FACULDADE DE MEDICINA E DE FEABMACIA DO BID DE JANEIRO THESE DO jjr. |níonio (| hristo (| unl(a RIO DE JANEIRO Typographia Moreira Maximino, Chagas & C.—Rua da Quitanda n. 90 1895 FACULDADE DE MEDICINA E DE PHÃRMACIA DO RIO DE JANEIRO DISSERTAÇÃO Cadeira de Clinica Pediátrica &òtudo (Btinico 3a Quòyeyòia NA PRIMEIRA INFANCIA TRES SOBRE CADA UMA DAS CADEIRAS DA FACULDADE Apresentada á Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, e perante ella sustentada a 30 de Dezembro de 1895 (Tendo sido approvada plenamente) POR Intonio ihristo lassanee Ma Doutor em scieneias medico-cirurgicas, tenente-medico honorário do exercito, ex-interno do Hospital de S. João Baptista de Nictlieroy, ex-interno de Clinica Pediátrica da Faculdade de Medicina, ex-socio do Grémio dos Internos dos Hospitaes, etc. cínfuo de dlnlonio êzneòto £aoôance Gimfia efunioz e 91 Catei a dTucjtista 91Laciet Gfvtioto £ao$ance NATURAL DO ESTADO DO PARA' RIO DE JANEIRO Typograplna Moreira Maximino, Chagas & C.— Rua da Quitanda n. 90 1895 FACULDADE OE MEDICINA E DE PHARMACIA 00 010 OE JANEIRO DIRECTOR—Dr. Albino Rodrigues de Alvarenga. V1CE-DIRECTOR—Dr. Francisco de Castro. SECRETARIO—Dr. Antonio de Mello Muniz Maia. LENTES CATHEDRATICOS João Martins Teixeira Physica medica. Augusto Ferreira dos Santos Chimica inorgânica medica. João Joaquim Pizarro Botanica e zoologia medicas. Ernesto de Freitas Crissiuma Anatomia descriptiva. Eduardo Chapot Prevost Histologia theorica e pratica. Chimica organica e biologica. João Paulo de Carvalho Physiologia theorica e experimental. Antonio Maria Teixeira Matéria medica, Pharmacologia e arte de formular. Pedro Severiano de Magalhães Pathologia cirúrgica. Henrique Jjadislau de Souza Lopes Chimica analytica e toxicologica. Augusto Brant Paes Leme Anatomia medico-cirurgica e comparada. Marcos Bezerra Cavalcanti Operações e apparelhos. Antonio Augusto de Azevedo Sodré Pathologia medica. Cypriano de Souza Freitas Anatomia e physiologia pathologicas. Albino Rodrigues de Alvarenga Therapeutica. Luiz da Cunha Feijó Júnior Obstetrícia. Agostinho José de Souza Lima Medicina legal. Benjamin Antonio da Rocha Faria Hygiene e mesologia. Carlos Rodrigues de Vasconcellos Pathologia geral e historia da medicina. João da Costa Lima e Castro Clinica cirúrgica—2a cadeira. João Pizarro Gabiso Clinica dermatológica e syphiligraphica. Francisco de Castro Clinica propedêutica. Oscar Adolpho de Bulhões Ribeiro Clinica cirúrgica—1“ cadeira. Erico Marinho da Gama Coelho Clinica obstétrica e gynecologica. Clinica ophtalmologica. José Benicio de Abreu Clinica medica—2? cadeira. João Carlos Teixeira Brandão Clinica psychiatrica e de moléstias nervosas. Cândido Barata Ribeiro Clinica pediátrica. Nuno de Andrade Clinica medica—1® cadeira. Drs. : LENTES SUBSTITUTOS 1. secção 2a secção 3a secção Genuíno Marques Mancebo e Luiz Antonio da Silva Santos. 4a secção Philogonio Lopes TJtinguassú e Ijiiíz Ribeiro de Souza Fontes. 5a secção Ernesto do Nascimento Silva. 6a secção Domingos de Góes e Vasconcellos e Francisco de Paula Valladares. 7? secção Bernardo Alves Pereira. Ha secção Augusto de Souza Brandão. 9a secção Francisco Simões Corrêa. 10a secção Joaquim Xavier Pereira da Cunha. 11a secção Luiz da Costa Chaves Faria. 12a secção Mareio Filaphiano Nery. Drs. : N. B.— A Faculdade não approva nem reprova as opiniões emittidas nas theses que lhe são apresentadas. (tíyjéeò el SítrUcl^ DISSERTAÇÃO « Les maladiês des enfants exigent une êtiide speciale; elles ont une physionomieparticulière; ía pathologie, la semeiotique et consèquemment la therapeutique sont dijferentes ; enfin, on peut être à la fois medecin excellent pour les adultes et mau- vais pour les enfants.» Hufeland. (Manuel de medecine pratique.) INTRODUCÇÂO Dyspepsia, segundo a etymologia da palavra, quer dizer : difpculdade de digestão. O nosso intuito, no presente trabalho, é estudar as pertur- bações digestivas que, bem se póde dizer, constituem quasi toda a pathologia da primeira infancia. O apparelho digestivo é, com toda a razão, considerado como pars minoris resistentice do orga- nismo infantil; sobre elle repercutem, alterando sua funcção, quasi todos os estados morbidos da infancia. Procuramos estudar a dyspepsia na primeira infancia col- locando-a n’um ponto de vista clinico, excluindo do assumpto as perturbações digestivas dependentes de uma lesão apreciável no apparelho digestivo ; n’elle incluindo, porém, os casos em que a lesão depende de um estado dyspeptico anterior. O estudo detalhado de todas as causas capazes de de- terminar uma perturbação digestiva nas creanças, constitue assumpto para um tratado de clinica pediátrica. Não é possivel, pois, deixar de restringir muito o assumpto. Estudaremos, por- tanto, d’um modo geral, todas as causas da dyspepsia, .extrinsecas ou intrínsecas, directas ou indirectas. Com a maioria dos pediatras, consideramos como primeira infancia, a phase da vida comprehendida, entre o dia do nasci- mento e o fim da primeira dentição e como segunda infancia, a .phase que, partindo do fim da primeira dentição, prolonga-se até a segunda. 6 Considerada n’um ponto de vista geral, a dyspepsia póde ser essencial ou symptouiatica, póde limitar sua dependeucia á esphera gastro-intestinal ou póde ligar-se a uma alteração do estado geral. Com os progressos da sciencia, vemos a classe das dyspepsias essenciaes restringir-se cada vez mais ; actualmente na maioria dos casos, consideramos as perturbações digestivas do adulto como effeito de causas que actuam sobre o estado geral. Taes são a dyspepsia do tuberculoso, do neurasthenico, do athe* romatoso, etc. Do mesmo modo pensamos em relação á infancia. Na maioria dos casos, as perturbações digestivas dependem do estado geral comproinettido de qualquer modo. Grande numero de pediatras consideram a dyspepsia in- fantil como effeito immediato e constante de um vicio no regimen alimentar. A’ primeira vista, parece verdadeiro esse modo de pensar e como tal o consideramos, até certo ponto ; basta para isso attendermos á susceptibilidade extrema do apparelho digestivo na primeira infancia e aos verdadeiros desatinos constantemente commettidos no regimen adoptado para a creança. Não devemos porém deixar de attender a certos casos, não muito raros, de creauças de tenra edade, alimentadas de modo desastroso, que vivem descuidadas por seus paes, atiradas para um canto e, não obstante, nada ou quasi nada accusarem de anormal na funcção digestiva. Por outro lado encontramos, com grande frequência, na classe culta da sociedade, creanças, cer- cadas de todas as cautelas tendentes a manter o regimem conve- niente, e