FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO THE SB DO Dr. CAETANO AIT0II0 llUllfSM Typ. de Costa & Santos, rua do Hospício n. 205. BBT«I PRIMEIRA CADEIRA DE CLINICA MEDICA Do alcoolismo clroníco e saas «meneias. PROPOSIÇÕES CADEIRA DE PHARMACIA E ARTE DE FORMULAR Dos vinhos chimico-pharmacologicamente considerados. CADEIRA DE PATHOLOGIA CIRÚRGICA Infecção purulenta. CADEIRA DE MATÉRIA MEDICA E THERAPEUTICA Acção physiologica e therapeutica do acido phenico. THESE APRESENTADA Á FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO EM io DE SETEMBRO DE i883 E perante ella sustentada em 14 de Dezembro do mesmo anno POR NATURAL DO RIO DE JANEIRO Doutor em Medicina pela mesma Faculdade., Bacharel em letras pelo Imperial Collegio de Pedro II, etc. RIO DE JANEIRO Typ. Militae, de Santos & C., rua do Hospício n. 206. 1833 Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro DIRECTOR—Conselheiro Dr. Vicente Cândido Figueira de Saboia. V1CE-DIBECT0S—Conselheiro Dr. Antonio Corrêa de Souza Costa. SECRETARIO —Dr. Carlos Ferreira de Souza Fernandes. Drs.: LENTES CATHEDRATICOS João Martins Teixeira Physica medica. Conselheiro Manoel Maria de Moraes e Valle . . . Chimica medica e mineralogia. Joao Joaquim Pizarro. . , Botanica medica e zoologia. José Pereira Guimarães . . Anatomia descriptiva. Conselheiro Barão de Maceió Histologia theorica e pratica. Domingos José Freire Júnior Chimica organica e biologica. João Baptista Kossuth Vinelli Physiologia theorica e experimental. João José da Silva , . Pathologia geral. Cypriano de Souza Freitas Anatomia e physiologia pathologicas. Joao Damasceno Peçanha da Silva Pathologia medica. Pedro Affonso de Carvalho Franco . , Pathologia cirúrgica. Conselheiro Albino Rodrigues de Alvarenga , . . Matéria medica e therapeutica, especial- mente brasileira. Luiz da Cunha Feijó Júnior . . , , Obstetrícia. Cláudio Velho da Motta Maia Auatomia topographica, medicina ope- ratória experimental, apparelhos e pe- quena cirurgia. Conselheiro A. C. de Souza Costa . Hygiene e hiatoria da medicina. Conselheiro Ezequiel Corrêa dos Santos , . . - . Pharmacologia e arte de formular. Agostinho José ds Souza Lima Medicina legal e toxicologia. Conselheiro João Viceute Torres Homem. . . . Domingos de Hlmeida Martins Costa Conselheiro Vicente Cândido Figueira de Saboia. João da Costa Lima e Castro Clinica medica de adultos. Hilário Soares de Gouvêa . . , . Clinica ophthalmologica. Erico Marinho da Gama Coelho Clinica obstétrica e gynecologica. Cândido Barata Ribeiro Ciinica medica e cirúrgica de crianças. João Pizarro Gabizo Clinica de moléstias cutaneas e syphili- ticas. João Carlos Teixeira Brandão Clinica psychiatrica. Clinica cirúrgica de àdultos. LENTES SUBSTITUTOS SERVINDO DE ADJUNTOS Augusto Ferreira dos Santos Chimica medica e mineralogiea. Antonio Caetano dfe Almeida . . , Anatomia topographica, medicina Ope- ratória experimental, apparelhos e pe- quena cirurgia. Oscar Adolpho de Bulhões Ribeiro Anatomia descriptiva. Nuno Ferreira de Andrade Hygiene e historia da medicina. José Benicio de Abreu Matéria medica e therapeutica, especial- mente brasileira. ADJUNTOS José Maria Teixeira Physica medica. Francisco Ribeiro de Mendonça Botanica medica e zoologica. Histologia theorica e pratica. Arthur Fernandes Campos da Paz Chimica organica e biologica. , Physiologia theorica e experimental. Luiz Ribeiro de Souza Fontes Anatomia e physiologia pathologicas. Pharmacologia e arte de formulart Henrique Ladislau de Souza Lopes Medicina legal e toxicologica. Francisco de Castro Eduardo Augusto de Menezes . . Bernardo Alves Pereira .... Carlos Rodrigues de Vasconcellos Ernesto de Freitaa Crissiuma . . Francisco de Paula Valladares. . Pedro Severiano de Magalhães . Domingos de Góes e Vasconcellos Clinica medica de adultos. Clinica cirúrgica de adultos. Pedro Paulo de Carvalho . , Clinica obstétrica e gynecologica. Josê Joaquim Pereira de Souza Clinica medica e cirúrgica de crianças. Luiz da Costa Chaves de Faria Clinica de moléstias cutaneas e syphiti- ticas. Carlos Amazonio Ferreira Penna Clinica ophthalmologica. Clinica psychiatrica. N. B.— A Faculdade não approva nem reprova as opiniões emittidas nas theses que lhe são apresentadas. A1 memória ie leu Pai, meu melhor amiso ANTONIO CAETANO DE AZEVEDO Procuro honrar-te. Á’ memória de minha irmã ANTONIA 1' HM I MI UB E CiLSÍl iQãçsim thám i» Iot&ss Camaip Saudade. A minha bôa Mãi $k 1©í ptii Tributo de gratidão e amor filial. a. idris^tAes Gratidão. A meu irmão e amigo 9 D. Harta 9a fcciati Gano Nos momentos de desanimo sempre encontrei o teu sorriso para alentar-me. Gratidão. Ao mestre e amigo DR. JOSÉ MANOEL GARCIA Eterna gratidão. Ao amigo Um abraço. 1 o Hlm. Sr. Manoel Francisco de Isevedo Amizade e gratidão. Aos colleps e amigos m m auxiliaram na yifla académica Gratidáo. AOS IBS BUS, SS MINHAS BUS Felicidades. AOS COUEGAS Saudades. JLOS MMM&B ioitoiialoi t© 1884. DO ALCOOLISMO CHEOBICO E SOAS WEQDEMCIAS Duas theorias extremas explicavam a acção do álcool ingerido pelo homem : a de Liebig, Bouchardat e Sandras, que affirmam que o álcool soffre uma combustão rapida e completa no organismo, escapando uma pequena porção que é eliminada em natureza pelos pulmões, e a de Lal- lemand, Perrin e Duroy, que sustentam a eliminação, não fazendo o álcool senão um simples passeio atravez do organismo. Demonstraram que o álcool se accumula de preferencia em certos parenchymas, notavelmente no figado e no encephalo. A eliminação do álcool se faz pelo rins, pelo pulmão e pela pelle. Affirmavam estes autcores que o álcool atravessava o corpo sem se modificar. O absolutismo destas conclusões não podia escapar á critica, uma