n rio n mi no PAULA CASTRO ummma ririlrwa de adultos João da Costa Lima e Castro............... i onmca cirúrgica de aaunos. Hilário Soares de Gouvêa.................. Clinica ophthalmologica. Erico Marinho da Gama Coelho............ Clinica obstetrica egynecologica. Cândido Barata Bibeiro.................... Clinica medica e cirúrgica de crianças, João Pizarro Gabizo........................ Clinica de moléstias cutâneas 3 sypinl- ticas. João Carlos Teixeira Brandão.............. Clinica psychiatrica. LENTES SUBSTITUTOS SERVINDO DE ADJUNTOS Augusto Ferreira dos Santos............... Chimica medica e mineralogia. Antônio Caetano de Almeida............. Anatomia topographica, medicina opera- tona experimental, apparelhos e pe- quena cirurgia. Oscar Adolpho de Bulhões Ribeiro........ Anatomia descriptiva. Nuno Ferreira de Andrade................. Hygiene e historia da medicina. José Benicio de Abreu..................... Matéria medica e therapeutica especial- mente brasileira. ADJUNTOS José Maria Teixeira....................... Physica medica. Francisco Ribeiro de Mendonça............ Botânica medica e zoologia. ".•••••• ••.....••• ••........,-•••........... Histologia theorica e pratica- Arthur Fernandes Campos da Paz......... Chimica orgânica e biológica. ........................................... Physiologia theorica e experimental. Luiz Ribeiro de Souza Fontes............... Anatomia e physiologia patológicas. . ..---............ ..... .............. Pharmacologia e arte de formular. Henrique Ladislau de Souza Lopes......... Medicina legal e toxicoloiíia Francisco de Castro....................... > b Eduardo Augusto de Menezes........... ) „,. Bernardo Alves Pereira.................. [ Clinica medica de adultos. Carlos Rodrigues de Vasconcellos...'....... ) Ernesto de Freitas Crissiuma...........[... \ Francisco de Paula Valladares............ ) „.. Pedro Severiano de Magalhães............. [ Clinica cirúrgica de adultos. Domingos de Góes e Vasconcellos. .........' \ ) Pedro Paulo de Carvalho. . n;ni/>a «k »„* • José Joaquim Pereira de Sua'............. aSL rS/J™ • gYnecol°ò'i('a- Luiz da Costa Chaves de Fada i"....... c nS d^ molZf81? de C'ianÇa^.1 ............ túnica ue moléstias cutâneas e syphili- Carlos Amazonio Ferreira Penna........... CliS ophthalmologica. Clinica psychiatrica. que lhe L~aAprFeSn!addaase.nã° aPPr°Va "em r^^^^m^ euattidas nas" ttiese i'yp. e lith.de J. D. de Oliveira-Rua do Ouvidor «. l Ki tos t c ¥@= llii) fe^rfmÃo N. 98 1 A estatística bem organisada dos paizes cultos demonstra k luz da evidencia que a mortalidade iufantil é excessiva era relação â da idade adulta. Etn Londres, durante o periodo de dez annos, decorrido de 1851 a 60, a mortalidade das crianças de 1 até 5 annos foi de 43,8 por cento da mortali- dade geral. A media de 1861 á 70 foi de 81,6 por mil, ao passo que nos oito annos seguintes foi de 73,8. Em Pariz, durante o periodo de 4 annos (1862 a 66), a media das crianças até um anno de idade regulou 290 por mil (Bertil- lon). Em Berlim, durante 15 annos (1854 a 1868), cerca da terça parte de todos os óbitos se verificou nas crianças até ura anno. Era Nova-York, durante 7 annos (1866 á 72), a porcentagem media foi, nas crianças de 1 a 5 annos de 50,0. Na nossa cidade do Rio de Janeiro, emfim, pela estatística mortuaria annexa aos relatórios do ministério do império, nos 10,251 óbitos que se deram em 1880, abatidos os 864 de idade ignorada, 2,404 foram por conta das crianças de 1 a 7 annos, cifra que eqüivale á porcentagem de 23,5. As condições anatomo-pathologicas peculiares ás crianças, esse ente frágil destinado a completar-se organicaraente no percurso do tempo, provocando susceptibilidade mórbida mais exagerada e menor resistência á acção mais ou menos violenta dos meios exteriores, explicam em parte a mencio- nada revelação dos dados numéricos. Outras causas, porém, independentes da natureza orgânica infantil e susceptiveis de remoção por intermédio de uma therapeutica bem conduzida e, maxime, pelo benéfico influxo do cumprimento dos pre- ceitos hygienicos, contribuem também extraordinariamente para engrossar a verba raortuaria. A só reflexão de que as porcentagens da lethalidade in- fantil estão sujeitas a grande fluctuaçao, isto é, variam para os differentes paizes, para as diversas localidades dos mesmos paizes e para as mesmas localidades em epochas variadas e conforme a alteração dos meios sanitários, comprova peremp- toriamente a ultima asserçao. Para nao entrar em dilatadas considerações demonstra- tivas a tal respeito, que me affastariam para longe do as- sumpto essencial, apresentarei tão somente um facto que por si só é concludente. Extrahil-o-hei dos documentos da Inglaterra, esse paiz a quem compete a primazia era matéria de estatística, tanto pelo desenvolvimento que alli tem tido essa importante sciencia, como pelo escrúpulo e exac- tidâo com que é cultivada. De um milhão de crianças re- cém-nascidas, nos districtos salubres (healthy), diz o Re- gistar General, morrem no fim de cinco annos de existência 175,410 ; ao passo que, no districto de Liverpool, isto é, n'aquelle que é dotado das mais desfavoráveis condições sa- nitárias, do mesmo numero de recém-nascidos fallecem, du- rante o mesmo praso, 460,370, isto é, perto de metade. Ha, pois, um excesso de 284,960 fallecimentos nos districtos in- salubres. (1) D'entre as cansas de morte que figurara nos quadros res- pectivos referidos k infância representam papel demasiada- mente notável as moléstias do apparelho digestivo. Essas en- fermidades lavram, sobretudo, no primeiro anno da vida, em conseqüência dos vicios de alimentação, causa cuja remoção está mais do que nenhuma sob a dependência directa da hy- (1) V. A treatise of Hygiene and Public Health, edited by Albort Buck, vol. :i»—London—1879. - 5 — giene bem dirigida. Em 1992 fallecimentos, no primeiro anno da vida, diz o professor Jacobi de Nova-York, 40,89 por cento pertenceram a desordens digestivas e 21,01 a mo- léstias do apparelho respiratório ; em 695 no segundo anno 9,06 foram por conta do apparelho digestivo e 36,54 por conta do pulmão. (1) Pela sua excessiva freqüência e fatalidade, escreve o pro- fessor Thomas Curtis, de Boston, as moléstias do apparelho digestivo sao as mais importantes de todas as das primeiras idades. Oommungando nas mesmas idéias, reflecte o Dr. Johann Steiner de Vienna : « A alimentação natural, em quantidade e qualidade convenientes, realisa nos primeiros annos da vida as mais importantes condições de prosperida- de da criança e do desenvolvimento actual e consecutivo de sua economia. Os erros e as negligencias commettidos em um ou outro d'estes dois sentidos acarretam resultados funestis- simos : é a elles que deve ser attribuida, na máxima parte, a cifra elevada da mortalidade infantil no primeiro anno da existência, de conformidade com a experiência quoti- diana. » (2) Não menos concorde com os supracitados é o distincto professor Fonssagrives : « O recém-nascido, diz elle, en- tregue de todo á necessidade de construir o seu edifício or- gânico, vive á custa do apparelho digestivo ; mas por causa d'elle também morre mais freqüentes vezes. Concebe-se a extrema susceptibilidade de um apparelho que, collocado durante os nove mezes da gravidez em inércia funccional completa, é abruptamente chamado á actividade, e actividade tal que prepondera de alguma sorte sobre todas as outras. A mucosa gastro-intestinal que, durante a vida intra-ute- rina, só possue as funcções geraes das mucosas, e apenas se- (1) Jacobi—Infant Hygiene, in Albert Buck—1879. (2) Joann Steiner—Compendium des maladies des enfants—Traducção de Keraval—Pariz—1880. — 6 — creta muco em pequena quantidade, adquire rapidamente organisaçao nova em relação com as funcções de dissolução e absorpçao que é chamada a preencher, e recebe, por inter- médio do aleitamento, o contacto aggressivo de estimulantes novos. E' por isso que a freqüência das moléstias do tubo di- gestivo, no recém-nascido, nada tem que deva supprehender. Ao passo que a morte pelas moléstias deste apparelho só é de 7,7 por cento da mortalidade geral até aos 15 annos, eleva-se a 17,5 nos óbitos até á idade de um anno e nao é menor de 12,8 nos comprehendidos entre 1 e 3 annos. Semelhante estatística põe em relevo a grande importância da dietetica nas crianças, visto que o máo regimen repre- senta, entre ellas, no desenvolvimento das moléstias do es- tômago e do intestino, o papel etiologico preponderante.» (1) De conformidade com a observação dos paizes estrangeiros está o que se verifica a este respeito nesta cidade. Nao po- demos, infelizmente, para tal effeito, fazer cabedal de docu- mentos numéricos. A nossa estatistica medica ainda está por crear : que sobre esse ponto possuímos é tao deficiente e desconchavado que nao nos permitte por esse lado chegar a conclusões positivas e rigorosas. Entretanto da leitura diária dos obituarios e da observação mais comesinha dos nossos práticos se pôde, cora certeza, inferir que as moléstias do apparelho digestivo sao, aqui como em toda a parte, as que maior numero de victimas produzem nas crianças recém-nas- cidas até um anno de idade principalmente. E', com grande differença,nos filhos das classes mais desfavorecidas de meios commodos de subsistência e nos d*aquella a quem a liberdade nao veio ainda garantir o gozo dos direitos civis, que a mor- talidade mais predomina. A razão é obvia e confirmativa de quanto benéfico é o influxo da hygiene. O proletariado mal dormido, mal vestido, mal alimentado, abjura nas fadigas incessantes do trabalho todo o culto ao (1) Leçons d'Hygiene infantüe, por J. B. Fonssagrives—Pariz—1883. - 7 — confortável e aos recursos que a hygiene aconselha ; a pobre escrava, em idênticas circumstancias ao primeiro, quando lhe peza o jugo da escravidão, o que seja dicto de passagem e para honra nossa, poucas vezes lhe succede, vê-se ainda es- bulhada do sagrado direito da maternidade, forçada a aban- donar o filho ao desamparo e â mingoa, para em proveito da ganância de seu senhor, ir dispensar, conjunctamente com o seu leite, caricias e affectos a outro que nao seja o filho das suas entranhas. Deduz-se logicamente do que fica dicto a alta importância, em hygiene infantil, do estudo analytico da alimentação nos primeiros annos. Pondo avisadamente em concurso para trabalho de dissertação semelhante assumpto, a cadeira de pediatria apresentou quiçá a mais alta questão que, em hygiene infantil, se podia aventar. Para levar ao cabo um estudo methodico de tal matéria, dividil-a-hei nas partes estipuladas, pela ordem natural da these proposta. Tratarei primeiro da alimentação na primeira infância com o máximo desenvolvimento possivel, isto é, da amamentação com exclusão do desmame. Passando detida- mente em revista os differentes processos do aleitamento, terei cccasiao de fazer a critica de todos elles, assumpto essencial e inseparável do primeiro. Tratarei, em seguida, do desmame, dos preceitos que a elle devem presidir e da mais adequada alimentação substitutiva do leite, isto é, da ali- mentação própria á segunda infância. Occupar-me-hei por ultimo da alimentação da puericia em grande parte análoga á da idade adulta e que, por conseguinte, dispensa maior desenvolvimento. Este plano comprehende todo o assumpto. _ 9 — I li UEITAfáO I Nao estão bem assentes os physiologistas quanto ao modo por que se faz, em todas as suas phases, a nutrição do ser humano no ventre materno, desde o periodo inicial da con- cepção. Acredita-se com maiores ou menores visos de proba- bilidade que, nas três semanas precedentes á appariçao da allantoide e desenvolvimento da placenta, sao as granula- ções do disco proligero, a camada albuminosa fornecida pela trompa, depois, no utero, os líquidos bebidos por endosmose na mucosa desse orgâo por intermédio das villosidades nas- centes e, emfim, o conteúdo granuloso da vesicula umbilical, as procedências múltiplas e successivas dos materiaes neces- sários para a evolução do ovo nessa sua primeira phase de crescimento. (Bailly) (1). Passada a terceira semana até o fim da gravidez, 03 vasos umbilicaes já desenvolvidos, as villosidades placentarias já vasculadas, absorvem do sangue materno os princípios nu- tritivos que a corrente circulatória estabelecida entre a mai e a criança faz penetrar no corpo da ultima. Assim é que, no orgao materno, o feto representa o papel do vegetal parasitário, que nao prepara por si mesmo os materiaes da sua nutrição, mas se limita, por órgãos especiaes de absorpçao, a sugar do tronco a que está juncto os suecos contidos na sua rede circulatória. Grande parte dos seus or- (1) Bailly Art. Foetus in Jaccoud-Dictionnaire de Medicine ei Chirurgie Pratiques. N. 98 * 31�438 - 10 - gâos jazem em completa ociosidade e a garantia da sua vida depende justamente da intimidade de relação que elle entre- tem com o ser procreador que o mantém no peu seio. Advem, entretanto, o momento critico do nascimento. Lan- çado ao mundo exterior abruptamente, o débil ente vê trans- formadas de súbito as suas condições de existência. A rup- tura do cordão umbilical traz-lhe uma circulação autono- mica ; os pulmões sahem da quietaçao em que se mantinham para proverem á necessidade da respiração ; e os órgãos di- gestivos entram em activo exercício para o preparo dos ma- teriaes da nutrição, taes como lhes vera de fora, transfor- mando-os em substancias absorviveis. Burdach qualifica essa transição de um verdadeiro salto da natureza, dessa natureza que, no conceito unanime dos que perscrutam os seus mys- terios, non facit saltus.A mortinatilidade com uma proporção de 30 por mil confirma o quanto semelhante salto é perigoso. Apezar de tudo, porém, apezar do rompimento das princi- paes relações entre a mãe e o filho nascente, essa separação entre os dous seres não é absoluta. A natureza previdente conserva um laço de união importantíssimo, suficiente para por si só preservar dos mais eminentes perigos o recém-nas- cido : esse laço é realisado pela amamentação. O que é, pois, a amamentação ? E' o acto complementar da gestação, a funcçfio em virtude da qual a mãe transmitte ao filho, por órgãos especiaes denominados glândulas mama- rias, o leite, isto é, o seu próprio sangue modificado pela acção mysteriosa dessas glândulas. A amamentação constitue um dos mais elevados deveres uma das mais nobres prerogativas d'esse ente sublime que a linguagem qualifica sob o nome affectuoso de mãe. En- tretanto esse dever não se cumpre facilmente, suavemente, commodamente ; antes pelo contrario, se por um lado o ins_ tincto da maternidade acha n'elle satisfação ás suas natu- raes aspirações, por outro é tal a serie de dificuldades, de sacrifícios, de dores mesmo, imposta á mae que amamenta, ._ 11 — que grande numero de mulheres pospoem á execução da"nobre tarefa o egoísmo da abstinência d'ella. Esse mal nao é novo. Não é exacta a afirmação dos que attribuem á influencia da civiiisação da nossa epocha a deserção do dever de amamen- tar. Já