ur. •^ÍT* HE DO enrique imune. ^ ?<&> '# •A0. ^-■ •^^ S^AÍS Jlv:- THESE DISSERTAÇÃO SECÇÃO MEDICA—Diagnostico iifferencial entre as moléstias to estomaio. Secção Accessoria.—Da asphyxia por submersão. Secção Cirúrgica. — Anatomia e piiysiologia da placeuta. Secção Medica.—Das condições pathogenicas, causas, diagnostico e tratamento do beriueri. APRESENTADA Á FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO EM 28 DE AGOSTO DE 1875 E SUSTENTADA PERANTE ELLA NA PRESENÇA DE SIà MÃKSTàil § ilIMM no dia 13 de Dezembro de ÍST^ E PELA MESMA APPROVADA (COM DISTINÇÃO ) POR / ^oão Sbenrique ^raune^^ Doutor em Medicina pela mesma Faculdade, Bacharel em lettras pelo Imperial Collegio de Pedro II, Sócio effectivo do Instituto dos Bacharéis em Lettras, membro" e professor de allemão da Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional, explicador de grego do Externato do Imperial Collegio de Pedro II, ex-interno do Hospital de Marinha da Corte, etc, etc. NATURAL DO RIO DE JANEIRO (NOVA FRIBURGO). FILHO LEGITIMO DO Dr. João Henrique Braune e de 1). Maria Dulce Braune. RIO DE JANEIRO Typogràphia Universal de E. & H. Laemmert 71, Rua dos Inválidos, 71 1875 FACULDADE DE ID11A DO RIO DE DIItECTOR Conselheiro Dr. Visconde de Santa Izabel. VICE-DIRECTOR Conselheiro Dr. Barão de Theresopolis. SECRETARIO Dr. Carlos Ferreira de Souza Fernandes. lentes catdedraticos Doutorest PRIMEIRO AN\0 F. J. do Canto e Mello Castro Mascarenhas.(la cadeira). Physica em geral, e particularmente^em sua» appli- cações á Medicina Manoel Maria de Moraes e Valle (Examina- dor e presidente).......(2a » ). Chimica e Mineralogia. Conselheiro José Ribeiro de Souza Fontes.(3a » ). Anatomia descriptiva. SEGUNDO AMO Joaquim Monteiro Caminhoá . . . .(Ia cadeira). Botânica e Zoologia. Domingos José Freire Júnior . . . .(2a » ). Chimica orgânica. Francisco Pinheiro Guimarães . . . .(3a » ). Physiologia. Conselheiro José Ribeiro de Souza Fontes. (4a » ). Anatomia descriptiva. TERCEIRO ANNO Francisco Pinheiro Guimarães . . . .(Ia cadeira). Physiologia. Conselheiro Antônio Teixeira da Rocha .{2* » ). Anatomia geral e pathologica. Francisco de Menezes Dias da Cruz . .(3a » ). Pathologia geral. Vicente Cândido Figueira de Saboia . 4(4a » ). Clinica externa. QUARTO ANNO Antônio Ferreira França......(Ia cadeira). Pathologia externa. João Damasceno Peçanha da Silva (Exami- nador)..........(2a » . )• Pathologia interna. Luiz da Cunha Feijó Júnior.....(3a » )• Partos, moléstias de mulheres pejadas e paridas e de recém-nascidos. Vicente Cândido Figueira de Saboia, . . (4a » ). Clinica externa (3o e 4o anno). QUINTO ANVO Joã i Damasceno Peçanha da Silva . . .(1* cadeira). Pathologia interna. Francisco Praxedes de Andrade Pertence (Examinador).........(2a » ). Anatomia topographica, medicina operatori1. apparelhos. Albino Rodrigues de Alvarenga . . (3a » ). Matéria medica e therapeutica. João Vicente Torres-Homem.....(4a » ). Clinica interna (5° e 6» artno). SEXTO ANNO Antônio Corrêa de Souza Costa . . . .(Ia cadeira). Hygiene e historia da Medicina. Barão de Theresopolis.......(2a » ). Medicina legal. Ezequiel Corrêa dos Santos '. . .(3a » ). Pharmacia. João Vicente Torres-Homem. . . . -(4a » ). Clinica interna. LENTES SUBSTITUTOS Agostinho José de Souza Lima.......I Benjamin Franklin Ramiz Galvão......f João Joaquim Pizarro.........> Secção de Sciencias Accessorias. João Martins Teixeira.........I Augusto Ferreira dos Santos.......] Luiz Pientzenauer....... . \ Cláudio Velho da Motta Maia......./ José Pereira Guimarães.........\Secção r'e Sciencias Cirúrgicas. Pedro Affonso de Carvalho Franco......I Antônio Caetano de Almeida (Examinador) , . . 1 José Joaquim da Silva.........] João José da Silva........../ João Baptista Kossuth Vinelli (Examinador). . . \ Secção de Sciencias Médicas. N. B. A Faculdade não approva nem reprova as opiniões emittidas nasTheses que lhe tão apresentadas. 94 8018 A VENERANDA MEMÓRIA li DE MEU IF.A.I A SAUDOSA MEMÓRIA DE MEU AMftiO JOSÉ GONÇALVES FERREIRA 63 17 A M23THA Mil A MEUS IRMÃOS A MINHASIEMÃES AOS PARENTES QUE ME ESTIMÃO A MEUS AMIGOS E COM ESPECIALIDADE AO ILLM. SR. JOAdUIM JOSÉ GONÇALVES FERREIRA E A SUA EXMa. SENHORA ^j^C£>^ s^ns-omam çaro^r^iaca^a Á MOCIDADE ESTUDIOSA PREFACIO 25er £efer, bem maxi fdjretot, ÊefHmmt beê STutorê Çjfid&t (Ãaffner). Diagnostico differencial entre as moléstias do estômago.— Eis o ponto que escolhemos para nossa dissertação ; conheciamos as difficuldades que o assumpto nos offerecia e não ignorávamos sua importância ; foi esta o movei que nos levou á escolha. Encetaremos o nosso pequeno trabalho mencionando os principaes autores estrangeiros e nacionaes que têm escripto sobre este assumpto, muitos dos quaes nos prestarão um valioso auxilio; depois da bi~ bliographia procuraremos tornar conhecidas, por traços rápidos, as principaes moléstias do estômago, em seguida apresentaremos os principaes symptomas em que se basêa o diagnostico differencial destas moléstias e os meios que se deve empregar para differençar aquellas que, por mais de uma vez, têm sido confundidas por médicos, aliás de grande reputação, e terminaremos hí /.'jaaTosiítáv 6a).aooõ>v ó tt/.oj;, oútwç tivmv tt; fsiÇTpò; vJawv Vi íisr;vcv asv OTCiy.síuv «púoiv, Taórti upò; tt.v ttç <ís vcacu ó iayoò; tpúaiv naXaist. (O Autor.) DISSERTAÇÃO Cancro do estômago. Pathogenia e Etiologia.—A diathese cancerosa tem uma certa predilecção para localisar-se no estômago, e tanto é assim, que, segundo a opinião do illustrado professor da universidade de Tubingue, o estômago é, de todos os órgãos internos, aquelle que mais vezes é invadido pelo cancro; outros autores, comquanto não colloquem o cancro do estômago em primeiro lugar na ordem de freqüência, todavia o considerão com pouco menos commum somente do que os cancros do utero e da mamma. Em 9,118 cancros, sendo 3,425 visceraes, 2,203 pertencião ao estômago (Tanchon Journal de Malgaigne) d'onde se vê que os cancros do estômago formão uma quarta parte do numero total dos cancros e dous terços dos visceraes. 566 - 8 — O cancro do estômago desenvolve-se primitiva ou secundariamente, neste caso apparece de ordinário ou por propagação de um outro que existia em um órgão vizinho ou consecutivamente á invasão cancerosa de algum órgão mais ou menos remoto. Innumeras são as causas a que os autores attribuem a existência do cancro do estômago. As paixões deprimentes, o abuso dos prazeres venereos, o celibato, a suppressão de um fluxo natural — menstruos—, accidental —hemor- rhoides — ou artificial — exutorios —, o abuso dos alcoólicos princi- palmente tomados em jejum, a má alimentação, os trabalhos intellec- tuaes excessivos, a solidão, a vida sedentária, o temperamento lym- phatico, certas profissões como a de sapateiro, alfaiate, etc., que obrigão os indivíduos que as exercem a terem constantemente o tronco inclinado para diante, as nevroses, as phlegmasias agudas e chronicas do estômago têm sido considerados como causas occasio- naes que contribuem para localisar a diathese cancerosa. Sexo. — Pouca influencia tem o sexo na producçâo do cancro do estômago, porquanto, segundo alguns autores, esta affecção mórbida manifesta-se indifferentemente em ambos os sexos, segundo outros, o masculino é de preferencia atacado; Brinton, em 784 casos de cancro do estômago, encontrou 440 no sexo masculino e 344 no feminino. Idade. — E raro apparecer antes dos 40 annos; a sua freqüência vai augmentando á proporção que o individuo vai se afastando desta idade até os 65, d'ahi em diante a freqüência do cancro se dá na razão inversa da idade. Herança. — Grande numero de familias servem para attestar a transmissão hereditária do cancro do estômago e muitos autores estão de accôrdo neste ponto. Lebert, porém, diz que a hereditariedade do cancro do estômago é antes uma excepção do que regra geral, e que sendo esta moléstia muito - 9 - freqüente, é muito possível que, por mera coincidência, se manifeste e m dous ou mais membros de uma mesma familia. Chardel, em sua monographia das degenerescencias scirrhosas e dos cancros do cardia, do corpo do estômago e do pyloro, considerou como causas occasionaes do cancro do estômago os irritantes animaes, mechanicos ou chimicos, como causa predisponente um estado particular do systema lymphatico. Anatomia pathologica.— Varias são as espécies de carcinoma observadas no estômago, assim como diversos os pontos deste órgão em que a lesão se assesta. As mais freqüentes são: o scirrho, o encephaloide, o alveolar ou colloide, omelanico, o villoso e o cancroide de cellulas cylindricas (cancroide epithelial de FõrsterJ são raros. Estas differentes espécies não se apresentão sempre isoladamente, ás vezes achão-se combinadas entre si, sendo o scirrho a que mais vezes se encontra de concomitância com o encephaloide. O carcinoma do estômago se assesta de preferencia na região pylorica onde a túnica musculosa é mais desenvolvida ( segundo Sappey é de 2 a 3 millímetros de espessu ra) e tem maior actividade ; menos vezes no cardia e na pequena curvatura e muito raramente na grossa extremidade e na grande curvatura, onde se notão condições contrarias ás que mencionámos. A membrana serosa do estômago não soffre alteração primitiva nas degenerescencias cancerosas, ora apresenta-se levantada pelas massas carcinomatosas, ora hypertrop hiada, porém em pequeno gráo, ora com vestígios de inflammação, mostrando-se, porém, freqüentes vezes mais friavel e endurecida. A túnica muscular apresenta-S2 avermelhada e hypertrophiacla; Mr. Louis em sua memória intitulada — Observations rélatives au câncer du pylore et à Vhypertrophie de Ia membrane musculaire dans toute son étendue — observou a membrana muscular com uma espessura dupla da normal. Pinei, em sua Nosographia, refere um caso de hypertrophia em que a túnica muscular apresentava, 4 a 2 — lO- na região pylorica, mais de uni centímetro de espessura. Prus observou um caso em que a espessura desta cam ada era de dous a três centímetros.. Quando o cancro do esto-.vago é limitado a uma das túnicas, é a muscular de ordinário a atacada sendo mui raramente a mucosa. Prus em sua obra — Recherches n ouvelles sur Ia nature et le traitement du câncer de 1'estomac—refere nos que vira muitas vezes alterações isoladas da membrana muscular ; devemos notar, todavia, que a túnica mucosa por sua textura, pelo contacto com os alimentos e pelo papel que representa na chymificação é de todas a mais exposta ás lesões mórbida . Vejamos as modificações que o cancro nella imprime, considerando successivamente o corpo mucoso propriamente dito, os folliculos muciparos, as papillas e as villosidades. O corpo mucoso apresenta-se avermelhado, violaceo, negro, edemaciado, emphysematoso, fungoso, hypertrophiado, ordinariamente endurecido, ás vezes ulcerado, quer em conseqüência de um trabalho inflammatorio, quer de um amollecimento limitado, outras vezes encontramos uma cicatriz indicativa da existência anterior da ulcera. Os folliculos muciparos, augmentados de volume, ordinariamente apresentão o ápice deprimido e com uma cor escura, e algumas vezes um circulo rubro na base ; estes folliculos mostrão-se muitas vezes ulcerados. As papillas augmentão de volume, tornao-se injectadas e de cor muito variável. As villosidades ou apresentão-se injectadas, ou destruídas em diversos pontos do órgão. O tecido cellular sub-mucoso e sub-seroso podem ser ntacados primitivamente pela degenerescencia cancerosa (*). (•) Roux. Mémoire renfenmnt quelques vnes générales sur le cnnccr. — 14 — Bayle e Cayol são de opinião contraria, nós, porém, levados pela lei da analogia, vendo a degenerescencia cancerosa atacar primiti- vamente o tecido cellular sub-mucoso e sub-scroso das fossas nasaes, do utero, da bexiga, etc. não podemos deixar de admittir que se dê o mesmo para o lado do estômago. Apresentam modificações já quanto á cor, já quanto á espessura e consistt ncia. A cor em lugar de ser branca amarellada é acinzentada, ou enegrecida; a espessura é ás vezes augmentada, outras vezes diminuída era conseqüência do grande desenvolvimento da camada muscular que pôde chegar a ponto de fazer desapparecer completamente as camadas cellulares. O cancro produz noestomago modificações quanto á capacidade, forma e direcção segundo o ponto em que se assesta; quando occupa o cardia ou o corpo do estômago ha diminuição de capacidade, porque, no primeiro caso não chegão os alimentos ao estômago sinão em pequena quantidade e no segundo as paredes não se prestão á dilatação; quando o cancro se assesta no pyloro, este orifício se estreita, os alimentos se accumulão por muitos dias no estômago antes de serem expellidos, determinando assim o desen- volvimento desta víscera que algumas vezes occupa toda a cavidade abdominal. Alterações de outros órgãos.—Tem-se encontrado hypertrophia de diversos cordões do pneumogastrico e inflammações de ramifi- cações venosas; os gânglios lymphaticos apresentam-se geralmente em perfeito estado; nas veias abdominaes e em diversos órgãos vizinhos, principalmente no fígado, encontra-se algumas vezes a substancia cancerosa. Quando a moléstia se acha em período adiantado encontra-se algumas vezes o cancro ulcerado, apresentando-se a ulcera cance- rosa mais ou menos larga com os bordos fungosos, revirados e endurecidos e o fundo duro, fungoso e desigual; esta ulcera destróe ás vezes toda a parede do estômago e outras em conseqüência de - 12 - adherencias havidas anteriormente com as partes vizinhas, de ordi- nário, fígado, pancreas, baço, epiploon, colon transverso, parede abdominal, diaphragma, corpo das vertebras, nellas se estabelece o fundo da ulcera substituindo deste modo a parede do estômago que havia sido destruída. Symptomatologia.—Para devidamente apreciarmos os sympto- mas que apresenta o cancro do estômago, dividiremos esta terrivel moléstia em dous períodos, como procedeu o illustrado Dr. Jaccoud, a saber: 1,° periodo-inicial ou dyspeptico—, 2o periodo—de tumor e de cachexia—. 1.