*£>. nJ5rtf|^afir3gWr W9 FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO f^i^i^^ip clf^Í #^> ' iM *%?*« Clinica cirúrgica de adultos. Domingos de Góes e VasconCellos.....] Pedro Paulo de Carvalho.......Clinica obstetrica e gynecologica. José Joaquim Pereira de Souza...... Clinica medica e cirúrgica de crianças. Luiz da Costa Chaves Faria.......Clinica de moléstias cutâneas e syphililicas Joaquim Xavier Pereira d» Cunha.....Clinica ophtalmologica. •.............Clinica psychiatrica. W.B.AFaculdadenãoapprova nem reprova asopiniõesemittidasnasThesesqufclhesão apresentadas 4626 FIFmr^^ujimiw-mmm wwBMHtamuaumHffs/. (E&flE A MEMÓRIA DE MEU PAE 0 Sr. Major TJrias Antônio da Silveira k MEMÓRIA DE MEUS IRMÃOS Dr. Theotonio Wenceslau da Silveira E Blandina Cândida da Silveira Á MEMÓRIA DE MEUS PARENTES E AMIGOS KuiiamíiiBSJBETBB: ^ ~&\i\ú$ %úwnk 3R»4 Os ^ossos conselhos fizeram germinar em mim o amor ao trabalho, e guiaram- me sempre no caminho da honra. Agora que vou cercar a minha vida das responsabilidades que acompanham o cidadão e o medico, peço-vos a vossa benção como a sancção do meu passado e as esperan- ças do meu futuro. A MEU IRMÃO E MAIOR AMIGO si e mm um 111111 Os maiores exageros de linguagem ficariam áquem de meus intentos para manifestar-te o meu reconhecimento pelo muito que fizeste por mim. Fòste para mim o que ninguém teria sido; conseguisle para teu irmão um logar na archibancada dos discípulos de Hippocrates. Aceita pois este trabalho que, se não está na altura de teus merecimentos, é ao menos a expressão maior da minha eterna gratidão. A MEUS QUERIDOS IRMÃOS Tkcophilo Ascanio da Silveira Álvaro Astcljpko da Silveira AMIZADE FRATERNAL. A MINHA QUERIDA IRMà E A MEU CUNHADO Sr. Hh Vim Intonfo da Silveira Fraternal amizade e eterna gratidão. À MIXIIA QUERIDA 1LIMà iimmi wmmm m mm Aceite, minha querida irmã, esta pequena prova da muita amizade que te dedico e do meu eterno reconhecimento. A MEU PRIMO E CUNHADO o Sr. Antônio Cândido de Mello e Souza Muita amizade c gratidão. A MEU PRIMO O Ulm. Sr. José AItos de üraaites E A' MINHA PRIMA A Exma. Sra. D« Maria Horária de üsantis Muita amizade e eterno reconhecimento A' MINHA QUERIDA IRMà D. âdefoide ffiatofina de Jlcfto Jlattos E A MEU CUNHADO 0 Sr. Dr. Cassiano de Mello Mattos Fraternal amizade. A MEU IRMÃO Br, Saturniria amando da Silveira E A MEUS SOBRINHOS a to»©3 os mime B&mítmmm AOS MEUS AMIGOS E COLLEGAS DISTINCTOS Os Srs. Drs. Sebastião Mascarcnkas (Barroso Francisco de (Parda Fajardo A muita amizade que lhes dedico me torna feliz por sua retribuição sincera. Ê 3TOTS €'B>WM13K3llOS m EEK!lBM€â Durante toda a minha vida acadêmica. SAUDOSA RECORDAÇÃO. AOS MEUS AMIGOS E COLLEGAS: Os Srs. Drs. Cicero Ferreira (Rodrigues Herculano Gonçalves Castanheira e sua Exmas. Famílias. A MEU ILLUSTRADO AMIGO O Sr. Dr. Francisco Ferreira Jfetto E L SUA EXMA. FAMÍLIA. A MEU PRIMO E AMIGO O Illm. Sr. Antonino Ferreira de Carvalko E Á SUA EXMA. FAMÍLIA. Muita amizade e eterna gratidão. A MEU PRIMO E AMIGO O Illm. Sr. Antônio ^edro de (Padua E Á SUA EXMA. FAMÍLIA. A MEUS PRIMOS A MEUS AMIGOS DA CIDADE DE PASSOS a meu Amigo o Illm. Sr. Tenente-Coronel Francisco de Paula Fajardo i k mk sxaia. $mihh\ Sincera amizade e alta consideração. AO DISTINCTO COLLEGA, O SR, Dr. SjMq Izamluja de Oliva laja E Á SUA EXMA. FAMÍLIA Muita consideração e amizade. A MEU AMIGO O SP. 33ev íqso Lttdol E Á SUA EXMA. FAMÍLIA. AOS MEUS AMIGOS E COLLEGAS DE ANNO ^.os Jlljvis. jSr^s. pi\s. João Antônio de Avellar Luiz Amar ante Cruz Antônio Martins Pimentel Cai-los Botto Luiz Botto José Fabiano Alves Alberto Senra Josino de Brito Ignacio Campos Augusto Clementino Ramiro Santiago Augusto de Vasconcellos Joaquim Fabiano Alves Gabriel Fabiano Alves. DO HOSPITAL DO OARMO ESPECIALMENTE AO SR. DR. e=sManee/ tí^/tféanteiio e/e cJ^xcvee/o. AOS DISTINCTOS CLÍNICOS Os Srs. Drs. Constante Jardim Júlio de Moura João (Paulo Ctinha (Pinheiro ADMIRAÇÃO ao TALENTO e A ILLUSTKAÇÀO. aqs ®©ie@ra3i®qs mm mm Felicidades. MINHA ESTREMECIDA TERRA NATAL. lIÜIEf AGÁ© HEMORRHAGIA CEREBRAL V/s HAR^ 1 1885-K O estudo da hemorrhagia do cérebro é feito ordinaria- mente dividindo-se o assumpto em três fôrmas clássicas; porém essa divisão não pôde ter por base razões nem physiologicas nem anatômicas e nem clinicas ; porquanto uma hemorrhagia extensa pôde não se acompanhar dos symptomas assustadores da apoplexia, ao passo que um pequeno foco é bastante, em alguns casos, para determinar ura ictus-hemorrhagico. Dividi o assumpto em duas partes: uma destinada ao estudo da hemorrhagia considerada em si mesma, outra desti- nada ao estudo da hemorrhagia em relação ás differentes zonas cerebraes. Como admirador dos immortaes trabalhos de Char- cot e Bouchard eu n'esta dissertação designarei sempre pelos nomes d'estes dous observadores as hemorrhargias originadas pelos aneurismas miliares; porquanto foram elles os primeiros a reconhecer e evidenciar definitivamente o papel d'estes aneu- rismas na producção da hemorrhagia cerebral. Cumpre-me aqui agradecer ao illustrado Sr. Dr. Monteiro de Azevedo, cujo serviço clinico no Hospital do Carmo acompanhei por espaço de três annos, os primeiros preceitos de clinica, que delle recebi, revestidos d'aquella illuotração e proficiência que o caracterisam. FHilIM fllfl Histórico Os antigos pathologistas, estudando a pathogenia da apoplexia, se limitavam unicamente á observação dos sym- ptomas, sem procurar qual a natureza da lesão que lhes dava nascimento. O seu diagnostico era completo quando elles encontravam os symptomas que constituem a apoplexia. Boerhaave assim descrevia os symptomos capitães da apo- plexia : « Quce apoplexia dicitur adesse, quando repente adio quinque sensuum externorum, tum internorum, omnesque motus voluntarii abolentur, superstite pulsu plerumque forti et respiratione difficili, magna, sternente, una cum imagine profundi perpetuique sumni. » Ao lado da apoplexia propriamente dita Galeno e a maior parte dos médicos que o seguiram descreveram um grau menor da apoplexia que elles chamavam de — para- plexia. Embora todos elles referissem ao csrebro a localisação da apoplexia, todavia desconheciam a natureza da alteração que tão subitamente accommettia este órgão. As theoriaspara — 6 — explical-a, porém, não faltaram como até hoje, e Galeno dizia que a moléstia resultava da replexão dos ventriculos por hu- mor melancólico e frio; Willis dizia que a sua causa era a parada dos espíritos animaes; outros finalmente davam como causa a obstrucção dos vasos pela biles. Com os estudos de Wepffer (1681) e principalmente de Morgagni (1761) a pa- thogenia da apoplexia tomou nova orientação. Ambos notaram a coincidência das heniorrhagias ce- rebraes com a apoplexia. Os trabalhos de Morgagni foram aceitos por todos os pathologistas, e suas idéas exageradas por áquelles que o seguiram deramlogara um novo erro. E' assim que Rouchoux, cujos trabalhos notáveis sobre este assumpto datavam desde 1814, quiz generalisar a todos os casos a relação pathogenica entre a hemorrhagia e a apoplexia, e cahio desastrosamente em erro, quando aííirmou que a apo- plexia sempre traduzia uma hemorrhagia no cérebro. Cru- velhier aceitou a nova significação da apoplexia, e estendeu-a a outros órgãos para designar nelles os focos hemorrhagicos. A apoplexia, pois, tinha perdido a sua significação hyppocratica, e era por um mero capricho empregada em vez de hemorrhagia que exprimia o mesmo phenomeno. Logo, porém, Rostan descobrio uma nova moléstia, que dava logar á apoplexia sem hemorrhagia cerebral, e que elle designou sob o nome de amollecimento não inflammatorio do cérebro. Os seus trabalhos, refutados por Broussais, foram apoiados por Andral, Lalle- mann e d'Abercombie. Naquella época era a escola medica de Broussais, que em seu absolutismo pretendia resumir a com- plexidade dos phenomenos pathologicos em uma formula meta- physica. Em todas as moléstias se via a irritação como causa, e pois a descoberta de Rostan não podia ser aceita por — 7 — Broussais, porquanto se tratava ali de uma espécie mórbida não inflammatoria do cérebro. Van Swieten tinha já assignalado a possibilidade de um vaso do cérebro ser obliterado por um coagulo originado no coração ; porém, depois dos trabalhos de Wirchow, de Panum e de Cohn sobre embolias cerebraes, e de Feltz sobre embolias capillares, a moléstia descoberta pelo gênio inves- tigador de Rostan, ficou definitivamente conhecida em sua natureza, e hoje é designada sob a denominação de amolleci- mento cerebral por embolia ou thrombose. Os trabalhos sobre hemorrhagia cerebral succederam-se até que em 1869, Charcot e Bouchard descobriram a relação pathogenica entre a hemor- rhagia cerebral e a os aneurismas miliares observados primeiro por Cruveilhier; provaram ao mesmo tempo que o maior numero de cerebrorrhagias tinham por ponto de origem os aneurismas miliares. Em virtude, pois, do que fica dito n'este ligeiro histórico cumpre-me declarar, que não empregarei em toda esta disser- tação a palavra — apoplexia — como synonymo de —hemor- rhagia —, porque penso que não se deve sacrificar a precisão techuica de uma sciencia qualquer, a innovações inúteis, que desvirtuam os seus termos, e que servem apenas para confundir as questões. — 9 — Hemorrhagia cerebral Definição . —Por hemorrhagia cerebral deve-se entender a extravasação de sangue no cérebro, atravez de uma solução de continuidade dos vasos cerebraes. Por esta definição não são consideradas hemorrhagias cerebraes as hemorrhagias inter e extrameningeanas, nem tão pouco as hemorrhagias dos pedunculos cerebraes, dos tuber- culos quadrigeneos, da protuberancia, do cerebello, e do bulbo. De facto estas hemorrhagias acompanham-se de symptomas que difncultam muito, e algumas d'ellas tornam mesmo impos- sível o diagnostico differencial, porque acompanham-se das mesmas perturbações funccionaes devidas á hemorrhagia do cérebro. O cérebro, porém, é constituido exclusivamente pelos dous hemispherios cerebraes, e pela rede vascular lepto-menin- geana; por conseqüência só devem ser consideradas hemorrha- gias do cérebro as extravasações de origem lepto-meningeana e quaesquer outras que se fizerem no interior dos dous hemis- pherios cerebraes. Segundo este modo de vêr, a palavra — en- cephalorrhagia — não deve ser empregada de um modo geral, como fazem ulguns auctores, para exprimir a hemorrhagia cerebral; eu só a empregarei modificada pelo diagnostico re- gional . X 1885—K — 10 — Etiologia As causas da hemorrhagia cerebral podem ser ou predis- ponentes ou determinantes. Causas predispoueites Idade.—Desde que a vista dos observadores dirigiram-se para o estudo da hemorrhagia cerebral, ficou logo admittida como verdade de observação, que a moléstia era mais freqüente nos velhos. Entre os aphorismos de Hippocrates encontra-se este : « As apoplexias têm sua maior freqüência dos 40 aos 60 annos. » Não admira entretanto que a velhice precoce, nascida dos prazeres de Baccho e ungida pelos lábios de Venus, venha até certo ponto infringir as conclusões dos observadores; por- quanto individuos ha que despem-se de sua vitalidade pujante em troca de uma esfarrapada cachexia urdida no viver depra- vado dos bordeis. Em taes condições, a decadência vital não exprime, como devera, uma idade avançada, e elles submettem o organismo ás mesmas contingências de que se cercam os in- dividuos velhos, ou mesmo m ais graves do que d'estes. Não são raras as observações de degenerescencias arteriaes próprias da velhice em individuos que deveriam estar em plena mocidade; e é por isso que Cabalis dizia que: «On a 1'âge de ses artères.» — 11 — Pois bem, estes individuos estão sujeitos á hemorrhagia cere- bral do mesmo modo que um velho, cuja idade venha attestada pelo estado das artérias. Nas crianças a hemorrhagia cerebral tem sido observada, quando moléstias geraes alteram a nutri- ção dos vasos, tornando-os mais friaveis. Sexo . — Alguns acreditam que ambos os sexos são igual- mente sujeitos á hemorrhagia cerebral; porém observações mais minuciosas têm chegado a estabelecer que ella é três vezes mais freqüente no homem do que na mulher. E tem plena razão de ser esta maior freqüência; em primeiro logar os factos de velhice precoce são raros no sexo feminino; em segundo logar o homem se entregando a trabalhos de todo gênero, traz o seu organismo em plena actividade, e tem pois o seu cérebro mais ou menos congestionado; ora, é natural que uma causa determinante de hemorrhagia cerebral, produza o seu effeito de um modo tanto mais fácil quanto mais pingue- mente vascularisado foro órgão. Constituição.—As constituições fortes, athleticas não dei- xam de ter alguma influencia na producção das hemorrhagias do cérebro. Morgagni tinha já posto bem em relevo a relação entre as constituições e a hemorrhogia cerebral, quando em suas cartas insistia sobre os signaes exteriores considerados como índices d'esta moléstia. O accordo, porém, não é unanime sobre a quasi totalidade das deducções pathologicas, e só por este principio é que pode-se explicar a opinião de Rouchoux quando diz: Aucun signe eceterieur apreciable, ne peut indiquer une disposition à Vapoplexiel — 12 — Hereditariedade.—Quem manusêa alguns dos trabalhos importantes que se tem escripto sobre a hereditariedade, sente-se com coragem de afíirmar a priori que a hemorrhagia cerebral é hereditária. A imponência dos factos rigorosamente observados vem evidenciar de todo esta possibilidade theorica, porque desde Frank até hoje que a sciencia registra factos incontestáveis de hereditariedade na hemorrhagia cerebral. Affecções de certos órgãos.—Desde Legallois que a hypertrophia cardíaca começou de ser imputada como causa predisponente de hemorrhagia cerebral, e a autópsia do senador Cabanis, assim como outras praticadas por Bricheteaud, Cor- visart Rokytanski e outros pareceram pôr a questão fora de duvida. Meniére, admittindo estas idéias sem restricções ao que parece, vio, talvez por coherencia, uma causa predis- ponente na hypertrophia gravidica, descoberta por Larcher. Não se pode admittir, porém, este modo de pensar ; de um lado as estatísticas e de outro lado razões ponderosas nos obrigam a não acreditar que a cardio-hypertrophia gravidica seja causa predisponente de hemorrhagia cerebral. Condições atmosphericas. — Hippocrates dizia que a apoplexia era mais commum durante o inverno e no decurso das primaveras frias e humidas, do que em qualquer outra estação. Parece, porém, que a moléstia possa achar-se em eminência maior numero de vezes sempre que houver uma passagem brusca do calor para o frio; e a razão physiologica do facto é clara demais para que seja exposta aqui. A morada em logares collocados em uma altidude anti- hygienica predispõe á hemorrhagia cerebral, — 13 - O estado de anoxhemia a que ficam reduzidos os habitan- tes das montanhas, confere um certo gráo de fragilidade aos vasos cerebraes, em virtude do qual a hemorrhagia cerebral so- brevem, mediante qualquer uma causa determinante. A subida a grandes alturas, principalmente carregando pesos, e por conseqüência augmentando os desdobramentos orgânicos, é uma causa que predispõe á hemorrhagia cerebral. Vícios geraes de nutrição.—O alcoolismo e a syphilis representam um papel importantíssimo na producção da he- morrhagia cerebral, porquanto, como exporei mais adiante, as estatísticas demonstram que a hemorrhagia cerebral é, nò maior numero dos casos ligada á preexistência de aneurismas mi- liares dos vasos cerebraes, e na pathogenia d'estes aneurismas o álcool e a syphilis occupam os logares de honra. As anemias, como quaesquer outras dyscrasias, desde que exprimam uma perturbação nutritiva de todo o organismo, podem predispor á hemorrhagia do cérebro diminuindo a resis- tência dos vasos daquelle órgão. Difficuldade da circulação cerebral de retorno . — Os tumores localisados sobre o feixe vasculo-nervoso do pescoço são causas predisponentes de hemorrhagia cerebral, e que fatalmente transformam-se em causas determinantes, se não forem removidas em tempo conveniente. Assim também todas as lesões intracraneanas, de uma evolução lenta, e sus- ceptíveis de serem removidas, predispõem ao ictus hemorrha- gico do cérebro. O uso de collarinhos apertados, as golas de couro usadas nos fardamentos dos soldados, embaraçam a circulação cerebral do retorno, Os embaraços circulatórios, - 14 — creados pelas lezões cardíacas adiantadas, actuam dillatando os vasos cerebraes, que, em presença de uma causa determinante podem facilmente se romper. E' somente nestas condições que se pôde admittir as lesões cardíacas como causa predisponente de hemorrhagia cerebral primitiva. Condições sociaes.—Alguns observadores pensam que a vida na abastança ou mesmo com sobriedade, predispõe mais á hemorrhagia cerebral, do que a vida em condições oppostas, mais attendendo-se ás condições pathogenícas da hemorrhagia cerebral, e na falta de estatisticas feitas debaixo d'este ponto de vista, é mais natural pensar-se que o contrario é que se dá. Causas determiuautes As causas que determinam a hemorrhagia cerebral podem ser grupadas do modo seguinte : 1. ° Causas que actuam directamente congestionando o cérebro. 2.° Causas que actuam por via reflexa. 3.° Causas que actuam embaraçando ou impedindo a circulação cerebral de retorno. 4.° Causas que actuam directamente rompendo as paredes dos vasos do cérebro. — 15 — 1.° Causas que actuam directamente congestionando o cérebro.—O ópio e os preparados de morphina estão incluídos n'este grupo, porque hoje está mais que provada a acção congestionante do ópio sobre o cérebro. Ora, uma vez que estes preparados sejam administrados de modo inconveniente, seja porque se tenha em vista um caso de atheroma bem caracterisado, seja porque a sua quantidade excessiva torne-se incompatível com a resistência das paredes vasculares, reunem-se as condições bastantes para que se dê a extravasação sangüínea entre os elementos da substancia cerebral. N'este caso também está o álcool, quando é ingerido em grandes doses e de uma só vez. Os esforços intellectuaes podem ser seguidos do ictus hemorrhagico, quando o terreno está todo preparado pela acção latente de causas especiaes, por que elles são acompanhados de congestão cerebral, do mesmo modo que um corpo opaco interposto aos raios luminosos o é de sua projecção. Dizer-se, portanto, esforço intellectual é dizer-se maior afíluxo de sangue para o cérebro, é dizer-se hyperhemia cerebral; isto é, que as manifestações da intelle- ctualidade constituem um producto, que tem por factores a integridade anatômica do cérebro, e as differentes oscillações de circulação cerebral. E' bem verdade que um cérebro, cuja organisação não seja normal, possa funccionar normalmente; mas não são estes senão factos excepcionaes, que não devem de modo algum destruir a ,proposição acima enunciada. Em vista do que ficou dito, pois, comprehende-se que o terreno, uma vez preparado, os esforços intellectuaes podem determinar a hemorrhagia do cérebro. N'esta classe de causas determi- nantes podem ainda ser incluidos os esforços musculares, o vomito, o espirro, a tosse, as posições declives, etc. — 16 - 2.° Causas que actuam por via reflexa.—Entre estas causas acham-se os abalos moraes, os choques, a insolaçao, as indigestões, a coprostase, as correntes de ar frio, as dores in- tensas, e muitas outras, cujo modo de acção é o mesmo, isto e, um acto reflexo que determina em ultima analyse um augmento de pressão sangüínea intra-cerebral. Este augmento de tensão intra-vascular póde-se effectuar, ou por paralysia dos vasos- motores ou por maior afíluxo de sangue ao cérebro. 