que, apezar d’isso, são victimas de frequentes e graves perturbações digestivas. Parece-nos, pois, que devemos restringir um pouco a classe das dyspepsias infantis de origem alimentar; porquanto muitas vezes a clinica vem nos demonstrar que, a dyspepsia deve ser filiada a um vicio no estado geral, que a mantém apezar de per- feitamente proprio o regimen alimentar seguido. Assim temos visto succeder com creanças, victimas de qualquer moléstia her* 7 dada ou adquirida, que mais tarde, descobre-se completamente aos olhos do clinico. E’ claro no entretanto que, se uma alimentação imprópria é noc iva a uma creança isenta de qualquer moléstia herdada ou adquirida, ou de um vicio de nutrição, sel-o-á muito mais a uma outra que soffra o jugo dessas causas deppressoras de seu frágil organismo. Entre nós, como veremos em tempo, a malaria deve ser considerada, como um dos principaes factores que entram em jogo na producção das dyspepsias infantis. Podemos mesmo dizer que é um factor etiologico quasi constante n’essas dyspepsias, actuando, umas vezes, acompanhado de todo o cortejo symptoma- tico que lhe é peculiar, outras vezes porém, de modo insidioso, não se desenhando claramente á primeira vista. A heredo-syphilis, a tuberculose, etc. muitas vezes, con- correm, como o impaludismo, na etiologia da dyspepsia infantil, entre nós; o mesmo se observa em relação a outros estados mór- bidos dominantes no organismo da creança. Do que fica dito deduz-se que, o clinico a cujos cuidados é confiada uma creança victima de perturbações digestivas, não poderá nunca perder de vista a possibilidade dhirna causa latente no organismo, entretendo a dyspepsia. Nada mais facil do que libertar uma creança da consequência immediata de uma alimen- tação imprópria; nada mais difficil do que chegar ao mesmo resultado, quando o organismo do doentinho guarda silenciosa- mente em si, outras causas mais poderosas que a primeira, para resistir aos meios therapeuticos empregados. Nos differentes capitulos em que dividimos o nosso estudo, tratamos da etiologia, symptomatologia, diagnostico, prognostico e tratamento da dyspepsia na primeira infancia. Estudando a etiologia, faremos detalhada enumeração dos vicios do regímen alimentar, procurando os meios de respeitar a susceptibilidade do apparelho digestivo n’essa edade. Insistiremos mais de uma 8 vez, porém, ua concurrencia da malaria e de outras causas intrín- secas da dyspepsia, porque parece-nos que não devem ser omit- tidas 11a enumeração das causas, a que, em geral, são attribuidas as perturbações digestivas da infancia. Fecharemos o nosso estudo com algumas observações cli- nicas que comprovam eloquentemente o nosso modo de pensar e que foram colhidas d’entre os iunumeros casos que observamos no serviço de moléstias de creancas da Policlínica Geral do Rio j j de Janeiro. CONSIDERAÇÕES GERAES Uma vez nascida, a creança começa uma vida mais inde- pendente do organismo materno e para viver não dispõe mais dos mesmos meios por que se desenvolveu e cresceu durante a vida intra-uterina. A circulação placentaria é substituida pela circulação definitiva, o pulmão dá franco accesso ao ar athinos- pberico, e a respiração se faz então como no adulto. Sua nutrição que era feita a custa de orgãos que não lhe pertenciam, começa a depender de orgãos proprios, cuja fuucção é ainda imperfeita, do apparelho digestivo ainda incompletameute formado. O apparelho digestivo é preponderante no organismo da creança e, por isso mesmo, é o seu ponto vulnerável. Comquanto ainda imperfeito e debil, cabe-lhe o desempenho de um duplo papel no organismo incompleto do recemuascido ; mantel-o e dar- lhe a força necessária para desenvolver-se. D’ahi a frequência extraordinária das perturbações digestivas u’essa edade, tanto mais, quanto mais próxima está a creança do dia em que nasceu. Nos primeiros mezes que seguem-se ao nascimento, ou mais ainda, conforme condições múltiplas, a creança deve ser sujeita ao aleitamento materno exclusivo, á alimentação imposta pela natureza. O regimen lácteo é o unico capaz de satisfazer ás con- dições da muita actividade do apparelho digestivo imperfeito e debil. O leite é o alimento simples e completo por excellencia ; fornece tudo o que exigem, a reparação das perdas quotidianas e o rápido desenvolvimento do corpo. Tudo que se afastar d’esse 10 regímen é improprio e produz uma perturbação da funcção diges- tiva, o que, ua maioria dos casos, constitue o preludio da patho- logia infantil. N’ essa edade é necessário que o alimento seja de ordem a ser facilmente absorvido, e a representar, em pequena quantidade, uma boa sonnna de elementos nutritivos, pois, o estado rudimen- tar do apparelho digestivo, não permitte o trabalho preliminar do preparo do alimento para ser absorvido. Assim, não havendo mastigação e sendo muito rudimentar a salivação, o alimento liquido, o leite, por sucção e deglutição, vae directameute ao estomago, onde começa o acto digestivo e logo depois passa aos intestinos, onde são absorvidos os elementos nutritivos. A funcção digestiva da creança perturba-se, desde que o regímen alimentar adoptado seja superior ás suas forças ; desde que o apparelho digestivo a isso seja directameute solicitado por uma força qualquer ; desde que os orgãos da digestão resintam- se dos effeitos da debilidade maior do estado geral, sob uma in- fluencia qualquer. As duas primeiras condições acceutuam-se muito mais, quando entra em jogo egualmente a terceira ; se o apparelho digestivo é tão susceptivel 11a primeira infancia, sel-o-á em gráo muito mais elevado com o accrescimo da debilidade organica anormal. A terceira condição realisa-se muitas vezes, apezar da perfeita adopção de um regimen conveniente. Perturbada a funcção soberana da creança, dá-se um des- equilíbrio orgânico, seu desenvolvimento torna-se estacionário, suas forças decaliem, e, n’essas condições, abrem-se de par em par as portas de entrada de seu organismo ás differentes moléstias que lhe são peculiares. D’esse modo é que se dá muitas vezes a inva- são do germeu paludico no organismo da creança. Comprehende-se perfeitamente a importância do impalu- dismo como candidato constante á concurrencia mórbida no orga- nismo infantil ; é uma moléstia que reina endemicamente, de modo desolador, em todo o território brazileiro, desde as fronteiras até as margens do Atlântico. Bile, quando não domina o orga- 11 uismo desde o nascimento, d’elle apodera-se em occasião propicia. O professor Cantani de Nápoles acredita que os habitantes das zonas paludosas, trazem sempre no organismo, o germen paludico em estado latente, e que sob a influencia do