° PERiODO-Inicial. — Os symptomas deste periodo são : per- turbações digestvas, dor e vomito. São muito pouco importan- tes para a especificação do cancro do estômago, porquanto per- tencem a quasi todas as moléstias deste órgão, e pôde existir o cancro do estômago, faltando todos esses symptomas, assim como existirem todos elles sem o cancro ; de sorte que o medico, em taes casos, tem necessidade de recorrer a outras fontes, princi- palmente á etiologia, não para determinar com certeza a existência do cancro, mas para suspeitai-a e de esperar phenomenos posteriores que darão o cunho de certeza ao que não passava de mera suspeita. Perturbações digestivas. — A perda do appetite é um dos symptomas que ordinariamente se mostra em primeiro lugar, raramente se manifesta depois de outros symptomas, é ás vezes tão considerável que chega á anorexia, outras tão insignificante que passa desapercebida até que symptomas posteriores venhão despertar a attenção do medico ou do doente. As digestões tornão-se difficeis, penosas e acompanhadas de pyrosis ; em conseqüência destas perturbações o indivíduo affectado de cancro do estômago, no fim de pouco tempo, se acha debilitado e con- sideravelmente emmagrecido. A sede é pouco considerável, ha ás vezes adipsia; a lingua, - i:i - humida e limpa, apresenta-se, ordinariamente para o termo fatal da moléstia, coberta de uma espessa camada de sabnrra e com os bordos avermelhados; a constipação de ventre é um pheno- meno freqüente no primeiro periodo da moléstia, quando, porém, esta se acha em gráo considerável de adiantamento, a constipaçao é substituída por diarrhéa provocada pelos detritos cancerosos der- ramados no estômago depois da ulceração do cancro, pelo pus e sangue que para isso concorrem irritando os intestinos. Dor. — A dor, comquanto seja um svmptoma mais freqüente do que a anorexia, todavia falta algumas vezes, como acontece nos cancros indolentes, que não são raros; é gravativa, urente, terebrante ou lancinante, variando de caracter nos diversos indiví- duos e muitas vezes no mesmo ; a dor lacinante é rara comquanto por muito tempo se julgasse que esse caracter era necessário a toda a moléstia cancerosa. No epigastro e nos hypocondrios é onde ella se assesta o maior numero de vezes, apparecendo também, comquanto rara- mente, ao nível das ultimas vertebras dorsaes e irradiando-se na direcçâo dos nervos interco?taes. É continua, nunca apresenta intermittencia, augmenta pela pressão e pela ingestão dos alimen- tos, nunca attingindo, porém, a intensidade das dores horríveis dos accessos gastralgicos ; tem-se visto, algumas vezes, essas dores irem diminuindo pouco a pouco, chegando em casos rarissimos a desapparecer completamente. Vômitos . — Segundo Brinton a sede do cancro concorre pode- rosamente para a producção deste phenomeno ; tendo analysado 167 casos, observou que o vomito ia augmentando de freqüên- cia, conforme as partes do estômago invadidas pela lesão erão: a parede posterior, a parte média, a pequena curvatura, a grande, o cardia, o pyloro. Comquanto muitos autores não estejão concordes em que o vomito augmeute progressivamente pelo modo indicado por Brinton, todavia todos convém em que os vômitos são mais 14 — freqüentes quando o cancro se assesta no cardia e no pyloro, do que em qualquer outra parte do estômago. Quando o cancro se assesta no pyloro produzindo o estreita- mento d'este orifício, o vomito tem lugar algumas horas depois de cada refeição; nos estreitamentos do cardia, logo depois e algumas vezes por occasião d'ella. Depois de serem os vômitos regulares durante um certo periodo de tempo, vemol-os diminuir e afinal cessar, coincidindo essa desapparição com uma hematemese, o que encontra explicação na fusão do tecido canceroso ou na grande dilatação das paredes gástricas, que, impossibilitando a sua contracção, determina neste caso uma espécie de regorgitação. No principio da affecção cancerosa os vômitos não são muito freqüentes ; são constituídos por pequena quantidade de liquido viscoso e apparecem principalmente de manhã antes do indiví- duo ter tomado qualquer refeição ; este phenomeno, tendo lugar em uma pessoa que não se entrega aos abusos alcoólicos, deve gerar no espirito do medico grandes suspeitas da existência de um cancro do estômago. Mais tarde, com o progresso da moléstia, os vômitos vão-se tornando cada vez mais freqüentes; depois das refeições os doentes vomitão, ou somente substancias ingeridas, ou de envolta com mucosidades, com líquidos ácidos de cor amarellada ou esverdeada, mais ou menos alteradas pelo trabalho digestivo, conforme a sede do cancro é o pyloro ou o cardia. É nos últimos períodos da moléstia que apresenta-se o vomito negro, côr de borra de café ou chocolate, produzido pelas hemor- rhagias capillares, de mistura com as substancias alimentares mais ou menos digeridas que se achavão no estômago ; raras vezes encon- tra-se misturado com a matéria vomitada, tecido heteromorpho, porquanto os elementos do cancro perdem sua fôrma caracte- rística em virtude de sua decomposição. - 1f» - O sangue derramado no estômago por essas hemorrhagias capillares passa ás vezes para os intestinos e é expellído por occasião da defecaçào (melena), passando muitas vezes desaper- cebido ao doente e ao medico, si não forem dotados de espirito investigador, que os leve a examinar as fezes. Em lugar da ruptura de vasos capillares, pôde dar-se a de um vaso importante ; nesse caso é considerável a quantidade de sangue derramado na cavidade gástrica, e conforme o tempo de demora nella, é o sangue expel- lído, rutilante, vivo, ou escuro, semelhante á borra de café. 2.° Período. De tumor e de. cachexia.— É nesse periodo que sobrevêm o tumor e a cachexia denominada cancerosa. Segundo Brinton, o tumor é encontrado 80 vezes em 100 easos, donde se pôde concluir que é um symptoma assaz freqüente, mormente si attendermos a que em alguns casos a sua existência não nos é revelada pelos meios de que dispomos e ein outros, encontrado o tumor, este se acha de tal sorte deslocado que o attribuimos a outro órgão que não o estômago. Os tumores assestados no cardia, na face posterior do estômago, embora volumosos, passão desapercebidos ao medico, os que têm por sede a pequena curvatura só são notados quando se esten- dem até á grande curvatura e apresentão-se na parte superior da região epigastrica, os situados na região pylorica são os que mais facilmente são observados e sendo estes os mais freqüentes, eis a razão por que grande numero de vezes se encontra tumor no cancro do estômago; este tumor se acha de ordinário na linha mediana, mais vezes no hypocondrio direito do que no esquerdo, já pela posição do pyloro, já pelas adherencias que o estômago contrahe com o fígado. O pyloro pôde deslocar-se e então o tumor é encontrado na região umbilical, algumas vezes na pelvíana, podendo simular um tumor do ovario ; mesmo não havendo des- locação do pyloro, pôde a posição do estômago ser modificada por uma ectasia geral, perdendo assim as suas relações normaes. - 10 - Fazendo-se passar uma linha longitudinal por meio do corpo de um indivíduo, c »mo procedeu Luschka, esta dividirá o estômago em duas partes desiguaes, sendo a esquerda cinco vezes maior do que a direita. O tumor assestado no pyloro tem, no homem, dous terços acima de uma linha hori- zontal que separe a região epigasíríca da umbilical, e um terço abaixo desta mesma linha, exactamente o contrario se dá na mulher ; a menor largura natural do epigastro e o uso do collete explicão este phenomeno. O tumor tem uma fôrma arredondada, o tamanho de um ovo ou de uma grande maçan pouco mais ou menos, ora é liso ora desigual, cheio de escabrosidades, ora bem circumscripto, ora não,, de consistência muito variável, tendo ora uma posição fixa, invariável, ora deslocando-se ou pela mão do observador ou em virtude das modifi- caçõesque soffre o estômago como estado de plenitude e de vacuidade; em conseqüência disto é o tumor em certas oceasiões percebido e em outras o medico inexperiente pasma-se por não encontrar o tu- mor que, poucas horas antes, a apalpação lhe tinha revelado evidentemente. Algumas vezes, principalmente no cancro colloide e no scirrho, encontra-se no estômago antes um abobadamento quasi geral de suas paredes do que um tumor circumscripto, um empastamento uniformemente resistente, dandp pela percussão um som de ordinário tympanico; no encephaloide essa infiltração geral (Jaccoud) é* raiissima. O tumor canceroso é ou indolente ou pouco sensível á pressão, si porém o peritoneo for primitiva ou secundariamente atacado pelo cancro, si sobrevier uma peritonite são insupportaveis as dores produzidas pela pressão. Cachexia. — Quanto mais importante é o órgão, maiores são as desordens observadas por occisião de seu máo funcionalismo, donde se segue que, as funeções do estômago não se executando sinão de um modo imperfeito, quando existe esta terrível affecção, - 17 — grandes são os males que dahi provêm ; a economia toda resen- te-se, o emmagrecimento caminha a passos tanto mais agigantados quanto mais imperfeito é o trabalho da digestão e maior a influencia que sobre o organismo exerce a diathese cancerosa, a face se enruga, o pulso torna-se pequeno, os malleolos apresentão-se edemaciados e o individuo toma uma cor especial, terrosa, amarel- lada, semelhante á da palha e que não se confunde com a impressa por qualquer outra moléstia. A cachexia cancerosa, que não é mais do que uma reunião de symptomas, é de grande importância para o diagnostico, pois é encon- trada em 100 casos 75 vezes bem pronunciada. Ha febre todas as vezes que sobrevém uma complicação inflam- matoria ; caso essa não se dê, ainda algumas vezes apparcce a febre hectica, que, consumindo de dia em dia o individuo, aponta-lhe a porta do túmulo. A ourina, em geral de côr anormal e em pequena quantidade, é sedimentosa e sobrecarregada de uréa e de uratos. Marcha, duração e terminação.—A affecção cancerosa segue uma marcha continua, o individuo vai cada vez mais se approximando do termo fatal; si ás vezes, algumas melhoras vem alimentar espe- ranças de salvação, essas são passageiras, o infeliz volta em breve a seu antigo estado e vê diariamente os symptomas se aggravarem; dura, termo médio, 15 mezes, o máximo 3 annos, segundo Brinton; em alguns a moléstia é tão rápida que a morte sobrevém depois de seis semanas e até de trinta dias. Dumas- refere um caso desta ordem em sua obra — Doctrine des maladies chroniques. A observação tem mostrado que o encephaloide é dos neoplasmas aquelle que, em mais curto periodo de tempo, põe termo aos dias de sua victima. Termina sempre pela morte, que é o mais das vezes produzida por inanição. 1 A 3 — 18 — Ulcera simples. Synonymia. — Ulcera chronica simples (Cruveilhier); perfurante (Rokitansky) ; gastrite chronica ulcerosa (Grisolle); ulcus rotundum (Iaksch); ulcera espontânea, corrosiva, menstrual (Brinton, Churchill, Catheart-Lees). Por muito tempo a ulcera do estômago foi confundida como um dos symptomas do cancro deste órgão; Cruveilhier foi quem pôz uma barreira ao erro em que cahião hábeis práticos e deu á ulcera do estômago um lugar no quadro nosographico. Etiologia e pathogenia. — A ulcera do estômago é uma lesão freqüente, porém em certos lugares ataca a maior numero de indivíduos do que em outros; por isso é que Brinton encontrou em 7,226 autópsias 360 ulceras, isto é, 5 °/0; Benett 3 %; os médicos allemães e dinamarquezes 13 °/0 e Grisolle considerou esta affecção como muito rara em França. E mais freqüente no sexo feminino do que no masculino; Brinton em 640 casos encontrou 440 em mulheres e 214 em homens. Esta lesão, rara na infância, é tanto mais freqüente quanto mais avançada é a idade. As privações, a miséria, os incommodos moraes, a intemperança, a ingestão de substancias muito quentes ou muito frias estando o corpo banhado de suor, o abalo que soffre o organismo com a chegada da puberdade, o estado puerperal, a lactação, predispõem o estômago a contrahir a affeção ulcerosa. A syphilis, as febres inter mittentes e continuas, a pneumonia, a pleurisia e sobretudo a tuberculose pulmonar, tendo muitas vezes existido conjunctamente com a ulcera gástrica, têm sido consideradas como causas determinantes dessa affecção; é claro que estas lesões, debilitando o individuo, o collocão em condições favoráveis para o — 19 — apparecimento da ulcera; não cremos, porém, que as moléstias acima referidas exerção, como pensão algurís autores, uma influencia espe- cial no apparecimento da ulcera gástrica; demais, si attendermos á grande freqüência dellas não devemos nos admirar que a ulcera gástrica se manifeste em um pneumonico, em um tuberculoso, etc, sem que haja entre essas lesões a relação de causa e effeito. O abuso de bebidas alcoólicas favorece, segundo Gerardt, não só o apparecimento da ulcera, mas também o seu progresso, provocando a fermentação ácida dos líquidos do estômago, que ficão em deshar- monia com a alcalinidade do sangue. A composição anormal do sangue, os catarrhos agudos e chronicos do estômago, produzindo alterações nos vasos sangüíneos, dão origem a tromboses e embolias, que por sua vez dão lugar ao apparecimento da ulcera, de sorte que esta é antes uma necrose parcial, dependente de uma obliteração dos vasos que serpejão pelas paredes do estômago e que o nutrem, do que o resultado de um processo suppurativo, que não se poderia dar com ausência dos phenomenos de inflammação e de suppuração. Anatomia pathologica.—A ulcera gástrica assesta-se de preferen- cia na região pylorica, mais vezes na face posterior do que na anterior, e freqüentemente na pequena curvatura ; é ordinariamente única, ás vezes outras apparecem posteriormente e em tempos diversos, de sorte que encontramo-la em differentes períodos de evolução e ao lado de cicatrizes de ulceras antigas; tem uma fôrma arredondada, quando é recente, mais tarde elliptica ou irregular pela reunião de outras e algumas vezes, como acontece na região pylorica, encontra-se uma orla completa no interior da cavidade gástrica. A ulcera recente tem 0,ffl007 a 0,m014 de diâmetro, a antiga 0,m04 a 0,m05 ; Cruveilhier, em uma observação, refere um caso de ulcera do estômago cujos diâmetros erão : o maior 0,m15, o menor 0,m08. Examinando-se a parte ulcerada, vê-se que a quantidade de — 20 — substancia destruiria vai diminuindo á proporção que se caminha para o exterior, dando á ulcera uma fôrma conica de base para o interior. Nas proximidades da ulceração raras vezes falta a inflammação, o mais das vezes esta existe acompanhada de espessamento e hy- pertrophia dos tecidos subjacentes. Os bordos, a principio molles, salientes e avermelhados, apre- sentão-se mais tarde duros e cortados a pique ; o fundo é acinzentado, endurecido e espessado. Na opinião de Cruveilhier a ulcera gástrica tem uma grande tendência a destruir as membranas do estômago e a perfura-las; a serosa peritoneal, pela resistência que offerece a essa destruição, muitas vezes impede que um derramamento de substancias contidas no estômago tenha lugar na cavidade do peritoneo. A perfuração de todas as membranas do estômago nem sempre se dá ; a perda de substancia pôde limitar-se á mucosa e ao tecido submucoso e haver formação de um tecido cicatricial; o trabalho ulcerativo, indo mais longe, pôde atacar a camada muscular; a retracção dos tecidos pelo processo de cicatrização é a conseqüência inevitável, podendo muitas vezes arrastar para o interior da cavidade gástrica uma dobra do peritoneo e produzir alterações importantes na fôrma do estômago que variarão de gravidade segundo a sede e extensão da lesão. Symptomatologia, marcha e terminação—A ulcera do estô- mago apresenta symptomas que varião muito, conforme a sede e a marcha da lesão. O doente sente ás vezes perturbações insignificantes nas funcções digestivas, uma sensação de calor por toda a superfície interna do ventriculo propagando-se ao esophago e algum peso na região epigastrica, principalmente depois das refeições ; após alguns dias, podem succeder a esses symptomas de pouca importância para o doente phenomenos terríveis que, em poucas horas, o tornão cadáver, taes como: os de uma peritonite superaguda consecutiva a uma — 21 - perfuração das paredes da cavidade gástrica, ou os de uma ruptura de um vaso importante caracterisada por uma abundante hematemese; felizmente, porém, essa marcha, a que o professor Jaccoud dá o nome de — fulminante —, não se nota sinão em um pequeno numero de casos. O mais das vezes a moléstia tem uma marcha chronica, caracte- risada por dor, vomito e hemorrhagia. Dor.