : pôde haver intermittencia nas manifes- tações syphiliticas da mesma fôrma, podem, por exemplo, umas pa- paias vir depois de outras, com as quaes vêm coexistir: as manifesta- ções se fazem assim , em alguns casos, por erupções suecessivas; mas isto não é reincidir sob a mesma fôrma, é a erupção que se comple- ta, ao passo que com os dartros não se dá isso, pois essas manifes- tações, depois de percorrida a sua evolução, muitas vezes desappare- cem, para apparecerem de novo com a sua fôrma primitiva. «V. Colorido.— A cor das syphilides é toda particular, toda especial, e apezar das descripções e comparações que lhe têm sido feitas, é difficil indical-a de uma maneira exacta : é por essa razão que costuma-se designal-a sob o nome de colorido syphilitico. Os autores antigos, para dar uma idéa d'esta cor, fizeram dif- ferentes comparações ; é assim que G. Fallopio comparou-a á côr da carne de presunto, comparação justa, pois que mostra a côr vermelha sombria das syphilides, as quaes não têm o vermelho livido, roxo, das scrophulides, e nem o vermelho vivo dos exanthemas - 14 - febris. Swediaur, tendo comparado este colorido ao cobre ver- melho, deu lhe o nome de colorido cuprico, denominação que, embora menos justa que a de Fallopio, é presentemente consagrada pelo uso, de modo que hoje a expressão co lorido cuprico traz logo a idéa de uma erupção syphilitica. Este colorido, entretanto, não é sempre tão delimitado, tão ca- racterístico ; assim nas syphilides recentes, encontra-se ao princi- pio uma côr rosada, depois vermelha, e só para o fim é que se mostra a côr especifica. Em alguns casos, nas syphilides papu- losa e tuberculosa disseminada, o colorido é muito escuro, muito carregado. Quando a lesão elementar é constituída por uma saliência cheia, por uma papula, por um tuberculo, o colorido especifico se mostra em toda a saliência; quando, ao contrario, a erupção é formada por pústulas, vesiculas ou ulcerações, o colorido não existe senão ao redor da lesão cutânea, muitas vezes mesmo elle não se mostra senão ao redor de um grupo de pústulas ou de vesiculas. Mais tarde, quando a lesão se deprime e desapparece, quando a ulceração se cicatriza, o colorido especifico se encontra no logar occupado antes pelo elemento eruptivo. A este colorido, sobretudo o que fica no logar da syphilide erythematosa, Gibert liga mais importância do que ao da própria lesão ou ulceração. O colorido especifico das manifestações syphiliticas ê de muito valor para o diagnostico, sobretudo quando é considerado conjunctamente com outros symptomas. Elle por si só, considerado isoladamente, não tem, segundo Bazin e Dévergie, o valor que lhe querem dar os autores, porque de um lado pôde faltar, e de outro pôde existir em erupções não syphiliticas. É, pois, um caracter que, para o diagnostico, tem muito valor, a que convém prestar toda a attenção, mas que é preciso não - 15 - considerar isolado ; é preciso consideral-o conjunctamente com outros signaes, pois por si só não tem o valor absoluto que lhe querem attríbuir. (í.° Ausência de dor e de prurido. — E este incontestavelmente um precioso signal diagnostico das syphilides • todas as vezes que nos acharmos em presença de uma erupção cutânea que não apre- sentar dor e nem prurido, devemos pensar em uma erupção svphi- litica; ao contrario, todas as vezes que uma syphilide for acompa- nhada de qualquer modificação da sensibilidade cutânea, de um prurido mesmo moderado, é preciso que busquemos em uma compli- cação a explicação d'este phenomeno. Assim procedendo, verifica-se muitas vezes que o prurido depende de uma affecção herpetica concomitante, outras vezes de uma affecção parasitaria, da sarna por exemplo. Entretanto, convém aqui abrir uma excepção para as erupções sy- philiticas do couro cabolludo, as quaes de ordinário são pruriginosas; do mesmo modo, as syphilides exanthematicas, em alguns casos, são acompanhadas de um ligeiro prurido, que habitualmente desapparece ao cabo de pouco tempo, sobretudo se o doente é submettido ao tra- tamento mercurial. Convém que a respeito deste signal façamos as mesmas obser- vações que fizemos em relação á côr das erupções syphiliticas : é um signal precioso, mas que não deve ser considerado isoladamente; deve ser considerado conjunctamente com outros signaes, porque de um lado ha outras erupções em que não se dão modificações da sensibilidade cutânea, como acontece, por exemplo, com as erupções scrophulosas; de outro, podem-se dar essas modificações, como acima dissemos,mesmo em algumas erupções syphiliticas. E, pois, um signal muito valioso, mas cujo valor não é abso- 4 luto. 7o. Plieiiomenos secundários das erupções. — A medida que as syphilides se desenvolvem, ellas modificam-se em seu aspecto, - 16 - e apresentam phenomenos consecutivos, muito dignos de attenção, os quaes offerecem caracteres particulares devidos á sua orLem, taes são : as escamas, as crôstas, as ulcerações e as cicatrizes. As escamas são esbranquiçadas, superficiaes, não cobrem muitas vezes senão incompletamente a saliência eruptiva ; se distinguem das do psoriasis herpetico, que são espessas, menos adherentes, e im- bricadas em muitas camadas. Biett ligava muita importância, para o diagnostico, ao bordelete ou debrum (liséré) epidérmico esbranquiçado, em forma de orla (collerete), que circumscreve as es: amas nas syphilides. Esta orla é formada pelo destacamento do epidemia ao redor da lesão eruptiva. As crôstas, que succedem á ruptura das pústulas syphiliticas ou á ulceração dos tuberculos, offerecem um colorido verde-negro, muito característico. Estas crôstas são espessas, desiguaes, muito adherentes, como en- caixadas na pélle que as rodêa; sua superfície é estratificada, e algumas vezes offerece eminências, elevações, asperezas, que as as- semelham á superfície exterior de uma concha ou a uma escama di ostra. As ulcerações, que succedem ás syphilides, offerecem também caracteres dignos de nota: os seus bordos são claros, talhados a pique, não são descollados ; o seu fundo é pardacento, como que revestido de uma pseudo-membrana; o pús é sanioso, fétido e muito plástico. Muitas vezes, ao redor das ulcerações, encontra-se uma areola de côr escura, cuprica, própria das erupções syphiliticas. As cicatrizes, que succedem ás ulcerações, são arredondadas, e, o que merece menção, menores que as ulcerações às quaes succedem e no seu centro apresenta-se uma depressão em relação com a perda de substancia ; a pélle enrugada ou unida, é muito fina. Nos primeiros tempos, as cicatrizes apresentam um colorido escuro — 17 — arroxeado, muitas vezes mais accentuado do que o era ao redor das ulcerações. A este colorido é que alguns autores ligam mais importância, por lhes parecer mais característico, do que ao colorido que acompanha as erupções. O colorido das cicatrizes desapparece pouco a pouco, para dar logar á côr branca, commum a todas as cicatrizes. A fôrma das cicatrizes pôde, em certos casos, fazer conhecer a erupção que lhes deu nascimento; é assim que póde-se reconhecer, somente pela extensão e fôrma especial das cicatrizes, uma syphilide tuberculosa circunscripta, uma syphilide serpiginosa, etc. 8.° Marcha e duração.—A marchadas syphilides offerece alguma cousa de especial: ella é geralmente lenta, como acontece na maior parte das moléstias cutâneas, mas éprogressiva, isto é, as syphilides não ficam estacionarias como as scroplmlides e grande numero de moléstias dartrosas; além de que, as erupções syphiliticas em sua marcha offerecem este caracter importantíssimo, que as distingue das erupções cutâneas não especificas, e vem a ser que ellas se modificam, se trans- formam por assim dizer, de modo que freqüentemente uma erupção succede a uma outra ; assim, muitas vezes, a unia syphilide eryte- matosa succede uma papulosa, a esta uma pustulosa, e assim por diante. E é por essa razão que os syphilographos modernos dividem em geral as syphilides em precoces e tardias, attendendo para isso ao tempo do seu apparecimento, á marcha das erupções, que não se fazem, em geral, todas ao mesmo teu po. A marcha das syphilides, lenta, chronica, como dissemos, pôde, entretanto , em alguns caos tornar-se algum tanto rápida, o que algumas vezes se observa nas erupções precoces ; isso, entretanto , em vez de ser a regra , é a excepção. A duração das syphilides, como se deprehende do que acabamos de dizer sobre sua marcha, é longa ; e uma das causas que para isso muito influe é o facto de fazerem-se as manifestações da syphilis por 3 3 - 18 erupções successivas [par poussêes), de modo que muitas vezes, e isso é o mais freqüente, uma erupção chega durante a ev olução da primeira, podendo assim muitas vezes observar-se sobre o mesmo indivíduo a mesma erupção em differentes phases da sua evolução. 9.° Terminação.— No modo de terminação das syphilides po- demos também encontrar dados valiosos para o diagnostico. Segundo Bazin, as syphilides tendem sempre para a resolução ou para a ulce- ração ; as affecções scrophulosas têm tendência, não para a resolução, mas para a hypertrophia e para a ulceração, ficando mesmo, em muitos casos, indefinidamente estacionarias ; as affecções herpeticas são estacionarias ou resolutivas. A mortificação, e depois a ulceração profunda do derma, terminação freqüente de certas manifestações sy- philiticas, deixam após si cicatrizes indeléveis, com caracteres espe- ciaes, de que já nos occupámos. Na scrophula e no escorbuto, póde-se também observar a mor- tificação como terminação, mas é somente a titulo de complicação. A syphilis, moléstia voraz, destruidora, de marcha sempre progres- siva, se não lhe for opposto algum paradeiro, marchando da periphe- ria para o centro, não termina espontaneamente pela cura, excepto em rarissimos casos ; as suas manifestações cutâneas, porém, podem terminar-se pela resolução, mesmo sem intervenção de tratamento, para darem logar a outras manifestações, filhas da mesma diathese, pois, como vimos, as erupções se succede :n umas a outras ; em ou- tros casos, porém, a sua terminação é a ulceração. 10. Contagio e inoculabilidade.— São dous caracteres, perten- centes não só aos accidentes primitivos da syphilis , mas ainda aos secundários, da mais alta importância, e que hoje não podem mais ser postos em duvida; o próprio Ricord, espirito eminente e investi- gador, a quem tanto deve a sciencia, por ter esclarecido e posto fora de duvida os grandes e incontestáveis princípios sobre que se basêa a syphilographia moderna, e que ao principio rejeitava o contagio pelos accidentes secundários syphiliticos, hoje confessa que em certos - 19 — casos a syphilis pôde provir destes accidentes. Entre outros, citare- mos William Wall ace, Rinecker, Cazenavc, Langlebcrt, Gibert, Rollet. que, por suas repetidas e fecundas experiências, puzeram essa ver- dade fora de duvida. E força, entretanto, confessar que o contagio pelas placas muco- tas, mesmo antes de qualquer experiência a esse respeito , era para muitos práticos um facto incontestável, resultante da observação cli- nica . A propagação da moléstia da bocea da criança para o mameláo da ama era um exemplo tantas vezes repetido, que necessariamente devia chamar a attençào dos clínicos. Hardy cita o facto de uma criança que, tendo placas mucosas no ânus, transmittio a syphilis á pessoa que a conduzia, em cujo braço appareceu um cancro, seguido mais tarde de accidentes constitucionaes. 0 contagio pelas syphilides humidas é facto geralmente admittido, não acontecendo o mesmo para as syphilides sêccas , cujo poder contagioso é muito contes- tado. 0 contagio dos accidentes secundários pelo sangue é hoje um facto incontestável, depois da bella, brilhante e fecunda experiência de Pedro Pellizari, distineto medico de Florença. Por nos parecer interessante, faremos conhecer essa experiência um pouco circumstanciadamente. No dia 3 de Fevereiro de 1862, Pellizari tirou o sangue de uma mulher de 25 annos de idade, grávida de seis mezes, apresentando adenopathias inguinaes e cervicaes, placas mucosas na vulva e no ânus, roseola syphilitica sobre a superfície do corpo e pústulas sobre o couro cabelludo. Este sangue, embebido em fios, foi applicado a uma superfície desnudada do braço de três jovens médicos, que nunca tinham soffrido de svphilis, e que, a bem da sciencia, se prestaram á experiência. O sangue estava quente, quando foi inoculado no primeiro; frio, quando o foi no segundo; frio e coagulado, quando o foi no terceiro. — 20 — Os dous últimos médicos nada offerecêram de particular; n'elles, a experiência foi completamente negativa. O primeiro, no dia 3 de Março, vio apparecer, sobre o ponto da inoculação, uma papula que, ao principio sêcca, cobrio-se logo de uma crôsta, e então manifestou-se o engurgitamento indolente dos gânglios axillares. No dia 22 do mesmo mez, a crôsta cahio e vio-se um cancro com todos os seus caracteres e de base endurecida. No dia 4 de Abril appareceram cephaléas e adenopathias cervicaes; no dia 12 do mesmo mez appareceu roseola, e no dia 22 uma syphilide papulosa. Esta experiência nada deixa a desejar: o contagio pelo sangue, e portanto pelos accidentes secundários, é posto fora de toda a contes- tação. Ella é fértil em deducções. Por ella se explica o contagio que muitas vezes se dá da syphilis em um indivíduo, livre de qualquer accidente anterior, mas que teve congresso sexual com uma mulher regrada, soffrendo de accidentes secundários, embora não sejam appa- rentes, e sem apresentar accidente primitivo actual: o contagio se faz pelo sangue,e para isso basta que haja no indivíduo uma ligeira solução de continuidade nos órgãos genitaes. D'ahi ainda a explicação do contagio da syphilis pelo dedo d'aquelle que pratica o tocar em uma mulher regrada ou em trabalho de parto, embora esta não offereça lesão syphilitica apparente: basta, para o contagio, que haja uma pequena excoriação no dedo. Explica-se ainda por ella os casos de contagio da syphilis pela vaccina, quando, juntamente com o piis vaccinico, a lanceta é carre- gada de uma pequena quantidade de sangue. O contagio dos accidentes secundários pelo leite da ama não está demonstrado; nenhum facto ha na sciencia, segundo Hardj^, que o demonstre. Assim, pois, os accidentes secundários da syphilis, em geral, são contagiosos e inoculaveis; veremos que o mesmo não acontece com os da scrophula e do herpetismo. II. Tratamento mercurial.—Parecerá talvez estranho o consi- derarmos o tratamento mercurial no numero dos caracteres próprios e com mim s ás syphilides; entretanto toda a estranheza desapparecerá desde que confessarmos que assim procedemos mais para não que- brar a ordem, o methodo, que nos impuzemos na confecção d'este trabalho, do que por qualquer outra consideração. Como o mercúrio é o medicamento por excellencia do 2° período da syphilis, e em alguns casos duvidosos, é um auxiliar valioso para o diagnostico, julgamos conveniente fazer dclle ao menos menção n'este capitulo, para que possamos na terceira parte deste trabalho fallar da sua conveniência em relação ao diagnostico. ARTIGO IV. Symptonias concomitantes e antecedentes do doente. Ao mesmo tempo que se fazem as erupções cutâneas de natureza syphilitica, concomitantemente com ellas, outras manifestações, depen- dentes da mesma diathese, se mostram para o lado de outros pontos da economia, principalmente para o lado do systema lymphatico, das mucosas, da iris, dos testículos, dos systemas piloso, ósseo e muscular, e para o lado dos órgãos visceraes: a syphilis é,já o dissemos, uma moléstia de manifestações múltiplas e variadas. O conhecimento d'essas lesões nos interessa muito de perto, porque muito pôde contribuir para, nos casos duvidosos, esclarecer o diagnos- tico; não faremos, entretanto, um estudo circumstanciado de todas essas lesões, os estreitos limites do nosso trabalho não nos permittem semelhante cousa : apenas nos occuparemos succmta e summariamente das principaes d'essas manifestações, sem nos esquecermos de que o 92 — nosso único fim com isso é adquirir maior numero de dados, para que as bases do diagnostico sejam firmes e seguras. Juntamente com essas lesões, faremos o estudo summario dos phenomenos geraes que precedem o apparecimento das syphilides, mas que em m uitos casos acompanham a sua evolução, e dos antecedentes mórbidos do doente, uma das fontes mais preciosas de dados diagnósticos das erupções syphiliticas. Assim, pois, trataremos: Io, dos phenomenos geraes; 2o, dos antecedentes do doente; 3o, das lesões do systema lymphatico; 4o, das lesões das mucosas; 5o, da irite syphilitica; 6o, da albuginite syphilitica; 7 o, da alopecia; 8o, finalmente, das lesões principaes do 3n periodo da syphilis, porém muito perfunotoriamente. I.° Phenomenos geraes.—^Já vimos que muitas vezes a apparição de uma erupção syphilitica era precedida de alguns symptomas prodromicos, consistindo em um pouco de máo-estar, de inappetencia, de fadiga, e em um movimento febril mais ou menos intenso, re- unindo-se a estes, muitas vezes, as cephaléas, as dores rheumatoides e crampoides, e os symptomas da chloro-anemia. Pois bem : estes phenomenos, que precedem o apparecimento das syphilides e que em geral desapparecem desde que a erupção se faz, podem acom- panhal-as com persistência, e por isso é que d'elles fazemos menção como symptomas comcomitantes. Esses symptomas, que muito podem auxiliar ao diagnostico, convém que aqui se diga, não são produzidos pelas manifestações syphi- 1 ticas, assim como também os symptomas da cachexia syphilitica não são devidos ás lesões que a acompanham: uns e outros são devidos a uma mesma, diathese, filhos de uma mesma causa, a syphilis, elles também, como as syphilides ; são manifestações sy- philiticas. *2.° Antecedentes do doente.—Incontestavelnente a historia dos antecedentes mórbidos do doente é uma fonte preciosa, que for- nece dados muito valiosos para o diagnostico. A syphilis é, em geral, uma moléstia de marcha regular; os seus períodos se succedem debaixo de certa ordem : os accidentes secundários são precedidos pelos primitivos, os terciarios pelos se- cundários; cada um d'estes períodos é constituído por lesões que qnasi sempre deixam signaes de sua passagem; as syphilide* são precedidas de cancro, o qual é geralmente acompanhado de adeno- pathias inguinaes e cervicaes, que muitas vezes suppuram, deixando em seu logar cicatrizes especiaes; também algumas syphilides, como as pustulosas, as tuberculosas, as ulcerosas, deixam signaes da sua existência. Pois bem: para o diagnostico convém muito examinar se ha, sobretudo nos órgãos genitaes e nas regiões inguinal e anal, cicatrizes ou signaes que denunciem a anterior existência de cancros, assim como qual a fôrma e a natureza d'esses signaes; muitas vezes verifica-se mesmo a presença de cancros coexistindo com as syphilides, sobretudo com as precoces, e isso é de grande valor para se estabelecer a natureza da erupção cutânea. Muitas vezes póde-se não encontrar a cicatriz do cancro, por que este não deixou vestígio da sua passagem; n'esse caso é de toda a necessidade que se procure saber minuciosamente a his- toria dos antecedentes, indagando se o doente, em algum tempo, soffreu de accidentes venereos, de cancros, babões, de blennorrhagia ; se, no caso de ter soffrido, não padeceu de rheuma ismo, de dores de cabeça á noite; de feridas na garganta, na bocca, na lingua; se não appareceu alguma outra erupção pelo corpo, senão teve boubas, etc.: procurando vêr se ha filiação entre os symptomas, para reconhecer-se a natureza da erupção que se tiver de examinar. - 24 - Repetimos: estas indagações são da mais alta importância para se decidir sobre a natureza de uma affecção cutânea; todavia só porque um individuo apresenta antecedentes venereos não se pôde concluir que a affecção actual seja forçosamente especifica, porque o cancro anterior podia ter sido simples, não sendo seguido de accidentes constitucionaes, de modo que a affecção actual pôde ser herpe- tica ou scrophu!osa. Dj modo que os dados diagnósticos, forne- cidos pelos antecedentes do doente, não devem ser considerados isoladamente. 3.° Lesões do systeina lymphaüco. O engurgitamento dos gânglios e vasos lymphaticos é uma das primeiras manifestações da syphilis constitucional, e que coincide quasi sempre com o desenvolvimento das syphilides. Estes engurgitamentos, assestando-se nos gânglios inguinaes, são em geral considerados como fazendo parte dos accidentes primitivos, mas elles podem persistir por algum tempo, de modo que muitas vezes coexistem com as syphilides, sobretudo com as precoces; estes engurgi- tamentos, entretanto, podem não ser de natureza syphilitica, como acontece, por exemplo, com os que acompanham o cancro simples. Um engurgitamento que raramente falha no segundo periodo da syphilis, que quasi podia ser considerado como característico, é o dos gânglios da região cervical posterior. N'esta adenopathia, assim como em todas as que são de natureza syphilitica, ha um caracter digno de attenção, é a indolência, que muitas vezes faz com que a attenção do doente não seja despertada. Este engurgitamento dos gânglios post-cervicaes e mastoideanos se distingue do que succede ás erupções do couro cabelludo, porque este é mais doloroso, offerece um caracter mais inflammatorio, tem uma marcha mais rápida e mais em relação com as moléstias de que é symptomatico; se distingue d'aquelle que succede ás placas mucosas da garganta e dos lábios, porque este se assesta nos gânglios carotidianos e sub-maxillares. Este engurgitamento post-cervical muitas vezes - 25 - precede ás affecções cutâneas e mucosas ; pôde muitas vezes existir só, e é quasi sempre independente de lesão visinha. Também os gânglios carotidianos, axillares, epitrocleanos, e clavi- culares, podem ser a sede de engurgitamentos indolentes syphiliticos. Além do engurgitamento dos gânglios lymphaticos, também póde-se observar o dos vasos lymphaticos que a elles vão ter, os quaes apre- sentam-se sob a fôrma de cordões duros, nodosos, assestando-se sobre- tudo na face interna dos membros superiores e inferiores, e no penis; Bazin cita Trastour, que diz ter observado um engurgitamento geral do systema lymphatico. 4.° Lesões das mucosas. —Não nos occuparemos aqui da placa mucosa, de que trataremos quando nos occuparmos das syphilides em particular. Ao mesmo tempo que se fazem as manifestações syphi- liticas para a pélle, também manifestações inteiramente semelhantes se fazem ordinariamente para as mucosas ; é assim que se observam a stomatiie, a angina, a enterite, a corysa, de natureza syphilitica, affecções que, segundo a maior parte dos autores, são constituídas por erythemas, papaias, vesico-pustulas, bolhas e tuberculos. O erythema é caracterisado por um rubor uniforme, que pôde occupar o véo do paladar, a uvula, os pilares, a mucosa das fossas nasaes ou a intestinal; n'essas partes ha seccura e dores vivas, e nenhuma secreção. x\.s papulas são muito freqüentes no véo do paladar, nas amygda- las e na lingua. Ellas começam por placas vermelhas, depois um pouco esbranquiçadas, como se fossem cauterisadas pelo nitrato de prata, o que é devido a uma exsudação plástica amarellada muito adherente, que occulta pequenas ulcerações; as da lingua são viola- ceas, sua superfície é unida e ligeiramente deprimida, de fôrma ovalar. Ellas podem, também, e isso é muito freqüente, desenvolver-se nos lábios, onde podem começar por uma mancha branca, que depois se rodêa de uma areola vermelha arroxeada ; ou então, começam por uma mancha roxa, o epithelio se destróe, uma pseudo-membrana 3 4 — 2fi — pouco consistente cobre a placa que se eleva, o botão se ulcera, offe- recendo em sua superfície granulações e saliências vegetantes ; nos bordos dos lábios, formam saliências fendilhadas no sentido vertical, humidas e cobertas ordinariamente de uma matéria amarella concreta; nas commissuras labiaes, ellas se offerecem sob a fôrma de pequenas fissuras radiadas e fendilhadas. As vesico-pustulas que se observam nas mucosas, assim como as bolhas, são fugazes, sendo logo substituídas por ulcerações superfíciaes variadas. Os tuberculos também se encontram nas mucosas: formam núcleos, ao principio indolente?», mas que depois se inflammam, e dão logar a ulcerações de fundo cinzento, pultaceo, que se estende em largura e profundidade ; se a ulceração se assesta sobre o véo do paladar, dá logar a perfurações ; se na abobada palatina, dá logar a caries e a necroses. A enterite syphilitica é muito mais rara que a angina e a stoma- tite ; a corysa syphilitica tem sido muitas vezes observada . *>.