3.° Causas que actuam embaraçando a circulação cerebral de retorno.—A circulação de retorno pôde ser perturbada de um modo notável pelos tumores cervicaes, pelos aneurismas da aorta, pelas neoplasias intra-craneanas, pelos coágulos nos seios da dura-mater, e por muitas outras causas, cuja ennumeração seria fastidiosa. Todas ellas actuam au- gmentando a tensão sangüínea intra-cerebral, de modo que em um momento dado, o augmento de tensão torna-se incom- patível com a resistência dos vasos, determinando assim a ruptura d'estes. 4.° Causas traumáticas . —Toda a força que actua com violência sobre as paredes do craneo determina pelo menos congestão cerebral. Quando o choque é seguido de íractura do craneo a hemorrhogia se produz pelo menos nas camadas corticaes. Os traumatismos sobre outras partes do organismo podem produzir hemorrhagia cerebral, ou embaraçando a cir- culação cerebral de retorno, ou provocando uma hyperhemia activa do cérebro. — 17 — Symptomatologia A hemorrhagia cerebral é uma moléstia caprichosa de- baixo d'este ponto de vista, porquanto muitas vezes dá-se a sahida do sangue no interior do cérebro, com destruição mesmo de seus tecidos, sem que appareçam symptomas que revelem a existência do foco. Muito tempo depois podem apparecer os symptomas de uma degenerescencia descendente ; mas quando o indivíduo não apresenta symptoma algum absolutamente, só umaautopsia curiosa é que casualmente encontra os signaes do foco de data remota. O maior numero das vezes, porém, isto se não dá, e obser- va-se perturbações funccionaes diversas que bastam para cara- cterisar a cerebrorrhagia, e mesmo determinar com grandes probabilidades a sede do foco. D'entre os principaes sym- ptomas que acompanham a hemorrhagia cerebral, devem figurar em primeiro logar aquelles que constituem a apoplexia. Os phenomenos prodromicos da hemorrhagia cerebral desde muito tempo têm sido admittidos, e eram designados sob a denominação de molimen apopletico ; todavia é preciso que se os examine com alguns detalhes para dar-lhes o justo valor. Na hemorrhagia cerebral não existem verdadeiros sym- ptomas prodromicos, como soe acontecer de ordinário nos 3 1885-K — 18 — exanthemas agudos ; e muitas vezes elles podem vir a faltar completamente. Se bem que debaixo d'este ponto de vista as estatísticas não tenham um valor absoluto, é comtudo um facto de observação diária, que o insulto hemorrhagico pôde apparecer, sem ser seguido de symptoma cerebral alguma. Porém em alguns casos é fora de duvida que pôde haver symptomas que precedam o ataque, e indiquem assim a sua eminência. Estes phenomenos precursores podem ser grupados em três cathegorias: Na primeira estão aquelles que precedem a hemorrhagia desde muito tempo, mas que não têm nenhuma relação im- mediata com ella. Na segunda estão os factos em que a he- morrhagia é precedida poucos dias antes por paresias ou parasthesias prodromicas n'aquellas mesmas partes que pouco depois serão sedes de paralysias quer da sensibilidade, quer da motricidade. Na terceira finalmente estão aquelles que pre- cedem de poucas horas o ataque e que devem mesmo ser considerados como symptomas da hemorrhagia que começou a fazer-se no interior do cérebro. De um modo absoluto não se pôde dizer que a hemorrhagia cerebral seja acompanhada de prodromos característicos, que indiquem sua proximidade, porque estes ou dependem de pequenos focos que se formam no logar onde a autópsia encontra o foco que determina o ataque, ou traduzem a iniciação do derrame intracerebral que se faz lentamente. Estes phenomenos consistem em vertigens repetidas, cephalalgia, zumbidos, stocomas scintillantes, etc, ao mesmo tempo nota-se mudança de caracter do indivíduo que torna-se irritavel, ou aborrecido de tudo ; outras vezes fica somnolento, — 19 — triste e com difíiculdade de pensar em um assumpto qualquer. A's vezes o indivíduo não pôde fallar, por impossibilidade de mover a lingua, mas esta perda da palavra é passageira. Outros symptomas exquisitos podem apparecer, e com- prehende-se que elles podem variar ao infinito; assim em um caso o indivíduo tinha a sensação de um perfume ine- briante, e logo depois foi accommettido pelo ataque. Outro bocejava constantemente pouco antes do ataque. Como disse acima, perturbações sensitivas e motoras podem preceder ao ataque, assim póde-se observar a paresia de um membro, paralysia de um músculo do globo occular, determinando a sensação visual dupla ou diplopia; sensação de calor, ou de frio que pôde chegar a provocar dor ao doente. Outras perturbações visuaes podem apparecer e correr por conta de affecções da retina, cuja hemorrhagia chega a provocar o apparecimento de amaurose que precede de muitos dias a cerebrorrhagia. Em seguida a estes prodromos apparece o insulto hemorrhagico e a apoplexia se manifesta. O symptoma principal da apoplexia é a perda de conheci- mento, ou antes da consciência. O indivíduo é índifferente a tudo quanto o rodeia; elle não sente e nem quer cousa alguma. Com o olhar dirigido ás vezes para um ponto qualquer elle olha sem nada vêr. Outras vezes é o estado soporoso intenso que appare- cendo desde logo não permitte ao menos que o indivíduo abra os olhos. Os músculos em completa resolução não con- servam os membros na posição que costumam a guardar durante o somno; apenas o coração pulsa e o indivíduo respira. Póde-se em taes condições observar o phenomeno que Cruveilhier foi o primeiro a notar, e que Prevost primeiro — 20 — que todos deu como meio diagnostico não só da hemor- rhagia como do hemispherio lesado; este phenomeno é o desvio conjugado da cabeça e dos olhos para o lado do he- mispherio lesado. O valor d'este symptoma será apreciado em outro logar. Raras vezes nota-se as convulsões coincidindo com um ataque de hemorrhagia cerebral, e quando existem quasi sempre indicam que o derrame estendeu-se aos ven- triculos cerebraes, Ao lado d'estes symptomas o rosto é colo- rido differentemente. A's vezes é uma pallidez cadaverica que se observa, outras vezes ao contrario elle congestiona-se e torna-se vultuoso. As pupillas podem apresentar-se contra- hidas ou dilatadas; porém a desigualdade d'ellas é um bom signal diagnostico da unilateralidade da lesão. O pulso é mais comummente fraco e irregular, mas ás vezes é cheio e forte. A respiração muitas vezes não apresenta irregularidade alguma; mas em muitos casos é estertorosa e acompanhada da projecção passiva das commissuras labiaes no acto expira- torio, assemelhando-se a um indivíduo que fuma em cachimbo. Desde pouco tempo depois do ataque a respiração pôde apresentar o typo chamado Cheyne-Stokes, e que consiste em uma longa pausa expiratoria seguida de movimentos res- piratórios muito freqüentes, que vão se espaçando para dar logar á uma nova pausa. A sensibilidade offerece difíiculdades em ser apreciada de um modo rigoroso, porque o indivíduo em estado de apoplexia pôde deixar de reagir as excitações mesmo fortes, e não ter anesthesía. A anesthesia, em sua significação restricta, exprime a perda da sensibilidade, quer seja ou não acompanhada de perturbações intellectuaes ; porém nos apopleticos, qualquer que seja a causa do ataque, ha perda de consciência que os — 21 — impossibilita de traduzir exteriormente qualquer acto volun- tário; a sensibilidade, pois, como phenomeno subjectivo que é, não pôde ser apreciada, emquanto não se verificar a existência de actos conscientes. Os reflexos em geral são abolidos, e nenhuma excitação peripherica, por intensa que seja, é capaz de provocar uma reacção medullar; somente persistem os reflexos da respiração e da circulação por meio dos quaes estes mortos vivem. O reflexo da deglutição é raras vezes abolido. As perturbações reflexas, que se manifestam para o lado do apparelho urinario, podem produzir em um caso incontinencia, em outro retenção de urinas ; a bexiga neste caso fica comple- tamente cheia, fôrma um tumor, ou antes uma saliência no hypogastro, e o invididuo urina gotta á gotta, por uma verdadeira regorgitação. Perturbações idênticas dão-se em relação ao sphincter anal, isto é, em certos casos encontra-se a constipação de ventre, em outros a incontinencia de fezes. A exploração dos reflexos abdominaes é de uma impor- tância enorme, segundo os Srs. Rosenback e Mcell, quando se tem em vista o diagnostico do hemispherio lesado. Segundo elles a diminuição do reflexo de ambos os lados, e a perda de conhecimento mais ou menos completa, indicam sempre uma lesão cerebral diffusa. Quando, porém, o reflexo é somente observado em uma metade do abdômen, é signal de que a lesão tem por sede o hemispherio do lado opposto. Quando persiste a ausência unilateral do reflexo observada durante o coma, uma grande parte do cérebro foi destruída (Rosenback e Mcell). A persistência dos reflexos respiratório e circulatório é relativa, assim como já vio-se ha pouco, para a respiração. _ 22 - A circulação capillar em todos os casos é perturbada, e mais vezes ha tendência para a estase nos capillares. Além d'isto encontra-se perturbações da cardiosthenia physiologica que podem ser grupadas de dous modos: Io, as- thenocardia coincidindo com o período de algidez; 2,° ta- chycardia, que augmenta-se gradativamente á proporção que o doente approxima-se da morte. A temperatura offerece um caracter muito especial, es- tudado por Bourneville. No começo do ataque ella pôde conservar-se no algarismo normal, mas quasi sempre ella desce, e em alguns casos chega até 35 gráos; depois de 24 horas ou menos ainda ella começa a subir, e pôde attingir á grande cifra hyperthermica de 41 e 42 gráos. Se a moléstia tem de se terminar fatalmente em pouco tempo, a temperatura conserva-se n'esse gráo ; no caso con- trario ella desce lentamente ao algarismo normal. Quando o doente tem de sobreviver ao ataque, todos os phenomenos apopleticos vão-se dissipando, gradativamente volta a consciência; mais apezard'isso o individuo conserva-se somnolento, com as idéias confusas, incapaz de responder com coherencia as perguntas que se lhe dirige, e queixa-se ás vezes de cephalalgia, etc. Os movimentos da lingua são difíiceis e podem-se accen- tuar aos poucos, e generalisar-se a certos músculos, dando logar ao sydroma clinico de Duchene de Bolonha, ou paralysia labio-glosso-laryngea, mais de origem cerebral. A este estado segue-se um período estacionario ou de paralysia, caracterisado por uma hemiplegia quer facial, quer dos membros thoraco-abdominaes. Na hemiplegia facial ha um facto muito curioso a notar-se, é que ha quasi sempre — 23 — paraplegia facial, paralysia do facial, respiratório, ficando intacto o outro ramo. A uvula e a lingua podem ser desvia- das para um dos lados. A intelligencia participa sempre d'estes desarranjos da organisação cerebral; quando menos n'este periodo observa-se uma depressão intellectual que se caracterisa sobre os mesmos modelos das psychoses onde se nota este estado da intelligencia. A circulação visceral é sempre muito perturbada. Os pulmões são congestionados, as serosas apresentam echymoses, e bem assim a muccosa gastro-intestinal. Observa-se também algumas vezes a para- lysia do trisplanchnico, que pôde ser completa ou não; n'este ultimo caso só existe um ligeiro augmento da temperatura local do lado paralytico; e quando ella é completa observa" se a atresia da pupilla e r^perthermia do lado paralysado, hypercrinia dacrio-cystica, etc. A eschara glutea de Samuel, ou decubitus acutus, as escharas tronchanterianas muitas vezes formam-se em menos de 24 horas. N'este periodo esta- cionario póde-se observar arthropathias que anatomo-patholo- gicamente caracterizam-se por uma synovite vegetante e ás vezes exhudativa que se evolue na synovial dos tendões. Em um periodo mais afastado do ataque aparecem contracturas sobre os músculos que primitivamente eram paralysados, e d'este modo a tortura oris, que a principio se fazia para um lado começa inesperadamente a mostrar-se do outro lado. Os membros são contracturados quasi sempre em flexão. Estas contracturas f-ão sempre a expressão de uma mo- léstia ulterior, e inseparável das lesões destructivas dos feixes cortico-motores, que formam os cordões lateraes da medulla. — 24 — Anatomia pathologica Neste capitulo serão estudadas: Io, as lesões vasculares; 2o, as modificações que experimenta o sangue extravasado; 3o, as lesões cerebraes; 4o, lesões de outros órgãos. I—LESÕES VASCULARES De todas as lesões vasculares que pôde apresentar a he- morrhagia cerebral, a mais freqüente éos aneurismas miliares. Embora tivessem sido percebidos já por alguns observadores antes de Charcot e Bouchard, foram estes todavia que definitiva- mente precisaram o seu papel na producção da hemorrhagia cerebral. Depois dos trabalhos d'este dous sábios, a pathogenia da maior parte das hemorrhagias cerebraes ficou definitiva- mente estabelecida. De então para cá, todas as deducções que tiraram de suas observações têm sido integralmente confirmadas pelas innumeras autópsias praticadas sobre individuos que suc- cumbem á cerebrorrhagia. Os aneurismas miliares dos vasos cerebraes não foram, é certo, descobertos por Charcot e Bou- chard; Cruveilhier os encontrara em 1857, Calmeil em 1859, - 25 — e n'esse mesmo anno foram descriptos por Gull. Wirchow os descreveu sob a denominação de ectasia ampular. E' fora de duvida que Heschel e Meynert também os encontraram. O que, porém, mais augmenta os méritos de Charcot e Bouchard é que observadores d'estes, cujos nomes ahi foram enuncidados, não viram relação entre aquellas lesões vasculares e a hemorrhagia cerebral. Coube a Charcot e Bouchard afíirmar que os aneurismas miliares eram o ponto de partida da extravasação sangüínea no cérebro, e mais ainda, que o maior numero de casos de hemor- rhagia cerebral tinham os aneurismas miliares por ponto inicial. As suas pesquizas sobre a pathogenia da hemorrhagia cerebral começaram depois que, autopsiando um indivíduo que havia succumbido á essa moléstia, viram a existência de pe- quenas dilatações vasculares, que elles chamaram aneurismas miliares. Em outra de suas autópsias subsequentes, elles chegaram a sorprehender mesmo um pequeno coagulo que se continuava com o foco. Dirigiram suas vistas para a relação que podia haver entre os aneurismas miliares e a hemorrhagia cerebral, e verificaram que os aneurismas miliares podem existir, e não tomar parte alguma na eliminação da vida. Procuraram depois indagar si a hemorragia cerebral coincidia com os aneurismas miliares no cérebro, e chegaram a verificar que o que no caso de Gull não fora para este mais do que coincidência exquisita, anômala, sem expressão de causalidade, era então uma coincidência que se repetira em todas as autópsias, e que apparecêra no cérebro do ultimo cadáver transfigurada em verdade scientifica positivamente adquirida. Os seus estudos tiveram por base 60 autópsias, 42 das quaes foram praticadas na Salpetriére. D'ahi por 4 1885— K — 26 — diante os observadores não têm feito mais do que confirmar as proposições que decorreram d'esses trabalhos. . Ora, depois do que fica dito supponho ter justificado á saciedade o facto de ter eu designado pelos nomes d'esses dous observadores as hemorrhagias do cérebro por aneurismas miliares. Entremos agora na descripção anatomo-pathologica dos aneurismas miliares. Elles podem ser vistos á simples vista; apresentam-se como pequenos glóbulos de 1 millimetro de diamentro pouco mais ou menos, tendo por origem pequenos vasos que também podem ser vistos a olhos des- armados . Com o auxilio da lente, porém, a sua existência patenteia-se de modo a poder-se, com grande facilidade, obser- val-os minuciosamente. A cor com que se apresentam depende das modificações por que suas paredes têm passado, e das que têm soffrido o sangue que os enche. E assim que quando o sangue é liquido e as paredes delgadas o aneurisma tem uma cor vermelho-violacea, mais ou menos carregada, e differe, portanto, do aneurisma antigo, cujas paredes apresentam-se com os mesmos caracteres que as d'esté, porém, cujo sangue, tendo começado de transformar. se em granulações gordurosas e hematoidina, as colore de um vermelho escuro ou mesmo ennegrecido. Quando, porém, o te- cido conjunctivo tem proliferado, espessando a adventicia, então se o sangue contido é liquido o aneurisma tem uma cor azul; se o sangue contido é constituído de maneira que predominem os leucocytos a côr do aneurisma é pardacenta ; se os glóbulos sangüíneos têm começado de soffrer as metamorphoses retro- gradas, a sua côr é escura; se finalmente granulações calcareas ou gordurosas ahi se encontram em abundância a sua côr é amarella. A consistência com que podem se apresentar estes — 27 — aneurismas é muito variável, e isto prevê-se, porque ella deve forçosamente depender de qualquer um d'estes estados do aneurisma acima enumerados, e que modificam necessaria- mente a consistência não só de suas paredes, como do sangue que ellas encerram, e por conseqüência modificam o conjuncto; isto é, o aneurisma deve se apresentar com a sua consistência em funcção d'aquelles estados, se me permittir-se a expressão. O numero de aneurismas é muito variável também, embora não se tenha podido obtel-o de uma maneira certa pela difficuldade de conseguir-se a obtenção de cortes que se prestem a isso ; todavia tem-se podido approximadamente contal-os, e tem-se encontrado a enorme oscillação entre dous aneurimas e muitas centenas d'elles. Embora não haja a precisão necessária que devia acom- panhar este algarismo, se fosse este obtido por processos rigo- rosos,elliminados os erros communs a ambos os termos da oscil- lação numérica, póde-se muito racionalmente concluir que os aneurismas miliares existem em numero muito variável nos casos de hemorrhagia cerebral. O logar para sua evolução não é Índifferente; pelo con- trario, ha pontos do cérebro que de preferencia os apresentam em maior numero e mais freqüentemente. E' assim que se os encontra, guardando a ordem de freqüência decrescente: nas camadas ópticas, corpos estríados, circumvoluções, protube- rancia, cerebello, centro oval, pedunculos cerebellosos médios, pedunculos cerebraes e bulbo. Conjunctamente com os aneu- rismas encontra-se uma peri-arterite caracterisada, como de ordinário, por um espessamento da adventicia, desappareci- mento da túnica média, de distancia em distancia. - 28 — Quando esta lesão se observa sobre as artérias da base do cérebro, estas podem apresentar-se com as alterações pró- prias que a arterite deformante confere ás artérias de um certo calibre. Para Charcot e Bouchard esta seria a arterite que acompanharia constantemente as cerebrorrhagias por aneuris- mas miliares, emquanto que na sua opinião a endo-arterite só produziria o amollecimento cerebral. Esta opinião não é aceita por todos, e Zenker chega mesmo a afíirmar o contrario, isto é, que a peri-arterite produz o amollecimento e que a endo-arte- rite produz os aneurismas miliares. Uma outra lesão que podem apresentar os vasos, é a que resulta da ruptura do aneurisma no interior da adventicia; o aneurisma rompe-se incompletamente, mas o derramamento continua-se fazendo lenta e gradativamente, o vaso vai sendo disseccado e forma-se um aneurisma disseccante. Além d'essas lesões os vasos apresentam-se atheromatosos. Comprehende-se que em