— E urente, terebrante, ás vezes um pouco obscura; é constante e limitada a um ponto da região epigastrica, irradiando-se ás vezes para os lados ; ha. porém, sempre um ponto em que a dor se revela com maior intensidade, este se acha ordinariam ente abaixo do appendice xyplioide, occupando um espaço limitado por uma circumferencia de dous a quatro centímetros de diâmetro ; esta dor chamada xyphoidiana não se assesta invariavelmente neste lugar; ora occupa, na linha mediana, o limite entre a região umbilical e a epigastrica, ora, fora desta linha, um ponto nos hypocondrios direito ou esquerdo. Pouco tempo depois do apparecimento da dor epigastrica sobrevém a dorsal, descripta pela primeira vez por Cruveilhier, assestada, se- gundo Brinton, entre a apophyse espinhosa da oitava ou nona ver- tebra dorsal e a da primeira ou segunda lombar ; esta dita rachidiana existe conjuntamente ou alterna com a xyphoidiana e apresenta-se com os mesmos caracteres que ella, podendo também se affastar da linha mediana ; este desvio é de ordinário de dous a quatro centi- metros. Brinton dá grande importância ao desvio das dores xyphoidiana e rachidiana para o diagnostico da sede da ulcera, apresenta diversos factos em que esse caracter lhe valeu de muito para o diagnostico ; dá maior importância, considera como expressão mais fiel da sede da ulcera gástrica a situação do ponto doloroso rachidiano e como um poderosíssimo auxiliar o desvio simultâneo dos -dous pontos dolorosos. — 22 — A dor se exacerba pela pressão, pela ingestão de alimentos sólidos principalmente mal triturados, de líquidos irritantes e cm tempera- tura elevada e pelo trabalho da digestão. A dôr produzida pela ingestão dos alimentos é ás vezes tão considerável que os indivíduos affectados desta lesão tendo appetite normal deixão de satisfazê-lo para evitar os cruéis tormentos que soffrem quando os alimentos chegão á cavidade gástrica; umas vezes a dôr segue immediatamente á chegada das substancias alimentares ao estômago, outras apparece algumas horas depois, o que depende da sede da ulcera ; no pri- meiro caso estará a lesão assestada nas proximidades do cardia, no segundo nas do pyloro. A dôr faz com que os doentes se conservem de pé ou deitados em posição especial, conforme a parte do órgão em que a ulcera se localisou. Este caracter, estudado primeiramente por Osborne e mais tarde por Brinton, é de summa importância e delle diremos mais algumas palavras quando tratarmos do diagnostico da sede da ulcera. Vomito . — E esse um symptoma que varia não só quanto á sua apparição, mas também quanto á época em que se mani- festa ; tem lugar ordinariamente depois da ingestão dos alimentos, acalmando quasi sempre as dores provocadas por estes; o espaço decorrido entre qualquer refeição e o vomito é tanto menor quanto mais próxima se acha a ulcera do orifício cardíaco. Si o vomito segue logo á ingestão dos alimentos, estes, taes quaes forão ingeridos, constituem a parte principal das substan- cias expellidas, mas si tem lugar algumas horas depois, então são vomitadas as substancias ingeridas mais ou menos modifi- cadas pelo trabalho da digestão de envolta com mucosidades amarelladas ou esverdeadas, de reacção ácida t si em jejum, é expel- lido um liquido alcalino, viscoso, constituído principalmente pela saliva deglutida. Algumas vezes os indivíduos que soffrem de ulcera gástrica têm vomito sangüíneo, segundo Müller 29 •/«>? ° sangue vomitado é - 23 — ou rutilante ou negro semelhante á borra de café, e expellído só ou misturado com as substancias que se achavam no estô- mago. Hemorrhagía.— A erosão de capillares do estômago pelo pro- gresso da ulceração dá em resultado uma hemorrhagía na cavidade gástrica ; esta, sendo ordinariamente insignificante, não produz por si só movimentos reflexos do estômago^ que façam com que o sangue derramado seja expellído pelo vomito, de sorte que este ahi fica até que uma causa mais poderosa venha actuar sobre o estômago produzindo o vomito que, juntamente com outras sub- stancias, expelle o sangue derramado na cavidade gástrica, sendo este rutilante ou negro, conforme o espaço de tempo que decorreu entre a hemorrhagía e a expulsão das substancias contidas no ventriculo. Si a causa que ordinariamente produz o vomito não sobre vier, então a pequena quantidade de sangue derramado na cavidade gástrica será expellida com as fezes que apresentarão uma cor vermelha escura e passará desapercebida, si o medico e o doente forem desprovidos de espirito observador. Em lugar da erosão se dar unicamente nos capillares, pôde comprometter um vaso de alguma importância e haver uma hemor- rhagía capaz de, por si só, determinar o apparecimento do vomito; nesse caso o sangue é ordinariamente rutilante, tendo de mistura algumas porções coaguladas; uma parte do sangue que não fôr expellida pelo vomito o será de envolta com as fezes, que serão o mais das vezes constituídas unicamente por detritos de sangue coagu- lado com apparencia de borra de café. Quando se dá uma hemorrhagía dessa ordem, os doentes sentem anxiedade epigastrica, náuseas, fraqueza; o pulso torna-se pequeno, a pelle fria e sobrevém geralmente lipothymias. A hemmorrhagia resultante da erosão de um vaso de grande calibre pôde ser tão considerável, que ímmediatamente produza a — 24 — morte do doente, tendo este apenas manifestado os symptomas de uma hemorrhagía interna. Todos estes symptomas, actuando sobre o organismo, imprimem-lhe, no fim cie certo tempo, um cunho especial, denominado cachexia ulcerosa, que, segundo Brinton, não é um symptoma, mas sim uma reunião de symptomas ou antes um estado que exprime grande soffri- mento do organismo. Esta cachexia, diz elle, fôrma um caracter tão especial da mo- léstia que muitas vezes só o aspecto do doente no consultório me permittio fazer o diagnostico. E possível que este tão illustrado quão hábil medico, que se de- dicou durante grande numero de annos ao estudo da ulcera do es- tômago, podesse diagnostica-la somente pela cachexia ulcerosa, o que porém ousamos afiançar, sem receio de errar, é que outro qual- quer medico que quizesse seguir o exemplo de Brinton, se afastaria muitas vezes do verdadeiro diagnostico. Convém notar que os indivíduos affectados de ulcera gástrica têm de ordinário constipação de ventre e são atormentados por uma^êde intensa e constante. A marcha é em geral lenta e irregular apresentando alternativas para bem e para mal; tem uma duração muito variável, ordinaria- mente de dous a cinco annos, podendo chegar, segundo observações de Luton, a 17 annos e segundo Leudet a 20; sendo uma affecção que reincide muitas vezes, quer se tenha produzido uma nova solução de continuidade, quer se tenha destruído parte ou a totalidade da cicatriz .por uma causa mórbida ou physiologica, é á reincidência que devemos attribuir esse grande espaço de tempo de duração da ulcera. Termina ordinariamente pela cura, raras vezes pela morte. A cura ou é completa, isto é, o doente volta a seu estado anterior de saúde e não sente inccmmodo algum dependente da affecção que existio, ou é incompleta, o que tem lugar quando uma cicatriz em- baraça os movimentos do estômago ou se estabelecem adherencias — 25 — entre elle e um ou mais órgãos vizinhos, dando em resultado dores gastralgicas, ou uma pylorostenose acompanhada de vômitos, consti- pação habitual e trazendo grandes embaraços aos actos mechanicos que têm por fim a digestão physiologica. Quando termina pela morte, esta se dá em conseqüência do marasmo, de uma moléstia intercurrente, de uma perfuração espontânea, ou emfim de uma gastralgia ful- minante que, na opinião de Cruveilhier, é a causa mais freqüente da terminação fatal da ulcera gástrica. Segundo Brinton as terminações observadas em 100 casos de ulceras forão: cicatrizações 50, perfu- rações 13, erosões hemorrhagicas 4, marasmo 3, indeterminadas 30. Gastrite catarrhal aguda. A gastrite catarrhal aguda póde-se-nos apresentar sob duas fôr- mas: a branda — embaraço gástrico—, a grave—febre gástrica.— Anatomia pathologica.—Uma camada de muco viscoso, esbran- quiçado, transparente ou opaco constituído por cellulas epitheliaes e bile, forra diversas partes, raramente a totalidade da mucosa estomacal; destacada esta camada, apresenta-se a mucosa gástrica algum tanto espessada, quer em conseqüência de uma infiltração serosa, quer de uma hyperhemia vascular denunciada por uma côr que varia do vermelho ao violaceo e até ao preto. Estas congestões não têm lugar ordinariamente em toda a super- fície do estômago; são disseminadas, o que levou alguns práticos a admittirem uma topographia da gastrite, limitada ora ao cardia (car- diatite) ora ao pyloro (pylorite) ora ás outras partes do estômago. A mucosa se conserva ordinariamente sã, algumas vezes notão-se pequenas erosões e diminuição de consistência. O sueco gástrico torna-se alcalino e perde as suas propriedades digestivas. - 26 — Pathogenia e etiologia.— A diminuição de secreção do succ0 gástrico, como acontece nos indivíduos atacados de moléstias febris a sua elaboração imperfeita em virtude de uma diminuição da vitalidade cellular, dando em resultado a decomposição anormal das substancias ingeridas, são causas que predispõem o estômago a contrahir esta moléstia. Entre as causas determinantes notaremos : a ingestão de grande quantidade de alimentos, de substancias alteradas por um começo de putrefacção, mal trituradas, incompletamente insalivadas, muito gordurosas, o regimen exclusivamente animal, o abuso de bebidas alcoólicas e de substancias que irritão a mucosa estomacal e que diminuem a força digestiva do sueco gástrico ou as contracções do ventriculo ; neste caso se achão os narcóticos empregados em doses consideráveis. Os resfriamentos, as mudanças bruscas de temperatura, uma con- stituição medica especial dão muitas vezes lugar ao apparecimento da inflammação catarrhal aguda em individuos que não se desviarão de um regimen salutar. Symptomatología, marcha e terminação.—O embaraço gástrico é ordinariamente precedido de proclromos caracterisados por dimi- nuição do appetite, lentidão das digestões, perturbações do somno e um máo estar que vai augmentando progressivamente até o apparecimento de symptomas mais importantes, peculiares á affecção de que tratamos; outras vezes faltão os prodromos, e a inflammação catarrhal aguda se denuncia logo por uma côr subicterica dos lábios e das alas do nariz contrastando com a lividez do resto da face; os olhos tornam-se languidos e as scleroticas amarel- ladas ; ha inaptidão para qualquer trabalho, cephalalgia frontal mais ou menos intensa estendendo-se algumas vezes ao occiput, inappe- tencia e sede ; a bocea é amargosa, a lingua larga, humida e coberta de uma camada de saburra amarellada, deixando patentes depressões deixadas pelos dentes ; ha máo hálito, eruetações fétidas ou inodoras - 27 — devidas ao desprendimento dos gazes sulphydrico, hydrogeneo e ácido carbônico provenientes da decomposição das matérias contidas na cavidade gástrica e vômitos constituídos por substancias ingeridas mais ou menos alteradas e por mucosidades viscosas, alcalinas, amarel- ladas ou esverdeadas; a região epigastrica apresenta certa tensão, li- geiro tympanismo e sensibilidade á pressão; a constip ação de ventre é muito commum, ás vezes ha diarrhéa; as ourinas são avermelhadas, sedimentosas e em pequena quantidade; algumas vezes falta a febre, outras, esta se manifesta com typo remittente, mais ou menos intensa e exacerbando-se para a tarde ; sonhos e pesadelos terríveis incom- modão o doente durante a noite: eis os symptomas que constituem a inflammação catarrhal aguda de fôrma branda conhecida pelo nome de embaraço gástrico. A exasperação d'estes symptomas e o apparecimento de novos pertencem á febre gástrica que não é mais do que a inflammação catarrhal aguda de fôrma grave. N'esta, ha febre muito intensa, sede ardente, manifestando o doente grande avidez para os liquidos acidulados; ha vômitos freqüen- tes, subictericia bem pronunciada, diarrhéa biliosa e de fétido exces- sivo em conseqüência da grande quantidade de bile derramada no duodeno, ligeira congestão do fígado e mais tarde phenomenos ataxicos e adynamicos. A inflammação catarrhal aguda de fôrma branda se dissipa ordina- riamente em três a quatro dias, pôde porém se prolongar por mais tempo, tomar a fôrma grave, degenerar em outra affecção e com- plicar-se com outras moléstias, o que tem lugar quando os doentes continuão a estar debaixo das mesmas condições que derão origem á primeira manifestação mórbida. Não é isso felizmente o que em geral acontece; o mais das vezes ella se dissipa em pouco tempo espontaneamente ou depois de suores copiosos e de evacuações abundantes, e os doentes entram em conva- lescença, tendo todavia digestões morosas durante alguns dias. — 28 — Na fôrma grave, a febre, bem como os outros symptomas perma- necem por mais tempo, nunca desapparecendo no primeiro septenario, podendo-se prolongar por dous ou três septenarios principalmente si o doente não estiver sujeito a uma medicação conveniente. A convalescença é mais demorada e as digestões não se fazem de um modo regular, senão depois de passados muitos dias. A inflammação catarrhal aguda reincide muitas vezes e pode tornar- se chronica; delia trataremos no capitulo seguinte. Apparece muitas vezes, principalmente em certas constituições médicas, de concomittan- cia com algumas moléstias agudas, como: pneumonia, pleuriz, bron- chite, angina, febre typhoide, no primeiro septenario das quaes, altera o caracter e a physionomia e perturba a marcha até que seja remo- vido este obstáculo. Prognostico.—Quando se tratar da inflammação aguda de fôrma branda, isto é, do embaraço gástrico, o prognostico será favorável qualquer que seja a constituição e idade dos indivíduos affectados ; quando, porém, se apresentar a fôrma grave, então o nosso juizo prognostico será variável. Si se tratar de pessoas adultas e de con- stituição forte, o prognostico ainda será favorável; este se revestirá de alguma gravidade nos indivíduos idosos, fracos, depauperados e essa gravidade augmentará muito quando a inflammação catarrhal aguda atacar a indivíduos de tenra idade, porquanto nesses casos a morte zomba ordinariamente de quasi todos os recursos da thera- peutica empregada para debellal-a. Da gastrite catarrhal chronica. A gastrite catarrhal chronica ou pôde ser consecutiva a uma gas- trite catarrhal aguda, o que se dá principalmente quando esta, em virtude de causas diversas, se mostra rebelde ao tratamento ou reincide — 29 — varias vezes, ou pôde manifestar-se revestida desde o começo do caracter de chronicidade. Pathogenia e etiologia.—Todas as causas que enumerámos no capitulo antecedente, como capazes de produzir uma gastrite catarrhal aguda, podem dar lugar ao apparecimento da gastrite chronica; todavia apontaremos algumas reconhecidas por todos os autores como muito importantes. A gastrite catarrhal chronica reconhece por causas, principalmente, o abuso de bebidas espirituosas, cujo effeito nocivo está na razão directa do gráo de concentração do liquido introduzido no organismo; o habito de ingerir por occasião de cada refeição grande quantidade de alimentos; a stase venosa da mucosa do estômago, quer dependa de uma lesão qualquer do fígado que produza um obstáculo ao curso do sangue da veia porta, como a sclerose hepatica os tumores do fígado, quer dependa de uma lesão do coração ou do pulmão que, accumulando no coração direito uma quantidade de sangue maior do que a normal, difliculte a chegada do liquido que deve ser derramado no coração pelas veias cavas; estas, tornando-se excessivamente turgi- das, produzem embaraço na circulação hepatica, o qual determina a stase venosa no estômago ; n'este caso estão a sclerose e o emphysema do pulmão, as lesões valvulares do coração, etc. A stase venosa ainda pôde ser produzida por um estado varicoso parcial ou geral do systema da veia porta, o qual, segundo a opinião do Dr. Jaccoud, coincide muitas vezes com varices hemorrhoidarias. Algumas moléstias chronicas como a tuberculose pulmonar, o mal de Bright trazem um catarrho chronico do estômago; assim vemos diversas vezes individuos tuberculosos consultarem aos médicos sobre a moléstia do estômago que os incommoda, muito antes de se quei- xarem da affecção principal; no mal de Bright a diminuição dauréa dá lugar á formação de productos ammoniacaes, que, irritando a mucosa gastro intestinal, dão origem a um catarrho chronico, o qual também - 30 ~ se encontra nas degenerescencias do estômago, no rheumatismo, na anemia e na clilorose. Durand Fardei diz que, nas colônias francezas, uma das causas mais freqüentes éo abuso dos purgativos drásticos (*). Anatomia pathologica.