menor abalo pódem surgir os accessos palustres clássicos. De accordo com este modo de pensar, alguns cirurgiões italianos adoptaram a medida de administrar saes de quinino, aos doentes, alguns dias antes de serem operados, e d’esse modo conseguiram muitas vezes evitar os accessos palustres que sobrevinham em geral nos dias que seguiam-se á operação. Passemos a estudar agora as principaes fôrmas por que se apresenta geralmente a dyspepsia na primeira infancia. Segundo a maioria dos pediatras, a dyspepsia apresenta-se nas creanças sob tres formas ; gastrica, intestinal e gastro-intes- tinal, segundo observa-se a predominância dos phenomenos gás- tricos, iutestinaes, ou se uns e outros apresentam-se a um tempo. E’ nos intestinos que se effectua a parte mais importante da digestão na creança, é ahi que se faz activamente a absorpção, graças ao epithelio da mucosa intestinal e aos vasos sanguíneos e chyliferos, é ahi que se operam os phenomenos chimicos mais importantes. Antes de ahi chegar, porém, o alimento soífre a acção imprescindível do sueco gástrico. Quando, sob a influencia de uma causa qualquer, dá-se uma alteração 11a secreção chloro-peptica do estomago, o alimento permanece indigesto no ventriculo, e então, ou continúa sua pro- gressão pelo tubo digestivo abaixo, constituindo a forma intesti- canal da dyspepsia, ou é regeitado sob a forma de vomitos, que caracterisam a dyspepsia gastrica. Os dous phenomenos pódem dar-se no mesmo individuo, teremos n’esse caso a forma gastro- intestinal. Segundo a definição de Chomel, dyspepsia é uma simples perturbação da funeção digestiva, independente de qualquer lesão nos orgãos do apparelho digestivo, 12 Acreditamos que os phenomenos dyspepticos são todos dependencia immediata de uma alteração nas secreções, que re- presentam o factor mais importante da digestão. Hoje depois dos estudos n’esse sentido feitos entre nós pelo Dr. Moncorvo, e por Léo, em Berlim, podemos attribuir as dyspepsias infantis a uma alteração no sueco gástrico, á diminuição ou ausência completa do acido chlorhydrico. Segundo o Dr. Moncorvo, a dispepsia nas creanças é con- sequência de uma diminuição ou ausência completa de acido clilor- liydrico no sueco gástrico, para o que muito concorre a tempera- tura elevada da zona tropical, durante as longas estações quentes, determinando uma liypersecreção sudoral. Os resultados conse- guidos com a chlorhydrotherapia, confirmam perfeitameute esse modo de pensar. A passagem para os intestinos, de substancias indigestas, determina uma irritação na mucosa intestinal e d’ahi a diarrhéa observada na maioria dos casos. A persistência d’essa irritação póde dar em resultado a inflam mação da mucosa, com todos os pheiiomeuos que llie são proprios, dando ao caso um caracter muito mais serio. As autopsias feitas em creanças, victimas de enterites graves, têm revelado apenas um estado congestivo da mucosa intestinal um tanto atrophiada. Poucas vezes se tem encontrado espessamento da mucosa e sclerose da camada muscular. H’esta desproporção que se evidencia, entre os symptomas dhuna extrema gravidade observados no doentinlio, e as lesões insignificantes encontradas pela autopsia 11a mucosa intestinal, que prova muito bem em favor do elemento infeccioso e toxico 11a pathogenia dos accidentes. Muitos são os agentes microbianos que determinam as gastro-enterites graves da infancia, são quasi todos os microbios patliogenicos hospedes liabituaes do tubo digestivo. Entre elles representa, sem duvida alguma, papel preponderante o bacterium 13 colicommune. Esses microbios actuam pelas toxinas que excre- tam, as quaes infeccionam o organismo inteiro pelos phenomenos de auto-intoxicação, que são hoje perfeitamente admittidos. Admittida como está hoje a idéa da existência constante de agentes pathogenicos no meio intestinal, vem ella collocar-se entre as outras muitas que levam-nos a crer na origem intrínseca de muitas das perturbações gastro-intestinaes da infancia. O meio intestinal é, pois, para o organismo da creança uma perigosa fonte de intoxicações, que reclama sérios cuidados para que não a vejamos prejudicar seriamente todo o equilibrio funccional do organismo, uma vez que elle offereça occasião propicia á acção virulenta d’esses germens. D’essa noção deduz-se immediatamente a grande vanta- gem que ha na desinfecção do tubo intestinal, o que constitue um dos meios racionaes de intervenção, do qual nos occuparemos em tempo. Segundo Eésag, a coloração verde que muitas vezes apresentam as dejecções das creanças, é devida em alguns casos á presença de um bacillo especial, chromogeno, que se desenvolve bem no meio intestinal e que não resiste á acção do acido láctico ; quasi sempre, porém, depende de uma alteração da funcção hepatica. Em resumo póde-se dizer, que sob uma influencia qualquer, extrínseca ou intrínseca, o déficit de acido chlorhydrico no sueco gástrico determina uma insuíficiencia da digestão gastrica, o alimento permanece no ventrículo por um espaço de tempo maior e, ou é regeitado sob a forma de vomitos, ou passa para os intestinos, cuja funcção muito provavelmente está alterada tam- bém ; ahi póde-se produzir uma simples irritação da mucosa ou verdadeira enterite, pode se dar uma fermentação e os phenome- nos consecutivos já conhecidos. Pode dar-se portanto uma into- xicação que, alliada á deficiência nutritiva, e ás constantes ex- poliações intestinaes, põe a vida da creança em serio perigo. O 14 esgotamento a que fica reduzida a creauça póde determinar verda- deiras atropinas e degenerações visceraes, que foram magistral- mente descriptas por Parrot, e que são encontradas nas verifica- ções necropsicas da athrepsia. Ao terminar estas ligeiras considerações não podemos deixar de fallar na gastro-ectasia que, sendo mais commummente observada na segunda infancia, encontra-se todavia em creanças de poucos mezes de edade. Acreditamos que a repleção alimeutar possa dilatar me- canicamente o veutriculo, mas não podemos negar que outras causas podem chegar ao mesmo resultado. Assim só, poderemos explicar alguns casos de gastro-ectasia em creanças de mezes sujeitas ao aleitamento materno. Junctamente com os vicios no regimen alimentar, concor- rem para a dilatação do estomago nas creanças, a temperatura elevada do nosso clima, capaz de determinar uma atonia muscular das paredes do estomago e sua consequente relaxação ; a intoxi- cação palustre por sua acção perturbadora sobre as funcçÕes digestivas e outros estados morbidos que por sua acção dystro- phica, debilitando todos os apparelhos, mormente o apparelho digestivo, concorrem para produzir a atonia e o