I / (A.«..-'U ; /'"/ j Br, Norberto Pereira da Foiroa (APPROVADA COM DISTINCÇAO) LI.BJHARV SURG£ONGLI€RAL:SC;T!CE Jur>9lS99 RlO DE JANEIRO Papelaria Meiidas, . Jj^grques &SJ • ~Rua do Ouvidor nj l897 mm m^m DISSERTAÇÃO —---------♦—♦-------— CADEIRA de clinica medica PARALYSIAS DAS CORDAS VOCAES PROPOSIÇÕES Tres sobre cada uma das cadeiras da Faculdade 1 THE8E APRESENTADA A l jpM 15 de Outubro de 1896 E SUSTENTADA A 15 DE JANEIRO DE 1897 PELO Ri Ml FILHO LEGITIMO DE êtosá dtfi-eve&io ÍPe>t e assim os aneurismas deste grande tronco implicam como phenomeno primitivo e necessário a compressão do recorrente. Com estes conhecimentos de boa pathologia, voltaremos a um diligente exame plessimetrico e esthetoscospico, e de duas uma.' Ou os signaes for- necidos por este exame são positivos, e a causa da verdadeira dysphonia será o aneurisma, e andaremos em bom caminho ; ou estes signaes falham, ou são duvidosos, e em todo caso teremos sempre sérios ele- mentos para desconfiar de um aneurisma aortico. Muitos exemplos mais poderíamos citar si não fosse nosso receio tornarmo-nos prolixos, e anteciparmos o que será exposto no correr de nosso trabalho. No indivíduo, que, apezar de uma boa phonação, apresenta dificuldade inspiratoria com ruido de estri- dof, examinamos o larynge e olaryngoscopio nos revela falta de abducção das cordas vocaes. Pois bem: não nos limitando a esta simples verificação, si depois de cuidadoso exame do pescoço e do thorax, não encon- tramos causa que nos explique essa paralysia, devemos F.-2 — IO — fazer convergir nossas attenções para o bulbo. Ora, na pathologia bulbar, o tabes dorsalis, (i) é facto de observação, pôde se manifestar symptomaticamente por paralysia laryngéa, muito tempo antes de se delinearem os symptomas clássicos. O clinico consciencioso, por- tanto, deverá sempre, em taes circumstancias pensar na possibilidade do tabes e nesse sentido se orientará quanto ás providencias a tomar. Bastem-nos as linhas que ahi ficam para fazermos sobresahir a importância que na clinica assumem as paralysias das cordas vocaes, e para fazermos ver a necessidade que ha hoje, perante as exigências da clinica, de todo o medico se familiarisar com o manejo do laryngoscopio. Comtudo si o estudo assim encarado das para- lysias laryngeas é de summa importância, os pheno- menos locaes também não devem deixar de merecer nossa séria attenção. Diante das difficuldades da inspiração, diante dos phenomenos asphyxicos determinados pela paralysia dos abductores, urge intervenção immediata, tanto mais importante então sendo o caso quanto a perda de tempo, muitas vezes accarreta a morte do pa- ciente. A aphonia devida á paralysia laryngéa é facto observado numerosas vezes, a rouquidão devida á mesma causa é motivo de graves damnos. (1) Veja-se nosso capitulo "Paralysias laryngeas de origem bulbar, epigraphe "Tabes dorsalis". — II — Pois bem: pôr em relevo a importância dessas graves perturbações é pôr em relevo a importância que merece o estudo dos phenomenos locaes de per si das paralysias laryngeas. Aqui a intervenção local é mais do que perigosa, alli a medicação geral urge, aqui ella deve ser especifica, alli o prognostico é grave. Comprehende-se que sem um diagnostico positivo, claro e preciso, muitas e muitas vezes arriscará o medico seus créditos, quando mais damnosos não sejam os seus erros. Synonimia. —As paralysias das cordas vocaes também são conhecidas na sciencia sob a denominação de paralysias do larynge, porque, em summa, tra- tando-se de paralysias do larynge, temos em vista os movimentos dessas cordas, e sob a denominação de laryngo^legias, que é um hellenismo dos tão communs nas sciencias médicas e que têm a vantagem de sim- plificar as expressões. Preferimos a denominação de paralysias das cordas vocaes, attendendo á sua maior precisão e clareza; comtudo, dadas estas explicações, empre- garemos indistinctamente no correr de nosso trabalho, qualquer dessas denominações. Definição—A paralysia, diz Jaccoud, (i) é uma akinesia completa ou incompleta resultante de uma perturbação na innervação motora. Acceitando de (1) Jaccoud "as paralysias e aata;:ia do movimento, Paris, 1864". -- 12 - — bom grado o modo de ver desse sábio, em relação ao nosso caso particular podemos dizer que: "Para- lysias das cordas vocaes, são estados mórbidos do la- rynge, cara cterisados por ausência ou por diminuição dos movimentos variados, que normalmente executam essas mesmas cordas, estados esses resultantes de uma > perturbação na innervação motora do órgão. — A simples diminuição do movimento dá-se o nome de paresia. — Ora os phenomenos symptomaticos caracte- rísticos das paralysias do larynge, que affectam quer a funeção phonatoria, como sejam a aphonia, a rou- quidão, a voz bitonal, anserina etc, quer a funeção respiratória, como sejam a difficuldade na inspiração. accessos de suffocação, factos de asphyxia etc, não podiam passar despercebidos aos antigos autores. Comtudo as imperfeições ou melhor, a falta de meios de investigação não lhes permittiam o estudo conve- niente : mesmo sobre as laryngopathias a confusão era muito grande ; e as paralysias laryngeas, essas então tinham uma existência problemática. Esboço histórico.—A historia das paralysias das cordas vocaes póde-se dizer, portanto, que é de data muito recente, as nevropathias do larynge sendo como que incógnitas insoluveis até a época da invenção do laryngoscopio. E de facto : até essa data, que foi em 1858, podemos compulsar a litteratura medica sem grandes esclarecimentos para o nosso assumpto. E' verdade que Galeno oecupou-se com parti- cularidade da anatomia e physiologia do larynge, e — 13 — que devemos-lhe a nomenclatura das cartilagens re- spectivas, como a thyroide, as afytenoides (que elle considerava como se fossem uma só cartilagemj, a cricoide etc Também Galeno fez a distincção entre os músculos que abriam e os que fechavam o orificio do larynge, e criou a palavra "glotte'; além disso, elle alludiu aos effeitos observados nos homens e nos animaes causados pela pressão sobre os vagos, e também á necessidade de que a glotte seja constricta para que se forme o som. Rufus de Epheso, que viveu no reinado do im- perador Trajano mencionou em um seu livro a acção dos nervos recurrentes sobre a phonação. Em uma época mais próxima de nós, em 1780, Lalouette, citado por Tissot (1), em seu "tratado das escrophulas, pags. 15, 34, 35" tinha já attribuido a aphonia á presença de glândulas engorgitadas no thorax. • Comtudo, não passava dessas noções sobre ana- tomia e physiologia nervosa, o que até então se co- nhecia sobre nevropathias do larynge, quando a admirável invenção de Czermack e Türck veio criar um novo mundo ás concepções sobre a pathologia nervosa do larynge e rasgar largos horizontes ás laryn- goplegias. Data d'ahi o apparecimento na sciencia das paralysias das cordas vocaes ; e o seu estudo se desenvolveu rapidamente, e se avantajou de modo a (1) Tissot—These Paris, 1887. — 14 — tornar-se seria preoccupação para os que se dedicam aos árduos problemas da clinica. Traube em 1860 publica dous casos de pa- ralysia da corda vocal esquerda, e em 1863 Ger- hardt dá a publicidade um estudo sobre as para- lysias das cordas vocaes. Durante os annos sucessivos appareceram trabalhos variados sobre o mesmo assumpto, não convindo esquecer os nomes de Baümler e Jorge Johnson, que por sua vez assignalou a possibili- dade da apparição de perturbações motoras sobre as duas cordas vocaes consecutivamente a lesão limitada a um só nervo vago. Em 1866 appa- receram os trabalhos de Türck e Morell Macken- zie e em 1879 o de Solis-Cohen que tentou clas- sificar as paralysias laryngeas. Data do mesmo tempo o trabalho de Schech sobre a anatomo-phy- siologia nevro-muscular do larynge. Em 1876 Rie- gel faz apparecer seu importante trabalho sobre as "paralysias respiratórias " importante conquista devida ao laryngoscopio, com o qual demonstrou elle a falta de ajfastamento das mesmas cordas no mo- mento da inspiração. Os trabalhos e pesquizas dos autores já na Al- lemanha, já na França, já na Inglaterra, já na America etc. mais e mais se multiplicam, os estu- dos são mais detalhados e mais conquistas são feitas no campo dos conhecimentos sobre o assumpto. Assim é que em 1880 Rosembach faz entrever uma lei, que mais tarde Semon, o illustre Semon apoiado em largos estudos estabeleceo definitivamente. Eis o enunciado d'esta lei que Massey intitulou " o theo- rema de Semon " : Em caso de lesões dos nervos moto- res do larynge (recurreute, vago ou spinal), ou de seus núcleos bulbares de origem, si a paralysia não é completa logo de principio, ella é primeira- mente e pôde ficar limitada aos músculos abducto- res, emquanto que nas mesmas circumstancias, cila não affecta nunca exchisivamente os abductores." Essa lei foi assumpto para intermináveis e calorosas discussões no seio das sociedades scientificas e con- gressos médicos, onde se digladiaram com ex • traordinario vigor Gowers, Robinson, Cohen Ter- vaert, Wagner, Tissier, o illustre Krause, o próprio Semon, B. Fraenkel Baecker e Rosembach. Essa lei bem como as opiniões predominantes nessas discussões que até hoje ainda não tiveram fim, teremos occasião de apreciar no correr de nosso tra- balho. Não param, porém, ahi as locubrações dos tra- balhadores infatigaveis, e Krause mais feliz do que Ferrier e Duret consegue determinar no cão entre as localisações cerebraes um centro phonatorio para o larynge. Comprehendem-se o interesse com que então se inveredaram as investigações, e as de- ducções e conseqüências que os espíritos pro- curaram tirar d'essas premissas Citemos n'esta phrase de trabalhos os nomes de Semon e Horsley que determinaram esse cen- tro phonatorio em uma espécie mais próxima do — i6 — homem, no macaco, e o vulto de Masini que pu- blicou o resultado de suas experiências um pouco differente do das experiências dos autores inglezes. Garel e Déjérine foram ainda mais adiante e quizeram, com o auxilio da clinica e da anatomia pathologica affirmar a existência d'esse centro não já no macaco, mas no próprio homem (i) — E' natural que as lesões bulbares não pas- sassem desapercebidas, e podemos dizer que a etio- logia das paralysias das cordas vocaes neste par- ticular é de grande riqueza. Foi Duchene de Boulo- gne quem em 1860 imprimio á pathologia bulbar do larynge poderoso impulso, descrevendo magis- tralmente pela primeira vez a paralysia labio- glosso laryngea. Schnitzler foi quem primeiro fez um exame laryngoscopico confirmativo em um caso de ataxia locomotora progressiva. Vêem depois os trabalhos de Rosenthal, Charcôt, Krishaber, Cher- chewski etc. Já estamos prolixos nesta breve bibliogra- phia antes que histórico que fazemos da questão, e longe iriamos se quizessemos nos livrar da pe- cha de incompletos. Não podemos comtudo deixar de citar ainda os nomes de Massei, Masucci, Felici etc. na Itá- lia ; de Cartaz, Collet, Moure, Ruault, Luc, Tis- (1) Veja-se o nosso capitulo "Paralysias laryngeas de origem ce- rebral" . — 17 — sier etc. na França; de Lori, Leube, Neuman, Gottstein etc. na Allemanha, e principalmente na America do Norte nomes como o de Hooper, Donaldson, Brysson-Delavan, Lefferts etc N'este ultimo paiz os estudos sobre as laryngopathias teem chegado ao apogêo das discussões. v.—3 CAPITULO II Anatomia e physiologia dos músculos e nervos do larynge O larynge possue duas ordens de movimentos em relação com o duplo emprego physiologico, ao qual o órgão se deve alternativamente prestar : uns, movimentos respiratórios, teem por fim manter a glotte aberta, por tanto tempo quanto dura a res- piração silenciosa ; outros, movimentos vocaes, juxta- põem e tendem as cordas, desde que o apparelho entra em jogo como instrumento de phonação. Era natural que attentas estas duas sortes de movimentos os autores pensassem que elles se execu- tavam isoladamente em dous apparelhos musculares distinctos, e que no larynge deveriam existir duas se- ries de músculos, uma preposta á respiração, outra encarregada da funeção vocal. Esta ultima serie ainda se subdividia em dous grupos. Nunca uma destas series invadiria as attri- buições das outras. E assim foi. 57 -- 20 -- Os músculos do larynge foram logo divididos em: a) abductores das cordas vocaes, e a esta categoria eram filiados os músculos crico-arytenoideos pos- teriores. b) abductores das cordas vocaes, que represen- tavam forças antagonistas aos primeiros e se com- punham dos crico-arytenoidêos lateraes e ary-aryte- noidêos ; c) e tensores das cordas vocaes, dos quaes faziam parte os crico-thyrodêos e os thyro-arytenoidêos. Outras denominações foram ainda dadas a esses músculos. O professor Béclard chama respiratórios os da primeira categoria, phonadores os da segunda e phonadores por excellencia os da terceira. Moure (i) propoz chamal-os systolicos, diastolicos e apstolicos. A denominação geralmente empregada é a que en- nunciámos. * Digamos algumas palavras, acompanhando os autores, (2) sobre a anatomia e physiologia de cada um destes músculos em particular. Crico-arytenoidêos posteriores—Situados na parte posterior da cartilagem cricoide, esses músculos se in- serem em baixo em uma fosseta da parte posterior (1) Em um trabalho apresentado á Sociedade Franceza de Otologia, laryngologia etc, em 1877. (2) Sappey "Tratado de anatomia desciiptiva", temo 4", 1889. -- 21 -- dessa mesma cartilagem; espessos, achatados e trian- gulares, suas fibras se dirigem para diante e para cima e vão se inserir na apophyse muscular ou postero-ex- terna da cartilagem arytenoide. Contrahindo-se, esses músculos imprimem ás cartilagens arytenoides um movimento de rotação em virtude do qual sua apo- physe anterior se dirige para fora, de tal sorte que a corda vocal de um lado se affasta da do lado op- posto ; elles são pois dilatores da glotte. Crico-arytenoidêos lateraes—Esses músculos estão situados nas partes lateraes do larynge, acima da cartilagem cricoide, adiante da arytenoide, no angulo que formam em seu encontro essas duas cartilagens. Seu volume é metade do dos precedentes. Achatados e triangulares elles se inserem por suas extremidades anteriores nas bordas superiores da cartilagem cricoide, e nas bordas lateraes dos liga- mentos crico-thyroidêos médios; d'ahi suas fibras se dirigem obliquamente para cima e para trás e vão se inserir no tuberculo da apophyse muscular da ary- tenoide, adiante das inserções dos crico-arytenoidêos posteriores. Contraindo-se, estes músculos levam para diante as cartilagens arytenoides e lhes im- primem ao mesmo tempo um movimento de rotação, em virtude do qual as apophyses anteriores das duas cartilagens se aproximam uma da outra, e portanto as cordas vocaes respectivas; são, portanto, músculos construtores da, glotte. Thyro-arytenoidêos—situados acima dos prece- dentes, na espessura das coirfas vocaes, são quadri- -- 22 -- lateros, muito delgados superiormente e muito espessos inferiormente. Por sua parte anterior inserem-se esses músculos na metade inferior do angulo da cartilagem thyroide e posteriormente na apophyse vocal e partes adjacentes da arytenoide. A acção destes músculos pouco differe da dos precedentes, sendo porém mais enérgica. E'portanto também um constrictor da glotte (i). Ary-arytenoidêo.—Impar e symetrico este mús- culo está situado atráz das arytenoides, em uma de- pressão dessas cartilagens; compõe-se de fibras oblíquas superficiaes que se entrecruzam de um lado para outro na linha mediana, e da fibras transversas profundas que de uma cartilagem se dirigem para outra. Al- gumas das fibras oblíquas, as mais superficiaes, se prolongam até a espessura das pregas aryteno-epi- glotticas. Contrahindo-se, este músculo aproxima as cartilagens arytenoides uma da outra e por suas fibras que se dirigem ás pregas aryteno-epiglot- ticas elle concorre para estreitar o orificio superior do larynge. Sua acção principal é portanto também constrictora da glotte. Crico-thyroidêos.—Estes músculos estão situados adiante do larynge; espessos e quadriláteros, suas fibras inserem-se imferiormente na borda anterior e superior da cricoide ; dahi suas fibras se dirigem para (1) O thyro-arvtenoidêo interno qne se acha na espessura da corda vocal, se contrahindo tende as cordas vocaes, além de tnr acção já descripta acima. — 23 — cima, as da linha mediana perpendicularmente, as lateraes obliquamente para fora; e vão se inserir na borda inferior e parte posterior da mesma da car- tilagem thyroide, bem como na parte anterior e vértice da pequena ponta da mesma cartilagem. Muito se tem discutido sobre a acção destes músculos, parecendo hoje fora de duvida, depois dos trabalhos de Schech,que estes músculos se contrahindo, levantam a parte anterior da cricoide aproximando-a da thyroide, e portanto fazem abaixar a parte pos- terior da mesma cricoide e com esta as arytenoides, que então se dirigem para baixo e para traz. Deste facto resulta um allongamento das cordas vocaes pelo distanciamento de suas duas inserções antero-poste- riores e conseqüente tensão das mesmas. São por- tanto estes músculos tensores das cordas vocaes. Além desses músculos (i) rapidamente descriptos ha ainda um músculo intrínseco do larynge o aryteno- epiglottico, com que pouco ou nada temos que ver em nossas descripções. A classificação em grupos que os autores esta- beleceram para os músculos que estudamos, e que acabamos de expor, tem a enorme vantagem de sim- plificar as descripções e é de incomparavel methodo di.iactico. Comtudo se fizermos um estudo detalhado da (1) E' inútil aqui dizer que tratando em nosso trabalho dos mnsculos do larynge, sempre nos referimos aos intrínsecos. — 24 — mecânica muscular do larynge, havemos de nos convencer de que não ha no larynge dous grupos mus- culares antagonistas de que um se nullificaria desde que outro entrasse em acção. A mor parte dos mús- culos laryngêos são músculos de dous usos que se acommodam alternativamente a cada uma das duas funcções, e tornam-se alternativamente vocaes^e re- spiratórios, segundo as combinações mecânicas em que elles estiverem e a maneira muito variável por que associam os seus esforços. Assim, o crico-aryte- 7ioidêo posterior, que desempenha, quando age só, um papel eminentemente respiratório (dilatação da glotte), se transforma em músculo vocal, quando as- socia sua contracção ás dos músculos tensores (contra- extensão das cordas e retrofixação das arytenoides, Jelenfy). Do mesmo modo, os thyro-arytenoidêos, músculos vocaes por excellencia, agem verdadeira- mente durante a phase respiratória para garantir a rigidez da glotte e prevenir o reviramento de suas bordas sob a impulsão da corrente aérea. Nesta acção de conjuncto da musculatura la- ryngea para a execução de qualquer acto, nesta synergia funccional, não podemos deixar de reconhecer comtudo a acção pi'edomina7ite deste ou daquelle músculo, nesta ou naquella combinação. Nós por- tanto, fazendo as reservas que acabamos de expor, continuaremos a adoptar o modo pratico e por assim dizer clássico de agrupar as forças musculares do larynge, que acima expuzemos, e de conformidade com esse modo de ver faremos nossos estudos. — 25 — INXERVAÇAO DO LARYNGE Rezam os tratadistas : os músculos do laryno-e são innervados pelos laiyngêos superiores e pelos in- feriores ou recurrentes. Ambos ramos do pneumo- gastrico, o laryngêo superior anima os músculos crico- thyroidcos, todos os demais músculos sendo innervados pelos recurrentes ou laryngêos inferiores. E de facto, assim parece ser; mas em todos os tempos se tem estabelecido a mais viva controvérsia a respeito da distribuição dos filetes desses nervos aos diversos músculos. Em primeiro logar notemos que esses dous nervos que poderiam á simples vista parecer exclusivamente provenientes dopneumogastrico, devem grande parte de suas fibras ao spinal ou accessorio de Willis, de modo que em definitiva os dous nervos animadores do larynge são o pneumogastrico e o spinal O laryngêo superior depois de se ter destacado do tronco do pneumogastrico, justamente abaixo do ponto em que este recebe o ramo anastomotico do spinal, desce a principio verticalmente ao lado do pharynge; depois, mudando de direcção, torna-se horizontal, se applica sobre a membrana thyro-hyoidêa, atravessa-a em sua parte média e penetra na pro- fundeza da membrana mucosa do larynge, na qual se distribuem seus ramos terminaes. Em seu trajecto cervical este nervo se anastomosa com o hypoglosso, com o gânglio cervical superior e com oplexus pharyngco. No ponto em que o laryngêo superior muda de direcção, elle emitte um ramo F.