Aulo-Gellio invectivara esse peccado das damas ro- manas ; as republicas antigas fizeram do aleitamento ma- terno prescripção legal, e Cezar proclamou que era mais commum o vêr-se as senhoras do seu tempo com papagaios ou cães do que com os filhos nos braços. O illustre autor do Emilio, essa preciosidade litteraria de eloqüência e sabodoria, nem sempre, no seio da sua misantropia, justo para com a augusta profissão de Hypocrates, apontara uma pretendida alliança entre os médicos e as mulheres do XVIII século, tendente á esquivança da pratica do aleitamento materno. Dando de barato á veracidade da accusação de J. Jacques Rousseau, aliás perfeitamente contestada, nao é em nossa epocha, diz oprofessor Fonssagrives (1), que tal censura pôde ser formulada. Os médicos de hoje, constituiram-se tutores vigilantes dos interesses das crianças, e essa emulação que em favor d'ellas despertou na imprensa, nas academias, nas sociedades protectoras, é certamente provado zelo, desenvol- vido originariamente pela classe medica. Outras vezes, infelizmente, não é o egoísmo, não é a falta de coragem ou de compenetração profunda da missão de mãe que se oppoem á amamentação materna ou a impossi- bilitara. A propaganda n'este sentido precisa deter-se perante a não verificação das duas condições essenciaes a esse me- thodo de aleitamento. Circumstancias de ordem social, de ordem pathologica sobretudo, ás quaes não pode a hygiene ser indifferente, impedem que elle seja inoffensivo para a mãe e fructifero para a criança, exigindo assim o emprego de outros meios de manutenção para o ente débil. Dahi os differentes methodos de aleitamento mais ou menos adequa- (1) J. B. Fonssagrives—loococit. - 12 - dos, os quaes para serem comprehendidcs n'um estudo com- pleto, devem ser distribuídos, de conformidade com a mai- oria dos autores de nota que têm tratado do assumpto, em aleitamento natural, artificial e mixlo. Tratarei especificadamente d'esses methodos. — 13 — II Comprehende a hygiene infantil sob a denominação de amamentação natural a que é fornecida pela mãi, ou por mulher mercenária chamada ama. D'ahi a divisão da ama- mentação natural em materna e mercenária ou pelo auxilio de ama. DA AMAMENTAÇÃO MATERNA Desde as primeiras épocas da existência os órgãos feminis, em iue se verificam os pasmosos phenomenos da reproduc- çao da espécie, entretêm relações de intimidade profunda com outros órgãos collocados fora do território anatômico dos primeiros ; mas que nem por isso ficam a salvo da lei de solidariedade e de auxilios recíprocos que os allia. Os seios da mulher, como os do homem, na primeira in- fância, nessa idade que se pôde chamar muito propriamen- te com Paulo Lorain a da indifferença sexual, offerecem análogo desinvolvimento. Poucos dias depois do nascimen- to, quando no feto a termo, já transformado em recém-nas- cido, se opera essa revolução orgânica maravilhosa, em que elementos até então ociosos entram em esphera de actividade vertiginosa, os seios infantis, ainda votados ao ostracismo da inaccão, apresentam no entretanto um reflexo do reboliço evolutivo. Invade-os uma tumefacção, concumittante com a secreçao de algum leite ; tumefacção que, em casos raros, pôde attingir ao estado inflammatorio e dar mesmo em resul- tado a formação depus abcedado. Esse estado dos seios Coincidindo muitas vezes com um ligeiro apparelho febril é 199��242 — 14 — cognominado em pathologia pediatrica — febre de leite dos recém-nascidos. Em seguida, os seios entram n'uma phase de puro estacionamento, que se prolonga até o momento da puberdade. A' entrada dos nove para os dez anno*, no periodo flores- cente da adolescência, a indifferenca sexual dos seios começa a desapparecer e o collo da menina, ainda impubere, accen- tua-se com um crescimento relativamente maior que no me- nino, onde o mesmo órgão se conserva em proporção aca- nhada. Quando a menina se vae transformando em moça, isto é, quando advem o momento da puberdade, o crescimen- to já consignado effectua-se mais predominante e os seios preparam-se para o grande acto da reproducção. Não obstante, além do desinvolvimento maior e do colo- rido um pouco mais carregado de que se reveste o mamelão, a castidade impõe ainda á jovem pubere uma parada na evo- lução mamai completa, que é- prerogativa da mulher que cohabitou e que sentindo-se fecundada prepara-se para ali- mentar o amoroso fructo das suas entranhas. Nas ultimas circumstancias a revolução existe na sua integra. Os ór- gãos da lactação começam a intumecer e arredondar-se desde o terceiro mez , as veias sub-cutaneas se tornam mais appa- rentes e marmoram o seio de um rendilhado azul, mais ac- centuado quanto mais próxima é a época do parto. Os seios attingem então a fôrma hemispherica coroada na parte cen- tral e mais saliente do plano horizontal por uma saliência cylindroide ou conoide, denominada mamelão ou papilla, cuja base é representada pelo perimetro interno da areola ou aureola. O colorido roseo escuro do mamelão se pronuncia, invade a aureola e freqüentes vezes transpondo esses limi- tes, espraia-se mais desmaiado na alvura circumvisinha. A pelle pôde mesmo chegar a fender-se e muitas vezes se for- mam, na sua superfície, verdadeiros vergues. E' sobre a proemiuencia mamillar que se virá adaptar a ventosa buccal da criança com o fim de sugar o leite. — 15 — Interiormente, as glândulas mamarias são, Como se sabe, compostas de lobos esbranquiçados, ligados entre si por tecido cellular e adiposo,o qual,existindo em superabundancia,serve de coxim ás nodosidades dos lobos e permitte aos seios o con- torno gracioso que os caracterisa exteriormente. Os lobos são constituidos por lobos elementares ou lobulos, os quaes por seu turno se compõem de acini ou terminações glandulosas, dond« nascem os canaes excretores, que reunidos se lançam em conductos de maior diâmetro, denominados canaes lacti- feros ou galactcphoros, abrindo-se estes em numero de deze- seis ou dezoito no mamelão. O forro interno desses canaes é de natureza epithjlial, nuclear ovoide nos acini, pavimentoso nos galactophoros. Os canaes galactophoros contêm nas suas paredes elementos elásticos e contractivos, representantes de importante papel na excreção do leite ; apresentam, no seu percurso, dilatações ou enchimentos, espécies de reservató- rios, cujo diâmetro pôde attingir até cinco millímetros, ao passo que, no mamelão, esse diâmetro não excede de meio millimetro. Durante a gravidez e quando a lactação se deve estabelecer a glândula mamaria soffre um trabalho prodi- gioso de desinvolvimento. Os conductos lactiferos se alon- gam ; multiplicam-se-lhes as ramificações ; parece que em cada conducto rebentam raizes cada vez mais profundas ; e á medida que elles se estendera do centro para a circumfe- rencia lobos e lobulos se lhes formam na extremidade livre e cada vez mais se multiplicam acompanhando o crescimento da glândula (Sappey). Não menos extraordinário é o desenvolvimento do ele- mento epithelial /'Bailly). Parallelamente ás mudanças anatômicas, que acabo sum- mariamente de passar em revista, os seios adquirem, de concumittancia com ellas, uma funcção physiologica corres- pondente—a secreção do leite. Essa funcção, porém, não se estabelece de sopetão ; acompanha gradualmente a revolu- ção anatômica. - 16 - Nos primeiros mezes da gravidez mais raramente, e mais commumente nos últimos, surde das glândulas mamarias um liquido pouco abundante, que augmenta nos primeiros dias, logo depois do parto, para ser em breve substituído pelo seu análogo o leite propriamente dito : esse liquido é denominado—colostro—. E' um liquido pouco espesso, mucilaginoso, amarellado e de reacção alcalina ; tem por densidade 1040 á 1060, isto é, uma cifra mais ele- vada que a do leite. Submettido ao exame microscópico, o colostro apresenta grande numero de gottas oleosas, glóbu- los maiores que os do leite com aspecto de framboeza, mem- branas finas e transparentes parecendo cellulas de epithelio e outras mais espessas, amarellaças, como caseina solidifi- cada, e finalmente glóbulos análogos aos do leite, não isola- dos como os do ultimo, mas ligados por uma substancia mucosa, solúvel no ácido acetico. Posto em repouso o colostro, como o leite, separa-se em duas camadas: uma inferior, composta de água, saes, lactose, caseina e albumina coagulavel sob a acção do calor ; e ou- tra superior contendo glóbulos butyrosos separados por sub- stancia viscosa que contém os glóbulos especiaes do colos- tro. A sua composição chimica é, segundo Simon, de 4,0 de albumina e caseina ; 4,0 de manteiga ; 7,0 de assucar de leite ; e 17,2 de residuo secco. Estas quantidades diminuem depois da febre do leite (1). Depois dos primeiros dias subsequentes á parturicão o colostro vae passando por alterações graduaes e successivas tendentes a transformal-o no verdadeiro leite, tranformacão que se completa positivamente, em regra geral, no 15». dia. Dessa epocha em diante, salvas as excepções, a secrecão láctea se verifica no rigor da expressão. Não é embalde que a natureza estabeleceo este periodo pre- monitório da secrecão colostral. O colostro está em relação (1) H. Duquesnel-Lait no Novo Diccionario de Medicina e Cirurgia pra« icats de Jaccoud—1875. - 17 - directa, pelas suas propriedades therapeuticas, com as pri- mitivas necessidades do recemnascido, e advoga, como argu- mento natural, as vantagens da amamentação materna. Rico de substancias gordurosas, elle possue por essa razão, no parecer muito rozoavel de Lassaigne, propriedade ligeira- mente purgativa, a qual é aproveitada pela criança para a expulsão do meconio, sem necessidade de qualquer interven- ção artificial, nem sempre innocua. No 15.° dia depois da parturição, disse ha pouco, a secre- cão láctea está positivamente verificada. Antes,porém, desse periodo sobrevem para a mulher um trabalho physiologico nos limites dos factos mórbidos, que não deve ser esquecido na historia e apreciação do aleitamento materno. Da trige- sima sexta á sexagesiraa hora depois do parto a mulher apre- senta aquelle estado que se denomina impropriamente o da febre do leite. Nao é propriamente febre o que a mulher sente : não ha, nessa occasião, exageração de temperatura, nem calafrios, nem o augmento das pulsações radiaes que caracterisam o estado mórbido. Se esses phenomenos apparecerem, a sua explicação deve ser procurada em outro facto que não seja a secreçao physiologica. A mulher sente-se, no emtauto, to- mada de certa lassitude, de cephalalgia ligeira, de alguma agitação, ás vezes mesmo se torna mais loquaz. Coincide com este máo estar certa diminuição no corrimento lochial; os seios apresentam-se turgidos, eutumescem até ás axillas. Dezoito ou vinte e quatro horas depois, se a mulher ama- menta, sobrevem uma transpiração m^is copiosa e a ligeira indisposição desapparece sem deixar vestígios. Na mulher que não amamenta esse trabalho physiologico é mais accen- tuado e pôde cora muito mais facilidade degenerar em estado mórbido. Uma vez atravessado o periodo colostral, as glândulas mamarias secretam defin itivamente o seu producto fixo, que é o leite. N. 98 3 — 18 - Producto complexo formado de elementos variados, o leite é o typo dos alimentos e encerra em si todas as substancias imprescindíveis para a manutenção e desinvolvimento do in- divíduo, isto é, princípios azotados, princípios carbonados, sobretudo graxos, e os saes que se encontram na economia. E' um liquido branco, cor de opala; brandamente ama- rellado, quando apreciado em massa ; azulado e translúcido, quando visto em camadas finas. Tem a consistência appro- ximada do xarope ; cheiro particular, pronunciado sob a acção do calor e que se perde, em parte, com a ebullição, podendo, sob a acção do sulfureto de carbono, ser extra- indo o seu principio odorifero; tem o sabor adocicado e ligei- ramente salgado. A sua densidade é, na media, representada pela fracção 1,032 e augmenta sensivelmente, em tempera- tura igual, logo depois que o leite é mugido. Pela acção do calor não soffre alteração sensível : entra em ebullição, abandonando ás paredes e ao fundo do vaso continente al- gumas partículas sólidas, ao passo que na sua superficie se forma uma pellicula insoluvel denominada frangipana. Abandonado, em lugar fresco, no fim de vinte e quatro horas, separa-se em duas camadas : uma superior menos densa denominada nata, a segunda inferior alcunhada de leite desnatado. O exame microscópico deixa ver um liquido que suspende considerável numero de glóbulos esphericos, lisos, diaphanos, distinctamente contornados, com diâmetro de Vso a Yioo de millimetro e mais : são os glóbulos consti- tuintes da manteiga. Finalmente, segundo Quevenne obser- vam-se finíssimas granulações, de aspecto particular e inde- pendentes dos glóbulos butyrosos, os quaes formam o case- um suspenso. Geralmente o leite dá reacção alcalina, algumas vezes é quasi neutro e só em casos raros e especiaes dá a reaccão ácida revelada pelo envermelheciraento do papel turnesol. Contem, como princípios componentes, manteiga (principio graxo), caseina e matérias albuminoides análogas (subs* — 19 — tancias azotadas), lactina ou assucar de leite, e saes alcalinos e terrosos, entre os quaes predominam o phosphato de cal e vestígios de ferro. As analyses qualitativas modernas, le- vadas a gráo elevado de perfeição, descubriram no leite as subsequentes substancias : Matéria graxa, comprehendendo margarina, butyrina (phosphorada), caprina, caproina, my- risticina, palmitina, estearina, butina e lecithina ; caseum suspenso e dissolvido, matérias albuminoides ; matérias ex- tractivas ou osmazoma ; lactina ; phosphatos de cal, de ma- gnesia, de potassa, de soda, de ferro e de manganez, chlo- rureto de potássio e de sódio, soda livre ou combinada com matérias orgânicas, ácido lactico ou lactatos de base de po- tassa e d'ammonea; silicatos ; íluoruretos ; enxofre, iodo, uréa e creatina. Em cifras redondas, segundo J. Simon, 1,000 gramas de leite contem 889 gramas d'agua e 110 gramas de matérias sólidas que se decompõem em 2o gramas de substancias gra- xas ou manteiga, 43 de assucar, 39 de caseina e uma grama e 50 cent. de saes. (1) Tal é a composição do leite normal, sujeita a variar, na proporção de seus elementos, sob a influencia de condições diversas que em outro lugar passaremos em revista. Do que acabamos de vêr se infere que entra na ordem physiologíca estabelecida pela natnreza o dever de lactaçã0 para a mulher que é mãe, e que todo o systema de alimen- tação que não seja talhado segundo semelhante base, des- virtua o preceito natural, isto é, prejudica sob o ponto de vista sanitário o ser destinado para o exercício da funcção amamentadora e o ser alimentado, oppondo-se ao desinvolvi- mento normal da criança. Effectivameute é sobre estas duas ultimas cansiderações que repousa toda a argumentação favorável hygienicamente á causa do aleitamento materno. Vejamos mais detidamente no que ella consiste. (1) J. Simon. Maladie des enfants (conferences therap. et