relaxamento das paredes do estomago. Só assim, repetimos, poderemos explicar a extraordinária frequência da gastro-ectasia entre nós, estendendo-se mesmo ás creanças sujeitas desde o nascimento ao aleitamento materno exclusivo. Etiologia Innumeras são as causas capazes de perturbar a funcção digestiva na creauça, principalmeute nos dous primeiros annos da vida. Qualquer desvio de hygiene, n’essa idade, é capaz de produzir um estado dyspeptico, que pode ser passageiro e de pouca importância, em uma creauça, cujo organismo não se resinta de um vicio constitucional, e que seja convenientemente tratada ; mas que pode produzir a morte, quando se trata de uma creança que não fôr cercada dos cuidados tão necessários n’essa tenra idade, principalmente quando n’esse frágil organismo existem, em estado latente, os germens de varias moléstias her- dadas ou adquiridas, que entram em franca actividade logo que sentem abalar-se o principal alicerce d’esse edifício orgânico. Dividiremos as causas capazes de produzir a dyspepsia na primeira infancia em: Causas determinantes directas e Causas determinantes indirectas. Como causas determinantes directas estudaremos principal- mente os ingesta que constituem a grande causa mechanica da dyspepsia. O apparelho gastro-intestinal é tão susceptivel na primeira infancia, que é bastante um excesso de alimentação para produzir uma perturbação digestiva. Tem-se observado esse facto, mesmo em creanças sujeitas ao aleitamento materno exclusivo, quando mal dirigido esse regimen. Por isso a hygiene aconselha algumas regras a seguir para evitar uma sobrecarga de leite no estomago 16 da creança, do que resulta a passagem para os intestinos, de certa quantidade de alimento que não foi para isso preparado, e sobre- vém logo a diarrhéa. Dissemos já, que o regimen alimentar a que deve ser sujeita a creança nos primeiros mezes é o do aleitamento materno exclusivo. Todos os pediatras europeus lamentam a frequente substituição do aleitamento natural pelo artificial, principalmente na classe pobre, em que as mulheres têm necessidade de vender o seu leite para poder viver, ficaudo seu filho sujeito á alimen- tação artificial. Entre nós não é tão frequente esse facto, que só se dá, quando a mulher julga-se em más condições para ama- mentar. O que observa-se muito, porém, é a addição ao aleitamento materno de substancias impróprias, a titulo de coadjuvantes, e que quasi sempre destroem todos os benefícios trazidos regimen natural. O leite materno é, como já o dissemos, o alimento que a natureza impõe ao recem-nascido ; é o unico nas condições de satis- fazer a todas as exigências d’aquelle organismo. Sua riqueza de princípios nutritivos, nos diversos mezes que seguem-se ao nasci- mento, não é a mesma; vai augmeutando proporcioualmente ao desenvolvimento do apparelho digestivo da creança. E’ ainda no leite materno que ella encontra a agua de que necessita, sendo assim inútil administrar-lhe agua, a pretexto de saciar-lhe a sede, como geralmeute é costume fazer. Costume esse, altamente preju- dicial, porquanto, não é raro servir a agua de vehiculo para a entrada, no organismo infantil de germens diversos que, logo ou mais tarde, vão perturbal-o em seu funccionalismo. Segundo alguns auctores, é por esse modo queise dá a infecção palustre, tão commum entre nós. Perier prescreve, em todo caso, a agua fervida ou pelo menos filtrada. O leite materno precisa satisfazer igualmente a certas exi- gências, e a mulher que amamenta deve para esse fim sujeitar-se a um regimen traçado pela hygieue. Muitas vezes é uma alte- ração no leite determinada por um desvio no regimen da mulher i7 que amamenta, que vae perturbar a funeção digestiva da creança. E’ costume em toda parte sujeitar a creança ao aleita- mento mercenário, no caso de justificada impossibilidade na mulher de amamentar seu filho; ou no caso lamentável de querer ella poupar-se a esse trabalho. Prescreveriamos certamente esse genero de aleitamento como o succedaueo immediato do aleitamento materno, se fosse facil, ou melhor, possivel attender-lhe a todas as condições hygie- nicas indispensáveis, taes como a perfeita concordância do leite, no pouto de vista da sua riqueza de princípios nutritivos, com a maior ou menor tolerância das vias digestivas d’esta ou d’aquella idade ; e a certeza absoluta, após um exame medico rigorosissimo, da ausência de moléstias na mnlher que vai ser a ama de leite ; moléstias que além de tornar nocivo o leite á funeção digestiva da creança, podem ser-lhe transmittidas. Ora, as amas de leite, em geral, são oriundas da classe inculta da sociedade, onde os preceitos de hygiene são, a bem dizer, desconhecidos completamente, encontrando-se a cada passo, mulheres portadoras de moléstias que as incompatibilisam com as funeçoes de ama de leite, e que, muitas vezes em estado latente, escapam ao mais minucioso exame medico. Não pode, portauto, haver nunca plena certeza de que a ama de leite esteja nas con- dições imprescindíveis de exercer as suas funeçoes. Eis a razão porque não prescrevemos o aleitamento mer- cenário, que só admittimos em condições muito especiaes, e damos toda a preferencia ao artificial comtanto que seja bem dirigido, de accôrdo com todos os preceitos de hygiene; porquanto uma das causas frequentes da dyspepsia na primeira infancia é, sem duvida alguma, o aleitamento artificial mal dirigido. Bem dirigido, certas regras indispensáveis seguidas, desde a escolha do leite a administrar até a completa asepsia da mama- deira, o aleitamento artificial será perfeitamente tolerado. O leite escolhido deve ser o de vacca, este deve ser esterilisado, 18 A esterilisação destróe todos os fermentos que determinam a acidez do leite e as perturbações digestivas ; é provável que não impeça a transmissão da tuberculose, porque a temperatura da esterilisação não attinge a i io°, mas é precioso meio de evitar frequentes perturbações digestivas. Além de ser puro, devemos reconhecer no leite esterilisado, a vantagem de ser mais facilmente digerido ; em vez de coagular em grandes fragmentos no estomago da creança, precipita-se em finos grumos. Para a esterilisação do leite são necessários apenas um sustentáculo para os frascos e uma marmita para receber esse sustentáculo. Os frascos cheios de leite puro ou diluido em pro- porções varias de accordo com a edade da creança, são fechados, e collocados no sustentáculo. Este é collocado dentro da marmita cheia d’agua e fechada completamente. A marmita é levada ao fogo, até entrarem os líquidos em ebulição por espaço de 40 a 50 minutos. Para usar o leite, basta transformar os frascos em ma- madeira