THESE DO Sr. Simões fiarfcosa AJC' {)■>-*- , vv s I IITG1EXE Dl PRIMEIRA 66 VIVER PARA OUTREM HYGIENE DA frinmra mffmtria ^ PELO s Sr. âdofpfto â. Simões íkvEosn THESE SUSTENTADA PERANTK A FACLI.DADK DE MKDICINA E APPROVADA COM DISTINCÇAO RIO DE JANEIRO Typographia Universal de H. LAEMMERT & C. 71, Rua dos Inválidos, 71 1883 Á MEMÓRIA DE MEUS AVÓS DE MEUS TIOS DE MINHAS IRMÃS A MEUS PAÍ A MINHAS IRMÃS A MEUS IRMÃOS A MINHAS CUNHADAS A MEU CUNHADO A MEUS SOBRINHOS Ao meu. bom e presado amigo DR. JOSÉ E. TEIXEIRA DE SOUZA Ao Illm. Sr. E SUA EXMA, FAMÍLIA A meus Primos, e especialmente aos Illmas. Srs. JOAQUIM A. BARBOSA COELHO JOSÉ ALVES BARBOSA CARLOS ALVES BARBOSA E sua Ezma. Família Aos Illms. Srs. DR. JOÃO RAYMUNDO PEREIRA DA SILVA TENENTE-CORONEL MANOEL MARTINS FIÚZA DR. ANTÔNIO AMANCIO PEREIRA DE CARVALHO E suas Exmas. Famílias AOS AMIGOS JOSÉ PARENTE VIANNA LUIZ PARENTE VIANNA JOÃO FERNANDES PARENTE VIANNA ENGENHEIRO CIVIL MANOEL MARTINS FIÚZA JÚNIOR DR. FRANCISCO DO R. BARROS FIGUEIREDO BERNARDINO CÂNDIDO DE CARVALHO DR. AUGUSTO V. LINS DE ALBUQUERQUE DR. ANTÔNIO CARVALHO PALHANO DR. RODOLPHO DE PAULA LOPES Aos Illms. Srs. MIGUEL LEMOS Rm yt* r -*.? ?7< " ~£Z> JS. * * )£T< Xr ?d X7* Cf « à XIà. àx >^x1àI rxx >. Iv X XIáx^. x_j x!/kJ> ENGENHEIRO CIVIL CYPRIANO TORRES DE CARVALHO HONORINO GUIMARÃES PINHEIRO 1TUB1EM HJMfl) OTilES CAPITÃOTEN ENTE ELIEZER COUTINHO TAVARI GABRIEL ILDEFONSO DAS NEVES CARDOSO ANTÔNIO FERREIRA BALTAR SOBRINHO E suas Esmas. Familias AÔS àMIGQS BE MES PAI Os Illms. Srs. MANOEL JOSÉ DA CUNHA PORTO COMMENDADOít FRANCISCO R. PINTO GUIMARÃES CORONEL JOSÉ DE SOUZA LEÃO MANOEL FRANCISCO DA SILVA NOVAES COMMENDADOR JOSÉ PEDRO DAS NEVES E suas Exmas. Famílias Ao Illm. Sr. E sua Exma. Família Ao Illm. Sr. E sua Exma. Família AOS MEUS ILLUSTRÂDOS MESTRES Exm. Sr. Conselheiro M. ffMfiEIM M83STEffi8 ÍAÍHNHÔÁ Illms. Srs. $MÊ WMMMRk BA €EM YfflEA BE, ÍKSÜS&ft MVM B$ MÍEAIBA E suas Exmas. Famílias Ao Exm. e Revm. Sr. CONEGO FRANCISCO ROCHAEL DE MEDEIROS Aos Illms. Srs. TESENTE-CORONEL ANTÔNIO AIRELIANO LOPES COUTINHO BE, «TMPHEGHIG «ME ■CGFHKHG JOAQUIM NUNES MACHADO COUTINHO ANTÔNIO AURELIANO LOPES COUTINHO JÚNIOR DR. JOÃO BEZERRA DE MELLO E suas Exmas. Famílias Drs. RODOLPHO DE MORAES COUTINHO AFFONSO LOPES DE MIRANDA GENERINO DOS SANTOS ARCHIMEDES CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE FHASCISCO C. DE VASCCNSELLOS CHAVES FILHO EDUARDO AUGUSTO DA SILVEIRA ESTEVÃO JOSÉ CARNEIRO DA CUNHA ANDRÉ DIAS DE ARAÚJO PERMINTO DE ABREU E LIMA FIGUEIREDO ANTÔNIO PEDRO DAS NEVES PEDRO CELESTINO DE ARATJJO FRAMÍLIN W \SH1\GT0\ l)K ALMEIDA AOS BONS AMIGOS ENGENHEIRO JOÃO ZEFERIXO FERREIRA VELLOSO REV-. PADRE JOSÉ ZEFER1N0 FERREIRA VELLOSO AOS AMIS8S AGRIPINO CÉSAR COUTINHO CHRISTIANO OESAR COUTINHO X. MARCIANO FERREIRA ARMOND Aos Illms. Srs. m. mm oôêkatt m si FRANCISCO PEREIRA DA SILVA DR. INNOCENCIO SERAPHICO DE ASSIS CARVALHO DR. ANTÔNIO JOSÉ DA COSTA RIBEIRO DR. ANTÔNIO FRANCISCO CARNEIRO DA CUNHA ZEFERINO FERREIRA VELLOSO E suas Exmas. Famílias Ao Exm. Sr. Conselheiro SENADOR JOÃO FLORENTINO MEIRA DE VASCONCELLOS E sua Exma. Família AOffitWi© $mil 1VISTA ^ ^^c \3C1WÍS50»TO)S5CTJ!V.yfi> Ãt HYGIENE DA PRIMEIRA INFÂNCIA Introducçâo fundamentai On ne dolt essenclellement penser qu'à deux choses, d'abord Ia vertu, pula Ia ganté. (Leibnitz). O dualismo philosophico caracteristico da vida, e que nos está a patentear a dependência mutua entre o ser vivo e o meio, augmenta de intensidade com a complicação crescente dos organismos. Ao percorrer a escala biológica, desde o seu gráo mais elementar, o vegetal, passando pelo intermédio, o animal, até o homem, gráo supremo dessa jerarchia, ostenta-se-nos logo a subordinação cada vez maior que une os seres vivos ao meio exterior. No vegetal, cuja organização muito simples apenas oíferece-nos a observar as reacções directas ou as continuas permutas materiaes que realizão-se entre elle e o meio, simples também é essa dependência; no animal, 4 HYGIENE porém, composto de vegetalidade e animalidade, já com- plicação nova vem augmentar-lhe as relações mesologi- cas; no homem, emfim, o mais complexo dos seres cujo attributo é a vida, a dependência intima sobe de ponto, pois múltiplas relações crêa-lhe a nova vitalidade que o distingue, estreitando os laços que o prendem ao meio. Neste ultimo caso a influencia mesologica actúa por ' dous factores—os antepassados e o mundo; a acção cósmica se exerce então em um organismo profundamente modificado, trabalhado pelas instituições protectoras com que o cerca o meio social. Queirão ou não os metaphysicos, todo o homem é obra do conjuncto enorme dos predecessores, e esta fatalidade jamais será abalada por ingratas, estéreis e inglórias revoltas. Parte integrante da Humanidade, da qual separado fora uma abstracção impossivel, é por ella que o homem domina o mundo, e soffre as modificações necessárias ao seu constante progredir. Entre o homem e o mundo é preciso a Humanidade, disse Augusto Comte. É, pois, soffrendo continuamente a dupla influencia do meio cósmico e social, que cada individuo dirige-se na vida, modifica-se e aperfeiçoa-se. E esses ensinos, modificações e aperfeiçoamentos resu- mem-se todos no mais delicado dos apparelhos humanos —no cérebro, nessa dupla placenta permanente entre DA PRIMEIRA INFÂNCIA 5 o homem e a Humanidade, segundo ainda a bella definição subjectiva do maior pensador moderno. Para sempre considerada múltipla a alma humana, como a instituio o eminente Gall, seria o cérebro theatro de lutas infecundas, si não conseguisse reger os órgãos subordinados, harmonisar-lhes as funeções, estabelecendo a unidade individual. Mas o homem, como já dissemos, não vive isolado e independente, fôrma com a sociedade um só systema em que as perturbações de um de seus órgãos têm inevitavelmente a retumbarem como éco as variações de todos os outros, e reciprocamente. Esta correlação nas funeções dos dous organismos, o indivi- dual e o collectivo, bem nos está a demonstrar a necessi- dade de uma cohesão entre todos os órgãos do meio sociológico, firmando a unidade collectiva, da qual depende essencialmente a individual. É, em verdade, difflcil semelhante cohesão, mas nem por isso impossivel de verificar-se, satisfeitas duas condições, a saber: submissão a uma potência exterior que contenha por seu valor as divergências individuaes, e preponderância de um sentimento sympathico subor- dinando os motores egoístas. De facto, só o conhecimento da invariabilidade da ordem exterior, exhibindo a nossa fraqueza individual, pôde congregar os esforços dos diversos elementos que constituem o organismo social em busca de um fim único — a felicidade collectiva,— pelas 6 HYGIENE modificações de que é susceptível a fatalidade que nos rege. Comtudo tal cooperação fora impossível, si não obdecessem todos ao mesmo impulso. No vasto campo de observações que nos offerece a historia, o que vemos senão succederem-se as gerações em labor continuo ao serviço de outrem, guiadas pelo mesmo sentir, unidas pela mesma crença ? E, pois, o concurso do amor e da fé que assegura a harmonia collectiva. A unidade individual proclama alto a existência de uma potência dominadora, refreiando-nos os moveis egoístas, e subordinando-os aos altruístas por ella esti- mulados. E dessa doce submissão que resulta a harmonia cerebral ou animica, e, por conseguinte, a das vísceras ou corporea que delia depende, em virtude das intimas relações que ligão o physico ao moral do homem. Dahi deprehende-se que a saúde só é compatível com essa harmonia, e que necessariamente depende da fé dirigente; dahi decorre ainda que a moléstia propriamen- te dita é cerebral em sua origem. Para maior clareza do que até aqui havemos exposto, proseguiremos em algumas considerações. Augusto Comte, tendo por principal precursor o illus- tre Gall, dividio as faculdades do homem em—affectivas, especulativas e activas—correspondendo ás três regiões do cérebro, das quaes só a activa e a especulativa DA PRIMEIRA INFÂNCIA 7 estão em relação directa com o mundo exterior, uma pelos nervos motores e a outra pelos nervos sensitivos; a região affectiva só recebe a influencia exterior indi- rectamente, por intermédio das regiões precedentes, mas está em connexões nervosas directas com as vísceras pelos nervos nutritivos. A estas ligações nervosas ajuntão-se as ligações vas- culares, de sorte que pelos laços dos systemas nervoso e sangüíneo a união do cérebro ao corpo fica estabelecida. A região affectiva estimula a vida de nutrição, e as duas outras coordenão a vida de relação, isto é, sob o impulso continuo das faculdades affectivas as intellectuaes e as praticas dirigem as relações passivas e activas da alma com o meio. Augusto Comte, concebendo a massa affectiva sem meios directos de.communicação com o exterior, não fez mais do que prolongar e systematisar, como elle mesmo diz, o bom senso popular, que acredita cego o sentimento. Pelo estudo statico que acabamos de esboçar, pode- mos já prever que a fixidez dos nossos sentimentos, origem de todos os actos, decorre da fixidez de nossas opiniões, porque são ellas que, guiando a actividade humana, os modificão. São, pois, as opiniões que gerão os sentimentos que as acompanhão em suas variações. Ora, si a saúde é o resultado da unidade cerebral, si esta suppõe a unidade collectiva que depende da 8 HYGIENE estabilidade exterior, é claro que as audepublica, tanto com a privada, continuarião em successivas oscillações, si o advento de uma doutrina plenamente aceita não conseguisse dirigir os homens, esclarecendo com radiante luz o campo da actividade humana. Só então logrará termo a luta revolucionaria entre o espirito e o coração pelo decisivo triumpho do sentimento. É o coração quem impelle, o espirito aconselha, e o caracter executa. O coração ou o sentimento é quem inspira; é elle quem dominará. No fetichismo, onde reina soberano o sentimento, diz. o Dr. Audiffrent serem raras as epidemias, muito pouco conhecidas mesmo, nos povos catholicos antes do décimo terceiro século. Para quem deduz as theorias da observação bem feita dos factos, o livro do professor Fuster (*) é uma exhube- rante confirmação da theoria formulada por Augusto Comte sobre a moléstia e as epidemias. O professor Fuster appensou á sua monographia interessante quadro indican- do a marcha e o progresso da affecção catarrhal desde o supracitado século até o anno de 1860, e nelle vê-se o numero sempre crescente de epidemias, coincidindo com (*) Monographie clinique de VafíecUon catharrale, par J. Fuster, professeur de clinique médicale à Ia Faculte de Montpellier, etc—1861. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 9 os progressos mais ou menos rápidos da decomposição religiosa. 0 espirito humano a conquistar leis naturaes incom- patibilisava para sempre os dogmas theologicos, substituía à fé sobrenatural, que se apagava, a fé demonstrada, que surgia com a sciencia, o arbitrário das vontades divinas pela immutabilidade das relações de successão e seme- lhança entre os phenomenos reaes. A ultima fôrma da synthese theologicaque conseguio harmonisar por algum tempo o sentimento com as opi- niões, graças ao senso pratico de seus incansáveis propa- gadores, cahio também em face das novas e decisivas conquistas. Desse desmoronamento inevitável vemos ainda as conseqüências na instabilidade cerebral que caracteriza a geração hodierna, a constituir uma verdadeira predis- posição a moléstias de todas as espécies, principalmente a certas affecções nervosas completamente desconhecidas no quadro nosologico dos antigos. Os cérebros sem ponderação pela ruptura da harmo- nia catholica, que destruio toda autoridade espiritual, deixarão-se dominar pelos instinctos egoistas,e refreiárão os impulsos sociaes. Esta exaltação da personalidade oppõe-se a qualquer tentativa de unidade, somente possivel pela coordenação de todos os nossos actos em torno de um sentimento sympathico. t. 6-82 2 10 HYGIENE Com o que dissemos, julgamos provar que a moléstia origina-se na anarchia do sentimento, factor único de todas as operações humanas ; que, sendo indirectas as relações do sentimento com o exterior, modifical-o só é possível pelas reacções dos actos e das opiniões. Que solução dar ao problema que se nos apresenta? Elle é por demais complexo, e deve tornar-se o alvo de toda a nossa solicitude pela urgência que nos impõe a gravidade de seu estado. « Cahimos em dissolução mesmo physicamente », como diz o Dr. Audiffrent. E à Hygiene, ordinariamente definida—arte de con- servar a saúde,—que pedem-se os meios de obstar a propagação do mal que nos contamina. Mas em que base assenta ella? E desse fundamento podem-se deduzir regras que satisfação o fim que se tem em vista, abran- gendo em seus preceitos todas as condições do problema? Fundados na Biologia pretendem os hygienistas com os elementos que esta base lhes offerece traçar regras de conducta a cada individuo com o intuito de manter-lhes entre os órgãos a harmonia que constitue a saúde. O dominio da Biologia, já demasiado largo, não attinge as mais nobres e mais complicadas funeções do homem. Por dilatadissimo que seja o âmbito de seus estu- dos, ha limites que o circumscrevem, e que ella não pôde transpor, sem graves prejuízos na interpretação dos DA PRIMEIRA INFÂNCIA 11 phenomenos que um methodo insufficiente tem tentado esclarecer. A investigação biológica fica adstricta no estudo do homem ao que elle tem de commum com o animal, á vegetalidade e a animalidade; mas, além desses phe- nomenos, apresenta o homem outros mais delicados cuja superioridade evidente o erige —rei—entre os animaes: são os phenomenos moraes,cuja base acha-se exactamente nos outros inferiores, e que constituem objecto de uma sci- encia mais especial e complicada, preparada pela Biologia. Fundamentando-se toda na sciencia biológica, que lhe dá apenas o conhecimento de uma parte da natureza humana, a Hygiene não attinge o fim que se propõe, porque o homem é o mais indivisível dos seres vivos, e, por conseguinte, todo estudo que isoladamente fizer-se da alma ou do corpo será mutilado, fornecerá noções incompletas e superficiaes. Já o grande Hyppocrates sabia e ensinava que « no organismo humano tudo conspira, tudo concorre, tudo consente». Antes de applicar preceitos á nossa natureza, é preci- so conhecel-a em todos os elementos. Estudar as funeções moraes, isto é, as funeções humanas propriamente ditas, não é tarefa a cargo da Biologia, que a este respeito só faz promover-lhes o advento scientifico, e preparar-lhes as difflceispesquizas. 12 HYGIENE A Hygiene não resolve o problema complexo que se apresenta, ao contrario complica-o, estimulando os ins- tinctos egoístas em detrimento do altruísmo, base da unidade, condição da saúde. O desenvolvimento physico é o único resultado que ella alcança. As tentativas de direcção moral, que os hygienistas têm emprehendido, permanecem estéreis em virtude do empirismo em que os deixa a falta de noções integraes sobre o homem. Como regular o que não se conhece ? Os trabalhos de George Leroy, continuados por Gall e terminados por Augusto Comte, desvendarão-nos a mais bella das orga- nizações até então incompletamente observada através do espesso véo com que a obscurecião a theologia e a me- taphysica. Fôrâo estes immortaes investigadores que derão cunho de positividade ás concepções sobre o homem. Bebendo na Biologia as noções de que dispõe esta sciencia, o estudo das leis da nossa natureza exige para o emprehender conhecimentos que somente a Sociologia é capaz de fornecer. Por não estar ainda creada esta sciencia, não coube inteiro êxito á prematura construcção de Gall. Augusto Comte, explorando o passado, analysou a evolução humana, e, entre a variedade dos factos histó- ricos, apprehendeu-lhes as relações, observou-lhes a constância, descobrio-lhes as leis. Estava constituida a DA PRIMEIRA INFÂNCIA 13 Sociologia. Com taes elementos novos e os dados que lhe offerecia a tentativa de Gall, estabeleceu Comte a verda- deira theoria da nossa natureza. A Moral theorica ficava creada. Desse estudo do homem é que derivão-se as regras próprias a todas as idades da vida; isto é, passa-se do abstracto—a sciencia—ao concreto—a arte—einstitue-se a Moral pratica ou a Educação, cujo objectivo é o aper- feiçoamento de nossa espécie, tornando-a melhor, mais activa e mais intelligente para adaptal-a ao serviço con- tinuo da Humanidade. Sempre foi essa a preoccupação dos sacerdócios anti- gos que da observação directa do homem deduzirão regras para a sua dupla natureza physica e moral, inimigas embora as considerassem, porém sempre inse- paráveis em suas prescripções: os cuidados ao corpo fòrão applicados ao lado dos preceitos moraes. Em todos os tempos foi assim a Hygiene subordinada á Moral. Hoje ella intenta, rebelde, libertar-se de tal jugo, mas é elle necessário, e devemos continuar syste- maticamente a obra espontânea dos sacerdócios theolo- gicos. É, pois, a Moral pratica ou Educação que institue o aperfeiçoamento humano. É ella a primeira das artes, como diz Augusto Comte, a que aperfeiçoa a acção, melhorando o agente. 14 HYGIENE Fundada na existência natural dos instinctos sympa- thicos, a educação positiva procura desenvolvel-os, su- bordinando os instinctos egoistas, de accôrdo ainda cora o principio physiologico de que a funcção desenvolve o órgão. A educação positiva prepara o homem para a. Familia, a Pátria e a Humanidade. Viver para outrem é a sua fórmula capital. PRIMEIRA PARTE IMSTHHÇA© IA fIOGQKà INFÂMIA I CONDIÇÕES SOCIOLÓGICAS DA PRIMEIRA INFÂNCIA LTiomme s'agite et 1'Humnnité le meno. Augusto Comte. su«n«Rio Dependência absoluta da criança. — Conseqüências. — Dependência especial em relação á Humanidade.—Dependência cosmologica (através da Humanidade).