um trabalho como este eu não possa entrar na descripção minuciosa não só das lesões do atheroma como das que cara- cterisam as arterites; por isso limito-me em enumerar as lesões vasculares que de ordinário acompanham a hemorrhagia cere- bral. Quando os vasos não apresentam nenhuma d'essas lesões, nota-se ou adelgaçamento de suas paredes que se tornam friaveis, ou mesmo pôde a auptosia não revelar nenhuma outra lesão vascular além da solução de continui- dade. — 29 — II—DO SANGUE CONTIDO NO FOCO O sangue uma vez fora dos vasos tende a coagular-se, seja por esta ou aquella theoria, e o seu estado varia conforme se tem debaixo das vistas um foco recente ou antigo. Quando se examina um foco hemorrhagico recente o sangue coagulado tem uma côr vermelho-escura. O tamanho pôde variar muito, desde pequenos pontos vermelhos disseminados no cérebro, até os grandes derrames que invadem os dous hemispherios, e mesmo que se prolongam até o isthmo. O coagulo apresenta varias fôrmas; ora é espherico, ovoide, ou pyriforme; ora apre- senta a fôrma de uma ferradura; ora finalmente não tem fôrma definida, porquanto a desigualdade de consistência dos tecidos do cérebro creada por uma moléstia anterior, ao lado do maior ou menor numero de vasos que se rompem em zonas differentes e que formam afinal um grande foco, concorre para formar uma cavidade anfractuosa, irregular, em que se molda o sangue que se coagula, e que n'estas condições não pôde ter uma fôrma definida. Pelo exame microscópico observa-se um tecido reticular constituído por fibrina coagulada, encerrando em suas malhas glóbulos sangüíneos. Os glóbulos brancos são augmentados de volume, devido talvez á uma infiltração de serosidade. Os glóbulos vermelhos quasi nunca podem ser vistos nem mesmo alterados, porque tendo muita facilidade em perder a sua fôrma logo que sahem dos vasos, não podem ser observados em coágulos que datam de 5 ou 6 dias ; ora, rarissimas vezes as auptosias são feitas antes d'esse tempo, e portanto é natural a difBculdade de serem observados no coagulo. — 30 — O que se pôde facilmente observar porém são os produ- ctos de desintegração que elles soffrem, representados pela hematosina e hematoidina. Os glóbulos brancos cahem em degenerescencia granulo-gordurosa e tomam o aspecto dos corpusculos granulosos de Glüge. E' preciso notar que a fibrina desde o segundo dia começa de perder o seu aspecto delicadamente fibrillar, para mais tarde no 6o ou 8o dia não apresentar mais traço algum do seu primitivo estado. No caso de tratar-se de um coagulo antigo, duas condições podem se realizar, ou o coagulo é pequeno e depois de ter passado por metamorphoses pathologicas espe- ciaes é reabsorvido, ou o coagulo é relativamente grande, e n'estâs condições segundo alguns pathologistas parte da fibrina pôde se organisar. No primeiro caso encontra-se pela autópsia ou uma cavidade cheia de um liquido seroso, ou uma cicatriz rectilinea quando o foco é de longa dacta. No segundo caso acreditam alguns que se pôde encontrar uma cicatriz alongada, constituída por um tecido innodular. Este ultimo facto deve sempre fazer presumir que se trata de um foco dactando de 2 ou 3 annos; porque hoje está mais ou menos estabelecido que esse é o tempo necessário para operar-se essa transformação dos elementos do sangue. Em certos casos, o tecido de cicatriz encerra granulações de hematoidina que resulta da decomposição da hematosina, esta perde o ferro que entrava em sua composição, hydrata-se e transforma-se em hematoidina. Nas vizinhanças do foco encontra-se quasi sempre estas granulações de hematoidina, produzindo uma pigmentação dos tecidos. Além d'estas substancias que resultam da transformação j)or que passam os elementos do sangue, encontra-se detrictus — 31 — constituídos pelas metamorphoses retrogradas das fibras e cellulas nervosas. São estas as modificações que experimenta o sangue extravasado na immensa maioria dos casos de hemor- rhagia cerebral. Nas hemorrhagias cerebraes, porém, de ori- gem dyscrasica o coagulo não apresenta-se cora os caracteres que ordinariamente o acompanham, assim em todas as dyscra- sias hypinnosicas o coagulo fibrinoso passa despercebido muitas vezes, por causa da pequenhez do foco. O que se obser- va é antes uma infiltração de sangue nos tecidos do cérebro, por pequenos pontos, sendo que os focos de uma grande ex- tensão existem muito raras vezes. Nas hemorrhagias por dyscrasia leucemica o coagulo é colorido de maneira diversa, porque a predominância de glóbulos brancos em começo de degenerescencia granulo- gordurosa mascara sensivelmente a côr que poderia resul- tar das alterações das hematías. Quando mesmo se forme um foco de grande extensão, a sua coloração pôde variar muito, conforme a natureza da dyscrasia. Nas dyscrasias em geral as hemorrhagias do cérebro se fazem de ordinário na serosa perivascular e em diversas zonas do cérebro para depois espalhar-se ás circum vizinhanças; é por este facto que estas hemorrhagias assemelham-se mais á suffu- sões hematicas, como as echymoses, do que a verdadeiros focos de hemorrhagia. — 32 — III. — LESÕES CEREBRAES Alguns pathologistas dizem que a extravasação de sangue no interior do cérebro póde-se fazer, sem destruição dos ele- mentos nervosos. Esta proposição só é aceitável nos casos de hemorrhagias de origem dyscrasica, porque então o foco extremamente pequeno tem se formado lentamente, e de um modo muito especial como já foi dito. Em todas as outras condi- ções, porém, não se pôde admittir hemorrhagias no interior do cérebro, que não se acompanhem de destruição das fibras e cellulas nervosas. A irrupção brusca do sangue entre as fibras nervosas representa uma pressão muito superior á resistência que podem ofíerecer as delicadas fibras desprovidas da bainha endothelial. Esta pressão do sangue por occasião das hemor- rhagias, em regra geral sempre é superior á pressão normal, e por conseqüência sempre incompatível com a persistência inte- gral das fibras nervosas em ura foco de hemorrhagia. Quando o foco hemorrhagico tem por sede os glanglios da base ou as camadas corticaes, então a integridade das cellulas nervosas torna-se metaphysicamente impossivel, porquanto estas cellu- las são ligadas entre si por prolongamentos protoplasmicos delgadissimos que não podem coexistir com o foco. Definitiva- mente, pois, não posso admittir a formação de focos hemorrha- gicos no interior do cérebro, sem destruição de cellulas ou fibras nervosas, salvo alguns casos de hemorrhagias dyscra- sicas. O cérebro pode apresentar um aspecto vario conforme o tamanho do foco, o tempo em que este se formou e o numero de vasos rompidos. — 33 — E' assim que, depois de praticar-se no cérebro os cortes de que fallarei mais tarde, a superfície d'estes pôde apresentar manchas não muito grandes, de um vermelho-escuro em vários pontos, mais fortemente colloridas no centro e esbatendo-se em seus contornos, que desapparecem insensivelmente. Quando o foco do interior do cérebro tem sido muito grande, e a continuação da vida tem permittido a reabsorpção de parte do coagulo, a superfície cerebral no ponto correspon- dente é deprimida, e fôrma uma cavidade virtual cheia de sero- sidade. Nos focos hemorrhagicos recentes as suas paredes são amollecidas em virtude da infiltração dos elementos do sangue depois que soffrerem as metamorphoses regressivas. Estes de- trictus actuam como corpos estranhos, determinam uma in- flammação peri-focal, e a necrobiose de uma certa porção de substancia cerebral. Por causa d'esta necrobiose foi que Rouchoux afíirmou que as hemorrhagias cerebraes, cujo foco apresenta as lesões da encephalomalacia, tinham sido conse- cutivos ao amollecimento, e deu a este o nome bem expressivo de amollecimento hemorrhagiparo. Os vasos que vêm ter ao foco apresentam as suas bainhas lymphaticas distendidas por sangue. Em um periodo mais adiantado as paredes amollecidas são eliminadas por um processo inflammatorio que as circumscreve, e o foco é limitado por uma membrana de nova formação. Depois d'esta inflammação detersiva o foco fica constituído por um kysto que encerra serosidade. Mais tarde, porém, o liquido que o enche, pôde ser reabsorvido, e suas paredes approximam-se, deixando um 5 1885-K — 34 — intervallo pequeno constituído por um tecido reticular, cujas malhas encerram granulações pigmentarias, provenientes das metamophorses regressivas do foco. Outras vezes, como af- firma Rokitanski, encontra-se uma cicatriz, cujos tecidos ti- veram por ponto de partida os depósitos de fibrina. Ha casos em que a cicatriz existe, porém, desprovida de granula- ções, que possam fazer a sua côr contrastar com as dos te- cidos ambientes, e revelara sua existência. Sempre que se consegue observar a cicatriz, esta é con- stituída por um tecido resistente envolvendo ou não o tecido reticular de que acima fallei, e dando ás paredes do foco uma consistência fibrosa. Quando a hemorrhagia se faz nas cama- das corticaes dão-se as mesmas modificações expostas ha pouco para os outros focos, apenas n'este caso a pia-mater par- ticipa do processo inflammatorio ; ha uma leptomeningite con- comitante; as camadas corticaes degeneradas são coloridas em amarello e extremamente adherentes á pia-mater. Outras vezes encontra-se uma cavidade atravessada por um tecido conjunctivo muito tênue, cujas malhas são repletas de serosidade secretada pela pia-mater. Quando os focos he- morrhagicos persistem por muito tempo, podem apparecer lesões secundarias que interessam as fibras nervosas da coroa radiante e que se estendem progressiva e systematicamente até á medulla. Bouchard pôde certificar-se de que essas lesões secundarias, caracterisadas por uma degenerescencia descendente, coexistiam quando havia destruição das fibras de coroa radiante, ou quando a lesão cortical attingia as ca- madas profundas do cortex cerebral. As lesões corticaes que interessam simplesmente as — 35 — camadas superficiaes das circumvoluções, não se acompanham de taes degenerescencias. A degeneração dos nervos ainda não foi observada, so- mente Meissener encontrou a dos corpusculos tactis, porém esta não tem sido depois verificada. Em todas estas degenerescencias o microscópio revela a destruição das fibras nervosas e sua substituição por tecido conjunctivo. O cérebro pôde ainda apresentar-se atrophiado em sua totalidade; isto se observa principalmente quando o foco tem por sede as camadas corticaes, seja elle pequeno ou grande pouco importa. IV—LESÕES DE OUTROS ÓRGÃOS Em grande numero de casos tem-se encontrado os aneu- rismas milhares em differentes órgãos além do cérebro ; no fígado, nos rins, na mucosa pituitaria, no pharinge, na retina, etc, elles existem muitas vezes. O coração pôde apresentar- se grandemente hypertropliiado, em conseqüências de lesões oro-valvulares. A orta quasi sempre apresenta as lesões características do atheroma ou das aortites chronicas. Os rins podem achar-se sensivelmente retrahidos, e o mi- croscópio demonstrar n'elles as lesões da nephrititeintersticial. O tegumento externo apresenta-se em alguns casos com vas- tas echymoses, principalmente ao nivel da face, das partes la- teraes do pescoço e da parte inferior do tronco. Encontra-se também escharas sobre a região trochanteriana e na região - 36 — sacra; na sua vizinhança o derma ás vezes é levantado for- mando bolhas, que encerram um liquido turvo. De todo este grupo de lesões, porém, a mais freqüente, quando o foco é de longa data, é a degenerescencia secundaria da medulla tendo por sede a metade posterior dos cordões lateraes e o feixe de Türck do lado do foco. Esta deg-enerescencia não é mais do que a continuação da que se observa no cérebro, e que depois de passar pelos pedunculos cerebraes, protuberancía e bulbo, apparece na medulla sobre os cordões lateraes do lado opposto do foco. — 37 — . Physiologia Pathologica A physiologia pathologica das hemorrhagias do cérebro, embora muito adiantada, deixa ainda de esclarecer muitas questões que a ella se prendem. Eu tratarei aqui da physiologia pathologica da hemor- rhagia cerebral e de alguns dos principaes symptomas que ella determina. Uma questão que até agora não tem sido completamente julgada, é a de saber-se si a ruptura dos vasos cerebraes póde-se fazer sob a única influencia do augmento de pressão intrarterial. Diversas considerações apparecem, quando se attende para o estado dos vasos, e o modo por que se pôde crear esse augmento de pressão, que fazem a razão não aceitar a possibilidade de taes hemorrhagias. A resistência que offerecem a pressão sanguinea os vasos em geral é demonstrada por diversos factos; de modo que parece que para elles se romperem é necessária uma alteração prévia de suas paredes, salvo o caso de um augmento de pressão considerável, superior portanto á sua resistência nor- mal. Mas a causa a que ligam mais importância na producção — 38 — de taes hemorrhagias é o excesso de compensação das lesões cardíacas. Ora, suppondo-se illesos os vasos cerebraes, as grandes pressões que accidental e bruscamente experimenta o meio interno sob a acção de causas múltiplas, não produzem hemorrhagia cerebral; como, pois, póde-se admittir que a ru- ptura de compensação por augmento de hypertrophia cardíaca seja sufhciente para provocar a ruptura vascular? N'um caso o augmento é brusco, rápido, e os vasos não se rompem; no outro caso o augmento é lento, progressivo, elles não podem Fe romper. A lesão orica ou valvular quando é primitiva predispõe a alterações vasculares não muito distantes; outras vezes, porém, ella exprime um vicio geral de nutrição, e comprehende-se que n'estas condições o excesso de compensação possa chegar a crear uma pressão incompatível com a resistência dos vasos alterados. Por conseqüência nas condições de normalidade orgânica do apparelho vascular não pôde haver hemorrhagia cerebral que não seja provocada por um trauma directo sobre o cérebro. Em todos os casos a alteração vascular é representada pelas arterites (endo e peri) ou pelo adelgaçamento das túnicas nos casos de dyscrasias profundas. As hemorrhagias de Charcot e Bouchard effectuam-se sempre pela ruptura dos aneurismas miliares. Estes aneurismas são proluzidos por peri ou endo- arterite. Charcot e Bouchard pensavam que os aneurismas miliares eram sempre devidos á periarterite ; porém estudos posteriores vieram demonstrar que a endo-arterite pôde também produzil-os. N'estas condições a resistência dos vasos, já dimi- nuída pelo processo phlegmasico anterior, é muito diminuída, — 39 — e qualquer augmento de pressão sangüínea, mesmo não muito grande, determina a ruptura do aneurisma. A endo-arterite, mesmo que não seja acompanhada dos aneurismas miliares, torna as paredes dos vasos friaveis ou pela degenerescencia gordurosa que a acompanha, ou pela infiltração calcarea que a segue. Na peri-arterite existe a mesma diminuição de resistência, e nem é por outro motivo que na paralysia geral dos alienados produzem-se os focos de hemor- rhagia; aqui as concepções delirantes impulsivas são acom- panhadas de congestão cerebral que provoca o rompimento das paredes vasculares sclerosadas. Nas anemias a mesma fragilidade vascular existe, e pois torna-se possível a ruptura dos vasos cerebraes, sob a influencia de um augmento de pressão; porém na leucocytemia Ranvier acredita que pela predominância dos glóbulos brancos estes adherem ás paredes dos vasos e chegam a obtural-os completamente. A esta oclusão seguem-se um augmento de pressão a quem do ponto obliterado e os vasos já alterados pela dyscrasia não podem offerecer resistência e rompem-se. Nas hemorrhagias de origem dyscrasica ventila-se a questão sobre a'possibilidade das hemorrhagias por diapedese. A diapedese dos glóbulos vermelhos parece ter sido posta fora de toda, duvida, principalmente depois dos trabalhos de Stricker ; mas ella é absolutamente inadmissível para explicar a extravasação sanguinea ; para isso era preciso fazer-se a ingênua supposição de que, em um momento dado, os glóbulos vermelhos por uma razão desconhecida se dirigissem para um ponto bem limitado dos vasos do cérebro e se resolvessem um a um a perfurar esses vasos e formar assim um foco de hemorrhagia, Ora, é (Jifficil acreclitar-se n'este mecanismo de - 40 - hemorrhagia cerebral. Nos casos de focos múltiplos e extre- mamente pequenos que ás vezes encontra-se, é mais natural pensar-se na ruptura vascular por pequenos pontos, que a autópsia não descobre. Muito menos poder-se-ha admittir a diapedese quando tratar-se de derra mes na bainha lymphatica, porque, em virtude de que principio a diapedese se faz tão somente em um ou outro vaso? Pois, o processo dyscrasico não é geral, e então por que os vasos cerebraes todos não se deixam atravessar pelos glóbulos sangüíneos ? A ruptura dos vasos pôde se dar sem que haja uma causa determinante apreciável, porém, n'estas condições é mais razoável encon- tral-a nas perturbações vaso-motoras, tão communs nas differentes anemias, e postas fora de toda duvida pelas pes- quizas modernas de neuro-angeiologia experimental. A hema- thydrose, a epiphora sangüínea só podem ser explicadas por essas perturbações, e estes dous phenomenos acham-se quasi sempre ligados a uma dyscrasia. Em ultima analyse é muito difficil admittir-se as hemorrhagias por diapedese. Passemos agora ao estudo do modo pelo qual apparece o estado apopletico. Até agora as explicações offerecidas para explicar a gênese da apoplexia não podem ser aceitas de um modo absoluto. Incontestavelmente é difficil conciliar-se o apparecimento da apoplexia com as condições contradictorias, que decorrem do abalo cerebral produzido pelo foco. Assim a apoplexia apparece: Io, com focos pequenos e grandes; 2o, ella falta completamente nos casos de pequenos focos e mesmo com grandes derramamentos ; 3o, ella ainda falta quando o derra- mamento se faz rapidamente e em ambundancia. Passemos uma rápida vista d'olhos sobre as diversas theorias, que têm appa- recido para explical-a, — 41 — Theoria do augmento de pressão intra-cerebral.