adaptando-lhes uma chupeta, que deve estar aseptica. N’essas condições, o leite de vacca administrado á creança na temperatura de 37o, é por ella perfeitamente tolerado. Entre nós usa-se muito alimentar as creanças com leite condensado. Consideramol-o como um genero de alimentação nocivo ás funcções digestivas. Em primeiro lugar ha a pro- babilidade da falsificação do producto, por substancias nocivas á creança e que não podem ser reconhecidas a primeira vista. Ainda mesmo puro, o leite condensado sendo preparado com o leite de vários animaes, é claro que seus elementos componentes não guardam proporção constante. Accresce ainda a circumstancia de ser esse leite condensado, magnifico meio de cultura para as bactérias que existem normalmente no ar athmospherico e, con- seguiutemente, um meio facillimo de vehiculação bacteriana. Não é raro ver-se tentar em creanças de poucos mezes, o regimen alimentar do adulto e ser essa pratica seguida de graves perturbações digestivas, que poem em perigo a vida da creança. Tem igualmente provado muito mal no regimen alimentar da primeira infancia o uso dos feculentos, mesmo quando associados ao aleitamento materno. Em summa o unico regimen que deve seguir uma creança de mezes é o regimen lácteo. O aleitamento materno, sendo um meio natural de alimentação, é, apezar d’isso, sujeito a certas regras, para que se mantenha a integridade da funcção digestiva da creança. O aleitamento artificial bem dirigido collocamos em segundo plano, como um recurso de que podemos lançar mão, quando o regimen natural é impossível. Desde que a creança attinge certa edade, é preciso que seja sujeita ao regimen omnívoro. E’ essa transição que quasi sempre se faz com prejuízo para a funcção digestiva; é essa transição que uns querem que seja feita em certa época e outros mais tarde, bruscamente ou por tentativas. Opinamos por este ultimo meio que tem a vantagem de permittir que se volte atraz desde que uma substancia não seja tolerada ainda. E’ mais facil, pare- ce-nos, o apparelho digestivo resentir-se de uma mudança brusca de regimen, do que por uma transição lenta e gradual. Não devemos deixar de enumerar, entre as substancias que perturbam directamente a funcção digestiva na creança, certas bebidas aromaticas ou fermentadas, fructos e doces que, muitas vezes conteem substancias capazes de produzir uma perturbação digestiva, até mesmo n’uin adulto. Uma vez enumeradas as causas que mais commummente produzem a dyspepsia, actuando directamente sobre o apparelho digestivo, perturbando-lhe a funcção, passemos a enumerar as causas que actuam de um modo indirecto, produzindo o mesmo effeito. Começaremos enumerando a grande classe de causas o embora actuern de modo diverso, concorrem todas para ? ducção da dyspepsia, debilitando o organismo, collocandr condições ainda mais favoráveis para a aCção dos agentes badores de sua funcção capital. 20 Os estados diatliesicos que enfraquecem o orgauismo da creança podem produzir os phenomenos morbidos da dyspepsia. Bsses estados dependem ou de simples vicios de nutrição, inhe- rentes á economia da creança ou de moléstias infecciosas de influencia discrasica reconhecida. Bntre os vicios de nutrição dos quaes depende muitas vezes a dyspepsia, estão o rachitismo e o estado de debilidade infantil denominado fraqueza congénita. Bntre as moléstias infecciosas encontramos no primeiro plano o impaludismo, a tuberculose e a heredo-syphilis. Bntre nós a malaria adquire proporções avantajadas junto as outras, como já dissemos, e como demonstraremos com algumas observações clinicas finaes. Por essa razão menciona- mol-a á parte, embora outras moléstias possam concorrer do mesmo modo para a producção da dyspepsia e actuem pertinazes como causa predisponente. As creanças dispondo de fraquissimos meios de resistência organica deixam-se influenciar pelos agentes exteriores com mais facilidade que o adulto. São, portanto, imprescindiveis, as regras que a hygiene traça, nesse sentido. B’ commummente observada a influencia desastrosa, que exerce sobre o organismo, muito principalmente sobre o da creança, o modo por que vivem os indivíduos da classe pobre. Habitam em estalagens, onde o ar é viciado, onde existem iinmun- dicies de toda especie. Ora, além das muitas iufecçÕes que ahi se podem dar, devemos considerar a agglomeração de pessoas em um espaço pequeno, faltando portanto o oxygeno necessário para a funcção da hematose, e havendo excesso de gaz carbonico, o qual é toxico, quando provém de miasmas physiologicos, como muito bem provou o physiologista P. Bert. Bntre nós observa-se muito esse facto, e não é pequeno o numero de creanças da classe pobre, filhas do proletariado que, debilitadas pelas más condições domi- ciliarias, são victimas de infecções diversas. Como já dissemos, a temperatura elevada é umadas causas da dyspepsia entre nós ; assim ella actúa indirectamente, augrnen- tando a secreção sudoral, o que determina uma deficiência chlorhydrica no sueco gástrico. Igualmente influem de modo nocivo sobre o apparelho gastro-intestiual da creança, as variações de temperatura e o frio intenso. Vários pediatras citam innumeros casos de dyspepsia que sobrevieram em creanças, após um passeio á noite, uma vez que não foram tomadas as cautelas necessárias para preserval-as da acção do frio. O systema nervoso é extremamente excitável nos pri- meiros annos da vida, assim explica-se a multiplicidade de causas que actuam frequentemente e de modo indirecto sobre a creança, produzindo estados morbidos diversos. Uma forte excitação ner- vosa é capaz de produzir uma perturbação digestiva por um pbenomeno reflexo ; o medo produz esse effeito. Alguns autores consideram a erupção dos primeiros dentes como uma grande causa de dyspepsia na primeira infancia. Merece realmente a denominação de velha tradição, a ideia de attribuir só a um phenomeno physiologico, as innumeras moléstias que se podem observar n’essa época da primeira infancia; e podemos dizer mesmo que, tal ideia é nociva á classe inculta da sociedade, porquanto traz como consequência o abandono da creança á moléstia, que não é considerada como tal, e que muitas vezes termina pela morte, por falta absoluta de intervenção no sentido de debellal-a. Entre nós factos desses não são raros. O que é innegavel, porém, é a receptividade mórbida maior u’essa pliase da primeira infancia ; acreditamos que a erupção dos primeiros dentes predispõe á invasão e manifestação de certas moléstias. Assim, o organismo da creança resiste á influencia de certa causa, mas uma vez chegada a época da erupção dos pri- meiros dentes, fraqueia e deixa-se influenciar pela causa, que de impotente torna-se victoriosa. Esse facto observamos diaria- mente não só em relação aos vicios no regimen alimentar, como em relação á influencia dos agentes exteriores. 