objecção se apresentava naturalmente. Lallemand, Perrin e Duroy não tinham retirado do sangue senão uma parte do álcool ingerido. Perguntou-se-lhes o que era feito da porção que elles não tinham achado ? Hoje a sciencia tem fixado os pontos fundamentaes deste problema. Uma porção, a maior, é eliminada rapidamente pelos orgãos secre- tores, o resto é queimado como alimento hydrocarbonado. Mas a com- bustão do álcool não é instantanea e, até á destruição total, elle está em circulação no sangue, onde tem sido achado muitos dias depois da ingestão. Emquanto faz parte integrante do organismo, o álcool exerce sobre o cerebro uma acção, cuja intensidade e duração são propor- cionaes á quantidade absorvida e á impressionabilidade do individuo, acção de excitação a principio, depois depressão e collapso, analogo a todos os venenos anesthesicos. Esta perturbação passageira constitue o alcoolismo agudo, a embriaguez em seus diversos gráos. Se este envenenamento não c repetido, senão de longe em longe, tudo entra em ordem, uma vez o álcool eliminado ou destruido; o organismo não apresenta no intervallo destas tempestades modificação pathologica alguma notável. Se, pelo contrario, estas phases de entoxicação aguda são frequentes, ou então, se, sem attingir o gráo necessário para produzir os accidentes do alcoolismo agudo, a absorpção do álcool é habitualmente superior á quantidade que póde ser destruida ou eliminada em um tempo dado pela evolução organica, então sobrevem uma impregnação, que se traduz, não mais sómente por desordens circulatórias e funccionaes, mas por alteração no conjuncto dos orgãos. Sadio na apparencia, o individuo vive, seguindo uma modalidade anormal, que constitue o estado de alcoolismo. Esta situação per- sistindo, symptomas proprios das desordens materiaes apparecem, cedo ou tarde, e põem clinicamente em evidencia a tríplice acção do álcool sobre nossos tecidos. Estes phenomenos podem ser referidos a tres ordens principaes : alteração dos orgãos glandulares, acção irritativa sobre os elementos conjunctivos, acção steatogenica sobre os elementos parenchymatosos. Assim nasce um estado morbido, de evolução mais ou menos lenta, cuja chronicidade póde ser incidentemente rompida por episodios agudos, e que é denominado alcoolismo chronico. O alcoolismo é a expressão geral, sob a qual se designa uma série de affecçÕes variadas em seus phenomenos, mas ligadas por um laço commum, a causa que as produz. Não é sempre íacil estabelecer praticamente as differenças, que se- param o alcoolismo agudo do alcoolismo chronico, isto é, dizer onde começa um e onde o outro termina; mas esta distineção não é menos legitimada pela diversidade e duração das modificações que soffre o or- ganismo. Com effeito, no alcoolismo agudo, as modificações são passa- geiras e desapparecem com a causa que lhes deu origem, sem deixar traços de sua passagem; no alcoolismo chronico, ao contrario, elias são persistentes e algumas vezes tão profundas e duráveis que levam sua influencia sobre a prole. O alcoolismo, em razão do uso sempre crescente das bebidas espi- rituosas e das necessidades imperiosas, que resultam do seu abuso, deve ser considerado como um dos maiores males da humanidade e classificado no numero das moléstias mais frequentes do quadro no- sologico. O abuso das bebidas espirituosas é quasi tão antigo como o mundo e se acha em cada pagina da historia dos povos. 3DEFX3STIQA.O Alcoolismo chronico é uma moléstia de evolução ordinariamente lenta e progressiva, causada pelo abuso das bebidas espirituosas, ca- racterisada anatomicamente por inflammaçÕes especiaes, não suppu- rativas, ou por degenerescencias gordurosas dos orgãos ; symptomati- camente por perturbações funccionaes diversas, levando sua acção principalmente sobre o systema nervoso e o apparelho digestivo. ETIOLO G-IA A etiologia do alcoolismo chronico reconhece como causa, a prin- cipio, a ingestão quasi diaria e repetida das bebidas alcoólicas, tomadas em quantidade exagerada. A aguardente e as bebidas, cuja riqueza de álcool é de 40 ou 60 por cento, são as geradoras mais eíficazes do alcoolismo. O abuso dos alcoolicos, tão espalhado em nossos dias, tem origens diversas. Em uns, é um appetite particular para as bebidas espirituosas, que os arrasta a excessos quotidianos ; em outros, é a ociosidade, a companhia de bebedores; em outros, as necessidades de um commer- cio. Na classe operaria convida-se a beber a toda hora do dia por delicadeza. Em certos.casos mais raros é um consolador, que faz esque- cer os pezares e dissipa os cuidados. Gontrahido o habito, torna-se uma necessidade imperiosa, uma paixão irresistivel, contra a qual nada podem os conselhos, as considera- ções e as resoluções as mais solemnes. A predisposição individual tem uma influencia positiva, bem de- 4 monstrada por este facto, que, consumindo igual quantidade de álcool, todos os bebedores não tornam-se alcoolicos. Emfim, a explosão dos accidentes póde ser favorecida por circumstancias occasionaes, taes como: emoções moraes, alimentação insufficiente, etc. Os individuos que trabalham em pleno ar ou que exercem uma profissão, exigindo um grande emprego de forças, resistem mais facil- mente á acção nociva dos alcoolicos. Algumas vezes o alcoolismo é o resultado de uma affecção cerebral. pathologica Mostraremos as lesões causadas pela ingestão do álcool, percorrendo os diversos apparelhos. Apparelho digestivo. — o estomago apresenta uma série de lesões. As paredes são espessadas, a mucosa é endurecida em certos pontos e em outros amollecida ou corroida ; algumas porções são inje- ctadas por placas. Acha-se na superfície um muco espesso, mas trans- parente, secretado