° Iríte syphilitica. — A irite syphilitica é de ordinário um phe- nomeno secundário, mas tm muitos casos é accidente de transição entre o segundo e o terceiro periodo. Ella começa ordinaiiamente por uma cephalalgia supra-orbitaria mais ou menos intensa, que se irradia para as têmporas, sobre o trajecto dos nervos frontaes e supra-or- bitarios, e se acompanha quasi sempre de lacrimejamento e de pho- tophobia. O globo ocular injecta-se, forma-se ao redor da cornea o circulo peri-keratico ou esclerotidiano; a iris torna-se esverdinhada ou fulva, segundo o olho é azul ou pieto; perde parte da sua mo- bilidade, o circulo pupillar torna-se estreitado, deformado. Ricord acredita que a irite syphilitica é o resultado de uma erupção semelhante a' dos tegumentos, admittindo por isso as fóimas macu- losa, papulosa, pustulosa, e uma gravidade em relação com a lesão anatômica. Virchow parece admittir uma irite gommosa, caracterisada por - 27 - excresccncias tuberculiformes. qUe seriam, como a gomina recente, o resultado de uma proliferação cellular, e não de uma simples c xsudaçào. Seja como for, logo o humor aquoso se turva, torna-se opaco; flocos febrinosos fluetuam no meio d'elle e interceptam os raios lumi- nosos ; póde-se mesmo observar um derramamento purulento na parte inferior da câmara anterior, um verdadeiro hypopion, na fôrma pustu- losa da irite. A pupilla torna-se cada vez mais irregular, enche-se de filamentos plásticos que são susceptíveis de organização e acabam cedo ou tarde, quando nào são reabsorvidos, por fazer adherir a iris ás partes visinhas. As perturbações funecionaes marcham parallela- mente com os progressos da inflammação. íj." Sarcocclc syphilitico.— O sarcocclc syphilitico, albuginite syphilitica ( Ricord ), orchite e peri-orchiU (Vhchow), se manifesta ordinariamente como accidente de transição do 2" para o 3° periodo, podendo também manifestar-se , o que nào é raro , uo terceiro periodo. Invade quasi sempre os dous testículos, um depois do outro. Con- siste escencialmente no espessamento, na infiltração plástica da túnica albuginea e dos prolongamentos que delia partem, para irem separar a substancia glandulosa. A affecção de ordinário não invade a rede testicular ( Virchow), limita-se á túnica albuginea; mas em alguns casos pôde interessar o epididymo (Bazin). E de ordinário precedido de dores surdas no testículo, que aug- mtnta logo de volume, dando pela apalpaçâo a sensação de zonas fibrosasque o percorrem em differentes sentidos e que apresentam quasi sempre núcleos duros em seu trajecto. Pelo progressivo espessamento da albuginea e augmento dos nú- cleos endurecidos, o testículo se converte em uma massa dura, ho- mogênea, regular, que tem uma fôrma allongada, característica. Este tumor é pouco sensível, e os progressos da affecção podem tornar completamente degenerada a glândula seminal. - 28 - Quasi sempre, a albuginite syphilitica é acompanhada de um der- ramamento liquido na túnica vagiríal. Os doentes perdem logo suas faculdades geradoras, sobretudo se são affectados os dous testículos ; as erecções se extinguem, o sperma torna-se aquoso, encerrando um pequeno numero de spermatozoides alterados, que acabam mesmo por desapparecer. Chega uma época em que os doentes ficam não só estéreis, mas também impotentes, 7.° Alopecía.—E umphenomeno freqüente do periodo secundário da syphilis; acompanha, de ordinário, as erupções cutâneas mais precoces, ás vezes mesmo as precede : basta exercer uma ligeira tracção, para cahir uma grande quantidade de cabellos. No periodo terciario também póde-se observar alopecia, que é de- vida a lesões, como exostoses, periostoses, que exercem uma compres- são destruidora sobre os bulbos pilosos, ou a erupções que se fazem no couro cabelludo ; a do periodo secundário não é devida a lesão alguma dos ossos do craneo ou do couro cabelludo. A alopecia do periodo secundário é muitas vezes geral: cahem todos os pellos do corpo ; outras vezes, ella se limita á cabeça, onde a queda dos pellos pôde ser geral, ou fazer-se por ilhas, ou limitar-se ás têmporas. Em geral os pellos cahem sem estar alterados; em alguns casos, porém, elles são seccos, quebradiços, lanuginosos, de côr modificada. 8.° Symptomas do terceiro periodo da syphilis.—Menciona- remos apenas os principaes symptomas do 3o periodo, os quaes, em alguns casos, podem ser concomitantes de algumas espécies de sy- philides tardias. As lesões do 3° periodo são muitas ; a syphilis, marchando da pe- ripheria do corpo para o centro, vai successivamente invadindo todos os tecidos e órgãos, de modo que o que se observa n'esse periodo são os symptomas da cachexia syphilitica, a qual resulta da acção diuturna e corrosiva dos virus syphilitico sobre o organismo. - 2«J -- As principaes lesões d'esse periodo são as seguintes : as affecções do tecido cellular, caracterisadas por tumores gommosos profundos e abcxssos gommosos ; as affecções do tecido ósseo, constituidas por os- teifcs, periostites, exostoses, periostoses, caries e necroses ; as affecções do lecido fibroso, aponevroticas e tendinosas; as lesões do encephalo ou cncephalopathias syphiliticas, que se traduzem por paraplegias, hrmiplcgias, paralysias geraes, epilcpsia ; emfim as outras vísceras, o fígado, os pulmões, os rins, podem também ser a sede de lesões syphiliticas. Quando estes symptomas se manifestam, pela acção prolongada e maléfica do vírus syphilitico, já o indivíduo acha-se de ordinário de- pauperado, debilitado, enfraquecido, offerecendo todos os symptomas de uma profunda cachexia. CAPITULO II. Das syphilides em particular. Não entrando nas emmaranhadas e intermináveis questões, rela- tivas á classificação das moléstias cutâneas em geral e das syphilides em particular, não só porque isso seria longo e quiçá acima das nossas forças, mas ainda e principalmente porque entendemos que em nada aproveitaria ao fim d'este trabalho ; procurando o mais possível alliar as idéas elevadas da escola moderna, cujos principaes representantes são Ricord, Hardy e Bazin, ás iléas fecundas de Willan e Biett: di- vidiremos as variada,- manifestações da syphilis sobre o tegumento — 30 — externo em erupções precoces, intermedianas e tardias, e considera- remos como principaes espécies d'esses três gêneros, as seguintes espécies de erupções cutâneas syphiliticas ou syphilides, admittidas pela maioria dos autores : l.a Syphilide erythematosa. 2 .a Syphilide papulosa, 3.a Syphilide emplacas ou placas mucosas dos autores. 4.a Syphilide vesiculosa. 5.a Syphilide pustulosa. 6 .a Syphilide em bolhas. 7 .a Syphilide maculosa. 8. * Syphilide escamosa. 9.a Syphilide tuberculosa, ARTIGO I. Syphilide erythematosa. O erythema svphilitico é caracterisado por manchas vermelhas, congestivas, desapparecendo cm totalidade ou em parte pela pressão do dedo. E um dos accidentes mais freqüentes da syphilis secundaria, assim como é um dos mais precoces, apparecendo, de ordinário, 2 mezes de- pois do accidente primitivo. As manchas do erythema syphilitico podem ser discretas ou confluen- tes ; quando essas manchas são pequenas, regulares, mais ou menos arredondadas, ovalares, a erupção recebe o nome de roseola syphilitica. A erupção pôde fazer-se de duas maneiras: ou bruscamente, de modo que em 24 horas invada toda a superfície do corpo, sendo isso muitas vezes devido a uma causa aecidental ; ou então, e isso é muito - 31 — mais eommum, ella se desenvolve lenta e progressivamente, invadindo o peito, o ventre, as coxas, osantebraços, etc. 0 volume das manchas do erythema syphilitico varia desde o volume de uma lentilha ao de uma moeda de um franco. A côr varia, de ordinário, desde o rosado até o vermelho sombrio, carregado; quando a erupção vai tornando-se antiga, a côr torna-se muitas vezes amarellada, cinzenta, cuprica. Em alguns casos, estas graduações de colorido acham-se reunidas, constituindo a p>elle de trutas (peau truitée) de J. L. Petit. Estas manchas, em geral, affectam a disposição de corymbos, de círculos, de linhas curvas ellipticas: outras vezes são muito irregu- lares. Em geral desapparecem pela pressão do dedo, mas de ordinário incompletamente. Ellas terminam, de ordinário, por uma descamação epidérmica abun- dante, deixando em seu lugar u aeulaturas amarelladas ou escuras, olhadas por Gibert como mais características, quanto á côr, do que a da própria erupção. 0 ervthemn, syphilitico pôde, em geral, revestir a fôrma maculosa ou papuVsa. O erythema maculoso écaracterisado por manchas sem saliências, de um colorido rosado ou vermelho pallido, desapparecendo completa- mente pela pressão do dedo; o papuloso é cara terisado por manchas salientes, de um vermelho vivo,em muitos casos de uma côr carregada, cuprica. Estas duas formas podem encontrar-se isoladas, mas também podem ser encontradas sobre o mesmo indivíduo. A syphilide ervthematosa não é acompanhada de dôr, ardor ou prurido. A sua duração, sem intervenção therapeutica, é ordinariamente de 5 a G mezes. A sua terminação mais eommum é a resolução ; em alguns casos, pôde também terminar por delitescencia. Ella é precedida, em geral, por phenomenos precursores, como __ 32 __ máo-estar, fastio, cephaléas, dons articulares, etc; e équasi sempre acompanhada de outras manifestações syphiliticas, como engurgitã- mentos ganglionares, placas mucosas, papulas e alopecia ARTIGO II. Syphilide papulosa. A syphilide papulosa é caracterisada por saliências cheias, seccas, circulares, de dimensão variável, e terminando pela resolução. Depois do erythema, é incontestavelmente esta a mais freqüente e precoce das erupções syphiliticas. Ordinariamente se desenvolve de um modo lento e gradual, tendo como sede de predilecção a parte posterior do pescoço, mas sendo freqüentemente encontrada também sobre a fronte, peito, costas, coxas e braços. A sua côr é muito característica, cuprica, e muito persistente; quando esta côr desapparece, restam maculaturas escuras, que, mais tarde, também desapparecem, podendo-se encontrar, embora em casos raros, pequenas depressões nos logares das sy- philides, sem que entretanto tenha havido ulceração durante a sua existência. D'esta syphilide admittem-se commummente duas varie- dades : as lenticulares e as miliares. As primeiras têm approximadamente o diâmetro de uma lentilha; são as mais precoces, coincidindo ordinariamente com a roseola, ou com outras fôrmas igualmente superficiaes. As segundas têm mais ou menos o volume de um grão de milho • se desenvolvem ordinariamente por grupos ; é esta variedade que é por alguns conhecida pelo nome de lichen syphilitico. Como todas as syphilides, a papulosa nãi é acompanhada de - 33 — modificações da sensibilidade. A polymorphia é um caracter que acompanha esta como as demais variedades de syphilides. Ella é ordinariamente precedida de symptomas geraes, taes como máo estar, fastio, dores rheumatoides, symptomas de chloro-anemia, cephaléas, etc; eé de ordinário acompanhada de outros symptomas, dependentes também da syphilis, como erupções crôstosas do couro cabelludo, placas mucosas roseola, engurgitamentos ganglionares, alopecia, etc. A marcha é chronica ; as erupções papulosas se fazem succes- sivamente. A duração, sem intervenção mercurial, é ordinariamente de 6 a 7 mezes. A terminação é a resolução. ARTIGO III. Syphilide em placas (placas syphiliticas de Bazin). Esta manifestação da syphilis, uma das mais freqüentes e precoces do periodo secundário, tem recebido varias denominações: placas mucosas, papidas mucosas, tuberculos mucosas, pústulas chatas, tu- berculos chatos, etc. Julgamos preferível a todas estas denominações, para indicar essas manifestações da syphilis secundaria, a que lhes é dada por Bazin, que as denomina placas syphiliticas, e admittiremos com elle as placas syphiliticas das mucosas e as da pélle. A placa syphilitica é constituída por uma elevação da pélle ou das mucosas cujos bordos são claramente circumscriptos e cujo centro é, em geral, deprimido. As placas syphiliticas podem-se desenvolver em todos os pontos da superfície cutânea, mas ha alguns que parecem ser a sua sede de predilecção : no ânus, na vulva, na parte interna e superior 3 5 34 — das coxas, no sulco naso-labial, nas commissuras labiaes, nas axillas, no umbigo, no scrotum, na lingua, nas amygdalas, ellas são muito mais freqüentes do que em outros pontos. A sua fôrma é, em geral, circular ou semelhante á de um ellipsoide, tendo os bordos levantados e o centro deprimido. O seu colorido é rosado, algumas vezes é vermelho escuro, e mesmo em alguns casos é arroxeado, outras vezes é cuprico. Ellas não são dolorosas, e nem são a sede de ardor ou prurido. Podem ser discretas ou confluentes. Podem ser seccas ou humidas; as da pélle quasi sempre são seccas, as das mucosas de ordinário são humidas. As placas syphiliticas podem-se desenvolver de duas maneiras : ou sobre superfícies sãs, ou então ser o resultado da transformação in situ de cancros. No primeiro caso, observa-se uma pequena elevação rosada ou vermelha, granulosa, que vai-se tornando circular, e é forrada por uma lamina epithelial, debaixo da qual se depõe serosidade ; depois a lamina rompe-se, deixando a descoberto uma superfície de um vermelho vivo, a qual não tarda em cobrir-se de uma matéria" plástica esbranquiçada. A transformação in situ do cancro em placa mucosa, pôde fazer-se do centro para a circumferencia ou vice-versa. O contorno do cancro vai levantando-se, tornando-se violaceo, emquanto que o centro está ainda ulcerado e granuloso ; pouco a pouco opera-se a cicatrização, uma pellicula cobre a superfície uleerada, e o cancro é completamente transformado em placa mucosa. E o modo mais freqüente. As placas syphiliticas das mucosas dão logar ao corrimento de um liquido muciforme e plástico, de um cheiro fétido característico. Muitas vezes este liquido se concreta em crôstas amarelladas espessas. A duração das placas syphiliticas varia entre mezes e annos. Ellas deixam maculaturas e algumas vezes cicatrizes enru- gadas. As humidas são eminentemente contagiosas. Os autores - 35 — distinguem muitas variedades de placas syphiliticas. taes como opalinas, ulceradas, diptheriticas, vegetantes. condylomatosas, etc. As placas syphiliticas, são ordinariamente acompanhadas de outros svmptomas, dependentes da mesma diathese, taes como roseola syphilitica, syphilide papulosa, alopecia, etc. ARTIGO IV. Syphilide vesiculosa. A syphilide vesiculosa consiste em pequenas empo Ias, contendo serosidade, que se desenvolvem sob a influencia da diathese syphilitica. E uma fôrma das mais raras. Admittimos três variedades de syphilide vesiculosa : a varioliformc, a eczematosa e a herpetiforme. A varioliforme é caracterisada por vesiculas disseminadas, ora acu- minadas, ora globulosas e algumas vezes umbelicadas, cheias de uma serosidade que se turva rapidamente. A base de cada vesicula é rodeada de uma areola francamente cuprica. A eczematosa é carac- terisada por pequenas vesiculas, dispostas em grupos irregula- res, ou disseminados aqui e alli. Ellas são mais volumosas e mais resistentes que as vesiculas do eczema herpetico, e tem a base rodeada de uma areola cuprica. A herpetiforme é caracterisada por vesiculas globulosas, do volume de um grão de milho ou de uma groselha. de base cuprica, podendo achar-se dispostas em grupos irregulares, ou então umas ao lado de outras, de modo a for- marem círculos ou anneis concentricos, como na herpes circinada A marcha d'esta syphilide, como das demais, é lenta, chronica. A duração da fôrma vesicular é curta, mas o mesmo não acon- tece para as placas escamosas, assim como para as papulas, que de ordinário substituem as vesiculas. Não é acompanhada de - 36 — modificação da sensibilidade cutânea. Com ella coincidem, porém, outras manifestações da syphilis. A terminação é, de ordinário, a resolução. ARTIGO V. Syphilide pustulosa. A syphilde pustulosa é uma variedade muito freqüente. O seu caracter anatômico principal' é o de começar por uma pús- tula. Ella pôde manifestar-se sob a fôrma de acne ou de ecthyma. A acne syphilitica pôde manifestar-se em todos os pontos da superfície cutânea, mas parece ter decidida predilecção pela parte posterior do tronco e pelos membros inferiores. É caracterisada por pequenas saliências discretas, isoladas, do diâmetro de uma lentilha. A côr d'estas saliências é bem característica, é cuprica. Estas saliências acham-se irregularmente espalhadas sobre diversos pontos ; suppuram incompletamente, e terminam por uma cicatriz de uma extensão muito menor do que a do botão ao qual succedem. É principalmente nos membros que estas pústulas são características: são achatadas, sobretudo na base, que é mais larga, tem uma côr cuprica, tendo sido antes vermelha. Appa- recem debaixo da fôrma de uma pequena lentilha, cujo ponto central torna-se proeminente pela presença de uma pequena collecção purulenta que, no fim de dous a três dias, desapparece, tomando então o botão um outro aspecto: o de uma elevação como que papulosa, cuprica, um pouco resistente ao dedo, offerecendo no ápice uma cicatricula deprimida, algumas vezes perfurada inteiramente no centro, rodeada durante algum tempo de pequenos restos epi- dérmicos. Esta erupção deixa o seu caracter pustuloso, epoderiamos — 37 — classifical-a entre as papulas, se não víssemos chegar nova erupção, que restitue á primeira o seu caracter primitivo. O ecthyma syphilitico è mais freqüente e mais grave que a fôrma precedente. É caracterisado por pústulas do volume de uma avelã, mais ou menos, rodeadas de uma areola cuprica. A base d'estas pústulas offerece, de ordinário, certa dureza. Estas pústulas se estendem por todo o corpo, e são isoladas. Esta dissemi- nação da erupção é caracter diagnostico importante. As pústulas ecthymaticas podem-se desenvolver primitivamente; a empola purulenta pôde ficar muitas semanas estacionaria, sem se despedaçar e nem se dessecar. Depois as pústulas se transformam em crôstas escuras, geralmente pouco espessas, em baixo das quaes encon- tram-se ulcerações ordinariamente superficiaes e circumscriptas por uma areola cuprica; estas ulcerações não tardam em cicatrizar, deixando em seu logar cicatrizes brancas, deprimidas, muito caracterís- ticas, as quaes têm sido precedidas de maculaturas lividas. A syphilide pustulosa nãoé acompanhada de dor ou prurido. A sua marcha e duração são longas. Ella é acompanhada dos symptomas, filhos da mesma causa, que acompanham as demais syphilides. ARTIGO VI. Syphilide em bolhas. D'esta fôrma de syphilide descrevem os autores duas variedades: o pemphigus e o rupia syphiliticos. O pemphigus syphilitico, que tem sido muito mais freqüentemente observado nas crianças, é caracterisado por uma ou muitas bolhas que se mostram na palma das mãos ou na planta dos pés; em casos — 38 - raros tem-se visto bolhas de pemphigus syphilitico em toda a superfície do corpo. Estas bolhas, largas, achatadas, pouco distendidas, desigualmente arredondadas, cheias de um liquido sero-purulento, rodeadas de uma areola livida, são mais ou menos do volume de uma avelã. Raras vezes o liquido se desseca, para formar uma crôsta escura; ordinariamente a bolha arrebenta-se, o liquido derrama-se, e em muitos casos á bolha succede uma ulceração. 0 rupia syphilitico, conhecido por alguns pelos nomes de pústula ostracosce, ostreosce, é um symptoma tardio e uma fôrma rara da syphilis. Pôde ser observado em todos os pontos da superfície cutânea, mas é mais freqüente nos membros inferiores, nas espaduas, costas e fonte. As bolhas do rupia se desenvolvem do seguinte modo: a pélle torna-se rubra e dolorosa em um ponto; n'esse ponto o epiderma levanta-se e enche-se de serosidade; a bolha, assim constituída, torna-se ichorosa ou sero-purulenta; ao cabo de pouco tempo estas bolhas se transformam em crôstas espessas e escuras, as quaes acobertam ulceras arredondadas e cinzentas, profundas, talhadas a pique. Estas crôstas são desiguaes, rugosas, ordinariamente arredondadas e rodeadas de uma areola de um vermelho livido. As ulcerações, que succedem ás crôstas, cicatrizando-se, deixam em seu logar maculaturas lividas, e mais tarde cicatrizes brancas, redondas e deprimidas, que são stigmates indeléveis da anterior existência da erupção A syphilide bôlhosa tem uma marcha essencialmente chronica ; a sua duração é longa. Não é acompanhada, em geral, por modificações da sensibilidade cutânea ; mas é acompanhada de outros symptomas syphiliticos, taes como ulceras do pharynge, albuginite syphilitica, irite syphilitica, exostoses, emfim de symptomas do segundo e já também do terceiro período da syphilis. — 39 — ARTIGO VII. Syphilide maculosa. A syphilide maculosa, pigmentaria de Hardy, vitiligo syphilitico de Bazin, é caracterisada por manchas cinzentas e brancas, as quaes não fazem saliência acima da pélle, não offerecem descamação, parecendo situadas em baixo do epidemia. A côr cinzenta d'estas manchas não é tão accentuada como a das placas do pityriasis versicolor; esta côr se approxima da côr do café com leite. A grandeza das manchas oscilla entre a de uma peça de 50 centi- mos e a de um franco; os seus bordos são desiguaes, quasi que não se destacam, por seu colorido, da pélle que as circumscreve. Ellas exaltam de tal modo a brancura da pélle, que em muitos casos pôde acreditar-se que o que constitue a lesão pathologica não é a macula, mas sim a pélle branca que a rodêa. Estas máculas podem achar-se isoladas, porém o mais freqüente é acharem-se reunidas em grupos na mesma região. A sede de predilecção d'esta syphilide é o pescoço (Pillon), mas pôde também encontrar-se em outros pontos, como o peito, a fronte, as pernas. Observa-se muito mais freqüentemente nas pessoas de pélle fina, delicada. A sua marcha é variável: ás vezes desapparece ao cabo de um ou dous mezes, outras vezes, o que é mais eommum, persiste indefinida- mente, mostrando-se muito rebelde, muito tenaz, resistindo por muito tempo á acção medicamentosa. Não é acompanhada de dôr ou prurido, mas é, em geral, acompanhada por outros symptomas da syphilis secundaria. - 40 — ARTIGO VIII. Syphilide escamosa. A syphilide escamosa, como fôrma primitiva, é rara; as escamas apparecem ordinariamente nos últimos períodos das erupções syphi- liticas vesiculosas, papulosas e tuberculosas. Entretanto, comquanto rara, não é possível negar-se a existência da syphilide escanusa primitiva, da qual admittimos três variedades: syphilide escamosa em gottas, syphilide escamosa circinada e syphilide escamosa palmar e plantar. A syphilide escamosa em gottas (Hardy), também chamada psoriasis syphilitico, é caracterisada por manchas arredondadas, ape- nas salientes, cupricas, da largura de três millimetros a um centíme- tro. Estas manchas são cobertas em parte por escamas muito finas, brancas e não imbricadas. Ao cabo de algumas semanas, as saliên- cias diminuem, as escamas cahem, e restam maculaturas mais ou menos arredondadas, regulares, de um colorido manifestamente cuprico. Em alguns casos observam-se descamações successivas, sendo as escamas cada vez mais finas. Os logares de predilecção d'esta syphilide são o tronco e os membros, principalmente os superiores. A syphilide escamosa circinada é sobretudo caracterisada pela dis- posição circular ; é mais freqüente que a primeira. E constituída por manchas vermelhas escuras, pouco salientes, formando circulos, seg- mentos de circulo, cujo centro é ordinariamente são. Sobre estas manchas, cuja grandeza de ordinário não excede a de uma peça de um ou de dous francos, notam-se escamas brancas, muito finas e não imbricadas. Depois a saliência apaga-se pouco a pouco, as escamas cahem, e restam manchas cupricas que desapparecem mais tarde. Ella se assesta ordinariamente na face e no pescoço; é também - 4t - freqüente ao redor dos lábios e no mento ; raramente occupa os mem- bros, e quando isso acontece, ella se assesta para dentro do cotovello e do concavo poplitêo, e não para fora, como o psoriasis vulgar. A syphilide escamosa palmar e plantar é caracterisada por manchas um pouco salientes, arredondadas, de uma côr francamente cuprica, cobertas de escamas duras, cinzentas. Estas manchas ora são isoladas, ora confluentes, formando n'este ultimo caso uma placa, que se estende algumas vezes, na mão, até o punho, e remonta, nos pés, até os ma- leolos. Esta placa, em conseqüência de movimentos, fendilha-se, for- mando fendas, rhagadas, muitas vezes extremamente dolorosas. Nos limites das escamas, encontra-se uma orla (liséré) vermelha escura, que apparece sob a fôrma de segmento de circulo. Quando a erupção invade toda a palma das mãos ou a planta dos pés, a sua marcha é extremamente lenta , prolongando-se muitas vezes durante mezes e mesmo durante annos. A syphilide escamosa, como as demais syphilides, é acompanhada por outros symptomas, dependentes da mesma diathese ; não é acom- panhada de modificações da sensibilidade cutânea. ARTIGO IX. Syphilide tuberculosa. Os tuberculos syphiliticos da pélle são tumores indolentes, arre- dondados, do volume de uma ervilha e algumas vezes de uma avelã, de consistência firme e côr francamente cuprica. Na syphilide tuber- culosa os tuberculos podem achar-se disseminados, e n'esse caso a erupção é precoce, ou podem achar-se em grupos circumscriptos, e n'esse caso a erupção é tardia. Trataremos separadamente d'estas duas variedades. 3 6 — 42 - §1.° Syphilide tuberculosa disseminada.— E caracterisada pelo desenvolvimento de tuberculos arredondados, do volume de uma ervilha, de uma côr vermelha sombria. Os tuberculos são dissemina- dos por toda a superfície do corpo, affectando, na maioria dos casos, a fôrma de círculos, de semi-circulos, mais ou menos regulares. No fim de certo tempo, elles se cobrem de uma escama branca e delgada ; não se ulceram ; algumas vezes entretanto dão logar a uma pequena cicatriz branca, deprimida ; porém esta cicatriz, que é precedida de maculaturas lividas, ordinariamente não persiste. A syphilide tuberculosa disseminada , como fôrma precoce que é , pôde ser precedida pelos symptomas geraes e precursores, que, dis- semos, soem preceder o apparecimento das syphilides em geral ; e é quasi sempre acompanhada por outros symptomas da syphilis secun- daria, taes como cephaléas, dores rheumatoides, placas mucosas, papulas, pústulas, etc. §2.