— E na membrana mucosa do estômago, coberta de uma camada de muco viscoso e pardacento, que vamos encontrar as principaes alterações: ou se apresenta com uma côr escura, acinzentada, raramente avermelhada em toda a extensão, ou se notão placas escuras, azuladas, disseminadas, dependentes de pequenas hemorrhagias; além da modificação da côr da hematina transformada em pigmento, ainda notamos um espessamento, uma hypertrophia da mucosa que dá á cavidade um aspecto escabroso e irregular constituindo o chamado estado mamelonado de Louis. Segundo Budd, é isto devido á distensâo das glândulas pela retenção dos productos excretados; segundo Frerichs a accumulos de gordura no tecido sub-mucoso, ou ao desenvolvimento de folliculos fechados e muito approximados; segundo Fõrster á hypertrophia das villosi- dades. O professor Jaccoud faz notar que esta opinião não pôde ser acceita senão quando essa alteração da mucosa occupar a região pylorica, que é o ponto em que existem villosidades circumdando os orifícios das glândulas de pepsina. Brinton julga que este estado mamelonado não é mais do que um phenomeno cadaverico depen- dente da contracção da túnica muscular do estômago, porquanto o tem encontrado em muitos individuos, que durante a vida não apresentarão symptomas que indicassem um estado anormal deste órgão. Na mucosa ainda sí observão vegetações de base larga ou pediculadas, nas quaes se reconhece a textura da mucosa hypertro- phiada. Em uma autópsia praticada por nós, no anno passado, no hospital de marinha da Corte, onde trabalhávamos como alumno interno, («) Dr. Feijó Júnior. These de concurso, 1870. — 31 - sobre o cadáver de um doente que soffría de uma moléstia do estômago que apresentava todos os symptomas do cancro, á excepção do tumor, encontrámos no estômago grande quantidade dessas vegetações, de base larga, da altura de 1 cent. a 1 4/2cent.;enão havendo carcinoma, fomos levados a acreditar que se tratava de uma gastrite chronica. O amollecimento branco com adelgaçamento da mucosa, que M. Louis por muito tempo considerou como dependente da inflam- mação chronica do estômago, não é mais do que um trabalho de decomposição cadaverica, que se dá principalmente em individuos que succumbem muito depauperados por moléstias longas e tem sido observado nas autópsias de individuos fallecidos de febre typhoide e de tuberculos pulmonares. O tecido sub-mucoso, bem como a camada muscular também apresentão-se algumas vezes espessadas, endurecidas e hypertrophiadas ou uniformemente ou só em certos pontos do estômago, onde esse espessamento toma o aspecto de um tumor; é no pyloro onde principalmente se encontra esta ultima alteração, que, estreitando o orifício pylorico dá em resultado uma dilatação do estômago. Symptomatologia e marcha. —Os symptomas que apresenta a gastrite catarrhal chronica são mais ou menos os mesmos da gastrite catarrhal aguda, revestidos porém de menor intensidade. Os doentes accusão, na região epigastrica, uma sensação de peso que se incrementa durante o trabalho da digestão, ou por uma pressão exercida sob esta região, transformando-se em dôr obscura, pouco intensa, facilmente supportada, algumas vezes irradiando-se para os hypocondrios e apresentando o caracter das dores gastralgicas ; as digestões são demoradas e imperfeitas; em conseqüência dos gazes que se desenvolvem na cavidade gástrica pela decomposição das substancias ingeridas sobre as quaes o sueco gástrico em con- dições anormaes não pôde exercer sua acção dissolvente, ha um certo abahulamento da região epigastrica e os doentes expellem pelas — 32 — eructações grande quantidade de gazes fétidos ; têm náuseas, pyrosis; em jejum ou durante o trabalho da digestão apparecem vômitos e as substancias por elles expellidas são constituídas: no primeiro caso principalmente por mucosidades, bile e saliva, da qual ha uma hypersecreção que, segundo Frerichs, é um symptoma constante da gastrite chronica ; esta saliva, sendo secretada em grande quantidade e deglutida principalmente durante a noite, é expellida de manhã com as substancias acima mencionadas; no segundo caso por ali- mentos mais ou menos alterados, misturados com mucosidades, de sabor e cheiro desagradáveis, contendo algumas "vezes vegetaes microscópicos denominados sarcina ventriculi. As substancias vomitadas antes do estômago apresentar lesão or- gânica bem manifesta são as ingeridas em ultimo lugar, o que é de grande importância para o diagnostico differencial entre esta lesão e o cancro, no qual muitas vezes são expellidas substancias ingeridas dous, três ou mais dias, depois de outras que são conser- vadas no estômago. Quando a moléstia se acha em periodo muito adiantado, appa- recem vômitos escuros, côr de borra de café, constituídos por sangue coagulado proveniente de erosões mais ou menos superficiaes da mucosa gástrica. O appetite é geralmente diminuido, ás vezes é exquisito ; a sede conserva-se ordinariamente normal e até diminuída, salvo quando ha febre, pois neste caso torna-se muito intensa. Os doentes sentem a bocca pastosa e amarga e exhalão máo hálito; a lingua se apresenta coberta de saburra, principalmente de manhã, e segundo alguns autores, apresenta-se, nos casos graves, sêcca, rubra e coberta de aphtas que se estendem á mucosa buccal. Grisolle, baseando-se em sua longa pratica, contesta tal opinião e diz que a lingua se conserva qnasi sempre em estado normal. Ha ordinariamente constipação de ventre, que algumas vezes alterna com diarrhéa. — 33 - Ordinariamente não ha febre ; todavia têm-se a observado algumas vezes durante a digestão laboriosa, augmentando para a tarde e caracterisada por máo estar, augmento de calor e freqüência do pulso. Em conseqüência da persistência destas perturbações locaes, a nutrição soffre profundamente; as successivas digestões imperfeitas produzem seus effeitos perniciosos em todo o organismo e apparecem o emmagrecimento, a pallidez, a fraqueza, a tristeza e desordens para differemes órgãos importantes, contribuindo tudo para uma termi- nação fatal A marcha é lenta, apresentando a moléstia variações para melhor e para peior, durando nunca menos de dous a três mezes e podendo algumas vezes prolongar-se muitos annos: termina ordinariamente pela cura quando o doente se sujeita a um tratamento serio, raras vezes pela morte e, quando isto se dá, é quasi sempre em conse- qüência de complicações. Prognostico.—Quando a gastrite chronica é simples o prognostico é pouco grave, quando porém dá lugar a lesões incuráveis ou a alterações profundas do estômago, como: atrophia do apparelho glandular, degenerescencia gordurosa da túnica muscular, etc, o prognostico reveste-se de simima gravidade. Da Gastrite tóxica. Certas substancias tóxicas, principalmente vegetaes ou animaes, introduzidas no estômago, ahi produzem uma phlegmasia violenta, sem todavia darem lugar directamente á destruição dos tecidos do órgão, a qual, quando se dá, depende da intensidade da inflammação e não da acção directa da substancia tóxica sobre as paredes do estômago; outras substancias, porém, taes como: ácidos concentrados, saes me- tallicos, cáusticos etc, pondo-se em contacto coma membrana interna 4 a 5 — 34 - do estômago a desorganisão completamente em virtude de uma combinação de natureza chimica. Anatomia pathologica.— Trataremos muito rapidamente da anatomia pathologica, porquanto em um trabalho desta ordem não podemos apresentar as diversas alterações das membranas do estômago, resultantes da ingestão de grande numero de substancias tóxicas, o que pertence mais especialmente á medicina legal. A camada epithelial da mucosa por onde trajectou a substancia cáustica é destruida e apresenta-se a mucosa injectada e coberta de manchas de côr variável conforme a substancia ingerida; a mucosa pôde ser atacada em toda sua espessura e transformada em uma eschara negra e friavel; estas lesões pódem-se estender á túnica mus- culosa até mesmo á serosa, dando lugar a uma perfuração do estômago; em alguns pontos mais ou menos próximos das escharas, nota-se uma inflammação da mucosa, a qual varia de intensidade conforme o gráo de concentração das substancias levadas á cavidade gástrica. Quando a eschara é muito superficial pôde a mucosa se revestir de uma camada epithelial; quando porém é extensa e profunda e o doente cura-se, a reparação, que teve lugar em conseqüência da suppuração e da formação do tecido cicatricial, dá lugar a adherencias, a commu- nicações anômalas com os órgãos vizinhos e a stenoses cardiacas e pyloricas conforme a sede da lesão. Symptomatologia.—Deixando de parte o que se passa no trajecto da substancia cáustica ou do ácido concentrado, da bocca até o cardia, vejamos o que se nota depois que a substancia tóxica penetrou na cavidade gástrica. A região epigastrica torna-se sede de dores agudas e atrozes acom- panhadas de um estado de agitação, anxiedade e dyspnéa; apparecem vômitos freqüentes constituídos pelos alimentos contidos no estômago misturados com sangue e com parte da substancia tóxica, eólicas, diarrhéa, suores frios, pulso filiforme e lipothymias; um estado de - 35 - torpor seguido de cyanose e de resfriamento das extremidades precede a morte que tem lugar quasi sempre algumas horas depois. Si a inflammação é muito extensa ou si a queda da eschara dá lugar a uma perfuração estomacal, apresentão-se os symptomas de uma peritonite superaguda. Prognostico.—É gravíssimo, porquanto a gastrite tóxica termina quasi sempre pela morte e nos casos mais felizes, isto é, quando termina pela cura, a convalescença é muito longa, as digestões são laboriosas e ás vezes sobrevém uma inflammação catarrhal chronica, que exerce uma influencia muito prejudicial sobre a nutrição geral. Gastrite phlegmonosa. Synonymia.— Linite suppurativa (Brinton) ; infiltração puru- lenta das paredes do estômago (Raynaud); inflammação phlegmonosa (Bamberger). Histórico.— Até o começo do século xvn esta affecção fora apenas mencionada por alguns autores como Rhazès, Varandoeus, Sennert, Heurn e considerada possível sua existência sem que podessem apresentar factos em seu apoio. Do fim do século xvn em diante, a gastrite phlegmonosa começou a ser observada por practicos distinctos como Bonnet, Hoffmann, Sauvages, Cullen, Franck, Rokitansky, Monro, Naumann, Andral, Brinton, Cruveilhier, Lebert, Raynaud, Bamberger, etc. e hoje sua existência, comquanto rara, não pôde ser posta em duvida. Etiologia.— Pouco se sabe a respeito da etiologia da gastrite phlegmonosa ; o alcoolismo parece representar o principal papel na producção desta moléstia figurando em seguida os desvios de regimen, a alimentação insufíiciente ou de má qualidade, as impressões moraes, a acção do frio humido e o traumatismo; - 3(5 — é observada ordinariamente no sexo masculino e na idade média da vida. Apresenti-se primitivamente cm individuos sãos, ou secundariamente complicando a febre typhoide, a varíola, a pyohe- mia, etc. Anatomia pathologica.—As túnicas do estômago se apresentão espessadas, principalmente a cellulo-adiposa, contendo em suas malhas pus mais ou menos concreto, que transuda sob a fôrma de gottas quando se faz uma incisão e uma ligeira pressão ; algumas vezes existe nas túnicas mucosa e muscular grande quantidade de pus que corre apenas é incisada uma destas mem- branas ; a muscular pôde ser destruida e o pus se achar limi- tado externamente pela camada serosa. Esta infiltração purulenta se observa quando a inflammação é diffusa ; quando porém se localisa em certos pontos do estômago, então notamos abeessos, que podem ser únicos ou múltiplos, oecupando, o maior numero de vezes, as circumvisinhanças do orifício pylorico. O volume destes abeessos varia desde o tamanho de uma cabeça de alfinete até o de uma noz. Em ambos os casos as túnicas gástricas se apresentam espessadas e a mucosa hyperhe- miada e echymosada. No peritoneo e nos órgãos vizinhos apparecem os phenomenos de uma inflammação, quando em conseqüência da ruptura do abeesso o pds se derrama na cavidade abdominal; ha adherencias do estômago com alguns dos órgãos vizinhos e encontra-se algumas vezes pús no duodeno. Symptomatologia e marcha.—Quando ha infiltração de pús, os doentes aceusão dores abdominaes muito intensas sobretudo na região epigastrica, exasperadas pela pressão e precedidas ou não de prodromos caracterisados por máo estar, febre e vômitos biliosos freqüentes; sede intensa, e inappetencia; a lingua apresenta-se saburrosa, o pulso freqüente e filiforme ; ha anxiedade, alteração - 37 — da physionomia ; um suor frio cobre a superfície cutânea ; a intel- ligencia, ao principio intacta, perturba-se; ha delírio e a morte sobrevém. Quando a peritonite se manifesta, então notamos exageração dos symptomas que apresentámos e o apparecimento de outros que lhe são peculiares. De marcha aguda, dura ordinariamente de 2 a 10 dias ; Niemeyer e Bamberger sustentam que em alguns casos a termi- nação pela cura pôde ter lugar em viitude da formação de um tecido cicatricial nos espaços areolares da camada submucosa. Existem no musêo de Erlangen algumas peças pathológicas em abono desta opinião. Quando ha formação de abcesso, a moléstia tem uma marcha aguda ou chronica ; no primeiro caso os sjmiptomas são mais ou menos os acima mencionados ; no segundo a symptomatologia reves- te-se de grande obscuridade, o que faz com que esta affecção se confunda com quasi todas as moléstias chronicas do estômago. Ha dôr epigastrica, anxiedade, náuseas, vômitos constituidos por substancias alimentares mal digeridas, misturadas com muco- sidades e ás vezes com sangue e pús, o que se dá quando o abcesso se abre na cavidade gástrica; apparece a febre hectica que é seguida de um emmagrecimento considerável. De marcha longa, dura ordinariamente muitos mezes ; si o abcesso não se rompe, a morte é produzida pelo marasmo, si se rompe na cavidade gas" trici o pús pôde ser expedido e dar-se a cicatrização da solução de continuidade, si o abcesso se abre na parte externa do estô- mago pôde o pús se derramar na cavidade abdominal e dar lugar a uma peritonite; em conseqüência de adherencias contrahidas pelo estômago com órgãos vizinhos o pús pôde ser derramado n'elles ; si estas se derem com o peritoneo o pús poderá atravessar a. parede abdominal e dar lugar a uma fistula estomacal. Prognostico.—E gravíssimo ; comquanto se tenha observado — 38 — alguns casos de cura, é pela morte que a moléstia termina quasi sempre; os abeessos de marcha chronica são menos graves do que os de marcha aguda. Inflammação cirrhotica. Linite plástica do estômago. Gastrite intersticial. W Brinton, que, mais do que ninguém, se oecupou com esta affecção, a julga mais freqüente do que pensão os pathologístas, e attribue esse erro á confusão desta moléstia com o cancro do estômago. A linite é observada principalmente nos individuos jovens e nos que abusão de bebidas alcoólicas, ataca ou só uma parte ou a tota- lidade do estômago ; offerece muita analogia com a cirrhose hepatica e de outros órgãos, dando como resultado definitivo uma retracção cicatricial das partes em que se assesta. As principaes lesões anatomo-pathologicas que se observão são: espessamento considerável do órgão, augmento de peso e de densidade, dureza e elasticidade, côr pardacenta e opaca e um desenvolvimento exagerado do tecido fibroso intersticial. Os histologistas com o auxilio do microscópio têm encontrado, de envolta com o tecido normal do estômago, uma massa fibrosa rudi- mentar, composta de filamentos ondulados menos distinetos que os da fibra branca do tecido areolar ordinário; poucos vasos, alguns cytoblastas e ausência de fibras amarellas e elásticas. Segundo Jaccoud desenvolve-se o mais das vezes secundariamente no curso do catarrho chronico do estômago, e segundo Budd e Brinton é provocada pelo alcoolismo e existe como lesão primitiva independente de qualquer lesão da mucosa. (*) ©itelten. «ofíerofrê bentriculi. — 39 - Esta lesão passa muitas vezes desapercebida durante ávida, só sendo reconhecida por occasião da autópsia reclamada por alguma outra affecção ; outras vezes, porém, nota-se um tumor duro na região epigastrica, acompanhado dos symptomas peculiares ás moléstias do estômago, como: dôr pela pressão, anorexia, vômitos freqüentes constituídos por matérias semi-putrefactas e algumas vezes por sangue, etc. A linite imprime muitas vezes no estômago certas modificações, como: estreitamento do orifício pylorico, dilatação consecutiva da cavidade gástrica e degenerescencia do tecido muscular, dando em resultado diminuição dos movimentos peristalticos A marcha é muito lenta; a duração de 15, 20 annos e ás vezes mais. Da Gastralgia. Synonymia.