pelas glandulas estomacaes hypertrophiadas. O espessamento tem logar não só na mucosa, mas também na túnica conjunctiva e na musculosa. As glandulas estão ordinariamente em estado de degenerescencia granulo-gordurosa. Estas lesões podem coexistir com alterações mais raras, como: retracção do orgão. As glandulas soffrem a hypertrophia mamelonea, encontra-se o estreitamento do pyloro, quer primitivo por espessamento das túnicas, quer consecutivo á cicatrisação das ulceras, que aífectam a mucosa. O intestino delgado é raramente atacado. Encontra-se no cecum algumas vezes um certo espessamento com endurecimento e coloração ardosea da mucosa. O fígado resente-se da influencia do álcool. A principio ha simples hyperhemia da glandula e uma superactividadc funccional; mais tarde esta congestão repetida e habitual termina por uma degenerescencia sclerosa, que é uma das consequências mais frequentes do alcoolismo. A steatose hepaticaé, segundo Peters e Cerpenter, quasi commum. Outras lesões mais raras podem se apresentar, taes como: inflam- mação catarrhal das vias biliares, phlegmasias circumscriptas do paren- chyma, atrophia amarella aguda, lithiase biliar, inflammaçÕes adhesivas da veia porta e seus ramos. O baço é, ora hypertrophiado e molle, ora duro e corneo. O pancreas é volumoso e infiltrado de gordura, ou então endurecido com espessamento do seu trama fibroso e atrophiado de seus elementos glandulares. Apparelho circulatório. — o coração é mais volumoso, mais molle e mais friável, o myocardo tem uma cor amarella e a super- fície é occulta por uma camada gordurosa, que recobre a base e a maior parte do ventriculo direito. As cavidades são dilatadas, sobre- tudo no coração esquerdo, cuja parede ventricular é espessada. (Magnus Huss.) As valvulas são espessadas, esbranquiçadas e podem apresentar todos os grãos da endocardite chronica. A arterite, a phlebarterite, a pylephlebite, a phlebite da veia cava, das veias cruraes têm sido notadas em um certo numero de obser- vações (Frericbs.) Apparelho respiratório. — Os bronchios são a séde de um estado catarrhal chronico, a mucosa tem uma cor acinzentada e ardosea, quando este estado persiste por muito tempo, os pequenos bronchios se dilatam e um emphysema pulmonar apparece. A sclerose do pulmão foi observada por Magnus Huss, quer consecutiva ás inflammaçÕes chronicas da mucosa bronchica, quer se produza nos bebedores, ata- cados de pneumonias agudas, cuja resolução tem sido lenta ou in- completa. A mucosa do larynge é hyperhemiada, a epiglotte vascularisada em suas duas faces, as cordas vocaes superiores e a mucosa arytenoidéa são tumefactas e injectadas e recobertas de um muco espesso pouco abundante; as cordas inferiores apresentam as mesmas alterações. Apparelho genito-urinario. — Os rins soffrem a acção nociva do álcool, que elles eliminam. Ha uma relação etiologica evidente entre o$ excessos alcoolieos e as lesões renaes. As lesões mais frequentes são : a cirrhose renal, a nephrite parenchymatosa, catarrho da bexiga, spas- mos do collo e congestões prostaticas. 6 Os testículos sao algumas vezes atrophiados, o escroto e o penis são flácidos, o sperma amarellado. Nada se sabe ainda sobre os ovários das mulheres alcoólicas. ApparelllO locomotor.—Nos primeiros períodos do alcoo. lismo, os musculos empallidecem, tornam-se mais molles e se car- regam de gordura no intervallo das fibrillas ; mais tarde as fibras contracteis soffrem a degenerescencia gordurosa, perdem em parte sua striação e a própria massa muscular soffre a atrophia, que a reduz ao seu volume primitivo. Segundo Rokitansky, os ossos contêm muito mais gordura, esta se accumula na cavidade medullar ás espensas do tecido osseo. Esta alteração é notável nos ossos curtos, cujos vacuolos alargados são cheios de gordura. Apparelho de innervação— o apparelho de innervação soffre perturbações múltiplas e se dirigem sobre a motibilidade, a sensibi- lidade e sobre as faculdades psychicas. No ponto de vista anatomico, as lesões nervosas do alcoolismo são variadas em sua natureza e em sua séde. Os envoltorios encephalicos, o tecido nervoso e os vasos que o percorrem podem ser interessados. As congestões e as inflammaçÕcs chronicas, a degenerescencia gordu- rosa, a atrophia, a hemorrhagia e o amollecimento constituem as alterações habituaes. Podem estar reunidas ou separadas e algumas delias se agrupam, segundo modos mui diversos. Na dura-mater podem-se encontrar as neo-membranas da pachy- meningite, origem frequente de hemorrhagias meningeanas secun- darias. A arachnoide e a pia-mater, na face superior dos hemispherios e no contorno do cerebello, são espessadas e opalisadas, os corpúsculos de Pacchioni são amarellados e volumosos. Os vasos da pia-mater dilatam-se, engorgitam-se e soffrem a dege- nerescencia gordurosa, cercados ou não de manchas echymoticas, resíduos de pequenas extravasações sanguíneas. O liquido cephalo- rachidiano é em geral augmentado. No cerebro e cerebello as partes mais vasculares são as mais ataca- das na substancia cinzenta. As paredes dos vasos, as cellulas que os cer- cam são cheias de grânulos acinzentados, refractando a luz fortemente. Se se examina o tecido encephalico em um periodo adiantado da moléstia, póde-se achar lesões apreciáveis a olho nú, taes como : endurecimento com atrophia da massa encephalica, circumvoluçÕes pequenas e desiguaes, ventrículos dilatados e cheios de um liquido seroso ; hyperplasia conjunctiva perivascular ao nivel da parte mais externa das circumvoluçÕes, d’ahi adherencias da pia-mater a seu tecido. Estas lesões diffusas podem ser complicadas de alterações circum- scriptas, como : encephalites