° Syphilide tuberculosa em grupos circumscriptos.— Esta variedade pôde mostrar-se debaixo de três fôrmas differentes : a.) syphilide tuberculosa em grupos não ulcerados; b.) syphilide tuber- culo-serpiginosa; c.) syphilide tuberculo-ulcerosa. a.) Syphilide tuberculosa em grupos não ulcerados. N'esta fôrma os tuberculos offerecem os aspectos mais diversos : em alguns casos apenas fazem uma ligeira saliência embaixo da pélle, em outros tem o volume de uma avelã. Elles affectam uma fôrma ora elliptica, ora em semi-circulo, ora emfim em circulo com- pleto. N'este ultimo caso elles se desenvolvem do modo seguinte : um ou muitos tuberculos apparecem ao principio sobre um ponto dado; resolvem-se logo, deprimem-se, e deixam em seu logar uma maculatura carregada ; outros tuberculos se desenvolvem ao redor dos primeiros, e se comportam do mesmo modo ; emfim novos tuberculos nascem ainda, e o circulo acha-se assim augmentado, offerecendo a seguinte disposição : a parte central, unida, sem a menor saliência, é de uma côr mais escura que a da pélle circum- - 43 - vizinha ; ao redor d'este centro, que pôde ser composto de macu- laturas lividas ou de cicatrizes mais ou menos regulares. encon- tram-se verdadeiros tuberculos não ulcerados. Se esta gênese de tuberculos é irregular, isto é, se uns têm desenvolvimento normal ao passo que outros não o tem, em vez de um circulo completo, poderemos observar fragmentos de circulo mais ou menos extensos. Estes tuberculos, assim grupados, offerecem ainda uma dispo- sição variável : ora uns invadem os outros, ora estão isolados, de modo que se poderia cortal-os da pélle sobre a qual se acham implantados. A sua côr ao principio é vermelha viva, depois torna-se livida, cuprica. São muito freqüentes nos lábios, no nariz, cujas azas são por elles destruidas, no omoplata, na região deltoidéa, na face posterior e externa do antebraço, e nas pernas. h.) Syphilide tuberculosa serpiginosa. Esta variedade começa por muitos tuberculos, ora regularmente dispostos, ora invadindo uns aos outros. Estes tuberculos se amollecem logo, e a pélle ulcera-se ; estas ulcerações são superficiaes, e algumas vezes cobertas de crôstas pouco espessas; ás vezes, entretanto, não ha crôstas. O que caracterisa esta erupção é a extensão da ulceração em superfície. Algumas vezes ella se estende, sem que em nenhum ponto haja tendência á cicatrização ; outras vezes, ao contrario, vê-se uma cicatriz violacea substituir os tecidos primitivamente ulcerados ; porém então a affecção ganha de um lado, quando se cura do outro. Uma cicatriz branca, muito delgada, succede mais tarde a estas cicatrizes roxas. As ulcerações serpiginosas são algu- mas vezes rodeadas de uma areola cuprica. c.) Syphilide tuberculo-ulcerosa. Esta fôrma comprehende duas variedades: a syphilide tuberculo-crustacea e a syphilide gommosa. 1.° Syphilide tuberculo-crustacea. — N'esta variedade, os tu- berculos occupam a espessura da pélle ; elles offerecem em seu apicè pontos purulentos. que se reúnem para formar uma crôsta - 44 — única. Esta crôsta, esverdinhada, muito espessa, rugosa, cobre uma ulceração que apresenta os seguintes caracteres : bordos arredondados, talhados a pique, duros, roxos ou d'um vermelho escuro; fundo desigual, cinzento e banhado de pus que se accumula em baixo da pélle. Se levantarmos estas crôstas, uma outra se produz logo e a ulceração augmenta. A tendência á extensão, própria da fôrma serpiginosa, se acha também aqui; somente, em vez de ganhar em superfície, esta ulceração se estende em pro- fundidade, sendo por isso que muitos autores a denominam syphilide perfurante. A esta fôrma prende Follin a syphilide pustulo- crustacea de Bazin, que só differe da primeira quanto á lesão elementar que, além de um tuberculo, pôde também ser um impe- tigo, um ecthyma ou um rupia. 2.° Syphilide gommosa (Bazin). —N'esta variedade os tuberculos se desenvolvem no tecido cellular sub-cutaneo ; elles rolam em baixo do dedo, e parecem achar-se presos por um pediculo estreito á parte profunda do derma. O seu volume varia entre o de uma ervilha e o de uma avelã. Elles podem terminar pela resolução, mas isso é raro ; de ordinário, a pélle que os cobre torna-se arroxeada, estabelecem-se adherencias mais completas entre ella e o tuberculo, depois este se amollece e a pélle ulcera-se. Esta ulceração tem bordos duros, talhados a pique, algumas vezes rodeados de uma areola cuprica; emfim toda a circumferencia offerece os caracteres já descriptos, próprios ás ulcerações dos tuberculos syphiliticos. O fundo somente offerece differenças: é constituído por uma matéria amarellada, concreta, semelhante ao carnicão. Esta ulceração, estendendo-se sempre, pôde trazer a destruição dos órgãos sub- jacentes : dos ossos do nariz, da abobada palatina, por exemplo. A disposição d'estes tuberculos ulcerados é a mesma que a dos não ulcerados. No fim de um tempo assaz longo, e sob a influencia de um tratamento bem dirigido, dá-se a cicatrização: botões carnudos — 43 — nascem do fundo da ulcera, e cicatrizes, li vidas ao principio, depois brancas e deprimidas, algumas vezes percorridas por arborisações vasculares e por bridas, succedem aos tuberculos. Estas arborisa- ções vasculares e bridas encontram-se sobretudo nos casos de syphilide serpiginosa. Ha uma disposição particular das cicatri- zes, que convém mencionar : é quando estas offerecem pequenos pontos cicatriciaes, deprimidos, que as circumscrevem. Esta dis- posição é por alguns considerada como característica das cicatrizes syphiliticas. Os tuberculos da syphilide gommosa podem achar-se isolados ou em grupos, e n'este ultimo caso as suas ulcerações podem reunir-se. A marcha é essencialmente chronica, os tuberculos podem durar annos. A terminação ou é a ulceração ou a resolução, n'este ultimo caso elles deixam depressões lividas. A syphilide tuberculosa não é acompanhada de modificações na sensibilidade cutânea; mas é acompanhada não só das outras mani- festações da syphilis secundaria, mas ainda muito freqüentemente é acompanhada dos symptomas da—cachexia syphilitica. - 46 - SEGUNDA PARTE- Das moléstias cutâneas de origem não syphilitica. As moléstias cutâneas não syphiliticas são innumeraveis; um tratado sobre cada uma d'ellas, embora summario, sobre ser inútil ao fim do nosso modesto trabalho, seria muito superior ás nossas minguadas forças. Ha um grande numero de moléstias cutâneas não syphiliticas, que nunca foram e nem podem ser confundidas com as syphiliticas, salvo o caso de crassa ignorância por parte do pratico. Acreditamos que marcharemos de conformidade com o pensamento do illustre professor da nossa Escola, que deu o presente ponto, e cuja perda todos nós ora pranteamos, se nos occuparmos somente d'aquellas moléstias cutâneas que, em casos dados, podem offerecer semelhanças com as de natureza syphilitica, e portanto dar lugar a enganos de diagnostico. Trataremos, portanto, n'esta parte somente das moléstias cutâneas não syphiliticas que apresentarem relação de semelhança com as syphilides, para melhor chegarmos ao nosso fim, que é: mostrar em que umas differem de outras. Ora, as moléstias cutâneas que até certo ponto podem, em casos dados, confundir-se com as manifestações cutâneas da syphilis, são as moléstias dartrosas, principalmente algumas fôrmas, as manifesta- ções da scrophula, sobretudo algumas d'ellas, algumas moléstias parasitárias, e finalmente a elephantiasis dos gregos. Portanto dividi- remos esta parte em quatro capítulos, tratando: No Io, das manifestações herpeticas ou dartrosas; D+�� — 47 - No 2o, das manifestações cutâneas da scrophula; No 3o, das moléstias parasitárias, principalmente de algumas fôrmas; No 4o, finalmente, das manifestações cutâneas da lepra tuberculosa ou elephantiasis dos gregos. CAPITULO I. Das affecções herpeticas ou dartrosas. Dividiremos este capitulo em dous artigos, tratando no primeiro das manifestações dartrosas, consideradas em geral, e no segundo d'essas manifestações, consideradas em particular. ARTIGO I. Das herpetides em geral. § 1.° Esboço histórico, definição e synonymia. — Todas as affecções cutâneas, com tendência á perpetuidade, generalisação e reincidência, eram indistinctamente designadas pelos antigos pela denominação de dartro, velha expressão franceza, synonymo da palavra grega e latina — herpes. Comprehende-se que, assim proce- dendo, os antigos confundiam moléstias de naturezas essencialmente differentes. - 48 - E foi isto que, com facilidade demonstraram Willan e Bateman, os quaes com razões sólidas fizeram sentir quão vaga e indeterminada era a palavra — dartro, proscrevendo-a, talvez sem consultar bem os interesses da sciencia, do vocabulário nosologico. Entretanto esta condemnação não ficou definitiva: Alibert primeiro, depois Bazin e Hardy, procuraram, segundo a expressão d'este ultimo, restituir a palavra — dartro o seu direito de cidade na linguagem scientifica; e tirando o que ella tinha de vago e indeterminado, deram-lhe uma significação restricta. A palavra dartro, segundo elles, exprime uma unidade pathologica, perfeitamente demonstrada pela tradição e pela observação; indica uma moléstia constitucional, uma diathese, que se traduz por erupções sobre as membranas tegumentarias externa e interna, e mais rara- mente sobre outros órgãos. Hoje a palavra dartro, com essa significação precisa e bem deter- minada, é geralmente aceita no mundo scientifico. Bazin inventou a expressão herpetismo como synonymo de vicio-dartroso, expressão que também é geralmente aceita pelos práticos. Na nossa these nos serviremos indistinctamente das expressões — vicio dartroso, dartros, diathese dartrosa, diathese herpetica, herpetismo, que consideramos synonymos. As manifestações cutâneas dos dartros ou do herpetismo são chamadas herpetides, expressão também da creação de Bazin e que tem prevalecido. § 2.° Symptomas geraes e precursores. — Comquânto na grande maioria dos casos as erupções dartrosas não offereçam symptomas geraes, propriamente prodromicos, salvo o caso de reves- tirem uma fôrma aguda, todavia é certo que, embora a diathese herpetica esteja latente, embora ainda não existam manifestações cutâneas, em muitos casos ha certos symptomas que podem ser considerados precursores, pois que denunciam o herpetismo, cujas manifestações cutâneas não podem tardar. - 49 - As pessoas dartrosas, embora em apparencia gozem de perfeita saúde, experimentam phenomenos particulares, offerecem accidentes especiaes, que não deixam de chamar a attenção de um observador consciencioso. Os indivíduos dartrosos offerecem ordinariamente modificações no caracter: tornam-se melancólicos, tristes, hypochondriacos; outras vezes são muito irascivels. O seu envoltório tegumentario externo é habitualmente secco, nelle a transpiração não se produz senão difíi- cilmente e de uma maneira passageira. A pélle offerece uma suscep- tibilidade extrema e uma facilidade excepcional em experimentar as influencias mais ligeiras e as mais fugazes : ora é um excitante geral, como excesso alcoólico, abuso do café , vigílias, uso de certos alimen- tos, como lagosta, caranguejo, etc.; ora é um excitante local, que dá logar a uma erupção, muitas vezes ephemera, mas que revela uma predisposição particular da economia e a existência do vicio latente, que só espera uma occasião favorável para manifestar-se. A pélle é ainda a sede de mordieações vivas, de pruridos, que se assestam particularmente no ânus e nas partes genitaes, onde podem adquirir tal intensidade que dê logar, sobretudo nas crianças, a hábitos vi- ciosos. O appetite é em geral bem desenvolvido, sendo um facto perfeitamente conhecido que os dartrosos consomem uma quanti- dade de alimentos muito mais considerável do que outros doentes collocados em condições análogas, isto é, isentos de febre. Em algunis casos, podem-se observar, quando a erupção tem de fazer-se, alguns outros symptomas que a denunciam : emmagrecimento, des- arranjo nas funcções digestivas, nevroses diversas, como nevralgia intercostal, sciatica, cephalalgia franca, gastralgia, sendo esta ultima caracterisada por dores lancinantes e acompanhada de vômitos. Esses symptomas, entretanto, são raros, só excepcionalmente são observados, pois quasi sempre o que se observa é, como acima dissemos, a saúde apparente do doente, acompanhada dos symptomas do estado que bem poderia ser denominado constituição herpetica. 3 1 no — | 3.° Signaes próprios e communs.— Os signaes próprios e communs ás herpetides merecem muito especial attenção da nossa parte, pois constituem um dos elementos capitães de que nos ser- viremos na terceira parte d'este trabalho. Esses signaes devem ser procurados : Io, na sede das herpetides ; 2o, no seu modo de desenvolvi- mento ; 3o, na disposição das erupções', 4o, na disposição dos elementos eruptivos; 5o, na simplicidade das lesões primitivas; 6 o, nas modificações da sensibilidade cutânea; Io, na côr; 8o, na natureza dos productos secretados; 9o, na marcha; 10, na duração; 11, na terminação; 12, na reincidência; 13, no tratamento. 1. ° Sede. — Pela consideração da sede se pôde chegar ao conhe- cimento do principio dos dartros ( Poupart). As herpetides podem manifestar-se em todos os pontos do corpo, ellas podem invadir o tronco, a cabeça, os membros; entretanto, ha alguns pontos que pa- recem gozar mais que outros da triste predilecção d'essas erupções; é assim que, segundo Bazin, nas crianças, a cabeça é o ponto pre- dilecto por onde começam não só as erupções dartrosas, mas ainda todas as que são próprias d'essa idade ; no adulto os dartros são mais freqüentes, em geral, nos pontos onde existem superfícies em con- tacto, como a margem do ânus, a parte interna das coxas, as axillas, as mamas, etc., e nas articulações no sentido da flexão, como no concavo poplitêo, no cotovello, etc. Quanto á sede anatômica das herpetides, ella é, de ordinário, na rede vascular e corpo-papillar do derma (Bazin); sendo por isso que as herpetides se estendem em grandes superfícies e se desenvolvem em todas as regiões. 2.° Modo de desenvolvimento.— Os dartros têm uma grande tendência a invadir muitas regiões ao mesmo tempo; raramente ficam circumscriptos a um só ponto do corpo. Pôde acontecer que, primi- tivamente circumscriptas a um ponto, d'ahi se irradiem e ganhem as partes vizinhas; ou então, podem attingir pontos mais ou menos afastados uns dos outros ; outras vezes offerecem uma grande mobi- lidade, de modo que desapparecem ou se reproduzem, ora sobre as - 51 - mesmas, ora sobre regiões differentes. Releva , entretanto, notar-se que casos ha nos quaes não se dá essa mobilidade: nesses, as erup- ções percorrem no mesmo logar a sua evolução, respeitando as partes vizinhas. Esses casos, entretanto, são raros. 3.° Disposição das erupções. — Observa-se nas erupções hcr- peticas uma symetria notável, que chama logo a attenção do obser- vador. V assim que ellas occupam de ordinário regiões que se cor- respondem : as partes lateraes do pescoço, a parte interna das duas coxas, os dous lados da face, os dous lados da região gluttea, as pre- gas de cada membro, etc. Tivemos occasião de observar em 1873, na província de Minas, na freguezia de SantAnna do Sapucahy, um caso muito interessante, de eczema generalisado, em um menino de 9 annos, filho de uma das principaes famílias do logar, no qual a disposição sy métrica da erupção prendia logo a attenção : haviam placas de eczema nos dous pomos, nas duas espaduas, nas duas metades lateraes das costas, nos dous lados da região gluttea, nas duas coxa», nos dous jumellos e nos braços : a erupção era typica; o eczema estava muito bem caracterisado. Entre as placas haviam espaços de pélle sã. Esta symetria é um elemento muito precioso para o diagnostico. 4.° Disposição dos elementos eruptivos.— Os elementos erup- tivos ao principio são geralmente isolados e disseminados sobre uma grande superfície; depois se reúnem e formam pequenas placas, que se confundem por sua vez e se estendem a uma ou a muitas regiões do corpo. Nos últimos períodos do herpetismo, o doente pôde ficar coberto da cabeça aos pés de um envoltório escamoso (Bazin). Os contornos dos elementos eruptivos do herpe- tismo, assim como os da erupção herpetica em geral, são sinuosos, irregulares. 5.° Simplicidade das lesões primitivas.— E um caracter digno de menção, porque é exclusivo ás herpetides, e tanto assim é, que as lesões, tomadas pela escola de Willan como typos das suas — 52 — descripções, pertencem ao herpetismo. Ao contrario, as moléstias compostas, as lesões mixtas (Dévergie) são com freqüência observadas nas syphilides e scrophulides. Esta simplicidade dos elementos eruptivos das affecções herpeticas, entretanto, só se observa nos seus primeiros períodos ; nos últimos períodos, as erupções cutâneas são tão variadas e confundidas, que é impossível reconhecer a lesão primitiva. 6.' Modificações da sensibilidade cutânea.—Incontestavelmente a existência de ardor, coceira, mordicação, prurido, é um dos signaes mais preciosos para estabelecer-se o diagnostico entre uma syphilide e uma herpetide : é signal que quasi não falha. O prurido pôde revestir caracteres diversos : ás vezes é tão intenso que se torna atroz e insupportavel ao infeliz doente, que com as unhas destróe o epiderma e pôde mesmo causar lesões profundas do derma, preferindo assim a dor resultante d'essas dilacerações á penosa sensação de — comichão: um prurido continuo e muito intenso, como se pôde observar no prurigo ferox, pôde conduzir o doente á alienação mental e mesmo ao suicidio ; outras vezes, o prurido é comparável á sensação que seria produzida pela presença de uma multidão de insectos em movimento sobre a pélle (formi- gamentó); em outros casos, elle se traduz por um sentimento de pungencia, semelhante ao que resultaria de uma queimadura super- ficial e extensa (ardor, mordicação); emfim, pôde manifestar-se debaixo de outras formas, como picadas, agulhadas, latejamentos. É muito mais intenso durante a noite do que durante o dia ; durante a noite pôde causar insomnias cruéis e debilitantes ; as mudanças de temperatura são também causas que podem despertar e fazer recrudescer o prurido. Elle é pouco pronunciado nas affecções cutâneas caracterisadas por secreções mórbidas abundantes; recipro- camente, é de ordinário muito intenso nas affecções da pélle que não apresentam secreção mórbida apreciável. Assim, o prurido é mais intenso no periodo erythematoso do eczema do que no periodo vesiculoso ; é mais freqüente e mais forte no pityri asis do que no psoriasis : esta ultima affecção é, como se sabe, notável pela abun- dância de escamas. O prurido ordinariamente acompanha as manifestações herpeticas, mas, como já dissemos, pôde precedel-as ; do mesmo modo, persiste algumas vezes depois da sua desapparição, e difficilmente cede aos meios therapeuticos contra elle dirigidos. A intensidade do prurido nada tem de fixo, e depende menos da lesão elementar que do temperamento, do regimen, e do estado geral do doente. Assim, nos individuos nervosos, o prurido é mais desenvolvido e mais tenaz do que nos scrophulosos, nos lymphaticos, n'aquelles enfraquecidos por longos soffrimentos e cuja sensibilidade já se acha mais ou menos embotada, obtusa, e nos quaes portanto as reacções são menos vivas, O prurido, convém que se diga, não é symptoma exclusivo das affecções herpeticas, mas o que é verdade é que n'estas é freqüen- tíssimo, e por isso muito digno de attenção. 7.° Côr.—As herpetides humidas offerecem em geral um colorido rosado, ás vezes um pouco arroxeado. Na fôrma escamosa, as escamas são brancas, algumas vezes nacaradas, podendo entretanto em alguns casos offerecer uma côr mais escura, mais carregada. 8.° Natureza dos productos secretados.—Em geral, as erupções herpeticas determinam secreções mórbidas consideráveis. As herpetides seccas são notáveis por uma producção abundante de escamas, como se observa no psoriasis, no pityriasis, etc; as herpetides humidas são caracterisadas pela secreção de uma grande quantidade de serosidade, como acontece no eczema, no pemphigus, etc. Esta serosidade possue propriedades alcalinas (Bazin). 9.° Marcha . —A marcha das herpetides é essencialmente chronica, tendo ellas muita tendência a ficar estacionarias. Em alguns casos, entretanto, algumas herpetides podem revestir — 54 — uma fôrma aguda, como, por exemplo, o eczema, o impetigo ; isso entretanto é raro; a moléstia ordinariamente prolonga-se durante annos, apresentando quasi sempre alguns intervallos mais ou menos longos de remissão. Ao principio o que caracterisa as herpetides é uma grande mobilidade, só nos seus últimos períodos é que se tornam permanentes (Bazin). 10. Duração.—Sendo a marcha das erupções dartrosas essen- cialmente chronica, a sua duração é muitas vezes indefinida: não é raro observarem-se casos de herpetides que acompanham o indivíduo durante toda a sua existência; outras vezes, ellas duram mezes e annos, e depois, sem causa apreciável, desapparecem. As herpetides seccas são as que, de ordinário, têm uma duração mais longa e que mais lentamente determinam metastases (Bazin). Não queremos, entretanto, dizer que a duração das herpetides seja sempre longa e indeterminada: está claro que, nos casos em que revestem a fôrma aguda, ellas duram pouco. 11. Terminação.—A terminação pela cura radical e absoluta de algumas herpetides é uma excepção rara (Hardy). Todavia existem exemplos de cura, mesmo de dartros inveterados, para o que é preciso que os indivíduos se sujeitem a um tratamento conveniente e muito prolongado. Quando as erupções dartrosas desapparecem, não deixam, em geral, cicatrizes, e isso é um facto muito especial, um verdadeiro signal pathognomonico, uma verdadeira pedra de toque, para differençar as herpetides das syphilides e scrophulides. E verdade que as erupções herpeticas são, de ordinário, acompa- nhadas de ulcerações algumas vezes bastante extensas em superfície, mas essas ulcerações, por serem muito superficiaes, não deixam cicatrizes, salvo raros casos. Essas ulcerações podem, em alguns casos, deixar manchas aver- melhadas ou arroxeadas, que são apenas alteração passageira da — 55 — secreção pigmentaría, porém ellas não persistem, desapparecem depois de algum tempo, e a pélle toma o seu aspecto normal. E o que se observa no rosto das crionças affectadas de impetigo; é coberto de uma mascara de crôstas espessas, que causam apprehensões aos pais de que os filhos fiquem com cicatrizes disformes, mas que, entretanto, desapparecem sem deixar vestigio. Quando o herpetismo mostra-se refractario aos meios contra elle empregados, tomando direito de domicilio no organismo, a perda per- manente determinada pelos productos mórbidos, a falta de somno e de repouso, trazem o enfraquecimento e o marasmo, e então o doente succumbe esgotado pela febre hectica, pela perda continua de suas forças e pela impossibilidade de reparal-as. N'estes últimos períodos não é raro observarem-se manifestações de natureza cancerosa ; todos os autores acham-se de accordo sobre este ponto. 12. Reincidência . —As reincidências constituem um dos caracteres fundamentaes das affecções herpeticas ; são circumstancias fataes da diathese dartrosa. Quando observar-se uma affecção dartrosa, em uma pessoa de certa idade, pôde avançar-se, de uma maneira quasi que certa, que a erupção actual foi precedida de uma ou muitas erupções semelhantes (Hardy). Uma das affecções dartrosas que mais reincide é o psoriasis, o qual, como se sabe, desapparece no inverno, para reapparecer no estio e na primavera. Assim, pois, todas as vezas que uma affecção dartrosa desappa- recer, não se pense que tudo está acabado, que o doente esteja para sempre livre da sua moléstia; de ordinário triumpha-se da manifes- tação local, mas não da diathese; os dartros são inveterados e re- beldes. A época e o modo de successão das reincidências são extremamente variáveisj, são subordinados a condições de temperamento, idade, regimen, gênero de vida e hábitos dos doentes. — 56 — Algumas vezes as reincidências mostram-se no fim de algumas semanas ou de alguns mezes; outras vezes, no fira de muitos annos. 13. Tratamento arsenical e sulphuroso .—O tratamento é um meio de que, em casos duvidosos, se pôde lançar mão, como po- dendo esclarecer o diagnostico. r E por isso que mencionamos o tratamento pelo arsênico e pelo enxofre no numero dos caracteres próprios e communs ás herpetides, do mesmo modo que mencionamos o tratamento mercurial entre os caracteres próprios e communs ás syphilides. Voltaremos sobre este ponto na terceira paute, mostrando quaes as vantagens que resultam para o diagnostico do emprego de certas substancias medicamentosas. § í.° Symptomas concomitantes.