— Dependência em relação á Familia e respeito necessário desta dependência, através da qual são soffridas todas as outras, A sociedade foi sempre o meio em que evoluio o homem. Nunca viajante algum o encontrou senão identi- ficado a um ser collectivo. Rousseau,suppondo um estado em que o homem, qual fera, vivera isolado nas selvas, mostra-nos a desordem de seu cérebro, cuja imaginação a funccionar anarchica não submettia-se ao correctivo da observação. Desde a Familia, o mais elementar gráo da sociedade, até a Humanidade, a mais vasta collectividade que nos domina, em todos os tempos e em todos os logares, vê-se o homem unido a seres semelhantes, que, como elle, t. 6—82 3 18 HYGIENE soffrendo a fatalidade do meio exterior, procurão modifi- cal-o, a principio sem opinião a respeito, simplesmente pelas disposições naturaes e necessidades physicas, depois- pela intervenção illimitada dos deuses, e por fim, pelo conhecimento positivo de nossa justa capacidade modifi- cadora, que engrandece a submissão sem tolher a audácia. As condições creadas pelo meio physico e social soffre-as a criança, quasi sem reacção, passivamente, em virtude de sua delibidade característica. Fraca de intelligencia, e, portanto, faltando-lhe o re- gulador de uma actividade cujos órgãos são ainda deficientes para reagir contra a sua situação, afim de se lhe adaptar, acha-se a criança em absoluta dependência dos meios que a cercão. Disto resalta a conseqüência de que no estudo da vida infantil devem-se guardar em consideração perenne as circumstancias varias em que a collocão as condi- ções acima apontadas; isto é, as reacções entre a criança e o meio, e as relações que a ligâo á Familia e á Huma- nidade não deverão cessar de estar presentes ao espirito do medico, que não pôde deixar de ser moralista. A continuidade, a unir as gerações que se succedem, encadêa as diversas phases da evolução humana, trans- mittindo-nos o impulso dos que já viverão. Cada um de nós tem a origem nas primeiras idades do gênero humano, DA PRIMEIRA INFÂNCIA 19 às quaes prende-nos uma serie continua de famílias, cooperando todas para o estado actuai da espécie, segundo leis invariáveis, naturaes e artificiaes. E conformando-nos com ellas que actuamos proficua- mente. Diz o Sr. Laffite : Oiix qui ne croient pas les subir ignorent les origines de leurs pensões et de leurs afíections; ils ne savent pas cie qui ils sont fils. voilá tout. Us phenomenos prendem-se uns aos outros como o presente prende-se ao passado, ligando-o ao futuro. A vida de hoje suppõe a vida de hontem. Ha uma ordem que nos subordina. Ninguém vive por si, todos vivem por outrem e para outrem. A esta fatalidade necessária é submettida a criança, e cada vez mais com os progressos da civilisação. Mas não é só no tempo que entrelação-se as gerações, estreita-as no espaço um élo forte — a solidariedade — sempre subordinada á continuidade social. Ficaria infructifera a acção dos mortos, si os con- temporâneos não lhes servissem de órgãos; de modo que, os primeiros fornecem a impulsão, os elementos e os processos de nossas operações, e a actualidade os põe em pratica ou desenvolve. Todavia, é muito mais importante a dependência da 20 HYGIENE criança para com os mortos que a dominão e dirigem. «Les vivants sont toujours, et de plus en plus, gouvernes par les morts», conforme a lei de Augusto Comte. Os phenomenos da ordem social e moral, como os de toda a ordem universal, si são inalteráveis em seu ar- ranjo, são modificaveis na intensidade de suas manifesta- ções, e a facilidade modificadora cresce na razão directa da elevada classe que elles occupão na série hierarchica. E a compensação consoladora que nos offerece a imper- feição natural. Assim, desde a influencia geométrica do terreno até a influencia moral do exemplo, sobre todos os factores que nos modificão, o poder humano tem acção crescente, pois a mesma complexidade dos factores multiplica-lhe os meios de augmentar-lhes ou diminuir-lhes as ener- gias, segundo as nossas próprias vantagens. A Humanidade sempre generosa em seus feitos, e cada vez mais consciente de suas forças, não desampara seus filhos, crêa-lhes instituições que os abrigão, e, aper- feiçoando-lhes a natureza, torna-os melhores. Era já regra theocratica «conhecer para melhorar.» Para provar o que expendemos basta comparar a mulher primitiva com todas as suas imperfeições physi- cas, intellectuaes e moraes, a mulher que substituiu o homem nos trabalhos exteriores e grosseiros, a sua escrava, com a mulher de hoje, delicada e terna DA PRIMEIRA INFÂNCIA 21 companheira, typo essencialmente moral, para ver quão proficua foi a acção da Humanidade, e quanto ella esme- rou-se em fazêl-a a mais sublime de suas obras. Ninguém o negará, a mulher moderna é uma verda- deira creação da Humanidade. É essa natureza profundamente modificada que per- petua-se na criança, resultado da cooperação de todos os seus antecessores, resumo das modificações introduzidas pela Humanidade nos cérebros imperfeitos dos seus as- cendentes. Sentimentos, actos e opiniões, tudo respira a provi- dencia humana que a sciencia demonstra. Pela hereditariedade, pois, a criança recebe das gerações que a precederão não só as qualidades physicas, como as intellectuaes e moraes, aperfeiçoadas por um trabalho evolutivo de muitos séculos. A luta chimerica entre o homem e o mundo, que o grande Bichat imaginou para caracterizar a vida, assen- tando em um pretenso antagonismo entre o mundo orgânico e o inorgânico, é resquicio de erro metaphysico naquelle cérebro ávido de concepções positivas. Nem se pôde conceber semelhante conflicto, no qual o meio sempre victorioso destruiria a vida; onde irião os corpos vivos haurir a força necessária para superar mesmo tem- porariamente um tal obstáculo?pergunta Augusto Comte. 22 HYGIENE O fundador da Biologia tornara contradictoria a noção fundamental, pois supprimia um dos elementos necessários a constituir a harmonia, que é a condição da vida. A concepção positiva da vida, qual a tiverão Blain- ville e Augusto Comte, exige não só um organismo apto a comportar o estado vital, como um meio conveniente que lhe sirva de manancial perenne de princípios assimi- láveis. A renovação material contínua característica suppõe a dependência estreita do ser ao meio que lhe ó também fonte perpetua de calor, luz, electricidade, etc, necessária a essa renovação. As perturbações vitaes originão-se, ora nas modifica- ções individuaes, ora nas alterações do meio ambiente. O organismo vivo agita-se entre certos limites de variações das influencias exteriores, que transpostos destroem a vida, ou pelo menos a alterão. Tanto mais afastados são esses limites quanto mais baixo o gráo que occupa o ser vivo na jerarchia biológica: no homem que a termina é nimiamente estreita esta dependência. Para compensar, porém, tamanha contingência, a multiplici- dade funccional, tornando o homem mais modificavel, augmenta-lhe as energias de reacção ás variações do ambiente que elle procura adaptar ás suas necessidades. A vida animal, que Augusto Comte considera simples aperfeiçoamento juntado á vida orgânica, é que o ser DA PRIMEIRA INFÂNCIA 23 vivo (leve o discernir e o apprehender os materiaes necessários á sua manutenção e de modificar favoravel- mente as circumstancias que o r, deâo. Assim, a criança, como todo o ser cujo attributo é a vida, só pôde ser concebida subordinada ao meio cosmo- logico. Mas esta influencia cósmica se exerce em um organismo, em que immensas modificações eíTectuarão-se, como já dissemos, no lento, mas fecundo caminhar de gerações immorredoras. Intermediária á infância e ao cosmos, repetimos, está a Humanidade, através da qual se estabelece a submissão da criança ao mundo. E a familia o elemento mais simples a que a abs- tracção pôde chegar na contemplação do organismo social. A Familia, a Pátria e a Igreja não representão grupamentos distinctos, porém gráos diversos da mais vasta e complexa existência collectiva—a Humanidade, á qual todos estão unidos por laços indestruetiveis. No recinto do lar surge a criança dependente da Familia, como o frueto da arvore que o produz. E a familia que lhe prepara o advento, ella que lhe afasta as influencias nocivas, ella que elabora, por assim dizer, os materiaes próprios á sua alimentação, tornando-os assimiláveis, ella, emfim, que influe immediatamente sobre a sua existência. 24 HYGIENE No estreitado circulo em que esse meio a encerra, encontra já a criança os primeiros delineamentos da sociedade em que mais tarde viverá. Recebendo do Pai a protecção material e da Mái a iniciação na educação, o infante prepara-se physica, intellectual e moralmente para amar e servir a Humani- dade, principio e fim de suas operações. Entretanto, utopistas revolucionários tentão arran- car a criança ao meio doméstico que lhe condem para. atiral-a em um mais vasto, é verdade, porém necessaria- mente prejudicial á primeira phase da vida. Nós, que não desconhecemos as relações que ligão a Familia á Humanidade, e que nunca separamos estes dous termos, vendo em um o laboratório onde formão-se os elementos que compõem o outro, só podemos aconselhar a permanência da criança no seio da familia como foco mais benéfico e carinhoso, como único meio que ella deve vantajosamente conhecer até á idade em que novas relações engrandeção o circulo de seus conhecimentos. E pela Familia que a Humanidade e o Mundo mani- festâo-se activos sobre a criança. II CONDIÇÕES MORAES DA PRIMEIRA INFÂNCIA SUMMAIUO Posição da questão.—Caracteres da vida orgânica da primeira iufancia.—Caracteres da vida animal da primeira infância. — Caracteres cerebraes da primeira iDfancia. — Perturbações pathologkas da primeira infância. — Do equilíbrio material e moral da primeira infância.—Conclusão. Ainda hoje não existe entre os biologistas accordo na divisão que fazem das idades. Bazeão-se todos nas mo- dificações diversas que se operão no organismo, e ser- vem-se da que lhes parece mais notável para limitar os periodos da evolução vital que se tocão. Ora, é muito difllcil perceber as modificações subtis que passão-se na evolução individual do organismo, e marcar-lhes onde termina um periodo e começa outro. Querem uns o syste- ma quaternário, em analogia ás quatro estações do anno, aos quatro humores, aos quatro elementos; adoptão outros o systema semelhante aos dias da semana. Limitando o nosso estudo á primeira infância, maior t. 0—82 4 26 HYGIENE é ainda o desaccordo. A primeira e a segunda dentição, como factos realmente notáveis, têm servido para termos divisórios dos primeiros periodos da vida. A isto, parece- nos, poder-se-ha objectar que a primeira dentição não se presta a limitar a primeira infância; porque, além de facto provisório, não vemos nesse pretendido periodo terminal e no seguinte modificações que possão determi- nar-lhes uma separação. Mais bem avisados, sem duvida, andarão Hippocrates, Stahl, e outros com elles, levando a primeira phase da vida até á segunda dentição, isto é, até aos sete annos, não só porque é esse facto definitivo, como também acaba uma serie de modificações muito notáveis, tanto no que respeita ao physico, como ás funeções intellectivas e moraes. Comprehendêrâo perfeitamente isto os catholicos e os jurisconsultos, negando a imputabilidade às crianças menores de sete annos. Augusto Comte, de accordo com os seus princípios de classificação, fez subjectivamente a divisão das idades, tomando para base o numero 7 em virtude de suas pro- priedades numéricas subjectivas. Estudando rapidamente as condições moraes da pri- meira infância no que esta offerece de característico, seguiremos as deducções moraes de Augusto Comte; e, como são pouco conhecidas as theorias deste grande e fecundo pensador, e entre muitas a theoria cerebral, DA PRIMEIRA INFÂNCIA 27 esboçaremos esta a propósito dos caracteres cerebraes da primeira infância, ao que somos ainda levados pelas ne- cessidades ulteriores do plano que adoptámos para esta dissertação. O caracter fundamental do primeiro período da vida é formado, como diz Hufeland, pelo desenvolvimento continuo do organismo ainda inacabado. Podemos dizer que este período é a continuação da phase embryonaria, da geração, que, iniciada no organismo materno, vem completar-se no exterior. Os órgãos não preenchem as funeções que lhes são próprias senão na proporção do desenvolvimento e for- mação; e, pois, as funeções não começão nem extinguem- se simultaneamente. Dos órgãos vegetativos, uns, já formados, desenvolvem-se, modificão-se e aperfeiçoão-se, outros são transitórios, inúteis à vida extra-uterina, como o thymus, o canal arterial,, artérias umbilicaes, orifício de Botai, etc, e desapparecem com as modifica- ções funecionaes que se operão na economia infantil, tendo por principal agente a respiração pulmonar que se estabelece no momento de nascer; outros, emfim, os dentes, despontão dos quatro aos oito mezes para ao depois cahir e ser substituídos por novos que constituem a se- gunda dentição: a primeira evolução dos chamados — dentes de leite —constitue a primeira dentição. A primeira infância é com razão considerada, por 28 HYGIENE alguns autores, um trabalho critico cujo fim é produzir, formar, desenvolver. Compor e decompor é o phenomeno fundamental da vida: são os dous termos do movimento continuo, pelo qual o organismo haure do meio os materiaes próprios á sua conservação e crescimento, e restitue-lhe os produc- tos transformados em substancias que não podem perma- necer no seu interior ou cuja permanência lhe é no- civa. Nem sempre, todavia, estes dous tempos da nutrição guardão entre si as mesmas proporções. Na infância o movimento assimilador predomina sobre o desassimilador. A circulação, a respiração, a absorção, emfim, todas as funeções da vida orgânica marchão com rapidez enorme. Dahi a importância das funeções digestivas e assimiladoras, principalmente dos systemas lymphatico e glandular. E esta vida vegetativa que exhubera e predomina, que explica o desenvolvimento rápido do corpo, que attinge nos primeiros annos da existência a metade do crescimento total futuro. Tudo ahi nutre-se, tudo aug- menta, porém nem simultâneo, nem igual, como já disse- mos, é o crescimento dos diversos órgãos da economia; uns adiantão-se, avanção na marcha, e chegâo cedo ao seu volume total; proseguem outros mais lenta e vaga- rosa evolução. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 29 Sensações e movimentos são as duas manifestações da contractilidade e da sensibilidade como attributos da vida animal. As sensações, como os movimentos que ellas produ- zem, são internas e externas. Durante a gestação, a vida uterina, o feto move-se, agita-se por estímulos sensitivos vagos e confusos visce- raes e das expansões nervosas dos tecidos que operão sobre o eixo cerebro-espinhal, e são a expressão das pri- meiras necessidades. É assim que o eslado de ilevào de uni membro pôde tornar-se doloroso para a criança em uma certa época e provocar mo\imentos, da mesma sorte que o estimulo do meconium accumulado no in- testino. (Bronssais). É a partir do nascimento que órgãos especiaes chamados órgãos dos sentidos dão passagem aos estímulos exteriores, e começa a irradiação das sensações externas. Para muitos physiologistas são os órgãos dos sentidos em numero de cinco, porém Blainville os elevou justa- mente a oito, desdobrando o tacto em quatro sentidos differentes: musculação, calorição, electrição e tacto propriamente dito. Por oito modos differentes, pois, o organismo pôde ser impressionado; e as sensações que dahi resultão produzem sempre um movimento immediata- menteou ficando como imagem a determinal-o mais tarde. As sensações actuão na época do nascimento pelo 30 HYGIENE despertar dos instinctos,cujos órgãos,a que se referem as suas necessidades, já são próprios a agir. Assim o que provoca vivamente o recém-nascido a apprehender o seio não é necessidade produzida pelo seio, mas porque entre este e o órgão do instincto de conservação da criança estabelece-se relação reciproca. Nas primeiras épocas da vida as sensações em geral são menos vivas comparativamente ás que se hão de perceber ainda. O fim próprio de toda a sensação é provocar um movimento, como diz o Sr. Lafllte. É a reacção do orga- nismo sobre o mundo exterior, ou sobre si mesmo como no phenomeno da nutrição. Os movimentos manifestão-se na existência fetal, desde as primeiras semanas do desenvolvimento, pois que basta a presença de uma fibra contractil em connexão com uma cellula motora, por intermédio de um nervo, para que elle se origine. A solidariedade dos dous apparelhos nervoso e vas- cular estão subordinados todos os actos orgânicos. A pro- vocação dos movimentos reflexos que explicão todos os actos internos deve ser attribuida ao sangue, estimulante geral dos tecidos. Todos os movimentos que se dão no feto e na criança nos primeiros tempos da vida são reflexos e involuntários. Só posteriormente com o habito são as contracções que DA PRIMEIRA INFÂNCIA 31 produzem os movimentos submettidas á acção cerebral, e tornão-se voluntárias. Destes últimos movimentos alguns ha que passão a involuntários após exercicios habituaes. Basta a este respeito lembrar a attenção fixa, que a criança emprega quando pretende dar os primei- ros passos, e os progressos que ella faz depois na marcha sem intervenção cerebral. Os movimentos excitados dominão a criança ; da grande necessidade de mover-se resulta a sua agitação constante. Antes de caracterizar o estado cerebral da primeira infância, devemos fazer a exposição analytica das fune- ções elementares do cérebro. Até O ali era o apparelho cerebral considerado órgão único e sede exclusiva da intelligencia que então englo- bava funeções multiplices, acreditando os physiologistas residirem nas visceras os sentimentos e as paixões. A esta supposição errônea não escaparão Bichat e Cabanis. Dispondo de materiaes que faltarão aos seus precur- sores, e impellido pelas solicitações sociaes urgentes, Gall pôde arrancar ás visceras as propriedades moraes que lhes erão attribuidas, e mostral-as no cérebro, estabele- cendo-o definitivamente sublime apparelho das múltiplas operações humanas. Sentimentos, idéas e actos ficarão para sempre constituindo funeções orgânicas do apparelho cerebral, o mais poderoso dos mecanismos. 32 HYGIENE Prematura, a construcçâo de Gall não escapou a graves aberrações na textura intima da theoria; comtudo esta tentativa teve de profundamente capital e essencial- mente novo dar uma sede a funeções indeterminadas, precisando-lhes o estudo. A. Comte, com mais sufficientes dados sobre a zoolo- gia e a anatomia comparada, ligou este estudo ao con- juneto do organismo, e, servindo-se do methodo subjectivo, único empregado nos estudos moraes, esclareceu a phy- siologia do cérebro, construio a theoria cerebral positiva. Espirito e coração são os dous vocábulos que o ins- tincto universal consagrou á distineção de nossas fune- ções especulativas e affectivas. O termo coração tem sido empregado com um duplo sentido, ora exprimindo a affeição que nos incita a agir, ora significando a energia directora da acção. Dahi a distineção das funeções cere- braes em affectivas, especulativas e activas, constituin- do as funeções activas o caracter. Depurando a palavra alma de toda accepçâo mystica, podemos aproveital-a para exprimir o conjuneto dessas funeções ou faculdades. E assim temos a alma humana composta do coração, que impelle a agir,do espirito, que o aconselha,e do caracter, que dirige a acção. As funeções ou faculdades affectivas correspondem a órgãos da parte posterior do cérebro, as activas a órgãos da parte média, e as especulativas a órgãos da região anterior. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 33 As faculdades affectivas ãecompoem-sG era personali- dade e sociabilidade. Somente no homem a sociabilidade at- tinge máximo desenvolvimento. Por isso nelle, em quem a unidade é altruista, a personalidade, indispensável á existência do ser, subordina-se á sociabilidade, o que de- termina sempre grandeluta entre o egoísmo eo altruísmo, mesmo nas almas bem formadas. Fazendo a repartição dos motores affectivos, Augusto Comte dividio-os em inte- resse directo ou fundamental—e sentimento social. Entre estes extremos, porém, collocou elle o interesse indirecto ou ambição, sentimento de fôrma composta ou mixta, pessoal em seu destino e social quanto ao meio. Temos, assim, o interesse, a amhição e a sympafJiia. O interesse directo sotIVe divisão nos animaes em que existe disposição a melhorar as condições de existência, e refere-se á conservação e ao aperfeiçoamento. A sepa- ração dos sexos mostra na serie zoológica o instincto da conservação da espécie. Augusto Comte qualifica de nutritivo o instincto da conservação individual em virtude de seu principal oflicio: nenhum poderia existir sem elle, que tem por sede orgâ- nica a parte média do cerebello. O instincto sexual occupando as partes lateraes do cerebello, e o materno que tem por sede a parte mais posterior do cérebro, immediatamente acima do cerebello, constituem os órgãos da conservação da espécie. t. u—£•.> 5 34 HYGIENE O instincto materno, na apparencia motor social, foi justamente collocado por Augusto Comte eütre os impul- sos egoístas, pois elle não exprime outra cousa mais do que o amor, o apego aos nossos productos. Na ordem de dignidade crescente e energia decres- cente, em que é feita a classificação das forças elementa- res do cérebro, vêm-se os dous instinctos de aperfeiçoa- mento : o destruidor collocado ao lado do instincto materno, o constructor acima. Estes dous instinctos são ainda chamados um de militar, outro de industrial. O mais grosseiro egoismo é, pois, constituído por cinco instinctos. O interesse indirecto ou ambição soffre uma divisão fundamental em—orgulho ou necessidade de dominio collocado ao lado do órgão industrial, e em—vaidade ou necessidade de approvação collocado acima. O primeiro é unido ao órgão destruidor a que elle assiste muitas vezes; o segundo confina com o órgão constructor; um impelle ao commando, o outro ao conselho. Como a vai- dade é profundamente modificada pelasinfluencias sociaes, alguns observadores, como Helvetius e Larochefoucauld, confundirão-a com a sociabilidade. Naexistencia do orgu- lho e da vaidade reside, como faz notar Augusto Comte, a origem da separação dos dous poderes em temporal e espiritual. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 35 Completão a serie das funeções affectivas os instinctos sociaes ou altruístas. São estes os mais nobres impulsos da nossa natureza, os que nos incitão ao serviço de outros, porém são também os menos enérgicos de todos. tiall os distinguio perfeitamente em apego, veneração e bondade. O primeiro suppõe a igualdade, e tem pleno exercício na vida domestica; o segundo suppõe a superi- oridade, tornando possível a submissão voluntária; o ter- ceiro suppõe a inferioridade, e estabelece a protecção aos fracos—é a caridade ou o amor universal dos christãos. Os órgãos correspondentes a estas funeções são contínuos e situados na região cerebral superior; a bondade está em relação com as funeções intellectuaes que ella inspi- ra, posterior lhe fica o da veneração, e aos lados desta o do apego. Sendo dezoito o numero das funeções elementares do cérebro, pela simples enumeração dos moveis affectivos, confirma-se o que avançámos na introdücção deste traba- lho a respeito da preponderância do coração sobre o espi- rito. Occupando a principal massa do cérebro, os ins- tinctos, em numero dedez, apenas deixão disponíveis oito órgãos ás outras funeções. No ponto de vista da educação,vê-se aqui comoé im- portante o conhecimento dos motores de todos os nossos actos. Podemos conhecer as inclinações predominantes, toas ou más. para favorecel-as ou reprimil-as. 36 HYGIENE Passando ao estudo das funeções mentaes, vemol-as dividirem-se em concepção e expressão. Ainda que no estado normal a expressão subordine-se á concepção, tudo concorre a provar que têm ellas uma existência distineta, porém inseparáveis nas o perações intellectuaes. A concepção é passiva ou activa, recebendo a primeira o nome de contemplação, e a segunda ode meditação. Por uma o espirito recebe do exterior, por intermédio dos órgãos dos sentidos e dos gânglios sensitivos, os materiaes necessários ás nossas construcções; ella fornece-lhe as idéas ou as imagens : jogando com estes elementos, pro- cede a outra a combinações mais ou menos geraes, com o fim de esclarecer a condueta habitual; ella produz os pensamentos. A contemplação apresenta dous modos distinctos: um, synthetico, refere-se aos seres, dá-nos imagens com- pletas, é a contemplação concreta; outro, analytico, re- fere-se aos phenomenos, dá-nos imagens incompletas ou decompostas, é a contemplação abstracta. Nosso espirito precisa, para seus usos theorico e pratico, não só das idéas concretas, mas também das idéas abstractas, sempre artificiaes, que elle elabora, destacando as pro- priedades dos seres que as revestem: as idéas concretas são especiaes, as abstractas caracterizão-se pela genera- lidade, em virtude da qual accommodão-se a muitos objectos. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 37 A meditação decompõe-se, segundo grande numero de pensadores, em inducção e deducção. Meditamos de dous modos distinctos: ou estabelecendo principios e comparando-os para terminar pela generalisação, isto é, induzindo, ou tirando conseqüências, coordenando para systematisar, isto é, deduzindo. A meditação inductiva estuda as relações de semelhança, a deductiva as relações de successão. Deste modo fica a concepção constituída por quatro operações necessárias: a observação dos seres, depois a dos phenomenos ; a elaboração dos principios, precedendo a das conseqüências. Esta serie especulativa termina-se com a faculdade de expressão, funcção imprescindível á existência social. Diante das leis que regem a existência humana, conhece o homem a esterilidade dos esforços isolados para modificar a dura fatalidade que as caracteriza, e une-se a seus semelhantes para, em concerto habitual, empregarem as actividades e superarem os obstáculos que a natureza oppõe á realização de seus projectos. Mas tora baldio um tal tentamen de concurso, si os homens, como também os animaes superiores, não tives- sem a propriedade de transmittir os seus pensamentos e os seus sentimentos aos seres que comsigo vivem. Como faz notar Augusto Comte, é preciso que antes de reagir cada um faça distinctamente conhecer suas emoções ou 38 HYGIENE projectos, afim de obter a sympathia ou a assistência de outrem. Preenche essa funcção a linguagem, a qual consiste em uma combinação de signaes, servindo á permuta de sentimentos e de idéas. Augusto Comte define signal—a relação constante que liga uma sensação a uma contracçao, de modo que a sensação lembra a contracçao e reciprocamente. Donde conclue-se que qualquer contracçao, qualquer movimento, constitue uni signal que recorda a emoção que o provocou, e serve, por conseguinte, para a communicaçâo. Para manifestar-se o signal basta, portanto, que intervenha a região affecti- va; mas os signaes não fórmão verdadeira linguagem senão quando, a expressão subordina-se ás quatro fune- ções de concepção, de que já falíamos. O espirito, como acabámos de vêr, compõe-se de cinco funeções distihctas irreduetiveis, e oecupa a parte anterior do cérebro. A contemplação abstracta tem por sede a zona média inferior, em relação, por sua parte superior, com o órgão da deducção; a contemplação concreta jaz assestada de cada lado da contemplação abstracta, acima dos olhos e um pouco inclinada para o ouvido vizinho; a meditação deduetiva na linha média, em relação com o órgão da bondade; a meditação in- duetiva jaz mais para fora, e em contacto mais directo com o órgão da observação. O órgão da expressão asses- ta-se em cada extremidade da região especulativa. DA PRIMEIRA INFÂNCIA :>n Muitas funeções a que os physiologistas querem dar órgãos espociaes, como o juizo, aimaginação, a memória, etc., são funeções complexas, e que exigem a cooperação de todas as faculdades especulativas. Si o coração impelle-nos a agir, si a intelligencia esclarece-nos sobre a conveniência ou inconveniência da acção, e fornece-nos os meios de satisfazer aos desejos, 0 claro que novas funeções são necessárias para a execução dos nossos planos. E ao caracter que cabe tão digno papel. Este novo conjuneto funccional decompõe-se em três elementos — coragem, prudência e perseverança ou firmeza. Comprehende-se facilmente a nece-sidade de admittir estas três funeções, sem as quaes fora impossí- vel todo suecesso pratico. Como agir sem coragem para emprehender, sem prudência para executar e sem firme- za para realizar ? Todo trabalho theorico ou pratico suppõe o concurso destas três aptidões, que correspondem aos nossos três órgãos — o excitador, o reientivo eo mantenedor dos movimentos. A firmeza oecupa sede mediana entre a vaidade e a veneração ; aos seus lados está a prudência, e a coragem posteriormente ao lado do órgão impar da vaidade. E evidente que todas as funeções d'alma, cujo quadro aca- bamos de expor, são o resultado da organização cere- bral, pois que a criança não poderá manifestal-as, senão quando os órgãos respectivos se achão próprios a agir. 40 HYGIENE O sentir e o desejar, que são dos instinctos feições características, tanto activas como passivas, regem a primeira época da vida infantil. Todos os actos desse organismo elementar são determinados por um instincto predominante, que é ordinariamente o instincto nutriti- vo: é a personalidade somente que o anima. Avançando na vida, uma pequena sociabilidade toma parte na producção das acções infantis. Habituados os sentidos da criança á influencia do mundo exterior, inicia-se-lhe a observação; com a con- templação concreta surgem-lhe phenomenos novos, os phenomenos intellectuaes: ella começa a adquirir o que se chama idéa ou imagem dos corpos. A criança, como os organismos elementares ou animaes superiores, não é capaz de nenhuma previdência pela comparação das diversas situações; é a reproducção das imagens anteriores, produzindo as mesmas emoções, que a faz executar os mesmos actos. A acção continuará cega como o impulso que a provoca, emquanto não a esclarecer o juizo que provém da região especulativa. Os signaes pelos quaes a expressão infantil traduz as emoções experimentaes ou espontâneas, como a neces- sidade de alimento ou de repouso, a alegria ou a dôr, são mimicos ou phoneticos, istoé, são formados pela decomposição dos gestos e dos gritos espontâneos. Os signaes artificiaes, que são um producto social, é DA PRIMEIRA INFÂNCIA 41 que progressivamente se vão tornando para a criança um estimulo da abstracção insufíiciente. Na execução dos desejos infantis manifesta-se em geral a timidez devida á exaltação da conservação pesso- al ou instincto nutritivo. Emfim, podemos considerar a criança, sob o ponto de vista da caracterização cerebral, como sob outros aspec- tos, um homem completo, cujos órgãos ainda embryon- narios se fossem modificando pelas acções hereditárias e desenvolvendo mais ou menos rapidamente sob os estímu- los do meio physico e social. Entre o phenomeno hygido e o anormal, não ha differença senão na intensidade dos primeiros. 'Em ne- nhuma época o homem é mais sujeito a essas variações vitaes, as moléstias, do que na limitada de um lado pelo nascimento, e do outro pelos sete annos. Os autores que occupão-se das moléstias infantis fallão todos na extra- ordinária freqüência dellas neste período da vida, e as estatísticas feitas sobre a mortalidade geral de cada paiz mostrão-nos o grande contingente com que entrão essas delicadas organizações na lei fatal da morte. Perturba- ções leves, que em outras idades não passarião de in- significantes indisposições,revestem na criança gravidade insólita, de modo que, quando não extinguem a vida, deixão o tenro organismo profundamente abalado, tal é t. <>-82 6 42 HYGIENE a feição nova que lhes imprimem as condições especiaes da infância. A grande dependência que submette o organismo ao meio indica-nos que a moléstia só pôde provir do interior ou do exterior. Mas as perturbações que se dão no meio não determinão estado mórbido qualquer, senão quando o cérebro, impotente pela ruptura da unidade que ca- racteriza a saúde, não pôde reagir e restabelecer o equilibrio ameaçado. O instincto nutritivo, sentimento que preside á uni- dade transitória da vida infantil, é o que excita e regula a acção da medulla e do grande sympathico, sob os estímulos de cujos apparelhos realizão-se os phenomenos vegetativos dos tecidos. Ora, este instincto, já em eretliismo pela actividade visceral própria á infância, cresce em super-excitação quando uma funcção, por influencia modificadora qual- quer, entra em jogo excepcional. Si, em virtude da predisposição mórbida existente, a perturbação visceral, retirada a causa excitadora, em vez de dissipar-se, persiste, manifesta-se logo um estado spasmodico, e a acceleração circulatória local, que torna-se nova causa de excitarão. Então, e em virtude de movimentos reflexos, estabelece-se a confusão das percepções internas, no meio das quaes o instincto acha-se impossibilitado de promover, por contracções convenientes, reacções capazes DA PRIMEIRA INFÂNCIA 43 de remover os obstáculos. Assim a harmonia compromet- tida desfaz-se de todo, e a ruptura da unidade é com- pleta. Si á predisposição creada pela grande actividade da vida orgânica da criança juntarmos a fragilidade de seus órgãos, e a sympathia que une entre si todos os apparelhos, e sobretudo a liereditariedade mórbida, que faz com que os organismos, attingindo os limites extre- mos da modiíicabilidade, não podem soifrer as menores variações exteriores, teremos explicado a freqüência das perturbações pathologicas da infância, e o perigo de que se cercão. Na infância, mais do que no a:lulto, o menor desre- gramento funccional repercute em todo o organismo, provoca perturbações do systema inteiro, quasi sempre manifestadas por symptomas nervosos gravíssimos. Taes phenomenos nada mais são do que a expressão exagerada da solidariedade que existe entre os apparelhos de um todo indivisível, onde tudo conspira e consente, na linguagem do fundador da medicina. Si a actividade enorme das funeções vegeiativas na criança faz com que o perigo nas moléstias seja facilmente attingido, deve-se a esta mesma actividade a prompta conjuração dos receios com a remoção dos obs- táculos, quando não são estes incompatíveis com a vida. De facto, as moléstias na primeira infância são 44 HYGIENE ordinariamente de fôrma aguda, ou matão em poucos dias, ou desapparecem em breve tempo. É de conhecimento geral que o órgão mais activo mais facilmente soffre desarranjos. Por isso os sympto- mas mórbidos na infância encontrão-se de preferencia manifestados pelos órgãos vegetativos. Depois destas perturbações seguem-se na freqüência as alterações das funeções animaes, e, finalmente, as alterações cerebraes. Esta gradação, esta suecessão é o que também observa-se na gênese de todo estado mórbido completo: aos symp- tomas vegetativos seguem-se os. symptomas animaes e por fim os cerebraes. A existência infantil fluetua entre o torpor e a agitação. Já temos dito que a harmonia das funeções constitue a unidade, condição da saúde, e que toda a unidade suppõe sempre a presidência de um sentimento prepon- derante. Ora, na criança, como já vimos, a preponde- rância sentimental está a cargo do mais poderoso inovei egoista—o instincto nutritivo, que opera a ligação da vida vegetativa á vida cerebral por intermédio da medul- la e do grande sympathico. Mas os moveis egoistas não são capazes de nenhuma ponderação, emquanto as suas necessidades não se achão satisfeitas; donde a unidade egoista só pôde ser passageira, e o equilibrio material e DA PRIMEIRA INFÂNCIA 4f) moral instável da criança fica a ameaçar-lhe constante- mente a saúde assim oscillante. Só os estimulos exteriores que irão progressiva- mente despertando a sociabilidade poderão tornal-a continuamente preponderante e produzir a verdadeira unidade. Esta subordinação de modo algum infringe as leis da organização cerebral e vegetativa, porque os moveis pessoaes se collocarâõ apenas ao serviço dos impulsos sociaes, sem cessar sua vigilância continua pela conser- vação do ser. A dedicação e a protecção carinhosa dos pais são os estimulos que a criança encontrará para desenvolver-lhe o apego aos cooperadores mais immediatos de sua exis- tência: dahi o sentimento da veneração aos mais remotos e dignos de seus.predecessores. O desenvolvimento deste dous sentimentos inci- tará a evolução da bondade, e por sua vez esta des- pertará a expansão do órgão principal da intelligencia —a meditação—em virtude de sua profunda connexâo orgânica. As fraquezas intrinseeas da bondade e da razão poderão, por uma cultura sentimental bem combinada, resistir á energia dos grosseiros impulsos; e assim a personalidade incoherente ficará subordinada á socia- hilidade systematisada. 46 HYGIENE A actividade seguirá espontaneamente o duplo im- pulso harmônico do espirito e do coração. Em conclusão do q ue havemos exposto resahe que o ponto de vista moral é com effeito, como diz Comte : 0 único próprio a fazer activamente prevalecerem as prescripções hygienicas. tanto privadas, como publicas. C LASSI Fl CAÇÃO POSITI VA DAS DEZOITO FUNCÇOES INTERIORES DO CÉREBRO ou QUADRO 8YSTEÍMATÍCO DA ALMA PELO FUNDADOR DO POSITIVISMO Aviso. —0 conjuncto destes 18 órgãos cerebraes constitue o apparelho nervoso central, que, de um lado, estimula a vida de nutrição, e, de outro, coordena a vida de relação, ligando as suas duas espécies de funeções exteriores. A sua região especulativa communica directamente com os nervos sensitivos, e a sua região activa com os nervos motores. Mas a sua região affectiva só tem connexidades ner- vosas com as visceras vegetativas, sem nenhuma correspondência immediata com o mundo exterior, que somente a ella se liga por meio das duas outras regiões. Este centro essencial de toda a existência humana funcciona continuamente, segundo o repouso alternativo das duas metades symetricas de cada um de seus órgãos. Para com o resto do cérebro a intermittencia periódica é tão completa como a dos sentidos e dos músculos. Assim, a harmonia vital depende da principal região cerebral, sob cuja impulsão as duas outras dirigem as relações. passivas e activas, do animal com o meio. PRINCIPIO Interesse. Sdo individuo ou instincto nutritivo. A* n0™>io S instincto sexual..... aa espécie.......