eliniques)—1880 — 20 - Pela descripção acima feita do apparelho da lactação na mulher que acaba de dar á luz, vê-se evidentemente que a funcção exercida por esse apparelho entra no concerto das funcções da geração e concorre para a harmonia d'ellas. O aleitamento é, por assim dizer, o segundo acto da materni- dade ; constituo o laço intimo que allia, no mundo exterior, a criança á mãe, quando pelo acto da parturição todas as relações de intimidade intra-uterinas são abruptamente in- terrompidas pelo nascimento e a secção do cordão umbilical. E' o leite o substituto natural do sangue : a analyse chimica o comprova ásaciedade. O leite encerra todas as matérias terrosas do pabulum vitm : o caseum é a albumina sangüínea modificada apenas no seu estado molecular; a existência da subtancia graxa nos glóbulos hematicos está hoje fora de duvida e o ácido lactico existe no sangue dos animaes cujo leite contem lactina. Supprima-se da mulher preparada para amamentar o o exercício d'essa funcção, não é intuitivo que essa suppres- são vae collocar-lhe o organismo em condições totalmente anormaes, que não poderão deixar de influir em desfavor do seu estado de saúde ? A puerperalidade é constituída pelos phenomenos importantes de involução uterina, miudamente descriptos pelos gynecologistas. Para que esses pheno- menos se realisem concatenados e harmônicos é preciso que venha a contra-fluxão mamaria equlibral-os. Se essa contra- fluxão se não verificar, ou for interrompida soffrerá o appa- relho utero-ovariano uma sobrecarga que o predispõe e muitas vezes n'elle determina a eclosão de estados patho- logicos. Os mais notáveis gynecologistas, Scanzoni, Chur- chill, Nonat, Courty, Barnes, G. Thomas são unanimemente concordes neste modo de ver, chegando mesmo Verriet e Litar- diére a collecionar bom numero de observações comprobativas. Accrescentemos que o mesmo facto não passou desaper- cebido aos antigos, que o exageram, no emtanto, funda- mentados na sua physiologia imperfeita e nas suas erradas 21 - doutrinas humorísticas. Sabe-se que elles chegaram a attri- buir ás pretendidas aberrações do leite a eclosão de inflamma- ções e ingurgitamentos do apparelho utero-ovariano, de anasarcas, ophtalraias rebeldes, leucorrhéas, dermatoses, phlegmasia alba dolens etc, como consta da memória de Lagrezie. A lactação constitue ainda, na vida genesica, um repouso duplo e imprescindível para o apparelho utero-ovariano. Na grande maioria dos casos a mulher-ama fica privada da fluxão catamenial e, como conseqüência, diminuem para ella as enchanças de nova gravidez. E' lei passada em julgado na historia da etiologia nosologica que toda a superactivi- dade imposta a qualquer órgão é para elle uma causa pre- disponente e mesmo determinante de moléstia. Ora, a mu- lher que não amamentafica privada da immunidade que essa funcção confere á concepção ; d'ahi a facilidade de conceber de novo e adiantadamente quanto á epocha mais natural ; d'ahi ainda a tarefa muito mais pesada imposta aos órgãos da reproducção e a imminencia da acquisição pára esses órgãos de estados mórbidos. Os ingurgitamentos repetidos com toda a serie de suas conseqüências habituaes, os deslocamentos uterinos, as me- trites geraes e parciaes, as granulações e ulcerações do collo, etc, taes são os tributos do trabalho forçado. Maler est quce lar.tavit, non quos genuit, disse-o Phedro, em uma das suas fábulas, e o professor Fonssagrives proclama que a traducção deste conceito deve ser repetido á saciedade no seio da família. Effectivamente tal é a influencia que a lactação exerce sobre o physico e moral da criança que é questão por deslindar o saber se essa influencia excede ou não a da própria gestação. Já tive occasião de estabelecer a intimidade de relações chimicas mantidas entre o leite e o sangue ; de forma que a ministração do leite materno ao recemnascido não é mais do que uma continuação, no meio exterior, da ministração — 22 — do sangue na vida intra-uterina. Nota-se ainda que o san- gue passa fatalmente de um a outro ser, sem que o ser pro- creador tenha d'isso consciência, sem que a sua vontade intervenha no acto ; a transmissão do leite, ao contrario, é toda voluntária e livre; depende de um impulso espontâneo, consentido, consciente do sacrifício que se vae fazer. E' pre- ciso para a missão augusta da lactação o alto espirito de ab- negação que leva a mãe a preferir aos prazeres, aos gostos do confortável, ao inebriante da vida tumultuosa dos thea- tros e salões de bailes, a concentração nos limites estreitos do lar doméstico, onde uma serie innumeravel de fadigas entremeiadas de noites mal dormidas, de repastos interrom- pidos, de anceios, de dores mesmo, só têm por compensação o sorriso do infante, o seu olhar profundamente meigo de inno- cencia e o contorno gracioso de suas formas, reveladoras do vigor da sua saúde e o seu bem estar, que é o ultimo gráo da ambição da verdadeira mãe. Supprima-se este conjuncto harmônico e estreito que une o filho á mãe, substitua-se a amamentação materna pela mer- cenária, não é evidente que este facto antinatural vae des- truir na criança uma parte da normalidade do seu desen- volvimento ? Não recebe ella ura alimento menos apto do que o que lhe era destinado pela ordem estabelecida ? Quem pôde garantir a innocuidade absoluta de um leite que não é o seu? Sem deixar enlevar no terreno da sentimentalidade, pelas concepções de mysticismo physiologico, acredito pia- mente, de accordo com muitos autores de boa nota, que essa ruptura de relações naturaes vae actuar physica e moralmente sobre os dois seres desligados: na mãe impon- do-lhe, alem dos prejuisos orgânicos em outro ponto men- cionados, um afrouxamento nos laços moraes, uma tibieza de affeição, incompatível, em regra geral, com aquella sollici- tude materna que se não supplanta, no conceito judicioso do philosopho de Genebra e que só pôde ser moldada no cadinho do sacrifício ; no filho, fornecendo-lhe um alimento — 23 - menos apto, muitas vezes impróprio e prejudicial e inocu- lando no seu ser o germen de muitas disposições em desacor- do com a lei geral de hereditariedade, se bem que nem sempre accessiveis á apreciação de momento. Todas as vezes, pois, que for possivel é indicação racional e positiva o aleitamento materno. Estará, porém, a mãe sempre nas condicções de amamen- tar seu filho ? E' este um novo problema, cuja solução é im- posta ao medico freqüentemente e ás vezes mesmo antes do parto. Dois casos se podem apresentar na pratica: ou se trata de uma mulher primipara ou multipara. No segundo caso, a questão é mais fácil de decidir. O medico consultado funda- mentará o seujuizo nas tentativas anteriores, fructiferas ou infructiferas. Ser-lhe-ha fácil deduzir do conhecimento m- nucioso dos resultados dessas tentativas o conselho mais adequado a dar à sua cliente. Importa, entretanto, que elle não abandone elemento algum influente na solução. E' possivel que uma mulher, que não pôde crear o primeiro ou os primeiros filhos, adquira poste- riormente os requisitos necessários á amamentação dos últi- mos. Trata-se, por exemplo, de uma mulher que mudou de meio, de condições sanitárias, de modo de vida, de caracter. O organismo pôde ter passado por grande modificação para melhor ; a posição social pôde ter melhorado de modo a for- necer a uma mulher que se finava em trabalhos insanos, o repouso e o bem estar das commodidades; diversas circums- tancias, emfim, podem ter produzido no organismo e no mo- ral feminil profunda e completa transformação. O conjuncto destas condições muito variáveis e não susceptíveis de serem comprehendidas em regras geraes determinadas se imporá ao critério do pratico, único competente para a solução do problema em cada caso particular. Admitta-se agora que se trata do primeiro caso, isto é, de ama primipara, Haverá, nessas circumstancias, signaea — 24 — infalliveis, pelos quaes o medico se possa guiar para externar o seu conselho definitivo ? Quiz o notável hygienista Donné decidir peremptoriamente a dificuldade. Baseava-se elle n'uma classificação sua, tirada do exame da secrecão colos- tral no oitavo mez da gravidez. Sob esse ponto de vista, subdividio as mulheres em três grupos : o primeiro com- prehendendo as que, no mencionado tempo, possuíam pouco colostro e poucos glóbulos ; o segundo as que tinham muito colostro, mas poucos glóbulos ; o terceiro as dotadas de abundância dos dous elementos. Só as ultimas, no parecer de Donné, pertencem á cathegoria das aptas para a bôa ama- mentação (1) Entrando na apreciação dos dados fornecidos por Donué^ o professor Bouchut confessa que existe relação quasi constan- te entre a natureza desse liquido, secretado durante a gravi- dez, ou colostro, e o leite tal como é fornecido depois do parto. Póde-se avaliar, diz elle, de conformidade com o exa- me do colostro e dos seus principaes caracteres, o que será a secrecão do leite, quaes serão as suas qualidades essenciaes e a sua abundância. Nada disso deve sorprehender, visto como é o mesmo órgão o productor do leite e do colostro e é sim- plissimo achar a relação entre esses dous líquidos. Todavia, continua o citado professor, encontram-se mulhe- res originalmente incapazes de criar, cujo colostro parece ter qualidades satisfactorias e que, entretanto, não devem alei- tar. Conseguintemente o preceito de Donné, importante, como incontestavelmente é, não tem valor absoluto (1). Abundando nas mesmas reflexões, J. Simon assignala os preceitos de Donné como signaes de probabilidade e não de certeza, accrescentando que errado andaria quem desse a esses signaes valor que não merecem. Assim, pois, o exame de secrecão láctea não offerece elementos suficientes para se avaliar em absoluto das aptidões da mãe para a amamenta- (1) Bouchut — Hygiene de Ia premiére enfance, 1879, ção de seu filho. Qual será, pois, o critério por que se deve regular o medico consultado sobre esse ponto ? Postas de lado as contra-indicações absolutas, que vou passar miuda- mente em revista, é licito ao medico sempre aconselhar á mãe o dever da lactação. Duas ordens de razões fortes pezam na balança para a sua prescripção afirmativa : por um lado, revela a estatística que a mortalidade infantil é excessivamente menor nos luga- res onde as mães têm por costume amamentar ; por outro, é sempre possivel, uma vez encetado o aleitamento, reconhe- cer as virtudes lactigeneas da mãe e impedil-a de conti- nuar, quando as suas tentativas não forem coroadas de bom successo. Com muita razão e tino pratico aconselha Donné que se não proscreva da missão do aleitamento a mãe que não apresentar as apparencias luxuriantes da ama de Bor- guinhão ou de Flandres. Mal avisado andará o medico por deirais exigente nesse sentido. Ha senhoras magras, mas sadias, que se não revelam, á primeira vista, aptas para alei- tarem, mas que, uma vez atarefadas n'esse emprehendimento sentem-se robustecer e apresentam uma cria que no aspe- cto physico justifica perfeitamente a aptidão materna. Ha, todavia, casos em que a amamentação materna é abso- lutamente contra-indicada. Mulheres existem que, apezar de boa saúde real ou appa- rente, apezar dos bons desejos que possuem para a amamen- tação, são inaptas para essa funcção, visto que lhes falta total ou parcialmente ò leite. Esse estado anormal, denominado agalaüia, é freqüentemente hereditário e se realiza todas as vezes que a mulher dá á luz, ou em alguns de seus partos só. mente. Em outras condições, especialmente em certas primr paras, a lactação se estabelece, ao principio, perfeita e com todos os bons requisitos ; pouco tempo depois o leite começa a diminuir e sobrevem a agalaxia, que é, n'este caso, deno- minada consecutiva. Não parece semelhante anomalia man- ter ralação directa de dependência com a actividade reprodu- N*. 98 i — 26 - ctora. Cita M. Fonssagrives uma senhora com onze filhos em quem a agalaxia se verificava sempre. A influencia de certas circumstancias de ordem moral ou physica pôde, em tanto, determinar a agalaxia consecutiva. Poget e Comraar- mond verificaram que o uso do pão misturado de farinha pro- cedente do centeio espigado determinava esse effeito. E' ocioso acrescentar que a agalaxia contra-indica absoluta- mente a amamentação. Outro obstáculo não menos de receiar é a má conformação do bico do seio. Ha casos em que este órgão é muito resistente, raso e não susceptível de alongamento, sejam quaes forem os meios mecânicos empregados para esse fim. A applicação das ventosas, as sucções amiudadas directas ou.pela mamadeira, são applicadas inutilmente : o bocal correspondente ao bico do seio se conserva sempre razo, sem saliência que permitta a adaptação da bocca da criança para o mister da sucção. As rachas, feridas, figas ou fissuras do mimelâo constituem uma enfermidade excessivamente dolorosa, e, em alguns ca- sos, de conseqüências funestas. Aconselham os parteiros o uso de loções tônicas e adstringentes e de medicação interna reconstituinte nos últimos mezes de prenhez, para as senho- ras predispostas a esta affecçao. Em casos benignos estas razoáveis indicações aproveitara ; muitas vezes, porém, a moléstia se manifesta tão rebelde e persistente que a única indicação possivel é a suspensão do aleitamento. Nas primiparas, com especialidade n^quellas em que o mamelão, sem ser completamente defeituoso, é cur- to, e, conseguintemente, mais exposto a distensoes, no acto da sucção ; nas mulheres que, se não submettendo a um re- gimen regular, conservam por longo tempo e sem necessi- dade o bico do seio na bocca da criança, esta enfermidade attinge, muitas vezes, o seu máximo gráo de gravidade. Ulcerações se formam, verdadeiras suppurações abcedadas podem sobrevir e a violência das dores sobe tanto de ponto que impossibilita toda a tentativa de amamentação. Ha mães — 27 — onde mais predomina a coragem do sacrifício, que insistem, apezar de tudo, e que chegam a adquirir um verdadeiro estado de cachexia. Então definham-se em magreza sempre crescente, accende-se-lhes a febre, o depauperamento e a insomnia. As applicações locaes adstringentes, as cauterisações com nitrato de prata, o glyceroleo de tannino, o benjoim e outras substancias adequadas empregadas de concumittancia com os bicos de seio artificiaes de borracha vulcanisada conseguem algumas vezes attenuar e até triumphar definitivamente da enfermidade. Quando estes meios tentados, porém, não dãD resultados sastisfactorios a interdicção ao aleitamento deve ser capitulada. Os ingurgitamentos leitosos lobares com abeessos múlti- plos e repetidos são, é excusado dizel-o, outra contra-indi- cação. Muitas moléstias geraes e diathesicas impedem o aleita- mento. As moléstias agudas, febris, contagiosas ou infec- ciosas, são impedimentos formaes. A varíola, a escarlatina grave, a febre typhoide, as febres palustres de máo caracter, a febre amarella, o cholera estão n'este caso : todas as mo- léstias, emfim, agudas de longa duração e depauperantes. A razão é obvia e é inútil n'ella insistir. Factos esparsos existem