—4 — 26 — delgado, chamado nervo laryngêo externo; este se dirige para baixo abandonando em caminho um filete ao constrictor inferior do phatynge e depois se inclina para o crico-thyro\dêo, ao qual fornece muitos filetes motores. Chegando á borda inferior da cartilagem thyroide o laryngêo externo se anastomosa com o laryngêo inferior, e se perde emfim na mucosa. Os nervos laryngêos inferiores ou recurrentes são assim chamados por causa da curva que elles des- crevem, o esquerdo abraçando a crossa da aorta em sua concavidade, e o direito a artéria sub-clavia direita- Affectam ahi esses nervos relações importantes com os órgãos do mediastino, como veremos em nossas des- cripções; e dahi recorrendo, isto é, dirigindo-se para cima, vão ter ao larynge, depois de se ter intromettido por sob a borda inferior do constrictor inferior do pharynge. No larynge elles se dividem em muitos filetes que se vão terminar nos músculos ary-aryte- noidêos, crico-arytenoidêos posteriores e lateraes e nos thyro - arytenoidêos. * Alguns autores não têm admittido assim as ter- minações dos laryngêos; e a esse respeito merecem especial attenção os trabalhos do professor Exner, de Vienna. Segundo este autor o crico-thyroidêo não seria exclusivamente animado pelo laryngêo superior. Tendo descoberto no cão e no coelho um filete nervoso ema- — 2/ — nando do ramo pharyngêo do pneumogastrico, ao qual elle deu o nome de laryngêo médio e que nestes animaes partilha com o laryngêo externo a innervação do crico-thyroidêo, este autor pretende que tal filete tam- bém exista na espécie humana e que nella tenha as mesmas funeções. Além disso, o mesmo professor affirma que o laryngêo externo algumas vezes anima a parte externa do thyro-arytenoidêo, que a parte in- terna deste músculo não só é innervada pelos recur- rentes como também pelos laryngêos superiores; ad- mitte ainda que o crico-arytenoidêo lateral deveria sua innervação aos laryngêos superioras e infe- riores, e que o crico-arytenoidêo posterior rece- beria sua innervação por sua face anterior e partes lateraes do laryngêo inferior, ao passo que sua face posterior seria animada pelo laryngêo superior. Em- fim para Exner a innervação fornecida pelo laryngêo superior não se limitaria somente ao crico-thyroidêo, mas se estenderia a quasi todos os músculos intrín- secos do larynge. Com algumas modificações, divergindo em alguns pontos, chegam porém quasi aos mesmos resultados os trabalhos de Onodi, de Buda-Pesth, de Mandles- tamm e vários outros autores. Neste como em muitos outros pontos da anatomo-physiologia do larynge, a luz ainda não se tem feito sufficientemente( e ainda muitos autores pendem a acceitar a descripção pri- mitiva, apoiados em trabalhos como os de Simano- wsky, de S. Petersburgo, que combatem os dos autores citados. Tão delicada questão não seriamos — 28 — nós quem resolvesse, e nos contentamos em assi- gnalar a discussão que ainda hoje perdura sobre o assumpto. Reconhecida a dupla origem dos nervos do la- rynge, i. é, a concurrencia do pneumogastrico e do spinal, era natural que aos physiologistas accudisse a idéa de representarem taes nervos funcções especiaes e differentes. De todos são conhecidas as memoráveis expe- riências de Cláudio Bernard, e as paginas maravilhosas que então escreveu este autor sobre o papel desses nervos. A incitação nervosa que anima os músculos do larynge chega a este, segundo C. Bernard, por dous troncos differentes, mas cada um desses troncos con- servaria distincta a attribuição funccional que lhe é especialmente devolvida: o espinal dá a innervação vocal, i. é, preside aos movimentos que como adiante dissemos, concorrem para a funeção vocal; o pneumo- gastrico dá o infiuxo respiratório, i. é, dilata o orificio glottico, animando os crico-arytenoidêos pos- teriores. E tão concludentes pareciam as experiências de Cláudio Bernard, que por muito tempo pareceu ter-se dito a ultima palavra a esse respeito. Para Schech, porém, os dous modos de innervação do larynge, i. é, a innervação vocal e a respiratória lhe vêm pela mesma via : o spinal anima por si só — 29 — todos os músculos do apparelho laryngêo, e os anima continuamente, seja qual foro sentidodesua actividade. Grabower, por seu lado, pretende demonstrar com experiências, que o papel proeminente da in- nervação do larynge cabe ao pneumogastrico. Não resta duvida que ao spinal cabe um papel essen- cialmente motor, e nesse ponto estão de accôrdo grande numero de autores, como, Horsley, Burchard etc. O papel motor, porém, do pneumogastrico é muito discutido, e sobre este assumpto não é fácil ter uma opinião definitiva. * Seja como for, no estado actual de nossos co- nhecimentos, é preciso admittir que a dupla adaptação funccional do larynge, si até certo ponto não corres- ponde á dissociação parallela de seu apparelho mus- cular, também não obedece á especialisação de seus conductores nervosos. O que differencia a funeção vocal do larynge de sua funeção respiratória, é unicamente a diversidade de sua origem central, é que uma é um acto cerebral, outra um plienomeuo bulbar. Que passe pelo ac- cessorio ou pelo vago, que accione um ou outro grupo muscular, a incitação partida do bulbo pertence á vida orgânica : ella tem o mais das vezes a respiração por fim, e quando por grande excepçao realiza um phenomeno sonoro, este é sempre um grito incon- sciente, cuja significação physiologica é propriamente a de um phenomeno reflexo. — 3° ~ O acto deliberado, que regula com uma precisão positivamente artística, a tensão phonica das cordas e o gráo de occlusão glottica, pertence ao contrario à categoria dos phenomenos conscientes que a vontade ordena, que a intelligencia confronta e dirige, e cujo caracter exclusivamente psychico affirma claramente a proveniencia cortical—Para executar regularmente, e sem que uma perturbe a outra, as duas funcções contradictorias, de que está alternativamente encar- regado, o larynge obedece alternativamente a dous senhores: as ordens que elle recebe do cérebro, e as que lhe envia o bulbo lhe chegam pelas mesmas vias ; mas, segundo que elle obedece á injuncção cerebral ou o bulbo o dirige, elle emprega seus elementos muscu- lares de modo diverso, associando diversamente seus effeitos, e realiza segundo os casos, ora as combinações innumeraveis de adducção e de tensão vocal, que diver- sificam infinitamente os sons laringêos elementares, ora o acto menos complicado da abdução pura e simples que garante de uma maneira permanente a dilatação respiratória da glotte. Isto é que se deve ter em mente si se quer alguma clareza na physiologia nervosa do larynge (Palalo Raugé . Fazendo nossas essas palavras fazemos claro que admittimos a existência de dous centros distinetos para as funcções do larynge. E assim o demonstram as experiências e observações. E' claro que o larynge tomando parte activa na respiração, havendo um synchronismo perfeito dos movimentos de afastamento das cordas com o acto — 3i — inspiratorio, existindo no bulbo núcleos de origem do pneumogastrico e do spinal, razões ha de sobra, para se concluir a priori pela existência na medulla al- longada de um centro motor respiratório do larynge. Semon que é quem mais tem estudado estas questões, aprofundando mais suas pesquizas não só chegou á determinação desse centro, como demonstrou sua in- dependência do centro respiratório dos movimentos thoracicos. Ha para os músculos do larynge, assim como o ha para os esphincteres, um tonus que mantém constantemente em actividade esses músculos, con- servando a glotte constantemente aberta; esse tonus, cuja existência foi posta em toda a evidencia por Semon tem por centro o bulbo e é de natureza reflexa, tendo, segundo o mesmo Semon, ponto de partida na vasta esphera de destribuição do pneumogastrico sobre a arvore respiratória. — Referimo-nos a um centro cerebral de pho- nação, e esta é uma questão nova e das mais inter- essantes que se têm debatido na sciencia. O professor Krause, de Berlim, praticando o exame laryngos- copico em animaes em experiência, e ao mesmo tempo excitando tal e tal ponto da superfície das circumvo- luções cerebraes, chegou por tentativas a ter o primeiro a gloria de determinar um centro phonatorio corticai para o larynge. Os trabalhos de Masini, de Semon e Horsley chegaram não só a confirmar essa descoberta, como a precisar limites e topographia a esse centro. Semon e Horsley experimentando em animaes de espécie muito visinha da nossa, em macacos (os tra- — 32 — balhos de Krause foram feitos em cães;, puderam delimitar um territorio"situado justamente atráz da extremidade inferior do sulco precental, na base da terceira circumvolução frontal, cuja excitação se acompanha de um movimento de adducção das cordas vocaes. Este território apresenta um foco de acção predominante na metade anterior do pé da circum- volução frontal ascendente. Teremos occasião de voltar sobre o assumpto, quando fallarmos das paralysias laryngeas de origem cerebral, e então diremos como a clinica e a anatomia pathologica, com os trabalhos de Garel e Déjérine vieram secundar os esforços da experimentação, (i) (1) Estes estudos de physiologia e anatomia nervosa do larynge acabam de ser enriquecidos por mais uma descoberta recentissima no campo da experimentação. Trata-se da realidade hoje de um centro cerebral de abducção das cordas vocaes, que em princípios deste anno (1896) em inglaterra os Srs. Risien Russell e Spencer delimitaram precisamente. Este novo centro acha-se situado um pouco abaixo e adiante do centro phonatorio (Vide Sèmaine Mèdicale, Maio de 1896.). CAPITULO III A ou Estudando, bem que rapidamente, a physiologia nervosa do larynge, vimos que além das fibras dos ner- vos que animam o órgão, ainda no bulbo havia uma representação para as funcções desse mesmo órgão e que modernamente também o cortex cerebral tinha sua influencia consubstanciada em dous centros. Pois bem a ratione, podemos dizer que tantos são os grupos em que podemos reunir as paralysias, quantos são os que conhecem como epigraphe as tres localisações ha pouco assignaladas. Assim é que de um modo geral podemos dizer que as paralysias das cordas vocaes se classificam em: Paralysias devidas a lesões dos troncos nervosos do laiynge—paralysias periphericas. Paralysias devidas a lesões do cen-\ tro bulbar. I paralysias Paralysias devidas a lesões dos cen-i centraes tros corticaes. F.—4 — 34 — E' natural esta classificação, assente nos conhe- cimentos que dia a dia vamos adquirindo de anatomia pathologica, e que dão séria orientação á classificação mesmo de qualquer outra paralysia. Bem que os pro- gressos da anatomia pathologica muito tenham benefi- ciado o estudo das paralysias das cordas vocaes, com- tudo muitos pontos ainda são obscuros e muitas duvi- das ainda subsistem, o que aliás é explicável, attentas as condições especiaes de difficuldade de observação e experimentação que nos offerece o órgão da voz. Assim é que aos tres grupos acima enumerados não podemos deixar de ajuntar um quarto que vem a ser o das paralysias funccionaes. Estas devidas a causas obscuras e mal conhecidas não reconhecem lesão alguma apreciável nem na innervação nem na musculatura laryngea, e merecem por isso o nome de funccionaes. Em definitiva temos, portanto : I—Paralysias periphericas, que são devidas a lesões localisadas, disseminadas ou systematisadas dos troncos nervosos do larynge. II—paralysias centraes, que são subdivididas em paralysias de origem bulbar e paralysias de origem cortical. III—paralysias funccionaes. Cada um desses grupos ainda pôde soffrer outras tantas subdivisões quantos são os typos (adducção abducção, etc.) que nos offerece ao laryngoscopio a imagem glottica, e conforme é a paralysia uni ou bi- — 35 — lateral. Estas distincções faremos ver melhor no correr de nossas descripções. Para as paralysias periphericas não podemos nos furtar de fazer uma subdivisão preliminar, conforme é lesado um ou outro dos troncos nervosos: laryngêo superior, laryngêo inferior ou* recurrentes, pneumo- gastrico e spinal. Tal qual ahi está nossa classificação, somos os primeiros a reconhecer sua imperfeição e suas lacunas, por isso mesmo que ainda é imperfeito e lacunoso o estudo das próprias paralysias ; comtudo por ella nos Julgamos com mais bases e melhor orientados do que o foramos si adoptassemos qualquer das classificações propostas pelos diversos autores. Umas são dema- siadamente vagas outras são de uma complexidade que tudo obscurece. Riegel em suas 'paralysias respiratórias' divide as paralysias laryngeas em respiratórias, phonatorias e mixtas. O mesmo pouco mais ou menos faz Türck. Ziemssen distingue as paralysias do dominio do laryngêo superior e as paralysias do domínio do la- ryngêo inferior. Solis Cohen já tivera esse mesmo plano de divisão. Gottstein querendo dividir as paralysias sob o ponto de vista clinico, segundo as perturbações func- cionaes, estabelece : a) Paralysia dos tenso res; b) Paralysia dos obturadores da glotte; _ 36 - c) Paralysia dos dilatadorcs da glotte; d) Paralysia de todos os músculos innervados pelo recurrente; Lefferts, ha alguns annos, apresentou á sociedade americana de Laryngologia a seguinte classificação : a) Paralysias motoras do larynge devidas a le- sões agudas e completas dos centros nervosos prin- cipaes ou dos troncos nervosos, lesões que podem ser uni ou bi-lateraes, e que dão ás cordas vocaes a po- sição cadaverica; b) Paralysias motoras devidas a lesões incompletas e progressivas dos centros nervosos ou, mais ordi- nariamente, dos principaes troncos nervosos : a lesão não attinge nesse caso senão um numero restricto de núcleos ou fibras nervosas, a paralysia se limita a certos músculos e em particular na espécie aos dilata- dorcs da glotte; c) Paralysias motoras limitadas a músculos isola- dos, devidas a certas lesões nervosas periphericas ; d) Paralysias motoras limitadas a um músculo ou grupo de músculos e devidas a myosite com degene- rescencia do tecido; e) Paralysias motoras de ordem puramente func- cional. Esta fôrma se liga sempre aos adductores. Si bem que complexa, esta ultima classificação parece-nos mais scientifica e clinica que as prece- dentes; nos mesmos casos está a de Morell Mackenzie bem que seja imperfeita. — 37 — Morell Mackenzie classifica : a) Paralysias por lesão da medulla allon^ada ao nivel do assoalho do 40 ventriculo; b) P. por lesão do spinal; c) P. por lesão do pneumogastrico; d) P. por lesão do laryngêo superior; e) P. por lesão do recurrente; f) P. de músculos isolados; Emfim Poyet em sua these inaugural (Paris, 1879) distingue paralysias de causas geraes, locaes e centraes. Não nos demoraremos em apontar aqui as imper- feições, as obscuridades e pouca lógica de quasi todas essas classificações; são defeitos esses que são sur- prehendidos á simples leitura. CAPITULO IV D, aralysias periphericas das cordas vocaes LESÕES LOCAES E LIMITADAS DOS TRONCOS NERVOSOS a—Nervo laryngêo superior. Vimos que o nervo laryngêo superior dá a sen- sibilidade á porção do larynge situada acima das cordas vocaes, e que por seu ramo externo dá a in- nervação motora ao músculo crico-thyroidêo. Além disso, segundo experiências muito precisas de Schech, este nervo ainda fornece a motilidade aos músculos ary-epiglotticos e thyro-epiglotticos. Comprehende-se que as paralysias devidas á lesão deste nervo, além de uma anesthcsia mais ou menos pronunciada do la- rynge, apresentem como caracteristico a falta de acção dos músculos citados. E de facto, a experi- mentação tem-se pronunciado desse modo. Longet seccionou os dous laryngêos externos no cão e notou a rouquidão e abaixamento da tonalidade da voz. Si com uma pinça elle approximava então a — 4o — cartilagem cricoide da thyroide, a tensão das cordas vocaes era restabelecida e a voz se tornava normal. Devemos,comtudo,confessar que em clinica muito poucos factos são registrados desta espécie de para- lysias. A diphteria parece ser a única moléstia, na qual se tenha até agora reconhecido de uma maneira positiva a existência desta lesão ; e comtudo na diph- teria o caracter da lesão é systematisado e devemos transportar estas linhas antes para o capitulo das le- sões diffusas. Não obstante Morei]-Mackenzie refere um caso no qual esta affecção foi produzida pela hypertrophia das glandulos e infiammação do tecido areolar situados abaixo do angulo da mandibula inferior; e Neuman, de Buda-Pesth, publicou um caso de secção do laryngêo superior em um indivíduo que tentara se suicidar. Symptomatologia—Eis, segundo estes autores, os principaes symptomas desta espécie rara de pa- ralysias. A anesthesia do larynge é manifesta; em conse- qüência da paralysia dos músculos ary e thyro epiglot- ticos a abertura superior do larynge não se fecha du- rante a deglutição e a epiglotte permanece levantada contra a base da língua. Resulta desses factos que constantemente passam para a cavidade do larynge partículas de alimento, sobretudo líquidas. A anesthe- sia da parte superior do larynge, que já é um sym- ptoma da affecção, concorre para que esses corpos não sejam repellidos pelos movimentos de tosse reflexa, — 41 — e essas partículas podem chegar até a trachéa e bron- chios, occasionando pneumonias. A paralysia do músculo crico-thyroidêo, observa Morell-Mackenzie, é raras vezes verificada. Comtudo os signaes laryngoscopicos observados fazem presumir a sua falta de acção : porquanto, continua o mesmo Mackenzie, quando a affecção é bi-lateral e accen- tuada, a glotte é figurada por uma linha ondulada durante a phonação, existem freqüentemente leve depressão da porção central das cordas vocaes durante a inspiração e uma elevação correspondente durante a expiração e phonação. Ora, estes signaes indicam uma falta de extensão das cordas, cujo principal agente é o músculo crico- thyroidêo. Por seu turno, Neumann, em seu caso em que um só laryngêo superior foi lesado e em que por isso a paralysia era unilateral, assignala a rouquidão da voz, e diz que a corda direita (era a paralysada) ao laryn- goscopio apparecia frouxa, menos longa e collocad a em um nível mais elevado que a sua congênere, parti- cularidade que também Mackenzie verificou em uma sua observação. Aconselham os autores que, para se reconhecer a paralysia dos crico-thyroidêos, apalpe-se com os dedos a região anterior do pescoço entre a cricoide e a thyroide correspondente a esses músculos, durante a phonação. O músculo não se contrahindo quando paralysado, nota-se afiaccidez da região, com o palpar, quando o doente emitte sons. Ora esta prova tem fa- F.