— Cardialgia, gastrodynia, cardiadynia, cardiogmus, dyspepsodynia, affectus cardiacus, passio cardíaca, caimbra, espasmos, eólicas do estômago. Etiologia e pathogenia.— A gastralgia é uma affecção muito freqüente na adolescência e na idade adulta, atacando de preferencia o sexo feminino, principalmente quando predomina o temperamento nervoso. O abuso de substancias mucilaginosas, ácidas, de bebidas alcoólicas, do gelo, de certos medicamentos irritantes, como a copahiba, a there- bentina, os drásticos contribue poderosamente para o apparecimento da gastralgia. Barras, que, em França publicou sobre este assumpto uma mono- graphia de mérito, diz que o jejum, o uso freqüente da alimentação vegetal, da animal desprovida de gordura, o abuso do peixe dão em — 40 — resultado quasi sempre esta affecção e apresenta como prova de sua asserção as gastralgias observadas nos individuos que, por excesso de zelo religioso observão um severo jejum durante toda a quaresma. O exercício intellectual muito aturado, os pezares, o abuso dos prazeres venereos, a continência e o onanismo, actuando sobre o systema nervoso, dão muitas vezes lugar a gastralgias. Schmidtmann diz: « quando sou consultado por um mancebo affectado de gastralgia, logo suspeito que seja devida ao onanismo ; as indagações posteriores a que procedo confirmão quasi sempre o meu juizo. » A anemia, a clilorose, as affecções da medulla ou do cérebro, a existência de tumores que, no craneo ou no thorax, comprimão cordões do nervo vago ou do sympathico, e no abdômen o plexo solar; a hysteria, a hypocondria, as affecções dos órgãos abdominaes, como do fígado, do baço, do pancreas são quasi sempre acompanhadas de accessos gastralgicos. Romberg admitte, como dependente de uma hyperesthesia do nervo vago, uma nevralgia a que deu o nome de gastrodynia nevrálgica e como dependente de uma hyperesthesia do plexo solar uma outra denominada cceliaca. Esta distincção admissivel em theoria não é de utilidade pratica, por ser muito difficil, como observou Henoch, determinar si as dores gastralgicas observadas em um doente têm por ponto de partida os filetes do nervo vago ou os do grande sympathico. Symptomatologia e marcha. — A gastralgia tem ordinariamente phenomenos precursores constituídos por difiiculdade de digestão, inaptidão para qualquer trabalho corporal ou intellectual, dores surdas na região epigastrica e, em três casos observados por Walleix, por vômitos provenientes de causas insignificantes; ás vezes apparece subitamente e é então caracterisada por uma dôr violenta, atroz, urente, constrictiva que obriga os doentes a mudarem constantemente - U - de posição, a se curvarem para diante afim de encontrar lenitivo; a dôr da gastralgia é tão intensa que ás vezes produz delirio e con- vulsões nas pessoas de sensibilidade exagerada. Hoffmann diz: que, entre as dores que affligem a humanidade, a dôr gastralgica occupa um dos primeiros lugares. E raramente continua, de ordinário intermittente ou remittente, dimi- nue ou desapparece espontaneamente logo depois da ingestão de alimen- tos ou da expulsão de gazes para reapparecer mais tarde; augmenta pela pressão brusca e irregular, como a que é produzida pela ponta de um só dedo, diminue pela pressão methodica e regularmente exercida com a palma da mão; em casos raros, quando a dôr se assesta na parede posterior do estômago, a pressão a exacerba embora feita com methodo e regularidade, o que não é para admirar, porquanto a parte dolorosa é levada de encontro á columna vertebral. A dôr assesta-se de preferencia no epigastro irradiando-se para a região dorsal ou para os hypocondrios. Os doentes percebem sensações diversas e exquisitas; alguns têm sensação de frio, outros de calor; a alguns parece que o estômago se dilata extremamente e está prestes a romper-se, a outros que está completamente vazio e retraindo ; seria muito longo enumerar todas as observações da sensibilidade que experimentão os gastralgicos. As náuseas, as eructações são freqüentes; os vômitos são raros e constituídos por mucosidades mais ou menos espessas, misturadas com bile quando apparecem pela manhã, e de envolta com as substancias ingeridas, principalmente líquidas, quando sobrevém depois das re- feições ; tem lugar com grandes intervallos ou em dias consecutivos depois dos quaes vem um longo periodo de interrupção. A contracção violenta do estômago em conseqüência dos vômitos contribue para exasperar a dôr já tão considerável. Durante os accessos gastralgicos de pouca intensidade o pulso conserva-se cheio e pouco freqüente ; nos accessos violentos torna-se concentrado, a face empallidece, um suor frio se nota sobre ella, a 4 A G - 42 - physionomia altera-se, exprimindo alto gráo de angustia; algumas vezes a lipothymia, o delirio e a convulsão vêm ennegrecer ainda mais este triste quadro. Schmidtmann dizia: « Aliquot notavi mulieres per qnam sensibiles, ferociente cardialgise paroxysmo, delirio atque nervorum distentionibus correptas. » Quando a gastralgia torna-se chronica apresenta,segundo Mondière, um symptoma que para elle é de summa importância: pequenos botões, mais ou menos avermelhados e salientes na ponta da lingua; a bocca apresenta-se de manhã pastosa, com sabor desagradável, sem máo hálito, de ordinário ha hypersecreção sialica. O appetite é diminuido, augmentado ou pervertido, a sede também, e as digestões são laboriosas e perturbadas; ha ordinariamente con- stipação de ventre, as fezes expellidas são duras e cobertas de mucosi- dades intestinaes; a ourina emittida durante o accesso ou Ímmedia- tamente depois, é transparente e em grande quantidade, em outras occasiões é avermelhada e sendo deixada em repouso, deposita-se r.o fundo do vaso um sedimento côr de tijolo. A gastralgia exerce uma acção muito importante sobre o systema nervoso ; os individuos que delia soffrem tornão-se tristes e intra- táveis. O estado geral não é de ordinário muito alterado, somente na gastralgia symptomatica é que observamos um depauperamento e emmagrecimento rápidos. A gastralgia tem uma marcha muito irregular, os accessos gas- tralgicos podem sorprehender o doente em qualquer hora do dia o;i da noite, mas têm lugar ordinariamente depois das refeições. Duração e terminação.—A duração dos accessos gastralgicos varia desde dous minutos até doze, quatorze horas; quando tem por causa a ingestão de alimentos excitantes, são passageiros, quando apparecem espontaneamente ou dependem de um excesso de severi- dade no regimen dietetico durão por muitos annos, ás vezes por toda — 43 — a vida tendo os doentes apenas alguns intervallos de socego em que a moléstia parece ter cedido. Quando a moléstia dura por muito tempo, os doentes tornão-se hypocondriacos, convencem-se de que seu malé mortal,preoccupão-se constantemente com seu estado ; a desconfiança e o aborrecimento de tudo e de todos os perseguem continuamente; procurão consolo para seus males na narração minuciosa delles ás pessoas conhecidas e ás estranhas ; neste estado lastimoso, que apresenta alternativas de melhoras e de peioras, arrastão por muito tempo uma vida des- graçada. A gastralgia ou termina pela cura ou persiste durante toda a vida, vindo o doente a fallecer victima de uma outra affecção. Alguns autores, e entre elles Barras, citão casos em que a gas- tralgia terminou pela morte; convém notar, porém, que havia sempre uma outra lesão concomitante mais séria, á qual deve ser attri- buida a terminação fatal. Prognostico.— Comquanto seja uma affecção que incommode muito aos doentes pelas dores horríveis que produz, não é em geral uma moléstia grave ; um tratamento conveniente e bem dirigido, um regimen adequado dão-nos, o mais das vezes, os resultados desejados, quando porém os acessos vão se reproduzindo com pequenos inter- vallos e sobrevém a hypocondria, o prognostico é grave, porquanto raramente a moléstia cede aos meios therapeuticos. Não devemos occultar que, algumas vezes a gastralgia não permittindo aos doentes tomar alimento, dá lugar a uma alteração profunda na constituição, cujo resultado é a morte por inanição, que outras vezes a gastralgia em conseqüência de ,-aia grande intensidade e duração enfraquece a tal ponto os individuos affectados d'ella que os predispõe a outras moléstias que em geral se revestem de summa gravidade. Estes casos são muito raros e constituem excepções. - u - Dyspepsia. Etiologia.—As causas da dispepsia actuão directa ou indirecta- mente. Causas dieectas.—Uma alimentação insuffíciente como a das pessoas que jejuão constantemente, das que vivem na miséria, que em conse- qüência de uma sobriedade mal entendida se alimentão mui parca- mente, dando em resultado diminuição dos productos úteis da digestão; a ingestão de grande quantidade de alimentos que, na opinião de Chomel, occupa, na etiologia da affecção de que tra- tamos, um lugar importantíssimo; o uso de uma alimentação exclusivamente vegetal ou animal, de má qualidade, mal preparada, inconveniente, quer pelo excesso, quer pela carência de adubos ; a falta de variedade na alimentação, embora de boa qualidade, não excitando, na opinião de Corvisart, em gráo sufficiente a acção do estômago; o abuso do café, do chá e do chocolate principalmente tomados em temperatura elevada; o uso de bebidas espirituosas como a aguardente, o cognac, o rhum, a genebra, etc. em jejum e sobretudo o seu abuso, são causas que contribuem poderosamente para o apparecimento da dyspepsia. Também a produzem freqüentemente o uso e o abuso de certos medicamentos, quer determinem uma acção irritante sobre a mucosa gástrica, quer diminuão ou embotem a energia das funcções diges- tivas ; entre os primeiros citaremos: os preparados arsenicaes, os mercuriaes, o nitrato de prata, o iodo, os balsamos, as resinas, etc. ; entre os segundos : o ópio e seus alcalóides, a belladona, o meimendro, etc, administrados em altas doses. A má trituração dos alimentos, a insalivação insufficiente, a falta de regularidade nas horas das refeições, o abuso do fumo, que, segundo Coutaret, tem grande importância, por ser causa da rejeição — 45 — de uma grande quantidade de saliva são de uma influencia notória na producção da dyspepsia. Causas indirectas. — Percepta. O trabalho intellectual muito aturado, determinando excitação e affluxo de sangue para o cérebro e consecutivãmente diminuição de vigor para os outros órgãos, enfraquecimento e impressionabilidade excessiva de todo o systema nervoso que os incita, o pezar, o terror, o ciúme, o amor con- trariado, o orgulho abatido, a nostalgia, uma forte emoção abalando profundamente o systema nervoso, dão lugar á manifestação de symptomas dyspepticos. Gesta.—A falta bem como o abuso de exercicios physicos são causas de dyspepsia; assim é muito freqüente encontra-la nos in- dividuos de vida sedentária mormente quando a isso ajunta-se uma profissão que obriga á flexão mais ou menos pronunciada do thorax para diante como: a de sapateiro, alfaiate, modista, etc. ; nos individuos que executão exercicios exagerados, principalmente logo depois das refeições ou durante a noite, na qual além da fadiga muscular ha a perda de somno que por si só já é uma causa bem importante ; o dormir em excesso, mormente durante o dia, produz uma acção idêntica á que vimos ter lugar com o emprego dos narcóticos. Circumfusa.—A habitação em lugares humidos, baixos próximos a pântanos, a respiração de um ar confinado e viciado, contendo substancias acres ou irritantes, o calor que por si só diminue o appetite e a energia das funcções digestivas, os banhos mornos repetidos são também causas da dyspepsia. Applicata.—O uso de colletes apertados e de tudo quanto com- prima excessivamente a região epigastrica, produzindo uma influencia nociva é também uma das causas de dyspepsia. Excreta.—Assecreções, sendo fornecidas pelo sangue, quanto mais — 46 — abundantes forem, tanto mais pobres de princípios nutritivos este se tornará, e depauperando assim o organismo repercutirá ímmedia- tamente sobre o estômago sua maléfica influencia. A dyspepsia é muito freqüente na primeira infância e no periodo do tempo que decorre dos 20 annos aos 50, é o que provão o quadro estatístico de Child e as observações de Dick e Willième ; é mais commum no sexo feminino do que no masculino, não porque aquelle tenha uma predisposição innata para adquirir esta nevrose, mas porque se expõe a maior numero de causas que, como acabámos de vêr, dão lugar ao apparecimento delia ; Beau attribue á hereditariedade um papel importante no apparecimento da dyspepsia; mas na falta de dados estatisticos é, somente tendo em vista a transmissão da maioria das nevroses pela herança, que poderemos concluir a sua influencia na producção da dyspepsia. Symptomatologia e marcha.—A dyspepsia gástrica, não sendo mais do que uma nevrose, apresenta symptomas mui variados e exquisitos; desses uns são a expressão de uma lesão funccional do estômago, outros indicão lesões orgânicas desenvolvidas em conse- qüência do máo funccionalismo gástrico. Temos pois symptomas primitivos e secundários. Symptomas primitivos.—Diminuição, perversão do appetite consti- tuindo a pica e a malacia, algumas vezes augmento delle, chegando á bolimia e produzindo syncopes quando a fome não é Ímmediatamente sopitada ; a sede em geral conserva-se normal, porém algumas vezes é diminuida, outras exagerada (polydypsia) e apezar de ingerirem os dyspepticos grande quantidade de liquido conservão todavia seccura da bocca. Algumas horas depois da ingestão de qualquer substancia alimentar, queixão-se os individuos dyspepticos de um máo estar, de um peso epigastrico, de náuseas, de dores de caracter variável e que os incom- modão horrivelmente, cessando de ordinário todos esses phenomenos — 47 « com a passagem da substancia alimentar para o duodeno ou com sua expulsão por meio do vomito ou da regurgitação. A flatulencia é um dos symptomas que mais os persegue, por quanto além de produzir grandes dores pela dilatação exagerada da cavidade gástrica, dá origem á dyspnéa recalcando o diaphragma ; de mistura com gazes existem muitas vezes líquidos na cavidade estomacal produzindo pela succussão o ruído de glouglou que é perce- bido pelo doente e pelo medico, o qual, percutindo ouvirá, além do phcnomeno mencionado, um tinido metallico. O desapparecimento dos gazes da cavidade gástrica, quer tenhão sido expellidos por eructações successivas, quer pelo recto, quer ainda, segundo alguns, eliminados por absorpção, dão em resultado um allivio considerável para o doente. A secreção salivar é raras vezes augmentada, na maior parte dos casos é diminuída, apresentando-se a saliva mais espessa e viscosa do que de costume. A lingua é ordinariamente normal, apresentando algumas vezes um inducto esbranquiçado ou amarellado, desigual, menos espessado no Centro do que nos bordos, onde se vê impressões deixadas pelos dentes; este symptoma é para Chomel de incontestável importância na practica. Os dentes banhados continuamente por essa saliva espessa e ácida estragâo-se bem depressa ; o hálito é algumas vezes muito fétido e outras inodoro; os doentes sentem na bocca um gosto insipido ou amargo; ordinariamente são accommettidos de constipação rebelde, algumas vezes porém de diarrhéa e até de lienteria. Symptomas secundários.