archivados na sciencia de mães que mantiveram a amamentação, atravessando grandes crises pathologicas, sem que nada soffressem durante a crise; esses factos são excepções de uma regra que 0 simples bom senso e,a fortiori, as exigên- cias scientificas mandara escrupulosamente respeitar. Certas moléstias chronicas que deterioram o organismo,taes como as diarrhéas inveteradas, as moléstias uterinas acompa- nhadas de grandes perdas sanguineas ou corrimentos cons- tantes, a diathese cancerosa, a albuminuria, o diabete, a infecção paludosa levada ao ponto de cachexia, o envenena- mento saturnino ou mercurial, são outras tantas condiçõe. mórbidas oppostas á prescripção do aleitamento maternos — 28 - Esta prohibição é também applicada ás mulheres nevropa- thicas, com especialidade as alienadas, as epilépticas, as hys- tericas, quando a hysteria não se limita a simples nervosis- mos ou excitabilidades nervosas sem conseqüências. Os attaques nervosos modificam a secrecão láctea, quer em quantidade, quer em qualidade : o leite torna-se menos aquoso, mais rico apparentemente em matérias nutrientesi mas por isso mesmo de digestão mais difficil. A tuberculose é uma contra-indicação formal, absoluta. Não é preciso que esta enfermidade já se ache positivamente declarada, para que o preceito redhibitorio tenha razão de ser; é bastante que a mulher em questão manifeste pelo seu estado geral escrofuloso, pelo vicio hereditário, pelo depau- peramento orgânico, tendência para a acquisição do mal, ou levante de modo provável a suspeita da iraminencia d'elle. Não é pelo receio de que o leite seja o vehiculo trans- missor do germen tuberculoso para o recém nascido; a rea- lidade d'este facto, se existe, não se acha ao menos compro- vada de modo peremptório; a maioria das opiniões é até controversa a semelhante hypothese. O que é fora de du- vida, porém, o que por si só é bastante para provocar a prohibição, é que o leite das mulheres affectadas desse es- tado pathologico é pobre de mais, não contem os principios nutritivos, que garantem a boa alimentação- Por outro lado, a criança oriunda de um tronco tuberculoso traz, dentro em si, em potência, a predisposição hereditária para a acquisi- ção do mal. Convém, pois, que a hygiene empregue racio- nalmente todos os meios que tendam a desfazer a eradica- ção mórbida hereditária; e um desses meios mais poderosos é incontestavelmente a alimentação substancial e adequada. O que diremos da mãe syphilitica ? A indicação é neste caso positiva. Não ha meio termo admissivel: ou o aleita- mento pela mãe, ou o aleitamento artificial bem conduzido. O aleitamento mercenário, collocando a ama em condições quasi infalliveis de adquirir a infecção por seu intermédio deve ser regeitado. A sã moral e a consciência elevam-se contra a prescripção da ama. Não tem direito, quer o medico, quer a família,de appelar para o abuso da ignorância, ou da ambição sórdida do lucro. O Dr. Simon parece abrir margem para a permissão de convenções estipuladas por escripto entre a família e a ama, convenções a que aliás o medico deve ser indifferente. Quanto a mim, condemno era absoluto a pratica dessas convenções como um acto immoral e digno de ser profligado energicamente pelo clinico que for consultado, sejam quaes forem as conseqüências. A indifferenca do medico perante um attentado dessa or- dem, seria igual á de Pilatos na condemnação do Christo. A mãe syphilitica é, pois, a única habilitada a amamentar seu filho, victima de enfermidade igual. Esta pratica tem, além disso, grande conveniência; facilita o tratamento dos infeccinados, pois que a medicação appli" cada distinctamente á mãe, transmitte-se ao filho, esten- dendo a sua acção até este. Se a intoxicação syphilitica ma- terna fòr de tal natureza que não permitta a amamenta- ção, o recurso é, sem hesitação, o aleitamento artificial. Emfim, para concluirmos a enumeração dos motivos que se oppoem ao aleitamento materno, apontaremos ainda a debilidade congênita da criança, que lhe impossibilita a sucção, e os vicios de conformação da cavidade buccal, o lábio lepurino, que se acha no mesmo caso. Tratarei agora, para dar de mão ao que se me offerece dizer sobre o aleitamento materno, da technica desse aleita- mento. Uma questão se apresenta desde logo. Em que prazo de- pois do parto se deve apresentar o seio ao recém nascido ? Sustentava Desessart e com elle alguns clínicos que a occa- sião mais appropriada é doze horas depois do nascimento. — 30 - O fundamento deste modo de ver era que a mulher pre- cisa de repouso depois das fadigas por que acabou de passar. Outros práticos exageram ainda o parecer de Desessart e acham que é mais conveniente esperar que a febre do leite sobrevenha e que se realise a secrecão láctea propriamente dita. Segundo os que assim opinam o colostro é inadequado para a nutrição das crianças. Os hygienistas modernos affastam-se d1esse modo de pen- sar. A criança deve ser posta ao seio materno pouco tempo depois de nascida; apenas a parturiente recobre a calma or- gânica que se lhe alvorotou na violenta crise physiologíca do parto. Em geral, quando o trabalho correu com regularidade, duas ou três horas de espera são suficientes. Esta pratica é a mais natural e offerece grandes vantagens. O liquido colostral, pelas suas propriedades gordurosas, opera como um purgativo brando e favorece a expulsão do meconio, que não pôde regularmente ser eliminado dada a falta do colos- tro, senão pelo uso de purgativos, nem sempre innocuos para o organismo tão débil do recém nascido. Ha, de mais a mais, conveniência em excitar o instincto da sucção no recém-nascido, sobretudo quando a mãe é primipara e con- seguintemente não tem os bicos do seio bastante alongados e aptos para a lactação. A sucção inicial facilita ainda e apressa a secrecão láctea. Uma vez porém, estabelecida definitivamente a lactação, pergunta-se qual deve ser a norma seguida na ministração do leite ? A criança nem sempre grita com fome ; a dor, a impaciên- cia, os hábitos viciosos em que a collocaram desde o princi- pio e aos quaes ella se arraiga com tenacidade são outros tantos motivos que lhe provocam o grito. Pelo seu lado, a mãe inexperiente, sempre sollicita em acalentar o filho que chora, acha na ministração do seio o melhor expediente para satisfazar a sua dedicação. D'ahi uma superabundancia - 31 - de alimentação que se torna nociva : sobrevem indigestões, eólicas, defecações es verdinhadas ; d'ahi também a privação para a mãe desse repouso desse somno calmo, sem o qual não pode haver boa ama. Todos esses inconvenientes se evitam desde que se estabe- leça um regimem, preceitos regulares, para a pratica do alei- tamento. Não se pode formular em absoluto uma regra invariável a tal respeito; as condições variáveis do organismo, quer infantil, quer materno, impõem excepção á regra geral. Entretanto é possivel determinar uma media a seguir na ge- neralidade dos casos. Chavasse recommenda que,no primeiro mez, se dê de mamar de hora e meia em hora e meia ; no segundo, de duas em duas horas ; e que o intervallo deve ir augmentando gradualmente com o desinvolvimento da criança, até que fique definitivamente fixado em quatro horas. Dando o seu assentimento ás recommendações de Cha- vasse, o professor Fonssagrives acerescenta que, desde o prin- cipio, se deve acostumar a criança a não mamar á noite, durante um periodo de cinco ou seis horas, das 11 as 5 horas da manhã, por exemplo. Este caso tem por effeito permittir á mãe o somno ininterrompido e reparador desse espaço de tempo indispensável para o seu bem estar e a sua saúde . Não é tao fácil como parece á primeira vista a realisação de semelhante medida hygienica. Nos primeiros dias as cri- anças se exasperam, choram ; e a sollicitude materna receiosa de motivar um prejuiso ao filho vem desde logo oppor-se á preciosa prescripção. Com um pouco de coragem e energia pode-se, entretanto, attingir á meta desejada ; convém que o coração materno suffoque os seus impulsos com a impassibi- lidade de quem prevê n'um pequeno sacrifício futuros e incal- culáveis benefícios. Uma vez a criança habituada ao regimen que se lhe estipulou, tolera-o suavemente e jamais se desvia d'elle. Por outro lado, não ha enchanças para perturbações gastro-intestinaes, nem a mãe tem o desprazer de sentir-se possuída de um leite impróprio; - 32 - E' muito comraum ver-se a criança preferir um seio a outro. Este facto provêm, muitas vezes, da melhor adaptação da bocca infantil ao seio mais bem conformado de mamelão. O professor Vogel explica semelhante preferencia, que quasi sempre existe para o seio esquerdo, pela pressão que o ficado exerce sobre o estômago no decubito lateral esquerdo. Seja como fôr, é indispensável impedir a cria da acquisição deste habito pernicioso para a ama. Vogel aconselha, para evitar esse inconveniente, que a mãe colloque as pernas da criança debaixo do seu braço direito, todas as vezes que ella der de mamar desse lado. Algumas senhoras inexperientes e desa- geitadas têm por habito collucarem a criança no regaço. de tal forma que a face d'esta fica totalmente fronteira ao seio. Resulta d'ahi,maxime, n'aquellas que possuem seios esphe- ricos, que o peso da parte superior d'estes espraia-se por sobre o rosto da criança de modo a obturar-lhe as narinas e obrigal-a a interromper a cada passo a sucção, em conse- qüência da dificuldade da respiração. O preceito para obviar esta falta consiste na mudança de posição da criança e na pressão com a mão, da parte superior do peito, de maneira a dar-lhe a disposição pyriforme. Todo o embaraço fica assim vencido. Que regimen deve adoptar a mãe que amameuta 9 E' pre- ciso que ella se compenetre antes de tudo da sua augusta missão ; que esteja convicta de que os seus sacrifícios não terminam com os nove mezes, em que teve de manter o objecto do seu amor na intimidade das suas entranhas. A so- lidariedade entre si e seu filho perdura ainda por todo o tempo da amamentação ; e não menos prejudicial é a quebra d'essa solidariedade agora do que seria durante a gestação. Qual- quer desregramento de sua parte pôde perturbar a pureza d'esse outro sangue chamado leite que ella agora é chamada a fornecer. A mãe que amamenta deve revestir-se de completa abne- gação pela vida tumultuosa dos theatros e bailes ; os movi- - 33 - mentos fatigantes da dansa, a respiração dos ambientes limi- tados e impurificados pelas agglomerações de gente, lhe são formalmente proscriptos. Se pelo sacrifício dos divertimentos e prazeres mundanos ella se não acha disposta a encontrar avantajada compensação no riso, nas graças, na expressão feliz de seu filho, prescinda da missão que lhe é imposta pela lactação : tornar-se-ha sempre incapaz de preenchel-a. Outra condição não menos importante é que evite o mais possivel as profundas commoções moraes, o susto,a cólera, etc. Sob a influencia dessas commoções o leite pôde soffrer tão pro- funda alteração que motive a própria morte da criança. O Dr. Simões de Lisboa cita a tal respeito,no seu livro sobre a edu- cação physica, um facto muito digno de nota. O marido de uma mulher que amamentava seu filho travou-se um dia, em sua casa, de razões com um militar seu conhecido. A alter- caçao azedou-se por tal modo que o soldado, em tom de ameaça, puxou da espada e tentou aggredir com ella o seu adversário. A mulher, que preseuciara toda esta scena, acudio em defeza de seu marido ; conseguiu tomar o ferro das mãos do militar e fazel-o em pedaços. Pelos gritos dos litigantes foram attrahidos alguns vizinhos, que puzeram, emfim, termo â lucta. N'essa occasião o filho da pobre mu- lher desfazia-se em gritos no berço onde repousava. A mãe toma-o nos braços e dá-lhe de mamar. Pouco tempo depois a criança começa a gritar de dôr e a agitar-se, como presa de uma violenta eólica. Em seguida manifestaram-se convul- sões, e estas cresceram a tal ponto que nada as poude debel- lar e a criança não tardou a tornar-se cadáver nos braços de sua desventurada mãe. Este triste acontecimento, sem mais commentarios, é suficiente para realçar a importância do preceito acima estipulado. A mãe que amamenta precisa outrosim privar-se dos ves- tuários que a garridice freqüentemente inventa, sem levar em conta as exigências da hygiene. Essas compressões do peito provocadas pelos colletes muito jistos, o aperto immo- N. 98 5 — 34 - derado da cintura, dificultam as digestões e a respiração e se reflectem prejudicialmente na secrecão do leite. As vestes mais convenientes são as análogas ás da gravidez ; folgadas a ponto de permittirem perfeita liberdade aos órgãos prote- gidos. A satisfação do sentido genesico é indispensável á esposa, e especialmente áquella que pela sua natureza ficasse sob a acção de um erethismo nervoso cora a continência abso- luta. Ha aqui, não obstante, uma regra a estabelecer, que consiste na satisfação não supérflua dessa exigência orgâ- nica. O amor pelos seus attractivos perigosos abre com faci- lidade margem a abusos. Ora, está fora de duvida que o abalo nervoso concumittante ao acto nupcial repercnte-se sobre o organismo inteiro, influe sobre a secrecão láctea e colloca a mulher na contingência de uma nova gravidez. E' de toda a justiça, pois. que os cônjuges sacrifiquem parte de seus gozos sensuaes nas aras do amor filial. Quanto ao regiraen alimentar a seguir não offerece tanta importância quanta lhe têm querido dar espíritos especiosos, que classificam arbitrariamente de quente tal alimento, de frio tal outro e de impróprios muitos que desvantagem alguma possuem. O regimen deve ser o habitual, aquelle com que a mulher se dá melhor, goza saúde e repara as suas forças. Importa, neste ponto, evitar toda a interdicção rigorosa. O regimen substancial e de fácil digestão é o que mais convém, sem proscripção de vários acepipes que agradam ao paladar da mulher-ama e que contribuem para raantel-o sempre em boas disposições. O mesmo seguir-se-ha a respeito das bebidas. E' irracio- nal a pratica que consiste em aconselhar o uso immoderado de certas bebidas, a cerveja e a cidra, por exemplo. Sob a influencia de muitos líquidos os seios entumescem, é verdade; a secrecão láctea augmenta em quantidade ; mas os glóbulos e o assucar não mudam de proporções, tornam-se simples- mente mais diluídos. A parte substancial do leite não soffre, - 35 - £ois, alteração para melhor. Todas as bebidas podem ser per» mittídas, desde que não se opponham ás exigências do pala- dar. Abrirei apenas uma excepção para os líquidos alcoólicos: a impressionabilidade da criança pela acção do álcool é ex- cessiva e importa que o leite a não favoreça e estimule. Não importando este preceito uma prohibição absoluta do vinho e dos líquidos espirituosos, tem, não obstante, por fim esta- belecer uma medida antes escassa do que farta para o uso dessa substancia. Resumindo o que havemos exposto a respeito do aleita- mento materno, repetimos: este methodo de aleitamento é incontestavelmente superior a todos os outros ; a estatística bem formulada, a observação