—6 — 42 — lhado nas observações que temos citado, de modo que o estudo das paralysias deste músculo tem seus pontos obscuros. Em parte, ainda devemos estas incertezas ao conhecimento não muito exacto da innervação do mesmo músculo ; pois si é verdade que o laryngêo superior o innerva, não podemos deixar de reconhecer que estudos e observações têm admittido a hypothese de também os recurrentes não serem alheios a esta innervação. O sábio Türck publicou muitas observações, em que havendo paralysia verdadeira dos recurrentes, notou a degeneração de todos os músculos do larynge inclusive o crico-thyroidêo, sem que elle notasse alte- ração alguma mesmo microscópica para o lado do la- ryngêo superior. Dado que os recurrentes também tomassem parte na innervação dos crico-thyroidêos, se nos affigura que os symptomas de flaccidez das cordas vocaes sejam antes devidos a uma paresia do que a uma total paralysia dos músculos, e que esta paresia se dá embora falhe o signal do palpar de que acima falíamos. Na observação que a propósito das lesões do spinal resumiremos, o músculo se apresenta nitidamente pa- ralysado, e isto nos parece ser devido a que então cessa toda e qualquer influencia nervosa para o mesmo músculo, quer esta lhe venha pelo laryngêo superior, quer pelo laryngêo inferior. Quer-nos parecer este facto corroborar nosso modo de pensar. O prognostico desta espécie de paralysia depende em geral do maior ou menor gráo de progresso — 43 — da lesão ; comtudo em virtude dos perigos apontados pela passagem de alimentos no larynge, tal estado in- spira sérios cuidados. Para maior elucidação resumimos em breves li- nhas a observação rara de Morell-Mackenzie. OBSERVAÇÃO I H. B., 37 annos, consultou-me em Maio de 1S74. Inrlammação dos gânglios e tecido aroolar de ambos os lados do pescoço. Os gânglios eram inflammados e tumefeitos desde a parte posterior do pescoço até o sterintm, c a pelle do angulo da mandibula era vermelha, quente, como que erysi- pelatosa. O doente se queixava de grande difficuldade de deglu- tição dos líquidos que lhe iam de traréz constantemente. Era completamente aphono. Pensei achar uma inrlammação considerável na parte interna da garganta; mas, ao exame laryngoscopico, a ex- cepçao de certo entumescimento a traz da amygdala esquerda, congestão leve das cordas vocaes e estado turgido das veias do pharynge, nada se via de anormal. Pensei que a difficuldade da deglutição era devida a uma perturbação funccional. Entretanto o doente, vindo á consulta segunda vez, achei uma anesthesia completa da mucosa do larynge. Podia-se tocar com a sonda todas as porções do interior do larynge sem provocar a menor irritação ou tosse. Era igualmente fácil ver que a epiglotte se mantinha constante- mente levantada, e que as cordas vocaes cujos movimentos de adducção eram livres, não eram tensas. Tanto quanto foi pos- sível julgar pelo exame externo, não existia paralysia apre- ciável do músculo crico-thyroidêo. Os symptomas foram attri- buidos á compressão do laryngêo superior. — 44 — Alguns dias depois um abcesso retro-pharyngiano do lado esquerdo foi aberto, e o intumescimento do lado direito dimi- nuiu gradualmente sem suppuração. O doente ponde engulir á tarde do dia em que foi aberto o abcesso, e alguus dias mais tarde recuperou a voz. Não é de duvidar que o laryngêo superior fosse comprimido perto do ponto em que se divide em ramo externo e interno. b) Nervo recurrente ou laryngêo inferior. Este grupo de paralysias devidas a lesões dos recurrentes é o mais commum na practica e o que tem sido mais bem estudado pelos autores. Logo a principio se pôde comprehender que as paralysias das cordas neste caso pode ser uni ou bilateral, segundo que um só ou os dous nervos recur- rentes estão compromettidos. Dahi já uma divisão para as paralysias laryngeas recurrenciaes, a saber: — unilateraes e bilateraes. Ora quer umas quer outras podem ser completas ou incompletas. Queremos di- zer : nem sempre os músculos são compromettidos em totalidade; quasi sempre uns ou outros escapam á paralysia. A symptomatologia destas paralysias, portanto, deve variar infinitamente de accôrdo com estas divisões estabelecidas. Etiologia — Os recurrentes tanto do lado es- querdo como do lado direito, affectam em seu longo percurso relações variadissimas, que aqui convém ser relembradas, para maior comprehensão do assumpto. O recurrente do lado direito nasce adiante da artéria sub-clavia, contorna este vaso de diante para traz e — 45 — de baixo para cima, formando uma alça de concavi- dade superior, que a abraça; remonta então sobre a parte lateral do esophago e passa abaixo da borda inferior do músculo consti ictot inferior, para terminar na parte posterior do larynge, onde elle se insinua na gotteira que formam as cartilagens cricoide e thy- roide— O recurrente do lado esquerdo—é mais longo e um pouco mais volumoso que o seu homologo do lado direito —Nasce elle mais em baixo e abraça a crossa da aorta da mesma maneira que o direito abraça a sub-clavia direita. Dahi elle remonta no angulo curvilineo formado pela trachéa e pelo esophago, se insinua por sob o constrictor inferior, como o do lado direito e segue o mesmo trajecto. O direito está ap- plicado sobre a face lateral do esophago, emquanto que o esquerdo responde á borda antero-lateral desse condueto. Com esse trajecto e com essas relações, os recur- rentes estão expostos a um numero sem numero de causas de todas as espécies, que attentam ora contra sua integridade funccional, ora contra sua integridade anatômica. Vejamos essas causas. Antes de tudo encaremol-as em relação com as paralysias bilateraes rccurrenciacs : a)—As causas capazes de attingir ao mesmo tempo os dous recurrentes não são muito variadas, Achamos exemplos em Türck, Traube, Ziemssen, Ger- hardt, Hiegel, etc. Câncer do esophago—Com esta etiologia Morell- Mackenzie e a maioria dos autores assignalam muitos - 46 - casos; é tão freqüente a paralysia recurrencial no caso de cancro do esophago, que muitíssimas vezes o ex- plorador tem chegado ao diagnostico dessa moléstia quasi que somente baseado no exame laryngoscopico. Hypertrophia da glândula . thyroide—O bocio é para os autores a causa mais freqüente das para- lysias bilateraes. Como mais adiante veremos, tra- tando da symptomatologia, as paralysias mais vezes observadas são incompletas, e os abductores pagam o maior tributo. Não é necessário grande rigor de exame para se diagnosticar a paralysia em tal caso. O estertor particular (bruit de cornage), as difficul- dades de inspiração, a vóz de tonalidade modificada que os individuos affectados de bocio apresentam, são signaes muito fortes para presumpção da paralysia respiratória. O espelho ordinariamente confirma essa presumpção. Reside nessa complicação o perigo mais serio para os infelizes portadores de tão incommoda hypertrophia. As paralysias devidas á hypertrophia da thyroide, segundo Gerhardt e Schech seriam algumas vezes intermittentes, mostrando-se por occasião de maior augmento passageiro do volume da mesma glândula. A Hypertrophia dos gânglios laryngo-bronchicos — também tem sido apontada como causa dos accidentes de que tratámos. Este facto soe dar-se com as pessoas escrophulosas ou já victimas da tuberculose. O facto de Riegel (nas paralysias respiratórias) parece ser devido segundo Mackenzie, a essa causa, visto como o autor não encontrando nenhuma outra lesão, achou — 47 — comtudo seu doente em período adiantado de tuber- culose. A hypertrophia desses gânglios não é rara no período inicial da tuberculose e a paralysia recur- rencial devida a essa compressão, seria um sicrnal de presumpção em um diagnostico duvidoso. Aneurismas múltiplos da base do pescoço—Não são raras na sciencia as observações em que aneu- rismas múltiplos compromettem os dous recurrentes, Mackenzie em seu "tratado das moléstias do larynge", cujas paginas não nos cansamos de citar, porque, neste assumpto, seus estudos clínicos são de admirável pre- cisão, ainda se encarrega de nos apresentar uma bella observação de paralysia bilateral recurrencial incom- pleta, typo respiratório, na qual a autópsia confirmou o diagnostico de um aneurisma da aorta ascendente, que se estendia ao tronco snb-clavio direito compro- mettendo o recurrente direito, e da existência de um outro aneurisma localisado na crossa da aorta e que lesava o recurrente esquerdo. No caso ainda mais curioso de E. Fraenkel, de Hamburgo (Annual of the univers med-sciences 1891, Vol. IV T. p. 26) um enorme aneurisma aortico que se estendia até o isthmo da glândula thyroide, produzia a dupla paralysia. — Ainda como facto curioso assignalemos aqui o caso de Baümler, citado por Gottstein, que é único na sciencia. A paralysia bilateral das cordas vocaes era a conseqüência de um derrame considerável no pericardio de um indivíduo syphilitico debilitado. Os symptomas pareciam ser devidos á compressão dos dous - 48 - nervos recurrentes pelo entumescimento dos tecidos, por causa da exsudação pericardia, pela hypertrophia do coração e pela distensão das veias innominadas e jugulares (Morell-Mackenzie). b) Paralysias unilçiteraes. Muito mais numerosas são as causas das para- lysias recurrenciaes unilateraes. As observações de taes paralysias pullulam com tanta insistência aqui e alli nas paginas dos autores, que não seremos prolixos na enunciação dessas causas. Nas variadissimas intervenções cirúrgicas que se fazem no pescoço, (como sejam entre outras, a esopha- gotomia externa, a extirpação de bocios, extracção de gânglios, ligadura de carótida etc.) um ou outro re- currente pode ser lesado. As compressões variadissimas que podem soffrer esses nervos são ainda causa de paralysias: taes são as compressões exercidas por tumores de toda espécie, gânglios hypertrophiados, abcessos profundos, di- versas variedades de bocio, cancros esophagianos, aneurismas da carótida, emfim por um numero sem numero de causas que, attentas as condições de tra- jecto dos recurrentes, podem attingil-os facilmente. — Ainda o recurrente direito está sujeito, repou- sando sobre o apice do pulmão direito, a ser englobado nos espessamentos pleuraes de natureza tuberculosa (Moure cita um caso na Révue de laryngologie, Fev. 1892), assim como ainda está sujeito a ser comprimido pelos aneurismas da artéria sub-clavia direita. Por sua vez, o recurrente esquerdo abraçando a crossa da aorta — 49 — reconhece como causa especial de sua paralvsia os aneurismas que se formam nessa crossa. Pode se dizer que esta é a causa mais freqüente das paralysias recurrenciaes unilateraes esquerdas; e tão intima é a relação que o nervo affecta com a crossa que a minima dilatação desta compromette o nervo. E'de uma importância descommunal na clinica o conhecimento desse facto ; a paralysia da corda vocal esquerda com os seus em geral ruidosos symptomas, além de ser um signal forçado das dilatações da crossa, é positiva e característica. Tanto é verdade o que dizemos que muitas vezes aneurismas latentes da crossa foram, antes de appa- recer outro qualquer signal, diagnosticados pela veri- ficação da paralysia recurrencial esquerda. Potain (i), Dieulafoy (2) e outros autores tiveram occasião de referir brilhantes successos a esse signal de diagnos- tico. Para nós tem tal importância o conhecimento desse facto, que diante de uma voz bitonal, anserina, tosse espasmodica, coqucluchoide, etc, na ausência de toda outra causa ao exame, estaremos sempre de so- breaviso com o aneurisma da crossa, mesmo quando nos falhem outros dados de semeiologia. OBSEPVAÇÃO II (INÉDITA) Grato á extrema gentileza de um distincto collega, aqui podemos registrar o seguinte caso, si bem que em ligeiras palavras. (1) V. (i:izette médicale, ~\~èíS~~). \ (2) Gazette Hebdomadaire, Julho INSf). F.—7 — 5o — Z..., 50 e tantos annos, morador n'esta capital. Indivíduo profundamente arthritico, a diathese que ha muito o acompa- nhava se revelava francamente por hemicraneas reiteradas, sudação copiosissima, callos e por uma manifestação eczema- tosa em uma das pernas. Ha dous annos pouco mais ou menos, levado pelo enthusi- asmo pelos successos da tão decantada hydrotherapia Kneipp, submetteu-se nosso doente aos seus preceitos, e o facto é que em pouco tempo desappareceram-lhe os males que o afíiigiam. O deslocamento de um vicio comtudo ao qual o organismo se acostumara não se podia fazer impunemente. E de facto, uma manhã, o nosso doente, passeando a pé nú sobre a relva humida, de accordo com o novo tratamento que se impuzéra, foi affectado de um resfriamento que produ- zio-lhe leve bronchite, que em pouco tempo se dissipou. Persistio-lhe comtudo uma rouquidão rebelde a todo o tratamento. Ao exame laryngoscopico, foi encontrada a corda vocal esquerda, paralysada,na Unha mediana (Paralysia do abductor). Este bello signal de alarma dado tão precocemente pelo órgão da phonação, não conseguio fazer germinar a descon- fiança de uma lesão para o lado da aorta, tanto mais provável quanto se tratava de um arthritico cujas manifestações ante- riores haviam desapparecido como por encanto, e quanto é sa- bido que o arthritismo está para as artérias, assim como o rheumatismo articular agudo está para o coração. E de facto, fazendo-se essa separação tão prejudicial entre as laryngopathias e o resto da economia, todos os tratamentos foram prescriptos com vista ao pobre larynge sem que por isso a dysphonia fosse sanada. Houve mesmo quem preconisasse nesse caso os banhos russos (!) Não foi senão muito tempo depois, depois que os males de nosso doente se aggravaram, que os signaes plessimetriccs e esthetocopicos vieram confirmar a existência de um aneurisma da crossa da aorta, já em um período adiantado de evolução... — 5i — Symptomatologia — Os symptomas das paraly- sias recurrenciaes variam conforme a paralysia é bi- lateral ox\ unilateral. Alem disso em um e outro caso elles variam conforme a paralysia possa ser, em um e outro caso. completa ou incompleta. Paralysia recurrencial bilateral completa — Neste caso, ao exame laryngoscopico, as cordas apre- sentam um aspecto caracteristico. O doente sollicitado a emittir sons, observa-se que as cordas ficam immo- veis em uma posição media entre a adducção e a ab- ducção, tal qual como no cadáver, e á qual por isso Ziemssen deu o nome acertado de "posição cadáverica das cordas vocaes. " Essa immobilidade é característica e o diagnostico fácil e concludente. Não ha dyspnéa, a voz é fraca ou reduzida a um murmúrio quasi im- perceptível. O doente sente como que uma plenitude respiratória, e quando falia, faz esforços consideráveis: a glotte sendo de dimensões anormaes, para fazel-a vibrar é mister uma columna de ar muito mais intensa que no estado normal; o doente fatiga-se, portanto, facilmente e aceusa dores nas inserções musculares thoracicas (Morell-Mackenzie). Paralysia recurrencial bilateral incompleta — Razões que mais adiante adduziremos, nos fazem desde já asseverar que, quando a paralysia recurrencial é incompleta, são sempre os músculos abductores que soffrem. Temos a considerar portanto nesta epigraphe os symptomas da paralysia dos dilatadores da glotte, que realiza o typo respiratório de Riegel. Este autor traçou com a maior nitidez os symptomas desta para- — 52 — lysia, de tal modo que até hoje os observadores que o têm seguido não têm feito mais que repetir as suas descripções. O symptoma predominante, fora de qual- quer exame local, é a dyspnéa com i?itegridade da voz. Esta dyspnéa, que se explica pela occlusão do orificio glottico pela falta de afastamento das cordas da linha mediana durante a inspiração, processa se a mor parte das vezes, lentamente ; ao minimo esforço, porém, a uma inspiração um pouco mais forte, a um accesso de tosse,ella se accentúa por tal forma que constitue verda- deiras crises de suffocação. Além disso, em razão desse mesmo phenomeno, ouve-se durante a respiração um estertorparticular bruit de cornage), mais ou menos accentuado, e que se incrementa quando o doente está dormindo. Esta dyspnéa com os progressos da idade da para- lysia pôde ir attingindo tal gráo de intensidade que ameace a vida do doente. Neste caso a tracheo- tomia é a taboa de salvação. Quando estes symp- tomas se manifestam nas crianças a confusão se pode fazer com as suffocações devidas ao croup, ve em tal conjunctura é de precioso auxilio o exame laryngos- copico. E de facto, na paralysia dos dilatadores a imagem laryngoscopica é das mais significativas. Durante a expiração as cordas vocaes approximadas na linha mediana mal deixam espaço entre si; este espaço porém deixa de existir, tornando-se linear quando o doente tenta um movimento de inspiração. Os mús- culos do larynge habituados a se contrahir synergi- — 53 — camente para manter a abertura do larynge, tentam os mesmos movimentos, falham, porém, os dos abdu- tores (que estão paralysados) e então predominam os dos adductores que ficam sem resistência em contrario; e quanto mais intensa é a força da inspiração mais accentuada é a contracção dos adductores, e mais se approximam as cordas da linha mediana. Paralysia recurrencial unilateral completa. E' característico o aspecto laryngoscopico durante, a phonação, uma das cordas vocaes fica immovel na "posição cadáverica"; a sua borda é concava; a corda sã só se move e se colloca em addução, e por um mo- vimento compensador ella ultrapassa