22 O pediatra Henock, de Berlim, cuja experiencia clinica é por todos respeitada, cita diversos casos de dyspepsia gastro-intes- tinal que resistiram tenazmente, durante algum tempo, ao trata- mento, e que cederam rapidamente depois da sahida do alvéolo de um ou dois dentes, e explica esse facto pela acção reflexa do grande sympathico ou do nervo vago, tendo por ponto de partida a excitação dos ramos dentários do trigemeo. J. Siinou não acredita que a dentição seja a causa de todos os accidentes que a ella attribuem-se geralmente. Acredita, porém, que a distensão das gengivas produz paralysias reflexas, capazes de determinar stases sanguíneas para o encephalo e para o tubo digestivo, e que a esse plienomeuo devemos attribuir as perturbações funccionaes, frequentes n’essa época. Como já dissemos, acreditamos que a erupção dos pri- meiros dentes, concorre para a invasão de certas moléstias, dando ao organismo da creança maior receptividade mórbida, o que explicamos pelos phenomenos reflexos diversos, que se podem dar, tendo por ponto de partida os ramos dentários do trigemeo. Ao terminar a enumeração das priucipaes causas que com- mummente produzem a dyspepsia na primeira infancia, diremos que a existência de germens de toda a especie no meio que nos cerca, impõe-nos as maiores cautelas para evitar a veliiculação desses germens, que encontram larga porta de entrada no appa- relho gastro-intestinal. Assim, deve haver asepsia absoluta em todos os objectos que servem na alimentação da creança, sem o que esses objectos podem servir de vehiculo a um germen infec- cioso, o qual é sufficieute por si só para perturbar o equilíbrio funccional do organismo infantil. Symptomatologia Antes de entrar propriamente no estudo dos principaes symptomas, que caracterisam as tres formas clinicas da dyspepsia na primeira infancia, diremos algumas palavras sobre o que constitue funccionalismo normal n’essa edade ; occupando-nos, mais particularmente, com o apparelho gastro-intestinal. Nos primeiros dias que seguem-se ao nascimento, o recem- nascido perde um pouco de seu pezo, para começar a recuperal-o logo depois. O augmento de pezo é condição essencial no caso de perfeito funccionalismo de todo o organismo infantil, mór- mente do apparelho digestivo, cuja funcção domina todas as outras. O desenvolvimento da creança é muito rápido, nos dous primeiros annos, a ponto de poder-se, nos primeiros mezes, dis- tinguir perfeitamente a edade de duas creanças que nasceram com poucos dias de differença, uma da outra. Mais tarde póde-se ainda precisar mezes de differença na edade, pelo gráo de desenvol- vimento, e a proporção que a creança chega á edade mais avan- çada, tanto menos facil se torna precisar-lhe a edade, pois, seu desenvolvimento, a partir do dia em que veio ao mundo, é tanto mais rápido, quanto menor é a sua edade ; faz-se segundo um mo- vimento uniformemente retardado. Km época fixa, attinge a creança vários grãos de desenvolvimento, alguns dos quaes são geralmente tomados, como caracteristicos certos da edade, taes como, a erupção dos primeiros dentes, o ensaio dos primeiros passos, etc. Kssa escala, porém, é muitas vezes alterada, pela menor perturbação funccional do apparelho digestivo. 24 O augmento de pezo deve ser constante na creança. E’ para haver certeza de que nada embaraça-lhe o desenvolvimento, que observa-se a pratica de pezar diariamente a creança. Uma perturbação digestiva logo altera o augmento de pezo diário. A creança evacua”duas, tres ou quatro vezes por dia ; com o avanço em edade essa frequência diminue. As fezes nos pri- meiros dias que seguem-se ao nascimento são verde-escuras (meconium). depois passam a ser de um amarello claro, com a consistência de um caldo grosso, quasi sem cheiro. Esses caracteres, referem-se ás fezes das creanças sujeitas ao regimen lácteo; uma vez mudada a alimentação, observa-se logo a mudança nos resíduos da digestão ; e á medida que a creança vai passando para o regimen omnívoro, sua digestão differe menos da do indivíduo adulto. Devemos mencionar um phenomeuo muito frequente- mente observado nas creanças de peito, e que, á primeira vista, pode ser considerado como symptoma de dyspepsia ; referimo-nos ao chamado vomito ou regorgitação dos recem-nascidos, como o chamou Henock. Essa regorgitação dá-se, quando ha uma sobre- carga de leite no estomago, e este desembaraça-se do excesso, ou quando se imprimem movimentos bruscos ou exagerados á creança que acabou de mamar. Essa regorgitação parece mesmo ser um phenomeno providencial, pois, por uma prompta evacuação do excesso de alimento, evitam-se os seus effeitos per- niciosos. Esse phenomeno é explicado pelas condições anatómicas do estomago n’essa edade, sua posição quasi vertical e sua dimi- nuta capacidade. Não devemos pois confundir a regorgitação dos recem- nascidos, com os vomitos caracteristicos da dyspepsia gastrica; só devemos considerar nocivo esse phenomeno se reproduzir-se cada vez que a creança mamar, pois d’esse modo, compromet- terá directamente sua nutrição, e então é necessário intervir aconselhando os meios de evital-o. 25 Passemos agora ao estudo dos principaes symptomas observados nas diversas formas da dyspepsia. Hm geral é pela esphera intestinal que começa a revelar-se a perturbação digestiva, pois ahi é que se passa a parte mais activa da funcção. As dejecções deixam logo de apresentar-se com os caracteres acima traçados, tornam-se esverdeadas, mais fluidas, contendo forte proporção de mucus, granulações graxas e coágulos de caseina não digerida. Em alguns casos, as fezes tornam-se muito fétidas ou com um cheiro acido caracteristico. A creança evacua com mais frequência; nos casos graves, o numero das evacuações pode mesmo ser de quinze a vinte por dia. O ventre torna-se abahulado e tympanico, a creança, irrequieta, chora muito, procura o seio para mamar e deixa-o logo para gritar, não se acalmando um pouco, senão depois de expellir gazes intestinaes. Outras vezes os vomitos precedem todo o cortejo sympto- matico, a creança vomita repetidas vezes, procura mamar, mas logo deixa o seio para expellir todo o leite ingerido; ás vezes o leite demora-se um pouco no estomago mas é logo rejeitado. Esses vomitos, em geral, são precedidos ou acompanhados de eructações, que indicam a producção pouco frequente n’essa edade de gazes no estomago. O leite vomitado vem muitas vezes mistu- rado com mucus, ao que Henock liga