attenta dos phenomenos natu- raes que se passam para o organismo feminil, as vantagens de toda ordem que de sua pratica resultam para a mãe e para o filho, o comprova evidentemente. Venturosa a mãe que pôde, pois, amamentar seu filho e infeliz d'aquella que ou por inaptidão orgânica ou por falta de aptidões moraes se vê privada ou se furta a tão elevada missão. DO ALEITAMENTO MERCENÁRIO O aleitamento mercenário é realisado por intermédio de uma ama. E' incontestavelmente o melhor substitutivo do aleitamento materno, se bem que muito inferior a este. A mortalidade das crianças recém-nascidas, criadas aos seios, diz J. Simou, não excede de 15 °/0; e desce a 10 e até a 5 °/0 nas regiões ou paizes em que as mães têm por habito ama- mentar seus filhos. Essa revelação numérica de J. Simon está completamente de accordo cora resultados análogos veri- ficados por outros autores. A. priori se podia chegar a seme- lhante asseveração. As relações de intimidade quer phy- sicas, quer moraes, que prendem ceteris paribus, a criança á — Hfi - mãe, não soffrem phridade cmu as que a alliam a uma mu* lher extranha. Nem a ultima, no território orgânico, possue os elementos harmônicos que a natureza preparou para a funcção da verdadeira maternidade ; nem tão pouco a solici- tude, a vigilância, o interesse natural do coração materno, pôde correr parelhas com a mulher, cujo único movei de acção ó apenas o lucro. Nas considerações que acabo de expender, refiro-me tão somente ao aleitamente natural exercido por uma ama domi- ciliar, isto é, sob a directa vigilância dos interessados. Ha outra sorte de aleitamento por amas, que vem a ser por aquellas que, fora do tecto domiciliar da criança, se encarre- gam de amamental-a em suas próprias casas, na cidade ou no campo, a qual é o peior dos methodos de aleitamento conhecidos. A estatística o comprova á saciedade e muitas razões militam em prol dessa asserção. As amas de fora, diz Paulo Lorain, pobres, avarentas, maltratam, descuidam-se das crias que lhes são confiadas. Semelhante trafico só é pro- veitoso para ellas, com a condição que continuem a trabalhar, a ir aos campos, a criar seu próprio filho, ao passo que a criança extranha é criada artificialmente, privada de cuida- dos, de exercício e fatalmente predestinada ao desenvolvi- mento imperfeito, ao rachitismo (1). Na cidade, estas mulheres residindo era habitações impró- prias, mal alimentadas, de moralidade em geral equivoca, expostas a conceberem de novo, deixam as crias era condi- ções excessivamente medíocres ; no campo as vantagens do ar puro, do clima superior ao urbano, são exageradamente excedidas pelas desvantagens da falta de asseio, da incúria, da ignorância e da exploração. O aleitamento mercenário por este meio é ainda inferior ao artificial. A grande dificuldade do aleitamento mercenário domiciliar é a escolha de uma boa ama. Muitos chefes de família procu- (1) Paul Lorain— Artig. Allaitement in Jaccoud — Dictionaire. 37 — ram o medico, ás vezes, sem motivo plausível, por insignifí- cancias que os alarmara; entretanto,com injustificável levian- dade, acceitam a primeira mulher que se lhes offerece para ama de seus filhes,meramente baseados em informações de pessoas incompetentes,quasi sempre movidas por interesses inconfes- sáveis. A escolha de uma boa ama é, no emtanto, tarefa de que o próprio medico experimentado nem sempre sesae bem, talhando-lhe todas as possíveis previsões. O illustrado hygienista, professor Fonssagrives, faz da ama-typo uma descripção ideal que vou transcrever tex- tualmente com receio de marear o brilho das suas palavras com uma reproducção própria. « A ama deve ter vinte a trinta annos ; mais moça, teria « menos experiência dos desvelos de que necessita a criança ; « mais idosa, seria menos apta para a amamentação. (Etas « oplima laudare solet a vigésimo quinto ád trigesimum &tatis « annum, disse Van Swieten. Aecio queria que a ama não « tivesse menos de 20 e mais de 40. Póde-se acceitar o pri- « meiro limite ; o segundo é manifestamente remoto. Im- « porta que ella tenha tido mais que um filho, afim de que « tenha adquirido mais experiência, a sua secrecão láctea « seja mais enérgica e a papilla tenha adequada conforma- « cão. A sua saúde, interrogada n'ella, na ascendência e « nos filhos e accusada em proporções felizes, o colorido da « tez, a brancura eburnea dos dentes e a integridade d'es- « tes, nada deve deixar a desejar. A cor escura dos cabellos « é condição favorável, mas deve estar em harmonia com a « da pelle ; cabellos negros com pelle fínissima, alva e rosea, « são, effectivamente, muitas vezes característicos de lym- « phatismo e escrofulose. A constituição precisa ser sã e k vigorosa, o temperamento lymphatico-sangúineo, a saúde « isenta de toda a taxa hereditária e pessoal. O leite convém « que seja abundante, de qualidade devidamente ensaiada « pelo exame microscópico, de idade nao excedente de qua- « tro ou cinco mezes mais do que a da criança, e é mister - 3* - « exigir do seio e do mamelão conformação tal que a cria se « lhe adapte commodamentfi e sugue sem esforço o alimento « que lhe é destinado. O caracter são, o gênio igual, a so- « briedade, a docilidade aos conselhos, a dedicação no cum- « primento de seus deveres, a paciência, o gosto pelas crian- « ças, o asseio escrupuloso, os bons costumes, completam, « afinal, essa phenix que a theoria proclama e a pratica em « vão procura. € Se amas existem d'essa qualidade são rara avis in terris ; « é preciso que nos contentemos com menos. N'esta inate- « ria, como em todas as cousas, uma boa qualidade apresen- « ta quasi sempre inconvenientes correlativos como contra- « peso : a alegria é ameaça de estouvamento ; as vantagens « exteriores tornam-se um perigo ,• a intelligencia, uma in- « clinação para a indolência e uma excitação no sentido de « tomar as rédeas do governo da saúde da cria ; o estado « matrimonial, a imminencia de interrupção forçada do alei- « tamento. As amas que não offerecem esta ultima garantia, « as moças mães, procuradas por muitas famílias com prefe- « rencia, são sem duvida mais exclusivamente affeiçoadas á « criança que lhes confiam ; porém, além de uma repugnan- « cia muito legitima, que condições equívocas de saúde e de « comportamento ! Releva não levar muito longe as exi- « gencias, isto é, ser inabalável quanto ás coisas essenciaes, « mas de composição fácil no resto. De mais a mais, ha cc maior ou menor urgência, a selecção se exerce entre maior « ou menor numero de amas, e tudo isso modifica natural- a mente essas exigências. » Como se vê manifestamente e como o attesta o citado pro- fessor, é difficil, senão impossível, alcançar a ama nas con- dições descriptas ; entretanto esse typo deve ser o estalão por que se deve guiar o pratico na sua escolha. Convém accrescentar que, no nosso paiz, grande numero de amas não são brancas ; estas pertencera quasi sempre á raça negra, ou são mestiças. As qualidades de colorido de pelle que se ~ 39 - deve ter em vista, nas ultimas condições, é que a preta esco- lhida tenha a côr retincta, azevichada, fixa, e a mulata possua a tez amarellada, de tom mais ou menos carregado, lisa e sem manchas. A côr fula da preta e a mosqueada da parda são indícios de estado doentio. Todos os requisitos exigidos na mãe que amamenta, são a forliori,indispensáveis,imprescindíveis,na ama. O circulo das exigências deve aqui soffrer mesmo maior ampliação. Assim,a ama deve ser espúria de toda e qualquer enfermidade aguda ou chronica; de diatheses, moléstias de pelld, moléstias conta- giosas ou infecciosas, etc. Seus seios deverão ser bem confor- mados, e aqui vem a propósito dizer que não são seios dota- dos de grandes massas adiposas os melhores, em geral elles fornecem leite pouco abundante. Os melhores são os de mé- dio volume, pyriformes, com a rede cuticular venosa bem desinvolvida, nodosos á apalpação, dotados de mamelões fle- xíveis, convenientemente alongados, limpos de botões, de escoriações, de endurecimentos de qualquer espécie. A ama deve, além do mais, não ser menstruada, pelo menos duran- te os primeiros seis a oito mezes de amamentação. Sabe-se que as regras diminuem a proporção d'agua e augmentam a dos corpos graxos e da caseina, facto que de ordinário pro- voca diarrhéa esverdinhada, eólicas e insorania nas crian- ças ; e esse inconveniente se pôde tornar tão intenso que, oppondo-se ao desinvolvimento da cria, exija a mudança de ama. Taes são as qualidades pessoaes da ama, que devem ser submettidas a inquirição minuciosa. Uma vez apreciadas essas qualidades, convém examinar directamente o leite. Não insisto nas qualidades desse liquido perceptíveis a olho nú, sobre as quaes já de espaço fallei. São variados os instrumentos inventados para o exame do leite. D'entre os principaes existem o butyrometro de Le- comte, o sacharimetro de Soleil,o lacto-butyrometro de Mar- chand e o cremometro. — 40 — O butyrometro de Lecomte é um tubo de 20 centíme- tros de comprimento e 2 de largura em uma parte e 10 cen- tímetros de comprimento e 1/2 centímetro de largura em outra. Vertendo-se o leite na abertura desse tubo, addicio- nado com ácido acetico cristallisavel; agitando-se e aque- cendo o instrumento, chega-se, em cinco minutos, por meio de uma divisão graduada no próprio vidro, a determinar muito aproximadamente a riqueza ou pobreza da manteiga do leite analysado. Pelo sacharimetro de Soleil determina- se por um processo também fácil a quantidade de lactina. O lacto-butyrometro de Marchand é uma analyse butyro- metrica baseada na solubilidade da manteiga no ether e da sua pouca solubilidade n'uma mistura, a volumes iguaes, de ether e álcool, bem como sobre a inaccão de uma pequena quantidade de soda cáustica sobre as matérias graxas mistu- radas com assucar de leite e caseum. O instrumento é sim- plissimo e a analyse, com auxilio de tubos próprios, já de antemão organisados, nenhuma dificuldade offerece. O cremometro é um provete graduado, por meio do qual, deixando-se repousar o leite n^lle introduzido, durante vinte ,e quatro horas, se avalia da riqueza da nata. O leite bom deve conter 8 % de creme. Ha ainda o lactoscopio de Donné, hoje quasi abandonado, com o qual se avalia da riqueza da manteiga ou da nata pela medida proporcional da opacidade do leite. A observação microscópica revela a homogeneidade dos glóbulos, que não devem estar misturados a corpos granu- Losos. O professor Bouchut, baseiando-se no processo de Malassez e Oihem para a numeração dos glóbulos sangüí- neos, achou um meio de numeração para os glóbulos do leite, pelo qual elle avalia das boas qualidades deste liquido • Em 158 amas que submetteu a exame, achou que a cifra representante dos glóbulos variava de 200.000 a 500.000 por centímetro cúbico. Estabeleceu sobre estas bases uma rela- ção entre o numero dos glóbulos e a densidade e riqueza butyrosa do leite, de tal fôrma que 110.250 glóbulos corres- pondem á densidade de 1022 e a 24 grammas de manteiga por litro ; e 370.000 glóbulos são correspondentes a 1030 de densidade e 34 grammas de manteiga. O processo, se bem que algum tanto minucioso, tem precisão e valor. Não deve ama alguma ser admittida a criar sem prévio exame medico. Este preceito que importava ser seguido á risca pelos interessados é, como já o disse, grande numero de vezes quebrado. No entretanto do seu cumprimento depende, por assim dizer, a sorte physica da criança, e elle é sobre- maneira imprescindível n'uma cidade como a nossa, onde não existe uma instituição municipal de habilitação para as mulheres que querem exercer a profissão de amas. O medico chamado para examinar uma ama deve proceder á verificação das mais insignificantes minudencias. Dirio-irá a sua attenção para as qualidades de constituição, de tempe- ramento, de saúde da mulher proposta. Examinar-lhe ha o couro cabelludo, afim de reconhecer a indemnidade de qual- quer moléstia parasitaria ; tomará em grande consideração as manifestações da pelle: qualquer presumpção de syphilis, por pequena que seja, é motivo para recusa ; examinará as gengivas, os dentes, o pescoço, tendo em attenção os ino-ur- gitamentos e as cicatrizes de natureza escrophulosa; saberá pelo exame dos braços, se existem signaes indeléveis de vac- cina, exigindo mesmo revaccinação, caso haja decorrido mais de dez annos depois da primeira vaccinação ; imporá até o exame dos órgãos de sexualidade, maxime se alguma sus- peita pairar no seu espirito sobre a existência da syphilis. Admitta-se, agora, que se encontrou uma ama dotada de to- das as condições exigidas para o exercício dessa profissão : as qualidades pessoaes da mulher em questão, miudamente pas- sadas em revista são positivamente boas; o leite submettido a exame directo dos sentidos e á analyse instrumental é reconhecido excellente ; poder-se-ha desde logo afirmar que N, 98 6 - 42 - a amamentação emprehendida vae ser infallivelmente co- roada de successo1? As condições apontadas são indubitavelmente uma garan- tia solida e quazi sempre real do bom aleitamento ; mas este pôde, não obstante, falhar. Ao lado das propriedades phy- sico-chimicas do leite existem outras, de natureza especial, dependentes da secrecão, da própria vida do leite, inaprecia- veis á analyse e tanto ou mais indispensáveis que as primei- ras para o successo desejado. O critério soberano de um bom ou máo aleitamento, o reactivo univoco, de absoluta sensibili- dade, é um único —o estado da criança amamentada. Como reconhecer, porém, com certeza se esse estado é bom ou máo ? Fora dos dados fornecidos pelo exame geral da cria, a saber, o gráo de firmeza au flaccidez das carnes, o colorido da tez, a sua placidez ou a sua exasperação habitual etc, ha dois signaes descisivos para um juizo acertado: as pezadas e a natureza das evacuações. Foi Natalis Guillot quem teve o mérito de applicar primei- ro a balança á hygiene pedagógica. Tinha elle por fim reconhecer o valor ponderai do leite ingerido de cada vez por uma criança e o mesmo valor durante 24 horas. Eis aqui o resultado a que chegou Bouchand no mesmo gênero de ave- riguações. No primeiro dia, de cada vez que mama, a criança ingere 3 grammas de leite; no segundo, 15 gr.; no terceiro 40; no quarto, 55 ; nos primeiros mezes esta quantidade sobe de 60 a 80 gr. e sobe de 100 a 130 depois do quinto mez. Admitindo-se que a criança mama 10 vezes por dia, no primeiro periodo, temos 30, 150, 400 gramas diárias ; admittindo que mama 8 vezes, no segundo periodo, temos que ingere de 600 á 800 grammas diárias, na idade de 1 até 5 mezes e, depois dos cinco mezes, 800 a 1000 gramas de leite. Estas cifras são médias sujeitas a fluctuações, ma3 nem por isso deixam de fixar idéias a tal respeito. Continuando em suas investigações, com intuito de dedu- zir d'ellas a lei de prosperidade nutritiva da criança,Bouchand - 13 - chegou á conclusão de que o recém-nascido perde, nos três primeiros dias, ura pouco do seu peso inicial, mas que o recupera rapidamente dentro os dias segcintes. O peso augmenta