a linha mediana, dando em resultado um leve entrecruzamento das arytenoides atráz, e uma obliqüidade da glotte. Não ha dyspnéa, raramente ha aphonia, a voz é velada, e offerece não raro o caracter bitonal, constituindo a chamada voz anserina. Paralysia recurrencial unilateral incompleta. Quando é incompleta esta paralysia, como já dis- semos com referencia ás bilateraes, são sempre os dilatadores que soffrem. Nestas condições os pheno- menos resumem-se em rouquidão e estertores mais ou menos pronunciados na inspiração. Ve-se, explo- rando o larynge com o espelho, que durante a inspi- ração uma só corda se affasta para as paredes lateraes do larynge, ficando a outra immovel na linha mediana. Taes são em succintas linhas os symptomas de- vidos a esta grande classe de paralysias. — 54 — O prognostico das paralysias recurrenciaes depende do maior ou menor gráo de alteração em que estão os nervos recurrentes, sendo obvio que tanto mais serio será quanto mais alterados estiverem os ditos nervos. Comtudo a importância das paralysias respiratórias, que podem produzir a laryngoestenose com todos os seus perigos, chama para ellas sérios cuidados, e muita reserva no prognostico. * * Dissemos, ha pouco, que quando as fibras dos recurrentes eram lesadas, si a paralysia era incompleta, sempre eram os dilatadores que soffriam. De facto, assim é. Este facto entrevisto por Rosembach, Morell- Mackenzie e outros, recebeu dos admiráveis estudos de Semon o cunho de uma lei. Já Riegel tratando das "Paralysias respiratórias" se admirava de que os autores considerassem rara essa affecção, porquanto em pouco espaço de tempo, em seu serviço haviam apparecido cinco casos. Os autores seguintes foram assignalando outros e outros casos, até que Semon depois de analysar minuciosamente todas as obser- vações por elle encontradas e depois de muito reflectir sobre as suas próprias, chegou a formular o seguinte ennunciado, conhecido pelo nome de theorema de Semon, e de que já falíamos em nosso histórico: " Em caso de lesões dos nervos motores do larynge (recurrente vago, spinal) ou de seus núcleos bulbares de origem, si a paralysia não é logo de uma vez 55 — total, completa, ella é a principio limitada aos abdu- ctores, e pôde ii elles ficar limitada, emquanto que nas mesmas circumstancias ella nunca affecta exclu- sivamente os adductores." Com as razões para expli- cação deste facto, o próprio Semon confessa não atinar, preferindo limitar-se á verificação do pheno- meno. Comtudo, surgiram logo as hypotheses, que se multiplicaram conforme os autores. Longo seriamos se aqui quizessemos enunciar essas opiniões uma por uma ; basta-nos dizer que as opiniões dos autores, que viam, como Semon, nesse facto, uma paralysia, todos se agrupavam nas tres seguintes hypotheses, aliás já aventuradas pelo próprio Semon : 1* admittir que as fibras nervosas dos recurrentes são dispostas concentricamente, e que estas se dividem em abduetoras e adductoras, estando as primeiras á peripheria e por isso mais facilmente lesadas (gratuita asserção) ; 2'? Suppor que os filamentos abductores são mais sus- ceptíveis de ser lesados, ou que nos casos de lesão das fibras adductoras algumas fibras que ficam bastam para transmittir o influxo nervoso ao músculo (hypo- these ainda mais gratuita); 3a, Emfim, admittir, que os músculos adductores do larynge recebem um supple- mento de força nervosa, que lhes vem por intermédio do laryngêo superior. Krause, de Berlim não admitte a existência de uma paralysia nesse facto, e explica o phenomeno observado dizendo que as experiências por elle feitas trouxeram-lhe a convicção de que ahi não se trata de uma paralysia, mas sim da contractura espasmodica - 56 - de todos os músculos do larynge. Como as forças adductoras, continua elle, sobrepujam as abduetoras, as cordas se conservam fixas na linha mediana. A theoria de Krause a um espirito desprevenido poderia parecer seduetora, mas recebeu de Semon golpes tão certeiros, que o próprio Krause deixou campear irrespondíveis os argumentos de seu adversário. Não resta duvida que ha de facto uma paralysia que é a dos abductores, e no estado actual de nossos conhecimentos a hypothese que mais parece satisfazer é a que admitte um reforço de innervação dos addu- ctores ao passo que o mesmo não se dá com os abductores. E não é aéreo este modo de ver, por- quanto como dissemos tratando da innervação do larynge, os trabalhos de Exner, Onodi e Mandlestamm teem feito ver que os músculos adductores recebem filetes em grande quantidade do laryngêo superior, e que existem múltiplas anastomoses em sua espessura entre filetes terminaes de origem differente. A para- lysia, portanto, devida á compressão do recurrente não affectaria de preferencia os abductores, todos os músculos seriam igualmente compromettidos, os addu- ctores porem salvar-se-iam de paralysar-se, por terem outras fontes de innervação. Este é o modo de ver de Lenno-Browne, que por isso nega a leitão discutida de Semon, pois que, para elle, todas as vezes que fosse lesado o recurrente, a paralysia dar-se-ia em todos os músculos. Acreditando dar-se, de facto, uma paralysia, nós comtudo não queremos dizer . que no facto da para- — 57 — lysia respiratória, as cordas não soffram um certo gráo de espasmo. Soffrem os adductores uma certa contractura e isso o demonstra a posição das cordas, na linha mediana, e os phenomenos de laryngismo, es- pasmos asphyxicos, de que são freqüentemente victimas os paralyticos respiratórios. Estas contracturas, porem não são permanentes e originam-se mesmo da própria paralysia, pelo desiquilibrio que esta traz ao funccio- namento synergico da musculatura laryngea, por isso que ellas mais se accentuam todas as vezes que entra em jogo uma das funcções do larynge. OBSELIVAÇÃO III (inédita) paralysia incompleta abductora da corda vocal esquerda devida a um aneurisma da crossa da a( «rta Graças a um requinte de gentileza da parte do Sr. Dr. Guedes de Mello, muito distincto ophtalmologista e laryngo- logista desta capital, a quem daqui enviamos os mais sinceros agradecimentos, podemos registrar as observações que se- guem tiradas da sua clinica civil. P. P., italiano, 49 annos de idade, solteiro, morador á rua de S. Pedro. A '21 de Agosto de 1892, ficou aphonico de repente. O medico que o vio, atribuiu o facto a uma bronchite. Sentindo-se peiorar em seus incommodos, recolheu-se á casa de saúde do Dr. Catta Preta, onde já se achava ha 10 dias quando o examinamos. Eeferiu o doente, que anteriormente, ha quatro annos tivera uma intoxicação palustre com gastro- enterite, mais tarde foi accommettido por dores rheumaticas que se localisavam ora nas paredes do ventre, ora nas do thorax quer á esquerda, quer á direita, ora nas articulações do punho, na região da tibia etc. Muito antes disso, porem, f . — s - 58 - ha uns 16 ou 18 annos, teve dous cancros na glande e dous bubões inguiuaes mais tarde; estes foram incisados; porem, seis mezes mais tarde appareceram de novo e resolveram-se sem suppurax. As dores rheumatoides tornaram a apparecer depois da intoxicação palustre. Actualmente o doente, além de se apresentar aphonico, tem tido quatro accessos de suffocação sempre á noite, sendo uma vez de dia; a inspiração e expiração são estertorosas, estridulosas; o doente sente difficuldade em expellir catarrho que parece-lhe agarrado á garganta. Diante deste quadro symptomatico, procedemos ao exame laryngoscopico, e encontramos a corda vocal esquerda immovel na linha, mediana durante a inspiração. jSTo exame attento que fizemos do pescoço não encontramos causa que nos explicasse a paralysia. Dirigimos então nossas vistas para o peito, onde já os antecedentes mórbidos do doente, já a própria lesão que verificamos nos faziam suspeitar qualquer lesão pai-a o lado da aorta. E' de facto, o exame mais tarde feito pelo Dr. L. Catta Preta revelava uma dilatação aneurismatica da crossa da aorta. Tratava-se, portanto, de uma paralysia unilateral incom- pleta da corda vocal esquerda devida á compressão do recur- rente esquerdo por um aneurisma da crossa da aorta. OBSERVAÇÃO IV (inédita) (CLINICA CIVIL DO DR. GUEDES DE MELLO) Paralysia bilateral completa das cordas vocaes De todos os casos que temos encontrado na sciencia, este é um dos mais bellos e curiosos a nosso ver. Em succintas palavras registra o Dr. Guedes em seus livros esta observação, mas ellas fornecem os dados essenciaes e nítidos da questão Eis : J. A. M. O. 26 annos, solteiro, morador nesta capital. O doente é parente de umillustre clinicoo qual m'o apresentou por escripto com a seguinte noticia : "O Sr. M... tem uma — 59 — notável hyperplasia do myocardio e uma estcnose conside- rável do orifício initral, as qnaes conjunctamente accarretam desordens fluxionaes para a arvore broncho-pulmonar, ultima- mente acompanhadas de hemoptises ou expuições sangüíneas. (jue muito o teem affligido. O que mais oincommoda agora são a fraqueza da voz que é muito velada e certa irritação na base do pescoço. ■' Nesse doente que se apresentou em meu consultório em dias de Setembro de 1892, procedi ao exame laryngoscopico. As cordas vocaes tinham sua coloração nacarada normal, nem a mais leve congestão, nem anemia ; a glotte porém apparecia com uma abertura bastante elliptiea ; durante a phonação as cordas tinham um muito rudimentar movimento de adducção. estreitando portanto um pouco mais a ellipse : e durante a inspiração os movimentos de abducção eram de igual intensi- dade. Xão se tratava, portanto de paralysia, mas de ama paresia muito pronunciada. O exame o mais minucioso a que procedi tanto no pescoço, como para o lado do thorax, não me trouxe a convicção da causa real dessa paresia. c Aconselhei ao doente a faradisação, mas o doente não voltou mais ao meu consultório. Tal é a observação. Dissemos ser este um facto bastante curioso; e de facto só encontramos na sciencia um caso que se assemelha a este, e é o de Baümler, em que a paralysia foi explicada pelo facto de uma pericardite com derrame. Morell-Mackenzie interpretando-o diz que a compressão dos recurrentes era devida ao entumesci- mento dos tecidos, á hypertrophia do coração e á distensão das veias innominadas e jugulares. Ora, todas essas condições pathogenicasachavam- se realizadas no doente da observação supra, pois a — 6o — lesão cardíaca que o acompanhava, conforme se vê na noticia do clinico informante, dava origem a todas essas causas de compressão. Portanto, a não ser que queiramos deixar o facto sem etiologia, devemos approximar o caso do Dr. Guedes de Mello, ao facto de Baümler, rarissimo, talvez único na sciencia. c) Nervo spinal. As lesões do tronco do nervo spinal em seu trajecto desde o buraco despedaçado posterior até a sua divisão em interno e externo, são raras e os factos apontados na sciencia como taes, foram na maioria dos casos apenas presumidos. A raridade de taes lesões explica-se mesmo pela pouca extensão desse trajecto. Além disso a configuração anatômica da região em que o spinal emerge da base do craneo, ainda nos explica a quasi impossibilidade de se observar a lesão isolada do nervo nesse trajecto. De facto o hypoglosso, o glosso-pharyngêo, o pneumogastrico ahi affectam taes intimidades de contiguidade com o spinal, que as observações todas registradas, fazem sempre sentir que também um ou outro ou alguns desses nervos ou todos foram compromettidos. As causas mais vezes apontadas como lesando o spinal, teem sido: tumores cancerosos da base do craneo, invadindo o buraco despedaçado posterior^ traumatismos quer accidentaes, quer operatorios, etc. Türck em 1855, época anterior ao laryngoscopio, referiu um caso de rouquidão que persistiu até a morte, e no qual elle verificou a compressão do spinal ao nivel do foramen lacerum. — 61 — Em um caso de Schech em que o spinal era comprimido por um tumor sarcomatoso da base do cérebro, também neste estavam englobados os troncos do glosso-pharyngêo, hypoglosso e pneumogastrico. J. Sauer relatou um facto de traumatismo interessando não só o spinal como também o hypoglosso, e em um caso de Dufour a compressão era devida a um kysto de echinococcus. Seeligmüller refere um dos casos os mais interes- santes de paralysias devidas a lesão do spinal. A paralysia era bi-lateral. Comprehende-se que a symptomatologia desta espécie de paralysias, seria a que apresentariam as paralysias conjunctas dos laryngêos superiores e laryngêos inferiores. Infelizmente esta ainda não poude ser feita, devido á concomittancia nos casos observados de outros symptomas devidos a lesões ds outros troncos nervosos. Comtudo a obser- vação de Seeligmüller (i) nos fornece alguns dados symptomatologicos de alguma precisão. O caso deu-se assim : Uma rapariga, em conseqüência de repetidos resfriamentos da região dorsal, começou a sentir perturbações da deglutição, ás quaes ulteriormente se ajuntáram uma paralysia atrophica dos dous sterno- cleido-mastoidêos, e dos dous trapezios com predomi- nância á esquerda; havia uma acceleração dos batti- mentos do coração (90 e mais por minuto) e signaes de uma dupla paralysia recurrencial. (1) Arciiiv fdr Psychiatrie uud Nervenkrankheit, 1872 Vol. III fase. 2. — 62 — A disphagia era causada por uma paralysia atro- phica do véo do paladar. O autor diagnosticou uma lesão peribulbar progressiva, tendo a principio com- promettido as raizes bulbares internas e depois as externas do spinal. Em um caso de Remak (i), além dos symptomas de paralysia dós músculos innervados pelos recurrentes, havia também os symptomas de paralysia do crico- thyroidêo, devida d falta de acção do laringêo superior. Tratava-se de um caso de pachymeningite syphilitica em que entre outras lesões, eram interessadas as raizes dos nervos spinaes. Como se vê é symptoma peculiar ás paralysias devidas a lesão do spinal a paralysia dos músculos esterno-cleido-mastoideos e trapezios, por elle inner- vados. O prognostico nestas espécies de paralysias é sempre grave, attentas as suas causas productoras. d) Nervo pneumogastrico. O nervo vago pode ser ser lesado quer em sua porção intermediária aos dous laryngêos, quer acima da emergência do laryngêo superior. Está bem en- tendido que as lesões que se derem no vago alem da Origem do laryngêo inferior, nenhum phenomeno trarão para o lado do larynge, a não ser que que- ríamos admittir irritações reflexas por via centripeta. (1) Deutsch med. Wochenschrift, n. 27, 1885. - 63 - Póra do cérebro, faz observar Ziemssen, o pri- meiro ponto que possa ser lesado é o gânglio do tronco do pneumogastrico. A conseqüência de uma tal lesão seria a para- lysia completa dos dous nervos laryngêos. Este facto que Morell-Mackenzie e Gottstein negavam por não existir observação na sciencia, o Dr. Luc nol-o apre- senta nitidamente apreciável na observação por elle resumida de H. Moeser, de Wurzburgo. Mais abaixo nos referiremos a essa observação. Abaixo das origens dos nervos pharyngeos e laryngêos abundam as causas observadas de lesão do vago. Morell Mackenzie refere paralysias laryngeas por compressão do pneumogastrico devida a um aneu- risma da carótida; Heller cita um caso no qual o tronco do va<^o era sede de um carcinoma. As intervenções opcratorias na região muitas vezes lesam esse tronco, no trajecto agora considerado: sejam exemplos o caso de Cock que parece ter ferido esse nervo praticando o pharyngotomia para a extir- pação de um corpo estranho, e o de Zappeler no qual o nervo foi englobado em uma ligadura applicada á carótida. Além disso, muitas outras causas podem inte- ressar o vago nesse trajecto, como sejam as diversas variedades de bocios, tumores ganglionares, abcessos etc, etc. Os aneurismas aorticos também teem sido apontados, interessando esse nervo ao mesmo tempo que o recurrente. — 64 - Os symptomas serão unilateraes ou bilateraes con- forme um ou ambos os nervos forem compromettidos. Quando o nervo for compromettido entre as origens do laryngêo superior e do inferior, os symptomas observados serão os mesmos que os devidos ás para- lysias recurrenciaes, que já tivemos occasião de es- tudar. Si, porém, a lesão tiver sede acima do laryngêo superior, os symptomas offerecem as particularidades devidas ás paralysias dos dous laryngêos superior e inferior, como no caso de Moeser do que damos um resumo tirado do livro do Dr. Luc. (i) OBSERVAÇÃO V ... .Exame laryngoscopico. O exame laryngoscopico re- velava as particularidades seguintes: a piincipio, a corda vocal direita era immobilisada em posição cadaverica, como em toda a paralysia recurrencial total. Durante a respiração tranquilla, a única particularidade que distinguia este facto das paralysias recurrenciaes habituaes, consistia em que a borda direita da epiglotte (lado paralysado) se apresentava a um nivel superior ao da borda esquecda, o que o autor explica pela paralysia dos feixes musculares depressores da epiglotte innervados por filetes do laryngêo superior. Durante a phonação, o aspecto laryngoscopico era bem mais característico: a corda vocal sã se mostrava mais tensa, mais longa que a sua congênere (paralysia do crico-thyroidêo, tensor da corda vocal); alem disso, não só a extremidade pos- terior da corda sã ultrapassava atráz a extremidade correspon- dente da corda opposta, mas também estava em um nivel in- ferior: emfim a arytenoide do lado são cruzava a arytenoide (1) Nevropathias laryngeas. 1892. Paris. - 65 - paralysada passando atraz delia, e sua cartilagem de San- toriui revirada para traz, contrastava com a do lado opposto «pie pendia inerte para diante...... Ve-se que neste caso, os signaes particulares das paralysias dos crico-thyroidêos, taes como descreve- mos a propósito das lesões do laryngêo superior, se superajuntam os symptomas clássicos das paralysias recurrenciaes. O prognostico das paralysias desta categoria é susceptível das mesmas considerações que já fizemos a respeito das outras espécies estudadas. II LESÕES UIFFUSAS DOS TRONCOS NERVOSOS Dissemos que as lesões dos troncos nervosos do larynge podiam ser locaes, limitadas, e destas até aqui temos tratado ; e, que essas lesões podiam ser diffu- sas e systematisadas. Estas se verificam pelos diversos processos de uevrite e degeneração nervosa A degeneração nervosa dos troncos laryngêos só tem sido nitidamente estabelecida nos casos de tabes, e delia nos occuparemos quando fallarmos no tabes como etiologia das paralysias, no capitulo seguinte. No estudo das lesões diffusas, as uevrites dominam a etiologia e delia nos occupamos neste capitulo. Dia a dia se enriquece a pathologia nervosa no estudo das nevrites, e no emtanto a pathologia laryn- gea nesse ponto pouco tem adiantado. Madame Déjé- rine Klumpke, reformando a classificação de Leyden, F.