— Na maioria dos casos, as affecções herpeticas cutâneas não são acompanhadas, durante a sua evolução, de accidentes geraes, taes como máo estar, perturbações no exercício das funcções, etc.; ellas se conciliam perfeitamente com o exercício regular das funcções de nutrição, e com as condições de uma boa saúde habitual. Casos ha, entretanto, nos quaes podem observar-se, concomitante- mente com as herpetides, certos symptomas, dependentes uns da própria diathese herpetica, outras da cachexia d'ella resultante, os quaes merecem menção. É hoje opinião corrente entre os autores que as manifestações do herpetismo não se fazem somente para o lado da pélle: ellas podem apresentar-se também em outros tecidos, notavelmente para o lado das mucosas. Pois bem: da localisação do herpetismo sobre outros tecidos, opi- nião que aceitamos, resultam desordens diversas para o lado das mucosas, para o lado do systema nervoso, para o lado das visceras, desordens que, embora succintamente, devemos fazer conhecer. A localisação do( herpetismo sobre as mucosas, ao mesmo tempo — 57 - que se fazem manifestações da mesma diathese para a pélle, dá em resultado affecções diversas, que passamos a mencionar. Antes d'isso, porém, seja-nos licito dizer que o herpetismo pôde manifestar-se nas mucosas, assim como em outros tecidos da eco- nomia, primitivamente, seja independente de qualquer manifestação cutânea, seja simultaneamente com manifestações d'esta espécie ; assim como pôde passar da pélle ás mucosas por propagação. De um modo ou de outro, observam-se phenomenos para o lado das mucosas, os quaes denunciam phlegmasias diversas. Para o lado da mucosa oculo-palpebral, podem observar-se ophthalmias diversas; da mucosa bronchica, bronchites e catarrhos pulmonares, da pituitaria, corysa; da mucosa buco-pharyngeana stomatites, anginas granulosas; das mucosas intestinal, urethral e vaginal, podem observar-se enterites, cystites e vaginites, produzindo diarrheas, blenorrheas e leucorrheas. Assestando-se no systema nervoso o herpetismo, ahi pôde produzir moléstias diversas, taes como cephalalgias, gastralgias, nevralgia intercostal, cubital, sciatica, etc. Estas nevralgias são em geral vivas, lancinantes, e mesmo tenebrantes, podendo ser produzidas ou augmentadas pelas emoções moraes. Mesmo o grande svmpathico pôde ser affectado, o que se manifesta por eólicas seccas, e na mulher por dores nevrálgicas uterinas. Nos últimos períodos do herpetismo, as modificações de caracter do indivíduo, já assignaladas, tornam-se mais accentuadas: a iras- cibilidade é maior, a exaltação do cérebro é considerável, a me- melancolia é extrema, o individuo pôde cahir na alienação mental. N'esses períodos apresentam-se os symptomas da cachexia herpetica: a anorexia é completa, a diarrhéa colliquativa, manifesta-se a febre hectica, ha albuminuria, embora passageira, formam-se collecções 3 8 - 58 - hydropicas diversas, e o indivíduo cahe no marasmo e se extingue em um verdadeiro esgotamento. Essa terminação do herpetismo, entretanto, não è das mais freqüentes. ARTIGO II. Das herpetides em particular. Aceitando a divisão das herpetides em seccas e secretantes, consi- deraremos entre as primeiras o erythema, o prurigo e a urticaria, e entre as segundas o pswiasis, o pitymasis, o lichen, a acne, a herpes, o eczema, o impetigo} o pemphigus, o rupia e o ecthyma, que são as principaes fôrmas do herpetismo que, em casos dados, podem offere- cer semelhanças com as syphilides, dando logar a erros de diagnos- tico. Trataremos resumidamente de cada uma d'estas fôrmas. § I.° Do erythema.— E uma affecção da pélle caracterisada por manchas congestivas, vermelhas ou rosadas , largas , não occasio- nando prurido pronunciado, desapparecendo pela pressão do dedo, e terminando no fim de um ou dous septenarios pela resolução, apre- sentando ou não uma ligeira descamação. Quando as manchas são pequenas, arredondadas, regulares, o erythema chama-se roseola. O erythema pôde annunciar-se por alguns symptomas precursores, mas pôde também apparecer sem prodromos. As suas manchas, vermelhas, congestivas, ao principio são diffusas, depois tornam-se circumscrip- tas; podem conservar até o fim o seu colorido, mas podem também tornar-se mais escuras, carregadas; a sua superfície pôde ser plana, lisa, mas pôde offerecer saliências, papulas, tuberculos; podem con- fundir-se insensivelmente com a pélle vizinha, ou offerecer um relevo, um bordelete, em sua circumferencia. Estas manchas podem ser — 59 — pequenas, ou occupar toda uma região, ellas desapparecem completa- mente pela pressão do dedo ; muitas vezes estas manchas offerecem prurido, e terminam por uma ligeira descamação epidérmica. As causas do erythema são variadas ; aqui só tratamos do erythema herpetico. A marcha é, de ordinário, rápida, e a duração ephemera. Os autores descrevem um grande numero de variedades de erythema, ms principaes das quaes são : o circinatum, o marginatum, opapulaium, o tuberculatum e o nodosum, cujos nomes por si mesmos se definem. § 2.° Do prurigo.—0 prurigo é uma erupção cutânea constituí- da por pequenas saliências, pouco elevadas, cheias, resistentes, eque dão logar a um prurido intenso. Os doentes, de ordinário, destroem estas saliências com as unhas, do que resulta um ligeiro corrimento sangüíneo, que se concreta, formando pequenas crôstas ennegrecidas. O prurido é intensissimo, e isso faz com que os doentes dilacerem a pélle com as unhas, causando excoriações mais ou menos extensas. Também em conseqüência da intensidade do prurido, os doentes soffrem insomnias, anorexia, dyspepsia, do que resulta o emmagreci- mento, e mesmo o estado cachetico. Em alguns casos a erupção acompanha-se de um augmento notável da secreção pigmentaria, e por conseguinte de um colorido mais ou menos escuro da pélle, colorido que persiste muitas vezes mesmo depois da desappariçâo de todos os outros symptomas. O professor Hebra affírma que nas papulas do prurigo existe sero- sidade, embora em pequena quantidade ; outros autores, porém, não tendo verificado esse facto, consideram o prurigo entre as herpetides seccas. O prurigo pôde manifestar-se em todo o corpo, mas parece mostrar preferencia aos membros, no sentido da extensão, e ás regiões dorsal e lombar. Os autores admittem diversas variedades de prurigo, notando-se entre ellas o prurigo mitis, fôrma ligeira, o prurigo formicans, vorax, fôrma a mais grave, prurigo podicis, que se assesta na margem do - 60 ânus, prurigo scroti, prurigo muliebris, que se assestam nas partes genitaes do homem ou da mulher. § 3.° Da urticaria.— É caracterisada pelo desenvolvimento na pélle de saliências, de um colorido rosado ou vermelho, acompa- nhando-se de sensações semelhantes ás que são produzidas pela urtiga. Pôde ser aguda ou chronica. A aguda é quasi sempre pre- cedida por phenomenos geraes, taes como cephalalgia, máo estar, fastio, movimento febril, etc. A erupção se compõe de papulas ou placas, discretas ou confluentes , de fôrma mais ou menos circular, de um diâmetro de 2 a 3 centimetros, de bordos mais ou menos duros, offerecendo muitas vezes no centro uma mancha negra, constituída por uma hemorrhagia capillar. O colorido desapparece pela pressão do dedo ; muitas vezes verifica-se no centro de cada papula um co- lorido branco, que contrasta com a areola vermelha da base. As pa- pulas, individualmente, têm uma duração ephemera, mas são, logo que desapparecem, substituídas por outras, de modo que a urticaria aguda dura ordinariamente sete a oito dias. A erupção é acompa- nhada de um vivo prurido. Ella termina-se pela resolução. A urticaria chronica é caracterisada não só pelas papulas da urticaria aguda, mas ainda por tuberosidades mais ou menos volumosas, duras, acom- panhadas de tensão, de embaraço nos movimentos e deixando depres- sões comocicatriciaes. A côr d'estas indurações papulosas e tuberculo- sas é vermelha carregada. A erupção se desenvolve de preferencia sobre as partes descobertas, como as mãos, a face, os antebraços. Ella apparece ordinariamente á tarde e á noite. A sua duração varia entre alguns mezes e alguns annos. § i.° Do psoriasis.—E uma affecção cutânea caracterisada por escamas seccas, epidérmicas, lamellosas, espessas, adherentes, cobrindo uma superficie saliente e offerecendo ora uma côr branca embaciada, ora argentea nacarada, apresentando de ordinário no seu contorno uma côr vermelha, ás vezes cuprica. Elle pôde começar por pequenas saliências papulosas que se cobrem de escamas ás vezes muito estreitas (psoriasis punctata) ; ou por sa- liências mais largas, arredondadas, convexas no centro e deprimidas na circumferencia (psoriasis guttata). No psoriasis generalisado, podem-se observar muitas variedades de fôrmas, constituindo o psoriasis nwmmular, gyrata, dijfusa, e circinata ou lepra vulgaris. As saliências do psoriasis são a sede de um rubor, que existe embaixo das escamas e se desenha muitas vezes ao redor d'estas. Este rubor pôde ser rosado, vermelho ou cuprico. As escamas do psoriasis são superpostas, imbricadas, ellas são constituídas por lameculas brancas, nacaradas, argenteas, adherentes ao tegumento sobre que repousam, e do qual com difficuldade podem ser destacadas. A face interna d'estas lâminas offerecem saliências e depressões correspondentes ás saliências papillares e aos seus intervallos; a externa é irregular. A erupção pôde occupar todos os pontos do corpo : ella começa de ordinário pelos joelhos e cotovellos. Observámos este anno, na cênica do nosso intelligente mestre, Dr. Saboia, um caso interes- santíssimo de psoriasis, que. nos pareceu typico. O doente chamava-se José Fernandes, entrou no dia 9 de Julho e sahio no dia 17 do mesmo mez, tendo occupado o leito n. 23. A erupção n'esse indivíduo era constituída por umas 15 ou 20 placas, formadas de escamas nacaradas, argenteas, imbricadas, de um volume variável, e tendo ao redor uma areola um pouco sombria, cuprica, e não offerecendo prurido muito pronunciado ; essas placas eram disseminadas. O psoriasis é, de ordinário, uma moléstia rebelde, inveterada, de marcha chronica, que dura muitas vezes annos: é conhecido o facto da desapparição do psoriasis no inverno e o seu reappareci- mento no estio e na primavera. Quando elle termina pela cura, não deixa stigmate. O psoriasis tem a sua sede anatômica no órgão secretor, na papilla epidérmica (Bazin). — 62 — § 5.° Do pityriasis.—É uma affecção cutânea caracterisada por uma secreção de pelliculas adherentes aos tecidos subjacentes, que cahem, seja espontaneamente, seja em conseqüência de um attrito mais ou menos enérgico, e que se renovam á medida da descamação. Em geral, a pélle conserva a sua côr normal, excepto nas va- riedades de pityriasis rubra, versicolor, em que a côr é vermelha ou rosada. As partes affectadas de pityriasis são a sede de um prurido ás vezes intenso, que se exalta pela acção das unhas do paciente, pelo calor e pela acceleração da circulação por um exercicio vio- lento. Em alguns casos o pityriasis é precedido de alguns symptomas geraes; em outros, porém, não ha symptomas prodromicos. Os autores admittem muitas variedades de pityriasis, já quanto á fôrma, já quanto á sede, cujas principaes são : pityriasis simples, também chamado dartro farinhoso, pityriasis furfuraceo ; pityriasis capitis, que, de ordinário, se desenvolve na cabeça; pityriasis rubrum, que se distingue pela presença de manchas vermelhas escuras, disseminadas ou formando largas placas por sua reunião, cobertas de lameculas epidérmicas cinzentas ou esbranquiçadas, muito adhe- rentes aos tecidos que as supportam ; pityriasis pilaris, no qual o orifício dos folliculos pilosos é coberto por pelliculas que a elle adherem fortemente, rodeando o collo do pello, resultando d'ahi uma serie de pequenas saliências ordinariamente approximadas umas das oUtras, que dão á superficie da pélle um aspecto rugoso, semelhante á — pélle de gallinha. § (>.° Do lichen. — E uma affecção cutânea caracterisada pela existência de papulas numerosas, discretas ou confluentes, as quaes, em uma época da sua existência são acompanhadas de rudeza, espessamento e exageração das pregas da pélle. O lichen pôde ser agudo ou chronico. A erupção é caracterisada por botões cheios, isto é, não contendo liquido, acuminados, não excedendo o volume de um grão de milho, offerecendo a côr normal da pélle, ou a côr vermelha ou rosada, podendo ser discretos e disseminados sobre largas superfícies, ou reunidos e grupados uns ao lado dos outros, constituindo placas claramente limitadas e separadas por intervallos da pélle sã. Se a affecção é aguda, a erupção se faz simultaneamente em todos os pontos do corpo, e em menos de um septenario as papulas perdem o seu colorido vermelho, se deprimem e terminam por uma descamação furfuracea. Se a erupção é chronica, ella é lenta e gradual; as papulas, ao principio limitadas a uma região, invadem successiva- mente as outras partes do corpo. Além das papulas, caracteristicas do lichen, observa-se uma rudeza, uma seccura particular da pélle, um espessamento notável d'esta membrana, um exagero considerável das suas rugas, um estado granuloso que a faz assemelhar á pelle de lixa ; emfim, se a erupção occupa partes móveis, como o concavo poplitêo, a prega do cotovello, a palma das mãos, podem observar-se fendas e rhagadas, que interessam profundamente o derma. 0 lichen é acompanhado de um prurido intenso. A sede anatômica do Kchen é a papilla nervosa (Cazenave); é o corpo mucoso de Malpighi (Hardy); é a papilla encarregada da secreção epidérmica (Bazin). As principaes variedades de lichen são: lichen agrius, invetera- do, circumscripto, generalisado, lenticular e miliar. § 1." Da acne. —- E uma affecção das glândulas sebaceas ou das glândulas annexas da pélle, caracterisada por uma erupção de pústulas, que offerecem uma evolução lenta, que dão nascimento a pequenas crôstas amarelladas ou ennegrecidas, e deixam peque- nas cicatrizes, ora lisas, ora um pouco enrugadas, franzidas. Em sua marcha podem considerar-se três períodos: erupção, suppuração e dessecação. A erupção começa por um rubor par- cial dos tegumentos, em cuja superficie apparecem pequenas eleva- ções vermelhas, oblongas ou conicas e umbelicadas, cujo volume — 64 — oscilla entre o da cabeça de um alfinete e o de uma lentilha. Estas saliências embranquecem e amarellecem logo no ápice, o que é devido á formação de pus , e se convertem progressivamente em papulo-pustulas, que, depois de alguns dias, dão sahida ao liquido que contêm, o qual concreta-se, formando crôstas amarelladas ou ennegrecidas mais ou menos espessas, que persistem durante um tempo variável. A suppuração, em geral, se faz lentamente, e du- rante um longo espaço de tempo, a acne se apresenta sob a fôrma de pequenas saliências conicas, vermelhas e duras na base, purulentas no ápice. Depois as crôstas cahem espontaneamente, a dureza da base se resolve progressivamente, mas em geral com lentidão, o rubor dos tegumentos desapparece insensivelmente, e restam apenas pequenas cicatrizes, ora lisas, ora enrugadas, circulares ou ovolares, que também com o tempo acabam por desapparecer, ao menos em parte. A erupção pôde ser discreta ou confluente. Os pontos de predilecção da acne são : a face, as costas e a parte ante- rior do peito. A marcha da affecção é successiva ; a duração, va- riável ; a terminação é, de ordinário, a resolução, podendo em casos raros terminar pelo lúpus. A sua sede anatômica é nas glândulas sebaceas e nos folliculos pilosos. As principaes variedades de acne são: a varioliforme, a miliar, a indurata e a rosacea. § 8.° Da herpeâ. — E uma affecção cutânea caracterisada por vesiculas grupadas umas ao lado das outras, sobre uma superficie rubra e inflammada, e depois convertidas em crôstas, pela desse- cação do liquido que contém, as quaes cahindo deixam seja ma- culaturas enrubecidas, seja ulcerações marchando rapidamente para a cicatrização. A herpes pôde ser annunciada por alguns symp- tomas precursores, mas pôde também sorprender o indivíduo no gozo de uma perfeita saúde. A erupção é constituída ao prin- cipio por vesiculas pequenas, miliares, mas que vão engrandecendo, podendo tomar o volume de uma ervilha ; estas vesiculas podem — 65 — achar-se reunidas umas ao lado das outras em numero de 10, 15, 20. . ., formando assim um grupo herpetico, separado por um inter- vallo de pélle sã de outro grupo mais ou menos distante ; outras vezes os grupos são isolados. As superfícies, onde se localisam estes grupos herpeticos, podem não offerecer modificação, mas de ordinário são rubras. O liquido contido n'estas vesiculas, primitivamente transparente, turva-se logo, torna-se opaco, e se concreta no fim de 3 a 5 dias em uma crôsta delgada, achatada, offerecendo um colorido amarellado ou escuro, e deixando depois da sua queda seja um simples rubor que desapparece lentamente, seja uma ligeira ulceração que não tarda em cicatrizar-se. Os grupos herpeticos podem apresentar a fôrma arredondada, mas em geral são muito irregulares. A herpes pôde occupar todos os pontos da superficie cutânea, mas é mais freqüente nos lábios, na parte posterior do pavilhão da orelha, no pr epucio e na vulva. Ha uma grande variedade de herpes ; apenas mencionaremos a herpes phlyctenoide e a herpes zona ou zoster. A primeira manifesta-se principalmente nos lábios, na face, no pescoço, no peito e nos braços. As herpes prepucialis, vulvalis, labialis, são herpes phlyctenoides. A segunda chama-se zona porque abraça o tronco ou os membros em fôrma de uma cinta ; é a herpes mais grave. A sua sede predilecta é o tronco, e principalmente a base do peito. A zona é, de ordinário, precedida de symptomas precursores : anorexia, máo estar, febre, dores lancinantes e tensivas nas partes que têm de ser invadidas A erupção é constituída por placas vermelhas, arredondadas, de 2 a 3 centí- metros de comprimento, separadas umas das outras por pélle sã, dispostas segundo uma linha obliqua, e cujo complexo representa uma meia cinta, uma zona que não excede á linha mediana nem para diante, nem para traz. Sobre estas placas erythematosas nascem vesiculas brilhantes, transparentes, reunidas umas ao lado das outras, cuja serosidade não tarda em tornar-se lactecente e mesmo ennegrecida. 3 9 - 66 - Ao nível da erupção encontra-se uma dor tensiva, que augnen- ta quando o doente pratica movimentos bruscos ou faz largas inspi- rações. A zona é, de ordinário, precedida e acompanhada de dores nevrálgicas, podendo mesmo ser acompanhada de cephalalgias, gas- tralgias, dyspepsias, e outras affecções, as quaes podem desappa- recer com a erupção, ou persistir ainda por algum tempo. § 9. ° Do eczema.— E uma affecção cutânea caracterisada por vesiculas pequenas, acuminadas, agglomeradas sobre uma superficie mais ou menos extensa, contendo um liquido se roso, transparente, e deprimindo-se quando é reabsorvido o liquido que ellas contêm, ou rompendo-se no fim de pouco tempo, para dar lugar á secreção e exhalação de um liquido seroso e transparente, que se concreta em lameculas mais ou menos espessas, que dão lugar a uma esfoliação epidérmica. O eczema pôde ser agudo ou chronico ; pôde ser ou não annun- ciado por symptomas precursores. A erupção é caracterisada por vesiculas transparentes, agglomeradas, repousando sobre uma superficie ordinariamente erythematosa, e de tal sorte tênues que mais judiciosamente se poderia dar-lhes o nome de granulações vesiculosas, passando muitas vezes por isso des- apercebidas. Estas vesiculas, cheias de serosidade transparente e limpida, ora arrebentam no fim de 24 ou 48 horas de existência, dando sahida a um liquido irritante, cujo contacto determina na superficie dos tegumentos escoriações e ulcerações superficiaes; ora se de- primem, á medida que vai sendo reabsorvido o liquido que ellas contêm, sendo seguidas de um trabalho de esfoliação epidér- mica. Depois da ruptura das vesiculas, observa-se uma superficie rubra, apresentando uma multidão de aberturas, formadas pelos orifícios das glândulas sudoriparas, e das quaes escorre uma serosidade transparente e plástica, que mancha a roupa, irrita as partes - 67 - vizinhas, e determina ulcerações, que dão nascimento a um corrímento mais ou menos abundante de liquido. É n'este momento que, simultaneamente com a inflammação dos folliculos sudoriparos, existe a do dei ma, sendo esta membrana a sede de um grande numero de pequenas ulcerações arredondadas, superficiaes, e cujos bordos não tardam em se reunir, constituindo uma vasta superficie ulcerada. 0 liquido eczematoso exhalado se desseca e concreta-se em lâ- minas molles, de um branco acinzentado, azulado ou esverdinhado, lâminas que se destacam, sendo substituídas por outras escamas de nova formação, delgadas, foliaceas, destacando-se com extrema fa- cilidade, mas reproduzindo-se também com extrema facilidade. Estas escamas vão diminuindo, se convertem em simples lameculas, e des- apparecem de todo. Depois da queda das escamas, resta um colorido vermelho mais ou menos escuro, ao nivel das superfícies doentes, o qual se apaga lentamente. Nunca ha, cicatrizes. Como se vê, podem-se considerar na evolução do eczema typo (é o que descrevemos) três períodos : vesiculação, exhalação e desca- mação . O eczema é acompanhado, de ordinário, de um prurido muito intenso; quando é chronico, é muito tenaz, muito rebelde, reincide muito, dá lugar a metastases. Pôde occupar todos os pontos do corpo. A sua sede anatômica, segundo Bazin e Cazenave, é nos orifícios das glândulas sudoriparas, as quaes inflammam-se, e d'ahi a inflam- mação propaga-se pouco a pouco á superficie da pélle, occupando ahi sem demora a rede vascular. Ha uma grande variedade de eczemas, já quanto á forma, e já quanto á sede, cujas principaes são: eczema rubrum, eczema simples, eczema fendilhado, eczema pilaris, eczema das partes genitaes, e eczema da face, - 68 - § 10. Do impetigo.—É uma affecção cutânea caracterisada por pústulas ou vesico-pustulas, que se convertem rapidamente em crôstas rochosas, espessas, amarelladas, parecendo a uma camada de mel concreto espalhada na superficie da pélle. Assemelha-se muito ao eczema, quanto á lesão elementar. O impetigo differe do eczema somente pela côr e consistência do liquido que as elevações epidérmicas contêm. 0 liquido raramente é reabsorvido; ordinariamente elle se desseca depois da ruptura do epiderma, e produz crôstas espessas, rochosas, semelhantes a uma camada de mel concreto (d'ahi o nome de melitagra), de um colorido amarello ou esverdinhado escuro, que cobrem superfícies inflammadas e ulceradas. Estas crôstas podem reproduzir-se á medida que se vão destacando, durante um tempo muito prolongado. Elle é acompanhado de um prurido mais moderado que o do eczema, e, como de ordinário se desenvolve em indivíduos lymphaticos e scrophulosos, não é raro ser acompanhado de tumefacção das partes e gânglios vizinhos. Quando é agudo, é de ordinário precedido por symptomas prodro- micos; quando é chronico, pôde durar annos. Ha muitas variedades ; as principaes são : o impetigo figuratum, sparsum, larvalis e scabidum. § 11. Do pemphigus. — É uma affecção caracterisada por bolhas de extensão variável, de ordinário muito vo.umosas, dis- tendidas por um liquido seroso, e mais tarde pela formação de crôstas foliaceas que, destacando-se, deixam excoriações superficiaes ou simples máculas, não seguidas de cicatrizes. O pemphigus é quasi sempre precedido de phenomenos precursores. As bolhas são arredondadas, mais on menos volumosas, cheias de um liquido citrino e transparente, se desenvolvendo por camadas successivas e terminando-se pela formação de crôstas delgadas e foliaceas. - 69 - As bolhas são precedidas de uma mancha erythematosa, que muitas vezes constitue uma areola vermelha para cada bolha. 0 liquido, que é claro, citrino, pouco plástico, pôde ser reabsorvido ; mas quasi sempre derrama-se no exterior pela ruptura das bolhas. 0 pemphigus pôde ser limitado a uma região ou generalisado ; pôde ser agudo ou chronico. A affecção pôde occupar todos os pontos da superficie cutânea. A terminação pela cura é freqüente no pemphigus agudo, a fatal no pemphigus chronico. A duração pôde ser de mezes, ou annos. A moléstia é de ordinário acompanhada de prurido mais ou menos intenso. Nos últimos períodos do pemphigus podem observar-se a enterite e hydropesias diversas como complicações gravíssimas, que apressam o desenlace fatal. Ha duas variedades principaes de pemphigus : pruriginoso, de pequenas bolhas, que é ordinariamente benigno ; e o pemphigus diutinus, de grossas bolhas, que ordinariamente termina pela morte. § 12. Do rupia.