depois, segundo Jacquemier, na proporção de 130 a 160 gramas por semana,nos primeiros mezes; sendo, depois do quinto mez, a progressão hebdomadária de 90 a 120 gramas. Os estudos relativos a este importante assumpto não che- garam ainda a um resultado de satisfactoria precisão ; con- vém augmentar em muito o numero de observações regulares para estabelecimento de leis mais fixas ; entretanto, incom- pletos como são, já permittem illações positivas e de muito valor quanto á apreciação das qualidades do aleitamento. Supponha-se, por exemplo, que um recera-nascido amamen- tado por sua mãe se desvia muito da cifra ponderai de nor- malidade de crescimento do primeiro mez, já a não attin- gindo, já perdendo mesmo de peso ; não será esse facto suficiente para a indicação do aleitamento mercenário *? E' evidente. Na hygiene infantil é, pois, a balança um meio digno da mais activa propaganda. O segundo critério de valor do aleitamento é a natureza das evacuações. A criança bem amamentada deve ter, em vinte e quatro horas, duas a quatro dejecções de consistência pultacea, homogêneas, côr de gomma-gutta, comparáveis a ovos mexidos (brouillés). Essas dejecções mancham apenas a parte do panno em que se espraiam e não formam na peripheria circulo extenso de infiltração aquosa ; expostas ao ar ou misturadas cora ourina as fezes mantêm a mesma coloração. Taes são os caracteres das dejecções infantis, quando o aleitamento é de'boa qua- lidade. No caso contrario ou quando a criança é doentia, as dejec- ções são verdes côr de espinafre, não homogêneas, serosas, misturadas de placas verdes, de fragmentos de caseum indigeridos e são dificilmente excretadas pela criança que, - 41 - nes^a occasião, manifesta dor. Algumas no acto da excre- ção são amarelladas, mas desde logo se tornam verdes, ao contacto do ar. Os dous elementos de diagnostico que ficam citados, a alteração de peso e de fezes normaes,quasi sempre coincidem, e consorciados attestam a má qualidade do aleitamento em- pregado. Dadas estas circumstancias, convém, o mais de- pressa possivel, mudar de ama, escolhendo outra cujo leite se case melhor com as necessidades da criança. Quanto ao regimen a seguir pela ama, em nada differe do que era outro lugar se estabeleceu para a mãe que amamenta. Accrescentaremos que as exigências devem ser aqui mais latas, sem que comtudo, se exagerem a ponto de causarem desgosto. O mesmo diz respeito ao regimen da cria. 4:, - II io mim Por aleitamento artificial entende-se um modo particular de alimentação das crianças que não podem ser, era virtude de qualquer circumstancia, amarnentadas pela mãe ou por uma ama. O processo mais geral consiste em fornecer á criança o leite de animaes, por intermédio de um instrument0 simples, substutivo do seio, e que se denomina mamadeira. Sob o ponto de vista hygienico este modo de alimentação é em demasia inferior aos dous de que se tratou anteriormente. Segundo as observações do Dr. Creqny, no espaço de um anno, sobre 300 crianças nascidas nesse periodo e acompa- nhadas durante três mezes, 236 nutridas ao seio deram 25 mortes, isto é, 10,63 por 100 ; e era 64 criadas á mamadeira 33 succumbiram, isto é, 51 por 100, o queda uma mortalL dade cinco vezes mais considerável n'um caso do que em outro. Os dados estatísticos de outra espécie fornecidos pof Winckel são também muito instructivos a este respeito. Pezando comparativamente 93 crianças nascidas a termo, das quaes 78 foram amarnentadas pelas mães e 15 por leite de vacca, Winckel verificou que todas perdiam peso nos 2 ou 3 primeiros dias ; porém, a partir do terceiro dia, o accres- cimo de peso foi nas 78 crianças amarnentadas ao seio, ao passo que as 15 submettidas á mamadeira, tinham,no décimo dia, um déficit ligeiro sobre o peso inicial. Por máo que seja, entretanto, o aleitamento artificial pelo leite dos mammiferos, comparativamente ao aleitamento na- 358438 - 40 tarai, não produz todavia a mortandade, o prejuízo inenar. ravel, da suppressão do leite, isto é, da alimentação da criança por outras substancias. Segundo J. Simon, a mortalidade dos recém-nascidos, criados methodicamente á mamadeira, eleva- se de 30 á 40 °/ol no ultimo caso figurado a lethalidade attinge a extraordinária cifra de 80 •/„ ! O verdadeiro ali- mento do recém-nascido é, pois, o leite. Propõe o professor Fonsagrives a subdivisão do leite em 3 cathegorias : 1.° os leites gordos (cabra ou vacca) caracteri- sados pela riqueza era manteiga (75 grammas por litro, ás vezes, no leite de cabra) e pela riqueza media em caseum e assucar; 2.° os leites caseosos (cabra e ovelha) caracterisados pela abundância do principio coagulavel; 3.° os leites ivogros e assucarados (mulher, burra, jumenta, bufala) que contém forte porção de lactose, pouca manteiga, muita albumina e proporção considerável da sáes. Os leites dos mamraiferos da 3a divisão são os que, pela sua composição, mais se approxi- mam do leite humano e que, por essa razão, deviam ser es- colhidos de preferencia para o aleitamento artificial. O leite de burra é o mais assucarado (contém por litro 61 de lactose), é o mais gordo (15 grammas), menos rico em caseina (18 gr.) e o mais aquoso (905 grammas) por litro. O leite de jumenta que muito se approxima d'este, é o mais pobre de manteiga e menos seroso, contendo a proporção de 896 d'agua por 103 de matérias sólidas. E' certo que o aleitamento artificial, en- tredido exclusivamente com os leites da 3* cathegoria, devia dar uma cifra mortuaria muito mais favorável. Infelizmente não é desse meio que se lança mão habitualmente na alimen- tação infantil; maxirne, n'uma cidade como a nossa, onde o leite de jumenta é muito raro e de preço exhorbitante. O leite commum fornecido ás crianças é o de vacca, muito mais abundante e mais barato que todos os demais. Este leite apresenta a densidade de 10,32, contem 35 á 40 grammas de manteiga por litro, 50 pouco mais ou menos de assucar, 41 de caseina, 874 d'agua, e, por conseqüência, 126 de matérias — 47 — sólidas. Por esta composição se vê que é elle muito mais im- próprio que o leite mulheril para a alimentação da criança. Com effeito em contacto com o sueco gástrico, o leite de mu- lher se coagula em geléa tênue, muito digestiva ; ao passo que o de vacca se transforma emjcoalhos espessos,'de diges- tão muito mais laboriosa. Para alternar as desvantagens]digestivas do leite de vacca, Coulier aconselha ajuntar em 593 grammas deste leite, 407 grammas d'agua, cerca de 1 1/2 de leite para 1 d'agua, e addiciouar a esta mistura creme fresco e phosphato de cal. Eis aqui a formula estipulada por esse autor : Leite de vacca 600 gr., creme fresco 13, assucar de leite 15, phosphato de cal porphyrisado 1,5, água 339,5. Outros aconselham a mistura do leite com água simples, com dscocto de cevada ou de althéa, ou água de Vichy, ou 10 á 15 centigraramas de bicarbonato de soda em cada mamadeira ; um pouco de assu- car fino, uma colherinha de água de cal, se ha tendência a vômitos ; e uma pitada de magnesia calcinada, todos os dias ou de dois em dois dias, havendo constipação de ventie. Com" prehende-se que todos estes meios, tendo por fim principal augmentar a digestibilidade do leite de vacca, são muito ra_ cionaes e prestam, muitas vezes, reaes e valiosos serviços nesta espécie de aleitamento. Accrescente-se ainda que é de surama importância fornecer á crinnça o leite sempre tirado da primeira mesma vacca, reco- nhecida como saudável, e que essa substancia deve ser admi- nistrada na temperatura orgânica, isto é, de 38° centígrados. Para as pessoas que não podem usar do thermometro na gra- duação da temperatura, ha um meio pratico muito simples, £ aquecer a mamadeira sob as cobertas do leite. Muitas amaá conseguem com um pouco de habito avaliar bem da tem- peratura exigida, pela sensação de calor produzida pela approximação da mamadeira á face. No aleitamento artificial usava-se antigamente fazer a criança extrahir o leite directamente da teta do animal que - 48 - lhe servia de ama, o qual, neste caso, pela maior facilidade com que se sujeitava a esse serviço era geralmente uma cabra. Este meio está hoje completamente abandonado pelo uso da mamadeira. As crianças recebem facilmente o leite por intermédio de uma colher ou de um copinho ; a mama- deira, porém, têm a grande vantagem de provocar a sucção, movimento uatural indispensável para o exercício physiolo- gico dos músculos dos lábios, da face e da lihgua, combinado com a acção simultânea dos músculos da respiração. Ha uma infinidade de formas variadas de maraadeiras, com a reunião das quaes se poderia formar um museu, como diz o Dr. Fonssagrives. Ha as mamadeiras Darbot, Breton, Le- planquais, Charriére, Robert, Mathieu, Galante, Monchar- vaut, etc. Todas ellas preenchem, mais ou menos regularmente, o seu oficio. Cada qual pode mesmo, sem ter necessidade de recorrer ás de diversos fabricantes, fabricar a sua mamadeira em casa. Eis o que diz a tal respeito o professor Bouchut : toma-se um frasco de vidro com capacidade de 150 grammas e introduz-se-lhe pelo gargalo, de modo a não obstruil-o completamente, um cylindro de panno, enrolado e dobrado ao meio. A extremidade dobrada do cylindro, o qual deve ter de compriraento uns 10 a 15 centímetros fica livre fora do gargalo; a outra extremidade, com duas pontas, mergu- lha no interior do vaso até o fundo. Este panno, embebido de leite, é dado a sugar na sua ponta exterior á criança, a qual pelos movimentos constantes da sucção provoca sem- pre para alli um affluxo de leite suficiente para a sua ali- mentação. Outros substituem o cylindro de panno por um de esponja, munido na extremidade de um envoltório de morim ou musselina. A mamadeira mais geralmente usada aqui consiste n'ura simples frasco de vidro, deprimido de cima para baixo, ar- redondado lateralmente, com uma das extremidades planas em fôrma de fundo de garrafa e a outra afunilada, termi- — 49 — nando-se em um cylindro fino com um annel saliente, Esse annel tem por fim fixar um bico de seio de borracha preta ou vulcanisada com um pequeno orifício no centro. Na face superior deprimida do frasco existe, emfim, uma bocca, onde se adapta uma rolha movei de cortiça e que serve para introducção do leite. Uma vez cheio de leite, conveniente- mente aquecido, o bico de borracha da mamadeira é intro- duzido na bocca da criança, que pelos movimentos de sucção fôrma o vácuo no interior do vidro e da bocca e chama o leite pelo orifício de borracha. A mamadeira ingleza, que se compõe de uma garrafa chata, na qual mergulha um tubo de vidro, adaptado a outro de cautchouc vulcanisado, de extensão de 25 a 30 centímetros e terminado também por um bico de seio dn mesma substancia, é muito commoda e presta bons serviços, apezar das injustas recriminações que lhe faz o Dr. Da vis, que attribue os effeitos do aleitamento artificial á mamadeira. A mamadeira Robert, usada em Berlim, é também de summa vantagem, bem como a de Monchovaut que contem uma válvula para impedir o leite sugado de tornar a descer para o interior do vaso. Os bicos de seio de cautchouc vul- canisado podem, na opinião do Dr. Eulenburg, produzir uma intoxicação saturnina em conseqüência da sobrecarga do carbonato de chumbo que nelles se contem, quando são mal preparados. Esse inconveniente é extensivo ás guarnições de chumbo ou estanho plumbifero. Por outro lado, os bicos de mar- fim molle, de cortiça, de teta de vacca, são muito frágeis e exigem constantes renovações. O melhor dos bicos conhe- cidos é o de borracha preta. A precaução que é preciso ter muito em vista, quando se faz uso das mamadeiras, é a lim- peza irreprehensivel e constante do apparelho. As lavagens devem ser feitas todas as vezes que a criança acaba de mamar e o bico do instrumento deve ficar em mergulho na água, quando não estiver servindo. Examinando N. 98 7 as mamadeiras, provenientes de uma creche, o Dr. Fauvel notou que ellas exhalavam cheiro fétido e que o tubo de borracha e sua empola terminal estavam cheios de leite coa- lhado, entremeados de cryptogamos, onde o microscópio descobrio grande numero de cellulas ovoides. O Dr. Rosen de Rosenstein attribue o desenvolvimento de aphtas, ao péssimo costume que tem certas amas de deixarem a criança com o bico da mamadeira, em gerai pouco limpo, na bocca. Como se sabe o leite é muito fácil de azedar. No creme, no meio dos glóbulos, ha corpusculos arredondados ou allon. gados, diz Wesling, em massas germinativas de vibriões, semelhantes ás que se acham nas substancias em putre- f acção. Os esporos augmentam, germinam, alongam-se, ramifi- cam-se, offerecem o aspecto de cellulas seguras ponta por ponta e tendo na extremidade um enchimento de contendo granuloso. E' uma mucedinea do gênero oesophora. Esta alteraç ão do leite dá-lhe propriedades purgativas ir ritantes e provoca gastro-enterites agudas ou chronicas cem suas terriveis conseqüências que é a morte. E', sobretudo, no uso do aleitamento artificial que ee deve recorrer com insistência á balança, para se ajuizar da prosperidade nutri- tiva da criança, e regularisar ou modificar a sua alimenta- ção no caso de insuecesso. Em resumo, o aleitamento artificial é, em ordem de inr portancia inferior ao aleitamento natural, se bem que sendo conduzido com todo o methodo e vigilância possa tornar-se muitas vezes, um recurso precioso. - 51 - ALEITAMENTO MIXTO O aleitamento mixto não é mais do que o systema de ali- mentar as crianças pelos methodos que temos passado em revista combinados dois a dois. Conhecem-se duas espécies de aleitamenso mixto, a saber : o mixto natural e o mixto ar- tificial. O primeiro consiste na amamentação effectuada pela mãe de concummitancia com uma ama; o segundo é o aleita- mento natural, quer materno, quer mercenário, com o auxi" lio do leite de um animal. D'esta enunciação se deprehende que o aleitamento mixto, qualquer que seja, não constitue ura verdadeiro systema de aleitamento. Elle não é mais do que um expediente de que se lança mão algumas vezes, de modo provisório ou defini- tivo, afim de attenuar os inconvenientes ou dificuldades re- sultantes do systema primitivamente adoptado. Trata-se, por exemplo, de uma mãe que deseja criar seu filho, mas cujo organismo é em demasia delicado para esse fim. Pode-se, n'essas circumstancias, admittir uma ama extranha para auxiliar á mãe e não prival-a assim de satisfazer os seus justos desejos. Fica pois estabelecido d'esta fôrma o aleitamento mixto feminino. O que convém ter em vista é escolher um leite mercenário que não esteja em idade muito affastada do da mãe. Tem acontecido muitas vezes que, senhoras debilitadas no começo do aleitamento, conseguem cora este auxiliar ro- bustecer-se e collocar-se após era estado de poderem con- tinuar sosinhas a amamentar. Quanto ao aleitamento mixto artificial, se é mais conveniente e racional do que o artificial exclusivo, não deixa de ter as mesmas desvanta- gens que este, quando é mal dirigido. Esta espécie de eclectismo alimentar dá em resumo dois resultados : ou â mãe predomina no fornecimento da alimentação, e então a alimentação extra é tão insignificante que nenhuma acção pôde excercer sobre a marcha normal do aleitamento natu- ral; ou predomina a alimentação artificial, e neste ultimo caso, subsistem inteiras todas as desvantagens do derra- deiro. O aleitamento mixto, repetimos, não é mais que um expe- diente, algumas vezes útil, mas que não constitue systema á parte, nem se presta a considerações especiaes que já não estejam desenvolvidas nos systemas de que nos havemos oc- cupado. — 53 - III Segundo a etymologia da palavra, desmame quer dizer cessação de aleitamento pelas glândulas mamarias ; de fôrma que rigorosamente se diz desmamada a criança aleitada artificialmente, por intermédio da mamadeira. A palavra deslactação é mais lata de sentido e exprime a privação não só do seio, como também do leite, qualquer que seja. No terreno scientifico, onde cada termo deve ter significação precisa, é de utilidade adoptar-se esta distíncção, afim de evitar confusão na expressão das idéas. A deslactação é o maior perigo que se pode fazer correr a uma criança no sentido da alimentação. O verdadeiro ali- mento appropriado ao recém-nascido, o único que deve servir de base fundamental para as crianças já desmamadas, e mes- mo na puericia, ó o leite. Este preceito emana da observação da natureza e dos resultados da experiência. A alimentação dos recém-nascidos pelos productos indus- triaes, taes como a farinha láctea de Nestlé, o chamado leite condensado, os diversos feculentos, etc, elevam a cifra da mortalidade infantil a um ponto exageradissimo. Adyspepsia, os vômitos,as constipações, a diarrhéa,a flatulencia, as gastro e entero-colites, os sapinhos, apresentam-se desde logo em scena e conduzem a criança áquelle drama mórbido tão ma- gistralmente descripto pelo professor Parrot,sob a denomina- ção de athrepsia, ou atrophia infantil de outros autores. E', pois, de grande justeza a proclamação do Dr. Simon :— Dap leite, sempre leite, aos vossos clientinhos. 