—9 — 66 — divide em sua importante these as nevrites em infec- ciosas e tóxicas. Acceitamos a simplificação assim feita por Mme. Déjerine, não deixando comtudo de ter nossas duvi- das a respeito das nevrites a frigore, ou rheumatis- maes; pois, si, como quer a auctora em questão, o frio não é senão occasião (causa occasional) ha factos como os de Schech e de Massei que ficam sem explicação, e que nos deixam bastante vacillantes. Com esta pequena restricção, nos subordinamos á classificação das nevrites em infecciosa e tóxicas ; e vejamos, com applicação aos nervos do larynge, si a observação e a clinica nos fornecem esclarecimentos a respeito. d) Nevrites infecciosas—Como seu nome o indica são nevrites devidas ao accommettimento dos nervos pelos diversos microorganismos agentes de determi- nadas moléstias. São factos de commum observação as paralysias devidas á diphteria, á febre typhoide, á tuberculose, a syphilis, ao beriberi, etc. Pois bem, o larynge também paga tributo a muitas dessas diversas paralysias, si bem que as observações a respeito não sejam numerosas nem muito claras. Paralysias laryngeas diphtericas — São as para- lysias infecciosas mais vezes observadas. Existe uma nevrite não só das fibras motoras como das fibras sen- sitivas do larynge. Em geral todos os troncos do la- rynge são accommettidos, mas a moléstia tem uma predilecção especial pelo nervo laryngêo supe- - 67 - rior. Observam-se então, predominando, os symptomas que descrevemos fallando das paralysias por lesões do laryngêo superior. A paralysia coexiste sempre com a anesthesia do larynge, e como as lesões diphtericas são diffusas a paralysia é sempre bilateral. Comtudo Ziemssen observou que ella em geral predomina do lado em que as falsas membranas diph- tericas são mais abundantes. Paralysias laryngeas devidas á febre typhoide — Os Srs. Boulay e Mendel estudaram esta complicação da febre typhoide nos Archivos de Medicina de 1895. (0 Teem sido raramente assignaladas essas paraly- sias, no curso da febre typhoide ; mas, segundo esses autores, ellas seriam mais freqüentes do que se pensa, e sua raridade apparente proviria de que muitas vezes são confundidas com os accidentes inflammatorios, ou necroticos susceptíveis de attingir a mucosa do órgão vocal; e é provável que accidentes laryngêos attri- buidos á lesões da mucosa ou das cartilagens, sejam devidos unicamente á paralysia das cordas vocaes. Essas paralysias, de que esses autores observaram 17 casos, apparecem depois da defervescencia da febre: entretanto pode-se vel-as sobrevir em pleno período febril, e mesmo desde os primeiros dias da affecção. (1) Em um dos ultimo* números de 1S!».">. dos Annales ;ua]\>ias typhicas. e publica algu- mas observações. — 68 — A symptomatologia das paralysias typhicas não differe da das paralysias clássicas. Ora são os constri- ctores paralysados, ora os dilatadores; ora um, ora ambos os recurrentes são compromettidos. Em todos os casos é necessário o exame laryn- goscopico para que se possa precisar a natureza da paralysia. Paralysias laryngeas devidas d tuberculose (i) tam- bém teem sido apontada pelos observadores. Depois que Pitres e Vaillard demonstraram que a tuberculose assim como o rheumatismo articular podiam ser cau- sas de nevrite, alguns observadores, entre os quaes Lubet-Barbóu e D útil se encarregaram de verificar o mesmo com relação do larynge, e as observações por elles apresentadas na these inaugural de Lubet-Bar- bou (Paris, 1887) deixam fora de duvida a existência de paralysias laryngeas por nevrite tuberculosa. As nevrites de origem syphilitica teem sido postas em evidencia pelos escriptos de Vierordt e Leyden, e paralysias laryngeas teem sido assignaladas devidas a essa causa. Gottstein em seu livro (moléstias do larynge) affirma ter observado paralysias do larynge devidas ao cholera-morbus, ao rheumatismo articular agudo, assim como dá uma bella observação de para- lysia laryngea devida á escarlatina. (1) Eefirimo-nos aqui á nevrite tuberculosa, pois que a tubercnlose pôde produzir paralysias laryngeas por meio de outras lesões. - 69 - Ainda têm sido apontadas laryngoplegias devidas a influenaa (P. Coch) ; e Schech, Gerhardt observa- ram casos devidos á febre palustre. OBSERVAÇÃO VI (INÉDITA) CLINICA CIVIL DO DR. GUEDES DE MELLO I. S. S.-, t.) annos de idade, casado, morador á rua Cas- siano nesta Capital, apresentou-se ao consultório a 20 de Maio de 1803. Soffre de rheumatismo articular brando, na arti- culação do joelho e escapulo humeral. Ha tempo teve bron- chite, eha tres annos, depois de uma suppressão de trans- spiração, sentiu-se rouco e esta rouquidão foi augmentando pouco a pouco. Actualmente o doente é bastante rouco, tosse pouco, e tem a sensação de um corpo extranho (prego) na gar- ganta ; ha dysphagia, quando bebe água, no fim do quarto ou quinto gole rejeita e fica como sufíbcado; alimenta-se bem mas sente difficuldade na deglutição e na respiração. Exame laryngoscopico — Examinámos as cordas vocaes e estas não tinham alteração alguma; a corda esquerda poiém era, paralysada em posição cadaverica, e ficava immovel emquanto que a sua hoinonyma da direita executava movi- mentos de addução e abdução durante a phonação e durante a inspiração. Examinámos cuidadosamente o pescoço e thorax e não encontrámos causa que nos explicasse esse phenomeno. Iodu- reto de potássio, e faradisação. Incluímos neste capitulo essa observação que graciosamente ainda nos forneceu o Dr. Guedes de Mello, porque apezar de não se ter podido fazer um exame histologico dos nervos (o que raramente se pode fazer, pois trata-se em geral de lesões de prog- nostico geral benigno), os symptomas de dysphagia — JO — tão nitidos, a ausência de outra causa e a paralysia total, completa, de todos os músculos nos fazem pensar em uma nevrite devida ao rheumatismo de que o doente soffria, e que atacou-lhe o órgão da phonação precisamente depois de uma causa occasional, o res- friamento. OBSERVAÇÃO VII (inédita) Ainda attribuimos á mesma causa e talvez também á syphilis a seguinte observação também da clinica civil do Dr. Guedes de Mello, si bem que não seja tão convincente como a antecedente. J. F. 0. 36 annos de idade, solteiro, morador á rua Cabido, nesta Capital, apresentou-se ao consultório no dia 1 de Março de 1805. Como antecedentes accusava o doente ter tido rheu- matismo e syphilis ; antes tivera bronchite. O doente apre- sentou-se rouco. Ao exame laryngoscopico as cordas eram de coloração normal, e a corda vocal esquerda achava-se para- lysada, na proximidade da linha mediana, não executando o movimento de abdução durante a inspiração. A um exame attento, nem no pescoço, nem no thorax en- contrámos causa a que attribuir esta paralysia. Iodureto de potássio em vinho de kola. Faradisação. b) nevrites tóxicas —A paralysia laryngea por ne- vrite tóxica que parece mais averiguada é a de origem saturnina, ou devida á intoxicação pelo chumbo. Ma- ckenzie assignala também o arsênico como causa dessas paralysias. Morgan, de Nova-York, incrimina o al- coolismo chronico^ e outros autores teem assignalado o cobre, a belladona e a morphina (Masucci). Não negando estas ultimas causas, podemos affirmar com- tudo que as paralysias laryngeas saturninas são as únicas de que haja conhecimento certo e só dellas nos occuparemos bem que succintamente. São as paralysias do larynge bastante communs nas intoxicações pelo chumbo. Tanquerel de Planches, em 46 casos de intoxicação saturnina, observou 16 vezes a aphonia, e o mesmo autor chamou a attenção sobre a aphonia e sobre as perturbações respiratórias sobrevindas em um certo numero de trabalhadores em chumbo. Elle approximou desses factos a paralysia laryngea muito freqüentemente observada nos cavallos empregados nas usinas de alvaiade, e que muitas vezes necessitavam a tracheotomia. Depois delles muitos outros observadores notaram muitas vezes a aphonia em casos de intoxicação saturnina. Pergunta Madame Déjérine si nestes casos a aphonia seria devida á paralysia generalisada dos mús- culos do thorax, ou haveria mesmo paralysia dos mús- culos do larynge? A esta pergunta deram formal resposta os exa- mes laryngoscopicos feitos por Otto Seifert em vários casos, visto como até então os autores nem mesmo pela autópsia tinham procurado a causa da aphonia observada. Resultou desse exame que a paralysia também invadia os músculos do larynge. Eis duas observações ds Seiffert resumidas : OBSERVAÇÃO VIII Seiffert (these de Mme. Déjérine.) Paralysia dos mús- culos ary-arytenoideos, com aphonia sobrevindo no declínio de uma eólica saturnina, em um pedreiro de 19 annos, que — 72 — moia as tintas para a sua própria serventia, empregando a alvaiade. Orla gengival. A aphonia é pouco pronuuciada. Exame laryngoscopico — Mucosa do larynge normal, princi- palmente ao nivel das cordas vocaes. Durante a phonação as cordas só se unem em seus tres quartos anteriores, havendo uma tenda triangular posterior. Durante a respiração o as- pecto da glotte era normal. OBSERVAÇÃO IX Idem (idem.) Xicoláo M. 30 annos, iiintor, exerce o officio desde 1867. Em 1872 aphonia durante 3 semanas, desappa- recendo pelo tratamento. Depois teve varias vezes aphonia. Em 1883, primeiro ataque de eólica saturnina. Estado actual (15 de Novembro de 1893):—Orla gengival, tinta pallida, hypertrophia do ventriculo esquerdo. Não ha albuminuria. Voz velada, surda, falsa. Exame laryngoscopico — Mucosa do larynge normal, prin- cipalmente para o lado das cordas vocaes. Paralysia completa dos músculos do lado direito do larynge. Integridade do músculo cricothyroideo. São interessantes estas observações, visto como nestes casos a paralysia só se limita ao larynge ; além disso, provam ellas, em contrario á opinião de Morell- Mackenzie, que todos os músculos do larynge podem indifferentemente ser paralysados nas intoxicações pelo chumbo. Acreditava Mackenzie, que, nas para- lysias laryngeas de origem saturnina, os músculos ad- ductores eram sempre preferidos, e que apresentavam em face dos abductores, nos envenenamentos pelo chumbo, a mesma susceptibilidade que os extensores em face dos flexores em outras regiões do corpo. CAPITULO V IW Ib I. PARALYSIAS DE ORIGEM BULBAR Os cordões antero-lateraes e posteriores da me- dulla, ao se entrecuzarem na região do bulbo, decapi- tam os cornos anteriores e posteriores da substancia cinzenta, formando-se então ilhotas dessa mesma sub- stancia, que se agrupam aqui alli, no soalho do 40 ventriculo, e que formam os núcleos de origem dos nervos craneanos. Não somente porem representam ellas núcleos isolados, mas, por sua coordenação, ligando-se entre si, constituem-se centros de certas funcções, que por elles se cumprem independente- mente da acção cerebral. No numero desses núcleos vamos encontrar os do spinal e do pneumogastrico, que são os nervos que animam o larynge: umacolumna, que fica atrás e fora da columna do hypoglosso e do facial, é a chamada dos nervos mixtos, onde estão os núcleos de origem do glosso-pharyngeo, pneumogastrico e spinal. Além disso, por sua associação coordenada, esses núcleos são centro dos movimentos do larynge, conforme trabalhos muito interessantes de Semon. v.—10 — 74 — Com estes rápidos elementos de anatomia, fácil se torna comprehender que toda causa que, directa ou indirectamente, lese esses núcleos ou esse centro dará como resultado uma paralysia do larynge de origem bulbar. Infelizmente, porém, no estudo desta questão, a experimentação tem sido muito limitada, e a clinica e a observação muito pouco interessadas. E não mereceria o assumpto tão pouco caso, porque muitas vezes, como veremos, os symptomas laryngêos bulbares, são de incontestável valor diagnostico. As lesões que podem comprometter os núcleos bulbares ou são emjóco limitado, ou são lesões difusas ou systematisadas. De ante-mão, porem, digamos que as paralysias laryngeas de origem bulbar são quasi sempre acom- panhadas de outros symptomas devidos á paralysia de outros nervos; pois é impossível quasi conceber-se o compromettimento isolado, no bulbo, dos núcleos do spinal e do pneumogastrico, tal é a relação de conti- guidade que ahi guardam os núcleos entre si. i.° Lesões em foco limitado. Hallopeau, em sua these de aggregação sobre as paralysias bulbares, querendo caracterisar as para- lysias que sobreveem em conseqüência de um foco limitado ao bulbo, diz as seguintes palavras: "A mo- léstia começa subitamente, habitualmente sem perda de conhecimento, por paralysias que affectam sobre- tudo a lingua, os lábios e muitas vezes os membros. Predominam freqüentemente em uma metade do corpo e coincidem raramente com a anesthesia; a — 75 — parte superior da face é respeitada; produz-se logo uma melhora sensível que pôde ser definitiva; a maior parte das vezes ha reincidência, e a morte pôde rapidamente sobrevir." E' obvio que as paralysias laryngeas obedecem a essas mesmas leis traçadas para as paralysias bul- bares em geral. E encontramos nos autores observações que, guiados por essas idéas, bem podemos attribuir a le- sões bulbares em foco. Comtudo, o estudo a esse respeito é apenas esbo- çado, e as observações que a sciencia registra poucas vezes teem sido completadas pela autópsia. a) sls hemorrliagias bulbares — poderiam ser causas de paralysias laryngeas; mas, nestes casos, os phenomenos são tão graves e tumultuosos e a vida do individuo é tão depressa extincta, que nem mesmo ha logar para pensar-se em qualquer exame. Antes de continuar, digamos que, em theoria, as paralysias la- ryngeas devidas a focos bulbares poderiam ser bila- teraes, mas lesões assim tão extensas de um lado a outro do bulbo, para que produzam a bilateridade, são incompatíveis com a vida. Portanto as paralysias laryngeas bulbares devidas a esses focos só serão observadas, quando esses focos pouco extensos, se limitarem a um só lado: as paralysias são pois unilateraes. Assim circumscriptos não acharemos muitas causas que produzam lesões bulbares limitadas. - 76 - b) A syphilis tem sido invocada como causa formando tumores syphiliticos (gommas) situados no bulbo. Tal é a causa que cita Morell-Mackenzie em relação a uma observação de Huglings Jackson ; em um segundo caso deste autor, havia uma paralysia dupla dos abductores, cuja causa era devida á mesma lesão bulbar, segundo o mesmo Mackenzie; comtudo, devemos notar que as lesões de origem syphilitica são ao mesmo tempo múltiplas e variadissimas a mor parte das vezes, e muito ingênuos seriamos si nos contentássemos com a existência só de gommas, quando sabemos que as escleroses syphiliticas são muito communs, e as arterites e nevrites syphiliticas não podem ser denegadas. c) Os amollecimentos necrobioticos teem sido assi- gnalados no numero das causas de paralysias de que tratamos. Gottstein cita muitos casos seguidos de autópsia. Em sua excellente these, entre outras obser- vações, Hallopeau refere uma seguida de autópsia e na qual os symptomas eram caracteristicos. No doente de Hallopeau havia aphonia e dis- phagia completas, a intelligencia era lúcida, a lingua e os músculos do larynge e do pharynge perfeitamente paralysados. Pela autópsia, verificou o autor existir um foco de amollecimento bulbar, resultante de um embolo que obliterava um ramusculo da artéria ver- tebral. c) Não encontrámos, fora as já enumeradas, outras causas locaes, que pudessem produzir paralysias do — 77 — larynge, taes como cxostoses vertebraes, tumores do cerebello, etc. E' escassa, como vê-se, a etiologia das paralysias laryngeas devidas a lesões limitadas do bulbo. A symptomatologia, em geral, reveste o typo unilateral completo; si bem que haja observações, como uma de Leudet, em que só exista paralysia dos abductores. Para Tissier, isto prova que a paralysia isolada de um músculo laryngêo pôde ter uma origem bulbar, havendo no bulbo um núcleo especial para cada m-usculo. A não ser para as paralysias de origem syphili- tica, para as outras em geral o prognostico é quasi sempre fatal no sentido da cura. 2°-- LESÕES DIFFUSAS E DISSEMINADAS Estas diversas lesões consubstanciam-se nas va- riadas modalidades clinicas, hoje perfeitamente defi- nidas e constituindo individualidades nosologicas, que affectam a medulla espinhal e a medulla alongada. Taes são a paralysia lábio-glosso-laryngea, a atrophia muscular progressiva, a syringomyelia, a esclerose lateral amyotrophica, a esclerose cm placas desseminadas, o tabes dorsalis, a paralysia geral es- pinhal e a pachymeningite cervical hypertrophua. Mais ou menos vezes as paralysias do larynge appa- recem como symptomas dessas variedades mórbidas, e não raras vezes então reclamam prompto soccorro para a vida do doente. E' de lastimar que os autores - 78 - pouco tenham-se preoccupado com as perturbações laryngeas nessas moléstias, de modo que as observa- ções em algumas dellas não teem sido feitas e em outras são muito escassas. Vejamos, entretanto, as mais estudadas quanto ás suas manifestações laryngeas. a) Paralysia lábio-glosso-laryngea e atrophia muscular progressiva. Razões, que aqui não nos importa adduzir, le- varam os autores modernos, á frente dos quaes está Charcot, a considerar estas duas manifestações mór- bidas como sendo da mesma natureza, e não differindo senão pela localisação das lesões. A primeira attinge o bulbo primitiva ou secundariamente, limitando-se a segunda a toda a extensão da medulla espinhal. Essas razões levaram Hallopeau a comprehendel-as sob um nome único—Atrophia primitiva chronica dos núcleos motores — e a considerar-lhe duas fôrmas ; a fôrma bulbar e a fôrma espinhal. A primeira fôrma é a paralysia labio-glosso-laryngea, de Duchene (de Boulogne). Lastimamos que, na maioria das Observações por nós encontradas, a paralysia laryngea só seja indirecta- mente referida pela verificação da aphonia mais ou menos pronunciada. Comtudo, o próprio Duchene já havia procedido a exame laryngoscopico em um de seus doentes e havia reconhecido "um afrouxamento das cordas vocaes ". Nessa moléstia a paralysia laryngea coexiste sempre com outros symptomas, pois que a atrophia do núcleo hypoglosso geralmente antecipa a do núcleo vago-accessot io. Krishaber fez observar que, antes muito tempo de se dar a paralysia, notava-se a perda dos reflexos laryngêos sem perda da sensibilidade ; de modo que da passagem de bebidas e alimentos para a cavidade do larynge não era dado o signal de alarma, e os accessos de suffocação, as pneumonias foram não raras vezes observadas. — Os symptomas dessas paralysias são geral- mente bi-latcraes, conservando-se as cordas vocaes, a mór parte das vezes, em posição cadavtrica. Nessas condições, o doente começa por sentir sua voz ir-se abaixando em tonalidade, até chegar á completa apho- nia ; sente difficuldade em fazer um esforço, não pôde soprar, por exemplo, a luz de uma vela, etc. Póde-se também observar algumas vezes a para- lysia só dos abductores ou de um só abductor. Krause teria observado muitos factos desse gênero. Nesse caso, a enscenação