— Leyden e Pagenstecher baseam-se em experiências physiolo- gicas para demonstrarem que o coma apopletico é devido a um augmento da pressão intra-cerebral. Pagenstecher para suas experiências servia-se de cães, em cujas cavidades cra- neanas injectava cera. Observando os phenomenos que se seguiam a esta operação concluio que no homem um derrama- mento extra-cerebral de 40 grammas de sangue era suffi ciente para determinar phenomenos de apoplexia. Esta theoria, como se vê, só é applicavel aos derrames extra-cerebraes, e portanto, torna-se duvidosa, quando se queira applical-a aos focos intra-cerebraes, que são justamente aquelles que mais freqüentes vezes se acompanham de apoplexia. Todavia è fora de duvida, que o augmento de tensão intra-cerebral parece representar um papel importante na gênese da apoplexia. Os estados congestivos do cérebro que acompanham muitas moléstias, não raras vezes provocam manifestações apople- ctiformes; para certos casos, pois, parece que a compressão dos elementos nervosos do cérebro, junto á sua anemia que resulta d'essa compressão, deve ser imputada como a condição determinante do ataque apopletico. Theoria da anemia . —Outros observadores encontraram a explicação da apoplexia na anemia do cérebro, que segue-se á hemorrhagia d'esse órgão. Dizem elles que a sahida do sangue no interior do craneo tem como resultado necessário a compressão dos vasos, que irrigam os elementos nervosos ; estes, necessitando da vida que lhes falta rapidamente, porque o sangue que a levava comsigo deixa de chegar aos seus territórios cellulares, traduzem exteriormente a suspensão 6 1885—K — 42 - brusca de suas funcções, pelo ataque apopletico. Esta theoria só pôde ser applicada, do mesmo modo que a precedente, aos grandes derramamentos que são raros, deixando de ser ex- tensiva á maior parte dos casos de hemorrhagia cerebral. Abercrombie acredita em uma perturbação da circulação cerebral, porém, diz que a compressão dos elementos nervosos não pôde ser invocada como causa dos phenomenos apople- ticos ; porque, diz elle, esta compressão não existe nas apoplexias por embolia cerebral. Porém, mesmo aqui não se pôde negar a sua existência, porque o embolo obturando bruscamente o vaso, produz ischemia no território cellular tributário d'elle; mas a quantidade de sangue que devia distribuir-se ali, não podendo passar além do embolo, deve refluir e congestionar os vasos circumvizinhos da zona ische- miada ; porém, toda a congestão trazendo implícita a idéa de augmento do calibre vascular, este augmento só é possivel á custa da compressão dos elementos anatômicos, que rodeam o vaso; logo, as ischemias cerebraes^por trombose ou embolia são acompanhadas de congestão relativa, e portanto, de com- pressão dos elementos nervosos. Portanto mesmo n'estes casos a apoplexia guardaria uma certa relação com a compressão dos elementos nervosos. Duret, estudando experimentalmente os traumatismos ce- rebraes, admitte que em todas as condições a apoplexia é devida a uma anemia sempre determinada pelo deslocamento do liquido cephalo-rachidiano. Dous são os mecanismos pelos quaes o liquido cephalo rachi- diano produz a anemia do cérebro; 1°, produzindo uma tensão brusca no interior das bainhas lymphaticas; 2o, actuando sobre o bulbo e irritando os corpos restiformes, Elm todas as — 43 — suas experiências elle verificou que quando os corpos resti- formes apresentavam o pontilhado sangüíneo, os animaes operados morriam em seguida a fortes convulsões ; d'onde con- cluio que estas convulsões eram dependentes da excitação dos corpos restiformes, pela onda de liquido cephalo-rachidiano. Nos casos de hemorrhagia cerebral a ischemia do cérebro é explicada por elle do modo seguinte: o liquido cephalo, rachi- diano, impellido bruscamente para o interior das bainhas lym- phaticas, comprime os vasos que elle rodeia, d'onde, anemia cerebral; forma-se uma onda de liquido cephalo-rachidiano que se propaga ao bulbo excitando os corpos restiformes; estes excitados provocam por via reflexa uma contractura dos vasos cerebraes, augmenta portanto muito a anemia que previa- mente existia; os symptomas d'esta anemia constituem a apoplexia. Em seguida á contractura sobrevem uma paralysia vaso-motora acompanhada de congestão, e os elementos ner- vosos ficam impossibilitados de nutrirem-se ; d'isto resulta muitas vezes a persistência dos symptomas até a morte. Embora creada pela intelligencia esclarecida de Duret, esta theoria não explica todos os casos de apoplexia por he- morrhagia cerebral. Com effeito, toda hemorrhagia cerebral é acompanhada de refluxo brusco do liquido cephalo-rachidiano; este refluxo deve provocar uma excitação imprescindível dos corpos restiformes; esta excitação deve se revelar pois em todos os casos pela apoplexia e pelas . convulsões que Duret observou; ora além de que as convulsões são raras na he- morrhagia cerebral, a apoplexia pôde também falhar, mesmo que haja um grande derramamento sangüíneo. Esta theoria portanto não abrange a maioria dos casos, e não pôde ser admittidaf Niemeyer, acreditando também que a apoplexia - 44 — ê devida á anemia cerebral, assignala como prova d'isto a pulgação exagerada das carótidas; este phenomeno, segundo elle pensa, é devido ao embaraço que existe na circulação do cérebro, Porém como pondera Jaccoud, este phenomeno nem sempre existe, e mesmo que existisse seria mais um motivo para que fosse vencido o obstáculo á circulação cerebral, Theoria de Jaccoud.—Basea-se esta theoria na solida- riedade funccional que existe entre os dous hemispherios ; o processo hemorrhagico rompendo essa solidariedade, os dous hemispherios cerebraes perdem temporariamente a sua acti- vídade funccional, e cahem em uma espécie de marasmo pas- sageiro. O hemispherio lesado recebe um choc directo que se transmitte ao outro por via reflexa; este ictus reflexo é o ponto de partida da diffusão dos symptomas da apoplexia. Segundo este modo de encarar a questão, a lesão local provoca uma nevrolysia geral que constitue a apoplexia. A primeira parte d'esta theoria é perfeitamente accei- tavel; no estado normal os dois hemispherios funccionam sy- nergicamente; mas em certos estados pathologicos elles dissociam-se debaixo do ponto de vista funccional, e tornam-se autonomicos de per si. A segunda parte da theoria é mais difficil de se admittir ; por que a diffusão dos symptomas tem por origem o choc reflexo e não o choc directo ? Pois ambos os hemispherios não possuem systemas de fibras nervosas semelhantes não só quanto á funcção como á sua estructura? Porque pois os symptomas que se diffundem não têm por ponto de partida o choc directo unicamente ou os dous chocs conjunctamente? Jaccoud deixa de parte essas — 45 — questões e propõe simplesmente a sua theoria. Como dissemos acima, a solidariedade funccional dos dous hemispherios é toda relativa. E' em virtude d'esta solidariedade, que as moléstias de um hemispherio incontestavelmente predispõem a generali- sação ao hemispherio opposto ; é ainda por meio d'ella que a psychologia explica certos phenomenos sensoriaes. Mas que ella, como dissemos, é toda relativa provam as pesquizas sobre hypnotismo nas hystero-epilepticas, o celebre facto de Barlow, a evolução tácita de abscessos e tumores em um dos hemis- pherios, ficando o outro illeso. Estes factos, pois, também demonstram que os hemis- pherios cerebraes têm até certo ponto a sua autonomia ; que, por exemplo, o hemispherio direito funcciona emquanto o esquerdo repousa; que um d'ellespóde adoecer e o outro conti- nuar funccionando regularmente. Faça-se, porém, todas as con- cessões possíveis, e admitta-se a theoria de Jaccoud, tal como é enunciada. Se quizer-se generalizal-a, esta theoria não ex- plica os casos em que os pequenos e grandes derramamentos não se acompanham do apparecimento do ataque apopletico; en- tretanto em qualquer dos casos deve existir o choc directo e o choc reflexo, deveria, pois, existir a nevrolysia geral. Nos casos em que o foco provoca o estado apopletico, esta nevrolysia ge- ral, que se effectuou por diffusão de symptomas locaes, não é tão geral, como á primeira vista podia-se suppôr. A palavra ne- vrolysia, em linguagem ordinária, quer dizer inhibição da acção nervosa; portanto, como a modifica o Sr. Jaccoud, quer dizer inhibição geral da acção nervosa; parece, pois, que todas as funcções do systema nervoso foram supprimidas pela diffusão dos symptomas locaes; entretanto, persistem os reflexos da respiração e da circulação para evidenciar que a diffusão dos — 46 — symptomas não se fez methodicamente pelo eixo cerebro-es- pinhal, e para demonstrar que a nevrolysia não é geral, como diz o professor Jaccoud. Huglings-Jackson e Troussau expli- cavam a apoplexia, o primeiro dizendo que havia shoc que a occasionava, e o segundo dizendo que ella era devida a um etonnement cerebral. Theoria de Heubner.—Quando se faz uma grande hemor- rhagia, proveniente de uma das principaes artérias do cérebro, ou de um de seus ramos collateraes, como, por exemplo, a lenticulo óptica, deve-se fazer um abaixamento notável no nível da ária vascular constituída pela pia-máter. As múltiplas anas- tomoses dos vasos lepto-meningeanos dariam logar a que uma certa mudança rápida na pressão cerebral se transmittísse á totalidade de um dos hemispherios. D'este modo elle poderia explicar todos os symptomas da apoplexia que possam ser attribuidos ás camadas corticaes. Esta theoria, mesmo que seja aceita em seus termos, não pôde explicar a apoplexia por pequenos focos de hemorrhagia; estes seriam insuíficientes para produzir um abaixamento de nivel bem notável nos vasos da pia-mater. A contra-prova da insufficiencia d'esta theoria existe nas hemorragias do cerebello que se acompanham de apoplexia; ora, estas hemorrhagias não podem por fôrma al- guma provocar o abaixamento de nivel a que se refere Heu- bner. Depois de ter percorrido todas estas theorias, é admirável, mas é necessário concluir-se, que nenhuma d'ellas explica a apoplexia. Não posso, pois, embora disserte sobre um tal ponto, transformar o meu escalpello de estudante em espada de Alexandre para cortar essas divergências de opiniões, e — 47 — proclamar o fiat lux nas trevas que envolvem a pathogenia da apoplexia. Diante, pois, das difficuldades de conseguil-o, mereço desculpa em nada adiantar, porque o faço depois de reflectir sobre o Homo, nosce te ipsum) e depois de compenetrar- me dos conhecimentos de que para isso poderia me servir, como contigente de acção. A interpretação scientifica da diminuição de excitabili- dade reflexa, que se observa na hemorrhagia cerebral, é muito deficiente ainda hoje ; de modo que nada de firmado existe sobre tal ponto. Uma modalidade com que costumam a apre- sentar-se os reflexos, e que necessita de muita observação para o seu esclarecimento, é a seguinte : quando pelo pinçamento excita-se moderadamente um membro paralysado, supponha- mos o braço esquerdo, obtem-se um ligeiro movimento do braço direito somente ; se a excitação fôr mais forte, obtem-se mo- vimentos da perna e braço direitos ; se a excitação fôr mais forte ainda, obtem-se movimentos da perna e braço direitos, e também do braço esquerdo, sede da excitação. Esta anomalia de excitabilidade reflexa existe, quer exista ou não, a hyperesthesia da pelle. Os reflexos abdominaes es- tudados pelos Srs. Rosenbach e Moell também são de diítlcil interpretação. Para a sua interpretação diversas opiniões ap- pareceram ; entre ellas nota-se a de Huspensky que acreditava na perturbação dos centros moderadores de Setschenow, em virtude da qual a excitabilidade reflexa diminuia-se. Hasse pensava que a causa d'essa diminuição devia ser procurada nas degenerescencias secundarias. Nothnagel pensa que a origem d'essa diminuição da excitabilidade reflexa está na medulla al- longada. Esta opinião mesmo é pouco provável, porque ao lado da suspensão das funcções do cérebro e da medulla existem — 48 — as funcções circulatória e respiratória que correm por conta em grande parte do funccionalismo bulbar. As perturbações bulbares só mais tarde, nas proximidades da morte, é que apparecem com o phenomeno de Cheyne-Stokes. A inter- pretação dos derrames nas cavidades serosas, bem como dos derrames sangüíneos nas vísceras, das perturbações oculo- pupillares, basea-se na paralysia do grande sympathico, que dá logar a phenomenos de vaso-dilatação seguidos de au- gmento passivo da pressão sangüínea. Para evitar repetições eu tratarei da interpretação dos outros symptomas, quando me occupar de localisações cerebraes. — 49 — Marcha O doente raras vezes morre em estado apopletico. Quasi sempre a apoplexia desapparece lentamente, o in- divíduo desperta-se, permanece durante algumas horas ou mesmo durante um dia inteiro, em estado de consciência, para de novo cahir em estado de sopor. Este segundo ataque ordi- nariamente é a expressão de um novo insulto hemorrhagico em uma outra região do cérebro ou no foco primitivo. Em qualquer d'estes casos, porém, o doente morre quasi sempre em estado comatoso. Mais tarde, depois do indivíduo ter passado esta primeira phase, apparecem os symptomas da encephalite aguda que de ordinário são gravissimos. Todavia o doente pôde ainda passar este periodo com vida e desapparecem todos os symptomas assustadores. Mas a lesão primitiva existe, a emi- nência de um novo ataque está creada pelo primeiro insulto hemorrhagico, e pois a vida do doente continua a ser amea- çada de perto. As alterações vasculares que existiam antes do ataque, vão se accentuando e progredindo lentamente. Outras moléstias encontram um terreno adequado para sua evolução no organismo em que ha um foco de hemorrhagia cerebral; e é a pneumonia que mais freqüentes vezes põe termo á vida d'estes doentes. 7 1885—K — 50 — Logo depois que desapparece a apoplexia a paralysia accentua-se, e só muito mais tarde é que apparecem as contra- cturas des membros paralysados. Estas contracturas persistem por um tempo variável, e quando o indivíduo se approxima da terminação fatal muitas vezes ellas desapparecem comple- tamente. Durante todo o tempo que medeia entre o ataque hemorrhagico e a terminação da moléstia, não é raro também apparecerem perturbações psychicas, que se caracterisam por depressão das faculdades affectivas; outras vezes por uma excitabilidade exagerada d'essas faculdades, de modo que os doentes tornam-se mesmo capazes de actos violentos. Os factos em que a marcha da moléstia a encaminha para uma cura ra- dical, não são admittidos por todos ; entretanto tem-se podido encontrar pela autópsia cicatrizes de focos antigos na substancia medullar dos dous hemispherios, sem que os doentes.depois de ficarem livres dos symptomas que appareceram com o ataque, apresentassem os symptomas tardios da persistência do foco, ou de lesões secundarias. — 51 — Terminação A terminação pela morte immediatamente ao estado apo- pletico, é pouco freqüente; quasi sempre a moléstia tende a provocar lesões encephalo-medullares que se accentuam tardia- mente, mas que sempre são a causa da morte do doente ; salvo na hypothese em que o doente morra por uma moléstia inter- currente estranha ao processo hemorrhagico. A terminação pela cura absoluta é rarissima, e mesmo com este modificativo ella não é admittida por todos. A terminação mais freqüente que dão todos os compêndios é pela hemiplegia e contractura tardia; porém não se pôde dizer que esta seja uma terminação da moléstia,porquanto a contractura e a hemiplegia são ligadas a um mesmo processo mórbido que teve por origem um foco de hemorrhagia. — 52 — Diagnostico As moléstias com que a hemorrhagia cerebral pôde se confundir, podem-se dividir em três grupos. No primeiro grupo estão as moléstias que têm por sede o systema nervoso; no segundo as que têm por sede outros órgãos, no terceiro estão as diversas intoxicações quer de natureza chimica, quer de natureza miasmatica. l.° Moléstias que têm por sede o systema nervoso.— Thrombose cerebral. Em certos casos é muito difficil, senão impossivel, fazer-se o diagnostico differencial entre a throm- bose e a hemorrhagia cerebral. A coagulação da fibrina no interior do vaso póde-se fazer rápida e silenciosamente, de modo que a apoplexia appa- rece sem poder-se fazel-a correr por conta de uma causa bem determinada. Geralmente, porém, quando se manifestam os symptomas da apoplexia, sem ter havido precedência de cephalalgia in- tensa, de perturbações visuaes, e de outros symptomas pro- dromicos, mais communs ao processo de thrombose cerebral, deve-se pensar que se tem debaixo das vistas um caso de he- morrhagia antes do que de thrombose cerebral. — 53 — Ainda mais unia vez, porém, convém tornar bem saliente que o diagnostico differencial em certos casos é difficillimo. Embolia cerebral . —A embolia é própria, sem ser de modo absoluto, á idade adulta; emquanto que a hemorrhagia é mais commum nos velhos , A existência de embolias em outras visceras, quando os seus symptomas podem ser observados, auxilia muito o dia- gnostico differencial. A embolia coincide quasi sempre com uma lesão orgânica do coração esquerdo, e é mais commum no hemispherio esquerdo; a auscultação, pois, revelando a exis- tência da lesão orgânica do coração, a hemiplegia apresen- tando-se do lado direito, constituem signaes de grande valor, para fazer acreditar na existência de uma embolia. A marcha da temperatura é um optimo recurso de que se deve lançar mão para o diagnostico differencial. Assim na hemorrhagia a temperatura depois de descer a 36° e mesmo a 35°, sobe depois a 39°, 40 e pôde no fim de três a seis dias attingir á cifra enorme de 42°. Na embolia em caso algum a temperatura attinge aquelle algarismo. A embolia e a thrombose cerebraes podem ser seguidas de hemorrhagia cerebral; mas o diagnostico da embolia ou thrombose n'estas condições é absolutamente impossivel, a não ser que se queira fazer um diagnostico experimentando-se á sorte. Não ha elemento nenhum de observação, que sirva para uma conclusão diagnostica nestes casos. Anemia cerebral . — Esta moléstia apresenta-se muitas vezes acompanhada de ataques apopleticos, cujo diagnostico — 54 — torna-se difficil em alguns casos. O desappatecimento do estado apopletico sem perturbações permanentes, a ausência de ele- vação thermica, o estado geral do indivíduo indicando a pre- existência de dyscrasia, a raridade de hemorrhagia cerebral nas dyscrasias, são todos bons elementos para, em seguida á uma observação rigorosa, excluir-se a hemorrhagia cere- bral. Congestão cerebral.—Quando o ataque apopletico que acompanha a congestão cerebral é seguido de hemiplegia per- sistente, o diagnostico torna-se muito difficil, senão impossivel. N'estas condições os elementos que fornecem a thermosemeio- logia, e a confrontação do pulso nas duas radiaes, são de muito valor ao lado de outros signaes menos importantes. O conhecimento dos antecedentes do doente é de muita van- tagem, principalmente quando se tratar de um indivíduo moço. A exploração do apparelho circulatório é de muita importân- cia, porque mesmo que se trate de um indivíduo moço, póde- se encontrar por essa exploração os signaes da velhice precoce. Tumores cerebraes . —Os tumores do cérebro, em seu começo de evolução, acompanham-se algumas vezes de ataques apoplectiformes que podem fazer pensar-se em uma apoplexia por hemorrhagia cerebral. E de facto senão tem havido pre- cedência de cephalalgia, se não ha hereditariedade de diathese neoplasica ou tuberculosa, o diagnostico torna-se quasi im- possivel entre a hemorrhagia e o tumor cerebral. Nos casos, porém, em que se possa fazer o exame do fundo do globo ocular, a existência da neuro-retinite por estrangulamento é um signal muito importante para o diagnostico differencial. -- 55 — Encephalite aguda suppurada .—Esta moléstia é acom- panhada de um estado apopletico muito pronunciado, e como não tenha nenhum symptoma que lhe seja especial, a sua con- fusão com a hemorrhagia cerebral é muito fácil. A exploração da temperatura n'estas condições é de grande vantagem ; por- que na hemorrhagia cerebral só depois de 36 ou 48 horas em regra geral, é que o thermometro começa a indicar tempera- turas acima da normal; ao passo que na encephalite aguda, desde que o estado apopletico se patenteia, a temperatura apresenta-se também em grau elevado. Hemorrhagias das meningeas.—Na pachymeningite he- morrhagica, sempre que o periodo prodromico é de longa duração, o ataque apopletico que o segue pôde ser, sem muita difficuldade, separado da apoplexia por hemorrhagia cerebral. Na hemorrhagia sub-arachnoidiana a apoplexia não é tão com- pleta como a que de ordinário acompanha a hemorrhagia cerebral. Em nenhum d'estes casos póde-se lançar mão de um symptoma ou de um grupo de syraptomas que possa servir de criterium para o diagnostico preciso. No hemato-rachis primitivo acompanhado de choc cere- íebral o diagnostico faz-se sem grande difficuldade, porque os phenomenos apoplectiformes desapparecem dentro de pouco tempo, e os symptomas que constituem a apoplexia não appa- recem senão incompletamente. Assim encontra-se a contra- ctura dos sphincteres em vez da paralysia que de ordinário os acompanha no verdadeiro estado apopletico. Muitos outros symptomas differenciaes ainda existem. Hemorrhagias extra-meningeanas.