^ instincto maternal por destruição ou instincto militar por construcção ou instincto industrial Instinctos de aperfeiçoamento. Ambição \ Temporal, ou orgulho, necessidade de dominio.... '"( Espiritual, ou vaidade, necessidade de approvação. Apego ....... Veneração ...{ Bondade, ou amor universal (sympathia), humanidade MEIO Passiva, t Concreta, ou relativa aos seres, essencialmente synthetica ou contemplação.................j Abstracta, ou relativa aos phenomenos, essencial- donde materiaes objectivos ( mente analylica....................................................... Activa, ( Inductiva ou por comparação, donde Generalisação....... ou meditação..................J donde construcções subjectivas. \ Deductiva ou por coordenação, donde Systemahsaçao.. Expressão...... Mimica, oral, escripta, donde Communicação................................................................. RESULTADO Concepção. 2 ) Actividade. Coragem........... Prudência....... Firmeza, donde Perseverança. (16) (17) (18) O ' Este quadro foi construido por Augusto Comte para o seu Systema de Política Positiva (tomo I, pag. 726), publicado a. sua theoria subjectiva do cérebro, destinada a substituir a admirável mas insufficiente tentativa de Gall. em 1851. Resume SEGUNDA PARTE moicai, m»es;ssoa.m^ INSTITUIÇÃO GERAL DA MORAL PESSOAL SIMJIAIIIO Posição da questão. — Dos caracteres geraes da systematisação positiva da moral pessoal.—Dos caracteres geraes da applicação das regras da moral pessoal.— Do papel fundamental da mãi como directora da educação.—Da necessidade de inculcar os hábitos, os preconceitos e as regras ou formulas da moral.—Me- didas para que a mulher possa exercer completamente a sua funcção de mãi. Os tres modos que affectão a existência humana— pessoal, doméstico e ei viço—, são considerados na moral positiva como grãos naturaes de uma mesma disciplina, na qual uma dependência mutua os prende, de sorte que o inferior prepara o superior, que por sua vez sobre elle reage. Nesta suecessão, as relações individuaes achão-se coordenadas segundo a sua extensão crescente e intimi- dade decrescente. Ê desta homogeneidade que resulta o caracter sempre social da moral positiva. O homem, a principio preparado pela Familia, é depois tomado pela Pátria, que o torna apto a servir a Humanidade, habi- tuando-oápratica das virtudes individuaes, sem as quaes t. 6—82 7 50 HYGIENE não se comprehendem as virtudes domesticas e sociaes. Esta consideração legitima a instituição da moral pessoal que tem por fim desenvolver o altruismo por dous proces- sos convergentes,—um indirecto, consistindo na purifi- cação dos instinctos egoistas, outro directo, cultivando as inclinações sympathicas. O grande fundador do catholicismo—S. Paulo, e os sacerdotes catholicos, seus successores, englobavão sob o nome de Carne ou Natureza os instinctos egoistas, que elles consideravão incompativeis com o altruismo ou conjuncto dos instinctos sympathicos a que chamavão Graça, e que não sendo innatos no homem, este devia. aspirar ao favor do seu deus, rompendo todas as suas ligações com os máos instinctos afim de anniquilal-os. Depois da descoberta de Gall, o medico, que não separa o moral do physico, sabe de que erros está eivada a theoria de S. Paulo, quando attenta para os laços que ligão a vida vegetativa á personalidade, destinada á conser- vação do individuo ou da espécie, condição sem a qual seria inconcebivel a existência collectiva. Esta exige a regularidade das funeções corporaes como necessárias á vida cerebral,da qual são a base fundamental.Sem a inte- gridade dessas funeções não pôde haver saúde, e por con- seguinte impossivel se torna a cada membro da sociedade preencher o cargo que lhe compete na distribuição DA PRIMEIRA INFÂNCIA 51 do trabalho, e assegurar á sua geração a unidade do corpo e a pureza d'alma. É por isto que a moral scientiíica condemna as praticas de torturas e sevicias, instituidas pela ultima synthese absoluta aos seus fieis para afastar os obstáculos que os retinhão presos á gros- seria da carne e eleval-os ao gozo ineffavel das delicias da graça; e condemna-as, não só pelas considerações expen- didas, como também porque dessa disciplina resultava um considerável abatimento das forcas do indivíduo, e este não pôde dispor de uma propriedade que lhe não pertence, pois que é todo da Humanidade, de onde veio, e para a qual caminha. O positivismo impõe ao cidadão o dever de cuidar da saúde, não para satisfação própria, mas para dar á intelligencia e á actividade a liberdade necessária a bem agir. A personalidade é, pois, necessária e indispensável á vida do ser, e absurda toda tentativa de destruição que contra ella levantar-se. Base necessária da nossa acti- vidade, ella entra como um dos elementos convergentes na realização de nossas funeções. A pretensa inconciliabilidade que alguns pensadores querem descobrir entre a existência dos instinctos egois- tas e a do altruismo, é conseqüência inevitável desse absolutismo scientifico que os leva a vêr exclusivamente na personalidade a origem de todo mal. Augusto Comte, descobrindo e pondo fora de contestação a ligação directa 52 HYGIENE entre o egoísmo e o altruismo,dá-nos a medida do valor de semelhantes apreciações, e estabelece a dependência correlativa das emoções sociaes e das emoções pessoaes, correlação que torna mais enérgicas as primeiras e as outras nobilita. Ainsi c'est par suite de ces relations spontanées et non point par un calcul raffiné- ou par des déductions compliquées, que 1'enfant en vient à cherir celle qui tient sa vie entre ses mains, le pauvre à respecter le riche qui pourvoit à son existence materielle, le fetichiste à adorer Ia Terre et le Ciei, qui le dominent par des influences insurmontables. Cest pour cela aussi que les fonccions domestiques ou sociales, d'abord recherchées pour Ia satisfaction de Ia personalité, íinissent pour constituer, pour tous ceux qui ne sont pas indignes, un milieu favorable à 1'essor de Ia sympathie. (*) Vemos assim que a natureza humana, mais enérgica nos sentimentos egoistas, oflferece em seu funccionalismo ordinário um poderoso elemento de disciplina, do qual tira proveito a moral pessoal. E, pois, como imprescindíveis á vida, e fornecendo uma base indispensável á expansão dos nossos sentimentos sociaes, que o positivismo consagra os instinctos pessoaes. Estabelece-se o problema da purificação. Já vimos que os esforços empregados pelo sacerdócio catholico para regrar a personalidade excitarão-a, em (*) M. Pierre LalRtte—De Ia morale positive—Havre, 1881—lfi2. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 53 vez de a refrearem, por isso que, com o seu dogma abso- luto, elle pretendia comprimir cegamente os instinctos egoistas que a compõem. A exaltação da vaidade nos mysticos e o desnvolvi- mento do amor próprio na população occidental dão teste- munhos vivos da ineflicacia e do perigo de taes praticas. O positivismo, retomando o problema, procura resol- vel-o do modo mais consentaneo á Índole dos conheci- mentos scientificos. Era preciso reter em certos limites a satisfação da personalidade, impedir-lhe o exercício exagerado como causa de perturbações que aíFectarião, tanto as nossas forças physicas, como as nossas faculdades intellectuaes e moraes; para isto, porém, não era mister supprimir á natureza humana uma de suas partes, bastava conciliar- lhe a existência com a expansão dos instinctos sociaes. Era necessário disciplinal-a, e não destruil-a. E o que tenta fazer a moral positiva com a subordi- nação da personalidade à sociabilidade, em vista da Humanidade, e por conseguinte elevando-se contra a satisfarão dos instinctos egoistas, quando elles não têm um fim commum. Não é em face de calculada prudência individual que o positivismo institue deveres ; mas, reconhecendo a utilidade pessoal de suas prescripções, elle as liga á sociabilidade. 54 HYGIENE Habituando-se a dar aos actos, ainda os menores, um destino elevado, o homem aprende a superar as inclinações pessoaes e subordinal-as ao bem de todos. Assim procedendo, já tem conseguido muito, porque tira a estes instinctos tudo o que encerrão de vicioso, o que limita-lhes muito o dominio; não basta, porém, uma tal purificação para constituir a plena moralidade. Esta não existe sem a dedicação. Para prevenir as más acções, o melhor meio a em- pregar é o exercicio habitual do bem ; pois que, como diz Augusto Comte « a principal restricçâo de uma inclinação qualquer resulta da expansão continua de suas antago- nistas. » (*) A cultura dos bons sentimentos, esclarecida pela sciencia systematisada para evitar os desvios moraes originados em opiniões errôneas, conduz á virtude, que o moralista Duelos definio: um esforço sobre si mesmo em favor dos outros. 0 positivismo, systematisa o culto privado,instituído e consagrado por um uso universal de muitos séculos. Esta instituição repousa sobre a seguinte lei moral: A expressão dos sentimentos excita-os e fortifica-os, com uma intensidade que cresce com a regularidade e a continuidade dos esfor- ços correspondentes, de modo a tornar habituaes impulsões accidentaes. (*) Augusto Comte—Poi. Pos.,vol. 4°, pag. 282. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 55 Reflicta cada um nesta lei, e poderá notar as vanta- gens enormes que resultarão para o homem da pratica dos actos cultuaes. Preparar o coração e o espirito, de modo a fazer do indivíduo um sêr moral, é o fim da educação, que, inicia- da na Familia, completa-se na Pátria. A primeira destas phases, a moral espontânea, isto é, a educação dos sentimentos, é a mais decisiva, a que mais affecta o conjuncto da vida; porque, com tal funda- mento, a moralidade, visto como as preoccupações materiaes não têm ainda estimulado o egoísmo, difíicil- mente será desviada na vida exterior. E sob a superin- tendência materna que a educação na vida privada se realiza pela 'expansão continua dos instinctos sympathi- cos, principalmente a veneração e a bondade, que já ahi encontrão um exercício sufflciente. Única providencia que a criança pôde e deve conhecer directamente, a mãi dirige-lhe a educação physica e aflfectiva até aos sete annos, idade em que inicia a sua cultura intellectual systematica pelos estudos artísticos nas grandes obras que constituem o thesouro esthetico da Humanidade, até então apenas sentida de um modo indirecto. A principio, aperfeiçoando os sentimentos, cultivando depois a intel- ligencia, a mãi deve sempre, e cada vez mais, estabelecer e consolidar a preponderância definitiva do coração 56 HYGIENE sobre o espirito. Patenteando á novel intelligencia a importância maior dos sentimentos relativamente aos actos, ella desenvolve o sentimento do dever, fazendo consistir a verdadeira felicidade na expansão das affeições altruístas, perante as quaes os actos serão considera- dos meios de satisfação ou de excitamento. A efficacia extraordinária da influencia materna no desenvolvimento intellectual e moral do indivíduo, parece-nos, deixamol-a provada em poucas palavras. Entretanto, alguns reformadores pedagógicos, no ardor com que pregão o ensino obrigatório, cuidão que a criança é demais na casa paterna, e querem afastal-a da influencia feminina para entregal-a a mãos estranhas. Não se lembrão elles que, si a educação tem por fim principal instruir e moralisar, e si a moralidade é o resultado do desenvolvimento da sympathia, aos seres mais sympathicos é que compete propriamente desenvol- ver nos outros as affeições destinadas a prevalecerem. O melhor preceptor, o que reunir a máxima moralidade ao maior cabedal scientifico, nunca conseguirá substituir a mãi em sua funcção principal, jamais fará um homem. Cest à notre sexe sans dou te qu'il appartient de former des geomètres, des tacticiens, des chimistres, etc; mais ce qiron appelle 1'homme, c:esl à dire 1'homme moral, est pout-être forme à dix ans, et, s"il ne Ia pas été sur les genoux de sa mère, ce será toujours un grand malheur. fJoseph de Maistre). Bem cabe aqui notar que, si a sociedade deve, no DA PRIMEIRA INFÂNCIA 57 interesse geral, que é o seu próprio interesse, adoptar as desventuradas crianças que a desordem moral, o criminoso desvario da familia abandona, jamais deverá esta acção protectora, revestindo a falsa apparencia philantropica de instituição publica, ir proteger assim a clandestinidade, que é o próprio crime. Diz M. de Gerando : É sempre perigoso para a moral publica abalar os olhos da multidão com a presença de um gênero de asylos, semelhantes ao dos hospícios de crianças, fazer suppôr que o numero dos expostos é considerável, e familiarisar a opinião com a idéa de um crime tão contra a natureza. De resto, diz Fonssagrives, a roda, que um eco- nomista inglez, lord Brougham, chamava « a melhor machinazinha de desmoralização que jamais foi inven- tada», e que um outro escriptor, AI. Renvasle, definia com igual energia « une machine á suppression d'état », tende a desapparecer rapidamente, e bem depressa não restará delia senão a lembrança de uma tentativa gene- rosa, mas imprevidente. Mas não é só na vida privada que a influencia ma- terna se faz sentir. A mãi é a educadora natural, a preceptora de seus filhos. A superintendência que ella conserva na educação continua durante toda a vida do filho, mesmo por inspiração subjectiva. Deixemos aos revolucionários, a esses espíritos sem coração, vozearem contra a permanência da criança no t. 6-83 8 58 HYGIENE lar, e confiemos nossos filhos ás suas mais, a esses entes adorados, que tanto soffrêrão por elles, e sempre a sorrir, e sempre promptos a maiores sacrificios, quando os exigem a salvação e a felicidade deses seres a que os ligão inquebrantaveis laços. Ha uma lei animal, de que já falíamos, segundo a qual os actos repetidos regularmente tendem a reprodu- zir-se mesmo quando tem cessado o estimulo exterior ou interior. E a lei do habito, que se completa pela lei do aperfeiçoamento, quando a reproducçâo é bem regrada. Estas noções fazem suggerir logo a utilissima idéa de suscitarem-se os hábitos na criança. Aproveitar as pri- meiras épocas da vida, em que é mais fácil amoldar essa cera molle, como já o disse alguém, aos actos, é um grande passo para o fim a que se propõe a educação. Não possuindo ainda os meios de analysar os actos bons ou máos, a criança não pôde escolher os mais con- venientes; demais, entregando-a aos próprios impulsos, reconhecer-se-hia claramente ser o egoísmo que deter- mina as suas acções, as quaes, com o tempo repetidas, concorrerião para desenvolver a parte mais enérgica e grosseira da natureza humana,em virtude da reacção dos actos sobre os sentimentos. As mais, pois, devem inspirar os hábitos aos filhos, não só porque estabelecer-se-hão sem esforço,' como pela salutar influencia que as boas DA PRIMEIRA INFÂNCIA 59 praticas exercem nos sentimentos altruistas. Quando virmos um homem violar o capital de que um outro é o depositário, podemos afíirmar, sem receio de cahir em erro, que em criança elle não se habituou a respeitar os botões ou as agulhas que encontrava na costureira de sua mãi. Isto prova que os actos insignificantes preparão os mais importantes. Nas mesmas condições dos hábitos estão os precon- ceitos. Ha uma escola anarchica que tem a fatua pretensão de educar sem elles os indivíduos. Eqüivale isto a não reconhecer a importância da subordinação do espirito ao coração. Abandonai a criança ás próprias inspirações, e seus actos serão o reflexo do egoísmo que os dirige, e a personalidade se desenvolverá. Diz o Sr. Laílite : Fort honne observatrice dunc réalité avec laquelle elle est en conlncls si intimes. Ia fennne regard avec pitié ces partisans de 1'obser- valion, quine voient que Ia suppression des préjugés equivaudrait ;'i laisser le champ libre a cette bete farouche que tout homme ren- ferme en lui. A mãi emprega toda a energia de que é capaz o seu amor para fazer prevalecerem no filho os preconceitos, que elle melhor comprehenderá depois, quando a sciencia demonstrar-lhe o valor. Rousseau, no Emilio, e os seus sectários desconheeião 60 HYGIENE a existência dos sentimentos benevolos, e isso explica a extravagância de suas theorias. As formulas da moral também devem ser habitual- mente repetidas ás crianças. Não importa que não as possão ainda comprehender; á força de muito ouvil-as,. aprenderáõ a respeital-as, e procurarão afinal seguir-lhes as determinações. Para que a mulher possa preencher a sua missão, por certo a mais difllcil, é preciso que as suas inspirações sejão esclarecidas por acquisições scientificas, dando ao espirito o papel que lhe compete de conselheiro do coração. Au- gusto Comte instituio para o sexo affectivo a mesma preparação encyclopedica que exigio do sexo activo, com pequenas modificações, motivadas pelo destino differente. Mas permanece ainda um obstáculo á plena reali- zação da funcção da mulher. Forçada por necessidades materiaes, abandona o lar, e entrega-se aos labores de uma vida activa, contra as disposições de sua própria organização e fora do seu dominio. Convém não desviar- lhe a attenção e os cuidados do sanctuario doméstico,. onde ella elabora a mais complexa das obras humanas— o cidadão. « O homem deve nutrir a mulher » é a regra de moral domestica que Augusto Comte apresenta para preserval-a do trabalho exterior. TERCEIRA PARTE Marcha gsral 4a eiucaçao iorante a primeira infância I INSTITUIÇÃO DA EDUCAÇÃO ANTES DO NASCIMENTO Fertes creantur fortibus et bonis. .. (HOKACIOj. SDni.llIIU Da regulamentação do casamento.