— Tosse ferina, quintosa, sem expecto- ração precedida de um prurido no larynge, aphonia, rouquidão antes ou depois das refeições. O professor Beau, em sua obra Traité de Ia dyspepsie, refere o facto de uma moça de 16 annos de idade, que, soffrendo perturbações das funcções digestivas, apresentava, durante o trabalho da digestão, - 48 - tosse e rouquidão a ponto de seus pais julgarem-na victima de uma affecção pulmonar ; submettida a um tratamento conveniente , as digestões forão-se fazendo cada vez melhor e a rouquidão e a tosse que a atormentavão desapparecêrão em pouco tempo. Os bocejos, os soluços, a dyspnéa em grande escala, são ainda symptomas importantes, fornecidos pelo apparelho respiratório. Cephalalgia ordinariamente frontal, vertigens chamadas dyspepticas, apparecendo quer o estômago se ache em estado de plenitude, quer no de vacuidade, somnolencia irresistível, principalmente depois de refeições abundantes e insomnia são symptomas freqüentemente observados nos individuos dyspepticos. A sensibilidade soffre diversas modificações dando em resultado as nevralgias intercostaes e cardiacas, as anesthesias e analgesias cutâ- neas, sensações illusorias, etc.: Leared nos refere factos de indi- viduos que durante a noite julgavão que algumas partes do corpo tinhão tomado proporções colossaes ; ha desordens na motilidade, mudança de caracter, hypocondria, difficuldade na expressão do pen- samento e inaptidão para qualquer exercício intellectual, mormente durante o trabalho digestivo. O máo desempenho das funcções digestivas, acarretando inevita- velmente alterações qualitativas do sangue, dá lugar a uma anemia, que, segundo Beau, pôde ser globular, albuminosa ou fibrinosa, acom- panhada de todos os symptomas que lhe são peculiares ; esta actúa sobre o organismo de modo a predispol-o á manifestação de diathe- ses, taes como a tuberculosa, a cancerosa, a escrophulosa, etc, e a ser aggredido mais facilmente pelas moléstias provenientes do exte- rior, como as phlegmasias e por certas affecções endêmicas ou epidê- micas. A moléstia progride constantemente, produzindo cada vez altera- ções mais profundas na economia, si o dyspeptico por incúria não recorrer logo á medicina que consegue muitas vezes debellal-a ou ao menos tornal-a estacionaria. - i9 - A dyspepsia, sempre caprichosa nos symptomas, o é também na marcha ; assim individuos dyspepticos vêm muitas vezes diminuirem e desapparecerem certos symptomas que muito os affligião e mais tarde sem causa manifesta esses mesmos symptomas voltarem com uma intensidade igual á anterior. É uma moléstia essencialmente chronica, a sua duração pôde prolongar-se por muitos annos. Prognostico. —A dyspepsia, comquanto raras vezes produza a morte, é todavia uma moléstia séria, porquanto o dyspeptico arrasta uma vida valetudinaria, sempre que, em conseqüência de certas cir- cumstancias, não pouder fugir das causas que a determinarão e que concorrem para seu progresso; demais as grandes desordens das funcções digestivas, alterando profundamente toda a economia e predispondo como já vimos ao apparecimento de certas moléstias augmentão a gravidade do proo-nostico. Diiataeão do estômago. A cavidade gástrica, é susceptível de dilatar-se assim como as cardicas e a cystica ; nos polyphagos notão-se dilatações do estô- mago ás vezes muito consideráveis sem que haja o perturbações da digestão nem alteração da saúde. Quando o estômago se dilata, as matérias ingeridas são nelle retidas e decompostas ou não ; no primeiro caso não se trata de um estado pathologico, a ampliação do órgão se faz regularmente, a camada muscular goza de grande contractibilidade e o orifício pylorico desce de modo a favorecer a passagem para o duodeno das substancias contidas no ventriculo; no segundo caso, porém, é a grande curvatura que se dilata, os orifícios cardíaco e pylorico se approximão, a contractibilidade muscular diminue dificultando a pa1--aoem das substancias da cavidade gástrica para o duodeno. Não trataremos da dilatação physiologica e occupando-nos da pathologica nada diremos da que é dependente de um obstáculo mechanico como sejão os tumores cancerosos, fibrosos, hydaticos, os estreitamentos do pyloro de uma porrão do intestino, os corpos estranhos etc, c nos oceuparcmos somente da que se acha ligada a uma alteração da contractibilidade muscular, quer esta seja devida a adherencias contrahidas pelo estômago com algum dos órgãos vizinhos, a um endurecimento do licido cellular submueoso ou interfibrillar, quer a destruição ou atrophia da túnica muscular quer, enfim, a uma paralysia do estômago análoga á que se dá na bexiga. Ohaussier em sua memória sobre as funcções do grande epiploon(l) diz: «1'ampliation morbifique de 1'estomac dépend, le plus ordinai- rement, d'un engagement au pylore qui arrete les aliments et en necessite raccumulation; dautres fois ellc dépend d'une inertie totale, d'un relAchement plus ou moins prompt des parois de ce viscère.» Antes delle já Lieutand (2) havia manifestado a mesma opinião que foi mais tarde seguida por Duplay (3). E principalmente ua idade avançada, nos polyphagos, nos polypo- ticos, nos individuos que abusão de bebidas alcoólicas, nos hydro- picos e cacheticos, que mais vezes se observa a ampliação mórbida do estômago, independente de uma cansa mechanica. Anatomia pathologica.— O estômago apresenta-se muito aug- mentado de volume oecupando quasi toda a cavidade abdominal e invadindo a exeavação pelviana. Manchard observou um caso citado por Duplay, em que a capacidade da cavidade gástrica era de seis litros; em Strasburgo existia um estômago de um soldado húngaro notável por sua enorme amplidão. (1) Chaussier; Mémoire sur les fonetions du grand epiploon. Mém. de 1'Acad.de Dijon; ann. 1784. \ (2) Lieutaud; Relat. d'une maladie rare de 1'estomac (Mém, de 1'Acad. des sciences) Année 1752, pag. 223. (3) De rampliat.ion mor bidê de Pestomae considerou snrtout sous le rapport de ses causes et de son diagnostic. Arch. de méd. Ann. 1833. 2' serie. T Illpag 186. r - 51 - As paredes do estômago podem não apresentar alterações, porém ordinariamente ellas existem, consistindo em adelgaçamento ou espessamento das túnicas, edemacia do tecido cellular subjacente e atrophia muscular acompanhada de steatose; as matérias con- tidas no estômago são idênticas ás que são expellidas pelos vômitos, e os órgãos da cavidade abdominal se achão recalcados ( atrophiados em conseqüência da piessão constante sobre elles exercida pelo estômago grandemente dilatado. Syniploniatologia.—O appetite é augmentado e algumas vezes devorador; o estado geral não se acha em relação com a quantidade ingerida de alimento* ; depois das refeições abundantes alguns experimentão uma sensação de plenitude, de peso na região epi- gastrica, outros de vacuidade que os leva a ingerir nova quan- tidade de alimento. No começo da moléstia os doentes tem vômitos, depois dos quaes se sentem alliviados, algumas vezes são provocados peh? excitaçâo feita com o dedo sobre a lueta ; com o progresso do mal a contractibilidade diminue, o estômago desce em virtude de seu peso e afasta-se do diaphragma, de sorte que quando este se contrahe o toca muito superficialmente, dahi resulta o desap- parecimento dos vômitos que são substituídos por largas evacuações intestinaes. Explorando-se o abdômen, por meio da apalpaçâo antes do vomito ou das largas evacuações intestinaes, sente-se um tumor que, do hypocondrio esquerdo se dirige para a espinha illiaca do mesmo lado, para o hypogastro subindo para o hypocondrio direito, fluetuação acompanhada de ruido de glouglou o qual muitas vezes se percebe a alguns passos de distancia ; pela percussão encontra-se no epigastro som claro que vai tornando-se obscuro á proporção que se caminha para o hypogastro ; si os doentes têm esvasiado a cavidade gástrica, esses phenomenos tornão-se menos pronunciados ou desapparecem; fazendo-se o doente ingerir uma certa quantidade de liquido em temperatura baixa, este sente o liquido descer até a parte inferior do abdô- men . A marcha é lenta,, a duração longa, não podendo ser preci- sada, porquanto a moléstia origina-se quasi sempre de um modo obscuro. Prognostico.—E urna moléstia grave sempre que depender de uma lesão orgânica, quando, porém, a causa que lhe deu origem fôr da ordem daquellas capazes de serem removidas, quando a dilatação fôr pouco considerável e o estado geral regular, podere- mos esperai* conseguir, por uni tratamento conveniente, uma cura completa ou ao menos um melhoramento considerável. Perfuração e ruptura, Estas duas lesões se achao intimamente ligadas entre si, e muitas vezes a ruptura é o complemento brusco de uma. perfuração conte cada anteriormente por um trabalho mórbido. Tratando de outras affecções do estômago, já dissemos algumas palavras a respeito de perfuração , cujos symptomas varião muito, conforme a communicação é estabelecida entre o estômago e os órgãos vizinhos, ou entre elle e a cavidade peritoneal. Si a communicação do estômago se estabelecer com a pleura, tere- mos os symptomas de um hydropneumothorax ; si com o colon trans- verso, um estado de depauperamento, de marasmo se manifestará em pouco tempo; si com as paredes abdominaes, sendo estabelecidas adhe- rencias prévias em virtude de um trabalho inflammatorio lento, tere- mosuma fistula gástrica que relevantes serviços tem prestado á physiologia, permittindo experiências sobre a digestão estomacal, como — 53 — as observadas por Beaumont (*) e por Bidder e Schmidt; si a perfu- ração do estômago fizer comnmnicar este órgão com o peritoneo, apresentar-se-hão então todos os symptomas de uma peritonite supe- raguda, entre os quaes dores intensas manifestando-se repentinamente no momento em que se dér a perfuração, grande agitação, extremi- dades e suores fidos, freqüência e pequenhez do pulso . A ruptura do estômago, freqüente nos animaes cavallares e bovinos, é felizmente muito rara no homem, n aquelles é devida a um desen- volvimento considerável de gazes na cavidade gástrica, em conse- qüência da fermentação ácida das hervas frescas; nas autópsias prac- ticadas em cadáveres humanos, tem-se encontrado no abdômen líqui- dos effervescentes e escumosos; a anal}rse chimica tem revelado grande quantidade de ácido acetico e traços de arsênico em proporção incapaz de produzir envenenamento, donde se concluio por analogia que a ruptura do estômago era nestes ca: os produzida pelo desprendimento de gazes resultantes da fermentação ácida. Depois de uma refeição copiosa, sentem aquelles em quem breve se dará um ruptura do estômago, dores intensas na região epigas- trica e uma constricção na base do thorax, têm náuseas, fazem esforços para vomitar, e algumas vezes conseguem expellir pequena quanti- dade de mucosidade; a sede é intensa e o pulso lento e regular ; estes symptomas, prelúdios da ruptura, tornão-se moderados por algum tempo para reapparecerem com maior intensidade algumas horas depois, isto é, na occasião em que a ruptura teve lugar ; agora a dôr abrange todo o ventre, este apresenta-se abahulado, a face decom- põe-se, o pulso torna-se freqüente, miserável, filiforme, a agitação augmenta consideravelmente, um suor frio e viscoso cobre as extre- midades, e a morte põe termo a esta terrível scena. Segundo Lefèvre, a perfuração do estômago é mais freqüente na mulher do que no homem ; já dissemos, tratando da ulcera, que esta tinha uma certa predilecção para o sexo feminino, e o autor acima (r) Kistula gástrica de Alexia Saint-Martin. — 5i _ referido cita sete casos de solução de continuidade do estômago, todos observados em mulheres, cinco dos quaes erão provenientes de ulcera gástrica e dous de verdadeira ruptura. O prognostico da perfuração e da ruptura é sempre muito grave, mas a cura não é do todo impossível; duas observações citadas por Luton (1) (uma de Hughes e Ray seguida de cura. de reincidência quatro mezes depois e de morte, outra análoga a esta de Bineau de Saumur), e uma terceira de Delpech (2'), que se refere a uma mulher que, tendo tido uma perfuração estomacal, entrava em convalescença oito dias depois, quando, em conseqüência de abuso do regimen, appa- recerão-lhe vômitos que destruirão as adlierencias contrahidas e uma peritonite superàguda, que em poucos dias terminou-lhe a existência, provão que a cura é possível. Polypos. Na cavidade gástrica existem muitas vezes excrescencias pedicu- ladas ou não, que não são mais do que vegetações de natureza can- cerosa, ou o resultado da hypertrophia de algumas villosidades, como já vimos em outro lugar. Em alguns casos, mui raros, existem verdadeiros polypos, mucosos ou fibrosos, idênticos aos das fossas nasaes, vagina, utero, etc; não apresentão symptoma algum apreciável, salvo quando o seu volume, tornando-se muito considerável, difficulta a passagem dos alimentos para o duodeno, tornando as digestões difficeis e dolorosas. Si o polypo se assestar no orifício pylorico, como em um caso observado por Husson, apresentar-se-hão symptomas bem salientes e de immensa gravidade, taes como dores intensas, vômitos e diffi- culdade ou imposibilidade das digestões ; em pouco te mpo sobrevém o marasmo e afinal a morte. (1) Diction. de Jaccoud, tom. 14, pag. 3r>á ; 2) Memorial des hôpitauy du midi pour 1'année 1830. l)l.ifi.\OSTICll DIFFERE\tlAL Toute Ia médecine est dans Ia science des indic.