muita importância como symptoma de dyspepsia gastrica. A dyspepsia gastrica em geral é acompanhada de consti- pação nos primeiros dias. A lingua torna-se, um tanto ou muito saburrosa, a cavidade buccal cobre-se de placas de muguet (oidiuin albicans ). Esta forma de dyspepsia, quando não é combatida em tempo, estendem-se os phenomenos dyspepticos até a esphera intes- tinal, constituindo a forma gastro-intestinal, o que é muito com- mum. Ha casos, porém, em que a dyspepsia limita-se á esphera gastrica. Do mesmo modo a forma intestinal em um período mais adiantado, complica-se com a forma gastrica. Em qualquer das tres formas da dyspepsia, a creança dimiuue sensivelmente de pezo, o que quer dizer, deficiência de nutrição e embaraço no desenvolvimento. A perturbação digestiva simples pode tomar um caracter muito sério, se fôr abandonada a sua própria evolução; em pouco tempo, ao processo puramente chimico, pode juntar-se um processo de natureza anatómica. O contacto prolongado e irritante das matérias em fermentação deve terminar por uma inflani- mação da mucosa. Quando a dyspepsia é entretida só por um vicio no regimen alimentar, basta a correcção do regímen para que cessem todos os phenomenos dyspepticos. Ha casos, porém, em que embora se corrija o regimen alimentar que parece defeituoso, a perturbação digestiva contiuúa a produzir seus effeitos desastrosos. Como já tivemos occasião de dizer, esse facto observa-se, quando a dyspepsia é entretida por uma moléstia em estado latente, contra a qual o clinico inexperiente não dirige a sua therapeutica. A inalaria revela-se n’esses casos, por symptomas que não se impõem á primeira vista, sendo facil passar desapercebida ; e não sendo atacada, continua a esgotar o organismo da creança pelos phenomenos- espoliativos que determina, pela deficiência nutritiva consequente e pode mesmo arrebatal-a á vida em poucas horas, apreseutando-se com a surprehendente anarchia sym- ptomatica do accesso pernicioso. Como já dissemos, a inalaria deuuucia-se ás vezes sómente por ligeira liypothermia peripherica em certas horas ; o baço porém apresenta-se u’esses casos augmentado e não raro pela reacção manifesta do doentinho, parece doloroso á pressão. As vezes os symptomas da infecção palustre apresentam-se no decurso da perturbação digestiva dependente de uma intole- rância pelo genero de alimentação administrado á creança; parece-nos que, u’esses casos, o impaludismo não é senão uma 2 7 moléstia intercorrente ; isso não quer dizer, porém, que a infecção palustre seja n’esse caso um accidente de somenos importância, concorre sempre para a aggravação do caso. Sendo múltiplas as causas da dyspepsia infantil, sendo muitos os estados morbidos capazes de produzil-a e mantel-a, é claro que muitas vezes os symptomas apresentem-se do modo mais variado, conforme cada caso em particular. Uma creança tuberculosa não se apresenta ao clinico como uma outra impalu- dada ou heredo-syphilitica. Ao clinico compete tirar dos sympto- mas geraes, as conclusões clinicas, uecessarias ao caso. A symptomatologia das desordens digestivas na primeira infancia, varia ainda, conforme a marcha de cada caso. Se fôr abandonada a si, a dyspepsia p.ersiste em sua marcha e o resultado é a apparição dos symptomas perculiares ás gastro-interites e outros pheuomenos morbidos de caracter muito mais sério, com os quaes não nos cabe occupar-nos detalhadamente. Diagnostico Em clinica pediátrica o diagnostico é baseado nos comme- morativos e nos signaes objectivos, pois, os signaes subjectivos, faltam quasi qne completamente, sobretudo quando se trata de uma creança de mezes. O clinico, portanto, tem necessidade de proceder á mais rigorosa anamnese, pois, os signaes obtidos pelo exame, são insufficientes para guial-o no juizo diagnostico. O exame do doente é incontestavelmente uma das maiores difficuldades que encontra o medico no exercicio da clinica pediá- trica ; é necessário empregar, mesmo, certa astúcia para conseguir proceder a um exame regular, pois, muitas vezes a creança oppõe forte resistência a qualquer exame. Póde-se dizer que, sómente a pratica babilita o clinico a vencer esse obstáculo, que se lhe apresenta diariamente no exercicio de sua profissão. No que diz respeito á anamnese, é preciso grande sagaci- dade para que o clinico não enverede por um caminho errado, principalmente quando se trata de uma creança filha de pais incultos, como temos observado algumas vezes. A anamnese deve ser completa, sem omissão da menor particularidade, desde os ante- cedentes hereditários até o estado actual da creança. A informação a respeito do regimen alimentar seguido, deve ser minuciosa, assim como a localidade que habita. São dados esses de grande valor para o medico, quando se trata de fazer um juizo seguro sobre um caso de moléstia infantil. O diagnostico da dyspepsia na primeira infancia, não apre- senta difficuldade alguma na pratica, uma vez que o clinico acha-se de posse da historia completa do doentinho e dos sympto- 30 mas n’elle observados. Deve ser feito o mais cedo possível em relação a evolução da moléstia, porque, como já vimos, o processo evolue com grande rapidez, determinaudo enfraquecimento rápido do organismo pelas espoliações frequentes que a creança soffre. O exame das dejecçoes é de grande importância para o diagnostico da dyspepsia. As fezes como que trazem a explicação do modo por que foi perturbada a funcção digestiva. Sabemos que é a deficiência de acido clilorhydrico no sueco gástrico que perturba a funcção e as fezes confirmam esse modo de pensar, pelas partículas indigestas que contêm. A menor perturbação digestiva traduz-se logo pela mudança de aspecto das dejecçoes. A dyspepsia na segunda infancia, 11a maioria dos casos, é acompanhada de gastro-ectasia, porém ha casos em que as creanças de mezes apresentam-na de modo bem evidente. Pela simples inspecção póde-se ás vezes fazer o diagnos- tico da gastro-ectasia infantil, sendo n’esses casos muito mani- festa a proemiuencia da região epigastrica nas creanças. A producção da clappotage, tão preconisada por Bouchard, e que é incontestavelmente um meio heroico para o diagnostico da gastro-ectasia no adulto, uão apresenta as mesmas vantagens quanto se trata de uma creança. A contracção dos musculos abdominaes e a distenção das paredes do ventre, determinadas pelo choro da creança, impedem completamente a producção do phenomeno. O processo do Dr. Moncorvo, denominado, gastro-reso- nancia plessime trica, é excellente meio de que podemos lançar mão para o diagnostico facil da dilatação gastrica. Km poucas palavras, esse processo consiste em distender