parciaes, congestões, amollecimento, hemorrhagias, cujas alterações vasculares e parenchymatosas da massa encephalica constituem as condições pathogenicas. Consequências do alcoolismo. — O estomago é o primeiro orgao que soffre as consequências do alcoolismo. A presença exage- rada ou prolongada do álcool no estomago determina uma verdadeira inflammação, uma gastrite simples ou complicada de lesões múltiplas. Esta gastrite é precedida de inappetencia, dyspepsia com estado sa- burral, sede, máo estar e dores epigastricas, eructaçÕes, pyrosis e vomiturações. Mas, de todos estes accidentes, o mais caracteristico é a pituita, vomito que se produz pela manha em jejum, sem esforços, precedidos por uma sensação penosa no epigastro e constituído por um liquido viscoso, esbranquiçado e algumas vezes colorido pela bilis. Esta gastorrhéa póde ser independente de lesão estomacal. E’ devida a uma hypersecreção mucosa. Diz Jacoud que o vomito tem logar sem esforços, mas observei um caso em que o indivíduo fazia os maiores esforços todos os dias pela manhã, assim que se levantava da cama. Mais tarde todos os symptomas de uma gastrite chronica sobrevêm. O indivíduo alcoolisado perde o appetite completamente, as di- gestões tornam-se cada vez mais laboriosas e acompanhadas de vivas dores, os vomitos tornam-se incessantes, o emmagrecimento progride rapidamente. A gastrite póde ser acompanhada de ulcera simples, aguda ou chronica, de hypertrophia geral ou parcial polypiforme das paredes do estomago. Na gastrite simples aguda, os vomitos são ordinariamente inces- santes, o pulso deprimido e as forças abatidas. A gastrite chronica dos 8 bêbados se resume algumas vezes n’uma simples pituita, consistindo em vomitos aquosos, produzidos em jejum. Mais tarde ella se faz notar por vomitos alimentares, que podem durar annos, sem reagir enormemente sobre a economia. Em certos casos de gastrite alcoolica, as glandulas tubulosas do estomago se inílammam, se dilatam, derramam pus, que contém, sobre a mucosa gastrica e algumas vezes occasionam uma suppuração do tecido cellular sub-mucoso. As ulceras simples chronicas do estomago, consecutivas ao abuso das bebidas alcoólicas, são caracterisadas pelas dores xiphoideanas e dorsal e pelo emmagrecimento-, Leudet diz que em alguns casos de ulcerações do estomago notou a hematemese. Aos accidentes gástricos acima referidos, vêm se juntar perturbações intestinaes. A diarrhéa,que alterna a principio com a constipação, torna- se pouco a pouco continua. O individuo tem cólicas ; a tensão abdo- minal e flatulência são habituaes. Nos últimos períodos a diarrhéa tor- na-se colliquativa, sanguinolenta, lienterica. A marcha destes acci- dentes é chronica e regularmente progressiva. Claude Bernard diz que o íigado é um dos orgãos em que a ac- cumulação do álcool é das mais manifestas. O álcool no ligado provoca um augmento de volume da glaniula, demonstrada pela percussão e pela apalpação. A inflammação estende-se ás vias biliares e então uma icterícia, conhecida pela nome de icterícia catarrhal dos bêbados apparece. As lesões do ligado causadas pelo alcoolismo, são de duas ordens: uma interessa o trama de substancia conjunctiva, outra as cellulas do orgão. A steatose, deposito anormal de gordura, no seio das cellulas hepaticas, é um phenomeno constante nos velhos bebedores. Lance- reaux e Frerichs indicam a relação de 70 sobre 90 casos. Algumas vezes as duas lesões se sobrepõem, uma hepatite fere o parenchyma, quando o orgão é a séde de uma hyperplasia inter- sticial. Entre as lesões que o álcool produz no parenchyma hepático, a mais frequente é, sem duvida alguma, a cirrhose. A maior parte dos autores, que têm tratado das moléstias do ligado, não desconhecem a influencia prejudicial exercida pelo abuso dos alcoolicos sobre a pro- dueção desta alteração. Augmento de volume do figado, apreciável pelos meios de exploração; mais.tar.de, endurecimento atrophico do orgão com um derrame.ascitico abundante; taes são os principaes signaes da cirrhose alcoolica. Se o augmento de volume do figado não é constante, a ascite é um symptoma muito frequente. A apparição da ictericia é rara, mas um phenomeno constante é a magreza. Nenhuma moléstia, nem mesmo phthisica, produz um emmagreci- mento tão rápido como a cirrhose alcoolica. Apezar de uma marcha lenta e chronica, a cirrhose algumas vezes percorre seus stadios em algumas semanas. A terminação é ordinariamente fatal. Observei um caso de cirrhose alcoolica, em que o indivíduo apre- sentava todos os signaes caracteristicos. Elle tinha o figado diminuído de volume, tinha ascite, ictericia bem evidente e magreza extrema. Apezar de todos os cuidados do medico, elle falleceu no fim de poucas semanas. Leudet notou que o alcoolismo podia actuar de um modo rápido e fulminante pela ictericia, que elle denominou ictericia aguda dos bêba- dos ; esta ictericia é acompanhada de symptomas nervosos e gástricos, com adynamia profunda e rapida, syncope e morte no coma. Observei um indivíduo moço, que abusava das bebidas alcoólicas grandemente; depois de quatro dias continuados de abuso do álcool, de ter apanhado muita chuva e nada ter comido, foi atacado de uma con- gestão de figado muito forte, tremor, delirio e febre ; chamado o me- dico, receitou calomelanos, oleo de ricino, ventosas sarjadas na região hepatica, sulphato de quinino depois do effeito purgativo. No dia se- guinte o indivíduo apresentou-se ictérico, adynamico e delirando muito, no terceiro dia estado comatoso e morte. Parece-me que se tratava aqui, neste caso, de uma ictericia aguda dos bêbados. O mesenterio é a séde de depositos adiposos e algumas vezes a gor- dura é de tal modo abundante, que