—Estas hemorrhagias — 56 — são raras quando não tem havido traumatismo sobre o craneo ; mas independente d'isso póde-se encontral-as, e a seu lado todos os symptomas de apoplexia. N'estas condições, portanto, ellas podem se confundir com a hemorrhagia cerebral. Epilepsia.— Os ataques de epilepsia de fôrma apo- pletica são fáceis de se confundir com a hemorrhagia cerebral. O conhecimento dos antecedentes pessoaes facilitam o diagnostico. No caso, porém, de não se poder obtel-os, é preciso esperar-se o desapparecimento do ataque, e observar- se a temperatura, para, ao lado de outros dados, fazer-se o diagnostico. Edema acutus cerebri. — Esta complicação tão commum ás diversas moléstias dyscrasicas em geral, tem sido levada em muita consideração principalmente na Allemanha, para explicar-se os symptomas insólitos attribuiveis ao cérebro, e que ás vezes apparecem no decurso de certas moléstias, que podem racionalmente depender de edema cerebral. Quando os symptomas constituem a apoplexia, o diagnos- tico immediato é absolutamente impossivel; o quadro mórbido é o mesmo que acompanha a apoplexia por hemorrhagia cerebral. Pouco tempo depois, porém, os symptomas cor- rigem-se completa ou incompletamente, e o emprego de uma medicação apropriada faz desapparecer todos os symptomas que poderiam ter persistido, e esclarece-se o diagnostico. Stncope.— A syncope é um syndroma que pôde appa- recer no decurso de muitas moléstias, e também no estado de — 57 — saúde intercurrentemente. O diagnostico não é difficil, quando ella não se termina pela morte, pois sua duração é muito pequena, e o indivíduo volta logo ao estado primitivo. Quando ao contrario é seguida de morte, então o diagnostico torna- se difificilimo, e não tem n'estes casos utilidade pratica. 8 1885—K — 58 — Moléstias de ontros orgâos Moléstias do coração.—As moléstias do coração são em regra geral acompanhadas de syncopes, que as complicam ou que as terminam. No primeiro caso a syncope dura pouco e exclue-se a hemorrhagia cerebral do diagnostico ; no segundo caso o diagnostico tem uma importância meramente especula- tiva, e o criterium deve ser procurado com o escropo e mar- tello, porque só assim elle pôde ser encontrado. A ruptura do coração, assim como a ischemia cardiaca por thrombose das artérias coronarias, merecem as mesmas considerações. Aneurismas da aorta.— A ruptura d'estes aneurismas é seguida de syncope. Quando o derrame de sangue faz-se na arvore tracheo-bronchica ou no esophago, o sangue não tarda a ser expellido pela bocea, o diagnostico firma-se. Nos casos, porém, em que a aortoectasia evolue-se sem symptomas que a tornem conhecida, e que a ruptura se faz em uma cavidade serosa, o diagnostico torna-se um pouco duvidoso. Mesmo quando a lesão aortica é perfeitamente conhecida o diagnos- tico ainda não é cercado de toda a precisão, por que o próprio facto de existir o aneurisma, indica uma alteração vascular, que pôde muito provavelmente se estender aos vasos cerebraes, — 59 — creando ahi os aneurismas miliares, e dar logar á hemor- rhagia de Charcot e Bouchard. Em todos estes casos o diagnostico não interessa á vida do doente, porque esta é fatalmente perdida em pouco tempo; e mesmo que se confundisse com a hemorrhagia do cérebro, o tratamento era o mesmo em todos esses casos. Embolias gordurosas dos pulmões.—O estado apopletico creado pelas embolias gordurosas dos pulmões, póde-se con- fundir com a apoplexia por hemorrhagia cerebral. Elle é ob- servado ordinariamente depois dos traumatismos cirúrgicos, principalmente quando a operação tem interessado a medulla dos ossos. Uma duvida no diagnostico pôde apparecer entre- tanto, quando se pensa que as condições do operado fazem possivel a existência dos aneurismas miliares. Assim quando se opera um indivíduo velho, em que a anesthesia não pôde ser prolongada, e em que se nota os signaes do atheroma, a pressão sangüínea pôde ser augmentada por esta anesthesia incompleta; a dôr que o indivíduo sente pôde actuar como causa deter- minante da ruptura dos aneurismas milhares, e portanto da hemorrhagia cerebral. Só a observação do doente é que pôde posteriormente resolver a questão. O mesmo estado de apoplexia ainda pôde ser creado pelas embolias aéreas dos pulmões, e as mesmas considerações sobre o diagnostico podem ser feitas. Insolaçao . — A acção dos raios solares quando o angulo de incidência approxima-se de seu mínimo, determina nos in- dividuos expostos ao tempo um verdadeiro ataque apopletico. — 60 — Este facto todavia não é freqüente, mas é observado principal- mente nos soldados, quando fazem marchas em dias calmosos, e nos trabalhadores de ruas nos dias em que o calor é muito intenso. A insolaçao podendo actuar como causa determinante de hemorrhagia cerebral, não permitte estabelecer-se o dia- gnostico differencial immediatamente ao ataque. — 61 — Intoxicações Alcoolismo agudo.— O ataque é passageiro, e mesmo no caso de persistência dos symptomas por algum tempo, qual- quer pessoa sentiria os vapores de aldehydo que de mistura com os gazes do pulmão é expirado. Alcoolismo chronico. — O estado de marasmo a que chegam os grandes bebedores de álcool pôde determinar de um momento para outro phenomenos muito semelhantes aos da apoplexia. O conhecimento dos antecedentes do indivíduo pôde esclarecer o diagnostico, ao lado da observação da marcha da moléstia. Tanto o alcoolismo agudo, como o alcoolismo chronico podem ser causa de hemorrhagia cerebral; o primeiro deter- minando e o segundo predispondo a ruptura dos vasos ce- rebraes. Portanto, o diagnostico necessita de muitos elementos differenciaes, para ser feito com segurança. Etherismo.— Em certos paizes o álcool tem soffrido uma guerra atroz, por ser considerado como offensor aos princípios religiosos, e o ether é usado para substituil-o. Comprehende-se pois que os phenomenos de collapso pelo ether devem ser — 62 - muito mais notáveis do que os que se succedem á embriaguez al- coólica, e portanto mais accentuados os phenomenos apopleticos. O cheiro da substancia que se escapa pelos pulmões ainda aqui é um bom criterium para o diagnostico. O chloroformio determina os mesmos phenomenos, mas o seu cheiro trahe a sua existência. O chloral pela sua innocuidade relativa tem dado logar a abusos sempre seguidos de máos resultados. O coma que resulta da acção do chloral é difficil de se reconhecer a que é devido, quando ignora-se os hábitos de vida do indivíduo ; mas uma analyse bem minuciosa dos symptomas do chloralismo agudo excluem a possibilidade da hemorrhagia cerebral. No chloralismo agudo a temperatura conserva-se sempre muito abaixo do algarismo normal, o que também se observa logo depois do derrame intracerebral; mas as contracções cardíacas na entoxicação chloralica não apresentam a energia que apre- sentam ás vezes na hemorrhagia cerebral. Muitas outras intoxicações ainda podem produzir os mesmos effeitos que estas de que falíamos ; taes são as into- xicações pelo ópio, haschich, belladona, aconito, etc. ; porém, n'estes casos geralmente o diagnostico é fácil desde que se conheça os hábitos de vida do doente. Digo que é geralmente fácil porque algumas d'essas substancias podem actuar em dozes tóxicas, como causas determinantes de hemorrhagia cerebral; de modo que mesmo conhecendo-se os antecedentes pessoaes não se pôde saber se desde logo o estado apople- tico é determinado pela hemorrhagia ou pela intoxicação. Impalludismo .—O impalludismo sob a fôrma de febres perniciosas de fôrma apopletica, syncopal e algida pôde simular — 63 — perfeitamente um derrame sangüíneo no cérebro. A prece- dência de accessos intermittentes, a natureza do logar em que morava o indivíduo, e os symptomas objectivos do impal- ludismo encaminhara o diagnostico. No caso, porém, em que falhem todos estes dados diagnósticos, o microscópio é um poderoso recurso, porque pelo exame microscópico do sangue encontra-se a melanemia, e esta é uma alteração que evi- dencia a natureza palludosa da moléstia. Uremia . —Póde-se fazer o diagnostico differencial n'este caso, quando a urina encerra os cylindros que acompanham a nephrite, ao lado da albumina. Muitas vezes este exame não pôde ser feito, e o abai- xamento progressivo da temperatura, a accentuação do coma uremico, e a ostentação dos phenomenos apopleticos em seu maior auge, tornam o diagnostico differencial impossivel. Moléstias zymoticas.—A febre typhoide, a varíola, a escarlatina, a septicemia cirúrgica, etc, podem produzir um estado de adynamia que se assemelha muito á apoplexia. O indivíduo de um momento para outro cahe em um coma profundo que o leva á sepultura em pouco tempo. N'estas condições é sempre plausível eliminar-se do quadro mórbido a hemorrhagia cerebral; mas como estas moléstias podem determinal-a, é possível que a sua existência passe desperce- bida, se não attender-se a esta possibilidade. Anemia perniciosa progressiva . —Esta moléstia termina- se em alguns casos pela syncope que não se pôde distinguir da apoplexia por hemorrhagia cerebral, por que esta quasi — 64 — sempre é a terminação da anemia grave. Manz dá muita importância aos focos hemorrhagicos da retina; porém, era alguns casos, embora fossem encontrados os focos em torno da papilla óptica, e aos quaes Manz liga tanta importância, a terminação se fez por syncope. Gota.—As manifestações cerebraes da gota são ordinariamente de pouca duração, o estado apopletico produ- zido por ella dissipa-se em pouco tempo. O diagnostico, pois, torna-se fácil em geral; mas, quando a apoplexia é devida á hemorrhagia cerebral pela dyscrasia uricemica, o diagnostico immediato é impossivel; só algum tempo depois é que póde-se eliminar os symptomas da gota communs aos da cerebrorrhagia. Algumas outras moléstias podem ainda se acompanhar de apoplexia, e portanto, se confundir com a hemorrhagia cerebral; porém, as que ahi ficam enumeradas são sufficientes para me dispensarem de proseguir no assumpto. Pôde parecer a quem ler esta parte relativa ao diagnos- tico que eu contradigo-me depois da opinião emittida no começo d'esta these, sobre a apoplexia e hemorrhagia, porquanto no diagnostico ligo uma importância quasi exclusiva ao estado apopletico. O motivo d'isto, porém, é que em primeiro logar a maior parte dos casos de hemorrhagia cerebral, são acom- panhados do ictus apopletico; este facto é tão verdadeiro, que deu logar á opinião errônea de Rouchoux e seus discípulos. Em segundo logar as hemorrhagias cerebraes, que não se acompanham de apoplexia, têm tanta difficuldade em ser diagnosticadas com precisão, que julgo desnecessário occu- par-me d'ellas. — 65 — Prognostico A hemorrhagia cerebral em si traz implícito um pro- gnostico desfavorável, porquanto se em alguns casos em pouco tempo não leva o doente ao túmulo, ella o inutilisa quasi sempre. Assim, quando o doente sobrevive ,além das perturbações orgânicas incorrigiveis, ella crêa uma predisposição a hemor- rhagias cerebraes ulteriores, que em regra geral terminam a vida do doente. A gravidade maior ou menor do prognostico depende de grande numero de circumstancias debaixo das quaes póde-se achar o doente. Assim as hemorrhagias intra-ventriculares são sempre se- guidas de um desfecho fatal. No mesmo caso estão as hemor- rhagias que se estendem á protuberancia e ao bulbo. A idade representa um papel importante também. Durand-Fardel faz notar que é dos 60 annos em diante,que se observa mais com- mummente a generalisação do derramamento intra-cerebral, quer se faça para o interior dos ventriculos, quer se faça para a cavidade arachnoidiana, o que em qualquer dos casos traz sempre um resultado funesto. O estado apopletico quanto mais accentuado apparece, tanto mais grave torna as conclusões 9 1885—K — 6G - prognosticas. A marcha da temperatura é de muita impor- tância. Em regra geral a temperatura que no começo do ataque conserva-se a 37° e 36°, tende a subir gradativamente a 38° e 39° para voltar ao algarismo normal, quando a morte não tem desobrevir immediatamente a apoplexia. Nos casos em que a temperatura inicial permanece no mesmo estado ou continua descendo, ou no caso contrario quando depois deter attingido a 39°, se eleva a 40° ou 45° deve-se acreditar que a morte não tarda a pôr termo á molés- tia. Valleix aflirma que o estado do pulso influe muito, porque nos casos em que elle se íipresenta filiforme, miserável, a morte sobrevem em pouco tempo. O pulso cheio e forte na opinião d'elle não pôde ser considerado como um signal de continuação ou de nova irrupção sanguinea. Mas si ao lado do pulso mise- rável a temperatura estiver muito elevada, as probabilidades de uma terminação funesta são em muito maior numero. O prognostico ainda aggrava-se mais nas condições se- guintes : quando apparece o phenomeno de Cheyne Stokes que quasi sempre precede de pouco tempo a morte ; quando o ataque tem sido precedido de um ou mais outros ataques; de ordinário o 4o ataque é seguido de morte, se a respiração é es- tertorosn, porque « stertor est cceteris paribus mensura peri- culit ; quando finalmente apparece o decubitus acutus, a pneumonia, os derrames pleureticos e pericardicos, a nephrite, etc. Depois,porém,que o doente tem transposto todas as phases mais perigosas do começo de sua moléstia, depois que as me- lhoras são suíficientes para o individuo achar-se novamente de posse de sua personalidade perdida, e para que uma nutrição conveniente possa prolongar-lhe a existência, o medico pôde — 67 - prever a persistência provável da hemiplegia por alguns annos desligada de phenomenos intercurrentes assustadores, si o in- divíduo portador do foco de hemorrhagia cerebral é moço ; si o indivíduo é velho é possível a intercurrencia de um outro ataque ou de uma outra moléstia que traz a morte comsigo. — 69 — Tratamento O tratamento da hemorrhagia cerebral pôde ser consi- derado debaixo de três modos; ou tem-se em vista previnir a hemorrhagia, ou combater os symptomas depois que a molés- tia é posta fora de duvida, ou finalmente melhorar ou remover mesmo os phenomenos consecutivos. Tratamento prophylatico. — Haverá um tratamento prophylatico para as hemorrhagias do cérebro ? De um modo geral não ha, porque não se pôde oppor meio algum que im- peça a evolução d'essas arterites que progridem tacitamente, e que produzem ou directamente a ruptura do vaso cerebral, ou que offerecem as condições em que se podem formar os aneu- rismas miliares. As hemorrhagias de Charcot e Bouchard sendo as mais freqüentes, comprehende-se que se torna muito difficil fazer-se um tratamento prophylatico, porque para isso seria preciso o diagnostico prévio dos aneurismas miliares, o que é impossivel. Só depois de um primeiro ataque, e do exame dos antecedentes pessoaes, é que o medico pôde ser levado a suppor que elles existem, e aconselhar ao doente que evite as causas ordinárias que podem determinar a ruptura de um novo aneurisma. Se — 69 — bem que isto não seja sempre possivel de se conseguir, todavia o doente fica muito menos exposto a um n ovo ataque do que ficaria sem esses conselhos. Os estados hyperhemicos do cérebro uma vez effectuados podem no fim de um certo tempo, se a congestão àugmenta, determinar a ruptura dos vasos se já houver uma alteração d'estes. Mesmo que a congestão não augmente, mas desde que persista.póde a ruptura se effectuar. Os meios a que se recorrer n'estas condições para remover o estado congestiyo podem ser considerados como meios prophylaticos. Assim os sinapismos, as sanguesugas, a sangria, e toda a medicação tendente a um tal fim deve ser considerada como prophylatica da hemorrha- gia cerebral. Pelo que se disse acima, só deve ser considerada prophylatica quando o medico suppuzer a possibilidade de alte- rações vasculares. Tratamento da hemorrhagia . —Depois que se manifesta o ataque que se pôde referir á extravasação sangüínea, não se pôde recorrer a nenhum tratamento que tenha por fim sustar essa hemorrhagia, porque a medicina não tem meio algum para attingir-se a tal fim. Antigamente acreditava-se que isso podia-se conseguir, e o primeiro tratamento que se apresentou para a realização da hemostasia do cérebro foi a sangria.Este tratamento, depois de ser muito enthusias- ticamente empregado, teve de receber mais tarde o seu verda- deiro valor, chegando mesmo a ser completamente rejeitado por alguns clínicos, entre os quaes Trousseau que chegava até a considerar a hemorrhagia cerebral uma contraindicação de sangria. Porém entre os dous extremos ha um termo médio em que se deve collocar para se sangrar o doente, tendo sempre — 70 - em vista que se lança mão de um recurso extremo e imposto pelo cortejo de symptomas especiaes. A sangria era também empregada como meio de reabsorver o sangue extravasado; porém desde que se soube, que mesmo no cérebro, o sangue extravasado coagula-se em pouco tempo, não se praticou mais a sangria com este fim. Este methodo de tratamento, instituído por Aretêo, passou por ínnumeras modificações, dando em certo tempo logar á largas discussões sobre o ponto do organismo que se devia preferir para praticar-se a sangria. Aphlebotomia mesmo chegou a ser posta de parte e aconselhou-se a arterio- tomia das temporaes, dizendo-se que era o meio mais expe- dito para sustar-se a hemorrhagia do cérebro; as complicações sérias que provinham muitas vezes de uma tal pratica fizeram com que ella fosse completamente abandonada. Deixando essas questões de parte é conveniente saber-se quaes são as indicações da sangria na hemorrhagia cerebral. A sangria geral tem por fim diminuir a tensão intravascular; d'aqui decorre pois a indicação da sangria todas ás vezes que o ataque se acom- panhar de phenomenos mórbidos indicativos de hyperhemia cerebral. A quantidade de sangue tirado todavia deve ser pro- porcional á intensidade dos phenomenos congestivos,attendo-se a que uma quantidade exagerada pôde dar logar á uma ische- mia dos centros que presidem ás funcções respiratória e cir- culatória. Alguns pathologistas acreditam ao contrario que se deve praticar a sangria até á syncope, porém esta é uma pratica condemnavel que deve ser absolutamente abolida. As indicações da sangria podem ser consideradas durante o ataque e depois do ataque. As indicações durante o ataque podem ser formuladas do modo seguinte: face vultuosa, estase venosa nas orelhas, região — 71 — mastoidea e face, ou então pulsação exagerada das carótidas, falta de parellelismo entre as fortes contracções cardíacas e a pequenhez do pulso radial, estado de robustez e idade não muito avançada, pulso accelerado e finalmente respiração de Cheyne-Stokes. Taes são as indicações da sangria durante o ataque, porém é couveniente salientar aqui que o clinico necessita de um criterium seguro para praticar a sangria, e poder estar convicto mais tarde, si a morte sobrevier, de que elle não foi o sujeito activo da terminação fatal. Depois do ataque a sangria pôde ser indicada todas ás vezes que a temperatura for exagerada ao lado de symptomas que revelem augmento de tensão intrarterial. N'estas con- dições