— Dos cuidados ao feto. — Do aborto e do infanticidio Si é objecto da hygiene, ou antes da moral, aper- feiçoar a natureza humana em vista da Humanidade, prevenindo assim os males que a negligencia na educa- ção do homem possa porventura acarretar, a sua missão ficaria sempre ineflicaz, quando não procurasse em bem dos futuros filhos a regulamentação do casamento, donde só deverão elles provir. A acção da moral neste acto é fecunda em resultados benéficos; desprezal-a é aban- donar aos desvarios humanos a base da sociedade, já muito abalada pela anarchia dos seus elementos; olvidar ou negar-lhe prescripções utilissimas, tanto aos esposos, como aos filhos vindouros é limitar, é cercear-lhe um 64 HYGIENE poder que mais tarde será applicado a remover obstá- culos ás vezes insuperáveis. Entretanto a anarchia augmenta, a saúde parece ir-se tornando abstracção im- possível, incrementa-se a moléstia e os casamentos cada vez mais afastão-se das condições salutares, em grave prejuízo dos seres que delles emanão. A lieredi- tariedade mórbida, como a physiologica, é facto assás comprovado pela observação de todos. Assim como a criança traz os signaes physicos dos pais,assim como encontra-se nella a reproducção das disposições moraes e das aptidões intellectuaes e praticas paternas, assim também os actos mórbidos passâo de pais a filhos, obede- cendo á mesma lei: a criança é a reproducção dos pais. A transmissão das moléstias pela hereditaridade, e muitas vezes aggravadas, deteve por muito tempo a attençâo dos hygienistas, que unanimemente proclamâo a necessidade de regrar a natureza dos productos huma- nos. E para isso propõem uma medida absurda— a inter- dicção do casamento aos mal conformados ou doentios, como se fora o casamento humano instituído para a satisfação legitima dos appetites sexuàes, tendo em vista a reproducção da espécie. Que é preciso regrar a pro- creação humana é affirmação hoje banal. Mas pretender resolver o problema com soluções taes, odiosas e tyran- nicas, é illudir-se completamente sobre os effeitos de semelhantes prescripções. A interdicção da união DA PRIMEIRA INFÂNCIA 65 conjugai prevaleceu nos espíritos emquanto a Graça foi considerada um dom da divindade, e ainda domina a opinião dos que desconhecem a melhor parte da natu- reza humana, os instinctos sympathicos ou sociaes. Hoje que a existência natural destes instinctos é um conhe- cimento scientifico adquirido por Gall e desenvolvido por Augusto Comte, a moral positiva vem tentar a regeneração da humanidade. E pela sublime instituição dos casamentos castos que a moral positiva institue também a regulamentação da procreação humana. Estudando nos dous sexos a natureza humana, vêmos-lhes notáveis differenças nas aptidões. Ao passo que a mulher, por uma menor intensidade de seus instinctos pessoaes e pela energia superior de suas incli- nações sociaes, impõe-se-nos typo eminentemente moral, as qualidades que formão o caracter, e dão o commando, apresentão no homem maior desenvolvimento, e o fazem o typo pratico por excellencia. Idênticos contrastes notão-se no espirito ou intelli- gencia, que na mulher offerece mais justeza e penetração, e no homem mais força e extensão. Sob esta idéa procurou Augusto Comte regenerar o casamento concebendo-o destinado ao aperfeiçoa- mento mutuo dos dous sexos, abstrahindo toda a sen- sualidade, necessária simplesmente para desenvolver t. 6—82 9 66 HYGIENE no homem a ternura, em virtude de sua inferioridade moral. Tudo concorre, pois, a provar a efficacia mutua desta união, que constitue a mais perfeita amizade embellezada por uma incomparavel posse reciproca. Ora, sendo assim, não devemos, como fazem os hygienistas, condemnar ao triste celibato os indivíduos incapazes de produzir filhos sadios, .mas, invocando autoridade superior a toda individualidade, aconselhal-os a que se abstenhão da procreação, reservando esta funcção aos casaes bem conformados. Adoptando esta medida, acreditamos que o numero dos nascimentos de crianças mais inclinadas á morte do que á vida, diminuirá consideravelmente. Em vista do futuro das crianças, devemos ainda accrescentar que é de grande necessidade regrar a idade dos cônjuges. Não basta preparar a geração futura pelas condi- ções que devem cercar a procreação da espécie. Quando esta funcção fôr exclusivamente preenchida por indi- víduos que só possâo legar á sociedade organismos tendo o conjuncto de aptidões normaes á vida, o hy- gienista, é certo, terá o seu papel muito limitado, e confiança no êxito de suas prescripções, porque então DA PRIMEIRA INFÂNCIA 67 encontrará amanhado o terreno de suas applicações. Mas, para alcançar resultados, ainda é preciso, instituindo geralmente a educação durante a primeira infância, indicar os cuidados especiaes que devem preoccupar a mulher durante a gravidez. Conhecem-se as relações que prendem o feto à mãi, e ninguém ignora que as mínimas perturbações que attingem o organismo materno repercutem sobre o do filho, provocando-lhe movimentos muitas vezes apreciá- veis. Juntem-se a isto as grandes modificações que expe- rimenta a mulher pelo facto da prenhez, e logo vê-se como é melindroso o seu estado e o risco que corre o embryão ao menor abalo physico ou moral. Emfim « n0 utero a criança identifica-se de tal modo com a vida de sua mãi, já dizia Hippocrates, « que a saúde de uma faz a saúde do outro. » É por isso que a moral vai buscal-o ainda em germen no seio materno, para em seus braços poderosos eleval-o, por uma serie de transformações physicas, intellectuaes e moraes, às condições da verdadeira felicidade. Desenvolvendo-se no organismo materno, onde haure todos os materiaes de nutrição, recebendo delle todos os elementos de vida, o feto, para executar completa evolução, tem necessidade de assistência continua, de reiterados cuidados. Muitas vezes mesmo estas precauções trazem verdadeiros sacrificios ao ente que o contém. Mas 68 HYGIENE que mãi digna deste nome não os supporta com a alma plena de alegria; que mulher os sente quando vê nelles as condições de levar a termo a nobre missão de que incumbio-se ? No entanto, a despeito da boa vontade, essas precauções são ordinariamente abandonadas, e não raro desses descuidos resulta o aborto. Atacando a ignorância com todo o seu cortejo de conseqüências fataes, preencheremos uma parte da nossa tarefa. Convém, pois, que a mulher grávida tenha uma clara noção do regimen a seguir, saiba como sua alimentação deve ser regrada, conheça a natureza das suas vestes mais apropriadas ao desenvolvimento do feto, instrua-se sobre as regras que lhe devem dirigir os exercícios, etc. Trataremos successivamente de todos estes artigos : Alimentação.—Não deve a alimentação variar da que fora habitual no estado de vacuidade uterina ; porém, quando as funeções digestivas são mais ou menos pertur- badas, e manifestão-se náuseas e vômitos, quando, por excepçãonaprenhez, a mulher torna-se plethorica, e pôde este estado comprometter a vida do embryão, o regimen nutritivo deve ser modificado então convenientemente. No primeiro caso, muitas vezes, a mulher repudia completamente as carnes, e prefere as substancias vege- taes e outras que a sua imaginação fertilissima inventa como alimento; neste caso somos de opinião que se lhe DA PRIMEIRA INFÂNCIA 69 permitta ingerir o que lhe appetecer, emquanto o appetite não referir-se a substancias não alimenticias, ou que, o sendo, possão todavia produzir-lhe uma indigestão, accidente que deve com cuidado ser evitado. Mulheres ha nas quaes o appetite é exageradamente excitado, e outras em que a anorexia é frequente,de modo que de antemão é impossível determinar a quanti- dade de alimentos que lhes é conveniente. De modo geral, porém, póde-se dizer que a alimenta- ção deve ser mais copiosa, porque a mulher que encerra em seu organismo um outro ente vivendo a expensas de seu sangue, o vehiculo nutritivo, necessita alimentar-se em quantidade sufflciente para a reparação própriae para o desenvolvimento do feto, tanto mais que a anemia e a fraqueza são ordinariamente o séquito da gravidez. Todavia, devem-se desprezar os alimentos fortemente excitantes, cujo effeito é a acceleração circulatória, tão nociva á criança. Entre esses excitantes estão os alcoólicos, que só em casos excepcionaes serão usados. Bouchut (*), Fonssagrives (**), e outros, recommendão as bebidas alcoólicas especialmente nos vômitos que acompanhão a prenhez, onde, em certos casos, têm ellas dado excellen- tes resultados. (*) Bouchut.—Hygiene de Ia première enfance.—Pariz, 1879. (**) Fonssagrives.—Entreticns familièrs sur l'hygiène.—?3Lriz,\810. 70 HYGIENE Emfim, deve a mulher regular a quantidade de alimentos a ingerir, pela possibilidade ou não de entre- gar-se ao exercício. É claro que, naquellas em que o cedema e as varices das pernas muito desenvolvidos condemnão ao repouso, a alimenção copiosa poderia produzir uma exhuberancia sangüínea; e, pois, devem ellas procurar manter o equilíbrio entre a receita e a despeza orgânica por uma alimentação moderada. Na gravidez, a mulher seguirá á justa o preceito de Hippocrates : não comer muito, nem exercitar-se muito pouco. Quanto aos casos de plethora, sabe-se que antes de empregar-se qualquer meio debellador, a diminuição dos alimentos será o primeiro, e muitas vezes só este bastará. Ar.—Sem ar puro não ha saúde. As mulheres grávi- das devem respirar um ar normal e viver em habitações convenientemente ventiladas. A atmosphera confinada que se respira nos logares de reunião, nos bailes, theatros, etc, pôde determinar, e não poucas vezes, contracções uterinas e o aborto. O ácido carbônico ahi em profusão, sendo inspirado pela mulher, produz-lhe sobre as fibras uterinas uma acção excitante, como a observação diária e Brown-Sequard o têm demonstrado. Por isso devem as mais impôr-se o leve sacrifício de DA PRIMEIRA INFÂNCIA 71 abandonar completamente taes divertimentos, princi- palmente nos primeiros mezes da gravidez. Para ellas seria mais conveniente a habitação no campo, pela pureza do ar e pela serenidade de espirito que goza a vida campestre. O seguinte trecho do Dr. Munaret, citado por Bouchut, exprime perfeitamente isso : Les plus beaux enfants naissent au sein des campagnes par Ia môme raison que les arbres en plein vent produisent des fruits moins hâlifs, mais plus gros, plus colores que ceux qui languissent sous les vitres d'une serre énervante. Vestes.— A gravidez repelle as exigências da moda. Esta, muitas vezes, exagerada, pôde ter funestas con- seqüências. Cumpre que os vestidos da mulher grávida sejão preparados de modo a não exercerem constricção sobre o ventre ou o peito, primando em deixar ao corpo plena liberdade de acção. Segundo Fonssagrives, dizião os Romanos convir que a mulher grávida seja incincta, sem cintura. O collete tão usado hoje, e às vezes de modo imprudente, é na prenhez uma das causas mais communs da parada do desenvolvimento fetal, das monstruosidades e do aborto. O collete embaraça os movimentos respiratórios, restringe o espaço já pequeno disponível a outros órgãos, 72 HYGIENE e determina o deslocamento do utero, oppondo-se á ascen- são do órgão gestador. É preciso recommendar, portanto, o completo aban- dono do collete neste periodo. Banhos.— Os banhos de asseio serão sempre permit- tidos, comtanto que nelles observe-se preceito, cuja in- fracção pôde trazer perigos nessa phase da gravidez, em que o aborto é facilmente provocado por qualquer desre- gramento, por qualquer accidente, mesmo insignificante. Os banhos devem ser levemente tepidos e pouco prolongados. Do quinto mez em diante e para o fim da prenhez não ha perigo a este respeito. Exercício.— Não se podem estabelecer regras fixas para o exercicio da mulher grávida. Varião ellas com o periodo da gestação e com as circumstancias que a acompanhâo. De uma maneira geral diremos já que o exercicio moderado convém a todas as épocas da prenhez; seus effeitos benéficos são numerosos e evidentes: excita o appetite, regularisa a circulação e o estimulo nervoso, evita a constipação de ventre, muito commum nesta época, e ás vezes prejudicial á saúde materna e fetal. Casos ha em que o exercicio será proscripto, e são aquelles em que accidentes anteriores indicâo a necessidade de condemnar a mulher a permanecer no leito por largo DA PRIMEIRA INFÂNCIA 73 tempo; a hemorrhagia e os demais signaes precursores do aborto mostrão esta disposição. Tratando-se de uma plethorica, prescrever-lhe o repouso fora incrementar perigos, ao passo que o bem regrado exercicio afastará os accidentes que a exaltação deste estado provocaria. Mais adianta-se a gestação, mais necessário e útil se torna o exercicio. Todos os parteiros o aconselhâo como ura meio de dar ás articulações da bacia flaccidez indis- pensável ao êxito do parto. A. falta de accidentes que nota-se nas puerperas camponezas explica-se-lhes em parte pela vida activa: ahi entregâo-se ellas aos labores costumarios até que a primeira dôr lhes annuncie o dever de recolherem-se. Assim como assignalamos os bons effeitos do exerci- cio moderado, devemos repellir como muito prejudiciaes os movimentos violentos: a carreira, adansa, os esforços musculares, a equitação, emfim, todo o movimento brusco provocador do aborto. Relações sesuaes.—A unanimidade das opiniões com que se têm pronunciado os autores nesta questão, desde muito devera despertar a attenção dos maridos sobre os inconvenientes a que expõem a mulher e o filho que ellas abrigão no ventre, entregando-se a contactos sexuaes. Mas os mesmos que vêm nesta excitação um perigo para t. 6—82 10 74 HYGIENE o desenvolvimento do feto, por uma contradicção, talvez interessada, limitão-se a aconselhar apenas moderação nas relações sexuaes, quando, conhecido o perigo, lhes correra o dever de recommendar completa abstinência. A este respeito têm os occidentaes muito que invejar a alguns povos da África, onde: L'époux est dailleurs plein d'attentionspour Ia mère ; il s'abstient de tout raprochement avec elle.....(*) E preciso que o homem aprenda a ver na mulher, não o instrumento de satisfação de um instincto egoista e grosseiro,mas a mãi, a esposa, a filha, a irmã, sublime conjuncto de todas as perfeições resumidas em um ente verdadeiramente providencial. A mulher grávida é o sanctuajio que abriga o germen do futuro cidadão. Todo o contacto impuro lhe será profanação. Desde o começo da concepção, o organismo feminino soffre perturbações profundas. As modificações funccionaes que este estado acarreta, a suspensão cathamenial, os vô- mitos e a susceptibilidade nervosa, indicão que é notável a modificação por que passão as funeções cerebraes. As relações directas a unirem o instincto materno ao apparelho dos germens, as reacções que effectuão-se (*) Docteur A. Corre. — La mère et Venfant dans les races humaines. —1882. DA PRIMEIRA INFANCTA 75 entre elles, tudo nos induz a acreditar que a desordem cerebral origina-se na exaltação deste instincto, em superactividade mesmo durante o aleitamento. A essa e não á outra causa devem ser attribuidos certos casos de aborto provocado e de infanticidio. Une jeune íille trompée dans ses esperances, deshonorée, peut perdre Ia tète au moment de l'accouchement et detruire son enfant. Cest sa vanité hlessée qui l'a poussée à cette résoluction extreme. Mais on peut admettre que cette "sanüé blesséeait pu provoquei' un accés de manie pendant lequel 1'infanticide a été commis. La malheureuse mère, coupahle d'unc première faute, est ici irresponsable de ses actes. (*) O facto é o mesmo em algnns casos de aborto provocado. Poderíamos ainda, seguindo o Dr. Audiffrent, expli- car esses phenomenos de outro modo, appellando para as reacções que, em virtude de sua natureza egoista, o motor materno produz sobre os outros instinctos. Mas para nosso fim é isto sufflciente. A attenção das mais deve ser attrahida para este ponto capital : o perigo a que expõem o filho quando nellas exalta-se o instincto materno. O meio de evitar desastres horrorosos é subordinar o motor materno aos impulsos dos moveis sociaes. (*) Dr. Audillrent.—Maladies du cerveauetde l'innercation.—181i. II MARCHA DA EDUCAÇÃO ORGÂNICA E ANIMAL DURANTE A PRIMEIRA INFÂNCIA SLMMlItIO rosiç&o da questão.—Cuidados ao recém-nascido.—Da nutrição e dos cuidados physiologicos geraes.—Da educação muscular e da educação dos sentidos (jogos).— Regra geral de tratamento das moléstias infantis. As impressões continuas que o meio produz no organismo do homem provocão a reacção deste, que procura afastar as que são nocivas ao seu livre funccio- namento, e adaptar, modificando-as e modificando-se, as que são susceptíveis de melhoramentos ao seu bem-estar e ao de seus semelhantes. Mas para isso duas condições devem ser satisfeitas: l.a Que a integridade e desenvolvimento do organis- mo sejão garantidos pelos meios que o conservão, isto é,. que as funeções da vida orgânica realizem-se com a máxima perfeição; assim se prevenirá a reacção funesta do corpo desarranjado sobre o cérebro ; 78 HYGIENE 2.a Que os órgãos ao serviço da vida de relação tenhão energia suíiiciente para reagir contra as impressões exteriores e para favorecer a vida orgânica. A primeira será preenchida pela regularidade da nutrição e das mais funeções physiologicas, concernentes à vida vegetativa; a segunda pelos jogos que, segundo a lei do habito, desenvolvem e aperfeiçoão os órgãos e suas funeções, e, demais, exercitão a actividade que prepara o homem para a vida pratica. Comprehende-se sem esforço que semelhante exerci- cio deve ser começado quando os órgãos do indivíduo têm mais vitalidade, quando estão no periodo do desenvolvi- mento. Na criança a delicadeza dos órgãos e sua flaccidez prestão-se facilmente a modificações que mais tarde serão impossíveis. Convém aproveitar o tempo em que ella tem mais aptidão a dobrar-se, a sujeitar-se. Começando na prenhez a educação physica da crian- ça, vamos continual-a com o nascimento e acompanhal-a- hemos até aos sete annos, termo da primeira infância. Nos cuidados a prestar á criança immediatamente depois do parto, dous casos podem se dar: ou o recém- nascido é forte e sadio, ou nasce fraco e doente. Tomemos o primeiro caso. Logo que a criança cahe no mundo exterior, pratica- se o desprendimento do cordão, si este vem enrolado ao pescoço, e deita-se-a com o semblante voltado para o DA PRIMEIRA INFÂNCIA 79 lado opposto da vulva, afim de que não corra o risco de ser suffocada pelos líquidos vaginaes escoantes. Dous procedimentos apresentão-se então ao parteiro : esperar o delivramento espontâneo para cortar o cordão; ou, segundo a pratica mais corrente, fazer a secção imme- diata a três ou quatro dedos de distancia do abdômen. Feito isto, reduzir, si porventura existe, alguma alça intestinal e applicar uma ligadura, de modo que nella não fique comprehendida a pelle. Procede-se á lavagem do corpo por meio d'agua na temperatura conveniente, tendo previamente o cuidado de untal-o com óleo ou uma gemma de ovo, afim de livral-o das impurezas que o cobrem. Bem enxuta a superfície do corpo, envolve-se o cordão com uma compressa, applica-se sobre ella uma outra, e uma banda, que faça uma volta em torno do corpo, mantém o apparelho. Na cabeça uma touca de meia, envolvendo as nádegas o coeiro de flanella, um pouco de linho de fôrma triangular para receber as matérias excretadas, e por cima de tudo uma camizinha, constituem o vestuário do recemnascido. Antes, porém, de vestil-o, cumpre investigar si existe algum vicio de conformação. Passemos ao segundo caso figurado. 