a dobra peritoneal enche uma grande parte da cavidade abdominal. Estes depositos de gordura são tão frequentes no alcoolismo, que, coincidindo com alterações do figado, revelam seguramente a existência de uma intoxicação alcoolica. Estes depositos de gordura embaraçam as funcçÕes das vísceras abdominaes. Lancereaux diz, que nos bêbados se encontra uma peritonite pseudo-membranosa chronica, devida ao abuso dos aicoolicos. Na estréa do alcoolismo, não se percebe no apparelho circulatório senão perturbações, funccionaes, palpitações do coração, congestões passageiras de diversos orgãos, dyspnéa ligeira, acceleração do pulso; mais tarde, porém, estas perturbações são substituídas ou complicadas pelos symptomas de accidentes variados, como : hypertrophia, dege- nerescencia gordurosa do coração, atheroma arterial, arterite, phlebite. A’s lesões do apparelho circulatório se juntam dilatações vasculares, que se produzem em certas regiões da face pela acção de uma hype- remia chronica e que representam um papel activo na producção dos endurecimentos tuberculosos, que se encontram tantas vezes na face dos bêbados. Para o lado do apparelho respiratório, os accidentes não são menos graves. O alcoolismo cria uma predisposição extrema ás congestões e inflam mações agudas dos pulmões e das pleuras. A pneumonia de origem alcoolica, bem estudada por Grisolle, offerece alguns caracteres especiaes, muitas vezes dupla de repente; ella tem a evolução da pneumonia catarrhal, mas sua marcha é mui rapida, suppura facilmente e determina uma série de phenomenos secundários de mui alta gravidade ; cyanose, prostração, adynamia, delirio, enfraquecimento de acção do coração, suores profusos, de tal sorte que, pela simples inspecção dos symptomas e sem o exame local, poder-se-hia crer em um accesso de delirio tremens; d'ahi a necessidade da auscultação e percussão dos doentes, que apresentam estas con- dições especiaes. Do que precede, resulta que o alcoolismo aggrava sempre o prognostico das affecções agudas do pulmão e da pleura. As pleuresias de origem alcoolica têm uma estréa insidiosa, uma marcha lenta ; o derramamento é habitualmente pouco abundante. As investigações de Bell demonstram que o abuso do álcool favorece o desenvolvimento da diathese tuberculosa, e que precipita a evolução delia. Nos bêbados a phthisica reveste muitas vezes a fôrma galopante. Para o lado da locomoção, as perturbações produzidas pelo alcoo- lismo não são menos importantes ; assim, o indivíduo que abusa do álcool tem a incerteza dos movimentos, fraqueza, fadiga rapida e mais raramente myalgias e caimbras, que reconhecem também como factores as modificações do systema nervoso. Segundo Rokitansky, os ossos contêm muito mais gordura, esta se accumula na cavidade medullar, á expensas do tecido osseo; esta alteração é particularmente notável nos ossos curtos, cujos vacuolos alargados são cheios de gordura. Resulta d’ahi dores vagas na conti- nuidade dos membros e uma predisposição para as fracturas, cuja consolidação é retardada. As articulações são a séde de dores de inten- sidade variavel, profundas e muitas vezes irrregulares; mas nada se sabe de certo sobre as lesões anatómicas, ás quaes correspondem estes symptomas. As perturbações nervosas funccionaes, devidas ao alcoolismo, po- dem affectar a sensibilidade, a motilidade e a intelligencia. As perturbações da sensibilidade estream por um mal estar geral, formigações, tracções localisadas, sobretudo nos membros inferiores, por dores de cabeça, acompanhadas de vertigens e por uma insomnia persistente ; se o individuo consegue dormir, o somno é agitado, per- turbado por pesadelos ; o despertar é marcado por um sentimento de extrema fadiga. Mais tarde apparecem formigamentos, intermittentes ou continuos, com sensação de entumecimento das partes dolorosas, acompanhadas algumas vezes de dores lancinantes, de calor ou de frio, tendo séde de ordinário nas extremidades, mas ganhando os braços, o dorso e os lombos, nos periodos mais adiantados. O conjuncto dos phenomenos precedentes se chama fórma hype- resthesica do alcoolismo, esta fórma hyperesthesica é algumas vezes seguida de uma paraplegia. A hyperesthesia se manifesta mais parti- cularmente nos membros inferiores, sobretudo nas plantas dos pés. Tive occasião de observar um doente nestas condições, o qual dizia que, quando pisava, sentia vidros ponteagudos lhe dilacerarem os pés, accusando ao mesmo tempo formigamento nos membros infe- riores e uma dor na região dorsal. Leudet diz ter observado frequen- temente a hyperesthesia das mãos. A hyperesthesia é acompanhada de anesthesia de outras regiões da pelle. Esta anesthesia apparece a principio nas extremidades e se gene- ralisa de uma maneira progressiva e centrípeta, e mais tarde torna-se continua. As funcções dos apparelhos sensoriaes, exaltadas a principio, sof- frem em seguida um enfraquecimento gradual; os bebedores veem clarões fulgurantes, moscas que voam; os objectos têm contornos vo- lúveis; durante a insomnia as perturbações mudam de caracter e cedem logar a allucinações ; os doentes- julgam ver ratos e outros pe- quenos animaes correrem sobre os lençóes ; mas, amanhecido o dia, perdem a lembrança destas Depois a amblyopia torna-sè per- manente e póde terminar por uma amaurose, devida á atrophia dos nervos opticos. O ouvido, alterado por tinidos, zumbidos, se enfraquece pouco e pouco ; o olfacto soífre também modificações, o tacto acaba por em- botar-se e assim o indivíduo vegeta, até que a morte o livre de tantos incommodos. As perturbações da motilidade, causadas pelo alcoolismo, são também numerosas. O tremor é um dos primeiros phenomenos a principio