—E uma affecção cutânea, caracterisada por uma larga pústula phlysacea, que se converte rapidamente em uma crôsta espessa e ennegrecida, ao redor da qual se produzem uma ou muitas erupções de bolhas circumferenciaes. A marcha do rupia offerece três períodos: erupção, incrusta cão e cicatrização. A erupção começa por uma mancha arredondada, livida, ligeira- mente saliente, ao nivel da qual o epiderma é logo levantado por um liquido sanioso ou sero-purulento. Esta pústula desseca-se logo dando lugar a uma crôsta rugosa, escura, mais ou menos espessa ; ao redor d'esta crôsta o rubor persiste e augmenta, e esta areola torna-se o ponto de partida de uma serie de elevações bôlhosas que, dessecando-se por sua vez e na ordem successiva de sua apparição, produzem novas concreções que se ajuntam á primeira. Muitas producções de bolhas podem assim succeder-se na circumferencia da — 70 — crôsta primitiva, que assim vai gradualmente augmentando em superficie. A crôsta varia em seu aspecto e em seus caracteres physicos, segundo a extensão e a intensidade da lesão local, segundo a pro- fundidade e persistência da ulceração que ella cobre. Ella é achatada, pouco saliente, fácil de destacar-se, quando a pús- tula inicial é de um pequeno volume, rodeada de bolhas pequenas e pouco numerosas. Esta crôsta cahe espontaneamente no fim de alguns dias, e resta então seja uma maculatura de um vermelho livido, seja uma simples escoriação que não tarda em cicatrizar-se. E o que se observa no rupia simples dos autores. No rupia proeminens, ao mesmo tempo que a affe cção alarga-se pelo desenvolvimento de bolhas em sua circumferencia, sua parte cen- tral se espessa e eleva-se pela adjuncção de elementos novos em sua face profunda. D'ahi resulta uma espécie de eminência conoide, dura, rugosa, en- negrecida, formada de camadas superpostas e concentricas, figurando a escama de ostra. Este envoltório crustáceo fica habitualmente estacionario durante longo tempo ; ás vezes o liquido secretado abaixo d'elle o levanta parcialmente, determinando fissuras atravez das quaes elle irrompe. Levantando-se esta crôsta, encontra-se uma ulceração circular, mais ou menos profunda, de bordas tumefactas e lividas, de fundo descorado, desigual e banhado por um liquido sanioso, que produz logo uma camada nova. Emfim, a secreção do ichor cessa, a ulcera forra-se de botões, e, cahida a ultima crôsta, fica uma cicatriz branca, plana ou bridada, mas sempre indelével. O rupia pôde se localisar em todos os pontos do corpo, mas parece ter preferencia pelos membros inferiores, principalmente pelas pernas, assim como pelo thorax e pelo pescoço. Quasi sempre é discreto. - 71 - Pôde constar de erupções successivas, e por isso é de ordinário de longa duração e de marcha chronica. A termina ção pela cura é freqüente § Í3. Do ecthyma.— E uma affecção cutânea caracterisada por pústulas phlysaceas, largas, arredondadas, ordinariamente discretas, de base dura e inflammada, e dando logar á formação de crôstas escuras, mais ou menos espessas, que deixam em seu logar macu- laturas avermelhadas e em alguns casos verdadeiras cicatrizes. A pústula do ecthyma começa por uma mancha vermelha, dura, arre- dondada ou ovalar, mais ou menos larga, dolorosa á pressão. Essa mancha eleva-se logo ácimá do nivel da pélle, em seu centro apparece um ponto vesiculoso, formado pela secreção de um liquido abaixo do epiderma. Esta vesicula augmenta com rapidez, e ao mesmo tempo o liquido que ella encerra torna-se opaco e purulento; ella fôrma uma saliência ligeiramente convexa, ás vezes um pouco deprimida no centro, o que lhe dá a apparencia de uma pústula variolica. Chegada ao periodo de maturação, a vesicula se deprime ou se despedaça, unia parte do pús se concreta, ,a outra derrama-se, em breve não encontrando-se mais do que uma exsudação crostosa mais ou menos espessa, ama- rellada, escura ou ennegrecida, adherente e como que encaixada no tecido da pélle. Ao mesmo tempo a areola circumferencial empallidece e desap- parece. A suppuração das pústulas é mais ou menos precoce, segundo os casos; ás vezes é tão rápida, que o epidemia é levantado em massa em toda a extensão da superficie inflammada; outras vezes, porém? ella é lenta e gradual. A crôsta cobre uma ulceração do derma; ás vezes é uma verdadeira ulcera que se observa, e a suppuração não tarda em formar novas crôstas. Esta ulcera pôde estender-se e persistir por muito tempo nos - 72 — indivíduos debilitados ou avançados em idade, constituindo o ecthyma cacheticum dos autores. Quando a terminação approxima-se, a esfo- liação crostosa diminue, depois destaca-se em fracções ou em totali- dade, deixando a descoberto maculaturas avermelhadas, desiguaes, um pouco deprimidas no centro, e em certos casos cicatrizes inde- léveis . 0 ecthyma pó de manifestar-se em todo o corpo, mas é mais fre- qüente nos membros, nas espaduas, no pescoço e nas nádegas; é raro na face e no couro cabelludo. Pôde ser limitado ou generali- sado, sendo este ultimo caso mais raro. As pústulas, de ordinário, são discretas, pouco numerosas, bem distinctas e separadas umas das outras; algumas vezes, entretanto, se reúnem em grupos irregulares. O volume d'estas pústulas oscilla entre o de uma lentilha e o da peça de um franco. A erupção é as vezes acompanhada de certos phenomenos locaes: ha uma dôr tensiva, ás vezes lancinante e pulsativa no momento da suppuração; quando os elementos pustulosos se reúnem em certo numero sobre uma mesma região, a dôr é muita viva e os phenomenos de reacção local muito intensos. A inflammação pôde estender-se ao tecido cellular sub-cutaneo ou repercutir sympathicamente sobre os vasos e gânglios lymphaticos. A marcha do ecthyma ora é aguda, ora chronica, porque muitas vezes a moléstia se compõe de erupções successivas. A terminação mais freqüente é a suppuração, seguida da dessecação dos productos secretados; outros modos de terminação podem ser observados: a gangrena, a ulceração, e em casos rarissimos a re- solução . A duração depende da marcha. As principaes variedades de ecthyma são: o cacheticum, o infantil, o lividum, e o vulgar. — 73 — CAPITULO II. Das erupções cutâneas da scrophula. Dividiremos este capitulo em dous artigos, tratando no primeiro das manifestações cutâneas scrophulosas, consideradas em geral, e no segundo d'essas manifestações, consideradas em particular. ARTIGO I. Das scrophulides em geral. § I.° Esboço histórico, definição e synonyinia. — Até os fins do século passado não havia trabalho especial sobre as manifesta- ções cutâneas da scrophula; ellas eram descriptas como fazendo parte da lepra. Em nosso século, Willan e Bateman, que tantos serviços prestaram á dermatologia, trouxeram alguma luz n'esta confusão, reunindo todas as fôrmas scrophulosas cutâneas em um só gênero, que chamaram — lúpus; porém, não procurando apreciar a natureza do lúpus, elles o collocaram na classe dos — tuberculos. Biett, espirito eminentemente pratico, sectário das doutrinas de Willan, reconheceu que o lúpus, segundo a classificação willanica, não podia fazer parte das lesões elementares tuberculosas; reconheceu no lúpus uma na- tureza particular, sobre a qual não ousou, entretanto, pronunciar-se. Alibert, desconhecendo também a natureza do lúpus, o classificou entre as dermatoses dartrosas, ao lado do eczema, do psonasis, etc, mostrando 3 10 por ahi que não havia verificado a differença radical, existente entre as moléstias dartrosas e scrophulosas. Foi somente n'estes últimos tempos que a natureza scrophulosa do lúpus foi mais ou menos admittida. A palavra lúpus, entretanto, tomada para designar as manifesta- ções cutâneas da scrophula, não deixa de ter os seus inconvenientes: Io, nem todas as moléstias cutâneas, descriptas pelos autores sob o nome de lúpus, se referem á scrophula; é assim que, além do lúpus scrophuloso, ha também um lúpus syphilitico, que não é mais do que uma espécie de syphilide; 2o, nem sempre o lúpus tem por ponto de partida um tuberculo, como quer a escola de Willan; é assim que existem lúpus, inteira- mente semelhantes ao lúpus tuberculoso, e que tiveram por ponto de partida uma pústula, uma escama, ou mesmo uma mancha erythe- matosa . Foi por todas estas razões que modernamente Bazin , e depois Hardy, propuzeram a palavra scrophulides, para designar as mani- festações cutâneas da scrophula, seguindo assim o exemplo de Ali- bert que creou a expressão syphilides, para designar as manifestações cutâneas da syphilis. Assim, pois, a palavra scrophulides, que não é inteiramente syno - nyma de lúpus, serve para designar as manifestações cutâneas, que estejam exclusivamente dependentes da scrophula. § 2.° Symptomas geraes e precursores: constituição scro= phulosa. — Os phenomenos precursores da scrophula, e portanto das scrophulides, consistem, em geral, em uma predisposição que exerce uma acção sobre os órgãos, modifica sua evolução durante a primeira idade, perturba mais ou menos as differentes funcções : é a constituição scrophulosa dos autores. Os caracteres de uma constituição scrophulosa consistem em uma modificação particular do fades, do habito externo, e principalmente das funcções da economia. — 75 — O fades merece especial menção. O primeiro facto que chama nos^a attenção, na constituição scrophulosa, é a conformação do craneo, cuja parte superior é consideravelmente desenvolvida; a fronte é baixa, o pescoço curto e as maxillas largas e fortemente accusadas. Porém o que mais chama a nossa attenção é incontestavelmente o contraste que se nota nos diversos traços physionomicos dos scrophulosos. As vezes o colorido do rosto é vivo, animado; outras vezes, ao con. trario, a face é pallida, ou antes, descorada, embaciada. Ora os olhos são vivos e expressivos ; ora melancólicos, languidos, tristes e quasi extinctos. Em uns, a robustez, a gordura, são muito desenvol- vidas, o tecido gorduroso é muito abundante, de modo que ha uma verdadeira polysarda; porém os músculos são molles, cabidos, flacidos. Em outros, ainda que dotados de um appetite enérgico, nota-se uma magreza considerável, a pélle é branca, rosada, ou baça e mesmo escura. Os cabellos ora são espessos, luxuriantes mesmo, ora raros , mui pouco abundantes. A physionomia pôde ser regular e bella, constituindo a belleza scrophulosa dos autores , ou irregular, despida de expressão. Relativamente á estatura, o crescimento muitas vezes parece ter sido embaraçado em sua evolução: o indivíduo tem, por exemplo, vinte annos, e pôde apenas, por sua apparencia frágil e infantil, accusar quinze. Em outros, observa-se uma estatura elevada, porém mal con- formada . Em geral, nos scrophulosos, ha falta de harmonia entre as differentes partes do corpo. O thorax é achatado para traz e sobre os lados em sua parte superior, apresentando assim uma fôrma quadrilatera; o sternum é arqueado, encurvado em fôrma de quilha de navio, e o ventre fôrma uma saliência disgraciosa; de or- dinário os membros não têm proporção com o resto do corpo, sendo por isso que freqüentemente se observa, nos scrophulosos, o desgeito, a falta de donaire, nas attitudes e nos movimentos. A columna ver- tebral é freqüentemente desviada de differentes maneiras, não se - 76 - devendo, entretanto, confundir estes desvios com aqnelles que são de- vidos ao rachitismo, moléstia essencialmente differente. As funcções da economia são modific adas de differentes maneiras, para mais ou para menos; assim, ora a nutrição é languida, ora é exagerada; em uns as digestões são promptas, em outros difficeis, acompanhadas de eructações gazosas. O estado das forças é igualmente variável: certos indivíduos são activos, laboriosos ; outros são lentos, pesados, preguiçosos, e esta preguiça é o resultado de uma verdadeira fraque- za, de uma espécie de inaptidão ao movimento. O mesmo acontece para a intelligencia: certos scrophulosos são dotados de um espirito brilhante, de uma penetração notável; outros são embotados , como que embrutecidos e estúpidos ; a obtusão das faculdades pode chegar ao idiotismo. O caracter pôde ser vivo, arrebatado , violento , colé- rico ; ou brando, paciente, bondoso, cheio de mansidão e abnegação. A puberdade pôde ser retardada, e é o mais freqüente, assim como pôde ser precoce ; nos individuos do sexo feminino , a menstruação de or- dinário se declara tarde. Os appetites venereos podem ser ardentes, fogosos, exagerados, ou então languidos e mesmo quasi nullos. Vê-se, pois, pelo quadro precedente, que o que predomina na constituição scrophulosa é um admirável contraste. § 3.° Signaes próprios e communs.— As scrophulides, assim como as syphilides e herpetides, offerecem caracteres próprios e com- muns, que merecem especial menção.Esses caracteres devem ser pro- curados : Io, na situação ; 2o, na fixidade ; 3o, na côr; 4o, nas ulcera- ções ; 5o, nas crôstas; 6o, na tendência á hypertrophia; 7o, na exis- tência de cicatrizes; 8o, na ausência de reacção; 9o, na carência de contagiosidade; 10, na marcha e duração; 11, na terminação; 12, finalmente no tratamento antiscrofidoso. 1.° Situação . — Um dos caract eres importantes das scrophulides é que ellas jamais são superficiaes; são situadas profundamente na pélle, invadindo as camadas profundas do derma, e é por isso que as ulce- rações que resultam dos progressos da erupção se estendem assaz — 77 — longe, e as cicatrizes que lhe succedem attestam uma ulceração grave da pélle. Muitas vezes ellas não se limitam ao tegumento externo, mas invadem também os tecidos sub-jacentes. 2.° Fixidade das erupções. — As scrophulides são, em geral, cir- cumscriptas a uma região ou mesmo a uma parte mais limitada, mos- trando mui pouca tendência á generalisação, excepto entretanto a variedade designada pelo nome de scrophulide tuberculosa dissemi- nada.Ellas estendem-se em largura e em profundidade, mas persistem no mesmo logar durante muitos mezes, e mesmo durante muitos annos. 3.° Cor.—As manifestações cutâneas da scrophula apresentam um colorido especial : é uma côr vermelha escura, carregada, li vida, violacea, semelhante á côr de borra de vinho, menos escura que a das syphilides e mais vermelhas que *i dos exanthemas ordinários. Este colorido é muito bem accentuado, sobretudo ao redor das ulcerações. 4.° Ulcerações.—As ulcerações scrophulosas offerecem carac- teres muito importantes : os seus bordos são retalhados, irregulares; não são talhados a pique, mas são delgados e descollados. Este descollamento dos bordos tem grande importância. O fundo das ulcerações é fungoso, sangrento, ou apresenta botões carnudos, pallidos, amollecidos, de má natureza, algumas vezes exhuberantes. A pellicula pardacenta, pseudo-membrana, que costuma se encontrar no fundo das ulcerações syphiliticas, mui raramente é encontrada nas ulceras scrophulosas. 5.° Crôstas.—As crôstas que cobrem as ulcerações scrophulosas são algumas vezes espessas ; não são muito duras, e não offerecem saliências tão destacadas e tão pronunciadas como as que se en- contram na syphilis; o seu colorido é variável: são ennegrecidas, quando contêm uma certa quantidade de sangue misturado ao pus deseccado ; ou então são de um branco notável, quando são puras, e este colorido branco é de grande interesse para o diagnostico. - 78 - 6.° Tendência á hypertrophia e á ulceração.—O intumescimento do tecido cellular sub-cutaneo é um phenomeno importante, que mostra a tendência das scrophulides para a hypertrophia. Quando a moléstia assesta-se em um logar abundante em tecido cellular, como por exemplo, na face, dá-se uma elevação da pélle, uma intumescencia, que faz confundir a moléstia com uma erysipela, e que lhe fez dar, por Cazenave e outros autores, o nome de erysipela chronica ou de lúpus hypertrophico. Depois d'esta tendência á hypertrophia, quando a moléstia marcha para a cura, dá-se uma tendência á atrophia, um adelgaçamento considerável da pélle e do tecido cellular subjacente, o que augmenta ainda a profundeza das cicatrizes. Observa-se muito facilmente este phenomeno, quando a moléstia tem occupado o nariz; depois da cura, as azas do nariz são muito finas, e mesmo o nariz torna-se muito delgado em sua extremidade. A tendência das scrophulides, sobretudo de algumas fôrmas, para a ulceração, é também um caracter que deve entrar em linha de conta no diagnostico. 7.° Existência de cicatrizes.—Mesmo depois da cura das scro- phulides, a moléstia pôde ainda reconhecer-se pelas cicatrizes, as quaes existem sempre, mesmo depois da scrophulide erythematosa, que desapparece sem ter apresentado ulceração. Estas cicatrizes são ordinariamente deprimidas, pela reabsorpçâo do tecido cellular subjacente ; ellas offerecem um aspecto reticulado que as faz assemelhar ás cicatrizes da queimadura do 3o gráo; algumas vezes, são salientes, desiguaes, offerecendo de ordinário bridas e uma rede vascular fina; outras vezes, são granuladas ou exhuberantes, formando uma variedade de keloide. O seu colorido, ao principio característico, li vido, roxo, violaceo, se apaga pouco a pouco, e torna-se branco, porém os vestígios são indeléveis. 8.c Ausência de reacçao.—Um caracter muito particular ás — 7U — scrophulides é a ausência de reacção geral ou local : não ha febie, nem ardor, prurido ou dôr; a sensibilidade parece ser embotada nos scrophulosos. Vêem-se scrophulides ulceradas, profundas, attacar e destruir todos os tecidos, mesmo os ossos, sem ser acompanhadas de dôr, ou de qualquer reacção. 9.° Carência de contagio.—E um facto por todos conhecido e por todos admittido que as scrophulides não são contagiosas, nem inoculaveis. 10. Marcha e duração.—O que nas scrophulides chama logo a attenção é a lentidão da sua marcha ; é raro que durem menos de 6 mezes, e muito freqüentemente persistem longos annos, podendo mesmo não acabar senão com a morte. Durante este longo pe- riodo ellas conservam quasi sempre a mesma fôrma, e occupam habitualmente a mesma sede. Em alguns casos raros, revestem a fôrma phagedenica, offerecendo n'estes casos uma marcha muito mais rápida, sobrevindo de ordinário a morte promptamente. 11. Terminação . —As scrophulides podem terminar pela cura ou pela morte. A cura pôde chegar pela evolução natural da moléstia, ou pela influencia de um tratamento conveniente, o que é muito mais freqüente. Em alguns casos, a terminação favorável é apressada por uma moléstia accidental, tal como uma erysipela, uma febre eruptiva, etc, que determina uma modificação feliz e traz a cicatrização. Em outras circumstancias não ha cura, e a moléstia se prolonga durante toda a vida. O doente pôde então succumbir sob a influencia de uma moléstia intercurrente, ou a morte pôde ser devida a outras manifestações da scrophula, taes como abcessos frios, que esgotam o doente pela abundância de suppuração, e determinam um estado cachetico. Emfim, o que é mais freqüente, o doente morre de uma complicação visceral, que é freqüentemente a tuberculose pulmonar, a enterite tuberculosa, ou a moléstia de Bright. - 80 - 12. Tratamento anti-scrophuloso. — As scrophulides são, em geral, favoravelmente modificadas por um trataments tônico prolon- gado, no qual figure, entre outras substancias, o óleo de figado de bacalháo, que é geralmente considerado como o medicamento por excellencia da scrophula cutânea. § 4.° Symptomas concomitantes. — Ao mesmo tempo que se fazem as manifestações scrophulosas para a pélle, eoncomitantemente com ellas, outras manifestações, dependentes também da scrophulose, se fazem para outros pontos. Trataremos summariamente das mani- festações scrophulosas das mucosas e do systema lymphatico, nos contentando apenas em enumerar as principaes lesões dos últimos períodos da scrophula. Todas as mucosas podem ser a sede de mani- festações da scrophulose; assim podem ser observadas corysas, otor- rheas, ophthalmias diversas, stomatites, bronchites, etc. A corysa scrophulosa é quasi sempre acompanhada de impetigo das fossas nasaes e tumefacção consecutiva do lábio superior. A otorrhea sero-purulenta, sem carie do rochedo, traz quasi sempre a surdez pelo espessamento ou pela perfuração da membrana tympa- nica; pôde também trazer a obturação parcial do conducto auditivo externo. A ophthalmia scrophulosa traz de ordinário conseqüências graves, taes como manchas sobre a cornea, ulcerações e perfurações d'esta membrana, synechia anterior, etc. A blepharophthalmia glandular é quasi sempre acompanhada de furunculos ou terçóes. A dacryocystite pôde ser seguida de tumor e fistulas lacrimaes, e mais tarde de carie do osso unguis e do canal nasal. A stomatite e a amygdalite são quasi sempre acompanhadas de hypertrophia das tonsillas e propagação da inflammação á trompa de Eustachio. As bronchites scrophulosas são acompanhadas de tosse com expéC- toração abundantef e nas crianças de dyspnéa. — 81 - A diarrhea do scrophuloso é de ordinário tenaz, acompanhada de mucosidades, ou então de matérias muco-puridentas. As leucorrheas são de ordinário acompanhadas de erosões granu- losas e profundas do collo uterino. As blenorrheas são acompanhadas de engurgitamentos da próstata ou complicadas de estreitamentos orgânicos do canal da urethra. Nas crianças encontram-se balanites muco-purulentas e granulosas, nos meninos; vulvites com os mesmos caracteres, nas meninas. Depois das mucosas, são os gânglios lymphaticos que podem offe- recer lesões concomitantes com as scrophulides. Os gânglios engurgitam-se,inflammam e suppuram, dando em resul- tado abcessos; a pélle se adelgaça, se descolla e se destróe, deixando vêr ulcerações de um aspecto particular, característico. A affecção começa ordinariamente pelos gânglios lateraes do pescoço, d'ahi passa a outros mais profundamente situados, como os infra-claviculares, sub-sternaes, axillares, etc, e n'esses pontos podem formar-se abcessos, descollamentos e fistulas. Os engurgitamentos ganglionares cervicaes, devidos á scrophulose, são fáceis de conhecer-se: elles affectam um só ou ambos os lados do pescoço ; sua massa é algumas vezes considerável e modifica singularmente a physionomia, tornando-a característica : o pescoço forma um relevo de cada lado das maxillas. As ulcerações que succedem á abertura dos abcessos têm uma duração mais ou menos longa : ellas ficam estacionarias, ou então, cicatrizando-se, deixam cicatrizes bridadas, enrugadas, lividas, roxas, características. Nos últimos períodos da scrophula, muitos outros symptomas se manifestam, como expressão da diathese scrophulosa, assim como muitas outras lesões se observam, merecendo especial menção as do tecido ósseo, como osteites, periostites, caries e necroses. N'esses pe- ríodos podem-se também observar os symptomas da phthysica bronchica. 3 U — 82 ~ ARTIGO II. Das scrophulides em particular. Aceitando a classificação de Hardy, trataremos das seguintes espécies de scrophulides : erythematosa, cornea ou acneica, pustulosa, tuberculosa e phlegmonosa. § 1.° Scrophulide erythematosa. — E caracterisada por manchas de um vermelho escuro, violaceo ; não é o colorido das syphilides, é alguma cousa de particular, é antes uma côr violacea que escura ; a superficie é unida e offerece um aspecto luzidio par- ticular. O rubor é permanente, embora desappareça momentanea- mente pela pressão do dedo ; elle augmenta, de ordinário, pelas emo- ções moraes e em geral por todas as causas de excitação geral. Estas manchas formam um ligeiro relevo acima da pélle sã e apresentam uma depressão depois da cura. São ordinariamente arredondadas, ovalares, e a sua extensão eguala ao principio a largura de uma peça de um franco ; mas podem estender-se, occupando muitas vezes toda uma região, como a face. Depois o epidemia enruga, se destaca, e então ha uma ligeira descamação, que se faz por pequenos furfures foliaceos muito ad- herentes, que dificilmente cahem por si mesmos, e resistem mesmo em alguns casos aos attritos da mão. Esta scrophulide assesta-se quasi sempre na face, e abi o seu ponto predilecto é o nariz ; pôde entretanto ser encontrada em outros pontos, como nos membros, nas mãos, nos pés. Pôde também assestar-se sobre o couro cabelludo, dando logar ao estiolamento e queda dos cabellos. Como em todas as scrophulides, não ha symptomas de reacção: não — 83 - ha calor, ardor, prurido ou dôr: a moléstia não man festa a sua presença senão por uma ligeira saliência, pelo colorido e pelo estado escamoso. A sua marcha é lenta; ao principio mostra tendência á extensão, depois fica estacionaria, podendo persistir por toda a vida. Quando tem de terminar pela cura, a mancha se deprime, o colorido empal- lidece, e a moléstia desapparece, deixando uma cicatriz indelével, embora não tenha havido ulceração. P"sta cicatriz, que se assemelha á de uma queimadura do 3o gráo, se produz por absorpção intersticial. A cicatrização de ordinário começa pelo centro da placa, e esta apparencia de um circulo cujo centro acha-se curado fez com que Biett desse a esta moléstia o nome de erythema centrifugo, deno- minação geralmente rejeitada, visto como não é possível que se colloque na classe dos erythemas, moléstias ligeiras, a scrophulide erythematosa, moléstia profunda, tenaz e de natureza grave. Ella offerece a particularidade de se desenvolver nos indivíduos de tem- peramento sangüíneo, de face colorida, parecendo que a face, pelo estado de congestão habitual em que se acha, offerece mais predis- posição . § 2 .° Scrophulide cornea ou acneica.—Esta variedade é muito semelhante á erythematosa, mas offerece demais uma alteração do apparelho folliculoso da pélle. E caracterisada por uma ou muitas manchas de um vermelho li vido ligeiramente salientes acima da pélle, e regularmente arre- dondadas ; na superficie não ha escamas, mas abi encontra-se uma multidão de asperezas pequenas, que dão á mão a sensação de raspa. Pela lente, observa-se que os orifícios arredondados dos conduetos sebaceos são alargados, entreabertos, e que as asperezas são for- madas por matéria , ebacea endurecida. Quando estes pontos salientes cahem, vê-se o orifício da glândula - 84 - sebacea aberto; mas uma nova producção nã j tarda a apparecer e a obstruil-o. E principalmente sob.e a face que se encontram estas manchas, cujo numero e dimensões são variáveis. No fim de certo tempo, algumas vezes sob a influencia do trata- mento, estas placas se deprimem, as producções acneicas cahem para não mais se reproduzir, e restam somente cicatrizes deprimidas, ainda que não tenha havido ulceração. Outras vezes as placas se estendem, ou persistem por muito tempo, a despeito de qualquer tratamento. Cazenave explica a existência das cicatrizes pela compressão exercida pela matéria sebacea sobre a pélle ; Hardy, porém, afíirmando que esta compressão não pôde ter logar, pois que as producções corneas fazem saliência para o exterior, diz que essas cicatrizes são devidas ao trabalho atrophico, que em geral caracterisa a terminação das mani- festações escrophulosas cutâneas. § 3.