symptomatica assumiria o typo da paralysia respiratória de Riegel, a funeção da respira- ção seria difficultada. seriam observados verdadeiros phenomenos de laryngoestenose, podendo mesmo ter- minar pela morte por asphyxia. Comprehende-se que a intervenção nestes casos urge, e cumpre ao medico estar sempre de sobreaviso com esta possível compli- cação da paralysia labio-glosseo-laiyugea. — Na fôrma spinal da moléstia, muitas vezes o bulbo é ulteriormente compromettido ; e o facto mais interessante é que então as manifestações bulbares se — 8o — limitam so ás paralysias do larynge. Sirvam-nos de exemplo os casos observados por Lõri, Gottstein e Koschlakoff em que eram compromettidos ora um, ora ambos os abductores das cordas vocaes. b) Syringomyelia. Os symptomas da syringomyelia estão hoje bem nitidamente traçados e as observações desta moléstia, não classificada ha alguns annos atrás, se multiplicam de todos os lados. As fôrmas são variadas segundo a predominância de taes ou taes estados pathologicos. Em uma clinica recente, o professor Raymond assi- gnalou a freqüência das manifestações bulbares, e mostrou que existia verdadeiramente uma fôrma que se podia classificar de bulbar ou mesmo de bulbo-pro- tuberancial. As perturbações laryngeas nesta ainda não são bem conhecidas. No emtanto, até 1893 Schlesinger poude reunir 12 casos em que notou paralysias la- ryngeas mais ou menos completas. Além disso taes paralysias ainda foram observadas nos casos de Booth, Benhardt, Hoffmann, Reichline, etc. Na Revista de Medicina, de 1895, Lamacq pU_ blicou algumas observações recolhidas no serviço de Pitres, nas quaes se notavam além de desordens sen- sitivas das mucosas buccal, lingual e nasal, além da atrophia da lingua, também perturbações para o lado do larynge. Cartaz observou 18 casos de syringomyelia, nos quaes notou que tres vezes havia paralysia ou paresia — Si- dos abductores, e duas vezes havia paralysia recurren- cial completa. Os symptomas das paralysias laryngeas devidas á syringomyelia variam conforme os músculos paralysa- dos, e não se affastam do quadro traçado para os das paralysias laryngeas periphericas. E' de. notar que essas paralysias apparecem em qualquer periodo da moléstia, podendo mesmo se apresentar logo no inicio. Attenta a gravidade da fôrma bulbar da syringo- myelia, nosso prognostico não pôde nunca deixar de ser sombrio. As cordas vocaes algumas vezes se apre- sentam consideravelmente atrophiadas. OP.SKRVACÃO X (resumida) (RECOLHIDA POR CAKTAZ NO SERVIÇO DE DÉJÉRINE, NA SALPÉTR1ÈRE.) Mine. V. salla Charcot, 5S annos, syringo-myelica. Sobre- vieram-lhe perturbações da voz quasi desde o principio da moléstia, ha 6 ou 7 annos. Uma occasião quasi que esteve aphona. Voz rouca e velada. Exame laryngoscopico : corda vocal esquerda immovel em posição cadaverica (paralysia recurrencial total ou completa). A corda vocal direita vem alem da linha mediana nos movi- mentos de phonação, approximando-se da corda paralysada. A corda esquerda apresenta uma atrophia notável, a borda affilada, mais delgada, e comparada com a direita pa- rece tres vezes menos espessa. Não ha inflammação da mucosa. c) Esclerose em placas disseminadas. As perturbações da palavra na esclerose em placas, desde muito tempo teem preoccupado os cli- K. —11 — 82 — nicos e figuram no numero dos signaes os mais carac- terísticos desta moléstia. Em poucos doentes, porem, teem sido estudadas as perturbações da phonação, e mais raros ainda são os doentes que tenham sido exa- minados laryngoscopicamente. Comtudo, Lõri relata 4 observações de esclerose em placas, nas quaes foi feito o exame laryngoscopico. Nas duas primeiras observações este autor descreveo nitidamente o tre- mor intencional das cordas vocaes, observado por muitos autores, e que está em relação com o tremoi intencional que se observa em outros territórios mus- culares. E' um tremor especial que se nota por occasião dos movimentos voluntários e devido á impossibi- lidade de uma contracção muscular sustentada. Este tremor da esclerose em placas é attribuido pela maioria dos tratadistas á particularidade obser- vada por Charcot e admiravelmente estudada por Ba- binski, e que vem a ser: no meio da destruição de outros elementos nervosos, os cilinder-axis são pou- pados pela esclerose em placas. Em sua terceira observação, comtudo, Lõri nos fornece um bom exemplo de paralysia laryngea na esclerose em placas. Eil-a resumida. OBSERVAÇÃO XI Mulher, 30, annos em começo de moléstia. Um anuo de- pois do primeiro symptoma que era difficuldade em escrever com a mão direita, sobreveio-lhe uma leve rouquidão. Ao exame laryngoscopico: leve paresia da corda vocal esquerda, que progredindo rapidamente no correr do anuo, - 83 - terminou em uma paralysia completa dos i oustridores e di- latadores desse lado. No curso do anuo seguinte, paralysia da metade esquerda do pharynge, e. ao mesmo tempo, forte tremor intencional em diversos músculos voluntários. O nystagmus fazia apparição. Tres annos mais tarde cm conseqüência de um attaque apoplectiforme, anesthesia súbita da metade esquerda do la- rynge e do pharynge. A morte sobreveio depois da para- lysia do membro inferior com contracturas. paralysia da be- xiga, dos esphincteres etc. No 4° caso, Lõri ainda observou paralysias para o lado do larynge, pharynge etc. Em um caso de esclerose em placas, Garel obser- vou a principio paralysia bilateral dos thyro-aryte- noidêos internos, paralysia esta que depois cedeo o lu- gar ao tremor intencional. Este facto está plenamente de accordo com o que se sabe sobre as remissões das paralysias na esclerose em placas. As paralysias completas do larynge são comtudo muito raras na esclerose em placas na opinião de Krause, que explica a rouquidão dos doentes, pelo leve "afrouxamentodas cordas' algumas vezes observado. d) Esclerose lateral amyotrophica. (moléstia de Charcot). Em poucas palavras, Charcot resume os caracte- res clínicos desta moléstia. i° Paresia sem anesthesia dos membros superiores, acompanhada de emaciação rápida do conjuneto das massas musculares e prece- dida algumas vezes de entorpecimentos e formiga- mentos. A rigidez espasmodica se apodera, em um - 84 - momento dado, dos músculos paralysados e atro- phiados e determina deformações permanentes por contracturas. 2o Os membros inferiores são invadidos, por sua vez. Produz-se em primeiro lugar, sem acom- panhamento de anesthesia, uma paresia que progre- dindo rapidamente, faz que em pouco tempo a es- tação e a marcha sejam impossíveis. A estes symptomas se junta uma rigidez espas- modica, a principio intermittente, depois permanente e algumas vezes complicada de epilepsia spinal tônica. Os músculos dos membros paralysados não se atro- phiam senão muito tempo depois e nunca no mesmo gráo que os músculos dos membros superiores. A bexiga e o recto não são affectados. Não ha tendência á formação de escharas. 3°.—Um terceiro periodo é constituído por uma aggravação dos symptomas das lesões, que se propa- gam para o bulbo. As perturbações da palavra, e da deglutição causadas pela paralysia da lingua são ha- bitualmente as primeiras em data, vêem em seguida os symptomas ligados á paralysia dos músculos ani- mados pelos laryngêos e facial inferior. Como na moléstia de Duchene, as lesões na mo- léstia de Charcot invadem lenta e successivamente as mesmas partes do bulbo. Além da referencia que de passagem fez Charcot sobre as manifestações paralyticas do larynge nesta moléstia, reduzidas ou quasi nullas teem sido as observações a esse respeito. Cartaz, citado pelo Dr. Luc, teria observado em um doente do serviço de - 85 - Charcot uma inclinação da epiglotte para a esquerda, uma tensão incompleta das cordas vocaes, uma certa rouquidão explicando-se por uma occlusão incompleta da glotte durante a phonação. Lõri, por sua vez, teria observado a immobilidade das duas cordas vocaes, em posição cadaverica. Estes parecem ser os únicos factos observados. e) Tabes dorsalis. Pode-se dizer que, de todas as moléstias que af- fectam o bulbo, o tabes é a que maior numero de vezes traz no meio de seus symptomas, as paralysias do la- rynge. E si é verdade que as crises laryngeas, á se- melhança das crises gástricas, chamam mais a atten- ção de todos que se occupam das manifestações tabe- ticas laryngeas, é facto fora de duvida que nem por isso os casos de laryngoplegias verdadeiras deixam de ter grande importância. As observações e referencias de casos de paraly- sias laryngeas no tabes encontram-se, em grande nu- mero, nas revistas e folhas scientificas; baste-nos, por- tanto, dizer que Burger, de Amsterdam, refere em um seu trabalho 71 casos, que Semon, em 30 casos de ataxia locomotora, notou 5 vezes laryngoplegias, e que Lõri, Krause, Bosworth, Mackenzie, emfim a quasi totalidade dos observadores teem referido casos de paralysias laryngeas tabeticas. — Com grande freqüência a paralysia é bi-late- ral, e de preferencia é o systema dos abductores o qual é attingido. Pôde-se dizer que nos dous terços dos casos assim accontece ; comtudo, casos bastantes — 86 — ha em que a paralysia é unilateral, sendo ora á es- querda, ora á direita, ora completa, ora incompleta. Lõri observou 5 casos de paralysia completa tabetica. Em um caso de Kahler a paralysia completa de uma das cordas coincidia com a paralysia do abductor da outra. — Convém que estejamos prevenidos comtudo, que nem todas as paralysias laryngeas tabeticas cor- rem por conta de lesões que se processam no bulbo. E' verdade que na maioria dos casos assim accontece, sendo muito mais commummente lesados os núcleos bulbares (do spinal e pneumogastrico); mas, factos ha bem verificados de degeneração dos troncos ner- vosos do larynge e em particular dos recurrentes de- vidos ao tabes. Estas degenerações de origem tabe- tica, que conforme dissemos no capitulo precedente, são atrophia do tubo nervoso e esclerose intersticial sobretudo, podem coincidir com as lesões nucleares; mas, o que é mais curioso é que ellas podem existir sem que o exame o mais minucioso tenha surprehen- dido qualquer lesão para o lado do bulbo. Em uma observação de Krause, citado por Burger, não se poude descobrir no bulbo nenhuma alteração, mas existia uma degeneração extensa dos recurrentes e dos vagos, que explicava sufificientemente as manifes- tações laryngeas notadas durante a vida. — Para Lubet-Barbou (These, Paris 1887) os espasmos do larynge estudados por Charcot, Ferreol, Krishaber, e de que Cherchewski na Revista de Me- dicina de 1881 tratou minuciosamente, são muitas ve- - 87 - zes, antes paralysias dos abductores do que propria- mente espasmos contracturaes, principalmente quando os accidentes observados são bastante consideráveis e duradouros, necessitando a tracheotomia immediata. De accordo com Krishaber pensamos que nesses casos ha paralysia e ha espasmo, a primeira se accentuando em um músculo e tendo por effeito causar a contra- ctura dos músculos antagonistas. As paralysias laryngeas tabeticas podem sobre- vir em qualquer periodo da moléstia: commummente ellas se manifestam em um periodo adiantado, mas não é raro ver-se anteciparem mesmo de muito tempo qualquer outra manifestação tabetica, e fazerem o medico desconfiar de um tabes de que elle por outro meio não poderia suspeitar. Alfr. Fournier em suaslições sobre os phenomenos preataxicos do tabes de origem syphilitica, chama a attenção para este symptoma premonitor. Esta é mais uma forma chamada frustra do tabes, e que se- gundo os observadores, tem tanta importância como as paralysias dos músculos do olho, ptosis, etc, produ- zidas por placas de degenerecencia cinzenta. Essas paralysias laryngeas apparecem muitas vezes subitamente sem causa apreciável; outras vezes por occasião de um resfriamento, por exemplo, o indi- víduo é victima de uma súbita difficuldade ins- piratoria. Parece que algum corpo estranho parou- lhe na garganta, e elle em vão faz exforços de tosse para tentar expulsal-o. Essa tosse é convulsiva (co- queluchoide); a inspiração é sibilante, longa e penosa, — 88 — a expiração rouca e fácil. Em poucas palavras este é o quadro symptomatico da mais commum das fôrmas de paralysia tabetica laryngea e que é a dos abduc- tores. A paralysia dos abdutores é, e as observações o provam, a paralysia por excellencia das tabes. Tanto peior para esses desgraçados para a aggravação dos males dos quaes, todos os symptomas parecem contribuir com as mais terríveis de suas faces. O prognostico é dos mais graves, sendo quasi todos autores accordes em pensar que essas paralysias vão sempre mais se aggravando sem nunca apresentar um periodo de regressão, como accontece com as ophtalmoplegias devidas ás mesmas causas. Esses phenomenos que acabamos de descrever, não são sempre tão terríveis como pintamos; elles percorrem todos os gráos desde a mais leve dyspnéa até a asphyxia necessitando a tracheotomia. Comtudo mesmo os casos os mais leves podem se aggravar inopinadamente, e muitas vezes é tão súbita tal ag- gravação que nem ha tempo de soccorrer o doente. Estas complicações são um dos maiores perigos á vida dos tabeticos laryngêos. II PARALYSIAS LARYNGEAS DE ORIGEM CEREBRAL 4 Vamos abordar agora um assumpto, sobre que ainda pairam duvidas apezar de trabalhos e estudos minuciosos. - 89 - Em 1886, Rebillard, em sua these inaugural (Paris) quiz fazer ver que as paralysias laryngeas de origem cerebral têm existência real, e para isso argumentou elle com a experimentação e com a clinica. Ora a experimentação, neste caso, convence e arrasta em seu rigoroso determinismo a menos penetrante intelligencia. Existe um centro cerebral phonatorio para o larynge, e isso não soffre hoje a minima contestação: todos os autores estão de accordo. As pesquizas e experimentações feitas com o in- tuito de estabelecer ou antes achar um centro cerebral para o larynge emquanto respiratório, i. é, um centro cerebral de abducção das cordas vocaes, pôde-se dizer que tinham falhado até estes últimos dias. E no emtanto, hoje que a physiologia tem espe- cificado, por assim dizer, para cada acto voluntário um centro de acção cerebral, era muito natural pensar, com Ruault, que os movimentos inspiratorios amplos que nós fazemos de propósito, muito differentes do que os que executamos instinctivamente, tivessem a sua representação cerebral. Os autores, depois de obter os resultados os mais desencontrados pela experi- mentação, tinham declarado que por muito tempo a sciencia procuraria a decifração para essa incógnita. Muito recentemente, porém, (Semana Medica, Maio de 1896) também esse centro de abducção foi descoberto na Inglaterra por Risien Russell e Spencer, que exci- tando em animaes uma região situada abaixo e adeante do centro phonatorio, i. é, adductor das cordas vocaes, F—12 — 9o — ponderam obter movimentos respiratórios, i. é, de ab- ducção das mesmas cordas. Hoje, portanto, é natural pensar-se que as para- lysias do larynge que possam depender de lesões ce- rebraes podem ser phonatorias ou respiratórias. As noções que temos, comtudo, de um centro cerebral de de abdução são apenas muito rudimentares para que pensemos em um estudo dessas paralysias. Restam-nos as phonatorias, que são as únicas de que até hoje se tem cogitado, e de que encontraremos observações mais ou menos rigorosas na sciencia. Não basta, porém, que a experimentação nos venha dizer que existe no cortex cerebral um centro respiratório para o larynge, ou um centro que preside aos movimentos de phonação, para que concluamos logo pela existência desses centros e de moléstias que se prendem á sua alteração, paralysias laryngeas, por exemplo. E' preciso, além disso que a clinica e a anatomia pathologica dêem o seu veredictum a essas asserções, pois que, em matéria de localisações ce- rebraes, é com ellas que nos devemos apegar, no dizer aphorismatico de Charcot. Existem, após estas considerações preliminares, paralysias laryngeas de origem cerebral ? Si não quizermos ligar importância aos casos de Ange Duval que notou duas vezes aphonia depois de traumatismos cerebraes, ao caso de Luys (Annaes das moléstias do.ouvido, larynge etc, 1875), ao de Livio Ronci em que hayia aphonia depois de uma àpoplexia, ao de Seguin, porque nessas observações — 91 — o exame laryngoscopico não foi feito, bem que hou- vesse autópsia; e si ainda não quizeremos dar maior importância ao caso de Lewin que observou a paralysia da corda vocal esquerda em uma hemiplegia esquerda (Berl. Kl. Woch. 1874), ao de Brysson— Delavan (Medicai Record, 1885% ao de Cartaz fhemi- paresia direita e paralysia da corda vocal direita), a dous de Garel (Annaes, 1886) que em uma hemiplegia direita notou paralysia da corda vocal direita, e em uma hemiplegia esquerda notou paralysia da corda vocal esquerda, porque nestas observações, si bem que tivesse havido exame laryngoscopico, faltou a verifi- cação importantíssima da autópsia: comtudo, diante das recentes observações de Rébillard (1887), de Garel, Garel e Dor e Déjérine (1890-1891) em que todo o rigor foi posto nos dados da observação, > não podemos deixar de admittir senão como certo e positivo que a paralysia laryngea de origem cerebral é um facto adquirido para a clinica e niti- damente limitada de outra qualquer paralysia. Seja- nos perdoado não podermos resistir ao desejo de aqui resumir uma das mais bellas destas observações, uma de Garel, de Lyon, que é de grande demonstração. OBSERVAÇÃO XII Anua Futel, 72 annos, entrou para meu serviço a 9 de Janeiro de 1886, sem o menor ensinamento sobre seus ante- cedentes. Tinha apoplexia havia dous dias, com perda de conhecimento, hemiplegia direita, paralysia facial do lado direito e aphasia. — 92 — A hemiplegia direita persiste ainda no membro superior. Sensibilidade intacta. Paralysia facial do mesmo lado. No co- ração, fraqueza das bulhas sem sopro. Alguns estertores disseminados nos pulmões. Elevação muito notável da tempe- ratura. A 10 de Janeiro, paralysia completa do braço direito com movimento epileptoide do pollegar e dos dedos. Para- lysia incompleta da perna. Tres ou quatro erosões e phlyc- thenas existem na região glutea direita. * A doente comprehende o que se lhe diz, mas não pôde res- ponder senão por um grunhido parecendo uni pouco com um oui. A 12 de Janeiro, 5 dias depois do attaque, practico o exame laryngoscopico para ver si a corda vocal direita parti. cipa da hemiplegia do mesmo lado. Com grande pasmo, veri. fiquei que era a corda vocal esquerda que estava paralysada em posição cadaverica. O larynge entretanto ó intacto, isto é, não apresenta nenhuma alteração orgânica própria. Não ha nenhuma causa de compressão do recurrente esquerdo. O estado da doente melhora pouco a pouco e a aphonia tende muito levemente a desapparecer. A 23 de Janeiro, a corda vocal esquerda permanece sempre paralysada. A' noute de 25 para 26 de Janeiro, sobrevem um segundo attaque, a doente cahe em coma absoluto, a cabeça olhando para o lado direito. Morte a 27 de Janeiro. Autópsia.