0 recemnascido não respira; é a morte apparente. Diversas são as causas que a produzem, porém confun- dem-se de tal modo os seus effeitos, que é impossível tirar 80 HYGIENE dahi indicação para um meio conveniente de tratamento. Este será, pois, o mesmo para todos os casos. Alguns phenomemos exteriores, porém, podem guiar o pratico. Si a face do recemnascido apresenta-se congestio- nada, deve se fazer correr pelo cordão uma pequena quantidade de sangue. Isto não basta algumas vezes. E preciso executar flagellações sobre as espaduas, a planta dos pés, a palma das mãos e as nádegas. Desem- baração-se as fossas nazaes e a garganta das mucosidades existentes, e exercem-se com a barba de uma penna titulações nestas cavidades. Sucções executadas com a boca nos seios, um banho quente e aspersões d'agua fria no corpo, são meios a tentar. Dão bons resultados também as duchas de água fria ou de álcool sobre o thorax, movimentos alternativos de abaixamento e de elevação nelle impressos, as fricções com flanella ou escova. Quando estas praticas têm , sido tentadas em vão, recorre-se á insuflação de ar boca á boca, ou pela canula de Chaussier, e finalmente á electricidade. Quando o recemnascido apresentar-se descorado e exangue, serão applicadas as mesmas praticas, àexcepção da sangria do cordão. Aquecel-o e aleital-o são os cuida- dos essenciaes depois de restabelecida a respiração. Este procedimento convém do mesmo modo nos DA PRIMEIRA INFÂNCIA 81 casos em que a criança nasce em estado de abatimento ^e fraqueza. Com a concepção, a sympathia utero-mamaria deter- mina para o lado das mamas um augmento de vitalidade, uma congestão sangüínea, um movimento gerador, indicio de um trabalho novo, que termina pela secreção do leite. É a advertência que o organismo faz á mãi de que deve alimentar o filho, como até ao nascimento o havia nutrido ella com o seu sangue, e ao mesmo tempo o meio de cumprir essa parte da incumbência materna. O leite é o alimento natural da criança nos seus primeiros mezes de vida, e destinado a continuar no exterior a geração começada no organismo materno. Je regarde comme Ia première loi de Ia nature, comme Ia première condition du développement complet de rhomme, que sa première nourriture lui soit donnée immédiatement par un être vivant. L'eníant qui a fait longtemps partie de sa mère, doit 1'ètre encore pendant quelque temps après sa naissance. São palavras de um verdadeiro typo de medico, Hufeland, o Nestor dos médicos allemães, como o chama- vão os seus contemporâneos. Entre os antigos, nas raças fetichistas, o aleitamento materno foi sempre considerado um dever; mesmo os mamíferos inferiores não recusão a mama ao filho. Só T. (5—82 11 82 HYGIENE a algumas mulheres excepcionaes estava reservado o abandono voluntário dessa obrigação, desse incommodoy que as priva dos prazeres exteriores ao lar. É o resultado da dissolução dos costumes e da anar- chia moral que nos devasta. Mas felizmente para a humanidade, o numero dessas infelizes excepções é muito limitado; e, si ainda existem, é porque nunca experimentarão as emoções que excita a dedicação, esse sentimento que levava Clothilde de Vaux a dizer: Quels plaisirs peuvent 1'emporter sur ceux du dévouement? Um dos deveres da mãi é aleitar o filho, e a realização do dever é condição de felicidade. 0 aleitamento materno assegura as harmonias func- cionaes estabelecidas entre a saúde do filho e a de sua mãi, que não fugirá ao império dessa obrigação, todas as vezes que dahi venhão vantagens para o filho, e não derivem inconvenientes para ella. Mas não é só o physico da criança que lucra com o leite materno. As qualidades intellectuaes e moraes que pela lei fatal da hereditariedade fôrão-lhe transmittidas em germen, elaboradas por assim dizer com o sangue, em- quanto era este o seu alimento e a sua vida, affirmão-se pela passagem do leite materno ao organismo infantiL DA PRIMEIRA INFÂNCIA 83 Sylvius, citado por Donné, diz o seguinte : Jai observe depuis longtemps que les enfants succent avec le lai^ le tempèrement aussi bien que les inclinations qu'on remarque en «ux, pendant le cours de leur vie, e qu'ils tenaient sous ces deux rapports beaucoup de leurs nourrices. E como ha ainda quem queira destruir o que já faz; parte da organização da criança, entregando-a a uma mercenária, que sob apparente santidade occulta muitas vezes alma depravada, e esconde em falsa robustez physi- ca moléstias contagiosas que podem passar despercebidas ao medico mais experimentado?! Feliz o filho que tem sua mãi por credora immediata de todos os seus benefícios, e delia recebe o sangue, o leite e os cuidados. Feliz a mãi que pôde communicar ao filho as condi- ções de saúde florescente, as aptidões intellectuaes e moraes. Verificando a influencia incontestável desta circums- tancia, não devemos esquecer que as funeções são inhe- rentes á organização, e que esta influencia só pôde modificar e não gerar, como dizia Gall. Ao lado das almas degradadas, que se recusão ao cumprimento do dever, negando o leite ao filho, ha mulheres (e formão o maior numero), que, a despeito de circumstancias desfavoráveis, querem a todo transe- 84 HYGIENE amamentar esses pequenos entes em que toda a vida dellas' se concentra. E a excitação exagerada do instincto materno a occultar-lhes a inconveniência que do aleitamento nessas condições resultaria para o filho e para si. Já que infelizmente existem, vejamos quaes são os casos em que o medico deve interdizer-lhes o aleita- mento. Muitos autores os exagerão e multiplicão extraor- dinariamente ; mas nós os restringiremos o mais que for possivel, acompanhando nisto a Hufeland, Donné, Fonssagrives e outros. Ha mulheres de constituição robusta e saúde invejá- vel, cuja secreção láctea faz-se em diminuta quantidade. Este facto, que pareceria indicar abstenção de aleita- mento, não se pôde erigir em motivo suíiiciente de tal proceder. Não é raro no fim de algum tempo correr o leite em abundância das mamas e bastar á alimentação da criança. Manda a prudência que, em casos semelhan- tes, as mais não desanimem, e experimentem amamentar o filho. A excitação, por elle produzida diariamente nas mamas, poderá despertar a actividade secretora do órgão, e a funcção, que apenas apontava, realizar- se-ha com toda a regularidade. Quantas vezes não se terá procedido precipitadamente em iguaes circumstancias ? DA PRIMEIRA INFÂNCIA 85 Diz perfeitamente Donné: Si on ne devait accorder Ia faculte de nourrir qu'aux mères douées d'une force et d'une santé aussi robustes que celles que l'on cherche dans les nourrices étrangères, il faudrait á peu près renoncer à voir les femmes du monde allaiter jamais leurs enfants, car il est três rare de rencontrer ces conditions dans les femmes habitant les grandes villes, et surtout parmi celles de quelques classes de Ia societé ; mais il y a tant de compensations à leur inferiorité sous ce rapport, que il est bon de mettre une certaine mesure dans les exigences et de ne pousser Ja sévérité à 1'excès. Em verdade, é freqüente encontrarem-se mulheres de constituição fraca nas quaes a abundância do leite e a sua bôa qualidade tem levado ao fim o aleitamento de seus filhos, que adquirem toda a força e robustez exigi- veis nesta idade. Muitas vezes mulheres nas condições acima citadas modificão profundamente com a amamen- tação o estado de suas forças. Segay (*) cita grande numero de observações em apoio desta opinião, que é a sua também, e diz que em sua clinica observara factos de aleitamento, imprimindo um movimento salutar aos organismos doentes. Pelo que acabamos de dizer, vê-se quanto é exagera- do o procedimento de alguns médicos que prohibem a certas mulheres o exercicio de uma funcção de onde depende-lhes a saúde e a felicidade dos filhos. (*) Segay.—Des moyens de genéraliser 1'allaitement maternel.— Pariz 1878. 86 HYGIENE Para os casos em que o leite materno é insufficiente, poder-se-ha empregar com muita vantagem o aleitamento mixto. Trata-se de uma mulher affectada de moléstias contagiosas ou de perturbações pathologicas, que se aggravarião com a amamentação ? Aqui é dever da mãi resignar-se a deixar o aleita- mento materno e empregar um outro de seus- modos. Hufeland (*) só admitte este procedimento em dous casos : affecções espamódicas e fraqueza do peito. Propõe ao mesmo tempo que as mulheres de cons- tituição débil aleitem os filhos ao menos durante os dous ou três primeiros mezes, época mais perigosa da existência. Segundo Brochard, quasi todas as mulheres, excepto as que soffrem de affecções constitucionaes, podem, sem fadiga, aleitar durante esse lapso de tempo, si seguem um regimen conveniente, e si querem dar de mamar a horas e em intervallos perfeitamente regulados. Mas supponhamos que, além disso, ainda possa dar-se uma contrariedade para a mãi. Corre-lhe abundante, em jorro, o leite, porém é fraco, tem qualidades nutritivas minguadas, em virtude das quaes não pôde preencher o (*) Hufeland.— Conseils aux mères sur 1'éducation physique des enfants.—Pariz. DA PRIMEfRA INFÂNCIA 87 fim a que é destinado. A criança mama e não satisfaz-se, dà continuamente signaes de que o leite ingerido foi insufflciente á sua nutrição, emmagrece, definha, vai caminho da morte ; é preciso prevenil-a. O que fazer? E a pergunta que a mãi dirige a si mesma. Entregar a outra o aleitamento de seu filho ? O aleitamento mixto é o que se apresenta immediata- mente; é o recurso que têm as mais quando, comprehen- dendo o valor do compromisso tomado perante a socieda- de, querem cumpril-o em toda a sua extensão. A mãi deve, pois, quando pôde, nutrir seu filho, E, si motivos imperiosos a desvião desta funcção, onde, como sempre, congraçados ella vê o dever e a felicidade, resta-lhe, ao servir-se de um outro modo de aleitamento, redobrar de vigilância e multiplicar os afagos para com o pequeno ser que o amor gerou em seu fecundo seio. Supponhamos o caso mais feliz. A mulher pôde criar o filho. Que regras deve ella seguir na amamentação ? Era uso entre os antigos dar a mamar ás crianças somente depois do terceiro ou quarto dia, isto é, passada a febre de leite. Em rigor poder-se-hia offerecer-lhes a mama immediatamente depois do parto; mas as dores produzidas por esse acto e os esforços empregados pela mulher deixão-a profundamente abatida, de modo que é 88 HYGIENE conveniente permittir-lhes reparar as forças por um somno de cinco ou seis horas. Caseaux (*) aconselha que durante este tempo se dêm ao recemnascido algumas colhéres de água morna assuca- rada, que, além de suas propriedades fracamente nutriti- vas, desembaraça a boca e a garganta das mucosidades que muitas vezes as obstroem. Repousada, a mulher lhe apresentará a mama, donde então sahirá um liquido amarellado, pouco abundante, o colostrum ("), que,. lubrificando as paredes intestinaes e solicitando-lhes contracções, facilita-lhes a expulsão do meconium. A sucção exercida pelo recemnascido augmenta a lactação, previne o entumescimento exagerado dos seios e as dores que este acarreta, e torna muito fraca a febre de leite. Ha, pois, boas razões para fazer aleitar o recemnascido logo ao despertar do somno materno. Nos primeiros dias que seguem ao parto, é preciso dar-lhe repetidas vezes o seio. Convém entretanto começar a habitual-o á regularidade nas refeições, o que se consegue offerecendo-lhe desde logo o seio de duas em duas horas mais ou menos. (*) Cazeaux.—Traité théorique et pratique de Vart des accouche- ments.—Pariz 1879. (**) Quando, apezar do colostrum, a evacuação do meconium não se faz, empregão-se geralmente outros meios, dos quaes os mais usados são : o óleo de amêndoas misturado com um pouco de óleo de ricino, e principalmente o xarope de chicorea composto. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 8i> Ordinariamente as mais traduzem cada grito da criança por um appello ao leite, e pressurosas correm a satisfazer-lhe a supposta necessidade. É preciso que ellas saibão que nem sempre estes gritos exprimem fome, mas apenas uma necessidade, como outra qualquer, de agitar-se. A irregularidade no aleitamento produz pequenas indigestões, que devem ser evitadas. As crianças ingerem uma porção de leite, quando ainda a outra não está digerida. A medida que a idade adianta-se, o aleitamento deve tornar-se menos freqüente. Para o fim do primeiro mez, o mamar será dado todas as três horas, e se afastarão cada vez mais os intervallos que separão duas secções de amamentação. Esta regra deve principalmente ser observada á noite, durante a qual será conveniente amamentar somente três vezes no principio e diminuir até uma com os progressos da idade. Aconselhão alguns autores que, para não perturbar o somno ás mais, aleitando o filho à noite, seja este entregue aos cuidados de outra mulher, que o aleitara servindo-se de uma mamadeira. E na verdade muito precioso o somno ás mais, que têm necessidade de reparar as forças no repouso que este acto lhes dá, mas não podemos concordar com esse parecer, não só porque o infante deve estar sempre sob a vigilância materna, como também T. 6—82 12 90 HYGIENE porque achamos sufficientes as horas de sommo que ella tem, sendo, como dissemos, regrada a amamentação. Não se pense que as crianças soffrem com o regimen acima estabelecido. É uma questão de habito; e, si a elle forem submettidas desde o começo da vida, facilmente o adquirirão, sem que isso lhes traga inconvenientes. Segundo a opinião de alguns médicos, é prudente, mesmo quando a mulher tem bastante leite, dal-o ao filho uma ou outra vez, em mamadeira, Assim não estranhará elle este instrumento, quando, em virtude de qualquer accidente, for interrompido o aleitamento materno. Quanto á maneira pela qual o seio deve ser apre- sentado á criança, assumpto que tem occupado alguns autores, entendemos que é cousa instinctiva na qual as mais darão lições ao melhor dos médicos. A mulher que cria deve regrar a sua vida em vista da criança, pois que a saúde desta depende em grande parte daquella. E preciso que tenha uma vida tranquilla, boas digestões, um somno longo e reparador, condições naturaes de um bom leite. Em que idade podem-se addicionar outros alimentos ao aleitamento ? É uma questão diversamente resolvida pelos autores. Não é possivel adoptar uma regra de conducta. Acredi- tamos que isto está subordinado á qualidade do leite e á DA PRIMEIRA INFÂNCIA 91 saúde da mulher e da criança. Si a mãi sentir-se fatigada, apezar da robustez do filho, convém ajuntar alguns ali- mentos á nutrição deste. O procedimento é o mesmo para os casos em que o leite perde as qualidades nutritivas. Muitos autores querem que, a despeito da bôa saúde da mulher e da criança, se comece a juntar outros alimentos ao leite ao sexto mez, com o fim de preparar o tubo digestivo ás modificações de regimen, introduzidas pelo desmamar. Parece-nos melhor esperar pelo oitavo ou nono mez, porque nesta época, como diz Fonssagrives, a dentição está começada e não se complica, por uma mudança de regimen, o trabalho da evolução que faz-se do lado do apparelho digestivo, e que concorda harmonicamente com o trabalho dentário. Este, e não uma data arbitraria, deve servir-nos de guia e critério para julgar da conveniência do regimen mixto. Vejamos quaes são os alimentos mais convenientes. Trata-se de passar da alimentação exclusivamente liquida á solida. Porém comprehende-se que o tubo digestivo da criança ainda não está preparado para receber alimentos sólidos, que serião causas de perturba- ções digestivas. Surge então a necessidade de um regimen transitório, que, não sendo inteiramente constituido por qualquer destes extremos, se approxime de ambos. Só a fôrma pastosa das substancias alimenticias preenche este fim; são as papas e as sopas, de miolo de pão, de 92 HYGIENE araruta, de sagú, da farinha de Nestlé, servindo-lhes de vehiculo o leite. Mas convém dar o novo alimento uma só vez por dia ao principio; depois augmentar-se-ha o numero de vezes, â proporção que approximar-se o desmamar. Tratemos agora de algumas complicações que, sobre- vindo no curso do aleitamento, podem determinar a necessidade de suspendel-o. A menstruação, que habitualmente desapparece durante o aleitamento, restabelece-se ás vezes, o que quasi sempre é desvantajoso pelo enfraquecimento que d'ahi provém para a lactação. E não só isso; o estado de erethismo nervoso commum nesta época ás mulheres influe sobre a saúde da criança em virtude da solidarie- dade que existe entre ambos. Os factos provão que as crianças neste periodo empallidecem, gritão, mostrão-se inquietas e padecem perturbações digestivas. E claro que em taes condições o aleitamento seria um perigo, que, por conseqüência, indica a sua sus- pensão. A moralidade dos homens é infelizmente um pouco rara. A prenhez sobrevem ás vezes durante a amamen- tação. Pôde a criança nos primeiros mezes nada soffrer; porém a observação demonstra que o leite diminue sob a influencia da gestação, e isto explica-se facilmente pela distribuição que então se dá das forças da mãi. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 93 Soffre a criança, porque o seio offerece-lhe menos leite; padece o feto, porque a placenta fornece-lhe sangue mais pobre. E, pois, imprudente continuar a amamentação, visto como, não só prejudicaria ao feto e á criança, mas também esgotaria a mulher que tem de prover as neces- sidades nutritivas de dous organismos. Além das condições physiologicas, perturbações mór- bidas podem provocar a suspensão da amamentação. Ellas são locaes ou geraes. Entre as primeiras, as mais communs são: as fendas do mamelão e os abcessos do seio. Conseqüências da irritação que produz no mamelão a sucção exercida pela criança, de moléstia de sua boca, como a stomatite aphtosa, ou de outra qualquer causa, as fendas do mamelão, principalmente nas mulheres nervosas, determinão dores atrozes, si ellas continuão a amamentar; declina-se-lhes rapidamente a nutrição, tor- não-se febricitantes, o leite altera-se, e em breve perdem a aptidão a nutrir. Si as fendas do seio apparecem de um só lado, o remédio é amamentar com o outro seio; si, porém, este é affectado também, a mulher deve abandonar ■ o aleitamento. Alguns medicamentos têm sido propostos para a cura das fendas mamelonares, e ás vezes têm dado bom resultado : são as loções adstringentes, a tintura de benjoin, a cauterização com o nitrato de prata, etc, 94 HYGIENE juntando-se-lhes ainda os bicos de seio (*), para evitar o contacto directo dos lábios da criança e do mamelão doente. Os abcessos, assestados em ambas as mamas e próximos á areola, podem determinar a interrupção do aleitamento. As moléstias geraes servem-lhe também de embaraço. Algumas são contagiosas, como o sarampão, a varíola, a escarlatina; outras não o são, porém modificão profunda- mente a qualidade do leite, quando durão longo tempo. Devemos tratar aqui da presença na secreção láctea de certas substancias ingeridas pela mulher que aleita. A ninguém é licito contestar factos que estão per- feitamente provados. O alho passa no leite e communica- lhe o seu cheiro acre, especial. O arsênico, o mercúrio, a essência de copahiba, o ópio, a essência de therebentina e outros, têm sido encontrados no leite. O óleo de ricino, o sene e o rhuibarbo, tomados pela mãi, purgão o filho. Destas investigações podemos tirar uma conclusão pratica: — que a criança pode ser influenciada pelo ópio, pelos purgativos e as essências; que, por conseguinte, os effeitos somnifero, evacuante, estimulante e ante-spasmodico, podem ser assim provocados indirecta- mente nella, si^fôr necessário ; e que, quando se administra a uma ama medicamentos destes grupos, é preciso fazer entrar em linha de conta a sua repercussão possivel na saúde da criança. (**) (*) Instrumento de madeira e cautchouc, com a fôrma do mamelão. (**) Fonssagrives, Leçons d'Hygiène infantile.—Pariz 1882. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 95 Além das substancias acima citadas, ha muitas outras no mesmo caso, e algumas constituindo verdadei- ros venenos, como o álcool e o chumbo. A eclampsia nas crianças que mamão tem como causa, muitas vezes, libações alcoólicas das amas. Supponhamos agora que, por qualquer das condições acima apontadas, a mãi não pôde nutrir.—O que fazer ? Já dissemos que o único alimento que convém, pelo menos nos primeiros mezes, é o leite. Devemos pois procural-o em outra fonte. Os autores apresentão para substituir o aleitamento materno, o aleitamento mercená- rio, o aleitamento artificial, e o aleitamento por um animal. Reina o maior accordo entre todos os autores quando tratão de aconselhar o aleitamento mais conveniente. Não ha um só que não attribua ao leite materno qualida- des que nenhum outro tem. Todos o proclamão o mais útil e o melhor. Entretanto, os mesmos que assim pensão recommen- dão que se procure uma outra mulher para preencher a falta de leite materno. Não resta duvida que o leite de uma mulher é o melhor substituto do leite de outra. Mas, quando se nos depara uma mãi que, em virtude de certas circumstancias, não pôde aleitar o filho, devemos lem- brar-lhe o entregal-o a outra, devemos aconselhal-a a que, aproveitando-se da pobreza desta, excite-a a roubar um 96 HYGIENE leite que pertence ao ente que se lhe gerou no seio, condemnando-o quasi sempre á morte certa ? Parece-nos que ha contradicção nos conselhos dos hygienistas. De facto, recommendar ao rico que é dever aleitar o filho, excitar o pobre a que abandone o seu... é contra- dictorio e cruel. É o forte a esmagar o fraco, quando devera prote- gel-o. As prescripções da hygiene, isto é, da moral, não se modificão segundo as classes da sociedade, senão augmentando os deveres daquelles que estão mais alta- mente collocados. Não somos, pois, partidários do aleitamento merce- nário. Ao contrario, o repellimos como um meio anar- chico e prejudicial. E tanto mais, quanto vemos no aleitamento artificial bem cuidado um expediente feliz a tomar nos casos em que os hygienistas aconselhão o aleitamento mercenário. Vejamos si é poderoso o argu- mento que apresentão em justificação do seu pro- ceder. Fundão-se elles na grande mortalidade das crianças aleitadas em mamadeiras, e offerecem-nos uma serie immensa de estatísticas em que, na verdade, quasi todas as crianças assim alimentadas são crianças mortas. Fora de peso este argumento, si as estatisticas tives- sem o valor que lhes attribuem os hygienistas; mas DA PRIMEIRA INFÂNCIA 97 conhecemos as condições em que infelizmente são feitas, e não podemos por isso prestar-lhes fé. Eis como se exprime Fonssagrives, appellando para ellas Les cliilTres, nous le dirons tout à 1'heure, ne font pas complétement défaut sur ce point; mais ils ne remplissent pas encore cette condition des grands nombres sans laquelle ils n'ont qivune signification indécise ; de plus, ils nernbrassent aussi que des enfants admis dans les hôpitaux, et par suite, offrantdes conditions originelles qui peuvent peser sur les resultats de ce mode d'alimentation. (*) É preciso notar que o autor citado é um dos que gritão contra a mamadeira. Procedendo com discernimento nestas questões, póde-se vêr que nãoé a mamadeira a causa da mortalidade a que se referem os autores, e antes a falta de cuidado no seu emprego. O autor acima citado ("*), fallando desse instrumento, pronuncia-se do seguinte modo : Et sil s'entend tous les jours accoler Pèpitliète de meurtrier, c"est parce qu'on 1'emploie sans mesure, sans opportunité, sansdiscernement, et surtout snns 1'intelligence des soins que il reclame. Não temos necessidade de continuar em citações, para provar a falta de valor das proposições avançadas O Fonssugrives — Entretiens fumiliers sur l'hygiène.—?anz 1870. (+*l Fonssagrives.— Leçons de hygiene infantile—Fariz 1N82. T. 6. —82 13 98 HYGIENE contra o aleitamento artificial. Si elle é mal feito, mata como mata qualquer outro em idênticas circumstancias. Conhecemos diversas crianças que devem a robustez e a saúde a este modo de aleitamento. Como, pois, accusal-o de assassino ? Quando a mãi não pôde absolutamente aleitar o filho, deve rocorrer á mamadeira. Vejamos qual é o leite que mais convém á nutrição da criança. Como o autor acima citado, dividimos as differentes espécies de leite em três categorias : Ia, os gordos (leite de vacca, de cabra, etc), caracterizados por sua riqueza em manteiga, que pôde chegar algumas vezes, para o leite de cabra, a 75 grammas por litro, e por uma riqueza média em caseum e em assucar; 2a, os leites caseosos (de cabra e de ovelha), caracte- rizados pela abundância do principio coagulavel; 3a, os leites magros e assucarados (de mulher, de jumenta,etc), que contêm uma grande porção de lactose, pouca manteiga, muita albumina e uma porção muito considerável de sáes. É claro, pois, que se deve escolher, para substituir o leite da mulher, o de um animal collocado na mesma serie. O leite da jumenta seria o melhor, porém a difliculdade de encontral-o o põe fora da escolha. O leite DA PRIMEIRA INFÂNCIA 99 de vacca ou de cabra, por mais fácil acquisição, é o geralmente empregado. (') Mas, em virtude de sua riqueza, em manteiga e caseina, é preciso que se lhe junte água para leval-o às condições do leite da mulher. Nas primeiras semanas deve-se juntar uma parte d'agua para uma e meia de leite. Esta proporção irá diminuindo com os progressos da idade, até que a criança possa tomar o leite puro. O leite deve ser dado em uma temperatura que se appro- xime da sua:—38° mais ou menos. E de rigor que seja lavada a mamadeira todos as vezes que tiver de servir.— Com esta pratica evitar-se- hão os eíFeitos do leite fermentado que se reúne no bico da mamadeira. A marcha do aleitamento é a mesma que descrevemos para o aleitamento materno, porém pôde continuar exclusivo até passada a primeira dentição. Tomadas todas estas precauções, acreditamos que o aleitamento artificial dará os melhores resultados. O aleitamento por um animal, usado antigamente, é hoje esquecido. O aleitamento mixto, de que já falíamos, emprega-se nos casos em que a mulher não pôde por si só ama- mentar. (*) Conhecemos duas robustas crianças criadas exclusivamente pelo leite condensado. 100 HYGIENE Quando se deve dar principio ao desmamar '! Não se pôde fixar o limite da amamentação. Seguimos a maioria dos autores, subordinando-o ás condições da saúde materna e do filho, e ao estado da dentição. Si o aleitamento torna-se pouco fructuoso para a criança e perigoso para a mãi, convém, suspendel-o e servir-se do aleitamento artificial; simples, si a criança tem menos de seis mezes, ou juntando-lhe alguns alimen- tos, si já passou desta idade. Mas o que nos pôde servir de critério para julgar da opportunidade do desmamar é o estado de dentição, como o queria Trousseau. Sabe-se que esta operação começa ordinariamente entre cinco e oito mezes, e que os dentes sahem por grupos entre os quaes ha um periodo de repouso. Assim, o primeiro grupo é constituido pelos incisivos medianos inferiores; o segundo pelos superiores; o terceiro pelos incisivos lateraes superiores e os incisivos lateraes inferiores. A criança tem então oito dentes, e o trabalho da dentição soffre uma parada, que pôde ser aproveitada para o desmamar. Vêm depois os primeiros pequenos molares. Entre este grupo e o seguinte ha um repouso de três mezes. Trousseau esperava que sahissem os caninos para desmamar a criança. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 101 Infelizmente estes dentes apparecem muito tarde, quando a criança tem vinte mezes, e nesta época é rara a mulher que pôde, sem soffrer, amamentar. Fonssagrives diz que não é o intervallo que separa o apparecimento do quarto canino do primeiro grande molar que é preciso escolher; mas, tanto quanto possivel, o que separa o ultimo pequeno molar e o canino. O numero impar de dentes é para Trousseau motivo para differir o desmamar, que iria coincidir com um periodo activo de evolução dentaria. Reflectindo na analogia das perturbações digestivas e cerebraes produzidas pela dentição e pelo desmamar extemporâneo, comprehende-se a utilidade do preceito do illustre clinico do Hotel-Dieu. Nem sempre a evolução da dentição segue a regula- ridade que lhe assignalamos. Não é raro verem-se inci- sivos sahindo ao mesmo tempo que molares e ca- ninos. Nestes casos escolher-se-ha o momento que offerecer menor perigo. Quando o novo regimen provocar accidentes graves, a mãi pôde, pouco tempo depois do desmamar, fazer apparecer a lactação, offerecendo o seio á criança. Gubler, Trousseau, Meyer, Perrin e outros citão casos de volta de leite com abundância ás mulheres que não aleitavão desde mezes. 102 HYGIENE É, pois, uma fontequese deve explorar nas moléstias que complicão a dentição e o desmamar. Dous methodosachão-se em presença, ambos seguidos por autores recommendaveis, para essa operação; o desmamar brusco e o desmamar lento. Donné, que autoriza o primeiro, fundava-se em que, dando duas vezes em vinte quatro horas o seio á criança, o leite extrahido deve estar deteriorado em virtude da estagnação. Inclinamos-nos ao segundo modo, que se funda em uma das leis que regem a animalidade—a lei do habito. A transição gradual que se opera por este methodo, habituando pouco a pouco a criança á modificação em sua alimentação, torna-a mais supportavel. E de Hyppocrates o seguinte trecho: Supportão-se bem os alimentos e as bebidas aos quaes se está habituado, mesmo quando a sua qualidade não è naturalmente bôa, e supportão-se mal os alimentos e as bebidas aos quaes não se está habituado, mesmo quando a qualidade não é má. Não é necessário continuarmos em citações para mostrar a conveniência da lentidão na marcha do des- mamar. Já dissemos acima que aos seis ou oito mezes devia-- se começara addicionar ao leite os alimentos de transição com o fim de preparar o apparelho digestivo da criança às substancias sólidas que o novo regimen introduz. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 103 Augmenta-se progressivamente a quantidade dos alimentos addicionaes á proporção que se diminue o leite, e, si a criança ainda mama durante a noite, é preciso fazel-a perder este habito, dando-lhe o seio somente durante o dia. Depois de algumas semanas, um pouco de quassia amara no mamelão è suffíciente para pôr termo ao aleitamento. Durante o desmamar deve-se cercar a criança de todas as precauções, e voltar ao aleitamento, si sobre- vierem diarrhéa e emmagrecimento. E uma das vanta- gens do desmamar lento. Occupemos-nos agora do regimen alimentar desde o fim da primeira dentição aos sete annos. O leite, as papas, e uma vez ao dia os caldos, são os alimentos que convém até dous annos. A carne que algumas familias dão nessa idade é um alimento perigoso. Não só a mastigação incompleta produz no tubo digestivo muito susceptivel da criança freqüentes indi- gestões, que podem conduzir a uma gastro-enterite, como também as propriedades fortemente excitantes da carne accelerão o crescimento, activão a circulação e a predis- põem ás moléstias imflammatorias. Não é só de fraqueza que se morre, o excesso de excitação é também uma causa de morte. 104 HYGIENE Além destes inconvenientes, o uso precoce da carne exerce uma influencia funesta sobre o caracter. Todos os homens, diz Hufeland, todos os animaes unicamente carnívoros são violentos, cruéis, apaixonados; ao contrario, uma nutrição vegetal nos dispõe á doçura e á humanidade. É o que a experiência tem-me mostrado muitas vezes. Certas crianças, ás quaes tinha-se dado carne prematura e superabundantemente, tornarão-se, é verdade, homens robustos, mas apaixonados, violentos e brutaes; duvido, por minha parte, que taes disposições as tenhão tornado capazes de fazerem a felicidade própria ou a dos outros. Ha casos, porém, como diz o mesmo autor, em que a carne presta bons serviços; é assim que, tratando-se de crianças de constituição fraca, é vantajoso o seu empre- go. Então actua como medicamento. Até dous annos, pois, a carne deve ser interdicta. Dahi em diante, ella entrará na alimentação, a principio uma vez por dia, depois duas vezes. O peixe, a carne de gallinha, o pão, os ovos quentes e sempre o leite devem constituir o regimen alimentar da criança. As refeições devem ser feitas a horas certas, para prevenir os desarranjos gastro-intestinaes a que são ex- postas continuamente na alimentação desregrada, e nisso também vai o habitual-as á ordem. De dous annos aos quatro, cinco vezes por dia, e dessa idade aos sete annos, quatro é o numero de refeições DA PRIMEIRA INFAXCIA 105 sufficientes á satisfação das necessidades orgânicas in- fantis muito exigentes. Pode-se dar vinho à criança? Somente nos casos em que a debilidade pede forte excitação. Então é elle um me- dicamento. Nas mesmas condições estão o café, o chá e todos os excitantes, que, habituando o organismo a uma excitação que não pôde despensar depois, estimulão pode- rosamente a expansão dos motores egoistas. Água e leite são as únicas bebidas que convém na primeira infância. Asseio. O asseio é a columna fundamental da saúde, dizia Hufeland. Na verdade, o papel physiologico de que gosa a pelle nas funeções orgânicas mostra-nos de que perigos estaria cercada a vida do individuo, si a água não lhe offerecesse o meio de conservar desobstruídas as pequenas aberturas que atravessão essa membrana. Para este effeito, empregão-se os banhos, que têm também a importante vantagem de fortificar o organismo, dando-lhe maior poder de resistência ás perturbações exteriores. Perfeito accordo existe entre os autores, quando se oecupão da necessidade dos banhos. Em tratando-se, porém, da temperatura que deve ter a água, dividem-se as opiniões. Pondo-as de parte, desde já nos declaramos pela utilidade dos banhos mornos nos primeiros mezes da vida, e pela superioridade incontestável dos banhos frios T. 6—82. n 106 HYGIENE desde o sétimo mez. Hufeland queria que estes últimos fossem começados na sexta semana. Com as condições do nosso clima, parece-nos prematura esta época. Para che- gar ao uso do banho frio, deve-se diminuir progressiva e insensivelmente a temperatura da água. Três precauções convém tomar na administração dos banhos frios: Ia, devem ser rápidos para que se produza uma reacção salutar ; 2a, deve-se attritar todo o corpo da criança, emquanto dura o banho, para facilitar essa reacção ; 3a, o corpo deve ser immediatamente enxuto, para evitar os perigos de um resfriamento. Os banhos serão quotidianos. Um pela manhã, meia hora depois do despertar. Somno. O somno é um dos actos mais importantes da vida do infante, e tanto mais necessário quanto mais approximado está elle de sua origem. Nos primeiros dias a existência distribue-se-lhe entre o dormir e o mamar. Merece todo o respeito este somno permanente que Hufeland chamava, com muita razão, um prolongamento da incubaçâo uterina. E preciso, pois, nunca interrom- pel-o. Convém, porém, começar a regrar este acto aos seis mezes, diminuindo progressivamente o somno diurno, muito menos reparador do que o da noite, de modo que aos três annos não durma durante o dia. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 107 Deitar-se cedo para levantar-se cedo é um preceito que todos os autores formulão. É um máo habito o de certas mais adormecerem os filhos nos joelhos. Náo só tem isto o inconveniente de dar-lhes durante o somno posições viciosas, como é im- possivel fazel-os perder depois um tal habito. O melhor é deital-os no leito, onde esperarão que lhes chegue o somno. A temperatura do aposento in- fantil deve ser escolhida de modo a escapar a todas as variações e á humidade. Vestuário. O fim do vestuário nas crianças, como no adulto, é occultar-lhes a nudez e protegel-as contra a influencia, por vezes prejudicial, dos agentes exteriores. Preenchendo-o, as vestes devem ser feitas de modo a deixar completa liberdade aos movimentos. Quanto é raro actualmente encontrarem-se reunidas estas condições! As mais vestem os filhos, parece, mais para chamar a attenção dos que os vêem, do que para garantir-lhes a saúde no meio das modificações da temperatura ex- terior. Na estação fria trazem os pequenos com os peitos e as pernas nuas, na calmosa sobrecarregão-os de seda e lã. Vaidade e ignorância. Já dissemos como cumpria vestir o recemnascido. Essas vestes devem ser conservadas até os quatro 108 HYGIENE mezes, idade em que convém alliviara criança da flanella e da touca de meia, substituindo a ultima por uma de linho, emquanto os cabellos não bastarem á protecçao da cabeça. Os pannos que a envolvem tornar-se-hão progressi- vamente mais leves e sempre amplos. Isto e a subordinação da natureza dos pannos á temperatura exterior constituem as regras que devem dirigir o vestuário do infante. Vaccinação.