° Scrophulide pustulosa.— A scrophulide pustulosa é a variedade mais 'freqüente; ora existe só, ora com ella existem simultaneamente outras espécies de scrophulides Ella pôde começar de duas maneiras differentes: em certos casos sobre uma placa vermelha da grandeza de um franco, vê-se desen- volver uma multidão de pequenas pústulas, da grossura da cabeça de um alfinete ; duram de 8 a 15 dias, rompem-se e deixam escapar um liquido plástico que se concreta em crôstas amarelladas. Em outros casos, a moléstia começa por uma só pústula, seme- lhante a do rupia; esta pústula, do volume de uma ervilha ou de uma pequena cereja, distendida desigualmente por uma mistura de sangue e pus, rompe-se e cobre-se de uma crôsta ennegrecida. A primeira variedade, apresentando pústulas pouco volumosas e reunidas, como as que se encontram no impetigo, fez com que á moléstia se desse o nome de impetigo rodens, denominação geralmente rejeitada pelos autores, por confundir moléstias essencialmente differentes. Uma vez desenvolvida, esta scrophulide é sobretudo caracterisada por crôstas, cujo colorido varia ; ás vezes são de uma brancura no- tável, outras vezes são um pouco amarelladas ; porém o mais fre- qüente é serem ennegrecidas pela mistura de uma certa quantidade de sangue. Podem encontrar-se uma ou muitas placas cobertas de crôstas ; quando ao principio existem muitas, ellas se reúnem pela extensão da moléstia. 0 augmento se faz por novas pústulas que se desenvolvem ao redor das crôstas, rompem-se, e augmentam por sua secreção a extensão da affecção. Estas crôstas são muito adherentes, e em baixo d'ellas existem ulcerações pouco profundas, de bordas irregulares, de fundo ver- melho pallido, baço, muitas vezes coberto de botões carnudos molles; não ha falsa membrana cinzenta, como nas ulcerações syphili- ticas. Em alguns casos, a superficie da ulceração apresenta pequenos botões duros, seccos, rugosos, como verrucosos; este aspecto, porém, não é primitivo. A sede mais freqüente desta escrophulide é o nariz, porém ella se desenvolve também sobra os pomos; nos membros ella é rara. A marcha d'esta variedade que, como as demais, não é acompa- nhada de modificações da sensibilidade, é muito lenta; ella en- tretanto cura mais fácil e promptamente que as fôrmas prece- dentes . Depois da cura, resta uma cicatriz mais profunda que a da erythematosa. Esta cicatriz, ao principio violacea, torna-se branca mais tarde; parece-se com as cicatrizes desiguaes, reticuladas, de uma queimadura do 3S gráo. — 86 — Em outros casos, em vez da cura, a moléstia estende-se, invade e destróe as partes que encontra ; os ossos, porém, de ordinário, são por ella respeitados. Observam-se então ulcerações profundas, irregulares, ás quaes succedem, depois da cura, cicatrizes muito apparentes, profundas e adherentes aos ossos. § 4.° Scrophulide tuberculosa.—Depois da pustulosa, é esta a fôrma mais freqüente, sendo além d'isso a fôrma mais grave da scrophula. Pôde apresentar-se sob duas formas differentes : scrophulide tuber- culosa sem vlceração ou com ulceração superficial, e scrophulide tuberculosa com ulceração profunda. a) A primeira forma é caracterisada por saliências indolentes, molles. de uma resistência elástica, da grossura de uma ervilha. Estas saliências são semi-transparentes, amarelladas, ás vezes de um escuro carregado, violaceo, porém nunca de um vermelho escuro como nos tuberculos syphiliticos. Estes tuberculos podem achar-se grupados uns ao lado dos outros, em numero de 12 a 18, formando placas arredondadas, circulos, semi- circulos, ou desenhos inteiramente irregulares ; ou então os tuberculos são disseminados sobre todo o corpo. A scrophulide tuberculosa superficial é rara nos membros, fre- qüente na face, onde de ordinário occupa os pomos, os lábios ou o mento ; pôde ser encontrada também nas outras partes do corpo, principalmente no tronco e partes sexuaes. A scrophulide superficial é freqüentemente acompanhada da infil- tração do tecido cellular sub-cutaneo, facto que chama a attenção mais do que os próprios tuberculos. Esta hypertrophia, quando se assesta na face, imprime a esta um aspecto particular: as feições são desfiguradas, as bochechas tume- factas e pendentes, os lábios são enormes, as palpebras, por sua - 87 — tumeíacçao, apenas permittem ao doente vêr; o rosto offerece um aspecto estranho. Quando este engurgitamento do tecido cellular se assesta nos mem- bros, o volume d'estas partes torna-se considerável, e os próprios elementos da pélle parecem participar d'esta hypertrophia. As partes genitaes podem também ser a sede d'este engurgitamento : então o penis duplica ou triplica de volume; do mesmo modo, os grandes e os pequenos lábios podem tornar-se consideráveis. A marcha d'esta scrophulide é essencialmente chronica, a affecção pôde durar annos; entretanto o doente parece gozar de boa saúde todas as suas funcções se executam bem, não ha reacção local ou geral. Ella pôde terminar de muitas maneiras: ás vezes o tuberculo se deprime, descóra-se e desapparece pela reabsorpção, deixando uma cicatriz deprimida, embora não tenha havido ulceração : ella então assemelha-se muito á erythematosa; em outros casos, o tuberculo persiste indefinidamente, ou então ulcera-se, mas a ulceração é super- ficial, não invade senão uma parte do tuberculo, e a cura se faz por cicatrização. 1)) A segunda fôrma, a scrophulide tuberculosa ulcerada, é de todas as fôrmas a mais grave. Ella começa, como a precedente, por alguns tuberculos vermelhos-violaceos, muito approximados uns dos outros, porém são mais grossos, mais animados, nota-se ao redor da sua base uma areola inflammatoria, e são promptamente invadidos pela ulceração. A ulcera que se fôrma pôde estender-se em largura ou em profun- didade; quando se estende em largura, nwvos tuberculos apparecem ao lado dos primeiros, se amollecem e se ulceram rapidamente, e assim a moléstia pôde occupar uma larga superficie. Quando a ulce- ração, ao contrario, ganha em profundidade, ella ataca e destróe a pélle, o tecido cellular, as mucosas, as cartilagens, e até mesmo os ossos. Esta marcha destruidora lhe valeu o nome d? — lúpus vorax, - 88 — As crôstas que cobrem as ulcerações são espessas, escuras, muitas vezes negras pela mistura com o sangue. Embaixo d'estas crôstas existem ulcerações profundas, anfractuosas, fungosas e molles, cujos bordos são irregulares e descollados, e cuja superficie é algumas vezes saniosa, sangrenta, ou então apresenta botões carnosos de má natureza; emfim, a secreção pnrulenta é abundante, serosa e fétida. A sede mais freqüente da scrophulide ulcerosa é no nariz ou em s; us arredores; ella começa mais habitualmente pela pélle, destróe as cartilagens, a mucosa, invade o vomer e mesmo o maxillar supe- rior; em alguns casos começa pela pituitaria, invade de um lado as cartilagens e a pélle, e de outro as partes profundas onde destróe o vomer, a abobada palatina, e estabelece communicação, seja entre as narinas, seja entre a bocca e as fossas nasaes. Quando a moléstia começa pelo lábio, ella o destróe, põe as gengivas a descoberto e pôde depois invadir os maxillares. No olho, ella destróe uma parte das palpebras, produz uma conjunctivite e algumas vezes ophthalmias graves, seguidas de cegueira. Ella pôde ainda occupar outras partes, como o pescoço, a região sternal, os membros, sobretudo na vizinhança das articulações, as partes genitaes. A marcha é muito lenta, e quasi sempre invasora. Por seus pro- gressos, ella produz vastas ulcerações, ulceras espantosas e horroro- sas, que dão logar a uma supuração abundante, trazendo muitas vezes comsigo a febre ectica, a cachexia, que causam a morte por esgota- mento. Esta terminação fatal, entretanto, devida somente á abun- dância da suppuração, é rara. A moléstia pôde terminar pela cura: n'estes casos as crôstas cahem, e forma-se uma cicatriz. As cicatrizes de ordinário são salientes, bridadas, offerecendo muitas vezes peque- ninas redes vasculares em sua superficie, e muito viciosas, arras- tando comsigo muitas vezes retracções, o que é muito freqüente. E depois de uma scrophulide ulcerosa que pôde encontrar-se uma atresia — 89 - da bocca, levada a ponto de embaraçar a palavra e a prehensão dos alimentos, ou uma destruição dos lábios, de modo que estes não podem mais reter a saliva. Pôde vêr-se o nariz destruído em totalidade ou em parte, uma narina obliterada, as palpebras repuxadas, e formando ectropion, o conducto auditivo obliterado e trazendo a surdez, e mesmo a ausência completa de uma orelha. No pescoço, as bridas cicatriciaes podem produzir o torticolis; nos membros, podem embaraçar os movimentos. Em fim, podem produzir todas as enfermidades próprias das cicatrizes das queimaduras de 3° e 4o gráo. § %.° Scrophulide phleginonosa.— E uma variedade caracteri- sada pelo desenvolvimento de pequenos abcessos cutâneos, chamados por alguns abcessos dermicos. Estes abcessos começam por um pe- queno tumor que engrossa pouco a pouco e pôde adquirir o volume de uma amêndoa ou mesmo de uma noz; pouco a pouco elle se amollece e suppura. A pélle que cobre este tumor offerece uma côr vermelha violacea, ella se adelgaça, acaba por se despedaçar, e deixa escorrer pus seroso, mal ligado, scrophuloso Logo uma crôsta se fôrma sobre a ulceração, o escorrimento esgota-se momentaneamente, depois uma nova abertura se faz ao lado da primeira, muitas vezes no mesmo logar, para se cobrir ainda de uma crôsta. Formam-se assim muitas aberturas que acabam por se reunir, formando uma ulceração mais ou menos extensa, que offerece todos os caracteres das ulcera- ções scrophulosas. O numero destes abcessos é variável; elles podem ser isolados ou agglomerados. São mais freqüentes na face, mas podem occupar também o tronco e os membros. A duração de cada abcesso é longa; a suppuração é assaz rápida, assim como a formação das crôstas, porém a cicatrização das ulcerações é assaz lenta; a cicatriz, ao principio violacea, torna-se branca, desigual, reticulada. Em alguns casos, a abertura do tumor não tem logar, o pús é reabsorvido, a pélle se recolla e não ha ulceração; nestes casos ainda os logares dos abcessos são indicados por manchas violaceas e mais tarde por cicatrizes pouco profundas, porém deprimidas e desiguaes. A duração - 90 - da scrophulide phlegmosa é longa, sobretudo quando as erupções se succedem, caso em que os abcessos podem succeder-se durante annos. CAPITULO III. Das affecções cutâneas parasitárias. Trataremos das affecções cutâneas parasitárias em geral, e depois trataremos da tinha e da sarna, affecções que, em casos dados, po- dem assemelhar-se ás syphilides. ARTIGO I Das affecções cutâneas parasitárias em geral. As affecções cutâneas parasitárias são devidas a parasitas diversos dos reinos vegetal e animal. Os symptomas que ellas offerecem são numerosos, podendo referir-se, segundo Bazin, a quatro ordens differentes: Io, symptomas fornecidos pelo próprio parasita; 2o, symptomas fornecidos pelas modificações physicas que o parasita imprime á pélle e a seus annexos ; 3o, symptomas que se prendem ás diversas erupções symptomaticas da moléstia parasitaria ; 4o, emfim, phenomenos sympathicos consistindo quasi sempre em perturbações da innervaçãoda péíle, e algumas vezes em perturbações de outros apparelhos. - 91 - 1.° Os parasitas são visíveis (a olho nú ou com uma lente) ou invisíveis, e neste caso só pelo microscópio poderáõ ser percebidos. Os parasitas são vegetaes ou animaes. Os vegetaes têm uma sede anatômica que não varia; quer vivam á custa dos pellos, das unhas ou do epidemia, é sempre o mesmo terreno que occupam: é o corpo mucoso de Malpighi. Elles, como as plantas, ficam fixos na região que occupam: se tomam extensão, é sempre por um desenvolvimento intrínseco ;e quando appareçam em pontos afastados da sua sede primitiva, é porque para ahi foram mecanicamente transportados. O parasita pôde apresentar-se coberto por uma lamina epidérmica ; ou então, pela destruição da lamina, ficam a mi na superficie da pélle ; outras vezes acha-se misturado a restos epidérmicos ou a matéria pigmentaria. Os animaes não têm sede fixa; mas entre elles ha uns que passeiam pela superficie epidérmica, estão sempre em movimento, ao passo que outros estão situados em uma loja epidérmica, d'onde não sahem senão em certos momentos, dadas certas condições. 2.° Os parasitas exercem modificações na pélle; é assim que observa-se muitas vezes uma mudança na côr affectando a pélle (vitiligo), os pellos (tinhas), ou as unhas (favus uugueal) ; outras vezes é uma disjuncçâo dos elementos cutâneos (sulcos do acarus); emfim, pôde haver uma ruptura dos pequenos vasos da pélle e por conseguinte hemorrhagias cutâneas (picadas de pulgas). 3.° Os parasitas podem produzir sobre a pélle toda a sorte de lesões elementares. Assim, o erythema, sob a fôrma de discos ou anneis, assignala o principio da tinha tonsurante e dá favosa; as erupções papulosas existem na mentagra e na sarna ; as vesiculas, na herpes circinada; as pústulas, na mentagra e na sarna; as bolhas, na sarna; na sycosis existem tuberculos mais ou menos volumosos, mais ou menos numerosos; como affecções escamosas, encontra-se o pityriasis alba, o pytiriasis versicolor; nas máculas, encon- tra-se o chloasma ou mascara das mulheres grávidas, o vitiligo, a purpura, — 92 — demais encontram-se as bolsas ou copinhos (godets)favicos,os furunculos parasitários, os abcessos dermicos. Emfim ás erupções symptomaticas devem prender-se diversas perturbações funccionaes, independentes da causa parasitaria, mas próprias da erupção, taes como prurido, sentimento de queimaduras, etc. 4.° Os primeiros symptomas sympathicos que apparecem são perturbações da innervação cutânea. O prurido é, de ordinário, o primeiro symptoma; de ordinário elle existe antes, durante e depois das erupções parasitárias. Este prurido offerece caracteres diversos: ora é franco, e ao mesmo tempo moderado ; ora é violento, e acompanhado de um sentimento de tensão, de queima- dura ; elle augmenta de ordinário para a noite, sobretudo quando é devido aos parasitas animaes. Depois das perturbações da innervação cutânea, vem a insomnia, a fadiga e a inappetencia. Podem também em casos excepcionaes observar-se os symptomas da cachexia parasitaria (Bazin). As affecções parasitárias são eminentemente contagiosas : o contagio pôde fazer-se pelo ar, pelo contacto immediato, pelo mediato e pela inoculação. Convém entretanto que se diga que d'esses quatro modos de contagio dous somente pertencem aos parasitas animaes, e são o contacto immediato e o mediato ; os parasitas vegetaes podem trans- mittir-se das quatro maneiras. A moléstia pôde communicar-se de homem a homem, do homem aos animaes, e reciprocamente (Bazin). Os elementos constitutivos dos parasitas vegetaes têm sido refe- ridos a dous systemas: o systema reproductor, que comprehende os sporos e os filamentos receptaculares ; e o systema vegetativo, que só encerra o mycelium. Os sporos são os corpos reproductores de todas as plantas cryto- gomas ; nos vegetaes parasitas, são corpusculos cellulares, que se apresentam, no microscópio, sob o aspecto de granulações brancas, refractando a luz, parecendo formados de um duplo envoltório, e contendo em seu interior granulos, que não são outra cousa senão — 93 — sporos menores que, em alguns casos, parecem dotados de movi- mentos rotatórios. As dimensões d estes sporos varia entre 1 e 6 micro-millimetros. Os filamentos receptaculares são cellulas alongadas, sob a fôrma de tubos, encerrando sporos. O mycelium é composto de cellwlas alongadas, sob a fôrma de tubos mais ou menos estreitos ; ha o mycelium dematoide e o membranoso. Os parasitas animaes pertencem a um grande numero de espécies distinctas; são conhecidos pelos nomes de ectozoarios, epizoanos, ectoparasitas. ARTIGO II. Das affecções parasitárias em particular. Ha duas espécies de affecções parasitárias: as que são produzidas por vegetaes parasitas, as que o são por animaes parasitas. Só trata- remos, e resumidamente, de entre as primeiras das tinhas e de entre as segundas, da sarna. § I.° Das tinhas. — As tinhas são affecções cutâneas produ- zidas pelos vegetaes tríchophyticos, parasitas que, com quanto possam desenvolver-se sobre o epidemia, tem como sede de predilecção os pellos e as unhas. Ha três espécies de tinhas : a favosa, a tonsurante e a peitada ou descalvante. A favosa é devida ao achorion Schoenleinii, a tonsurante ao trichophyton tonsurans e a pellada ao microsporon Audouini. A tinha favosa é caracterisada por incrustações amarelladas, mais ou menos espessas, seccas, ásperas, de um cheiro sui generis, ora dispostas de uma maneira irregular, ora, ao contrario, artisticamente deprimidas em fôrma de copos de uma regularidade notável. — 94 - Admitte Bazin três subdivisões da tinha favosa, que são: a urceolaris, a scutulata e a squarrosa. A tinha tonsurante é uma manifestação cutânea especial, branca, laminosa ou floconosa, devida a um parasita vegetal,erupção que tem sua sede sobre o epiderma ou sobre pellos quebrados, e que pôde ser acompanhada de outras erupções symptomaticas numerosas, vesiculosas, pustulosas, tuberculosas, etc, segundo sua sede e a época em que é estudada. Bazin admitte três espécies de tinha tonsurante, que são : a circinata, a punctata e a gyrata. A tinha pellada ou alopecia é caracterisada pela queda dos pellos e por uma espécie de lanugem esbranquiçada. Ha duas espécies : simples e achromatosa. As tinhas todas offerecem caracteres communs: todas são con- tagiosas, todas produzem uma alteração dos pellos, e, segundo o período da sua existência, uma calvicie temporária ou permanente ; o prurido é um dos seus signaes mais constantes ; são notáveis por uma grande resistência aos tratamentos ordinários, por sua duração muitas vezes indefinida e pela extrema raridade de uma cura espontânea ; emfim exigem uma therapeutica idêntica, da qual em todos os casos pode-se esperar uma cura completa. Em todas ellas podemos considerar três períodos, quanto aos symptomas e á marcha : germinação, estado e declinação, do vege- tal parasita. No primeiro periodo o prurido ê ordinariamente franco, algumas vezes acompanhado de ardor, de erupções fugazes, vesiculosas, pustulosas, erythematosas... uma hypersecreção do epiderma, a alte- ração primitiva dos pellos, caracterisam essencialmente este periodo. A alteração dos pellos varia conforme a espécie de tinha ; elles tornam-se seccos, desluzidos, o seu diâmetro não é o mesmo nos differentes pontos da sua haste, elles offerecem nós e estreitamentos, mudam de côr, e, em vez de serem louros ou pretos, tornam-se russos, avermelhados, pardacentos, argenteos, etc. - 95 - No segundo periodo, o prurido continua; apparecem crôstas amarelladas e mais ou menos espessas no favus, lâminas brancas e nacaradas na tinha tonsurante, uma ligeira penugem esbran- quiçada ou cinzenta na pellada. Ora o parasita está só, ora acha-se misturado a restos epidér- micos, á matéria pigmentaria, etc. Ao mesmo tempo manifestam-se outras erupções symptomaticas mais profundas, acompanhadas tam- bém de prurido ; observa-se uma alteração mais adiantada dos pellos, que não só são friaveis, lanuginosos, entortilhados, de uma côr difterente, mas ainda cahem ou se quebram na superficie da pélle, de modo que ha, menos na tinha tonsurante, uma calvicie que não deve ser confundida com a que vem algumas vezes em um periodo mais adiantado, pois que esta é permanente e aquella é tempo- rária . O terceiro periodo é caracterisado por uma calvicie definitiva, resultante ordinariamente da destruição da papilla pilosa e da obli- teração do canal pilifero. Vê-se muitas vezes o parasita desappa- recer com as erupções symptomaticas, e o doente acha-se curado. § 2." Da sarna — E uma affecção cutânea, eminentemente con- tagiosa, produzida pelo acarus scabiei ou sarcopta, caracterisada por uma lesão especial {eminência acariana e sulco) e por erup- ções inflammatorias symptomaticas que variam segundo a idade da moléstia, a idade do indivíduo contaminado e as predisposições in- dividuaes. Quatro ordens de symptomas devem chamar a nossa attenção na sarna: Io, symptomas fornecidos pelos sarcoptas; 2o, sympto- mas resultantes das modificações que os parasitas imprimem direc- tamente na pélle e a seus annexos (sulcos); 3o, as erupções symptoma- ticas • 4o, finalmente, os phenomenos sympathicos (perturbações da innervação cutânea). \.° O sarcopta, também chamado acarus scabiei, t um parasita animal, que não deve ser considerado como insecto, mas sim como - 96 - uma arachnide tracheana degradada (Moquin-Tandon). É um animaculo molle, esbranquiçado, transparente, luzidio, de fôrma arredondada, de 33 micro-millimetros de comprimento sobre 25 de largura. Nas costas existe um certo numero de tuberculos corneos (aguilhões), uns cheios, outros tendo um canal; no abdô- men, ha rugas transversaes, irregulares, mas ás vezes curvilineas para traz sobre a linha mediana, ha uma chanfradura ao nivel da qual, sobre as costas, acha-se o ânus com dous pares de sedas. As patas, em numero de 8, firmam quatro pares, dous anterio- res e dous posteriores. As anteriores terminam-se por uma parte muito delgada, rija, tubulosa, trazendo em sua extermidade uma vento sa (ambulacró), disposição notável que facilita singularmente a progressão do animal. As posteriores são abdominaes e termi- nadas por uma longa seda arqueada, sem ventosa. Dá-se o nome de apodemas ás partes duras que constituem o squeleto. Um apodema mediano representa o sternum ; os apodemas late- raes occupam a parte inferior das patas e representam as epimeras dos insectos. A cabeça do sarcopta, pequena, estreita, obtusa, de fôrma ovoide, offerece duas sedas em sua origem e se compõe de duas mandibulas, de dous maxillares e duas palpas maxillares enormes, formadas de três artículos e trazendo três pellos, sendo tudo rodeado por um rebordo delgado, membranoso, representando as bochechas. O mento é situado sobre a convexidade dos ma- xillares, e sobre um plano inferior acha-se o lábio inferior, onde existe uma lingueta lanceolada. A bôcca continua com o esophago e este com o estômago ; o intestino é curto, e o recto se dilata antes de se abrir fora. O systema nervoso é representado por uma intumescencia transversal, situada perto do esophago, d'onde partem filamentos muito delicados. O sarcopta não tem olhos. O apparelho genital da fêmea é situado atraz do apodema sternal; o do macho, na parte posterior e mediana do abdômen. Existem notáveis differenças entre o sarcopta macho e o sarcopta - 97 - fêmea. O sarcopta fêmea, sob o ponto de vista pathologico, é muito mais importante que o macho. 2.° Os sulcos são as únicas lesões directamente produzidas pelos sarcoptas ; constituem o symptoma mais importante da sarna. Elles se assemelham aos traços esbranquiçados que se produz, passando ligeiramente um alfinete sobre a pélle. Quando os indivíduos são limpos e têm a pélle fina, o sulco é branco e cinzento ; elle é ennegrecido nos indivíduos sórdidos, cuja pélle é dura e espessa; emfim, toma a côr imprimida á pélle por certas profissões. O comprimento d'estes sulcos varia entre alguns millimetros e um ou dous centímetros. Cada sulco tem duas extre- midades : uma aberta, desigual, correspondente ao ponto por onde o parasita penetrou na pélle ; outra fechada, arredondada, onde elle se conserva. É sobretudo nas mãos, nos intervallos dos dedos, na face anterior do punho, que os sulcos se encontram ; depois no homem é no penis, e na mulher é nos seios. 3.° O sarcopta representando na pélle o papel de corpo estra- nho, como os cogumellos nas tinhas, desperta erupções diversas. As principaes erupções provocadas pelo acarus scabiei são vesicu- las, papulas, papulo-vesiculas e pústulas. Na producção d'essas erupções não deixa também de representar o seu papel impor- tante a unha do paciente. 