-itions. Et Ia premièie, Ia plus importante de ces indications cVst Ia corniaissanee de Ia maladie qu'on doit combattre. (Rostan méd. clinique). Cancro do estômago, Dous são os symptomas que, embora não pathognomonicos, devem levar o medico ao diagnostico do cancro do estômago: lu os vômitos negros ; 2" o tumor no epigastro ou em um dos hypocondrios acompanhando os movimentos do órgão. O vomito negro tem sido considerado por alguns como symptoma pathognomonico do cancro; está. porém, mui longe de sel-o, porquanto é observado na ulcera sempre que, a hemorrhagia sendo pouco considerável, o sangue derramado na cavidade gástrica é expellído depois de ter soffrrdo a acção do sueco gástrico. Em um caso, porém, o vomito será symptoma pathognomonico da existência de um cancro, quando o microscópio nos revelar a existência das cellulas características desta affecção de envolta com as substancias expellidas pelo vomito. Para que, pela presença do tumor, não sejamos levados a erro, deveremos prestar-lhe toda a attenção afim de não tomarmos por tumor da cavidade gástrica o que se achar assestado em algum dos órgãos vizinhos ; assim, um tumor do figado, um accumulo de cálculos na vesicula biliar, de matérias fecaes no colon trans- verso, um aneurysma da aorta ao nivei do tronco eceliaco podem — 5f> — induzir a erro o medico que não examinar o tumor com a devida cautela, fazendo variar as posições do doente, empregando a apal- pação, a percussão, prestando attenção aos movimentos do tumor e que não attender aos phenomenos consecutivos á sua existência. Cancro e ulcera. E de extrema difficuldade o diagnostico differencial entre o cancro e a ulcera do estômago : confirmào esta assereão os erros que commettem constantemente médicos notáveis pelo talento, por longa pratica e vasta erudição. Si existir tumor epigastrico acompanhado de todos os symptomas peculiares ao cancro, o diagnostico será feito Ímmediatamente, mas si faltar este symptoma importantíssimo, em que se baseará o medico para o diagnostico ? Na marcha da moléstia e na differença dos effeitos do regi- men e do tratamento; eis como nos responde Cruveilhier, que consumio longos annos no estudo desta questão ; accrescentare- mos que, em taes casos, a idade do doente pôde ser de grande auxilio para o medico ; si aquelle tiver menos de 35 annos ou mais de 65, serão tanto maiores as probabilidades em favor da ulcera, quanto mais se acharem os individuos em questão áquem dos 35 annos de idade ou além dos 65; deveremos ter em muita consideração a herança e a preexistência de um tumor canceroso ; si pelos commemorativos conhecermos que um ou mais membros da familia fallecêrão victimas de moléstia cancerosa, ou que o próprio doente teve um tumor maligno em qualquer outro órgão, poderemos, sem receio de errar, estabelecer o nosso dia- gnostico. A existência do tumor não deve levar o medico a diagnosticar — 57 — ímmediatamente um cancro do » stomago. porquanto a ulcera do estômago, diz Woillez, dá lugar a exsudações plásticas que, espes- sando-se, dão-nos pela apalpação a sensação de um tumor e pela percussão um som obscuro, fazendo-nos crer erradamente na exis- tência de um tumor canceroso. A ulcera do estômago apresenta algumas vezes todos os symp- tomas do cancro, e o Dr. Herard, medico do hospital de Lanboisière apresentou em 1856 á sociedade medica dos hospitaes nma observação de um caso de ulcera do estômago com todos os symptomas do cancro. Apresento este exemplo para mostrar como estas moléstias se confundem e aproveito a occasião para lembrar que em casos idênticos devemos suppor que temos diante de nós a moléstia curavel, a ulcera contra a qual devem ser dirigidos todos os nossos esforços. No cancro o regimen dietetico, quando não fôr prejudicial, será inútil ; na ulcera é um meio poderosissimo, que em poucos dias me lhora consideravelmente as condições do doente; a alimentação láctea, que na. ulcera do estômago tem dado tão brilhantes resultados, é um dos recursos de que o medico deve lançar mão para o diagnostico destas duas affecções. « Uma das particularidades mais notáveis da ulcera do estornado, diz Nonat, e que por mais de uma vez me tem valido para, estabelecer o diagnostico, é a tolerância perfeita, do estômago para o leite, quando a, maior parte dos alimentos e das bebidos são obstinadamente expel- lidas pelo vomito. (1) A diminuição do appetite, a anorexia são symptomas freqüentemente observados no cancro do estômago ; na ulcera não ha anorexia, os doentes affectados desta moléstia privão-se, como já dissemos tra tando da symptomatologia, o mais que podem da ingestão de ali mentos, em conseqüência das horríveis dores de que são victimas. Os vômitos, dependentes de uma affecção cancerosa do estômago, (1) These do Dr, Moncorvo de Figueiredo. P-:g. 128. 4 ií — r.K - têm lugar em qualquer hora do dia, sendo expellidas por elles sub- stancias alimentares ingeridas dous, três dias antes e não produzem influencia alguma benéfica nos soffrimentos do doente ; na ulcera os vômitos têm lugar depois das refeições e fazem diminuir considera- velmente as dores que atormentão o doente por occasião da ingestão dos alimentos. As hemorrhagias são a favor da ulcera, mormente si forem abun- dantes, quer a sua existência nos seja revelada pela hematemese, pela côr e consistência das fezes, quer pelos symptomas de hemorrhagia interna: no cancro também se observáo extravasacòes sangüíneas : ' • O 7 estas são em geral em pequena escala, e, quando abundantes, só apparecem depois da ulceração do cancro, isto é, em um período adiantado da moléstia, quando de ordinário já se acha completamente dissipada a duvida do diagnostico. Existe geralmente dôr em ambas estas affecções ; quando, porém, faltar este elemento, será em um caso de cancro e nunca de ulcera-, naquelle a dôr é pouco intensa, com caracter variável, raras vezes augmentando pela pressão ou ingestão de alimentos, nesta a dôr é mais intensa e urente, mordicante, fixa nos pontos ditos xyphoidiano s e rachidiano e exacerba-se sempre pela pressão e inorestão de ali- mentos . O professor Trousseau, baseando-se em muitas observações clinicas do Hotel-Dieu sobre a phlegmasia alba dolens, deu-lhe uma immensa importância como symptoma do cancro ; todas as vezes, diz este celebre clinico, que se hesitar no diagnostico entre uma gastrite chro- nica, uma ulcera e um cancro, a presença de uma phlebite obliterante tirará todas as duvidas e levará o medico a pronunciar-se pelo cancro. A ulcera tem uma duração muito mais longa do que o cancro* segundo os autores, os individuos affectados da primeira destas mo- léstias vivem ordinariamente muito tempo, 4 a 17 annos Lutou), os da segunda, podendo fallecer victimas delia no fim de 30 dias, nunca prolongão a sua penosa existência por mais de três annos (Brinton). — 59 - Cancro do estômago e gastrite catarrhal chronica. Ainda nos achamos em grande embaraço no diagnostico diffe- rencial entre o cancro c a gastrite catarrhal chronica, mormente quando aquella affecção datar de pouco; o diagnostico, porém, não será impossível si attendermos a certos symptomas : os vômitos negros e viscosos são muito freqüentes no cancro e raros na gastrite catarrhal chronica; no cancro as substancias ingeridas demorão-se, de ordinário, por muito tempo no estômago, só sendo expellidas pelos vômitos algumas vezes muitos dias depois, o que não se dá na gastrite ; nesta ha febre qne ou manifesta-se conti- nuamente, ou por um ligeiro augmento de temperatura á tarde; o cancro é raramente acompanhado de febre, e quando esta se apresenta não traz confusão alguma para o diagnostico, porque nesta occasião já a cachexia cancerosa tem impresso no individuo o sigillo indelével do carcinoma; a ausência do tumor fará inclinar o nosso espirito para a existência de uma gastrite catarrhal chronica, na qual o tumor só apparece por excepção, sendo pelo contrario muito freqüente no cancro ; além disso, o depauperamento rápido, a idade do individuo e a existência da diathese cancerosa no doente ou em algum membro da familia, são poderosos auxiliares para o diagnostico differencial. Diagnostico da sede do cancro. Feito o diagnostico do cancro do estômago, ainda é necessário completal-o determinando em que parte do órgão se acha assestada a affecção cancerosa. O cancro do pyloro produz vômitos que tem lugar horas, um. F,0 - dous, três e mais dias depois das refeições, e como é de ordinário acompanhado de pylorostenose, os alimentos vão se accumulando na cavidade gástrica, dando em resultado uma dilatação delia. Oayol (1) diz que a situação do tumor ao lado direito do epigastro entre as falsas costellas e o umbigo é um grande auxiliar para o diagnostico do cancro do pyloro ; nós, porém, concordamos com Chardel que não dá importância alguma a esse symptoma, atten- dendo ás alterações de posição que soffre o estômago aftectado da degenerescencia cancerosa. O apparecimento de vômitos Ímmediatamente depois dos alimentos terem penetrado na cavidade gástrica, ou antes de ahi chegarem, o embaraço na deglutição dos líquidos ou dos sólidos, a dôr na região epigastrica, ás vezes mt cspadua direita, caiacterisão o cancro do cardia ; no da pequena curvatura, a dôr se assesta na região interscapular; e finalmente no da face posterior, na região dorsal média, e na parte inferior da lombar. Estes dados, porém, estão longe de ter uma importância real, e se enganará muitas vezes na sede da lesão o medico que, baseado nelles, quizer sempre precisal-a. Da ulcera. Cruveilhier, na 12a parte de sua memória sobre a ulcera do estômago publicada na Gazeta dos hospitaes (Pariz), diz que a existência da ulcera do estômago pôde ser sempre suspeitada e quasi sempre positivamente diagnosticada. As moléstias gástricas que com ella se podem confundir são : a gastrite catarrhal chronica, a gastralgia e o cancro ; tentaremos (1) Traité des maladii:,- cíhicÓicuscs 1833. - 61 — dirfeiençal-a das duas primeiras, e a respeito do cancro nada mais aoereòcentaremos ao que íicon dito quando tratámos do diagnostico differencial entre elle e a ulcera. Ulcera e gastrite catarrhal chronica. A ulcera do estômago se desenvolve de ordinário consecutiva- mente a uma gastrite chronica, de sorte que no começo os symptomas são quasi os mesmos, diftérindo algum tanto a ulcera pela maior intensidade e fixidade da dôr, que se exaspera pela pressão e ingestão de alimentos e diminue ou cessa pela expulsão delles ; quando, porém, a moléstia se acha em periodo adiantado, quando o doente aceusa dôr fixa abaixo do appendice xyphoide com repercussão para o dorso, quando sobrevém gastrorrhagias e vômitos sangüíneos, caracteres importantíssimos da ulcera, desapparece completamente a confusão que poderia haver entre estas duas affecções. O Dr. Niemeyer chama a attenção dos médicos para o estado da lingua, que na ulcera se apresenta rubra e lisa, e na gastrite coberta de uma camada de saburra ; esse caracter da lingua, comquanto não seja muito fiel, como faz sentir o celebre pathologista allemão: todavia não devemos desprezal-o, porque pôde servir-nos de poderoso auxiliar em casos duvidosos. Ulcera do estômago e gastralgia E de summa importância o diagnostico differencial destas duas lesões, porquanto si confundirmos um cancro com uma ulcera do estômago, sendo aquelle uma moléstia incurável, o tratamento diri- gido contra a supposta em nada prejudica ao doente ; si confundirmo _ (,2 — uma ulcera do estornado com uma gastrite catarrhal chronica, a therapeutica a empregar sendo mais ou menos a mesma para ambas as affecções, não pôde d ahi provir grande inconveniente ; o mesmo não acontece, porém, com a confusão entre a ulcera a gastralgia; tendo cada uma dellas uma therapeutica diversa, é claro que um erro de diagnostico, acarretando uma medicação inconveniente, trará grandes males para o doente. Procuraremos em poucas palavras estabelecer os dados que devem afastar o medico de uma confusão tão prejudicial. A dôr gastralgica é brusca, não persistente, mal circumscripta. âpparece ordinariamente de manhã, diminue pela pressão methodica e pela ingestão de alimentos; a que provém de uma ulcera apre- senta-se ordinariamente no ponto xyphoidiano correspondendo ao rachidiano, para os quaes mais de uma vez temos chamado a attenção, exaspera-se pela pressão, embora methodica, e pela ingestão de alimentos. A gastralgia é raramente acompanhada de vômitos ; quando estes apparecem é em uma época mais ou menos afastada da ingestão dos alimentos e constão de ordinário de substancias líquidas, mas nunca de sangue, sendo as sólidas freqüentemente conservadas na cavidade gástrica; a ulcera traz vômitos freqüentes e nas matérias vomitadas se encontrão substancias ingeridas, sólidas e líquidas indistinctamente, misturadas ás vezes com sangue puro ou alterado, tendo lugar ordinariamente logo depois da ingestão dos ali- mentos . Na gastralgia o appetite é exquisito e o emmagrecimento pouco considerável, apparecem vertigens, palpitações, hysteriae hypocon- dria; na ulcera o appetite é normal, ás vezes diminuido, o emmagrecimento é considerável e raras vezes âpparece a hvpo- condria. - 03 - Da sede da ulcera, O ponto em que a dôr se localisa e o decubito do doente dão ao medico grandes probabilidades de marcar precisamente a sede da lesão gástrica. A dôr na região umbilical indica quasi sempre ulcera na grande curvatura ; quando esta é exagerada e desviada do epigastro para o hypocondrio esquerdo, faz presumir uma ulcera na extermidade cardíaca. Brinton observou 2 cardia; a dôr e o decubito achavão-se perfeitamente, de accordo com o que acabámos de expender. O intervallo de tempo decorrido entre a ingestão dos alimentos e o vomito, a atrophia e a dilatação do estômago, não devem passar desapercebidos ao medico observador, pois são de grande impor- tância para o diagnostico differencial entre uma ulcera do cardia e do pyloro. Gastrite catarrhal aguda, O diagnostico da gastrite catarrhal aguda é ordinariamente fácil; quando esta se apresenta sob a fôrma branda é logo reconhecida pelo peso na região epigastrica, inappetencia, tédio para os alimen- tos, náuseas e cephalalgia supra-orbitaria, symptomas estes qnc desapparecem com a administração do tartaro emetico ou da ipeca- cuanha era dose vomitiva; quando .1 gastrite se reveste da fôrma — (Vi — grave, o diagnostico é mais difficil, porém sempre possível; no pri- meiro caso póde-se confundir com a dyspepsia, de cujo diagnos- tico differencial trataremos adiante, no segundo com a gastral- gia e a gastrite tóxica, das quaes passamos a differençal-a. Gastrite catarrhal aguda e gastralgia. Esta nevralgia pôde algumas vezes apresentar confusão com a febre gástrica pela analogia de alguns symptomas, esta, porém, dcsappa- recerá desde que o medico prestar a devida attenção aos pheno- menos: dôr, appetite, vômitos e febre. Na gastrite catarrhal aguda ha dôr pela pressão, diminuição de appetite ou anorexia, vômitos biliosos e febre mais ou menos intensa ; na gastralgia a dôr é espontânea, cessando pela pressão methodica feita com a palma da mão, o appetite se conserva ordi- nariamente normal, as substancias expellidas pelo vomito são constituídas por alimentos ou mucosidades e ha apyrexia. Gastrite catarrhal aguda e gastrite tóxica. A gastrite catarrhal aguda de fôrma grave, que temos denomi nado com alguns autores — febre gástrica —, se distinguira da gastrite tóxica por apresentar-se esta sempre acompanhada de phenomenos que sobrevém mais rapidamente e revestidos de maior intensidade do que aquella ; alem disso, os commemorativos, o estado da bocca, quando se tratar de venenos cáusticos, a marcha e a duração da moléstia facilitão extremamente o diagnostico. — 65 - Gastrite catarrhal chronica e dyspepsia. A gastrite chronica é acompanhada de dôr pouco intensa, sendo esta incrementada pela pressão e pela ingestão de alimen- tos ; repercute rapidamente sobre todo o organismo os effeitos perniciosos provenientes das freqüentes perturbações da funcção de nutrição, caracterisadas ao principio sobretudo por emmagre- cimento e pallidez e mais tarde por alterações de todos os órgãos. Na gastrite a lingua se apresenta rubra na ponta e nos bordos e muitas vezes saburrosa no centro ; o epigastro apresenta-se tenso e a percussão nos fornece um som obscuro. Na dyspepsia os doentes sentem, durante o trabalho da digestão, máo estar e peso na região , epigastrica; são accommettidos de vertigens, de cephalalgia frontal, ás vezes de nevralgia intercostal; a perturbação das funcções digestivas traz em scena a anemia, que os predispõe a diversas affecções mórbidas; a lingua apresen- ta-se de ordinário normal, ás vezes coberta nos bordos de uma tênue camada de saburra que vai-se tornando espessa á proporção que se approxima do centro. A percussão do epigastro dá som normal nas diversas fôrmas da dyspepsia, menos na flatulenta, em que o som é tympanico. Gastrite catarrhal chronica e gastralgia. Na gastrite catarrhal chronica a dôr é surda, continua e augmenta pela pressão e pela ingestão de alimentos; as digestões se fazem com lentidão, os vômitos são freqüentes, os alimentos sólidos são de pre- ferencia expellidos e os liquidos conservados, o depauperamento — 66 — caminha rapidamente e os individuos affectados delia morrem emma- rasmados ; o appetite é diminuído, chegando ás vezes á anorexia, mas nunca é pervertido ; as dejecções são diarrheicas, biliosas ou sangui- nolentas; as ourinas carregadas e em pequena quantidade, a febre é continua ou intermittente, o calor do ventre augmentado ; a lingua apresenta-se vermelha na ponta e nos bordos com uma camada de saburra amarello-esbranquiçada e os dentes exhalão máo hálito. Quando fizemos o diagnostico entre a ulcera e a gastralgia, demos os caracteres da dôr desta ultima, os quaes se achão em completa opposiçâo aos apresentados pela gastrite catarrhal chronica. Na gastralgia as digestões são normaes e ás vezes se fazem em um tempo mais curto que o ordinário ; os vômitos são raros e as substan- cias líquidas são as expellidas ordinariamente ; o appetite é irregular ou exquisito, e