—Cérebro—Hyperhemia media das meuiugeas na base e lateralmente. O tronco basilar apresenta signaes no- táveis de endarterite, consistindo em dous anneis quasi com- pletos ou placas amarellas duras, de natureza atheromatosa e calcarea. As mesmas lesões se observam nas artérias cerebraes an- teriores, médias e posteriores. Hemispherio esquerdo.—As placas de atheroma cessam á entrada da artéria sylviana na scissura de Sylvius. Na pri- meira bifurcação da artéria existe um pequeno coalho a ca- vallo no esporão da divisão. A scissura não offerece lesões. Encontra-se um primeiro pequeuo foco de amollecimento ver- melho entre a frontal ascendente e o pi da terceira frontal — 93 — esquerda. Um segundo foco no sulco de Rolaudo, é situado á altura da 2a frontal. Um pouco acima sobre a frontal ascendente dous ou tres pontos muito pequenos de amollecimento vermelho. Mais adiante ainda um foco de tinto vermelho-castanha. Este foco que é o mais extenso é situado na altura da 2! e 3* frontaes para o terço médio da paiietal ascendente. Este foco se retira e se enuclea com a maior facilidade, deixando um fundo pouco alterado; não está em relação com outros focos. Só os focos da frontal e parietal ascendente lesam um pouco a substancia branca sub-cortial. Jlemispherio direito.—O atheroma do lado direito penetra na scissura de Sylvius. A parte inferior da frontal ascendente adhere um pouco ásmeningeas. Estas ultimas retiradas, esta parte, apresenta uma super- fície despolida sobresahindo do aspecto liso do resto do cortex; esta superfície apresenta uma leve coloração amarellada. Adiante, no pé da 3a frontal, ao uirel das pregas de pas- sagem, acham-se dous pontos de amollecimento, muito vermelhos, muito junctos, de aspecto pontilhado, como nas lesões do hemispherio esquerdo. Nenhuma lesão na parte anterior da 3a frontal. Ao corte, estas lesões teem pouca profundeza., e não inte- ressam sinão o cortex cerebral; na superior só existe uma lesão leve amarellada interessando a substancia branca. A lesão da frontal ascendente penetra um pouco na subs- tancia branca, no sulco que a separa da 3a frontal, e vae dessa maneira se reunir ao foco superior, não se formando assim senão uma só e mesma lesão. Nãe verifiquei nenhuma lesão no bulbo ou no cerebello. Do lado do pescoço não existia ne- nhuma causa de compressão, podendo explicar uma paralysia laryngea de origem peripherica. O larynge não estava lesado e a articulação crico-aryteuoidea esquerda não estava an« kylosada. — 94 — Esta é a observação completa que Garel publicou em 1886 nos Annaes das moléstias do ouvido, nariz e larynge; mais tarde em 1890, nos mesmos Annaes, Garel publicou em collaboração com seu discípulo Dor, uma outra interessantíssima observação que sen- timos aqui não poder resumir. Tratava-se de um indi- víduo affectado de endocardite ulcerosa, e no qual um embolo partido do coração foi produzir na cápsula interna um pequeno foco de amollecimento. Esse doente não apresentou em vida nenhuma per turbação de motilidade nem nos membros nem na face nem no véo do paladar. Tinha-lhe sobrevindo uma rou- quidão, e Garel e Dor practicando o exame laryngos- copico, notaram a monoplegia da corda vocal esquerda. Na autópsia, os autores em vez de achar a lesão cortical que haviam diagnosticado em vida, só acharam, com grande pasmo, um pequeno foco de amollecimento avermelhado, do tamanho de uma er- vilha, na parte supero-interna do núcleo lenticular, e levemente compromettendo de 1 a 2 millimetros a parte externa da cápsula interna. Não podem ser mais convincentes estas obser- vações. Garel acaba sua bella memória publicada nos ditos Annaes e em que elle discute essas observações, formulando as seguintes conclusões : 1*) Existe um centro cortical motor do larynge em cada hemispherío cerebral, 2f) Este centro tem sede ao nivel do pé da 3^ cir- cumvolução frontal e do sulco que a separa da frontal ascendente. — 95 — 3a) As fibras emanadas desse centro passam ao nivel da parte externa do joelho da cápsula interna, formando no feixe geniculado, um feixe motor la- ryngêo independente do feixe da aphasia e do feixe do hypoglosso. 4a) O centro laryngêo tem uma acção cruzada, sua destruição determina a paralysia total da corda vocal do lado opposto (posição cadaverica). Pela 3a conclusão ve-se que no feixe geniculado da cápsula interna, ao lado do da aphasia e do do hypoglosso que Raymond e Artaud estabeleceram es- tudando as glossoplegias, vem se ajunctar um novo feixe também independente, que Garel chamou feixe motor laryngêo. Esta conclusão julgou o autor estar autorisado a estabelecer, pelo estudo que fez da sua 2a observação curiosissima, visto como o facto da monoplegia laryngea era o único symptoma paralytico observado. A estas conclusões e principalmente á ultima, Semon e Horsley oppuzeram a mais viva resistência, e suas objecções eram tiradas da experimentação. Diziam elles : nas observações de Garel o exame his- tologico do bulbo não foi feito; lesões microscópicos no bulbo seriam sufficientes para explicar os pheno- menos observados; as excitações, continuavam elles, baseando-se em suas experiências, nos animaes, de um' só centro laryngêo cortical determina a adducção nas' duas cordas vocaes. Um centro pôde supprir o outro. Concluíam elles: as paralysias laryngeas corticaes portanto não existem, visto como, practicando a abla- -96- ção de um desses centros ou mesmo de um hemis- pherio cerebral inteiro, a excitação electrica do outro centro continuava a determinar a approximação das duas cordas. E depois, diziam elles, como existir po- sição cadaverica das cordas, quando a posição cada- verica implica paralysia também da abducção, e para esta ainda não foi verificado um centro cortical ? Como conceber que a lesão de um só centro determine pa- ralysia respiratória e phonatoria ao mesmo tempo ? Travou-se renhida a discussão entre os autores; e Garel respondendo a seus contendores, lembrava que a experimentação pôde vir em auxilio da clinica, mas ella não deve nunca impor seus resultados a esta, visto como a experimentação conduz quasi sempre a resultados contradictorios No caso particular estava um exemplo: as expe- riências de Semon e Horsley não concordavam com as de Masini. Este, publicando nos Archivos Italianos de Laryngologia, os resultados de suas experiências, entre outras conclusões, dizia que o centro cortical laryngêo tinha acção cruzada, o da direita influen- ciando o da esquerda e vice-versa, tal qual como Garel dissera. Em matéria, de phonação funeção tão elevada, não se pôde, continuava Garel, concluir de experiências sobre animaes para o que se pôde passar no homem. Quanto ao exame histologico do bulbo, Garel respondeu que as lesões de que'se tratava eram focos de amollecimento, que não lhe poderiam escapar si estivessem localisados no bulbo. — 97 — Ainda respondendo a 2a objecção de Semon e Horsley, Garel pergunta si elles duvidariam negar as paralysias de uma só parte do corpo, em caso de lesão de um só centro do lado opposto; e porque o larynge não está sujeito ás mesmas leis ? Quanto á ultima objecção de Semon e Horsley, pensão Dr. Luc (i) que neste ponto estes autores acharam a falha da couraça de seu adversário, e las- tima que Garel se servisse de uma denominação im- própria qual a de posição cadaverica. Conclue o Dr. Luc dahi, que o exame rigoroso do movimento do larynge tenha falhado nas observações de Garel. Comtudo, si até bem pouco tempo eram fundadas taes considerações contra as observações de Garel, hoje podemos dizer que não teem razão de ser, é neste ponto ainda os últimos trabalhos inglezes (1896) acabam da dar a mais completa victoria a Garel. O centro cerebral de abducção das cordas acaba de ser descoberto, e a sua lesão ao mesmo tempo que a lesão do centro de adducção, poriam as cordas em posição cadaverica. Pois nos casos de Garel a lesão affectava, é de suppor,os dous centros realizando aposição cadaverica tão criticada ; na verdade, sabemos hoje que o centro respiratório fica muito juncto do centro phonatorio, e que a lesão, minima que seja, compromettendo o centro phonatorio poderia muito bem alterar o respiratório. (i) Nevropathies laryngées, 1892. F.—13 - 98 - As observações de Garel resistindo a todos os embattes da critica deixam bem patentes as paralysias de origem cerebral. Existem portanto paralysias laryngeas de origem cerebral. Os casos observados, comtudo, ainda contam-se como factos raros, e além dos de' Garel, do de Rebil lard (1886) temos apenas mais dous de Déjérine com- municados em 1891 á Sociedade de Biologia, de Pa- ris, em que um foco de amollecimento occupava a sub- stancia branca subjacente á 3a frontal esquerda. Nestas observações de Déjérine ha a particula- ridade importante de que o exame histologico do bulbo foi feito, sem ter o autor encontrado a minima lesão. Está aberto na clinica um capitulo perfeitamente delimitado .e assente em sólidos alicerces ; -falta porem que aobeervação o enriqueça, e venha trazer-lhe mate- riaes de estudo, e observações que a esse respeito teem até hoje sido, por assim dizer, nullas. Sem novas observações, serão theoricas as discus- sões sobre sua etiologia, symptomatologia, pathogenia etc.—Do pouco estudado, comtudo, podemos concluir que as paralysias laryngeas corticaes podem ser quer respiratórias que phonatorias, quer completas, quer unilateraes, quer bilateraes, que múltiplas e variadas podem ser as causas que possam lesar os centros laryngêos e as fibras do feixe motor laryngêo, e que o prognostico deve variar, mas sobre o qual por em- quanto nada podemos dizer de positivo. — 99 — Fechamos este capitulo, repetindo com Paulo Raugé (Arch. int. de laryng. 1892): ''esta pretendida raridade das paralysias laryngeas cerebraes poderia bem não ser sinão uma illusão. Emquanto a aphasia, desde o principio de sua producção, se accusa por uma perturbação notável, o mesmo não se dá com a falta de adducção de uma só corda, que pôde não causa embaraços á respiração e trazer modificações imper- ceptíveis na voz (factos de Déjérine). Accrescentemos que na mór parte das vezes, trata-se de doentes, que em razão de suas lesões cerebraes faliam pouco ou nada, e em que a execução do exame laryngoscopico é difficil na maioria dos casos, etc... " e continua o mesmo autor: "a paralysia laryngea de origem cor- tical ou sub-cortical cessará sem duvida de ser um phenomeno clinico excepcional, no dia em que nos serviços dos hospitaes, tivermos adoptado o principio de examinar o larynge em todos os doentes victimas de lesões cerebraes, e nos hemiplegicos em particular. " CAPITULO VI D, raraip arjnps moccionaes Na divisão, que estabelecemos em um dos capí- tulos precedentes, dissemos que reservaríamos ás pa- ralysias laryngeas, para as quaes não se tem reco- nhecido uma lesão apreciável, o nome de funccionaes. Esta divisão também se dá com outros grupos de pa- ralysias, como por exemplo com as ophtalmoplegias, glossoplegias, etc Muitos autores, não querendo re- conhecer, como causas destas paralysias, sinão a hys- ^teria, preferiram chamal-as—paralysias laryngeas hys- tericas. Si bem que seja verdade que na etiologia das •paralysias funccionaes, a hysteria occupa logar mui- .tissimo avantajado, não podemos comtudo levar nosso -exclusivismo a esse ponto, porquanto reconhecemos que causas ha independentes da hysteria e que teem ,-claramente produzido as paralysias em questão. Len- nox Browne diz que a aphonia funccional é bem mais raramente hysterica do que se pensa, e é preciso des- confiar dessa expressão, que não serve muitas vezes senão para nos desculpar a nossos próprios olhos, por não acharmos a verdadeira* causa. -- 102 -- Massei também se recusa a capitular de hysteri- cas todas essas affecçoes, quando diz que a hysteria não é sua única causa productora. Aquelles, que tudo querem fazer correr por conta da hysteria, os trabalhos e estudos de Charcot sobre a hysteria no homem, fizeram chegar a verdadeiros extremos. Todo o indivíduo affectado, para elles, deve ter sua tara hysterica : as causas que por si só pode- riam explicar a affecção não são sinão predisponentes ou provocadoras das manifestações da nevrose; se- gundo elles, as paralysias hystericas laryngeas seriam muitas vezes a única manifestação da hysteria. Nós admittimos a hysteria como que avassalando quasi todo o capitulo etiologico das paralysias func- cionaes; não deixamos, porém, de reconhecer que causas ha que não nos parecem de origem hysterica. Vejamos. Follenfand (i) refere em sua these paralysias la- ryngeas de origem reflexa; e destas as que mais vezes são citadas são devidas a perturbações de funeção do apparelho genital da mulher, como sejam o ame- norrhéa, dysmenorrhéa, etc. Lennox Browne pensa serem estas perturbações muito freqüentemente causas de paralysias laryngeas, ao contrario de Mackenzie e Massei que as reputam mais raramente causadoras dessa affecção, do que se pensa. A tuberculose em seus primeiros períodos tem produzido a aphonia paralytica, e as observações (1) These de Paris, 1878—Aphonia nervosa. — 103 — registradas na these de Lubet-Barbou são muito con- vincentes. Mancll, que refere muitas observações de- vidas a essa causa, quer explicar as paralysias, que para elle são muito mais freqüentes á direita, pelos effeitos de compressão que productos exsudativos do apice do pulmão direito exerceriam sobre o recur- rente direito, que como vimos affecta nesse ponto a mais intima relação com esse apice. Com Massei e com Morell Mackenzie, discordamos do modo de ver de Mandl, primeiro, porque as observações nem sem- pre concordam quanto á prevalência do lado direito, segundo, porque a restauração da voz em taes casos é facto muitas vezes observado, e no entretanto tal facto não se poderia admittir, dado o comprometti- mento do tronco recurrente no apice pulmonar. E nesta ordem de indagações, encontraremos ainda muitos casos em que a hysteria não pôde abso- lutamente ser invocada. Como explicar taes paralysias, sem admittirmos phenomenos inhibitorios de ordem reflexa? Os factos de paralysias laryngeas, como os de asthma, devidos a lesões feitas nas fossas nasaes (cau- terisações), á existência de polypos, etc, parecem-nos também poder se filiar a essa ordem de explicação, si bem que os que se batem pelo exclusivismo hysterico affirmem que nesses casos, si a hysteria não é mani- festa, a paralysia é seu primeiro signal. Ainda a chlorose e as anemias piofundas devidas a varias causas têm sido observadas dando logar ás paralysias funccionaes. — 104 — Incontestavelmente, porém, é a hysteria que fi- gura em primeira linha no numero das causas de pa- ralysias funccionaes. Esta grande nevrose que produz as mais variadas perturbações paralyticas, ora fulmi- nando metade do corpo, ora produzindo as variadas fôrmas das ophtalmoplegias, glossoplegias, etc, tam- bém não tem perdoado o larynge ; e neste capitulo abundam por tal fôrma as observações na sciencia, que seria um nunca terminar si aqui quizessemos citar os autores que têm regi trado ca>os em suas obras. O medo, o susto, o terror, a cólera, etc, têm sido as occasiões mais freqüentes das manifestações hystericas paralyticas do larynge. As paralysias laryngeas funccionaes accommettem ordinariamente os músculos da phonação, e tal é a freqüência com que taes factos :-ão observados, que os autores não trepidam em filiar pelo menos as paraly- sias hystericas ao grupo das cerebraes; comtudo Thaon cita dous factos de paralysia hysterica dos abductores e que necessitaram a tracheotomia. Isso não nos admira, uma vez que hoje sabemos que tam- bém no cérebro está um centro de abducção. Na mór parte das vezes os músculos da phonação são attingidos conjunctamcute ; mas existem muitos exemplos de paralysia isolada deste ou daquelle músculo. A este respeito muitas memórias têm vindo á publicidade para a explicação desse phenomeno, que realmente é curioso. Faz-se patente, pela leitura dessas memórias que a hysteria, tem sido a causa predomi- uanre dessas paralysias, mas que também outras cau- — io5 — sas são capazes do mesmo effeito, como a tuberculose (Proust e Tissier) o catarrho pharyngêo, etc. etc. As paralysias funccionaes podem ser unilateraes ou bilateraes: estas são mais freqüentes. Como symptoma (i) muito freqüente desta espé- cie de paralysias, temos de assignalar ou a perda com- pleta da voz, ou si tal não se dá em absoluto, ao menos, um abaixamento notável de tonalidade. Esta é a razão porque muitos denominam estas paralysias de aphonia nervosa, e de aphonia hysterica : emquanto que a voz fallada é abolida, o rir, a tosse são perfei- tamente normaes, e os hystericos aphonos para a con- versação, involuntariamente podem cantar árias ou canções distrahidamente recordadas, e mesmo falia em voz alta no estado de somno. Alem disso, nos casos de hysteria quasi sempre ha concomittancia de anesthesia do larynge e de pa- ralysia dos lábios e mesmo dos músculos da língua. Convém não confundir, comtudo, a aphonia hyste- rica com o mutismo hysterico (apsytiria) tão bem es- tudado por Charcot, e no qual o doente não falia e nem mesmo pode articular as palavras, por ter perdido a noção da articulação das palavras. Isto não se dá na aphonia, em que o doente falia murmurando com os lábios, somente não ha voz. O diagnostico far-se-á a custa da inspecção do larynge, pela qual verificaremos, no caso affirmativo, (1) Esta descripção refere-se mais ás paralysias hystericas que são as muitís- simo mais freqüentes. F.—14 — io6 — de aphonia nervosa, a ausência de todo neoplasma e de todo obstáculo mechanico. E' escusado, alem disso, dizermos que devemos fazer tal diagnostico quando, alem de tudo, for com- pleta a ausência de symptomas que nos façam descon- fiar de lesões bulbares, nevrites etc. O prognostico em geral não offerece gravidade, sendo certo, comtudo, que casos tem havido, principal- mente de aphonia hysterica, em que a voz nunca mais foi recuperada. CAPITULO VII m m o u Neste capitulo rapidamente enfeixámos as con- clusões practicas que nos poude suggerir nosso mo- desto trabalho. De facto, é por occasião do tratamento que o me- dico tem necessidade de discutir e precisar a etiologia, catalogar e synthetisar a symptomatologia, interpre- tal-a para poder adduzir princípios sobre que baseie seu juízo, e institua sua therapeutica. E' mesmo obedecendo a essa ordem de indica- ções, que em todos os tempos a therapeutica tem se dividido em causai, symptomatica, etc. Para as paralysias laryngeas, si nem sempre po- demos estabelecer um tratamento causai, devemos sempre tentar o symptomatico. I—Paralysias periphekicas.