passageiro, elle se accentua com os esforços que faz o doente para dar a seu movimento mais precisão. E’ pela manhã, ao despertar, que elle é observado, diminue ordinariamente depois da. ingestão das bebidas alcoólicas. Na estréa é limitado, ataca as mãos, depois invade os membros, a face, a cabeça e a lingua, resulta d’ahi uma certa hesitação da pa- lavra, complicada algumas vezes de gagueira ; os movimentos são menos seguros e regulares, ha hesitação na marcha e a força de con- tracção é notavelmente diminuida. O enfraquecimento muscular, que póde se generalisar e attingir os musculos lisos do intestino, da bexiga, do esophago, termina, quando os bebedores não renunciam a seus excessos, em uma paralysia, que nunca é completa, que estréa pelas extremidades superiores e que affecta a marcha centripeta. (M. Huss.) Emfim, nos periodos últimos, o sys-tema muscular se atrophia ou soífre a degenerescencia gordurosa; a paralysia augmenta então e torna-se completa e definitiva. O tremor é muitas vezes acompanhado de caimbras, abalos nos musculos dos tornozelos e nos flexores dos pés. Estes accidentes têm logar sobretudo á noite. As convulsões com rigidez consecutiva são mais raras; são simples ou de apparencia choreica ou epiléptica, A epilepsia alcoolica Succede aos symptomas precedentes ou aos ataques de delirio tremens, eila póde curar-se pela suppressão da causa, a menos que não coincida com a paralysia geral.' As perturbações intellectuaes revestem duas modalidades op- postas, conhecidas sob os nomes de delirio tremens e loucura lype- maniaca. O delirio tremens é um epiphenomeno agudo da intoxicação chro- nica, produz-se sob a influencia de causas bastante variaveis. Ora suc- cede a excessos prolongados e repetidos, como por uma saturação de álcool, ora é a consequência de emoções moraes; ás vezes, porém, vem complicar uma affecção incidente, a qual imprime uma physiono- mia toda particular. As moléstias agudas, como : a pneumonia, a erysipela, o rheuma- tismo articular, os grandes traumatismos constituem para este acci- dente uma verdadeira opportunidade e isto porque arrastam a sup- pressão brusca do álcool, tornado para o organismo o agente indis- pensável ao equilibrio funccional. O delirio tremens tem muitas vezes prodromos, taes como : mal estar indefinido, fadiga sem causa, inquietações, fraqueza, anorexia, somno penoso e interrompido por pesadelos, ou então sãò ausências intellectuaes, perda súbita e temporária da memória, temores imaginá- rios, modificações bizarras no caracter, no gosto e nos instinctos. Então o accesso brilha com toda a violência ; os doentes furiosos são presos de agitação a mais viva, os olhos salientes, desvairados, dão á face vermelha e túrgida uma expressão de medo e de terror ; todos os musculos se agitam de uma maneira desordenada e nos intervallos de repouso são tomados de tremor violento e geral. A palavra é breve, entrecortada, de repente o alcoolisado expelle gritos, vocifera, quebra os objectos que o cercam, ameaça aos assistentes, luta contra seres imaginários ou procura escapar-se do leito, quebrar a cabeça contra a parede e precipitar-se pelas janellas. Se a violência inicial do accesso’tem sido menos considerável, o delirio fica ■ exclusivamente cerebral, mas não é menos animado, o doente fallá com extrema volubilidade, entrega-se a accessos de alegria hilariante e loquaz, entretem conversação com individuos ausentes, iempenha-se em trabalhos virtuaes, procura realizar uma preoccupação mportante, cuja idéa o domina e volta a cada momento ás palavras e aos actos os mais differentes; porque a memória é reduzida ao mi- nimo de actividade. As resoluções tomadas são de uma volubilidade e de uma instantaneidade tão grandes como os meios de expressão e de execução. O delirio é ordinariamente profissionnal e segue exactamente as hallucinações ; mas, por maior que seja a exaltação, o estado consciente nunca é abolido completamente. Os movimentos, mesmo os volun- tários, carecem de precisão e de coordenação. Durante todo tempo do accesso, a insomnia é completa, pelo menos dura tres ou quatro dias, mas não é raro persistir oito a doze dias e mais. A inappetencia, a sede viva, a lingua secca e vermelha, mais raramente saburral e húmida, eructações, vomitos biliosos, a constipação ou eva- cuações involuntárias são symptomas habituaes do lado do apparelho digestivo. A pelle é coberta de suores, o pulso é quanto á acceleração, proporcional á agitação geral. As duas fôrmas, cujo quadro acabamos de esboçar, são as mais fre- quentes ; mas apresentam ainda muitos grãos em suas manifestações exteriores e em sua symptomatologia reaccional. Certos phenomenos podem faltar, outros são exagerados. A fôrma superaguda, descripta por Delasiauve, não é senão uma exageração da primeira variedade, acompanhada de ataques epilepti- formes, que vêm complicar a terrivel agitação do paciente. A duração do accesso é de dous a seis dias, raramente mais, a terminação é marcada por um somno profundo, do qual o alcoolisado sahe ani- quilado, sem lembrança bem precisa do que se passou. A volta ao estado anterior é feita com uma rapidez que sorprehende, tanto mais, quanto se foi ferido do poder das causas de esgotamento, que têm actuado sobre o doente. A symptomatologia permitte estabelecer facilmente o diagnostico do delirio tremens e não confundir com outras affecções, como : a febre palustre de fôrma delirante, a meningite e certos delirios agudos, aos quaes não se assemelha senão por symptomas isolados. A uremia distingue-se pelos vomitos contínuos, ausência de alluci- nações, coma, albuminúria e pelos commemorativos. No saturnismo cerebro-spinhal, o delirio é extremamente