apezar disto os gastralgicos conservão por muito tempo um estado geral satisfactorio ; ha ordinariamente constipação e as fezes são de consistência normal ou endurecidas, as ourinas abundantes e claras; não ha febre, e a lingua apresenta-se humida, larga, despida de induto saburroso ou coberta de tênue camada de saburra e algum tanto avermelhada na ponta. Da sede da gastrite catarrhal chronica. Quando a grastrite catarrhal chronica não abrange a totalidade do órgão, isto é, quando é parcial, ataca de preferencia os três pontos seguintes: o cardia, a grande curvatura e o pyloro. Quando se assesta no cardia, os doentes accusão dôr e difficuldade na deglutição, sentem dôr urente na região epigastrica, que só cessa depois de terminada a digestão, vomitão pela manhã um liquido mais ou menos ácido, sentem ardor e seccura no pharynge, devidos á accumulo de mucosidades provenientes do estômago. Quando a gastrite se localisa na grande curvatura os doentes — 67 - nao sentem dôr nem difficuldade na deglutição, nem mesmo depois que os alimentos penetrarão na cavidade gástrica, experimentão uma sensação desagradável e parece-lhes que uma cinta aperta-lhes fortemente a base do thorax; durante a digestão estes symptomas se exasperão. Si é no pyloro que se manifesta a inflammação, os doentes não experimentão dôr, sentem pelo contrario prazer por occasião da ingestão dos alimentos; é durante o trabalho da digestão que so- brevém as dores no hypocondrio direito e na espadua acompanhadas de náuseas e de regurgitações. Gastrite tóxica e phlegmonosa. A gastrite tóxica póde-se confundir com a phlegmonosa pela intensidade dos phenomenos e pela rapidez com que estes apparecem; um exame, porém, bem dirigido, faz desapparecer toda a duvida que possa existir no espirito do medico. Na gastrite tóxica os phenomenos intensos durão menos tempo do que os da gastrite phlegmonosa; esta é acompanhada de vô- mitos biliosos, que, examinados com cautela, revelão ás vezes, a existência de pús misturado com bile, tornando-se então um sympto- ma de grande valor para o diagnostico, emquanto aquella traz vô- mitos contendo alimentos sólidos ou líquidos misturados com sangue e com parte da substancia tóxica ingerida; além disto as alterações, que, na gastrite tóxica apresentão a bocca e o pharynge, produzidas pela acção das substancias tóxicas, as sensações de dôr e ardor no pharynge e esophago, as eólicas atrozes, a diarrhéa, os comme- morativos, a presença de substancias venenosas junto ao doente, e a pouca freqüência da gastrite phlegmonosa em relação á tóxica, nos levão quasi sempre a um diagnostico exacto. Da linite chronica. Como já dissemos, quando tratámos da linite, esta moléstia tem sido considerada rarissima. Brinton, porém, julga que muitos médicos tem sido levados á esta conclusão, por terem considerado como affectados de cancro individuos cuja affecção mórbida era uma linite. Para se estabelecer o diagnostico, que muitas vezes é impossível entre o cancro e a linite chronica, devemos attender: á idade do doente; o cancro ataca de preferencia os individuos de certa idade, de 35 a 65 annos, poderemos considerar como média a idade de 50 annos; a linite tem sido observada em individuos de 30 a 40 annos, média 35 annos; a degenerescencia cancerosa, invadindo o estômago, produz um tumor que, quando se torna apreciável pela apalpação, predomina a extensão sobre a altura, o contrario se dá na linite. Esta moléstia tem uma marcha muito mais lenta e uma duração muito mais longa do que o cancro; pôde durar 10 a 15 annos, emquanto o cancro dura no máximo 3 annos e termo médio 15 mezes; no cancro notão-se certas particularidades na expulsão pelo vomito das matérias ingeridas, o que não se dá na linite. Em resumo, a idade do doente, a fôrma do tumor, a marcha, a duração da moléstia e certas particularidades que apresenta o vomito, são dados preciosos para o diagnostico differencial destas duas lesões. Gastralgia e cancro. Não é difficil o diagnostico differencial entre a gastralgia e o cancro do estômago. As dores observadas na gastralgia são muito mais intensas e - 69 — mais rápidas em seu apparecimento ; ha grande tendência para a hypoccndria, os vômitos, as regurgitações e a pyrosis são muito menos freqüentes; o cancro tem uma marcha lenta, mas incessan- temente progressiva, a dôr observada no cancro é revestida de menor intensidade e longe de diminuir pela pressão methodica como a dôr gastralgica, exacerba-se pelo contrario; a gastralgia, perten- cendo ao grupo das nevroses tem a marcha peculiar a ellas; isto é : irregular, caprichosa, intermittente. Si a estes symptomas que, por si só são sufficientes para dif- ferençar estas duas affecções, se ajuntarem os vômitos negros, o tumor epigastrico ea cachexia câncer, sa, o diagnostico differencial torna-se em taes casos tão fácil, que só pôde o erro ser filho de extrema ignorância. Gastralgia e dyspepsia. A dispepsia e a gastralgia existem muitas vezes reunidas em um só individuo, o que faz com que o medico se veja em sérios embaraços, quando tem de emittir um juizo diagnostico. A gastralgia se distingue da dispepsia pela intensidade e inter- mittencia da dôr, que, em geral, âpparece antes das refeições e (iiminue ou cessa pela pressão methodicamente exercida com a palma da mão e pela ingestão de alimentos; o appetite, de ordi- nário , não se altera, as digestões fazem-se ás vezes mais promptamente do que no estado normal e os symptomas secundários são insignificantes ou tardios. Na dyspepsia, quando ha dôr, esta se manifesta durante o trabalho da digestão que então é demorada e laboriosa; o appetite é irregular caprichoso ou pervertido e os symptomas secundários, depen- dentes do máo fuDecionalismo do órgão, apparecem dentro de pouco tempo. - 70 — Dyspepsia e cancro. A affecção cancerosa em começo pôde ser confundida muito facil- mente com a dyspepsia; os symptomas são quasi idênticos, e nem é para admirar que assim seja, porquanto o cancro do estômago é acompanhado de uma dyspepsia symptomatica ; si o cancro se apresentar com alguns dos symptomas que o caracterisão como o tumor, os vômitos negros e alguns outros, que já mencionámos quando tratámos do cancro, será fácil o diagnostico; no caso con- trario, deveremos suspender o nosso juizo até que a marcha da moléstia e as alterações que fôr soffrendo a constituição do doente nos possão guiara um diagnostico exacto. Dyspepsia e embaraço gástrico. A dyspepsia póde-se confundir com o embaraço gástrico; mui- tas vezes este não é mais do que um symptoma daquella, algumas, porém, apresenta-se como uma moléstia inteiramente independente da primeira, principalmente no começo das pyrexias agudas. O apparecimento rápido dos symptomas, a anorexia quasi completa, a bocca pastosa e amarga, a lingua coberta de saburra branco-amarellada mais ou menos espessa, e a côr amarellada das alas do nariz são os principaes symptomas do embaraço gástrico em que o medico se deve basear para estabelecer o diagnostico. Si os symptomas forem de tal sorte obscuros que o medico só por elles não possa emittir o seu juizo, recorrerá á therapeutica, administrará um vomitivo, depois do qual desappareceráõ todos estes symptomas, si forem dependentes de um embaraço gástrico. - 71 — Dilatação. A dilatação do estômago tem symptomas tão particulares, que, baseando-nos nelles, é impossivel confundil-a com qualquer lesão deste órgão. Alguns practicos distinctos a têm confundido com a ascite e com a prenhez ; Jodon, tendo feito em uma mulher o diagnostico de uma prenhez, vio com sorpreza passar a época da expulsão do feto; modificando o seu diagnostico admittio uma ascite ; Chaussier, em um doente considerado ascitico, practicou a gastrocenthese e Bonnet cita o facto de uma mulher que, tendo o ventre muito desenvolvido, fora julgada grávida; as autópsias forão praticadas e em todos estes individuos se encontrou dilatação gástrica. A ascite começa pelas partes m ais declives, pelos flancos e pelo hypo- gastro e não apresenta o ruido hydroaerio ; quando a moléstia se acha muito adiantada o emprego da bomba estomacal faz desapparecer toda a duvida. O tumor da prenhez apresenta uma convexidade para a parte superior, pela apalpação póde-se perceber os movimentos do feto e a auscultação nos revela os batimentos cardiacos ; si estes meios nos forem insuíficientes, empregaremos o tocar vaginal, por meio do qual chegaremos a um diagnostico exacto. Perfuração e ruptura A perfuração e a ruptura não podem ser confundidas com outra moléstia do estômago, e isto se conclue da symptomatolo- gia que expuzemos; convém, porém, distinguil-as entre si, por- quanto grande é a semelhança dos symptomas que apresentão. - 72 - Na perfuração os symptomas precursores têm uma duração muito mais longa e algumas vezes faltão ; na ruptura os pheno- menos precursores sobrevém rapidamente e durão pouco tempo ; devemos, além disso, recorrer á etiologia que nos presta um valiosis- simo auxilio no diagnostico differencial destas duas affecções. Polypos. Só podem ser confundidas estas producções mórbidas com o cancro ; a raridade do polypo, a idade e os commemorativos do doente, a ausência de vômitos melanicos e da cachexi i cancerosa são as bases em que se deve firmar o medico para estabelecer o diagnos- tico entre estas duas affecções. j Prolonga-se por muito tempo. tempo âpparece a hypocondria, causa | de uma vida lastimosa e desgraçada. Quasi sempre pela cura ; quando est i nau se dá, os doentes conservâo o seu mal até que outra moléstia venha terminar-lhes a existência. Raramente termina pela morte. (*) Para a. confecção deste quadro nos utilisimos d.is theses do» Srs. Drs. Feijó Juaior, Girault e Lemoine. SEGUNDO PONTO CADEIRA DE MEDICINA LEGAL Da asphyxia por siiiniersão. PROPOSIÇÕES I A morte na asphyxia por submersão é produzida por um envene- namento negativo do sangue, em virtude do qnal, este se acha em condições taes que não pôde entreter a vida do systema nervoso. II E muito diffícil, mas não impossível, determinar, pelo exame do cadáver, si a submersão teve lugar antes ou depois da morte. III O diagnostico da asphyxia por submersão se basêa em sympto- mas de duas ordens ; externos e internos. IV Entre os symptomas externos, damos grande importância ao estado do rosto, das mãos e dos pés, e á pelle de gallinha que é observada principalmente na superfície anterior dos membros. V Entre os internos, á injecção e escuma na trachéa, ao augmento de volume dos pulmões e á presença no estômago do liquido em que se deu n submersão. 4 A Kl - -\ - VI A presença no estômago e nas vesiculas pulmonares de um liquido semelhante áquelle em que o cadáver estava mergulhado, dá-nos probabilidade, mas não certeza, da morte por sub versão. VII Não ha signal thanognomonico da asphyxia por submersão ; pela reunião porém, de certos symptomas, podemos chegar a um diag- nostico exacto. VIII Verificada a morte por submersão, resta ainda saber si houve homicidio ou suicidio ; muita perícia e muita attenção para todos os phenomenos que o cadáver apresenta levão muitas vezeA o medico legista a emittir um juizo exacto. IX A putrefacção é uma das causas que mais difficulta o diagnostico. X São differentes os pontos por onde começa a putrefacção em um cadáver mergulhado na água e em um outro exposto ao contacto do ar. XI A putrefacção dos cadáveres na água começa sempre pela face, a dos expostos ao contacto do ar sempre pela região umbilical. XII Em ambos os casos os anti-braços e as pernas são as partes que resistem por mais tempo á putrefacção. XIII Dos gêneros de morte por asphyxia por submersão, os mais freqüentes são: a hyperhemia dos órgãos thoracicos e a neuroparalysia; o menos freqüente é a hyperhemia cerebral. TERCEIRO PONTO CADEIRA DE PAKTOí? Anatomia e physioloffia fla Placenta. PROPOSIÇÕES 1 A placenta acha-se implantada na cavidade do utero, ordinaria- mente na parte superior e posterior. II Apresenta duas faces, uma interna ou fetal, outra externa ou uterina e um bordo ou circumferencia. 111 A face interna é lisa, ligeiramente concava e forrada pela chorion e pela amnios, a externa algum tanto convexa apresenta desigual- dades—lobos ou cotyledones—, e acha-se unida á face interna do utero mediata ou Ímmediatamente conforme a época da prenhez. IV A circumferencia da placenta continua com a chorion na porção letal e com a caduca na porção materna. . V A espessura da placenta diminue á proporção que se caminha do centro para a circumferencia. VI E na porção central da face interna da placenta que se insere ordinariamente o cordão umbilical. VII Ha na placenta um grande numero de vasos sangüíneos, não tendo-se, porém, ainda descoberto nella nervos nem vasos lym- phaticos. VIII As trocas entre o sangue da mãi e do feto se operão atravéz das paredes dos vasos. IX A placenta, estabelecendo o contacto mediato entre os vasos da mãi e os do feto, representa um papel muito importante na respiração fetal. X O antagonismo que existe entre a placenta e os pulmões é uma prova do que acima dissemos. XI Em reforço desta opinião, apresenta-se a rapidez com que, no feto, sobrevém a morte por asphyxia quando se comprime o cordão umbilical. XII A glycogenia placentar suppre a hepatica nos primeiros tempos da vida embrvonaria. QUARTO PONTO CADEIRA DE CLINICA MEDICA Das condições patlopicas, cansas, diagnostico e tratamento flo teriM PROPOSIÇÕES I O beriberi é uma toxicohemia infecciosa. II Si a causa determinante do beriberi nos é desconhecida, não acon- tece o mesmo com as causas predisponentes. III O impaludismo não pode ser admittido como causa sine qua non do beriberi. IV Até certo ponto a etiologia do beriberi se assemelha á do es- corbuto. V Todas as causas que produzem anemia, depauperamento do orga- nismo são favoráveis ao apparecimento do beriberi. 7N - VI O diagnostico do beriberi genuíno, em qualquer de suas fôrmas é sempre fácil, principalmente reinando a moléstia epidemicamente. VII São de muito valor para o diagnostico da lórma hydropica os caracteres e a marcha do edema. VIII A hyperesthesia muscular, coincidindo com a anesthesia e analge- sia cutâneas e com a cinta beriberica, faz crer na existência da fôrma paralytica. IX A medicação contra o beriberi deve ser externa e interna, variando esta segundo a fôrma da moléstia. X No beriberi de fôrma hydropica deve-se começar o tratamento pelo emprego dos drásticos e dos diureticos; no de fôrma paralytica, a strychnina, o phosphoro e o arsênico têm dado bons resultados ; no de fôrma mixta deve-se combinar estas medicações. XI Entre os medicamentos externos gozão de grande reputação: as fricções excitantes, linimentos de camphora, de strychnina, tinctura de pipi, e alcoolatura de limão; a faradisação e a hydrotherapia con- correm poderosamente para o restabelecimento do doente. XII A sabida do foco de infecçâo tem, sem auxilio de medicação alguma, dado excellentes resultados. UUTOKPATOY2 A>l>OPI2M0I Aúo ircvwv àaa ~tvcy.=vMv ar, y.arà ròv auriv toVov, í çícsÍsotíso; ánausoi tov ít-íw. (Sec. 3a Aph. 46.) Ti">v cpúcêMv aí u.iv irpò: flípo;, aí <^à ttoo; -/3va ;u vi /.ax.ü; Tíscfjy.asi. (Sec. 3" Aph. 2. iTTc-^wpTijAaT* usXava cíovei at[Aa u.s'Xav à—, a'J7caaTCj io-jtoí /.ai v-n 77'jperü y.«i ávs'j Trupt-rcíj y.ay.iCTa, y.at óitoaciuiv àv rà yptóaa-ra Trj^poTspx Y), aãXXOv y.áx.isv. (Sec. 4a Aph. 21.) (Jy.ocioi y.pú~Tv. y.apy.ívci ■yívovT-/'., ar, ÔsoaiTíúíiv SsXtiov. ©spaneudu-Evc. "vòcp àniX/.-jvTat rayíw:, ar, í):pa7r'Joy.-;v.i ^s ttoXuv «haTsXoíÍGi. fSec. 6a Aph. 38.) Ytvoç à-j'3'j77vín, áa-poTspa aàXXcv toj i/.stoÍcj "yivousva xaxov. (Sec. 7' Apb. 73.) Ktt». /_oovsro voucTiaan y.otXír,; y.aracpopr, vs.v.vi. (Sec. 7> Aph. 83.) ^>(i£ -"«s^' Esta these está conforme os Estatutos. — Rio, 31 de Agosto de 1875. Dr. Caetano de Almeida. Dr. João Damasceno Peçanha da Silva. Dr. Kossuth Vinelli.