4. ° O prurido é, de ordinário, tão intenso que não deixa sequer um instante de repouso ao paciente. E sobretudo para a noite que a coceira torna-se insupportavel para os doentes, privando-os do somno. Da acção das unhas do doente resultam muitas vezes pústulas extensas, crôstas ennegrecidas, sulcos muito apparentes, etc. - 98 - CAPITULO IV. Da elephantiasis dos Gregos, Sobre um ponto tão importante, que pôde offerecer margem a volumes, pouca cousa entretanto diremos. Insistiremos príncipalmente em algumas das manifestações da elephantiasis para a pélle, que são justamente aquellas que em certos casos podem assemelhar-se a algumas syphilides, sobretudo á maculosa e á tuberculosa, dando logar a enganos de diagnostico. A elephantiasis começa ordinariamente por manchas d'um colorido variável: vermelhas, amarelladas, fulvas, ou então brancas; ellas desapparecem pela pressão do dedo. Estas manchas, de fôrma e extensão variáveis, offerecem de ordinário uma ligeira saliência em sua circumferencia e uma pequena depressão em seu centro ; ellas são a sede de prurido e de formigamentos. Em alguns casos, mesmo no principio, nota-se uma anesthesia da pélle, a qual pôde existir não só sobre a mancha como em outros pontos ; em outros casos, ao principio nota-se uma hypersthesia na pélle, a qual de ordinário dura pouco, dando logar a uma completa insensibilidade geral ou parcial. Pôde acontecer que as manchas fulvas se cubram de pequenas vesiculas, que se rompem deixando o derma a descoberto. Estas manchaspodem ser acompanhadas de bolhas de pemphigus, quecontêm um liquido viscoso, amarello-esverdinhado, o qual, concretando-se pelo rompimento das bolhas, fôrma crôstas escuras, rugosas, estratificadas pela addicão de camadas sueeessivas, crôstas que podem revestir todas as fôrmas e deixam cicatrizes brancas, lisas, cobertas de escamas, muitas vezes insensíveis. Esta erupção pemphigoide é muito freqüente, sobretudo na fôrma anesthetica. Quando as manchas se desenvolvem - 99 - sobre partes pilosas, como o couro cabelludo, os supercilios, o lábio somente, sendo lesados o bulbo piloso e suas glândulas, os pellos tornão-se duros, sêccos. rugosos e quebradiços : observa-se logo uma verdadeira alopecia. Quando a moléstia faz progressos, a pélle altera-se em seu aspecto e em sua consistência, ella torna-se rugosa, depois se espessa por pontos ou por placas, para constituir os tuberculos. Os tuberculos se desenvolvem, não só nos pontos já modificados, mas ainda n'aquelles em que a pélle está sã. Elles apparecem em todos os pontos da superficie cutânea, mas parecem ter mais predilecção pela face e pelas mãos. Estas producções tuberculosas variam muito em seu numero, em seu volume, em sua fôrma e em sua disposição. Ao principio limitados a alguns pontos do corpo, elles apparecem insensivelmente e por erupções successivas em outras regiões. A sua dimensão oscilla entre a de uma simples papula e a de uma grossa avelã. Quando estes tumores attingem um grande volume, é quasi sempre isso devido á fusão de dous ou mais tuberculos vizinhos. A sua fôrma é mais ou menos circular, hemispherica, mais ou menos elevada acima das partes circumvizinhas; a sua base é de ordinário larga. Muitas vezes elles se grupam em um ponto symetricamente. Por seu volume e sua fôrma polyposa, os tuberculos deformam e lobulam as partes que lhes servem de sede. Ao nivel dos tuberculos, a sensibilidade é embotada ou abolida a tal ponto, que póde-se atravessal-os, pical-os, excisal-os. cauterisal-os. sem que o doente experimente sensação : ha anesthesia e analgesia completas. Os tuberculos, ulcerando-se, deixam vêr ulceras de formas variá- veis, de bordos algumas vezes talhados a pique, endurecidos, reta- lhados, descollados. Estas ulceras deixam escapar uma sanie sanguinolenta, de grande fetidez. A suppuração é abundante, sobretudo por occasiâo das erupções — 100 — tuberculosas; depois ella cessa e dá nascimento a crôstas, que provêm da dessecaçâo do pus, do sangue e de detritus epitheliaes. Estas crôstas são rugosas, mamillosas. estratificadas, esverdinhadas. A ulceração, depois de ter destruído a pélle, o tecido cellular subcutaneo, ganha as partes mais profundas, os tendões, músculos e ossos. Estas ulcerações se desenvolvem de preferencia na face, no nariz, nas mãos, nos pés, nas orelhas, etc. Os tuberculos invadem as unhas, as deformam, alteram e destróem; os pellos são também alterados, destruidos, participando assim da degenerescencia da pélle. As manifestações da elephantiasis não são exclusivas da pélle; a moléstia invade também quasi que todos os outros órgãos da eco- nomia; symptomas geraes os mais graves se apresentam, o habito externo se modifica, a physionomia do doente reveste um caracter estranho e toma um aspecto horroroso e repellente, em conseqüência do volume dos lábios e das orelhas, do achatamento do nariz, da tumefação das palpebras e da perda dos supercilios: é o aspecto do morphetico, o qual infelizmente é muito conhecido no nosso paiz, aspecto que assemelha o pobre doente a certos animaes, d'onde os nomes de elephantiasis e leontiasis, com os quaes é conhecida a moléstia. Sentimos não poder dar maiores desenvolvimentos a esta ma- téria, que tão vasto campo nos offerece: os estreitos limites do nosso trabalho a isso nos obrigam. O que dissemos, entretanto, parece-nos sufficiente para servir de base ao diagnostico differencial entre as manifestações cutâneas da elephantiasis e as da syphilis. — 101 — TERCEIRA PARTE- Diagnostico fliirencial entre as moléstias cutâneas 4e orlp syphilitica e não syphilitica. Deprehenditar morbus ex eiusis proecedentibus et ex üb quoe mox apparent et qucB aequuntur, (Gdillaüme Rondelet. De morbo iUlico.) Não abandrinaremos n'esta terceira parte, que é propriamente o ponto de nossa dissertação, o plano adoptado para as duas primeiras; para sermos lógico, para que haja ordem, o methodo que presidio as duas primeiras partes, será o mesmo para esta terceira. A nossa these, já o dissemos, não é mais do que um syllogismo, cujas premissas são constituídas pelas duas primeiras partes e cuja conclusão é constituída pela terceira. Foi este o pensamento funda- mental que nos guiou na elaboração das duas primeiras partes, e que portanto nos guiará n'esta terceira. Assim, pois, esta terceira parte não é outra cousa senão a conse- qüência daquillo que estabelecemos nas duas primeiras. O diagnostico differencial entre as dermatoses de origem syphili- tica e não syphilitica pôde ser encarado debaixo de um duplo ponto de vista: diagnostico de gênero e diagnostico de espécie; diagnostico de fundo e diagnostico de fôrma. No primeiro, determina-se simplesmente a natureza da erupção, isto é, se é simples ou especifica ; no segundo, não só se determina a natureza da erupção, mas ainda a lesão elementar que a constitue. Para sermos completo, trataremos de um e de outro. Portanto, — 102 — dividiremos esta parte em dous capítulos, fazendo no primeiro o parallelo entre as dermatoses syphiliticas e não syphiliticas, consi- deradas sob o ponto de vista da sua mais vasta generalidade, pro- curando sempre n'esse parallelo cotejar os symptomas communs, para fazer sobresahir as differenças ; no segundo, faremos o estudo com- parativo entre cada fôrma de syphilide e as moléstias que com ellas se possam confundir, mostrando também em que umas se distin- guem de outras. CAPITULO I. Para enunciar-se com segurança e firmeza um juizo diagnostico sobre a natureza de uma erupção cutânea, convém, é de toda a ne- cessidade, que se tenhão em consideração os phenomenos geraes e precursores d'essa erupção, os seus signaes próprios e communs, finalmente os antecedentes do doente e os symptomas concomitantes. Portanto, n'este capitulo faremos o estudo comparativo entre as affecções cutâneas syphiliticas e simples, mostrando que ellas diffe- rem: Io, por seus symptomas geraes e precursores; 2o, por seus caracteres próprios e communs; 3°, pelos symptomas concomitantes e pelos antecedentes do doente. ARTIGO I. Symptomas geraes e precursores. Quando uma erupção syphilitica acha-se imminente, differentes phenomenos, como já vimos, a denunciam na maioria dos casos : a acção corrosiva do vírus syphilitico sobre o organismo produz - 103 — os symptomas da chloro-anemia, a côr da pélle e a das mucosas torna-se pallida, amarellada, sub-icterica, ha palpitações de cora- ção coincidindo com ruidos de sopro nos vasos do pescoço, os glóbulos do sangue diminuem, a albumina augmenta ; além d'esses, observam-se symptomas nervosos diversos: vertigens, tonteiras, ce- phalalgia, dores rheumaticas, febre syphilitica. Ora, comparando-se estes phenomenos com o que se observa nas affecções dartrosas, scrophulosas, parasitárias e elephantiacas, nada se encontra de semelhante. As affecções herpeticas podem, em alguns casos, annun- ciar-se também por alguns phenomenos nervosos, taes como nevralgia intercostal, sciatica, gastralgia, cephalalgia. Estas nevral- gias, entretanto, não se exasperam para a tarde e para a noite, como acontece com as que são dependentes da syphilis. As eepha- lalgias podem ser lancinantes, intensas, mas são sempre nevralgias francas, sem sede especial, o que não acontece com as que são devidas ao virus syphilitico, as quaes exasperam se quasi sempre para a tarde e para a noite, ordinariamente são bi-temporaes on supra- orlntarias. No dartroso de ordinário não existem as vertigens, as ton- teiras ; em casos excepcionaes elle pôde achar-se emmagrecido, offerecer algum desarranjo nas funcções intestinaes, mas nunca offerecerá os symptomas da chloro-anemia, ao menos em gráo tão pronunciado e tão depressa como o syphilitico. Na maioria dos casos mesmo as erupções dartrosas se fazem, sem ser precedidas de prodromos, ellas se conciliam mais ou menos com a saúde, de modo que pôde não observar-se desarranjo nas funcções intestinaes, o appetite é bom, as evacuações regulares, não ha emmagrecimento; no syphilitico, isto é cousa que de ordinário não se observa : desde que o virus syphilitico é introduzido no organismo e abi permanece por algum tempo, symptomas geraes são logo observados. A menos de complicação de rheumatismo, nào se observaráõ no - 104 dartroso as dores articulares e musculares, tão características do segundo periodo da syphilis, com o seu caracter de se exaspera- rem para a tarde e para a noite, de affectarem de preferencia as grandes articulações e os músculos do tronco. Algumas fôrmas herpeticas. revestindo um caracter agudo, podem apresentar febre, mafr esta febre, que de ordinário é ligeira, moderada, e ao mesmo tempo contínua, franca, não reveste a fôrma intermittente, de typo quotidiano, terção ou quartão, sem calafrio inicial, resistindo ao sul- phato de quinina, apparecendo de preferencia á tarde ou á noite, como se observa na febre que precede e de ordinário acompanha as syphilides. Os indivíduos que se acham sob a acção do virus syphilitico são ordinariamente enfraquecidos, abatidos, desanimados, incapazes para exercícios corporaes ou para esforços de intelligencia. O dartroso apresenta ordinariamente um caracter irascivel, é muito affectado de tristeza, melancolia, hypochondria ; o seu en- voltório tegumentario é secco, a transpiração cutânea é difficil e passageira, a pélle é a sede de modificações diversas, taes como ardores, mordicações vivas, pruridos, que se assestam de prefe- rencia na margem do ânus e nas partes genitaes, onde podem adquirir tal intensidade, qus dêm lugar, sobretudo nas crianças, a hábitos viciosos ; a pélle mostra uma extrema susceptibilidade para os excitantes locaes e geraes, experimentando as influencias mais ligeiras e fugazes. Assim, pois, vê-se que os phenomenos observados como pro- dromos no indivíduo dartroso, não se podem confundir com os que se observam no syphilitico ; e para um observador attento, consciencioso e pratico, esses phenomenos podem offerecer elementos para o diagnostico. Quanto ás erupções scrophulosas, os seus symptomas pre- cursores consistem na constituição serophulosa dos autores, de que tratámos largamente em outra parte, e sobre a qual não — 105 - voltaremos, porque ahi nada ha que de leve se possa confundir com os symptomas precursores das syphilide-: apena> lembraremos que as scrophulides se manifestam, sem que se observe qualquer i-eaceào local ou geral: não são precedidas de pruridos, mordica çoes. ardores ou dores: do mesmo modo, não são precedidas de movimento febril ; ellas se manifestam, sem que o indivíduo offe- reça. symptomas differentes daquelles que constituem a r0/iiçno scrophulosa. Quanto ás erupções cutania- parasitárias, ellas não sã<» prece- didas de symptomas prodromicos. e portanto não é possível um estudo comparativo. Quanto ás erupções cutâneas da elephantiasis, ella> sà<> prece- didas ordinariamente por muito tempo de symptomas precursores : mas esses suo de tal ordem, que a confusão é impossível. ARTIGO 11. Signaes próprios e couimuns. Incontestavelmente unia das fontes mais fecundas, que offerece v maior numero de signaes para o diagnostico differencial entre as dermatoses específicas e não especificas, é o estudo compara- tivo entre os seus .-symptomas próprios e communs: ma:*, para o diagnostico sei- seguro, para (pie haja firmeza no juizo, convém que se tenha em consideração nào este ou aquelle signal em particular, mas sim que se considerem todos reunidos : é do con- juneto, do complexo d'esses signaes. é da reunião do maior nu- mero d'elles. que resulta a firmeza no juizo diagnostico ; cada um desses caracteres, tomado isoladamente, para pouco servirá, poii o seu valor ri ao e absoluto; ma,-; considerado conjunctamente 3 u - 106 - com outros, toma-se um auxiliar valioso, um signal precioso que muita luz trará ao espirito do pratico. E principalmente pelo perfeito conhecimento d'esses caracteres. que, na grande maioria dos casos, podemos determinar se uma erupção que se offerece á nossa observação é ou não dependente da syphilis. Esses signaes, pois. nos mereceráõ muito particular attenção. Um dos primeiros caracteres que offerecem as erupções svphili- ticas, e que chama logo a attenção do observador, é a polymorphia ou existência simultânea de muitas fôrmas elementares : muilas vezes sobre uma superfície erythematosa se observam ao mesmo tempo papulas, vesiculas, pústulas e tuberculos. Em nenhuma outra erupção cutânea se observa este caracter, e portanto é uni bom signal diagnostico. Em relação á sede das erupções, encontram-se differenças que podem trazer luz ao diagnostico. As erupções cutâneas, especificas ou não especificas, podem manifestar-se cm qualquer ponto da superficie cutânea; entre- tanto, umas e outras parecem mostrar predilecção mais para uns pontos do que para outros : c assim que as erupções syphi- liticas, segundo Dévergie, occupam de preferencia o contorno das azas do nariz, o contorno da bocca e principalmente as commis- suras labiaes, a raiz dos cabellos sobre a fronte e parte poste- rior do pescoço, os ângulos internos dos olhos, o centro do peito, a parte interna dos membros, a visinhança das axillas e das vi- rilhas ; as erupções dartrosas occupam freqüentemente a margem do ânus, a vulva, a parte interna das coxas, o umbigo, ar- articulações no sentido da flexão, as bolsas c o couro cabel- ludo ; as manifestações scrophulosas são muito freqüentes nas partes lateraes do pescoço e principalmente na pyramide nasal; as affecções parasitárias, devidas á tinha, mostram parti- cular predilecção pelo couro cabelludo, e as que são devidas ao sarcopta começam ordinariamente pelos espaços interdigitaes, - 107 - dorso da mão, punho e penis ; as affecções leprosas começam de ordinário pela face, já occupando os pomos, já o nariz e os lábios, ou todos ao mesmo tempo, e n'esse caso as orelhas não são poupadas. A fôrma da erupção é um signal que deve ser tido em linha de conta. As erupções syphilitieas affectam ordinariamente fôrmas especiaes: são dispostas em circulos completos, em segmentos de circulo mais ou menos extensos, e em linhas curvas ellipticas. Nas herpetides, salvando a herpes circinada e o psoriasis, nada encontra-se que seja semelhante a essa disposição: ahi os contornos dos elementos eruptivos e da erupção herpetica em geral são sinuosos, irregulares ; e quanto á herpes circinada e o psoriasis, que em geral offerecem a disposição circular, a primeira é geralmente considerada moléstia parasitaria, e portanto para levantar duvidas pôde lançar-se mão do microscópio, e o segundo é moléstia muito conhecida, os seus caracteres são muito salienies, para que se possa confundir com as syphilides. Ainda, quanto á fôrma, as herpetides offerecem um caracter, que lhes é próprio, e que as distingue das erupções especificas, e vem a ser a symetria em que de ordinário se offerecem as manifestações dartrosas, symetria que chama logo a attenção; é assim que ellas occupam de ordinário regiões que se correspondem: as partes lateraes do pescoço, a parte interna das duas coxas, os dous lados da face, as pregas de cada membro, os dous lados da região gluttea, etc. A fôrma das scrophulides é irregular, n'ellas não se observam de ordinário as fôrmas circulares e em linhas curvas ellipticas, das syphilides. As affecções parasitárias podem, em alguns casos, como no da herpes circinada, offerecer fôrmas semelhantes ás que se observam nas erupções syphiliticas ; mas, n'esses casos, não só ha o recurso do microscópio, como existem outros muitos symptomas que devem ser — 108 — considerados, e que de ordinário não deixam duvidas no espirito do pratico observador rigoroso. As erupções da elephantiasis são muito variáveis quanto á fôrma, e portanto não podem dar logar a enganos. As syphilides, assim como as scrophulides e as lesões da lepra tuberculosa, são fixas, isto é, não viajam, não mudam de lugar; no ponto em que se desenvolvem, abi passam por todas as phases da sua evolução; as svphilides podem em muitos casos ser generalisadas, mas podem ser oiroumscriptas a uma região ou mesmo a. uma parte mais limitada: as scrophuli les são quasi sempre circumscriptas, tendo muito pouca tendência a se generalisar, excepto porém a scro- phulide tuberculosa, disseminada-: ellas se estendem em largura e em profundidade, mas permanecem no mesmo ponto, não mudam de logar: as lesões da elephantiasis também são fixas e quasi sempre circumscriptas a algumas regiões, como á face, ás orelhas, ás mãos, que são de ordinário os primeiros pontos attacados. As herpetides e as affecções parasitárias, ao contrario, têm grande tendência a invadir muitas regiões ao mesmo tempo; raramente ficara circumscriptas a um só ponto do corpo. O que caracterisa as herpe- tides é uma grande mobilidade : pôde acontecer que, primitivamente circumscriptas a um ponto. d'ahi ellas se irradiem e ganhem as partes vizinhas, ou então podem attingir pontos mais ou menos afastados uns dos outros: em outros casos offerecem uma grande mobilidade, de modo que desapparecem e se reproduzem, ora sobre as mesmas regiões, ora sobre regiões differentes. As affecções parasitárias, ao principio circumscriptas a alguns pontos, como a cabeça, as mãos, o penis, d'ahi se irradiam sem demora, podendo invadir toda a superfície cutânea, Da côr das erupções se podem colher preciosos dados para o diagnostico. A côr das syphilides é característica: é a côr de carne de presunto, segundo Fallapio; é o colorido cuprico. de Swcdiaur: é o colorido syphilitico. dos autores. A crer das scrophulides é vermelha ltrH — escura, carregada, lívida, roxa, côr de borra de vinho; menos escura que a, das syphilides e menos vermelha que a dos exanthemas ordinários. As herpetides, comquanto não offereçara uma côr característica, jamais offerecem a côr cuprica das syphilides, excepto porém o psoriasis no qual essa côr pôde ser observada, a tal ponto que pôde deixar duvidas no espirito sobre a sua natureza, como aconteceu em um interessante caso que se offereceu ,t nossa observação este anno, na enfermaria de clinica a cargo do nosso mestre Dr. Baboia, caso a que já nos referimos neste trabalho, e no qual as placas do psoriasis eram rodeadas de uma cor manifestamente cuprica, o que levou alguns a acreditarem que tratava-se de uma erupção syphilitica, hvpothese que cora toda a razão não foi aceita pelo intelligente professor. A côr cuprica, porém, nas herpetides e a excepção ; ellas são, de ordinário, rosadas ou avermelhadas, podendo ser em alguns casos brancas, brancas nacaradas, e excepcionalmente um pouco escuras. As erupções parasitárias offerecem cores variáveis, que não têm valor algum diagnostico. O mesmo não acontece com as lesões da. elephantiasis, cujas man- chas e tuberculos são de uma côr fulva, amarellada, ás vezes branca. Nas modificações da sensibilidade cutânea encontrão-se também elementos preciosos para o diagnostico. Nas erupções syphiliticas ha ausência de prurido e de dôr, ao menos dôr espontânea. Nas affecções herpeticas e parasitárias observa-se um prurido, de ordinário intenso, que em alguns casos pôde ser transformado em cruciante dôr, que pôde levar o doente á alienação mental e ao suicí- dio. Assim, todas as vezes que nos acharmos em presença de uma erupção cutânea, que apresento prurido, mesmo moderado, convém que ro pense em uma affecção herpetica ou parasitaria; reciproca- mente, todas as vezes que uma erupção cutânea não offerecer modifi- cação na sensibilidade, convém que se pense em uma syphilide ou em uma scrophulide. - 110 - Isto, entretanto, não quer dizer que as erupções syphiliticas nunca offereçam modificações da sensibilidade cutânea, porque em primeiro logar as affecções syphiliticas do couro cabelludo são pruríginosas, e em segundo logar podem observar-se algumas syphilides exanthema- ticas que, no seu periodo de invasão, são acompanhadas de um ligeiro prurido, que não tarda a desapparecer, sobretudo se o doente é submettido ao tratamento mercurial. Isso, porém, é a excepção. As scrophulides não são acompanhadas de dôr ou prurido; ao con- trario, nos scrophulosos a sensibilidade parece embotada: vêm-se scrophulides ulceradas, profundas, attacar e destruir todos os tecidos e mesmo os ossos, sem o doente experimentar qualquer modificação de sensibilidade, sem que haja reacção. As lesões da elephantiasis, tanto as manchas como os tuberculos e as ulcerações, são insensíveis ; nas manchas e nos tuberculos não só ha analgesia como ha também anesthesia, abolição da sensibilidade dolorosa e da sensibilidade táctil: póde-se, como já dissemos, atra- vessar,picar, excisar os tuberculos, sem que o doente experimente dôr. As erupções cutâneas offerecem, durante as differentes phases da sua evolução, phenomenos que devem ser tidos em linha de conta no diagnostico differencial: são as escamas, as crôstas, as vlceracões e as cicatrizes. As escamas das erupções syphiliticas são esbranquiçadas, super- ficiaes, não cobrem senão incompletamente a saliência eruptiva ; n'ellas existe um bordelete (lisêrê) epidérmico , esbranquiçado, em fôrma de orla (collerete), ao qual Biett ligava summa impor- tância. As escamas das erupções herpeticas, sobretudo as do psoriasis são d'uma côr branca argentea, nacarada, são muito mais espessas, menos adherentes, e superpostas em differentes camadas, imbricadas. As scrophulides não apresentam escamas ; o mesmo acontece para as affecções parasitárias, e quando assim não seja, as escamas, como signal diagnostico, têm mínima importância. — Hl - As lesões da elephantiasis podem offerecer era alguns dos seus periodos algumas escamas. as quaes em geral são pequenas, fur- íuraceas (Lamblin). As crôstas, que resultam da ruptura das bolhas e pústulas syphiliticas, assim como da ulceração dos tuberculos, são espessas, desiguaes. muito adherentes á pélle que as rodéa, duma côr verde-nvyro especial; sua superficie é estratificada, e algumas vezes offerece eminências, elevações, asperezas, que as assemelham á superficie exterior duma concha ou a uma escama de ostra. As crôstas scrophulosas offerecem uma côr branca muito notável, quando são puras, isto é, quando não contêm sangue e nem pus; são inteiramente ennegrecidas, quando contêm uma certa quantidade de sangue misturado a pus ; são espessas, mas não são muito duras e nao offerecem saliências tão destacadas, tão pronunciadas, como as syphiliticas. As crôstas herpeticas são ás vezes espessas, um pouco duras, como acontece, por exemplo, no impetigo, no ecthyma. mas são muito superficiaes e mui pouco adherentes. As crôstas elephantiacas são escuras, rugosas e estratificadas pela addicão de camadas suecessivas, que se formam na base de implantação. As crôstas, devidas ás affecções parasitárias, são, em geral, pouco adherentes e superficiaes. As ulcerações syphiliticas têm os bordos claros, talhados a pique, não descollados; o fundo d'estas ulcerações é pardacento, como que revestido duma pseudo membrana ; o piís é sanioso, fétido, e muito plástico. Os bordos das ulcerações scrophulosas não são talhados a pique, são irregulares, delgados, retalhados, descollados; o fundo das ulcerações é fungoso, sangrento, ou apresenta botões carnudos, pallidos, amollecidos, de má natureza, algumas vezes exhuberantes ; a pseudo-membrana, que encontra-se revestindo o fundo das ulcerações syphiliticas, raramente é encontrada nas /crophulosas. — 112 - As ulcerações das affecções herpeticas em geral sào superficiaes, salvo entretanto em algumas fôrmas raras, como no rupia, cm que podem ser um pouco profundas : o mesmo acontece para as affecções parasitárias, que em geral nào oiVereccm caracteres dignos de nota. Os bordos das ulcerações elephantiacas sào variáveis : algumas vezes endurecidos, descollados: outras vezes retalhados ou talhados a pique ; o pus é sanioso, fétido, de cheiro característico, semelhante ao cheiro de rato. As cicatrizes syphiliticas são arredondadas, menores que as ulce- rações a que succedem, no seu centro ha unia depressão em relação com a perda de substancia ; a pélle, enrugada ou unida, é muito fina; o seu colorido nos primeiros tempos é escuro, arroxeado, muitas vezes mais accentuado do que o era ao redor das ulcerações. As cicatrizes scrophulosas são ordinariamente deprimidas pela reabsorpção do tecido cellular subjacente ; o seu aspecto