— Tratamento cau- sai—Seria este o ideal dos tratamentos, e ^therapeutica pathogenica de Bouchard o ideal das therapeuticas> si o sublata causa, tollitur effectus, fosse, em patho- loo-ia, uma regra sem excepçao. Infelizmente, na mór — 108 — parte das vezes assim não accontece, e disso temos exemplos bem frisantes com as paralysias do larynge. O tumor que comprime o nervo recurrente (por ex.), que o irrita a principio, e mais tarde acaba por desor- ganisal-o, poderá ser retirado pelos meios de que dis- puzermos : cessa a causa de compressão, mas o effeito, a paralysia, essa ficará sempre. Uma preliminar, portanto, deve ser estabelecida desde já: no tratamento de qualquer paralysia laryn- gea, devemos sempre ter em vista que a paralysia tanto mais probabilidade terá de ser curada, quanto mais promptamente for diagnosticada, e mais depressa for removida a causa do mal. Si na theoria essa já é uma objecção seria á the- rapeutica causai, na practica ella encontra embaraços absolutamente inamoviveis. Especialisando o caso ao nosso assumpto, como sustar os estragos de um câncer do esophago, ou removel-o ? A thyroidectomia é uma operação de prognos- tico sombrio, os aneurismas dos grossos troncos arte- riaes do pescoço, são de um tratamento cirúrgico de- licadíssimo e problemático, quando é possível, e o tratamento medico para os aneurismas thoracicos são de completa inefficacia, para o nosso caso ao menos, para não dizer sempre. Comtudo, o quadro etiologico das paralysias la- ryngeas tem limites muito vastos, e não devemos desesperar dos resultados do tratamento causai, si em grande numero de casos elle inefficaz. Outras causas —- 109 — ha em que os nossos recursos therapeuticos são de grande alcance: as gommas syphiliticas, as nevrites syphiliticas cedem ao tratamento especifico; o trata- mento iodurado e tônico é muito vantajoso nas hyper- trophias glandulares de origem escrophulosa; as ope- rações cirúrgicas na região cervical são muitas vezes coroadas dos melhores successos ; abcessos compres- sores podem ser abertos; e si é verdade, como diz o Dr. Luc, que no arco aortico as simples aortites são causas de compressão do recurrente, ellas podem ser perfeitamente combatidas pelo repouso, medicação iodurada e revulsiva. Tratamento symptomatico.—O tratamento symp- tomatico será sempre estabelecido á vista de dous grandes perigos, a que podem estar sujeitos os laryn- goplegicos. De um lado, pôde haver a anesthesia do larynge, a abolição dos reflexos, e a abertura permanente do ori- ficio superior do larynge cova paralysia da epiglotte: symptomas esses todos dependentes da paralysia do laryngêo superior, e que podem ser causa dos mais sérios damnos, por occasião do doente ingerir alimen- tos, taes como suffocação, pneumonias etc. De outro lado, podem occorrer os gravíssimos perigos da laryngoestenose devida á paralysia dos abductores e conseqüente contracção espasmodica dos adductores. Pois bem: o tratamento symptomatico urge nesses dous casos, e ahi não nos importa saber qual seja a causa da paralysia. -- I IO — No primeiro caso devemos alimentar o nosso doente introdusindo-lhe uma sonda esophagiana, e por ella fazendo passar alimentos líquidos ou semi-li- quidos, e assim proceder até que cessem os sympto- mas que, na maioria dos casos, são devidos á paralysia diphterica, que por sua vez devemos combatter ao mes- mo tempo pelos tônicos e pela electricidade. No segundo caso, diante de phenomenos asphy- xicos, quando nos falhe a medicação calmante pelas inhalações de chloroformio, pelas injecções morphi- nicas, pelas poções bromuradas etc, devemos sem de- mora reccorrer á tracheotomia e assegurar, pela ca- nula, um caminho franco ao ar. II — Paralysias de causa central.—As conside- rações, que até aqui fizemos, quanto ás paralysias la- ryngeas periphericas, também se applicam ás de causa central. E' verdade que nestas, na mór parte das vezes, trata-se de casos desesperados, e em que, portanto, mais tem logar o tratamento symptomatico. Comtudo, si é verdade, como diz Fournier, que em 8o % o tabes é de origem syphilitica, devemos sempre neste caso instituir o tratamento especifico, com tanto maior probabilidade de successo quanto mais cedo interviermos. E si como já dissemos, algumas vezes as paralysias laryngeas, são symptomas preataxicos do tabes, será de boa regra intervir com esse tratamento sem demora, não esperando outro qualquer symp- toma. — 111 — III—Paralysias laryngeas funccionaes—Estas sãoas que mais teem sido beneficiadaspelos tratamentos variados, tentados desde muito tempo Nos casos de hysteria, a suggestão.as emoções vivas são muitas vezes apontadas como causas de cura. E nãó sabemos si a verdadeiros phenomenos de suggestão e de emoção de- vamos os resultados obtidos pelas variadissimas inha- lações, pulverisações e tópicos, ou si devamos attribuir esses resultados, como quer Mackenzie, a uma esti- mulação da membrana mucosa do larynge, produ- zindo por acção reflexa um leve spasmo de glotte. Teem sido empregadas: inhalações de vapores impreg- nados de ammonea, e de chloro (Pancoast, de Phila- delphia , de calamus aromaticus, de creosoto etc, so- luções estimulantes e adstringentes de nitrato de prata, chlorureto de ferro, que são pulverisadas ou com que se pincela a mucosa laryngea. Todos esses meios porem falham muito, e o único que dá hoje os melhores resultados é a electricidade applicada por meio de correntes fará dicas. Este meio tem sido hoje applicado também á maioria das laryngoplegias produzidas por nevi ites, e com optimo resultado. Ora de dous modos se pode faradisar o larynge : exteriormente pela pelle do pescoço, ou levando, o polo positivo para o interior do larynge, ao mesmo tempo que o polo negativo fica no exterior na pelle do pescoço. Este ultimo processo foi muito preconisado por Mackenzie que diz que, nos casos de aphonia chronica, -- 112 -- só elle é efficaz. Para esse fim, Mackenzie ideou um electrodo para o interior do larynge, que tem a forma de uma sonda laryngiana, e que permitte excitar-se este ou aquelle músculo. Este electrodo de Mackenzie mais tarde foi modificado por Fauvel, que reuniu no mesmo excitador o polo negativo e o polo positivo, e que, por um dispositivo fácil de manejar-se, commu- nicavam-se quando o excitador estava dentro do la- rynge. Obteve-se então um terceiro processo de faradisação, totalmente intralaryngêo. Para proceder-se a faradisação intralaryngéa, Mackenzie aconselha que, guiado pelo espelho laryn- gêo, o operador mantenha o reophoro um segundo ou dous em contacto com as cordas vocaes, e que depois o retire. Isto se repita 5 ou 6 vezes em cada sessão. Muitas vezes basta uma primeira applicação para se obterem resultados admiráveis, que serão comple- tados por applicações successivas. Tratamento con- secutivo porem deve ser dado ao doente, a fara- disação ao menos cutânea deve ser mantida por muito tempo, e a voz deve ser exercitada tanto em relação e intensidade como em relação a duração. —Por fim, digamos que o Dr. Oliver, de Boston, tem muito preconisado a gymnastica dos músculos do larynge, exercida pelos diversos processos de massagem externa. Diz elle ter colhido os melhores resultados com este methodo, que só, é mais que suf- ficiente, em muitos casos. ■o ».—15 Physica Medica I Os espelhos mais usados em physica são planos esphericos e cylindricos. II A imagem nos espelhos planos é symetrica do objecto, da mesma grandeza, á igual distanciado outro lado e virtual. III O laryngoscopio é uma das mais úteis applicações das propriedades dos espelhos. Chimica Inorgânica I O phosphoro é um metalloide penta-atomico. II São notáveis as propriedades dos estados allotro- picos do phosphoro. III No organismo elle se encontra em grande quan- tidade, principalmente sob a fôrma de phosphatos. — n6 — Botânica e Zoologia Médicas I A família das Rubiaceas pertence á grande classe das gamopetalas infero-ovariadas. II Seu grande numero de gêneros pôde ser grupado em tres tribus : Cinchona, Coffea e Rubia. III Esta família possue espécies da mais alta impor- tância em medicina, como: a Quina, o Café, a Ipeca, etc. Anatomia Descriptiva I As cordas vocaes inferiores, únicas verdadeiras cordas vocaes, inserem-se: adiante, na parte média do angulo reintrante da cartilagem thyroide, e atrás, no angulo anterior da cartilagem arytenoide. II O comprimento médio das cordas vocaes é de 20 a 24 millimetros no homem, e de 16 a 18 na mulher. III Fazem corpo das cordas vocaes inferiores os mus- guIos thyro-arytenoidêos internos, os ligamentos thyro- arytenoidêos inferiores e a mucosa. — ii7 — Histologia Theorica e Pratica I A mucosa do larynge é por toda a parte forrada de epithelio vibratil estratificado ; exceptuam-se a epi- glotte e as bordas das cordas vocaes inferiores que têm um epithelio pavimentoso espesso. II As papillas do derma da mucosa laryngea são muito desenvolvidas, principalmente ao nivel das bor- das das cordas vocaes inferiores. III As glândulas do larynge são em cachos, com ori- ficio punctiforme visível a olho nú. Ellas ou são disse- minadas ou formam grupos. As cordas vocaes inferio- res não as teem absolutamente em suas bordas livres. Chimica Orgânica e Biológica I A Quinina é um alcalóide que existe no estado natural nas cascas das Quinas, familia das Rubiaceas. II Os saes de Quinina mais empregados em Medi- cina são: o sulfato, o bi-sulfato, o chlorhydrato, o bromhydrato e o valerianato. III O sulfato de quinina é insoluvel na água. — 118 — Physiologia Theorica e Experimental I O som da voz forma-se ao nivel da glotte, não só pela vibração da columna de ar expirado passando por um orificio estreitado, como principalmente pela vibração das cordas vocaes inferiores. II Parece lógico admittir que na corda vocal a única parte que vibra é o músculo thyro-arytenoidêo. III Este músculo tende a corda vocal, se contrahindo. Pathologia Geral I A idade representa um factor etiologico de summa importância no estudo das moléstias. II As idades do homem foram divididas pelos pa- thologistas em: infância, mocidade, maturidade e ve- lhice. , III Ha moléstias que teem certa predilecção por certa idade. — n9 — Anatomia e Physiologia Pathologicas I O poder de regeneração dos tecidos e dos órgãos do corpo humano é limitado. Porções volumosas de tecidos, como um membro, um dedo, uma porção de figado, de cérebro etc, não podem nunca se regenerar. II E' extraordinariamente duvidoso que as cellulas ganglionares e os filetes nervorsos do systema nervoso central possam se regenerar nos indivíduos comple- tamente desenvolvidos. III Pelo contrario a regeneração e a multiplicação anormal dos nervos periphericos podem se produzir e preencher perdas de substancias extensas. Chimica Analytica e Toxicologica I Na analyse qualitativa o exame attento das pro- priedades physicas e organolepticas fornecerá uteis indicações, que si nem sempre caracterisam o corpo, impedem muitas vezes de confundir-se com outro. II No conhecimento das propriedades chimicas é que se encontram em geral os meios de distincção e de separação dos elementos de uma substancia. — 120 — III A analyse pode ser ou por "via humida", ou por via secca, conforme se dissolve, ou se funde pelo calor o corpo a analysar. Pharmacologia, Matéria Medica e Arte de Formular I Uma das fôrmas pharmaceuticas mais empregadas e mais commodas são as "pílulas." II A fôrma pilular permitte mascarar todo o sabor acre e desagradável, e se presta a uma dosagem rigorosa. III Todas as vezes que o uso de um medicamento deve-se prolongar por muito tempo, convém usar esta forma. Pathologia Cirúrgica I Os papillomas são os mais communs dos tumores do larynge. II Sua sede de predilecção é ao nivel das cordas vocaes inferiores. III Seu diagnostico positivo só se pode fazer com o auxilio do laryngoscopio. -- 121 -- Pathologia Medica I A laryngite catarrhal aguda é a affecção mais freqüente do larynge. II São seus symptomas : ardor, seccura no larynge tosse rouca e dolorosa, e voz rouca que pode ir até a aphonia. III A dysphonia pôde-se attribuir em grande parte a perturbações pareticas musculares das cordas vocaes. Therapeutica I Diaphoreticos são os medicamentos que provocam ou activam a secreção sudoral. II O Jaborandi é o único diaphoretico scienti- flcamente averiguado. III A atropina actúa como antagonista do Jaborandi, estancando a secreção sudoral. F.—16 -- 122 -- Operações e Apparelhos I Dá-se o nome genérico de tracheotomia á ope- ração que tem por fim a abertura do conducto la- ryngo-tracheal. II Esta operação faz-se por dous processos : rápido e lento. III Um dos maiores perigos da tracheotomia consiste na producção de hemorrhagias ao incisar-se a mucosa laryngo-tracheal. Anatomia Medico-cirurgica e Com- parada i A região infra-hyoide é circumscripta : em cima pelo osso hyoide; em baixo; pela furcula do esterno; aos lados pelas bordas anteriores dos muculos esterno- cleido-mastoidêos. II Esta região apresenta numerosas variedades de forma e dimensões, segundo as idades, sexos e in- divíduos. III Encontram-se nessa região de cima para baixo : o osso hyoide, a membrana thyro-hyoidéa, a carti- lagem thyroide, a membrana crico-thyroidéa, a car- tilagem cricoide e a trachea-arteria. — 123 — Hygiene i Dia a dia em Hygiene a desinfecção progride supplantando outros meios de prophylaxia. II Os desinfectantes gazozos são de pouco valor. III Comtudo o formol, apezar de gazozo, a verificar-se o que delle se espera, virá preencher o ideal dos de- sinfectantes. Medicina Legal T 1 A aphonia é uma das simulações que o medico legista tem de reconhecer. II Si bem que raramente, a aphonia hysterica tem sido observada no homem. III Neste caso é difficil reconhecer a simulação. O exame laryngoscopico é de fraco auxilio; e os gritos in- conscientes, bem como o recobramento momentâneo da voz durante o somno ou sob acção dos narcóticos, são factos observados nas verdadeiras aphonias hystericas. — 124 — Obstetricia I A influencia da hereditariedade sobre as pre- nhezes múltiplas é comprovada por muitos exemplos. II * A superfecundação é um facto admissível nas prenhezes múltiplas. III A superfetação, porém, é inadmissível. Clinica Propedêutica I A escuta da voz é um bom meio auxiliar dia- gnostico. II A voz bronchica pôde ser modificada em sua intensidade, continuidade (voz intermittente) ou consonância. III A egophonia ou bronchophonia intermittente, tre- mulante, é muito commum nos derrames pleuriticos. — 125 — Clinica Dermatológica e Syphili- graphica I Entre as laryngopathias syphiliticas secundarias o erythema syphilitico é muito commum. II A laryngite syphilitica distingue-se em geral das laryngites catarrhaes communs, pela cor sombria, carminada, intensa com salpicos accentuados da mu- cosa; estes caracteres são mais nitidos ao nivel das cordas vocaes. III O erythema syphilitico cede em geral ao trata- mento especifico da syphilis, mas nunca em menos de 20 a 25 dias. Clinica Cirúrgica (2a cadeira,) I Clinicamente os tumores se dividem em benignos e malignos. II A marcha invasora, a infecção dos gânglios próxi- mos, a tendência á ulceração ainda clinicamente servem para differençar os tumores malignos dos benignos. III Os tumores malignos reincidem quando extir- pados. -- I2Ó -- Clinica Ophtalmologica I A conjunctivite purulenta representa o primeiro factor de cegueira dos recém-nascidos. II A contagiosidade da conjunctivite purulenta é acceita por todos os clínicos. III O nitrato de prata é de um valoroso recurso no curativo da conjunctivite purulenta. Clinica Cirúrgica (ia cadeiraj I Nos casos de asphyxia por membranas diphte- ricas, a tubagem do larynge tem sido exclusivamente adoptada, depois do aperfeiçoamento do instrumental empregado. II A tracheotomia, comtudo, não tem por isso per- dido seus foros de importância na clinica, e, mesmo sem ser uma operação preliminar, tem indicações bem precisas. III O cirurgião não deve hesitar em praticar a tra- cheotomia, todas as vezes que a asphyxia é persistente nas paralysias respiratórias. — 127 — Clinica Medica (2a cadeira) I Os aneurismas da crossa da aorta são uma das causas mais freqüentes de paralysias laryngeas. II Os phenomenos de suffocação e tosse coquelu- choide são devidos á contractura espasmodica dos músculos do larynge. III O repouso, a medicação iodurada e a electri- cidade têm dado algu.n resultado no tratamento dos aneurismas aorticos. Clinica Pediatrica I A coqueluche é uma das moléstias mais communs na infância. II Uma de suas mais terríveis complicações é a broncho-pneumonia. III As elevações de temperatura, no curso da coque- luche, indicam quasi com certeza, uma complicação broncho-pulmonar, mesmo na ausência de outros signaes physicos. — 128 — Clinica Medica (ia cadeira) I Em 1876, Charcot descreveo pela primeira vez uma nevrose rara e singular do larynge, á qual elle deu o nome de vertigem laryngea. II . E' ella um ictus laryngêo especial independente da epilepsia essencial e do tabes, com cujas manifes- tações laryngeas os autores têm-n'a confundido algumas vezes. III A pathogenia da vertigem laryngea ainda é obscura, havendo na sciencia numero muito restricto de observações. Charcot pensa ser um phenomeno clinico comparável á vertigem de Menière. Clinica Obstetrica e Gynecologica I O volume e o aspecto do ventre bem como o edema supra-pubiana muito pouco valor têm no dia- gnostico das prenhezes duplas. II Só a apalpação e a escuta nos fornecem signaes positivos. III A posição que os fetos guardam entre si cons- tituem muitas vezes impossibilidade para as manobras •de versão reclamada. — 129 — Clinica Psychiatrica e de Moléstias Nervosas I Nos casos de loucura hereditária, os individuos apresentam desde o nascimento, certos signaes espe- ciaes, chamados estigmatas e que podem ser ou phy- sicos ou psychicos. II Entre os estigmatas physicos notam-se as mal- formações do craneo, e do esqueleto todo, o desen- volvimento tardio e incompleto do systema muscular, vícios de corformação dos órgãos dos sentidos etc. III Os estigmatas psychicos variam nos idiotas, nos débeis e nos que Magnan chama degenerados super- iores; nestes notam-se a emotividade anormal, des- harmonia das faculdades, obsessões e impulsões ir- resistíveis, aberrações genitaes, etc. F.—17 APH0R1SM0S M H1PPOCRATES I Vita brevis, ars longa, occasio proeceps, expe- rientia fallax, judicium difficile. {Secc. I, Aph. I) II Si febre vexata, nullo existente in faucibus tu- more, repentina accidat strangulatio, lethrale. {Secc. IV, Aph. 34) III Natura corporis est in medicina pricipium studii. (Secc. I, Aph. VII) IV Natura morborum curationes ostendit. (Secc. II, Aph. III) V Somnus, vigilia, utraque modum excedentia, ma- lum denuntiant. {Secc. II, Aph. III) VI Cibus, potus, venus, omnia moderata sint. (Secc. II, Aph. IV) Visto — Secretaria da Faculdade de Medicina e de Pharmacia do Rio de Janeiro, 15 de Outubro de 1896. O secretario, Dr. Antônio de Mello Muniz Maia.