a diminuição da tensão sanguinea modera os phe- nomenos geraes que correm por conta da encephalite local, ao mesmo tempo que facilita a reabsorpção do coagulo que começa de soffrer as metamorphoses retrogradas. Si os phenomenos geraes persistirem, além da sangria geral, póde-se servir de ventosas escharificadas, esanguesugas ás apophyses mastoides. Importa também fazer notar que o doente deve occupar uma posição que difficulte a chegada de sangue ao cérebro. Assim el'e deve estar em decubito dorsal e ter a cabeça apoiada, de modo que fique em um plano superior ao do tronco. N'estas condições o doente deve guardar a maior immo- bilidade que fôr possivel. A bexiga será conservada sempre vasia por meio de sondagens repetidas. Ao lado da sangria está a medicação revulsiva que deve secundal-a nos casos em que os phenomenos congestivos se apresentam fora do commum. Ella ainda presta serviços quando — 72 — ha contraindicação para as sangrias. Entre os revulsivos deve-se recorrer ás ventosas de Junod, aos sinapismos sobre os jumellos, aos clysteres irritantes, ás fricções da pelle com escovas ásperas. Nem sempre, porém, a hemorrhagia cerebral é acompanhada de symptomas que exijam o emprego das sangrias e dos revulsivos ao mesmo tempo. Em alguns casos ao contrario são os meios oppostos a esses, aquelles de que se deve lançar mão para medicar-se o individuo. O doente, por exemplo, apresenta-se pallido, com a face ligeiramente cyanotica, o pulso filiforme coincidindo com uma fraca impulsão car- díaca; a respiração difficultosa, e a amplitude thoraxica durante a inspiração apenas sensível; finalmente phenomeno de Cheyne-Stokes. Todos estes factos uma vez bem averiguados recorre-se ás injecções sub-cutaneas de ether, que prestam um serviço importantíssimo n'estas condições; por meio d'ellas póde-se mesmo prolongar a vida do doente por algumas horas mais. Na observação junta a esta these o doente que é objecto d'ella abria os olhos e parecia querer fallar todas as vezes que se fazia a injecção de uma gramma de ether. Póde-se empregar as aspersões frias sobre o rosto, a inha- lação de vapores ammoniacaes, o almiscar, o café, o vinho, o carbonato de ammonea, etc. Quando a difficuldade de deglutir é muita, póde-se, além das injecções hypodermicas e das inhalações, recorrer aos clysteres. Uma vez que o doente consegue passar com vida o estado apopletico, grande parte dos perigos tem sido removida, porém elle está ainda exposto a um novo ataque que pôde apparecer sob a influencia da causa a mais banal, e que muito naturalmente não se pôde evitar as mais das vezes. O que é preciso então é aconselhar ao doente a maior — 73 — calma de espirito, permanecendo ao mesmo tempo no leito com o minimo de movimentos. O papel do medico depois d'isto consiste em tonificar o doente, observando apenas a mar- cha da moléstia, e combatendo então as complicações que sobrevierem. Assim merece menção especial a febre que pôde tornar-se intensa e o medico deve empregar todos os meios a seu alcance para combatel-a. Assim por exemplo os capacetes de gelo, as ventosas escarificadas e as bixas sobre as apophyses mastoides. Entre todos estes meios ha um que deve ser lembrado de preferencia, é a antipyrina. Na falta d'este medicamento póde-se recorrer também ao sulfato de quinina na dose de meia gramma três vezes ao dia. Os intestinos devem ser des- embaraçados por meio de purgativos salinos, ou dos calomelanos sempre preferíveis n'estes casos. Si houver cephalalgia intensa que se torne persistente, e com tendências a incrementar-se; si coexistir com ella uma insomnia inquietante acompanhada de phenomenos ataxicos, deve-se recorrer ao chloral e á paraldehyda, de preferencia ao ópio e seus preparados. N'estes casos, porém, ha um meio que produz sempre resultados esplendidos e que nunca falha : é a irrigação continua da cabeça por meio dos capacetes me- tallicos allemães, ou dos capacetes de borracha. Depois de se conduzir o doente longe d'esses perigos, e deixal-o no periodo estacionario da moléstia, deve-se empre- gar uma medicação que favoreça a reabsorpção dos detritos resultantes da degenerescencia do coagulo. Evidentemente não se possue uma medicação que vá actuar sobre o coagulo directamente, obrigando-o a entrar para 10 1885-K — 74 — o meio interno; tental-o seria uma utopia; porém póde-se lan- çar mão de meios therapeuticos, que inquestionavelmente auxiliam a natureza a chegar a esse resultado. Assim para que o coagulo possa ser de novo absorvido é necessário que se degenere e se reduza á uma polpa de modo que esta, de mistura com a substancia cerebral também degenerada, possa diluir-se no serum, e por esse meio penetrar na torrente cir- culatória. Para proceder-se de harmonia, com estes phenomenos, e empregar-se uma medicação racional, é preciso distinguir-se as modalidades com que se apresenta a tensão sangüínea, e aproveitar-se tão somente das indicações que d'ellas decorrerem. Assim se depois mesmo de passado o periodo febril, o individuo apresentar symptomas que dependam de uma irrigação abun- dante do cérebro, recorre-se aos revulsivos, ao iodureto de potássio, etc, que tem por fim diminuir a tensão intravas- cular, e favorecer portanto a reabsorpção do coagulo; si, porém, o individuo conserva-se em estado de prostração, de adynaraia, ou si houver symptomas finalmente de um embaraço á circu- lação cerebral de retorno, recorre-se aos excitantes diffusivos a principio, depois aos tônicos, aos reconstituintes, etc, que tenham por fim levantar as forças do doente, e por esse modo regularisa-se a circulação, e impede-se a stase sangüínea no cérebro ao mesmo tempo que se favorece a reabsorpção do coagulo. Em qualquer das condições o individuo deve estar debaixo de cuidados rigorosos de hygiene. Antigamente em- pregavam como fim de apressar a degeneração do coagulo, ventosas escarificadas, sanguesugas, vesicatorios, fricções ir- ritantes, etc, sobre a cabeça ou sobre a nuca ; hoje, porém, estão completamente abandonados esses meios, porque não se - 75 — pôde effectivamente apressar as metamorphoses do coagulo. No mesmo caso estão os mercuriaes que se administrava com esse fim. Os iodicos eram empregados não só para tornar mais rápida a retrogradação phathologica dos elementos do sangue coagulado, como também para dissolver o coagulo de- generado e facilitar a sua reabsorpção por essa fôrma. É mais natural, porém, que os bons resultados tirados pelos iodicos sejão attribuiveis á acção deprimente que elles exercem sobre a tensão sanguinea, em virtude da qual torna-se fácil a re- introducção dos exsudatos liquefeitospara ò meio interno. A electricidade também pôde ser applicada com o fim de auxiliar a reabsorpção do coagulo. De duas maneiras póde-se empregar as correntes electricas : ou sob a fôrma de correntes galvanicas, ou sob a fôrma de correntes faradicas. Remack foi um dos primeiros que empregou as correntes gal- vanicas, e vio que as hemiplegias que se seguiam á hemor- rhagia cerebral, desappareciara em pouco tempo. Este tratamento foi depois empregado por outros clí- nicos que faziam ao mesmo tempo a galvanisação da região por onde passa o sympatico cervical. Quando se faz appli- cação da electricidade com este fim os dous electrodos col- locam-se sobre a cabeça em pontos homólogos, e fazendo com que o contacto não se prolongue por mais de oito minutos para cada ponto. As correntes galvanicas podem também ser applicadas sobre os nervos paralysados ; n'este caso toma-se o cathode por polo Índifferente, applicado sobre a columna vertebral ou sobre a região de um plexo cujo nervo quer-se excitar, e o anode applica-se sobre o trajecto d'esse mesmo nervo ; obtém-se, portanto, uma corrente ascendente. A intensi- dade d'esta corrente pôde ser augmentada gradativamente — 76 — todos os dias, tendo-se a cautela de diminuir-se o tempo das sessões de electricidade, á proporção que a corrente torna-se mais forte. Convém evitar as inversões e as interrupções da corrente que sempre produzem um choque prejudicial aos fins que se tem em vista. As correntes faradicas, segundo Duchene (de Bolonha) não exercem nenhuma influencia sobre os symptomas que persistem depois do ataque, quando são applicadas sobre o craneo. Ao contrario, applicadas sobre os músculos paraly- sados ou sobre os nervos n'esse estado, ellas auxiliam o retorno das funcções perdidas. Depois de apparecerem as contracturas, o emprego d'este meio não raras vezes as torna mais intensas. Em todos os casos, porém, para se lançar mão da electricidade, é necessário que se deixe um espaço de 5 a 6 mezes a datar do ataque, porque logo depois que a hemorrhagia tem se ma- manifestado a electricidade pôde dar logar ao apparecimento de um segundo ataque, de conseqüências quasi sempre fataes. As águas thermaes alcalinas têm sido aconselhadas como meio auxiliar muito importante do tratamanto; porém é muito grande o numero de individuos que percorrem os estabele- cimentos balneários sem grande proveito. E' muito natural que a mudança de clima, os cuidados hygienicos de que se cerca um individuo que vai a um estabelecimento balneário tratar-se somente, concorram todos para a melhora do estado geral, e para que a medicação seja aproveitada. Sempre porém é preciso ter em muita consideração, que em caso algum o doente deve fazer uso de águas cujo gráo thermico seja muito elevado, porque podem dar logar â uma reacção sobre o orga- nismo, bastante intensa para provocar um novo ataque de hemorrhagia. — 77 - A hydrotherapià sob os cuidados de um medico habili- tado pôde dar bons resultados no tratamento das paralysias. A strychnina em injecções hypodermicas constitue também um tratamento que produz muito bons resultados em alguns casos, para combater-se as paralysias. O seu emprego, porém, merece muita cautela para que o medico indague dos phenomenos mórbidos que soem appa- recer como indicativos da intoxicação chronica por esse alca- lóide . A strychnina não deve ser empregada por muito tempo, e bem applicada é um bom meio para tratar-se da hemiplegia facial. A arnica tem também sido indicada por alguns; porém o seu uso não tem demonstrado que ella exerça definitivamente uma influencia benéfica no tratamento das hemiplegias que se succedem ás hemorrhagias. No mesmo caso estão a alfazema, hortelã, melissa e muitos outros outros medicamentos que têm sido propostos para esse fim. 2GUNM PARTS Das üemorrüasias flo cérebro fletóo I puto do vista das localisaçoes cerebraes. Este assumpto é bem vasto para ser desenvolvido comple- tamente em uma these, sobre hemorrhagia cerebral. Para con- seguil-o seria preciso dissertar-se exclusivamente sobre elle, de modo a analysar as delicadas questões de localisação cerebral. N'esta parte eu farei simplesmente um resumo das noções melhor adquiridas sobre localisaçoes no cérebro, e que podem auxiliar sobremaneira o diagnostico regional das hemorrhagias cerebraes. Ao mesmo tempo nos capítulos convenientes darei conta dos symptomas, que deixaram de ser interpretados na parte relativa á physiologia pathologica, porque elles correm por conta de zonas bem determinadas do cérebro. 07 — 80 — Ligoiias noçBos sobro a aaatomia do cérebro O cérebro é representado pelo segmento encephalico mais volumoso e mais altamente situado. Constituído pelos hemispherios cerebraes, elle enche quasi totalmente a cavidade craneana, se estendendo da abobada á base do craneo, repou- sando anteriormente sobre o assoalho orbitario e posterior- mente sobre a tenda do cerebello. Além de outros tecidos, que entram em sua textura, o cérebro é formado essencial- mente por fibras e cellulas nervosas. As cellulas formam as camadas corticaes, e os gânglios da base ; as fibras constituem dous systemas commissuraes, que têm por fim, um ligar as cellulas ganglionares ás corticaes de um mesmo hemispherio- e outro pôr em relação mutua as cellulas dos dous hemis, pherios. O primeiro só constitue o que Meynert chama systema de projecção de primeira ordem. As massas ganglio- nares da base são : as camadas ópticas, os corpos estriados, (núcleos intra e extraventricular) e o ante-muro. As camadas corticaes formam as circumvoluções, e a quantidade de cellulas nervosas de que são formadas é superior a todas as cellulas do resto do eixo encephalo. medullar. Estas circumvoluções acham-se dispostas methodicamente nos dous hemispherios. De todas ellas as que merecem especial menção para o diagnostico da moléstia, que faz - 81 — assumpto d'esta these, são a 3a frontal esquerda, as duas frontaes ascendentes, as duas parietaes ascendentes, e o lobulo para-central. A 3a circumvolução frontal (Ia frontal dos allemães) nasce da frontal ascendente,fôrma uma parte do bordo anterior da fenda de Sylvius, e sem attingir completamente a extre- midade anterior do lobo frontral, dirige-se para a face inferior d'este lobo, onde se termina. A circumvolução frontal ascendente, ou central anterior, fôrma o bordo anterior do sulco de Rolando, e se dirige quasi verticalmente da fenda de Sylvius ao sulco inter- hemispherico. A circumvolução parietal ascendente, ou central posterior, parallela á frontral ascendente, fôrma o bordo posterior do sulco de Rolando, e tem a mesma direcção que a frontal ascendente. O lobulo para-central está collocado na face interna dos hemispherios, abaixo do ponto em que se termina o sulco de Rolando. Os dous hemispherios podem ser considerados perfeita- mente symetricos, salvo algumas differenças, que se nota quanto ao desenvolvimento de ambos, e de certas zonas de cada um. As artérias que nutrem o cérebro partem todas do circulo de Willis e se dividem em corticaes e centraes. As pri- meiras formam a rede vascular da pia-mater, e logo penetram no cérebro, para ahi formarem as arborisações terminaes. Estas artérias são: cerebral anterior, cerebral média e cerebral posterior. A cerebral anterior nutre todo o lobo frontal excepto a 3a frontal e frontal ascendente. A sylviana 11 1885—K — 82 — completa a vascularisação do lobo frontral, vascularisa todo o lobo parietal, e Ia temporal. A cerebral posterior vascula- risa o resto dos hemispherios cerebraes. As veias do cérebro vão ter aos seios da dura-mater e quanto á suas ramificações ultimas os anatomistas ainda não estão de accordo, uns admittindo as anastomoses com as arborisações das circum- voluções, e outros negando-as completamente. Os vasos cerebraes, que penetram nos tecidos do cérebro, são todos cercados por uma bainha lymphatica que vem se abrir nas malhas da pia-mater. Estas bainhas são cheias de liquido cephalo-rachidiano que circulando entre os elementos nervosos, accumula-se mais em certos pontos da superfície do cérebro, e fôrma os chamados lagos, flumen, rivi e rivula. As artérias centraes que vão aos corpos estriados formam dous grupos: um interno que é constituido pelos vasos provenientes da cerebral anterior e dos plexos choroides; são as artérias estriadas propriamente ditas, e estriadas ventriculares; outro externo que provem da sylviana no espaço perfurado anterior, são as artérias lenticulares propriamente ditas, as lenticulo- estriadas e lenticulo-opticas. As artérias das camadas ópticas formam dous grupos : um constituido pelas artérias ópticas internas anteriores e poste- riores, ramos da communicante posterior e da cerebral posterior; outro formado pelas artérias ópticas externas e posteriores que nascem da cerebral posterior ao nivel dos corpos geniculados. Para completar esta synthese de anatomia do cérebro, resta dizer que os dous hemispherios reunidos formam em sua parte média uma cavidade que é dividida em duas por uma la- mina transversal de fibras nervosas, trigono-cerebral; a inferior constitue o ventriculo médio ou terceiro ventriculo; a superior — 83 — é dividida em duas outras pelo septum lucidum que é perpen- dicular ao trigono; estas tomão o nome de ventriculos la- teraes . Uma vez feita esta rápida vista cVolhos sobre a anatomia do cérebro, somente quanto ao que interessa ao diagnostico das hemorrhagias cerebraes, passarei ao diagnostico regional d'essas hemorrhagias: 1° Nas camadas ópticas ; 2° Nos corpos estriados; 3° Na cápsula interna ; 4° No centro oval; 5° Nos ventriculos cerebraes; 6o Nas camadas corticaes. I.— HEMORRHAGIA CEREBRAL NAS CAMADAS ÓPTICAS A physiologia das camadas ópticas ainda hoje não está conhecida. As opiniões divergem muito sobre o papel func- cional d'essas duas massas nervosas do cérebro. Magendie primeiro que todos pensou que ellas eram es- sencialmente a sede dos phenomenos de sensibilidade; mas Longet e Schiff disseram que isto corria por conta das fibras da calotte. Luys as considera como um centro da sensibi- lidade em geral; são para elle um verdadeiro sensorium commune, Meynert e Wundt as considera como centro dos reflexos das excitações periphericas. Crichton Browne diz que não só a sensibilidade geral é diminuída como também a sensibilidade — 84 — reflexa; mas a diminuição da sensibilidade geral para Browne é só do lado opposto á camada óptica interessada por uma lesão qualquer. Elle acre dita que este é um bom meio para o diagnostico das lesões das camadas ópticas. O papel funccional que os positivistas dão ás camadas ópticas não têm bases po- sitivas que imponham a convicção, onde não ha prejuízo pelo systema contista. Resulta de todos os trabalhos que até ha bem pouco têm-se publicado sobre o assumpto que não se conhece as funcções das camadas ópticas. Era portanto natural que a clinica ficasse estacionaria quando quizesse assentar as bases para o diagnostico das lesões localisadas sobre as camadas ópticas. Os factos clínicos até hoje colleccionados não nos auto- risam a nenhuma conclusão positiva que sirva de criterium para o diagnostico. Assim ao lado de factos em que a lesão tem sido acompanhada de phenomenos mórbidos nos domínios da sensibilidade, já exclusivamente, já ao lado de perturbações motoras, outros são acompanhados de perturbações motoras, exclusivamente, e o que é mais, outros não se acompanham de nenhum symptoma da moléstia. O único meio de dia- gnostico, de que se pôde lançar mão, é a maior freqüência das hemorrhagias nas camadas ópticas. Esta maior freqüência auetorisa não ao diagnostico certo, indiscutível, mas somente a acreditar-se na grande possibilidade de um foco de hemor- rhagia n'essas massas de cellulas nervosas, interessando tam- bém zonas vizinhas, sempre que se tratar de casos clássicos de hemorrhagia cerebral. — 85 — II. - HEMORRHAGIA CEREBRAL NOS CORPOS ESTRIADOS As funcções dos corpos estriados têm dado logar também a muitas theorias, e ainda hoje não se conhece de um modo seguro o seu papel funccional. Um facto, porém, parece fora de duvida, é que elles são sede de motricidade. A sympto- matologia pois dos focos hemorrhagicos que compromettem a sua integridade anatômica, não é bastante definida para poder-se traçar o quadro de perturbações funccionaes suffi- cientes para caracterisal-as. Outra difficuldade ainda accresce> e vem a ser a raridade de lesões limitadas que offereçam con- dições de precisão topographica, de modo a permittir filiar-se a perturbação funccional á destruição cellular; e pois a deducção scientifica da localisação mórbida encontra embaraços taes, que só a multiplicidade de factos scientificamente colleccionados poderá para o futuro vencel-as precisando as funcções dos corpos estriados. Pelo que as observações offerecem a deduzir-se, os focos ou hemorrhagicos ou de amollecimento de qualquer um dos corpos estriados, traduzem-se, na maioria dos casos, por hemiplegia do lado opposto á lesão. Esta hemiplegia tende a desapparecer nos membros abdominaes para persistir nos membros thoraxicos. Foi este facto que fez com que se pen- sasse que as lesões dos corpos estriados podiam produzir monoplegias dos membros thoraco-abdominaes; hoje, depois de observações numerosas, póde-se quasi afíirmar que essas monoplegias puras, completamente dissociadas são um signal negativo de lesões dos corpos estriados. A hemiplegia cruzada — 86 — que sóe acompanhar a hemorrhagia dos corpos estriados tem por sede os músculos innervados pelo facial respiratório, algumas vezes os músculos innervados pelo hypoglosso, os músculos dos membros superiores e inferiores, thoraxicos e abdominaes. São estes os únicos dados que a pathologia põe á dis- posição da clinica, para o diagnostico das hemorrhagias nos corpos estriados. Quanto aos symptomas especiaes a um dos núcleos (núcleos intra e extraventriculares) nada absoluta- mente póde-se afíirmar. Apenas conhecem-se factos de he- morrhagias isoladas sobre um ou outro exclusivamente, e acompanhadas de perturbações motoras e vaso-motoras. As perturbações da sensibilidade geral e especial são ainda pro- blemáticas como phenomenos constantes d'essas hemor- rhagias. Mas é preciso também assignalar aqui que em alguns casos tem se encontrado lesões limitadas a um núcleo somente e duplas no núcleo lenticular, sem symptoma nenhum que as externasse. Quanto á possibilidade de dege- nerescencia descendente por lesões nos corpos estriados, ainda nada de absoluto se pôde dizer, porém tenho mais razões para acreditar que ellas não a produzem, do que para pensar o contrario. III.