1785 - 54 - À substancia láctea não pode, todavia, constituir exclusi- vamente, em todas as phases da infância, a alimentação da criança. Ha um momento em que esta attinge certo gráo de desenvolvimento incompatível com sustento tão simples. E' preciso para manter-lhe a nutrição gradual e progressiva uma receita mais farta. Vem, pois, a pello perguntar em que tempo convém auxiliar a lactação por meio extra ? Que espécie de alimento, que substancias appropriadas, se deverão escolher ? Em que tempo,emfim, é conveniente reali- zar-se o desmame ? Taes são as principaes questões que me cumpre elucidar n'esta parte do meu trabalho. Não se pôde, em referencia á solução d'este questionário, estabelecer regras fixas e invariáveis para todos os casos. As condições sanitárias da criança, as suas variadas aptidões orgânicas, as qualidades lactigeneas da mãe ou da ama; taes são as complicações diversas que embaraçam qualquer decisão uniforme. Não obstante, deixando os casos particula- res, mais da alçada do critério do medico do que das previ- sões da hygiene pedagógica, é possivel estabelecer preceitos fixos,uma vez admittida a normalidade de todas as condições. A criança deve ser submettida exclusivamente ao alei- tamento, durante os cinco ou seis primeiros mezes de vida. D'ahi por diante aconselha a razão e a experiência que se lhe comece a dar alimentos novos. J. Simon, que encarou magistralmente esta matéria pelo lado pratico, é de opinião que se associe ao leite, uma vez por dia primeiro e depois duas, uma sôpinha de biscoutos de Bruxellas ou um min- gáo bem cosido a fogo brando durante um quarto d'hora, e composto de leite cortado, assucarado, um pouco salgado e addicionado de farinha de trigo. Quando a criança attingir á idade de um anno, além do leite que deve ainda ser a base da sua alimentação,convém ministrar-lhe um ovo quente por dia, caldos de gallinha, depois sopas gordas ou magras de tapioca, de sagú ou de pão. Mais tarde dever-se-ha accres- C3ntar a este regimen, uma vez por outra, peixe, geléas e suecos de carne de vacca. Aos quatorze ou quinze mezes, quando já a criança está munida de uns 10 ou 12 dentes, será licito dar-lhe carne picada, battida ou ralada, parcellas de alimentos sólidos. A não ser as pureés feculentas, prohibir-se-lhe-ha o uso de legumes, especialmente os legumes .verdes e os fruetos ; em compensação, porém, se lhe pe:mittirá, nas duas refeições principaes, um pouco de água vinhosa assucarada e, se a digestão for laboriosa, de mistura com a água commum a água de Vais ou de Vichy. Só na idade de 15 a 16 mezes, segundo este autor, se procederá definitivamente ao desma- me. O Dr. Fonssagrives aconselha como bom alimento de transição uma mistura de leite de vacca e caldo de carne, desgordurado a frio e coado atravez de um panno molhado. As crianças acceitam muito bem este alimento, diz o mesmo autor, e colhem do seu uso incontestável proveito. Outros autores, entre elles Bouchut,recommendam os min- gáos simples ou feitos com leite, cora caldos, ou mesmo manteiga. Todos os alimentos citados são muito próprios; os mingâos de araruta, de tapioca, de sagú, de maizena, etc; os caldos de gallinha ou de carne, o caldo de feijão, as varia- das geléas, a farinha de Nestlé, as sopiuhas de leite ou cal- dos com pão ou biscoutos bem desfeitos, etc, convém admi- ra velmente. O que é sobretudo necessário ter em vista é a abstenção de toda substancia solida, que precisa para ser facilmente digerida a mastigação prévia. Assim preparada e coadjuvada, a criança se vae habilitando para o momento mais ou menos critico do desmame. Em que tempo definitivo se procederá,porém, ao desmame '? Os israelitas tinham por costume desmamar no fim de dois annos e meio até trez, e o mesmo limite foi estabelecido por Galeno. Pelo seu lado, os autores inglezes, acham própria a idade de nove mezes a um anno e Chavasse declara formal- mente que depois d'essa epocha a amamentação faz maior. — 56 - mal que bem. Os autores de melhor nota acham exagerados para mais e para menos os períodos fixados. A idade usual- mente adoptada na França, em Portugal e no nosso paiz é a de 15 mezes pouco mais ou menos. Repito ainda, a fixação numérica estabelecida é susceptível de alteração muito racional, conforme a debilidade ou robus- tez da criança e as condições do aleitamento adoptado. Se a senhora que alimenta goza saúde, se o seu leite é de boa qualidade, se ella arrasta sem graves encomraodos a funcção do aleitamento, é claro que se pode prolongar mais o exer- cício d'essa funcção. No caso contrario, porém, se se trata de uma senhora por demais delicada, que se depaupera, que fornece um leite pouco nutriente para a cria, aconselha a boa razão que se suspenda a amamentação caso o estado da criança o comporte, ou que se tome uma ama, ou se venha em auxilio da mãe com um aleitamento mixto. Além da fixação numérica de que se ha fallado, possue a hygiene uma balisa mais racional para a determinação do tempo do desmame. Essa balisa coustitue a fixação physiolo- gíca e é fornecida paio estado de deatição. Baumes autor de vários trabalhos de merecimento sobre pediatria, entres elles um sobre convulsões e outro sobre a primeira dentição escrevia em 1806 o que se segue. « O aleitamento deve ser levado o mais longe possível. Rejeitem, se entenderem, o sentimento dos que pensam que uma criança não pode ser des- mamada sem perigo,antes da sua bocca estar munida de deses- seis dentes convenientemente rompidos, porque ha crianças de dentição mais tardias do que outras, crianças cujo tempe- ramento é franzino, lento, mui fortemente lymphatico e mucoso, para as quaes o aleitamento prolongado, não é salutar; mas em todos os outros casos,é pratica muito asisada continuar a amamentação da criança até que a dentição esteja adiantada e se conclua por experiência que tal trabalho não é difficil. Quantos males, quantas lamentações não se previ- nem freqüentemente com semelhante pratica ! » - 57 - Iniciado talvez nas idéias de Bauraes, o professor Trous- seau de gloriosa memória, ampliou-as com o talento clinico que o caracterisava. Sabe-se que, em geral, dos seis mezes aos sete ou oito o mais tardar, rompem os primeiros incisivos medianos inferiores ; seguem-se-lhes depois os incisivos medianos superiores, e os lateraes superiores. Ap- pareridos esses oito dentes, a evolução soffre uma pequena parada, que vae até aos 10 mezes e 1 anno. N'esse periodo apparecem os quatro pequenos molares e a criança prefaz a conta de doze dentes, segue-se ura repouso de dois a trez mezes, até que rompem os quatro caninos. Acconselhava Trou- seau que depois do rompimento dos caninos, quando a criança vem a contar 20 dentes, se deve proceder ao desmame. Esse preceito de Trousseau é precioso. Depois do rompimento dos caninos a máxima parte das crianças tem atravessado essa crise da dentição, a qual, se muitas vezes se verifica sem accidentes, outras tantas é acompanhada de desordens locaes e geraes que inspiram bem fundado receio. As gingivites, as aphtas, as stomatites, e a adenite cervical; as bronchites e broncho-pneumonias, as dy^pepsias e enterites, são tribu- tários d'essa quadra. Ora o desmame prematuro colloca a criança em condições de não poder resistir a essa tempestade mórbida, em conseqüência das digestões laboriosas que se dão então e da facilidade com que essas indigestões provocara enfermidades muito mais graves e mortaes. Por outro lado o desmame, feito na epocha escolhida por Trousseau, já deixa o infante com maiores aptidões buccaes para a acceitação de alimentos menos digestivos do que o leite. Infelizmente a dentição nem sempre segue marcha regular : ha, ás vezes, uma verdadeira ataxia na evolução dentaria. N'essas condições, é dever do clinico escolher a occasião mais azada para o desmame, tendo em consideração o estado sanitá- rio do seu cliente. Insistia Trousseau, e com razão, que se não desmaraasse a criança possuidora de numero impar de dentes; o aue quer dizer, que se não devj fazer coincidir o desmame 4 N.98 8 - 58 - cora a actividade da crise dentaria, pois que os dentes rom- pem por grupos pares. Casos ha em que a criança resente-se em demasiado do des- mame, ou em conseqüência de accidentes dentários superve- nientes, ou por que o tempo escolhido não foi dos mais ade- quados. Pode acontecer que o abalo produzido seja tal que colloque em risco de vida o doentinho. Qual a indicação a cumprir n'estas circumstancias ? Resta- belecer a amamentação, se é possivel. Por esse meio se obtém ás vezes verdadeiras ressurreições. A tarefa não é tão dificil como parece á primeira vista. Ha uma colleção de factos ar- chivados na sciencia era que crianças desmamadas depois de ura mez, dois, trez e quatro conseguiram ainda readquirir o habito de mamar (Gluber, Trousseau, Meyer, Perrin etc). Um clinico d'esta Corte referio-nos o facto de uma criança affectada de enterite grave, depois do desmame, e que reco- meçou a mamar, salvando-se como por encanto da terrivel enfermidade que a collocou em imminente risco de vida. « O instincto de mamar, diz Fonssagrives, é vivaz na criança, bem como o demonstra o habito de chupar o dedo nas crianças prematuramente desmamadas, que n^sso pro- curam um vão simulacro do que lhe recusam. » Como se deve proceder ao desmame ? No principio deste capitulo fizemos vêr como de longe se deve ir preparando a criança para a crise do desmame. Uma vez approximada a epocha própria, o meio mais racional é ir desacostumando-a lentamente de mamar repetidas vezes. Isso se conseguirá, affastando-a da pessoa que amamenta e cuja presença lhe excita a sensibilidade do acto; saciando-lhe o appetite com maiores doses de alimento, procurando, por todos os meios, evitar a amamentação durante a noite. Na occasião defini- tiva, emfim, é habito approvado untar os bicos dos seios com substancias amargas, que não sejam nocivas, taes como a genciana, a quassia, o fei de boi, o sulphato de quinina. Ha crianças que resistem heroicamente a todos estes meios ; ~ 10 - ò amargo das primeiras sucções não é suficiente para nelles dominar o interesse das subsequentes. Com estas o único meio é a ruptura enérgica e decidida, que não deve ser por condes- cendência interrompida uma vez iniciada, sob pena de au- gmento do sacrifício infantil. Outras crianças, pelo contrario, se submettem com admirá- vel docilidade. Tenho noticia de uma que se foi desacostu- mando primeiro de mamar durante o dia, reservando-se para fazel-o tão somente uma ou duas vezes á noite. Uma occasião atravessou incólume uma noite, e d'ahi por diante as outras. Estes factos, força é confessal-o,são muito excepcionaes. Para terminar, emfim o que se me offerece dizer sobre o desmame, notarei que, quando o desmame é realisado de modo methodico e racional, raras vezes dá motivo ao desen- volvimento de enfermidades ; no caso contrario, é fonte perenne de moléstias graves, que muito contribuem para o reforço do obituario. As moléstias principaes constituintes da pathologia do des- mame, são as enterites e entero-colites, o rachitismo e as mesenterites tuberculosas. Analysando as condições de idade em que se verificaram 2,129 casos de fluxos de ventre nas crianças, o professor West, de Londres, verificou que entre 1 anno e 18 mezes essas moléstias constituem 26,870 de todas as affecções infantis, e é nesse periodo querepresenta, com freqüência, o principal papel, As diarrheias da dentição estão indubitavelmente ligadas ás do desmame nesta estatística ; mas nem por isso se pôde deixar de considerar o desmame como factor etiologico- muito importante dos fluxos de ventre infantis. J. L. Petit, Jules Guerin, Trousseau, são todos accordes em afirmar que o rachitismo é procedente do desmame pre- maturo. As estatísticas do ultimo auctor, que a esse respeito escreveu trabalho consciencioso e de longo fôlego, demons- tram á saciedade essa asseveração. A eclampsia é também muitas vezes oriunda, se bem que indevidamente, do desma- -dO- me. A facilidade com que essa desordem de innervação apparece nos casos de moléstias do apparelho digestivo explicam a sua freqüência. A proclividade mórbida do desmame se prolonga por muito tempo e todas as precauções devem ser tomadas com persis- tência até que a criança se habitue completamente ao seu regimen novo, - 61 - IV A ALIMENTAÇÃO BA SEGUIDA INFAMA I IA PUERICIA ATÉ AtlfUVOUlI A influencia do desmame sobre os órgãos digestivos da criança perdura ainda, quando a appetencia pelo seio se lhe desvaneceu de todo. Habituada ao regimem lácteo tão ade- quado ás suas aptidões orgânicas, se esse regimem for abruptamente interrompido e substituído por outro excessi- vamente gorduroso e animalisado, a criança não deixará de resentir-se da mudança súbita e soffrerá em breve, como conseqüência, de irritações gastro-intestinaes, de dyspepsias, de estados inflammatorios e até de degenerescencia tubercu- losa, maxime se, por via hereditária, se acha predisposta para a acquisição desse terrível mal. E' por isso que no capitulo anterior se fez