movei, os symptomas mus- culares menos intensos, períodos de depressão e de somnolencia seguem ás phases de excitação ; na mania aguda não se observam a ataxia dos movimentos, o tremor, os terrores súbitos e as idéas são incoherentes, carecem de associação e não são, como no delirio tremens, o producto directo das allucinaçÕes soffridas pelo doente. Quanto aos envenamentos pelo opio, belladona, stramonio, são acompanhados de allucinaçÕes, delirio, desordens musculares e se terminam pelo coma, bem differente do somno profundo, mas calmo, que poe fim ao delirio do alcoolisado. Um ponto difficil do diagnostico é differençar o delirio tremens dos delírios symptomaticos das aífecções febris. E’ preciso fundar-se na loquacidade, agitação dos movimentos, no tremor, nas allucinaçÕes, na vista subjectiva de pequenos animaes e na insomnia persistente, para poder asseverar que trata-se de delirio tremens. A perturbação da intelligencia manisfesta-se também pela loucura, denominada alcoolica. A loucura alcoolica tem uma evolução mais lenta do que o delirio tremens. Apresenta-se sob tres fôrmas : lype- mania, ferocidade ebria e a monomania homicida e suicida. A lype- mania é caracterisada por um abatimento e um terror, que nada póde vencer. Seus principaes signaes são : allucinação, insomnia, sonhos sinistros, terrores contínuos, recusa obstinada a todo o alimento. A ferocidade ebria é notável pela agitação e instinctos ferozes do doente. Elle vocifera, ameaça, procura dar pancada, morder, etc. Os olhos são animados, a boca cheia de espuma e range continuadamente os dentes. A monomania homicida é aquella em que o doente, julgando-se ameaçado em sua existência, parece ouvir vozes que o impellem ao homicídio. Na monomania suicida, o doente sente-se perseguido, vê-se ator- mentado pelas allucinaçÕes e desesperado suicida-se. A loucura alcoolica tem uma duração variavel e susceptivel de cura, se o alcoolisado abstem-se dos excessos ; se, porém, continúa em seus desregramentos, termina pela demencia e paralysia geral. A demencia ou embrutecimento alcoolico consiste no enfraqueci- mento e obtusão gradual de todas as faculdades. A paralysia geral de origem alcoolica não differe da paralysia geral ordinaria, senão no começo. Julgamos ter mostrado as consequências mais communs do alcoo- lismo chronico e vamos passar ao diagnostico, prognostico e trata- mento, porque já vai longo este trabalho. Diagnostico. — o diagnostico repousa sobre o conhecimento dos accidentes variados que podem gerar os excessos de bebidas alcoólicas sobre a coexistência habitual de um certo numero destes accidentes e sobre a marcha delles e nas informações fornecidas pelos doentes. Na falta de signaes pathognomonicos, um conjuncto de manifestações, que a observação ensina a referir a uma mesma causa, auxilia o reconheci- mento do alcoolismo chronico. Prognostico. — O alcoolismo chronico é uma moléstia séria e muitas vezes mui grave, não só pela difficuldade que experimentam os individuos que são affectados, de cessar os funestos hábitos,, mas também pela fraqueza de acção dos meios therapeuticas sobre as lesões materiaes, geradas pelo abuso dos alcoolicos. A sede da manifestação alcoolica' exerce uma influencia sobre a gravidade do prognostico, este varia com o gráo de importância func- cional do orgão lesado. As alterações do encephalo, dos pulmões, do figado, dos rins, são sempre para temer. Ainda mais, o alcoolismo colloca os individuos affectados em condições taes, que basta a menor affecção para desenvolver nelles accidentes, que põem a vida em perigo. Uma ferida, uma fractura, uma contusão leve, são. para o beberrão affecções sérias ; um embaraço gástrico, uma variola discreta, uma pneumonia, affectam uma malignidade toda particular. Os individuos alcoolisados acham-se em condições as mais desvan- tajosas para supportar uma moléstia por mais leve que seja. Tratamento.—Dous modos de tratamento devem ser em- pregados para combater os desastres do alcoolismo. Um prophylatico, cuja applicação pertence aos homens que têm nas mãos as redeas dos Estados, outro palliativo ou curativo, que pertence ao medico applicar com discernimento. Desde tempos mui remotos os legisladores e os philanthropos se têm lamentado contra o abuso do álcool e nas leis de quasi todos os paizes se encontram penas mais ou menos severas. No Brazil onde o abuso das bebidas alcoólicas faz grande numero de victimas, já é tempo de pôr um paradeiro ao mal que cresce. Se- guindo o exemplo dos Estados-Unidos da America do Norte e da Ingla- terra, fundem-se as sociedades de temperança que tantos benefícios tem produzido n’aquelles paizes; lancem-se impostos pesados sobre as bebidas alcoólicas, sobre as casas destinadas unicamente á venda da aguardente e licores alcoolicos, puna-se a embriaguez tornada publica e dê-se instrucçáo ao povo, fazendo-o conhecer os prejuizos causados pelo álcool e conseguir-se-ha melhorar a sorte de tantos desgraçados. O tratamento curativo consiste em affastar a causa, melhorar a nutrição e as forças assimiladoras e despertar a acçáo nervosa. Um bom regimen, o emprego dos tonicos e dos alcalinos são meios que permit- tem reconstituir as funcçÕes digestivas perturbadas e enfraquecidas. No caso de dyspepsia alcoolica as preparações arsenicaes produzem bons effeitos. O appetite torna a apparecer e o mal estar diminue nota- velmente. As desordens nervosas tem sido combatidas pelos meios que acham sua indicação na modalidade symptomatica. As caimbras, os sobresaltos de tendões, as hallucinaçoes sao tratadas pelo opio e a morphina. Nos casos de epilepsia com vertigens recorre-se a assafetida e a camphora. Para remediar a