— HEMORRHAGIA CEREBRAL NA CÁPSULA INTERNA A cápsula interna representa um papel importantíssimo quando se tem em vista o estudo das hemorrhagias cere- braes; não só estas hemorrhagias a interessam no maior - 87 — numero dos casos, como também as perturbações que d'ella dependem têm uma importância máxima para o diagnostico e prognostico da moléstia. Separando a camada óptica e o núcleo caudado do núcleo lenticular, a cápsula interna põe o cortex do cérebro em relação com o mundo exterior. Ella é alimentada por alguns ramusculos da lenticulo-optica e lenticulo-estriada. A clinica exige debaixo do ponto de vista symptomatologico a sua divisão em dous segmentos : anterior e posterior. As hemorrhagias da cápsula interna dão logar a perturbações sensitivas, sensitivo-sensoriaes, motoras e sensitivo,—motoras. — 88 - Perturbados so&sitbas A cápsula interna debaixo do ponto de vista anatômico é formada por feixes indirectos e directos; entre os pri- meiros encontra-se as fibras que do pé do pedunculo vão ao núcleo lenticular e ao núcleo caudado, e fibras que vão d'estes dous núcleos e da camada óptica ao cortex cerebral. Entre os segundos estão os feixes de fibras (sensitivas e motoras) que da medulla vão directamente ás camadas corticaes. Todas estas fibras antes de se irradiarem desordenada- mente formam feixes aos quaes estão reservadas funcções especiaes. E' assim que o segmento posterior da cápsula é for- mado por dous feixes, um indirecto proveniente das camadas ópticas e outro directo. O feixe directo occupa a parte mais externa do segmento e só muito em cima é que elles fundem- se definitivamente. As hemorrhagias que destroem essas fibras determinão perturbações que podem ser exclusiva- mente sensitivas, affectando a fôrma de hemianesthesia. Ferrier também observou a hemianesthesia exclusiva- mente sensitiva em seguida ás lesões capsulares, porém dá uma outra interpretação que não pôde ser admittida. — 89 — Perturbados soasitiTo-seasorlaos São estas as mais importantes quando se trata da hemor- rhagia da cápsula. Pela intima relação dos feixes sensitivo e sensorial é natural que estas sejam as perturbações mais communs occasionadas pela hemorrhagia da cápsula. Esta lo- calisação foi entrevista por Türck, que em 1859 communicou á Academia de Sciencias d'Austria alguns factos de amolleci- mento e de hemorrhagia do cérebro, acompanhados de hemi- anesthesia sensitivo-sensorial. Depois Charcot, em 1872, aper- feiçoou a descripção de Türck, mostrando que ella podia se approximar da hemianesthesia hysterica. Depois d'isto diffe- rentes trabalhos vieram provar as supposiçõs de Türck; final- mente póde-se afíirmar hoje que a maioria dos casos de hemi- anesthesia sensitivo-sensorial são dependentes de uma lesão do segmento posterior da cápsula. Cumpre fazer saliente que a he- mianesthesia não é absolutamente separada da hemiplegia ou hemiparesia; pelo contrario, é as mais das vezes acompanhada de perturbações da motilidade, e isto porque os focos he- morrhagicos pela lenticulo-estriada abrangem sempre uma grande quantidade de fibras capsulares assim como interessam grandemente as massas opto-estriadas. Seria, pois racional, pelo que precede, fazer-se o dia- gnostico regional da hemorrhagia da cápsula, todas ás vezes que, desapparecido o estado apopletico, se encontrasse a 12 1885—K - 90 — hemianesthesia sensitivo-sensorial; poréoi, é preciso uma ana- lyse bem circumstanciada dos symptomas para se chegar a esse resultado, porque as hemorrhagias do mesocephalo dão logar a uma hemianesthesia que com muita facilidade póde-se con- fundir com as de origem cerebral; e o mesmo também se observa nas hemorrhagias dos pedunculos cerebraes. Alguns symptomas, permittem,porém, a exclusão d'estas ultimas he- morrhagias. Assim, a anosmia, a amblyopia ou a hemianopsia, não se encontram nas hemorrhagias dos penduculos e da pro- taberancia. A hemichorea ou a athetose pre ou post-hemiplegica é um symptoma de hemorrhagia na cápsula que conduz na maioria dos casos ao diagnostico certo, se bem que se encon- tre factos em que a lesão não exista; porém, hoje póde-se dizer que a athetose e a hemichorea pre ou post hemiplegica tem por localisação o segmento posterior da cápsula interna destruído. A exclusão das hemorrhagias pedunculares e protube- ranciaes ainda pôde basear-se no facto de sua raridade, e de terem por ponto de partida algumas vezes um foco que foi originado pelas lenticulo-estriadas; de modo que mesmo nos casos de symptomas protuberanciaes bem accentuados, elles podem correr por conta de um foco primitivamente capsular que mais tarde se estendeu á protuberancia. — 91 Perturbações motoras Emquanto que o segmento posterior da cápsula é for- mado quasi todo por fibras de sensibilidade geral e especial, o segmento anterior é todo constituido por fibras que condu- zem a corrente nervosa do centro para a peripheria. Todas as lesões que interro mpem a continuidade da cá- psula no segmento anterior traz em como conseqüência uma hemiplegia. Esta proposição hoje quasi que é absoluta, porque não só os factos clínicos a demonstram, como as experiências de laboratório provam que ella é exacta. Algumas observações têm sido publicadas em que um foco sobre essa região da cá- psula, não fora seguido de symptoma nenhum que consistisse em perturbações motoras ; mas, esses factos devem ser postos de parte como expecionaes, podendo mais tarde receber uma interpretação exacta. Estas hemiplegias têm uma singificação prognostica de muita importância, porque são sempre incuráveis. Desde, porém, que o segmento anterior é destruído em muito pe- quena extensão, é possível que outra zona do cérebro func- cione em substituição e a hemiplegia desappareça. E' um facto idêntico ao que se passa com a hemorrhagia da cápsula externa; porquanto, n'esta hemorrhagia o segmento anterior da cápsula é comprimido pelo foco, d'onde resulta uma hemiplegia; e, á proporção que uma encephalite deter- siva, perifocal, elimina o coagulo, a compressão diminue, — 92 — desapparece, assim como desapparece a hemiplegia que só existe por causa da compressão. Um phenomeno muito importante que acompanha sempre tardiamente a hemorrhagia do segmento anterior da cápsula, é a contractura post-hemiplegica. A explicação d'estas contracturas tem motivado differen- rentes modos de pensar. Assim, a escola allemã, representada por Hitzig n'este assumpto, acredita que as contracturas são motivadas pelos movimentos associados excessivos. Não ha duvida que os movimentos associados de que falia Hitzig exis- tem na maioria dos casos de hemorrhagia ou de amollecimento cerebraes seguidos de contractura ; mas, que elles entrem como factor para explical-as é difficil de admittir-se. Em primeiro logar differentes estados de superexcitação cerebral existem que não são acompanhados de contracturas, e com elles os movimentos associados que sem difficuldade póde-se provocar. Em segundo logar sempre que ha contractura dependente de hemorrhagia cerebral, a autópsia revela uma sclerose des- cendente nos cordões lateraes. As contracturas durante o ataque ou pouco antes são raras, o que não devia acontecer pela hypothese de Hitzig, porque n'essas condições o cérebro naturalmente devia achar- se no estado de superexcitação que elle invoca para explicar o exagero dos movimentos associados. A escola franceza, tendo á sua frente Charcot, invoca a sclerose descendente como causa determinante do phenomeno. Segundo Charcot, o processo inflammatorio produziria por irritação das cellulas motoras, onde se terminam os cordões lateraes um estado semelhante ao que produz a strychnina, isto é, um exagero de sensibilidade reflexa. D'este modo a — 93 — actividade reflexa, que entretem o que se chama —tonus muscular—, uma vez exagerada em certa zona, produziria o exagero da tonicidade nos músculos dependentes da região superexcitada, exagero que seria traduzido pela contractura. Esta theoria é apoiada por muitas considerações importantes e entre ellas a seguinte: que na quasi totalidade dos factos as leucomyelites lateraes acompanham-se de contractura. E' certo, que a autópsia tem verificado a integridade dos cordões lateraes, em individuos que durante a vida apresentaram-se com contracturas post-hemiplegicas ; mas estes factos consti- tuem verdadeiras excepções, onde talvez a neoformação de tecido conjunctivo não tivesse podido ser posta em evidencia pela deficiência de nossos meios de investigação microscópica. Os phenomenos que se observa na hemiplegia spasmodica infantil de Benedickt, emquanto que moldam-se á theoria de Charcot, são ao mesmo tempo um solemne protesto contra a theoria allemã. — 94 — Perturbações sofisitLYO-sesseriaes © motoras Estas perturbações, se bem que possam existir com as lesões isoladas do segmento pos terior da cápsula, todavia a sua existência não é tão evidente como nos casos em que a destruição tem-se feito na totalidade, ou na quasi totalidade da cápsula interna. N'estes casos a lesão não circumscreve-se absolutamente á cápsula, ella vai muito mais longe, destruindo outras zonas que podem ser consideradas, como elementos incumbidos de funcções especiaes; porém, pouco importa, uma vez que a hemiplegia francamente accentuada é acompanhada de hemi- anesthesia sensitivo-sensorial, isto basta para o diagnostico da sede mais importante da hemorrhagia cerebral. IV--HEMORRHAGIA CEREBRAL NO CENTRO OVAL O centro oval, sendo formado por fibras nervosas, que se cortam, em todos os sentidos offerece difficuldades de ser estudado debaixo do ponto de vista das localisaçoes. Além d'isto o centro oval não pôde ser considerado como centro psychico, porque elle é constituido exclusivamente por fibras çommissuraes. Diversos processos têm sido propostos para - 95 - limitar as funcções de que devem se achar incumbidas as fibras de pontos differentes do centro oval. Pitres foi o pri- meiro que propôz um processo para isso, fazendo seis cortes nos hemispherios ; esses cortes elle denominou de: Io, prefron- tal;2°, pediculo-frontal; 3o, frontal; 4o, parietal; 5o, pedi- culo-parietal; 6o, occipital. Bitot limitou mais a extensão dos cortes, propondo um apparelho especial para isso, e, faze ndo-os com intervallo de um centímetro, em toda a zona que elle chama zona-mezo-lobar. Nothnagel modificou o processo de Pitres, propondo fazer-se sete cortes em vez de seis. Apezar de todos estes meios trazidos pela cerebrotomia methodica para o estudo das localisaçoes, as do centro oval não estão ainda bem estabelecidas para que a clinica possa se utilisar d'ellas. Como em todas as lesões cerebraes as do centro oval se dividem em dous grupos: em um ainda que pequeno não ha symptomas que externem a lesão ; em outro muito maior a lesão é acompanhada de certos symptomas. As perturbações para o lado da sensibilidade nas lesões destructivas do centro oval ainda não estão bem estudadas de modo a poderem orientar o diagnostico; porém, parece que nas lesões da porção occipital do centro oval a sensibilidade é interessada. Estas lesões são acompanhadas de aphasia conforme a zona que tem sido interessada; porém esta aphasia em nada se distingue d'aquella que resulta de uma lesão da terceira circumvolução frontal esquerda, sendo considerada em si mesma ; mas ao lado de outros symptomas é um magnífico re- curso para o diagnostico. As perturbações da motilidade são perfeitamente comparáveis ás que dependem de uma lesão dos — 96 — corpos estriados; porém as hemiplegias por destruição dos corpos estriados em regra geral não se acompanham de con- tracturas ; ao passo que as hemipl egias por destruição do centro oval são seguidas sempre de contracturas tardias, incuráveis. As lesões da circumvolução de Broca não se acompanham de contractura nem de hemiplegia completa; por conseqüência quando se tiver debaixo das vistas um caso de hemorrhagia cere- bral em que, ao lado da aphasia, existir uma contractura tardia, post-hemiplegica, póde-se com toda a probabilidade diagnos- ticar uma destruição do centro oval nas vizinhanças da 3a cir- cumvolução frontal esquerda (feixe pediculo-frontal de Pitres). V- HEMORRHAGIA CEREBRAL NOS VENTRICULOS A symptomatologia das hemorrhagias nos ventriculos do cérebro ainda hoje não constitue um criteriun seguro para o diagnostico e isto principalmente porque sempre ao lado da hemorrhagia intraventricular, existe destruição ou das camadas ópticas, ou dos corpos estriados, de modo a tornar-se absolu- tamente impossivel a separação dos symptomas que dependem dos ventriculos e das camadas ópticas. Um facto, porém, assi- gnalado pela primeira vez por Durand Fardei, tem sido ve- rificado pára quasi todas as hemorrhagias intraventriculares do cérebro, e é a contractura que apparece desde logo, e que, se o derramamento é grande, permanece até a morte. Neste caso, isto é, quando o derramamento é grande, além da contractura dos membros thoraco-abdominaes, observa-se convulsões generalisadas. A existência d'estas perturbações é tão constante nas hemorrhagias intraventriculares que — 97 — Racle quiz fazer d'ellas um signal pathognomonico d'essas hemorrhagias. Uma hemorrhagia intrventracular encerra em si um prognostico gravíssimo ; porém quando o derramamento é bastante pequeno para não produzir lesões destructivas de uma certa extensão, o prognostico torna-se ao contrario mais favorável do que em qualquer outra, porque só n'estas hemor- rhagias é que o extravasacto entra para a circulação sem deixar vestígio algum da hemorrhagia, não só quanto aos symptomas consecutivos, como quanto aos signaes, que a au- tópsia permitte descobrir. O Sr Edward Sanders propõe um certo grupo de sym- ptomas que, segundo elle, podem servir para o diagnostico dif- ferencial entre as hemorrhagias do cérebro e meningeas, e as hemorrhagias dos ventriculos. Assim, segundo elle, os qua- dros seguintes mostram a differença entre : HEMORRHAGIA CEREBRAL Freqüente no meio da vida. Começo moroso e menos violento. Coma menos profundo. Convulsões raras. Contracturas raras. A paralysia éde regra observar-se, esempre reveste a fôrma hemiplegica. A cura é freqüente. A melhora ou remissão dos symptomas é raro observar-se. Ordinariamente a vida prolonga-se. HEMORRHAGIA VENTRICULAR Freqüente nos moços ou velhos. Começo rápido e violento. Coma profundo e immediato. Convulsões freqüentes. Contracturas freqüentes. Falta paralysia, e quando existe é gene- ralisada em todos os casos. A cura é rara. Uma melhora ou remissão passageira dos symptomas é o commum observar-se A morte é rápida e vem em algumas horas HEMORRHAGIA VENTRICULAR Não ha antecedentes Os symptomas premonitores são raros. A cephalalgia é rara. A tortura oris é commum. As contracturas são freqüentes. Convulsões são menos freqüentes. Vômitos menos freqüentes. Não ha febre. Morte rápida. 13 HEMORRHAGIA MENINGEANA Sempre ha antecedentes. Faltam sempre os symptomas premonitores E' freqüente a cephalalgia. A tortura oris é rara. São menos freqüentes as contracturas. As convulsões sempre existem. Sempre se observa vômitos. Sempre ha febre. A vida ordinariamente se prolonga. 1885—K — 98 — Este quadro do Sr. Sanders resume de uma maneira completa os symptomas de que se pôde lançar mão para o diagnostico da hemorrhagia intraventricular. VI.