é reticulado, o que as assemelha ás cicatrizes das queimaduras do 3o e 4o gráo; outras vezes as cicatrizes são salientes, desiguaes, bridadas e granu- losas. como verrugas, ou então sào exhuberantes ; o seu colorido é violaceo, roxo, o qual apaga-se pouco a pouco, para dar logar á côr branca, eommum a todas as cicatrizes. As herpetides em geral não deixam cicatrizes, excepto em raras excepções ; as suas ulcerações, sendo muito superficiaes, desapparecem sem deixar vestígio : em algumas fôrmas, porém, se bem que raras, como no ecthyma, no rupia, podem ficar pequenas cicatrizes brancas, que de ordinário vào suceessi vãmente se modificando ate que desap- parecem completamente, ou ficam quasi desapercebidas. O mesmo podemos dizer das affecções parasitárias, que em geral não deixam cicatrizes. Na elephantiasis, quando existem cicatrizes, ellas são brancas, lisas, c de ordinário cobertas de escamas. TS&marcha das erupções cutâneas, encontram-se differenças notáveis. A marcha, das syphilides, comquanto lenta; chronica, è entretanto - 113 —■ progressiva, isto é, as erupções syphiliticas não ficam estacionarias: ellas se modificam, se transformam, de modo que freqüentemente uma erupção succede a uma outra. As affecções cutâneas da scrophula ufferecem sempre a mesma fôrma durante toda a sua existência; o que as caracterisa é a excessiva lentidão da sua marcha,, de modo que é rarissimo que durem menos de seis mezes, podendo durar em outros casos lü, 15, 20 annos e mais. A marcha das affecções herpeticas c também chronica, é lenta, a moléstia pôde também prolongar-se durante annos ; mas essas affecçòes offerecem quasi sempre intervallos mais ou menos longos de remissão, sendo um dos caracteres d'essas erupções, como sabemos, uma grande mobilidade, sobretudo no principio. As anecções parasitárias têm uma marcha progressiva, podendo a moléstia durar muitas vezes indefinidamente; abi também as erupções se succedem, mas de ordinário com os mesmos caracteres. Quanto á elephantiasis, moléstia totius substancia', a sua marcha é bem conhecida : ás mauchas succedem de ordinário tuberculos, a estes ulceras, que vão se generalisando e depauperando cada vez mais o pobre doente, fazendo-o cahir em uma profunda cachexia, que infelizmente o leva inevitavelmente á sepultura. Do modo de terminação das erupções, também podem-se colher dados diagnósticos. As syphilides tendem sempre para a resolução e para a ulceração; as scrophulides tendem para a hypertrophia e ulceração, podendo mesmo, em muitos casos, ficar indefinidamente estacionarias; as affecçòes dartrosas tendem para a resolução ou ficam estacionarias ; as lesões da elephantiasis tendem para a ulceração, raramente para a resolução. Ainda ha differenças profundas entre as dermatoses syphiliticas e nào syphiliticas, quanto ao contagio e inoculabilidade. E hoje geral- mente admittido, como mostrámos, que a syphilis secundaria é con- tagiosa e inoculavel, ao menos alguns dos seus accidentes; as scrophulides não são contagiosas e nem inoculaveis; a elephantiasis, 3 15 — 114 - comquanto seja geralmente considerada contagiosa, ao menos pelos indivíduos alheios á medicina, não c considerada como tal pelos autore» de dermatologia; quanto ás moléstias parasitárias, ellas são contagiosas e inoculaveis. Finalmente, nos casos duvidosos, quando o nosso espirito vaciliar sobre a natureza de uma dermatose, convém prestar séria attenção aos resultados do tratamento: pois que sabe-se que as syphilides precoces obedecem de ordinário promptamente a um tratamento mercurial, e as tardias a um tratamento mixto, de mercúrio e iodureto de potássio, ou somente de iodureto de potássio, que c o medicamento por excellencia da syphilis terciaria, assim como o mercúrio o é da secundaria ; que as scrophulides se modificam em geral sob a influencia de um tratamento tônico, fortalecente, em que entre principalmente óleo de figado de bacalháo ; que as affecções herpeticas em geral, e algumas fôrmas em particular, obedecem a um tratamento, cujas bases principaes sejam o arsênico e o enxofre; que a epilação, as pomadas sulphurosas e mercuriaes, etc, são os meios próprios para combater as moléstias parasitárias cutâneas; finalmente que a elephantiasis, sendo geralmente considerada uma moléstia in- curável, todos os meios contra ella empregados não são outra cousa senão palliativos. Com estas bases, desde que haja duvida sobre a natureza de uma affecção cutânea, na suspeita de que antes se trate de uma affecção do que de outra, póde-se lançar mão do tratamento que nos parecer mais apropriado á natureza da afíêcção supposta, para observar os seus effeitos e certificar- se no juizo diagnostico, a des- peito mesmo dos protestos de Oazenave, Dév«rgie, e outros. ARTIGO 111. Antecedentes do doente e symptomas concomitantes, A historia dos antecedentes mórbidos do doente, assim como o exame atfeiito e minucioso da superficie do corpo, offerecem — 115 ordinariamente elementos muito preciosos para o diagnostico : todas as vezes que nos acharmos em presença de uma erupção cutânea, cuja natureza seja duvidosa, é de toda a necessidade que se conheça essa historia e que se faça esse exame. .Segundo as idéas geralmente aceitas hoje na sciencia sobre a syphilis, esta moléstia de ordinário offerece uma marcha regular, na qual se distinguem certos e determinados perío- dos, cada um dos quaes é caracterisado por affecções próprias, sempre as mesmas; é assim que a escola moderna, cujas idéas abraçamos, admitte que a syphilis offerece em sua marcha Ires períodos distinctos '• primitivo, secundário e tereiario. O primeiro periodo é caracterisado pela existência de um cancro, cujos caracteres são bem conhecidos : é o cancro duro, hunteriano, syphilitico; o cancro simples e a blennorrhagia, comquanto não sejam accidentes dependentes da syphilis. podem, entretanto, e isso não é raro, coexistir como cancro duro; o cancro syphilitico só appareer em geral 36 ou 48 horas depois que o virus foi inoculado, podendo mesmo este periodo de incubação ser muito mais longo. Sô algum tempo depois do apparecimento do cancro infectante, tempo que de ordinário não excede de um ou dous mezes, é que a syphilis começa a fazer-se sentir por suas manifestações para o lado da pélle e das mu- cosas, sendo então para o lado da pélle caracterisada pelas syphilides. Depois a moléstia, sempre progressiva e invasora, marcha da peripheria para o centro, da pélle e das mucosas ella passa ao tecido fibroso, aos osso:;, e finalmente ás vísceras. Esta é, em geral, a marcha d'essa, moléstia destruidora, Ora, cada um d'esses períodos deixa, ordinariamente signaes, vestígios indeléveis da sua passagem; é assim que, apparecendo as syphilides, é porque já houve ou ha ainda cancro, que geralmente é acompanhado de adeno- pathias inguinaes e cervicaes, que muitas vezes suppuram, deixando em seu logar cicatrizes especiaes ; também algumas syphilides, como as ulcerosas, as pustulosas, as serpiginosas, deixam signaes caracte- rísticos da sua passagem. — 146 — Pois bem: para nos pronunciarmos sobre n, natureza de uma erupção cutânea, convém muito, é de absoluta necessidade que examinemos a superficie do corpo do doente, assim como as mucosas das aberturas naturaes, procurando verificar se ha, principalmente nos órgãos genitaes e nas regiões inguinal e anal, cicatrizes ou signaes que de- nunciem a anterior existência de cancros, de bubões, assim como qual a fôrma e a natureza desses signaes; no caso de verificar-se a exis- tência d'esses signaes, convém indagar ha quanto tempo se deram os accidentes que os produziram. Muitas vezes verifica-se mesmo a existência de cancros, coexistindo com as syphilides, sobretudo com as precoces, e isso, como se com- prehende, é de summo valor para o diagnostico, sobretudo se esse cancro offerecer os caracteres do cancro duro, hunteriano. t onvém, entretanto, que se previna uma causa de erro: pôde acon- tecer que não se encontre a cicatriz do cancro, porque este, tendo consistido em uma pequena ulceração, desappareceu sem deixar ves- tígio da sua passagem, e nem por isso a erupção cutânea deixa de ser de natureza especifica; mas n'esses casos, attendevemos a outros symptomas. e a duvida de ordinário não persiste. Além d'este exame feito sobre o corpo do doente, convém que este seja interrogado sobre os seus antecedentes mórbidos: se seus pais e ascendentes soffreraiu de syphilis, dartros, scrophulas, elephantiasis, que sào moléstias hereditárias ; se elle em algum tempo soffreu de acci- dentes venereos, de cancros, bubões, de blennorrhagia; se, no caso de ter soffrido. não padeceu de rheumatismo, de dores de cabeça á noite, de feridas na garganta, de moléstias de olhos; se não lhe appareceu alguma erupção pelo corpo, se não teveboubas, etc: procurando vêr se ha filiação entre os symptomas, para reconhecer a natureza da erupção que tivermos de examinar. ' V>nvéni ainda que se indague, se é a primeira vez que o doente soffre d'essa erupção, ou se já tem soffrido mais vezes ; se as erupções foram circumscriptas. generalisa:us anneis offerecem uma marcha centrífuga e progressiva, de modo que vai invadindo grandes extensões, ao passo que a sy- philide fica estacionaria. ARTIGO IX. Syphilide tuberculosa. E a fôrma que dá logar a maior numero de enganos. Trataremos de cada variedade em particular. l.u A syphilide tuberculosa disseminada, ou papal od.uberculo&a (Bazin), só pode ser confundida com a o.c»e induroAo... — 131 Eis. c-nfrríanio. os caracteres distiuctivo.-,: a aeneéde ordinário limitada á face, ás costas e ao peito, ao passo que a syphilide é disseminado em grandes superfícies: a syphilide é constituída por uma saliência tuberculosa, sem pústula no ápice, ao passo que na acne não ha saliência tuberculosa, mas ha pústula no ápice do elemento eruptivo ; a syphilide é rodeada por uma areola cuprica bem pro- nunciada, é precedida de accidentes primitivos e acompanhada de outros accidentes da syphilis, ao passo que na acne nada d'isso se observa. (2.° Syphilide tuberculosa cm grupos nao ulcerados. -A úni- ca affecção que poderia confundir-se com esta fôrma é a scrophulide tuberculosa. Para estabelecer-se o diagnostico; convém consultar a constituição do doente, os seus precedentes mórbidos, assim como os symptomas concomitantes, e em alguns casos duvidosos lançar mão do tratamento, para observar o resultado. Além d'estes meios geraes , pódc-se ainda distinguir, na maioria dos casos, uma affecção de outra, por meio de seus caracteres objectivos difterenciíies: o tuberculo scrophuloso é menos duro, semi-transparente, violaceo, e é acompanhado de engur- gitamento do tecido cellular sub-cutaneo; as suas cicatrizes são enru- gadas, irregulares e muitas vezes salientes, embora mesmo não tenha havido ulceração ; ao passo que nos tuberculos syphiliticos não se observam esses caracteres. 3.° Syphilide tuberculo-serpiginosa.—Esta variedade, também conhecida pelos nomes de syphilide serpiginosa ulcerosa (Hardy, Ba- zin, etc), offerece muitas semelhanças cora a scrophulide pustvlnsa e com o cancro phagedenico. Ella se distingue da scrophulide pustulosa. cuja ulceração é de uma côr mais pallida, arroxeada. li vida, mas não cuprica: cujos bordos são descollados. retalhados, irregulares ; cujo piís é mais liquido e como seroso • cuias crôstas são brancas, amarellas ou negras. mas - 132 - não verde-negras como as da syphilis; além d'isso ha ausência da areola cuprica e dos symptomas concomitantes. Ella se distingue do cancro phagedenico, porque este é quasi sempre único, se desenvolve de ordinário nas partes genitaes, o seu aspecto é particular, a suppuração é clara e abundante, de modo que diíficil- niente se formam crôstas sobre a ulceração ; além disso, como ordi- nariamente o cancro phagedenico é simples, o pus é inoculavel no indivíduo affectado. í.° Syphilide pustulo-crustacea.— Esta variedade só poderá ser confundida com a scrophulide pustidosa e com o ecthyma cacheticum . Para distinguil-a da scrophulide pustulosa. convém attender aos symptomas precedentes, aos concomitantes e, em alguns casos, lançar mão do tratamento. Além d'isso ella se distingue da scrophulide, porque a crôsta d'esta é branca ou negra, mas não de um negro es- verdinhado como a da syphilide; as ulcerações scrophulosas têm bor- dos irregulares, não talhados a pique, descollados, o fundo d'estas ulcerações não é revestido da pseudo-membrana cinzenta, especial ás ulcerações syphiliticas ; as cicatrizes, em vez de serem deprimidas, de um branco baço , são irregulares., salientes, vermelhas arroxeadas. violacea s. Para distinguil-a do ecthyma cacheticum, eni geral, não ha diflicul- dade : pois esta moléstia é própria dos indivíduos debilitados, velhos ; assesta-se quasi que exclusivamente nos membros inferiores ■ as suas pústulas são mais numerosas, mais approximadas; a areola que as rodêa é mais violacea, e as ulcerações são mais superficiaes. 5.° Syphilide tuberculo-crustacea (perfurante dos autores).__ Esta variedade pôde offerecer semelhanças com as scrophulides pustuloso, e ■ulcerada. e com as ulceras cancerosas. Para distinguil-a da scmphvlide pustulosa, convém notar que na syphilide as crôstas são mais salientes, mais desiguaes, mais duras, — 133 offerecem uma côr esverdinhada característica; quando cahem, deixam ulcerações arredondadas, de bordos talhados a pique, tendo o fundo forrado por unia pseudo-membrana especial á svphilis: cicatrizes não são tão profundas e conservam por muito tempo a côr escura característica; emfim, a marcha da scrophulide é muito mais lenta. Km muitos casos, entretanto, não bastam os phenomenos objecti- vos, é preciso consultar os precedentes do doente, os phenomenos concomitantes, a marcha da affecção, e lançar mão do tratamento. Para distinguil-a da scrophulide ulcerosa, convém attender a que n'esta os bordos da ulceração são descollados, irregulares, os tecidos subjacentes são <-omo edemaciados, ao passo que na syphilide os bordos são talhados a pique, regulares, e os tecidos adjacentes não soffrem modificação; a ulceração da scrophulide é rodeada de uma areola livida e não cuprica, as crôstas são negras e não esverdi- nhadas, as cicatrizes são profundas, irregulares, bridadas, caracteres que não encontram-se na syphilide. Emfim, convém attender aos antecedentes do doente, aos pheno- menos concomitantes e ao tratamento. As ulcerações cancerosas se distinguem, porque eomeçam por um botão verrucoso, que persiste por muito tempo antes de se ulcerar; os seus bordos são salientes, revirados para fora ; as cicatrizes, quando se formam, são muito apparentes; finalmente, ha ausência de antece- dentes syphiliticos, dos phenomenos concomitantes das syphilides, e o tratamento mercurial não aproveita (>.° Syphilide gomniosa.— Esta variedade, quando ulcerada, só se poderá confundir com a scrophvlide tuberculosa ulcerosa (profunda de Bazin). Eis os caracteres differenciaes: comquanto ambas comecem por pequenos tumores, os da scrophula têm um período de induração menos longo, formam uma saliência menos distineta em baixo da pélle, sua consistência é menos dura que os da syphilis; a suppuração 13', — o.-, invade simultaneamente em todos os pontos da sua extensão; elles formam então sobre a pélle uma saliência em cone ; quando se abrem, a pélle se offerece adelgaçada, descollada em toda a extensão da bolsa, o pús é semelhante a soro, turvo, amarellado, avermelhado, misturado de fragmentos caseosos ou fibrinosos : são rodeados de uma areola roxa, livida. Na syphilide gommosa, a suppuração começa pelo centro do tumor, emquanto que a base fica ainda endurecida ; a pélle não é levantada em cone; o endurecimento da base persiste, mesmo quando o pús é evacuado: o pús é sanioso, mais ou menos fétido, semelhante á colla ou a uma solução de gomma; depois da evacuação do pús, a base se rodêa de uma areola cuprica, Além d'isso, a marcha da syphilide não é tão lenta como a da scrophulide, Nos casos duvidosos, convém attender, como já muitas vezes temos dito, aos antecedentes do doente, aos phenomenos concomitantes e ao resultado de tratamentos apropriados, C$á6 4€€lSS^ílIâ FLOE ;CADEIKA DL BOTÂNICA) PROPOSIÇÕES i L ma flor completa se compõe de quatro verticillo>, disposto? symetricamente e alternando uns com os outros, que são, de fora para dentro : cálice, corolla. estames e carpellas. [1 Os dous primeiros verticiUos sào chamados órgãos protectores, e constituem o periantho da flor. Nào sào essenciaes, podendo faltar ambos ao mesmo remp" ou somente a corolla : no primeiro caso a flor chama-se aperianthada, no segundo chama-se apetala ou nionoperianthada. III O cálice, que é o primeiro envoltório da flor, se compõe de muitas peças, que se chamam sepalas. e que não sào mais do que folhas modificadas, O cálice chama-se gamosepalo, quando as peças que o compõem são soldadas entre si; polysepalo, quando essas peças Sào livres e distinctas . 1294 29 iob — IV A corolla, que é o segundo envoltório da flor, se compõe de muitas peças, que se chamam pétalas, e que não sào mais também que folhas modificadas. A corolla é yamvpetala, (juando as peças que a compõem sào soldadas entre si; polffpétala, quando essas peças oào livres e distinctas. V Os dous últimos verticillos da flor sào chamados órgãos reproductores ou sexnaes: os estames são sexuaes masculinos, as carpellas sexuaeíí femininos. A reunião dos estames dá-se o nome de androeèo, á das carpellas o de gynecêo ou pistilo. VI Cada estame se compõe de três partes ; anthera, pollen e Jilete. VII A antheraê um pequeno saccomenibranoso, algumas vezes simples, mas ordinariamente offerecendo duas lojas, raramente quatro, desti- nado a conter o pollen. VIII O pollen. matéria íecundante dos vegetaes, se apresenta sob a fôrma de granidos extremamente pequenos, ordinariamente amarellos, globulosos, ovoides ou polyedricos, contidos nas lojas da anthera. IX Cada grão de pollen offerece duas membranas: uma externa, es- pessa, pouco extensível, apresentando poros, chamada exhymenina; - 137 outra interna, delgada, transparente, muito extensível, chamada cmlhymeuiua, cm cuja cavidade encontra-st um liquido mucilaginoso. chamado yW/V/, no qual existe uma grande quantidade de corpusculos dotados de movimentos diversos fbrowuianosy. X <>s grãos de pollen podem achar-se livres e distinctos uns dos outros, formando mm matéria, pulverulenta que, por dehisccn cia, escapa-se da anthera na época da fecundação ; ou reunidos por uma matéria vi.eosa e elástica, formando uma massa solida, que se molda exactamente sobre as parede- das lojas. XI o Jilete é o sustentaculo da anthera. É um filamento ordina- riamente cylindrico, ou ligeiramente adelgaçado da base ao ápice. Os filetes muitas vezes se soldam, formando feixes, chamados androphoros. XII Quando os filetes formam um só feixe, os estames chamam-se monadelphos; quando dous, diadelphos; quando três ou mais feixes, polyadelphos. XIII Uma flor pode conter um ou muitos estames. XIV Cada carpella se compõe de tre> partes : viário, stylo c stigmatt. XV O ovario c uma cavidade fechada., simples ou composta, con- tendo um ou muitos óvulos. à 18 — 138 — XVI O ovario é simples, quando pertence a uma carpella única e livre, e constando por tanto de uma só loja; é composto, quando é formado por muitas carpellas reunidas em um só corpo, e con- stando por tanto de tantas lojas quantas forem as carpellas reu- nidas, mas podendo constar de uma só loja. XVII Os óvulos acham-se presos ao ponto de juncção dos dous bordos das carpellas, por meio de um corpo especial chamado — plaçenta ou trophosperma. A placentação pôde ser axile, central ou parietaL XVIII O estylo é um pequeno corpo cylindrico, mais ou menos alon- gado, que implanta-se na parte superior do ovario. Ás vezes falta, e então o stigmate é sessil. XIX O stigmate é uni corpo glandular que termina o stylo, quando este existe, e que repousa innnediatainente sobre o ovario, quando falta o stylo. Ha sempre tantos stigmates quantos forem os stylos ou as carpellas. XX Considerados em relaçào á sua posição na flor, os estames sao %PW^- perigynos, ou epigyuos. segundo inserem-se abaixo, ao redor ou em cima do ovario. »• seecionado a pélle, o músculo cuticular. a aponevrose e as camadas de tecido cellular frouxo, cabe-se no espacei muscular formado pelo sierno-hyoidèo e thvroidêo, onde se acha o feixe vascular. XVI Ohegando-se a esse ponto, convém que os tecidos fiquem completamente relaxados, para que a artéria seja mais facilmente encontrada : conseguido o que, levanta-se o omo-hyoidêo e afasla-sc para traz o sterno-mastoidêo. XVII Desde que se descobre o feixe dos vasos, afasta-se para traz a jugular. que de ordinário acha-se muito intumescida, e com - MS - todo o cuidado levanta-se e incisa-se a bainha da artéria, passand o- se-lhe em seguida a ligadura, por meio d'uma agulha curva. XVIII Convém muito cuidado, muita attenção, para não ferir a jugular e o pneumo-gastrico, ou para não liga-las conjunctamente com a artéria. XIX No caso de ferimento da jugular, convém applicar-lhe uma ligadura lateral, ou mesmo ligal-a completamente. XX A ligadura da carótida primitiva é operação que de ordinário produz brilhantes resultados. QUARTO POKTO AS BOUBAS, SUA ORIGEM E SEU TRATAMENTO. CADEIRA DE PATHOLOGIA 1NTEKNA). I As boubas sào erupções cutâneas, de marcha chronica, contagiosas, geralmente consideradas como o apanágio da raça negra no Brasil. II Querem alguns que as boubas sejam manifestações cutâneas scrophulosas, ou dartrosas ; outros que sejam manifestações cutâneas da syphilis : outros, finalmente, acreditam que ellas podem ser manifestações dartrosas, scrophulosas ou syphiliticas. III Nào pensamos que sejam manifestações da escrophula ou do herpetismo; acreditamos porém, que sejam de uatureza syphi- litica. IV Nào admittimos, portanto, que ellas sejam moléstias exclusivas da raça negra no Brasil. — líí ~ V Entretanto, não se pôde negar que sào, no Brasil ao menos, muito mais freqüentes na raça negra do que na branca, o que deve ser attribuido, não á differença de raça. mas ás condições especiaes em que se acha o escravo. VI Os médicos brasileiros admittem geralmente duas espécies de boubas : as humidas ou atoucinhadas c as seccas. VII. As humidas mostram-se cm fôrma de saliências mais ou menos apparentes sobre a pélle, de consistência molle lardacea, de base intumecida, cobertas de uma substancia pultacea, esbranquiçada, exhalando um cheiro fétido, e secretando um liquido sanioso. VIU As seccas são constituídas por saliências grupadas ou disseminadas por todo o corpo, de uma côr carregada, escura, mais negra que a da pélle geral, apresentando uma descamação fina, furfuracea, que dá aos indivíduos de côr preta um aspecto russo cinzento, IX As humidas podem ser acompanhadas de algum prurido, o que se explica pela irritação causada sobre a pélle pelo liquido sanioso, fétido, que recreiam - 143 - X Acreditamos que as boubas humidas não são outra cousa senão placas mucosas (syphiliticas de Bazin), e que as seccas ordinariamente papulas ou tuberculos syphiliticos no seu periodo de descamação. XI As boubas podem desenvolver-se em todos os pontos do corpo, mas ha, entretanto, alguns que parecem gozar da sua predilecção. XII Esses pontos predilectos são os seguintes: margem do ânus, escroto e prepucio no homem, vulva, grandes e pequenos lábios na mulher, narinas, umbigo, axillas, virilhas, bocca posterior e parte interna das coxas. XIII As boubas são eminentemente contagiosas; ellas se transmittem pelo contacto, pela herança e, segundo alguns, pelo aleitamento. XIV As humidas se transmittem pelo contacto com muita facilidade não está, porém, provado pela observação que o mesmo aconteça ás seccas. XV O contagio das boubas seccas pelo contacto é de difficil demon- stração, porque as duas fôrmas, humida e sêcca, estão quasi sempre reunidas no mesmo indivíduo. XVI As erupções boubaticas muitas vezes se fazem por camadas successivas, mediando entre ellas intervallos variáveis. — «46 — XVII Não pensamos que as boubas se transformem na scrophula, e nem em qualquer outra moléstia. XVIII 0 que nos parece ser verdade é que ellas, depauperando pro- fundamente o organismo, o predispõem á scrophula e quiçá a outras moléstias, como a tuberculose. XIX E assim se explica o facto de um pai boubatico (ou syphilitico) procrear um filho scrophuloso, quando não seja também boubatico. XX 0 tratamento mais efficaz contra as boubas são os depurativos de base mercurial. Em Minas empregam contra ellas, e com muita van- tagem, a carobinha do. campo. FIM. HIPPOCMTIS APHORISII I Yerequidem infania, ínelancholice, eomitiales,sang'uinis, profusiones, angina), gravedines, raucitates, tusses, leproe, impetigines, vitihgines et pustulce ulcerosce plurimoe et tubercula et articulorum dolores. —(Sect. III, apb. 20}. II Ulcera undiquaque glabra maligna. —(Sect. VI, apb. 4). III Pastuhe latce raro pruriginosoe.—(Sect. VI, aph. 9). IV Ex os.-ds nudutione erysipelas, malum.—Sect. VII, aph. 19). V Ex erysipelate putredo aut suppuratio, malum.—(Sect. VII, apb. 20). VI Erysipelas foras effusum intro vert;, minime bonum, at ab interioribus foras, bonum. —(Sect. VI, aph. 25). Esta these está conforme os Estatutos. — Rio, 16 de Agosto de 1875. Dr. Caetan.j de Almeida. Dr. João Damasceno Peçanha da Silva. Dr. Kossuth Vinelli.