fraqueza muscular, a paralysia, a anesthesia, a obtusao intellectual, usa-se da noz-vomica, da strychnina e do phos- phoro. O Dr. Marcet preconisa o oxydo de zinco para os casos acima citados e diz ter visto cessar o tremor do tronco e das extremidades, assim como a cephalalgia, as vertigens e hallucinaçoes. As vantagens de algumas destas medicações não podem ser con- testadas, entretanto não é permittido conceder á maior parte delias, senão uma acção palliativa, mas não curativa. No caso de delirio tremens o opio dá bons resultados, e a tintura de digitalis presta grandes serviços. As modificações, que soffrem as moléstias, que sobrevêm aos indi- viduos attacados de alcoolismo, dão lugar a indicações especiaes. Mo- derar a frequência do pulso, acalmar o systema nervoso, levantar as forças do doente, tal é o fim que se deve propôr o medico. A digitalis, o opio, a quina, são os meios com que se póde contar nestas circum- stancias,em que o repouso mais absoluto é sempre necessário ao doente. PROPOSIÇÕES CADEIRA DE PHARMACOLOGIA E ARTE DE FORMULAR Dos Vinhos- cWmico-pDarinacologicamente consiieraios, I O vinho serve para preparar soluções, designadas pelo nome de vinhos medicinaes. II Os vinhos medicinaes são soluções, que se obtêm, tratando pelo vinho substancias vegetaes e mineraes. III A natureza do vinho, com que se prepara cada um dos vinhos medicinaes, não é indifferente. IV O vinho branco, o tinto e o assucarado são os frequentemente utilisados. V Os vinhos destinados ás preparações pharmaceuticas devem ser de uma pureza escrupulosa. VI O vinho tinto contendo muito tannino não convém ao tratamento das substancias metallicas, nem ao das plantas, cujo elemento activo é um alcaloide. VII Os vinhos participam todos das propriedades do álcool, além disto a influencia do creme de tartaro se faz sentir no vinho branco, e a do tannino nos vinhos tintos. VIII Nada é mais variavel do que a quantidade de elementos fixos, tidos em dissolução nos vinhos. IX Os medicamentos que servem de base aos vinhos medicinaes tem quasi todos uma origem vegetal. X Os vinhos medicinaes, que tem por vehiculo o Malaga, são quasi inalteráveis ; os outros ao contrario soffrem mui promptamente a fer- mentação acética. XI Os vinhos medicinaes são, pela maior parte, medicamentos de com- posição imperfeitamente conhecida. XII Os vinhos medicinaes são simples ou compostos. CADEIRA DE PATHOLOGIA CIRÚRGICA INFECÇÃO PURULENTA I A infecçao purulenta ou pyohemia é caracterisada anatomicamente pela formação de collecções purulentas múltiplas, chamadas abcessos metastaticos, nos differentes orgãos. II As causas da infecçao purulenta são locaes e geraes. UI As causas locaes são todas as que determinam a stagnação do pus e as causas geraes residem no accumulo e nas más condicções hygi- enicas que cercam os doentes. IV A infecção purulenta é annunciada por um calafrio variavel, ele- vação de temperatura e acceleração do pulso. V A superfície traumatica muda de caracter, a suppuração diminue, o pus fica fluido, altera-se e, se a ferida marcha para a cicatrisação, o trabalho cicatricial pára, os liquidos exhalam um cheiro sanioso. VI Uma vez os primeiros symptomas desenvolvidos, a moléstia marcha rapidamente e muitas vezes a morte chega em dous ou tres dias. VII O tratamento prophylactico da infecção purulenta consiste : em lavar a ferida com liquidos anti-septicos e desinfectantes e alimentar convenientemente o doente. VIII Em evitar o accumulo de doentes, ventilar a athmosphera confinada e desinfectai-a. IX Limpeza excessiva de todas as peças de curativo, dos instrumentos, das esponjas, etc. X Isolar os doentes que já são victimas da infecção. XI O melhor methodo de curativo, para prevenir a infecção purulenta, é o de Lister. XII O tratamento curativo da pyohemia é em geral improfícuo. CADEIRA DE MATÉRIA MEDICA E THERAPEUTICA Acgão pliysiolosica e therapentica ío acido phenico, I O acido phenico, em solução mui diluida, applicado sobre os tegu- mentos ou as mucosas, os embranquece e produz uma adstringência mais ou menos energica. II Uma solução mais concentrada determina uma sensação de quei- madura com uma insensibilidade mais ou menos profunda. III No estado puro, os crystaes de acido phenico desorganisam os tecidos e produzem uma eschara superficial acompanhada de dor violenta. IV Tomado internamente o acido phenico, produz nas mucosas os mesmos effeitos irritantes, mais rápidos e mais violentos. V Em doses fracas o acido phenico actua como tonico e adstringente. VI Em doses elevadas provoca phenomenos de intoxicação semelhantes aos dos venenos corrosivos. VII A dose toxica varia, segundo os individuos, de 12 centigrammas a duas grammas. VIII Introduzido na economia pelas vias respiratórias, no estado de va- pores, o acido phenico determina as mesmas perturbações funccionaes que os anesthesicos. IX O acido phenico, em solução diluida, é o preventivo por excellencia contra a suppuração das feridas. X Internamente recommenda-se o acido phenico nas affecçÕes broncho- pulmonares. XI As applicaçoes de acido phenico externamente devem ser feitas com certa reserva. XII O acido phenico, empregado em clysteres dá bons resultados na febre thyphoide. HYPPOCRATIS APHORISMI I Si metus aut tristitia longo tempore perserverarint, melancholicum est signum. — Sect. 6. Aph. 23. II Sommus, vigilia, utraque modum excedentia, malum. — Sect. 2. Aph. 3. III Gibus, potus, venus, ommia moderata sint.—Sect. 2. Aph. 6. IV In febribus acutis convulsiones et circa viscera dolores vehementes, malum. Sect. 4. Aph. 54. V Ubi somnus delirium sedat, bonum. Sect. 2. Aph. 2. VI Ad extremos morbos extrema remedia exquisité óptima.—Sect. 1. Aph. 6.