-HEMORRHAGIA DAS CAMADAS CORTICAES O estudo das localisaçoes corticaes constitue a parte mais importante da doutrina das localisaçoes em geral. Esboçadas no systema phrenologico de Gall, as loca- lisaçoes corticaes entraram para o terreno scientifico depois dos trabalhos de Hitzig e Fritsch. Este ultimo em 1870 provou que as camadas corticaes erão excitaveis ao contra- rio do que pensavam Flourens, Vulpian e Cl. Bernard. Hitzig confirmou os trabalhos de Fritsch determinando os pontos do cortex cuja excitação se acompanhava de movi- mentos localisados em certos grupos musculares. Em uma segunda memória, publicada em 1872, elle precisou mais os centros dos movimentos voluntários no cão para o membro anterior e posterior, para os músculos da face e do pescoço. Pouco se emocionou o mundo scientifico com estes factos í apenas Schiff fez ligeiras criticas aos trabalhos de Hitzig. Ferrier pouco depois publicou um trabalho sobre as funcções do cérebro, que constituía já um verdadeiro progresso nos estudos sobre localisaçoes corticaes. Descreveu um grande numero de centros corticaes no cão ; precisou a sede dos mo- vimentos voluntários da face, dos lábios, dos olhos, da lingua, dos membros superiores e inferiores, e do pescoço. Re- conheceu que os centros variam em extensão conforme as — 99 — espécies aniraaes, e que a localisação é tanto mais precisa quanto mais se sobe na escala zoológica. O trabalho de Fer- rier provocou a critica de C&rville e Duret os quaes discor- dando d'elle a principio, mais tarde confirmaram suas asserções. Restava porém, saber de que interpretação eram susceptíveis os movimentos attribuidos a estes centros. Duret, e Carville com sua celebre colher, vieram demonstrar que á ablação de um d'esses centros correspondia uma paralysia transitória dos músculos cujos movimentos d'elle dependiam • d'onde concluíram que nosanimaes inferiores tem-se antes cen- tros funccionaes do que centros anatômicos permanentes. O habito de certas cellulas corticaes vibrarem mais freqüen- temente pelas excitaçoes periphericas, constitue um centro desde que estas cellulas se associem debaixo de uma certa orientação. Assim depois de sua ablação um novo grupo pôde se associar e formar um centro substitutivo do pri- meiro ; e quando a paralysia persiste é porque a associação funccional substitutiva foi impossivel. A existência dos centros psychomotores teve a sua cabal demonstração diante do Collegio Real dos médicos de Londres. Ferrier predizia os movimentos que iria obter pela excitação dos centros que por experiências anteriores tinha determinado no cérebro do macaco. E o macaco mostrava as mãos, apre- hendia um objecto, etc, á vontade do physiologista. Era a vontade de Ferrier que se infiltrava com a electricidade nas cellulas cerabraes do animal; era que Ferrier queria e pensava pelo macaco cuja unidade psychica fora trocada por ura pouco de electricidade. Logo depois os trabalhos n'esta direcção se succederam e os resultados differentemente obtidos, e interpetrados também - 100 — de modos diversos vieram complicar a questão já em si deli- cadíssima. Em todo o caso estava-se de accordo sobre a loca- lisação da zona motriz nos animaes. Por analogia determinou-se também a zona motriz do cérebro humano. Este methodo que, appiicado á biologia geral produz, magnificos resultados, não deve ser empregado para o esclarecimento de questões espe- ciaes de biologia. Charcot,cujo nome concretisa aneuro-pathologiafranceza, procurou para base de suas affirmações sobre localisaçoes no homem, a relação entre os phenomenos observados in vita e as lesões corticaes post mortem. D'este modo elle determinou a zona motora, e ha dous annos que em colaboração com o professor Pitres elle modi- ficou um pouco os limites d'essa zona. Os resultados obtidos em França e na Allemanha discor- daram um pouco das conclusões que sobre o assumpto tinham tirado os experimentadores sobre os animaes. A zona motora, admittida hoje, é constituída pelas duas circumvoluções frontal e parietal ascendentes, e pelo lobulo paracental. As zonas de sensibilidade não tem localisação até hoje determinada. Ha possibilidade de acreditar-se que os lobos occipitaes e parte dos lobos parietaes e temporaes se incumbem das funcções de sensibilidade, se bem que em certos casos bem observados, as lezões da zona motora exclusivamente tem sido acompanhadas de perturbações da sensibilidade. Deixando de parte as perturbações da sensibilidade sobre as quaes ainda não ha nada bem estabelecido, tratarei somente das perturbações motoras e das perturbações da palavra occasionadas pelas hemorrhagias corticaes. As perturbações motoras dependentes das hemorrhagias — 101 — corticaes consistem no maior numero de casos em paralysias queaffectam certos grupos musculares isoladamente. São para- lysias incompletas, ou antes, são enfraquecimentos musculares constituindo verdadeiras paresias ; porém paresias facilmente curaveis, e que dissipam-se com facilidade. Quando ao con- trario ellas têm de perpetuar-se, a progressão da lesão se faz lentamente, e só mais tarde é que ella tem attingido maior extensão. Emquanto que as paralysias periphericas são acom- panhadas de perturbações relativas á calorificação e de per- turbações trophicas de outra ordem, nas paralysias de origem cortical isto não se observa. Como elemento pre- cioso para o diagnostico differencial entre as paralysias peri- phericas ainda deve-se lançar mão da electricidade para se obter o typo de contracção muscular, estudado por Erb na Allemanha, e que elle chama— Entartungs-Reaction. Quando se excita pela electricidade faradica um músculo sede de paralysia de origem peripherica elle não reage, ao passo que pela electricidade galvanica a sua excitabilidade é exagerada. Nas paralysias de origem cortical tanto por uma como por outra electridade o músculo reage sempre. Até hoje os dados de que póde-se dispor para o diagnos- tico topographico das paralysias corticaes resume-se nisto: os centros motores corticaes para os membros do lado opposto acham-se situados no lobulo paracentral e nos dous terços superiores das circumvoluções ascendentes; os centros para os movimentos da parte inferior da face são collocados no terço inferior das circumvoluções ascendentes, na vizinhança da fenda de Sylvius ; o centro para os movimentos isolados do membro superior é provável que exista no terço médio da circumvolução frontal ascendente do lado opposto, — 102 — Depois, portanto, de se fazer o diagnostico da paralysia cortical, a analyse dos symptomas conduz ao diagnostico regional. Tem-se querido ultimamente determinar de um modo definitivo a existência de outros centros nas camadas corticaes, porém, não se tem motivos ainda de bastante força para se aceitar d'essa fôrma essas localisaçoes. Uma outra localisação que é hoje admittida geralmente é a da pa- lavra no terço posterior da terceira circumvolução frontal esquerda. As hemorrhagias corticaes, interessando tão so- mente esta circumvolução raras vezes apparecem; ordinaria- mente ellas estendem-se ás zonas circumvizinhas. Tem-se querido modificar a localisação da palavra, ampliando o ceutro até as circumvoluções da insula; porém, até hoje só existe uma observação em que as circumvoluções da insula foram interessadas exclusivamente; e mesmo esta observação tem sido objecto de interpretações em virtude das quaes em nada altera a localisação admittida primeiro por Dax (de Montepellier.) N'este capitulo ha opportunidade de tratar muito resumi- damente de um symptoma que é muito commum ás hemorrha- gias cerebraes; é o desvio conjugado da cabeça e dos olhos. Este symptoma já tinha vivamente impressionado Cruvei- lhier; o grande observador porem, não chegou a dar uma explicação d'elle. Depois succederam-se diversos trabalhos até que Prevost em 1868 formulou a seguinte lei: No desvio conjugado dos olhos e da cabeça o desvio se faz para o lado da lesão. Esta lei foi aceita até 1876, quando Landouzy apresentando factos que a contratadiziam, modificou-a do modo seguinte: A cabeça e os olhos voltam-se do lado dos membros paralysados, quando ha paralysia, e voltam-se do — 103 — lad o opposto aos membros convulsionados quando ha excitação do centro rotador. Grasset, observando factos de desvio conjugado para o lado dos membros convulsionados, contestou a lei de Landouzy, e alterou-a do modo seguinte: Nas lesões de um hemispherio quando ha desvio conjugado, o doente olha seus membros con- vulsionados, si houver excitação, e olha sua lesão si houver paralysia. Depois de ter analysado uma grande serie de observações com o fim de fixar a localisação do desvio con- jugado, elle formulou com reserva a seguinte proposição Quando o desvio conjugado puder ser attribuido á uma lesão cortical, a alteração é localisada ás mais das vezes nas circum- voluções que existem no fundo da fenda de Sylvius, e na dobra curva (gyrus angularis). Este desvio conjugado pôde ainda em certos casos correr por conta de uma lesão protube- rancial, e n'estes casos a lei para os hemispherios não é mais applicada senão depois de se inverter os seus termos; d'este modo ella fica formulada da maneira seguinte : O doente olha seus membros paralysados si ha paralysia, e olha sua lesão si ha excitação. — 104 — Observação do um oaso áo homorrbagia cerebral B. José da Cruz, portuguez, negociante, com 32 annos de idade, morador em Cascadura, entrou no dia 30 de Maio, de 1883, para a enfermaria de clinica de moléstias do sys- tema nervoso, no Hospital do Carmo, a cargo do distincto clinico o Sr. Dr. Monteiro de Azevedo. Antecedentes pessoaes. — Apenas se pôde saber que este individuo poucos mezes antes fora tratar-se, na enferma- ria em que se applica a homceopathia, de uma febre inter- mittente, e também que tivera uma infecção syphilitica cuja data não se pôde verificar. Um medico que d'elle tinha tratado em outro tempo assegurava que elle tinha uma lesão orgânica do coração, mas esta não poude ser encontrada por aquelles que quizeram verifical-a. Nada se poude saber em relação aos antecedentes paternos. Refere uma pessoa que acompanhava o doente que este, na noite de29 de Maio, quando conversava alegremente entre seus amigos, foi subitamente sorprehendido por um attaquei cahindo como fulminado, e apenas dando ligeiros signaes de vida; e porque o doente se demorasse a tornar a si, elles o trouxeram para o Hospital do Carmo de cuja Ordem era irmão. — 105 — Estado acttjal.— O doente em decubito dorsal os- tenta em seu maior gráo o estado apopletico ; completa- mente alheio a tudo quanto o rodeia, elle unicamente abre os olhos quando se faz-lhe uma injecção hypodermica de ether. A commissura labial direita é sensivelmente desviada para esse mesmo lado, e ambas são projectadas passivamente durante a expiração; o doente fume Ia pipe. Por uma observação mais prolongada verifica-se a exis- tência de uma hemiplegia esquerda. Poucos dias depois apre- senta uma eschara no sacro, apparece a respiração de Cheyne Stokes, a temperatura torna-se hyponormal, e ás 9 horas da noite de 19 de Junho o doente succumbe depois de 10 dias de moléstia. AUTÓPSIA O cadáver apresenta uma grande echymose que se es- tende do lado direito do pescoço á parte posterior do dorso, in- vadindo mais abaixo o lado direito do thorax e do abdômen, e se terminando ao nivel das arcadas cruraes. Aberta a cavidade craneana o cérebro foi retirado com toda a cautela. As meningeas são adherentes aos bordos su- periores dos dois hemispherios, porém, especialmente em certos pontos. Nos lobulos paracentraes e na parte superior das duas circumvoluções centraes esquerdas, a adherencia é tal, que não se pôde retirar as meningeas sem que estas venham acompanhadas da massa cortical degenerada. A face inferior ou concava da dura-mater apresenta placas de menin- gite chronica, mais confluentes ao nivel da inserção da foice do 14 1885—K — 106 — cérebro. Um corte feito com o fim de separar os dous hemis- pherios, dá logar á sahida de uma certa quantidade de sangue do interior dos ventriculos. Pratica-se sobre o hemispherio direito o corte de Fleshig modificado por Brissaud, e en- contra-se um grande foco hemorrhagico tendo por origem a lenticulo-optica, e destruindo grande parte do centro oval. Este foco é occupado por um coagulo um pouco maior do que uma noz, a ponto de fazer saliência no interior do ven- triculo lateral direito, cuja parede interna fora destruída. Pelo mesmo corte no hemispherio opposto nada se en- controu. Esta observação além de ser um caso typo de hemorrhagia cerebral, apresenta uma particularidade interessante relativa ás localisaçoes cerebraes. Este individuo antes da hemorrhagia cerebral teve uma meningite chronica, como provaram as lesões encontradas pela necropsia; esta meningite trouxe a destruição das partes mais importantes da zona psycho- motora, e durante a vida nem um symptoma ao menos traduzio esta alteração mórbida; de modo que a existência d'esta meningite seria com toda a razão ignorada, se não se procurasse pela autópsia o foco he- morrhagico ; e se ao contrario o doente apresentasse os sym- ptomas que a caracterisam, a hemorrhagia cerebral seria dif- ficilmente diagnosticada. E' um caso pois que vem augmentar as excepções feitas á localisação da zona psycho-motora, admit- tida hoje por todos, sem todavia eu pretender com elle in- fringir as deducções dos pathologistas sobre a questão de topographia d'essa zona. CADEIRA DE PHYSICA MEDICA PONTO 4o Contribuição daphysicapara o estudo da luz electrica debaixo do ponto de vista hygienico i A luz electrica debaixo do ponto de vista hygienico deve substituir qualquer outro systema de illuminação. II A physica tem realisado verdadeiros progressos nos ap- parelhos de luz electrica. III O systema Edison deve ser preferido a qualquer outro para a illuminação á luz electrica. — 108 — CADEIRA DE CHIMICA MEDICA E MINERALOGIA PONTO 2o Propriedades chimicas do ozona, seu papel nas epidemias i O ozona goza de propriedades oxydantes enérgicas. II Ainda não está demonstrado que a intensidade de uma epidemia é em razão inversa da cifra ozonometrica. III No caso de ser possível nunca se deveria aproveitar das propriedades do ozona com o fim de sustar o desenvolvimento de uma epidemia. CADEIRA DE CHIMICA ORGÂNICA E BIOLÓGICA PONTO 9o Importância dos desdobramentos nos phenomenos chimicos da vida i A maior parte dos phenomenos chimico-biologicos correm por conta de desdobramentos. II As cellulas representam um papel importantissimo nos desdobramentos intra-organicos. III Os desdobramentos chimico-biologicamente considerados são verdadeiras fermentações que têm por fermento cada cel- lulado organismo. - 109 - CADEIRA DE BOTÂNICA MEDICA E ZOOLOGIA PONTO 8o Dos parasitas, animaes que vivem no exterior do corpo humano i Nem todos os parasitas que vivem no exterior do corpo do homem produzem moléstia. II Outros produzem verdadeiras moléstias conhecidas al- gumas sob o nome de pediculoses. III Os parasitas animaes pullulam ou não sobre o tegumento externo, conforme o estado de receptividade orgânica. CADEIRA DE PHARMACIA E ARTE DE FORMULAR PONTO 10° Do opio I O opio é o sueco concreto das cápsulas de diversas es- pécies do gênero papaver. II Contém muitos princípios activos; porém, a morphina existe em maior quantidade. III O opio é considerado tanto melhor em qualidade quanto maior é a quantidade de morphina que elle encerra. — 110 — CADEIRA DE ANATOMIA DESCRIPTIVA PONTO 4o Orgao central da circulação i O coração é o órgão central da circulação. II Pôde ser considerado como um músculo ôco dividido em quatro cavidades. III Duas superiores são as auriculas ; duas inferiores são os ventriculos. CADEIRA DE HISTOLOGIA PONTO 5o Influencias cósmicas sobre a producção do pigmento cutâneo e em relação á unicidade da espécie humana i O meio cósmico exerce uma poderosa influencia sobre a producção do pigmento. II Experiências modernas fazem crer que o systema ner voso representa na producção do pigmento ura papel im- portantíssimo . III E' de crer-se que sob influencias diversas a espécie humana possa apresentar-se com o pigmento cutâneo colorído differentemente. — 111 — CADEIRA DE PHYSIOLOGIA PONTO 3o Dos auxilios prestados pela chimica biológica aos estudos de physiologia i Sem a chimica biológica a physiologia ainda estaria muito atrazada. II Como meio de verificação a chimica biológica é o criterium mais seguro de que pôde lançar mão o physio- logista. III A interpretação chimico-biologica exacta das reacções intra-organicas é uma condição para que a physiologia attinja o mais elevado gráo de aperfeiçoamento. CADEIRA DE PATHOLOGIA GERAL PONTO 5o Paralysias i As paralysias quer da sensibilidade, quer da motilidade traduzem geralmente uma lesão material do systema nervoso. II Ha paralysias .da motricidade que não se podem re- ferir á desordem nervosa, quer funccional, quer anatômica. III As paralysias da sensibilidade apparecem muitas vezes sem uma lesão que a autópsia possa revelar. — 112 - CADEIRA DE ANATOMIA E PHYSIOLOGIA PATHOLOGICAS PONTO 5o Da filaria sanguinis hominis e das perturbações por ella determinadas no organismo i A filaria sanguinis hominis pertence á familia dos Stron- gylides e á ordem dos Nematoides. II Ella pôde dar logar a derrames hemato-lymphaticos em diversos pontos do organismo. III A chyluria é uma moléstia, que tem por causa a filaria sanguinis hominis. CADEIRA DE PATHOLOGIA MEDICA PONTO 5o Febre amarella i A febre amarella é uma moléstia infecto-contagiosa. II Parece provável pelo menos que ella é devida ao crypto- coccus xanthogenicos do Dr. Freire. III Ninguém ainda fez experiências no sentido de provar que o micróbio isolado pelo Dr. Freire não é o elemento pathoge- nico imprescindivel da febre amarella. — 113 — CADEIRA DE THERAPEUTICA ESPECIALMENTE BRASI- LEIRA E MATÉRIA MEDICA PONTO 10° Medicação anesthesica i Entre a grande lista dos anesthesicos occupam os logares de honra, o chloroformio, o chlorureto de metyla, o ether, o opio e seus preparados. II Os anesthesicos podem ter outras indicações que não seja a dôr. III Elles podem ser applicados convenientemente associados quando ha indicações para a anesthesia mixta. CADEIRA DE PATHOLOGIA CIRÚRGICA PONTO 3o Carcinoma i O carcinoma sempre é a expressão de um vicio diathesico II O microscópio pouco adianta no diagnostico do carci- noma. III A therapeutica de nenhum recurso dispõe para cural-o. 1885—K — 114 — CADEIRA DE MEDICINA OPERATORIA EXPERIMENTAL E ANATOMIA TOPOGRAPHICA. PONTO 5o Estudo critico das operações reclamadas pelos tumores do corpo thyroide i Os tumores do corpo thyroide reclamara quasi sempre a thyroidotomia total ou parcial. II Os outros processos operatorios susceptíveis de se appli- carem ao corpo thyroide, raras vezes são indicados. III A thyroidotomia é uma operação que o maior numero das vezes dá resultados esplendidos, e offerece muito menos inconvenientes do que qualquer outro processo. CADEIRA DE OBSTETRÍCIA PONTO 4o Albuminuria i Não existindo nephrite concomitante a albuminuria das mulheres prenhes é sempre devida á dyscrasia gravidica. II Diversas theorias têm apparecido para explical-a e de todas a mais aceitável é a de Semola. III Quasi sempre a albumiuuria é seguida dos ataques de eclampsia puerperal. — 115 — CADEIRA DE HYGIENE E HISTORIA DA MEDICINA PONTO 3o Abastecimento d'agua á cidade do Rio de Janeiro i Nem todas as fontes que servem para o abastecimento d'agua actualmente no Rio de Janeiro, offerecera condições de potabilidade. II O systema de encanamento por meio de tubos de chumbo parece concorrer para o apparecimento de certas moléstias. III Seria conveniente, se fosse possível, a substituição dos tubos de chumbo, e das caixas d'agua feitas d'este metal, por tubos e caixas de uma outra substancia inoffensiva á saúde publica. CADEIRA DE MEDICINA LEGAL E TOXICOLOGIA PONTO 7o Experimentação physiologica applicada á toxicologia i A experimentação physiologica presta serviços á toxi- cologia. II Ella não pôde ser um criterium absoluto para uma con- clusão sobre os resultados de uma pesquiza toxicologica. III É um bom meio de verificação depois que pela chimica se tem chegado a crer na possibilidade de se ter isolado uma substancia qualquer cujos caracteres chimicos não sejam por si só imponentes para fazer nascer a convicção. — 116 - PRIMEIRA CADEIRA DE CLINICA MEDICA PONTO Io Do parasitismo em relação ao diagnostico e tratamento da tisica pulmonar i A tisica pulmonar pôde ser de origem bacillar, e pôde ser a expressão de um vicio geral da nutrição. II Na tisica bacillar o microscópio, revelando a existência do micróbio, o diagnostico impõe-se. III Até hoje não ha medicação racional, para o tratamento da tisica bacillar. PRIMEIRA CADEIRA DE CLINICA CIRÚRGICA PONTO Io Das indicações e contra-indicações operatorias dos individuos affectados de moléstias constitucionaes i As moléstias constitucionaes adiantadas são, de um modo geral, uma contra-indicação operatoria. II E' sempre conveniente medicar-se com o fim de corrigir-se a perturbação mórbida constitucional, para depois fazer-se a operação. III Em certas condições as operações são indicadas com o fim de corrigir -se o vicio geral da nutrição. Hippocratis Aphorismi i Qui sponte sanguinem cum urina effundunt, iis vehemens in renibus venulam ruptam esse significat. (Sect. IV, Aph. 78). II Omnia secundum rationem facienti, si non succedant secundum rationem, non est transeundura et aliud, manente eo, quod a principiis visum est. (Sect. II, Aph. 52). III Ubi somnum delirium sedat, bonum. (Sect II, Aph. 2). IV Sanguine multo efíuso, aut singultus superveniens, malum. (Sect. V, Aph. 3). v Cibus, potus, venus, omnia moderata sint. (Sect. IV, Aph. 2i VI Quibus per febres ad dentes glutinosus, humor obnas- citur iis vehementiores fiunt febres. (Sect. IV, Aph. 53). Esta these está conforme os estatutos. Rio de Janeiro 28 de Setembro de 1885. %. $P. &. de çãayal/iãe*. i. (weinaldo odweb ofeietla.