— Foi grande o progresso realizado na me- dicina pela descoberta de Jenner. Em vez de solicitar da therapeutica meios para o tratamento da varíola, o me- dico sente-se feliz ao poder pela vaccina preservar os semelhantes dos perigos a que os expõe essa moléstia. Entre uma affecção caracterizada por symptomas aterradores, que podem determinar a morte, e uma sim- ples indisposição passageira, quem hesitará na escolha? A experiência, a mostrar-nos que a varíola tem parti- cular predilecção pelas primeiras idades, indica a urgência da vaccinação. Mas esta não deve ser praticada, pelo menos, antes de duas semanas. Dentro deste periodo têm-se visto casos de tétano succederem á inoculação do virus. Não reinando epidemia variolica, não ha inconve- niente em esperar pelo terceiro mez para a vaccinação. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 109 Formão os músculos um systema de órgãos que só por si constituem quasi dous quintos da massa total da economia no homem adulto bem constituido. Apenas es- boçados na criança, os músculos da vida de relação têm necessidade de exercicio para desenvolver-se. Do cultivo de suas aptidões funccionaes resulta-lhes o aperfeiçoa- mento, cultura esta tanto mais indispensável quanto é lei biológica que a falta de exercicio atrophia o órgão, e pôde acabar por tornal-o inútil. As primeiras contracções automáticas da criança são a manifestação da necessidade do movimento a accen- tuar-se com a marcha da idade. Comprehende-se, porém, a desharmonia do desenvol- vimento das massas musculares, a falta de agilidade e precisão dos movimentos, si não se os regrasse, instituindo a educação kinesiatrica. Da mesma fôrma não se deve desprezar a educação dos sentidos, estas janellas abertas por onde recolhe o cérebro os materiaes das idéas sob que elabora os pen- samentos. Para pensar é preciso ter idéas, para ter idéas, observar, e a observação é por meio dos sentidos que se faz. Se estes instrumentos essenciaes não forem exercitados e aperfeiçoados, é claro que a observação será mal feita, a imagem indistincta ou fugitiva e o pensamento confuso e errôneo. As necessidades materiaes são os excitantes ordinários 110 HYGIENE da actividade humana. Mas na criança, como na hypo- these formulada por Augusto Comte de uma sociedade em que a alimentação solida e liquida fosse tão fácil como a aérea, cessa aquella excitação em virtude dos cuidados com que a cercão os pais, provendo-a do neces- sário. Neste caso a actividade soffre na intensidade, e mesmo na sua natureza, profundas modificações. Comtudo fora impossível concebel-a extincta, porque seria negar à região activa do cérebro a tendência natural do exercicio directo, mesmo suppondo-o vago, sem destino exterior. Em vez, porém, de produzir actos propriamente ditos, a actividade torna-se esthetica, e significa a manifestação das emoções por meio de movimentos, que, como sabemos, são os mesmos, quer tenhão por fim a expressão ou acção. Não existindo a verdadeira acção, a actividade infantil expande-se em jogos, que, constituindo puros meios de exercicio e prazer, tornão-se úteis preparações á exis- tência pratica. Nos jogos bem combinados e escolhidos, com a attracção que os reveste, encontra a criança exercicio para a região activa (o caracter), e os órgãos que lhe estão appensos (músculos) para os sentidos e demais faculdades. A intervenção therapeutica nas moléstias da infância é guiada por certos preceitos que, olvidados, acarretão graves prejuizos. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 111 As variadas moléstias que soem acommetter as crianças são de ordinário a convergência de indisposições insignificantes que, descuradas, incrementão-seetornâo-se aterradoras. Leves indigestões repetidas, vômitos, diar- rhéas descuradas, são o inicio de uma serie de symptomas que terminarão pela morte. A atrophia infantil dos antigos, modernamente denominada athrepsia, é frizante exemplo do que avançámos. Entretanto modificações in- troduzidas opportunamente no regimen offereceriâo forte barreira aos progressos da affecção. Antes de qualquer intervenção therapeutica,as prescripções dieteticas devem ser tentadas contra a evolução dos processos mórbidos infantis. Si, como diz Broussais, entre o phenomeno hygido e o mórbido somente existem differenças de in- tensidade nas leis que os regem, é claro que no regimen principalmente encontra o pratico o meio de debellar a moléstia, levando o organismo ás condições normaes de existência. Mais se encanece na pratica, menos é a dispo- sição de pedir soccorros á pharmacia, como diz o Dr. Archambault: Mais sóbrio se fica de therapeutica propriamente dita, salvos certos casos bem determinados. Deve o medico lembrar-se sempre que todo estado statico ou dynamico tende a persistir espontaneamente sem nenhuma alteração, resistindo ás perturbações 112 HYGIENE exteriores, e, por conseguinte, fica-lhe a acção limitada a collocar o organismo em condições de poder resistir à moléstia, afastando as influencias interiores e exteriores que oppoem obstáculo ao restabelecimento da harmonia destruida. Mas a expectaçào a mais completa, diz o professor West (*), não nos tira o poder de regrar o regimen da criança, a temperatura de seu aposento, a natureza de seus jogos, de proscrever de sua alcova a luz a iva eosruidos fortes; e bastão estas simples precauções para fazer desapparecerem numerosas affecções leves da infância. As medicações especiaes ficão assim reservadas para os casos em que as perturbações orgânicas profundas ameação destruir o organismo. Assim, si nas moléstias da infância tudo se deve temer, tudo também póde-se esperar, pois, graças ao movimento nutritivo e gerador, a desordem funccional que parece trazer a destruição orgânica é completamente vencida por uma crise salvadora. Na the- rapeutica infantil as pequenas doses medicamentosas produzem melhor effeito do que a medicação turbulenta. A susceptibilidade das crianças exige que os medica- mentos sejão-lhe administrados nas doses minimas e da maneira menos desagradável. Peu, três peu, produit de grands effets, diz Hufeland. (**) (*) Cb. West.—l.eçons sur les maladies des enfants.— Trad. pelo Dr. Archambault. (") Hufeland.—Médecinepratique. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 113 No tratamento das crianças não ha pormenores a desprezar, a mais pequena circumstancia tem muitas vezes immenso valor. Todo o pratico deve ser aqui mi- nucioso, e, além de solidamente instruido, extremamente delicado. T. 6—82. 15 III MARCHA DA EDUCAÇÃO MENTAL E MORAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA 8UMMARIO Posição da questão.—Da construcção dos seres.—Lógica dos sentimentos.— Marcha gradual desta construcção e resultados. —Da linguagem»—Educação da in- telligencia e do sentimento.—Conclusão. Com a saúde e a conservação do corpo, a alegria e a pureza d'alma. E a mãi, a quem incumbe o gerar e nutrir, quem deve ainda guiar, isto[é, favorecer nos filhos as ten- dências verdadeiramente humanas e restringir ao mini- mum da energia as solicitações puramente animaes. Debelladas a miséria ea ignorância materna, ninguém melhor do que o sexo affectivo, dissemos já, paciente, vigilante e terno, assegurará a saúde, regulará o coração, e preparará o espirito do que é a carne de sua carne, o sangue de seu sangue. É sem duvida nessa phase dos primeiros sete annos da existência que a organização cerebral se deixará 116 HYGIENE modelar à vontade, que esta massa impressionável reco- lherá avidamente, qual terreno virgem, as sementes das emoções e das idéas. Vivemos em um meio que rege-se por um conjuncto de fórmulas moraes, cuja influencia é crescente na marcha civilisadora que segue a espécie humana. A educação não se faz só pelas pedagogias, mas pelas manifestações da natureza, o maior dos cathecismos, e pelo exemplo, a mais viva das imagens. Em época de debilidade moral, como a que atraves- samos, ha pais que deixão-se embevecer pelas phantasias caprichosas do egoismo infantil, e entregão os filhos á mercê dos desejos. Mas, si são interessantes e graciosas em seu egoismo as crianças, os seus caprichos se vão tornando desagradáveis, odiosos, e com o tempo chega a desillusão: as excrescencias transformão-se em defor- midades. Assim como a educação physica não espera para regular o exercicio muscular que a criança comprehenda as leis do movimento, assim também a educação mental e moral não esperará que a utilidade dos preconceitos a incutir lhe seja demonstrada. A criança que ainda não falia, a criança de berço, não tem então sentimento da sua personalidade, não a nota, não a distingue. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 117 Pela dilatação habitual, progressiva, dos sentidos infantis, as imagens se vão depondo nos gânglios cere- braes,de sorteque,dadas imagens actuaes,o órgão da con- templação, já susceptivel de exercicio, entra em funcção, approxima essas diversas imagens, coordena-as em torno de uma preponderante, que é a visual quasi sempre, concebendo-as ligadas entre si de modo constante em um todo. Assim se faz a construcção do ser: um signal para designal-o constitue-lhe o nome. Conforme a profunda observação do grande Broussais: ... a criança é levada a nomear-se pela terceira pessoa dos verbos; ella não diz: eu quero, eu tenho fome, mas João ou Pedro (o nome que se lhe deu) quer isto, tem fome... Esta tendência é importantíssima a nolar, porque prova que o homem se percebe pelos sentidos, como percebe todos os outros corpos da natureza, É certo que muito custa sempre fazer comprehender a criança que eu tem a mesma significação que o nome próprio....Esta difliculdade vem de que a criança fôrma a idéa de si mesma no exterior de seu corpo; ella vê os nomes ligados a cada uma das pessoas que a cercào, mas é as formas destas pessoas que liga estes nomes, não vai mais longe. É, pois, á sua também que ella liga o seu: associão-se estas duas impressões, sua pessoa é para ella Pedro, João, Gaspar, palavras que lhe representão seu corpo, suas fôrmas. (*) É evidente que nesta construcção da personalidade, do eu, as sensações externas achão-se combinadas com (*) Broussais.—Cours de phrenologie—Pa,viz 1836. 118 HYGIENE as internas, transmittidas á região especulativa pela sede cerebral das emoções dos sentimentos. Quanto ás palavras eu, me, não são mais do que pronomes, como diz a grammatica, isto é, palavras postas em logar do nome, para evitar- lhes a repetição freqüente. Ellas indicão que somos capazes de um certo gráo de abstracção, e não que concebemos nossa existência e nossa pessoa como encerrada no vocábulo eu por um facto de preten- dida consciência intima, e sem nenhum documento fornecido pela sensação. (*) Em presença dessas sensações novas e fortes a que se abre o cérebro pela construcção dos seres, a criança suppõe que toda a natureza vive; animados e inanimados, tudo ella anima de impulsos e desejos semelhantes aos seus : com elles conversa, com elles folga, com elles se enco- lerisa. Nada ha de fictício, nem de arbitrário neste feti- chismo infantil, como erradamente suppõe o pseudo posi- tivista Spencer. A criança nesta manifestação intellectual obedece á primeira das leis de philosophia primeira, que é fazer a hypothese mais simples, mais sympathica e mais esthetica, de accordo com o conjuncto dos dados pos- suídos. Este é ainda o estado do selvagem contemporâneo,e foi o primitivo da evolução da espécie, o que quer dizer que (*) Laffite. Cours de morale théorique. Política positiva (Revista). 1873. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 119 esta lei da evolução humana encontra sua comprovação na existência individual. O estado mental infantil,animando seres inanimados, é mais recto que o dos theologos-metaphysicos que consi- derão inertes os corpos em geral. A lógica infantil não comprehende phenomeno algum independente dos corpos, e por isso empresta-lhes sua própria vida: paixão, intelligencia e actividade, o que caracteriza-lhe o fetichismo. A lógica infantil é a do sentimento, é a que governa os selvagens e mesmo os animaes superiores. Esta combinação das idéas segundo a ligação das emoções é que dissipa o torpor inicial da intelligencia e faz surgirem as primeiras hypotheses, únicas capazes de concatenar e dirigir as observações que a criança começa a fazer sem o guia da razão. Só o desdém superficial da metaphysica parecerá des- conhecer o immenso poder deste modo instinctivo de pen- sar que ède todas as idades, predominando então sob o do- mínio apaixonado, como predomina em toda a infância. Deve-se olhar a infância ccmo a introductora espon- tânea da subjectividade que a nossa madureza fará pre- valecer systematicamente pela subordinação do typo pessoal ao typo social, da analyse á synthese, da conser- vação ao aperfeiçoamento. 120 HYGIENE Baldia fora a pretensão de instituir d priori a marcha da educação mental e moral. Só velhos hábitos metaphysicos ou ontologicos ali- mentarião a aspiração de ver em nossos processos lógicos combinações arbitrarias, e subtrahil-os da consideração própria ao evolutivo exercicio cerebral que os manifesta. Nas diversas phases da evolução individual, corres- pondendo ás phases da evolução sociológica, está veri- ficada alonga preparação instituidora dalogica universal. A marcha gradativa desta acquisição sempre seguio, como todo o nosso progresso, o impulso da situação, o império das necessidades. Nenhuma concepção humana escapa á reacção total do apparelho cerebral: é sob o impulso do coração e sustentado pelo caracter que o espirito elabora. For- necendo o coração pelo sentimento a origem e o destino dos pensamentos, é a elle que cabe combinal-os, operando a ligação das emoções impulsivas. Resahe dahi a insti- tuição espontânea do regimen lógico fundamental,— a lógica dos sentimentos.—Sempre mais involuntário que voluntário este regimen lógico, as elaborações intelle- ctuaes, exigindo rapidez e precisão, não poderião só sobre o sentimento escapar ao vago e ao confuso. Dahi a necessidade de uma instituição auxiliar fundada no principio de que—todo sentimento traça uma imagem, e a imagem reproduz o sentimento: nesta connexão toda a DA PRIMEIRA INFÂNCIA 121 efiicacia desta segunda combinação, ou segundo processo lógico que facilitou as inducções ficticias, e preparou as inducções reaes. O espirito, operando a combinação das imagens, creou o modo complementar do raciocinio para mais precisão e rapidez. A elaboração histórica successiva e espontânea destes três meios de pensar é representada pelo fetichismo, que cultivou os sentimentos, pelo polytheismo, que ela- borou as imagens, e o monotheismo, que instituio os signaes. Desta tríplice e espontânea elaboração resultou a constituição systematica da lógica que Augusto Comte definio :—« o concurso normal dos sentimentos, imagens e .signaes, para inspirar-nos concepções que convenhão às nossas necessidades moraes, intellectuaes ou phy- sicas. » Inherentes os elementos da verdadeira lógica á orga- nização cerebral, já nos animaes superiores encontra-se o esboço que a sociabilidade aperfeiçoa. Segundo uma interessantíssima observação de Au- ,gusto Comte, o termo grego lógica applica-se ao raciocínio, e reciprocamente o termo ragionare, italiano, designa .a simples expressão. Na infância o desenvolvimento da linguagem é an- terior ao do raciocinio, e a instrucção começa, como diz T. 6—82. 16 122 HYGIENE Audiffrent, « por simples fórmulas cujo sentido só tarde se comprehende e algumas vezes nunca. » O exercicio da linguagem é o melhor estimulante geral do sentimento. A expressão oral é dos modos de communicação o que, seguido de movimentos mimicos e attitudes conve- nientes, tem maior efíicacia moral. As communicações mutuas da linguagem reagem pro- fundamente sobre as principaes funeções do individuo. E a linguagem que consagra a riqueza espiritual da Hu- manidade, e a transmitte a novos cooperadores. E a mãi que exercerá na vida domestica a funcção transmissora da linguagem humana. A intelligencia infantil desenvolve-se pela obser- vação dos seres, pelo exercicio da contemplação concreta, e é levada espontaneamente a uma synthese fetichica. Os sentimentos, combinando-se com as imagens, serão os materiaes sobre os quaes irá elaborando a mentalidade da primeira infância. Este desenvolvimento espontâneo deve ser cuidado- samente respeitado e aproveitado para o exercicio da veneração, do apego e da bondade. É preciso dar ás crianças hábitos moraes e incutir- lhes de tal modo que passem ao estado de preconceitos. É a imitação, é o exemplo a fonte da educação moral, deste ensino. DA PRIMEIRA INFÂNCIA 123 As mais disciplinarão os filhos de modo a refrear-lhes a cólera, a reter-lhes a impaciência, a moderar-lhes a gulodice. De Maistre dizia que, cedo começando-se a habituar a criança a privar-se voluntariamente de um torrão de assucar, ensinava-se-lhe já o futuro modo de dominar as paixões. A nenhuma acção da criança será indifferente esta educação. Muitas vezes um acto infantil, apezarda pouca importância, traz o cunho ou intenção nociva, e é preciso reconhecel-a sempre para reprimir. Antes mesmo da criança fallar, já pela inspiração dos sentimentos de apego e veneração despertados por hábitos numerosos, o tom e o gesto materno a farão agir consequentemente. A mãi, que o sabe ser, sabe também como a ordem e a prohibição podem ser formuladas com uma doçura que não exclue a firmeza. Quando infelizmente estes meios não bastem, os cor- rectivos corporaes os tornaráõ effectivos, pois que na educação como na sociedade a submissão é condição necessária de êxito. A mãi, guiando-se pelo quadro cerebral e servindo-se dos dous processos convergentes de que já falíamos, pôde tornar decisiva a unidade cerebral do filho, dando-lhe um centro altruista, fim da educação. Para fortificar as tendências boas tem-se a pratica 124 HYGIENE das boas acções e a expansão dos bons sentimentos. O processo da oração, expurgado de todo vestígio theologico, é um processo positivo de cultura moral e adaptado á natureza positiva das existências adoradas. Si «pedir a riqueza ou o poder é pratica absurda e ignóbil, desejar com fervor ser mais terno, mais venerador, ou mesmo mais corajoso, é já realizar em qualquer gráo o melho- ramento desejado », como diz Augusto Comte. O culto é, pois, um meio fácil e geral de aperfeiçoamento. Certas operações materiaes poderão sòt dadas a praticarás crianças, pelo duplo effeito que disto se obterá, fazendo não só reconhecer as diííiculdades de taes actos, como enternecendo o coração, e inspirando o reconhe- cimento e a bondade para com os que a estas operações habitualmente se dedicão. Enfim, neste incisivo verso— agir por affeição e pensar para agir—está resumido todo o destino e toda a arte da educação.