ver a conveniência de ir preparando, desde longa data, o organismo infantil para a epocha critica do desmame ; é por isso ainda que logo depois delle effcctuado até ao segundo anno, todas as precauções attinentes á inte- gridade das funcções das vias digestivas devem ser tomadas com persistência e boa razão. A base fundamental da alimentação desta quadra deve consistir ainda no leite, au.dliado pela ministração de subs- tancias feculentas sob a forma de mingáos, e, uma vez por outra na roda do dia, de uma sopa animalisada de fácil absorpçao. Convém ter muito era vista não usar precocemente da carne, principalmente da defibras resistentes. E' próprio da - 62 - Criança ser glotona e voraz, os alimentos pouco se lhe demo- ram na cavidade buccal para os misteres da mastigação, de forma que, se a carne lhe é administrada em pedaços nao desfeitos, succede que essas partículas passam inteiras para as vias digestivas pouco fortes ainda para digeril-as convenien- temente, 9 o resultado próximo são as diarrheias lientericas, primeiro acto do drama mórbido que apparecerá depois com todas as suas funestasconsequencias. O mesmo se poderá reflectir, com relação ao nosso paiz, quanto ao abuso do feijão. Esse alimento muito substancial é de grande uso na classe pobre, e é muito commura nessa classe, onde pouco penetra a luz da hygiene, a sua minis- tração ás crianças. O grão desse cereal impossível de ser attacado por um estômago de criança actua sobre as suas paredes como um verdadeiro corpo extranho e provoca terrí- veis indigestões acompanhadas muitas vezes de accessos eclampticos que põem em perigo a vida da criança. O pão é um alimento precioso para esta epocha de transi- ção ; é um dos alimentos sólidos e que deve ser aconselhado em primeiro lugar. As crianças accusam pronunciada appe- tencia por elle; esse alimento dilue-se facilmente sob a acção salivar e, segundo Fonssagrives, tem ainda a conve- niência de fornecer uma espécie de epithema emolliente ás geogivas habitualmente irritadas das crianças dessa idade. Os ovos quentes adubados com um pouco de sal são também um excellente alimento animalisado ; cosidos, estralados ou fritos, em virtude da coagulação dos princípios azotados, tornam-se de digestão muito mais laboriosa. Podem também ser muito adequadamente encorporados aos mingáos. E' preferível, antes do uso da carne, perraittir o peixe, com especialidade o peixe miúdo fresco. A carne deste animal é polposa, macia, e dispensa o preparo masti- gatorio para ser digerida. Comprehende-se que ha certas qualidades de peixe carregado, taes como o polvo, a — 63 — lulla, etc; os salgados em geral e os peixes era lata, cujo uso deve ser completamento prohibido. A partir dos dous aos três annos de idade até á completa omnivoridade deve haver um regimen infantil especial; infe- lizmente, porém, os hygienistas pouco se têm occupado deste assumpto, de modo que não ha princípios fixos, regras estabelecidas scientificamente para semelhante regimen. Fonssagrives mostra-se, e com razão, muito adepto das sopas animalisadas, como alimento de transição da epocha da segunda dentição á omnivoridade. Neste ponto confirma as idéas de Locke que, proclamador das virtudes alimentares das variadas sopas e caldos e do pão, eleva-se contra a mania abusiva da carne nas crianças, a qual, na sua opinião, só devia começar a fazer parte da alimentação infantil, quando as crianças attingissem a idade de 5 annos. Sem ser tão exclusivista como Locke também me parece haver abuso desse alimento na infância. E' o facto de se crer anêmicas e muito lymphaticas as crianças que nem sem- pre o são,que contribue para a propaganda desse regimen, ás vezes mal indicado. Outro abnso alimentar muito commum nesta idade e contra o qual se elevam concordes todos os hygienistas são os doces. A criança em geral, é muito affeiçoada a esta espécie de alimento e a industria exploradora das fraquezas humanas, reconhecendo semelhante predileção infantil, arma-lhe todos os laços attinentes a estimulal-a. Balas de innumeras quali- dades, confeitos de cores vivas, compõem o conjuncto da industria assucareira. Essas substancias são em geral de diffi- cil digestão e o abuso do assucir entretem a acescencia gás- trica, as dyspepsias de que soffrem muitas crianças. A formula a seguir-se, na puericia, deve ser amais sal do que assucar»; formula que infelizmente a cúbica e a gula — 64 — das crianças de combinação com a condescendência dos pro- genitores tornam de dificílima execução. Não menor e menos pernicioso é o abuso dos fructos. Os fructos prejudicam as crianças não só pelas qualidades pouco digestivas de muitos delles, mas também pela epocha prematura em que são freqüentemente utilisados. Ha grande numero de fructos que, sendo administrados, quando che- gam à completa maturação ou sujeitos á cocções previas, for- necem ura alimento magnífico á infância; outros ha, todavia, que são sempre prejudiciaes. O grande perigo dos fructos, porém, é o abuso de serem comidos verdes, falta, aliás, muito comraura nas crianças. Era conseqüência dessa imprudência é muito comraura o desenvolvimento de terriveis indigestões acompanhadas de febres de máo caracter, malignas, infecciosas, sobretudo nas quadras do anno em que a constituição medica favorece o apparecimento d'essas enfermidades. Ha um dito popular confirmativo desta asserção e que resa que o anno de muitas fructas é anno de muitis febres. Relativamente a bebidas, é de má hygiene permittir ás crianças o uso prematuro de vinho e mais bebidas alcoólicast Desde a mais remota antigüidade tem sido este abuso ver- berado. Platão fixava os 18 annos como competentes para a permissão do vinho; Galeno menos rigoroso, só o admittia aos 14; Paulo D'Egine alongava o praso até 20 annos. Hu- feland não era menos imperativo que os escriptores anti- gos; Locke acompanhou Hufeland na solução desta questão. « Não convém esquecer, diz Fonssagrives, que o systema nervoso da criança é extraordinariamente impressivel, e que o uso do vinho pôde augmentar essa predominância ce- rebral e nervosa que é caracter saliente da sua physiologia.» Este escriptor, entretanto, permitte o vinho dos seis annos em diante, e preconisa o vinho misturado com água, como — 65 — bebida sã e refrigerante. Análogos motivos se oppõe ao uso immoderado do chá e do café. Esta ultima bebida, especialmente, é de muito uso no nosso paiz, O café aguado pouco prejuizo pôde causar, mas a infusão forte é um estimulante do systema nervoso in- fantil, que por sua natural impressionabilidade, mais ne- cessita de sedativos que de excitantes. O abuso das comidas ou bebidas estimulantes tem ainda outro inconveniente, apontado razoavelmente por Fonssagri- ves, é a excitação do sentido genesico Este effeito favorece na criança a propensão para o vicio de Onan. Terminando, emíim, as considerações que a respeito deste ponto de hygiene infantil se me offerece dizer, apontarei ainda as principaes regras a seguir no regimen alimentar. Durante a epocha da amamentação a criança está affeita a tomar alimento muitas vezes por dia. Estes espaços devem ir-se tornando maiores nas crianças desmamadas, e na pue- ricia ; mas é preciso seguir aqui como em tudo a transição gradual, em que a naturesa é grande mestra. Os adultos tomão, em geral, três refeições diárias : o almoço, o jantar e a ceia; e o seu organismo se conforma perfeitamente com esta praxe. Sujeitar, porém, a criança a semelhante regra é com- pletamente irracional ; n'essa quadra da vida caracterisada por uma mobilidade^ma actividade de acção extraordinárias, e que bem se nota nos actos exteriores o organismonas suas funcções não pôde deixar de participar da mesma actividade. 0 movimento digestivo é muito mais rápido, muito mais rápidas as eliminações, e conseguintemente muito mais ne- cessária uma prompta reparação. Assim, pois, á de boa hygiene aconselhar que além das três refeições diárias prin- cipaes, sejam fornecidas merendas leves, no intervallo dellas. Em relação ao trabalho com a alimentação é também de bom uso um repouso anterior e outro posterior ás horas do trabalho intellectual. - 60- CONCLUSÃO A questão do regimen infantil, encarada debaixo de todos os pontos de vista, os mais minuciosos, podia dar assumpto para desenvolvimentos maiores ; infelizmente, como já tive occasião de externar, esta matéria não tem tido ainda, por parte dos mestres da sciencia, toda a ampliação de que é talvez susceptivel. Apresentando, pois, o que me parece mais essencial sobre a matéria, julgo ter cumprido meu dever e ter-me conformado com o que exige a these que escolhi par.i dissertação. IfopO£ÍCuT0 — 69 — CADEIRA DE PHARMACIA E ARTE DE F0RMUL4R Do opio chimica e pharmacologicamente -considerado i O opio é o producto solido ou semi-solido proveniente da evaporação do sueco leitoso (lactex) da cápsula do Papaver soraniferum álbum. II O processo regular para a extracção do opio consiste em praticar iucisões nas paredes das cápsulas maduras, com um instrumento de muitas lâminas curtas, de forma que esse instrumento rompa as paredes sem penetrar na cavidade capsular. III Distinguem-se, segundo sua proveniencia, o opio de Smyr- na, o de Constantinopla, o do Egypto, o da Pérsia e o das índias. IV As diversas espécies de opio são apreciadas conforme sua riqueza em morphina. V A quantidade de morphina existente nas diversas espécies de opio varia na media de 5 a 15 °/0 VI A morphina, a codeina, a narceina e a narcotina são os alcalóides mais importantes do opio. VII A morphina, de todos os alcalóides do opio o mais impor- tante, é solida, cristallisavel e se apresenta sob a forma de prysmas rectos rhomboidaes incolores ; é de solubilidade muito fraca na água, forte no álcool absoluto e ainda mais no álcool à 80.° .70 - VIII À morphina dissolvida na água e os saes de morphina em solução aquosa levam para a esquerda p plano de polori- sação : ella é pois levogyra. IX A morphina solida e cristalisada é quasi completamente insoluvel no ether sulfurico, nos óleos graxos, em certos óleos essências e na benzina, e notavelmente solúvel no chlo- roformio e no álcool amylico. X A morphina satura os ácidos, formando saes definidos e ordinariamente cristalisados. XI Os saes de morphina são geralmente solúveis na água, no álcool, na glycerina; não se dissolvem sensivelmente nem no ether, nem no chloroformio puros, e tom acção seda- tiva e estupefaciente. XII Os saes de morphina commumente empregados são o chlorhydrato e o sulfato. XIII O chlorhydrato de morphina, que é geralmente empre- gado de preferencia, se prescreve sob a forma de pílulas, poções ou era injecções hypodermicas e se administra inter- namente na dose de 1 a 5 centigrammas em 24 horas. XIV As mais importantes preparações pharmaceuticas de que o opio é a base são : o extracto gomraoso de opio e os lau- danos de Sydenham eRousseau. - 71 - CADEIRA DE ANATOMIA DESCRIPTIVA Nervo pneumogastrico i O pneumogastrico, pertencente ao décimo par craneano, nasce no sulco lateral do bulbo abaixo do glosso-pharyngêo. II Desde a sua origem até a sua terminação o pneumogas- trico apresenta a estudo cinco porções, a saber : a Ia dentro do eraneo ; a 2.* no buraco despedaçado posterior ; a 3.a nn pescoço ; a 4.* no thorax ; e a o." no abdômen. U! Na porção intra-craneaua o pneumogastrico, nascendo por um feixe triangular de raizes, cujo vértice corresponde ao buraco despedaçado posterior, apresenta direcção obliqua para fora e para cima ; este feixe está situado entre o glosso- pharyngêo e o espinhal. IV O pneumogastrico sahe da cavidade craneana pelo bu- raco despedaçado porterior, envolto na mesma bainha osteo- fibrosa que o espinhal, diante do qual elle se acha. V Vertical no poscoço, apresenta dois gânglios : o superior, glanglio jugular, immediatamente abaixo do buraco despe- daçado ; o inferior, gânglio phlexiforme^ logo abaixo do pre- cedente. VI 0 pneumogastrico, no pescoço, está situado para fora e para traz da artéria corotida interna e da primitiva, e para dentro da veia jugular interna. Ahi emitte ramos pha- ryngeanos, os nervos laryngeos, superior e inferior e alguns ramos cardíacos, -72- VII Antes de penetrar no thorax, o pneumogastrico direito trajecta entre a artéria e a veia sub-clavea, parallelamente ao grande sympathico ; o esquerdo, continuando seu per- curso ao longo da carótida primitiva, vae collocar-se ao lado esquerdo da crossa da aorta. VIII Tendo penetrado no thorax, o pneumo-gastrico direito, de- pois de ter crusado a direcção da sub-clavea respectiva, se dirige para traz e para dentro no sentido do esophago, cujo bordo direito percorre até o diaphragma. IX O esquerdo desce verticalmente e applica-se á face interna do pulmão do qual se acha separado pela pleura mediastina. X No thorax, os pneumo-gastricos dão ramos cardíacos pul- monares e esopnagianos, formando plexos differentes por suas anastomoses. XI Na cavidade abdominal elles penetram pelo orifício eso- phagiano (cardia), collocando-se o direito a traz e o esquerdo adiante do cardia. XII Os plexos mais notáveis do pneumogastrico são os que forma cora o grande sympathico, a saber: o plexo cardíaco o plexo pulmonar e o plexo esophagiano. — 73 — PRIMEIRA CADEIRA DE CLINICA MEDICA DO DIAGNOSTICO E TRATAMENTO DAS ADHERENCIAS DO PERICARDIO I As adherencias do pericardio são ou geraes ou parciaes. II As adherencias parciaes são mais communs e apresentam- se geralmente nos pontos menos moveis do coração e nos mais declives. III Peter não crê que a falta de mobilidade exerça influencia na producção de adherencias ; julga isso devido ao attrito do coração contra os pontos mais resistentes. IV As adherencias podem ser rnolles e laxas ou fibrosas, e são susceptíveis de soffrer degenerescencia calcaria. V A symphise cardíaca raramente se apresenta só ; quasi sempre vem acompanhada de alterações, quer para o lado do coração, quer para os órgãos que cercam o pericardio. VI O aspecto do coração differe muito, ora é normal e, mais freqüentemente, hypertrophiado e dilatado. VII O coração se conserva normal, quando as adherencias são parciaes e as dobras molles e longas. VIII As adherencias do pericardio se manifestam ao exterior por modificações das paredes thoraxicas. N. 98 * 10 — 74 — IX Na occasião da systole vê-se uma depressão da parede do thorax, cuja sede é dependente da natureza e pontos adhe- rentes. X A depressão systolica pôde não ser signal de adherencia, mas se coincide com choque diastolico, isto é, levantamento diastolico produzido pela volta das partes que foram depri- midas, a sua posição normal é symptoma pathognoraonico. XI O collapso das veias do pescoço é algumas vezes resulta- do da dyastole cardíaca. XII Se encontrarmos esses três signaes (depressão systolica, choque diastolico e collapso venoso), temos elemento para o nosso diagnostico. XIII Pela apalpação sentimos os battimentos do coração em maior extensão. YIV A medicação empregada é revulsiva e internamente a que mais vantagem apresenta é o uso do iodureto de potás- sio e do leite. I Qu