as paredes do esto- mago pelo gaz carbonico, e depois applicar o pavilhão do esthetos- copio de Constantin Paul sobre a região epigastrica; e, emquanto se ausculta, vae-se percutindo ligeiramente com o indicador e o medio a partir do ponto em que foi applicado o pavilhão do esthetoscopio, e em torno d’elle em zonas concêntricas de dentro para fora. Os pontos que delimitam a zona de resouancia, são o limite máximo da dilatação gastrica. B’ este processo muito simples e com elle facilmente chegamos a um bom resultado para o diagnostico seguro da gastro-ectasia em creanças de mezes. Nos casos de dyspepsia em que suspeitamos da influencia malarica, muitas vezes certas particularidades iuherentes a localidade habitada pelo doente, elucidam-nos alguma cousa a respeito. Temos observado innumeros casos, em que a moléstia actuava de modo insidioso, e que tornaram-se bem claros depois de obtidas informações minuciosas a respeito do meio que habitava a creança. Assim, a existência de pantanos, terrenos encharcados, immundicies de toda especie, escavações, emfim quaesquer focos de infecção nos levam iinme- diatamente a pensar na intoxicação palustre, que é a mais com- mummente observada no nosso paiz. Outras vezes a perturbação digestiva é acompanhada de uma serie de symptomas, que nos autorisam a asseverar a existência de um estado morbido causador da dyspepsia. Assim é que, muitas vezes, somos informados de que a creança a lioras certas tem as mãos frias, depois eleva-se a temperatura, do tronco principalmente; torna-se irrequieta, tem um somno agitado e assim se conserva por algumas horas. O exame do sangue é um bom meio de diagnostico, o mais seguro que é possivel, mas infe- lizmente não são poucas as difficuldades que se encontram na sua realisação pratica. Os diversos estados morbidos que commummente entretêm a dyspepsia, denunciam-se ao clinico pelos signaes que lhe são proprios. Não nos demoraremos enumerando os symptomas d’esses estados morbidos ; apenas n’elles tocamos, porque, parece-nos, que o completo esclarecimento das condições pathogenicas são de grande vantagem 11a clinica, pois a therapeutica da dyspepsia infantil, varia muito conforme cada caso em particular. Prognostico Tantas são as condições a que está subordinado o prognostico da dyspepsia na primeira infancia, que torna-se muito difficil estabelecer regras geraes, que guiem o clinico no juizo prognostico de cada caso em particular. Sabendo que a menor perturbação digestiva coinpromette muito o desenvolvimento da creança, que esta, além de não desenvolver-se, vae-se debilitando pela deficiência nutritiva e pelas constantes expoliações que soffre, e que, o simples processo dyspeptico de ordem chimica, pode, quando abandonado a si, aggravar-se a ponto de produzir uma gastro-euterite, que arrebata a vida da creança, é claro que o nosso prognostico dependerá muito do gráo de adiantamento do processo. O nosso juizo não s'erá o mesmo, em um caso de simples dyspepsia que começa a manifestar-se e em outro que, abandonado a si, tenha debilitado a creança, que n’essas condições, além da perturbação digestiva aggravada, está em condições muito favoráveis á evolução de outras moléstias herdadas ou adquiridas. O prognostico depende muito também da existência ou não de moléstias herdadas ou adquiridas, em estado latente ou manisfesto no organismo. Assim, em dous casos de dyspepsia, tendo como ponto de partida uma alimentação imprópria, porém havendo em um, os signaes reveladores da heredo-syphilis ou da tuberculose, e no outro, ausência completa de qualquer signal que denuncie moléstia herdada ou adquirida, é forçoso que consi- deremos o primeiro caso mais grave que o segundo. 34 Influe muito sobre o prognostico, o interesse que toma pelo doentiuko a pessoa que o trata. Os resultados do tratamento empregado não serão os mesmos, em uma creauça tratada por sua própria mãe, mulher intelligente que a cerca não só de carinhos mas também dos maiores cuidados para que seu filho recupere a saude, e em outra que esteja em condições de não poder-se contar, nem ao menos com o tratamento prescripto. A dyspepsia na primeira infaucia quaudo é abandonada á sua evolução ou incouvenientemente tratada, repercute de modo patente sobre o desenvolvimento da creauça, retardaudo-o ou mesmo difficultando-o, pela deficiência nutritiva que determina; assim é que o rachitismo geralmente reconhece-a como um de seus factores etiologicos. O estado geral do adulto, podemos dizer mesmo, que resente-se dos embaraços nutritivos da primeira infancia, para o que concorrem muito também as moléstias herdadas ou adqui- ridas como a heredo-syphilis, o impaludismo, etc. Assim, bem podemos dizer, que a gastro-ectasia tão frequentemente observada, assim como a maioria dos estados dyspepticos de variada symptomatologia, que accommettem indi- viduos de todas as edades, têm forçosamente entre seus múltiplos factores etiologicos, as perturbações gastro-intestinaes da primeira iufancia. Tratamento Vamos nos occupar no presente capitulo, com os meios de que poderemos lançar mão para pôr termo a uma perturbação digestiva. Não poderemos fazer um estudo sobre o tratamento senão de um modo geral, porquanto encaramos o assumpto em um pouto de vista clinico, e todos sabemos que os doentes obser- vados, não amoldam-se exactamente aos caracteres traçados pelo patbologista. Causas innumeras concorrem para as variantes individuaes, com que as moléstias revelam-se ao clinico. Ha porém duas indicações geraes a que temos sempre de attender. A primeira refere-se á suppressão da causaproductora da perturbação digestiva, a segunda trata de combater a dyspepsia e as complicações que a acompanham. Vejamos como proceder para satisfazer a essas duas questões capitaes. A’ primeira vista comprebende-se a importância que tem no tratamento da dyspepsia, a suppressão da causa, pois, se a ella não attendermos, de modo algum conseguiremos o resultado da nossa tberapeutica. Como já vimos, as causas capazes de produzir e entreter a dyspepsia infantil podem ser directas ou indirectas, intrínsecas ou extrínsecas. Vimos que um regimen inconveniente pode per- turbar a funcção digestiva da creauça, principalmente quando se trata da alimentação nos primeiros mezes. K’ uma circumstancia a que não se pode deixar de attender; é necessário pois estar de posse de boas informações a respeito do regimen a que está sujeita a creança, para podermos corrigil-o, caso seja defeituoso, de modo a não se poder apontal-o como prejudicial. 36 Ha casos simples de dyspepsia, em que a correcção do regimeu defeituoso é bastante, para que a funcção digestiva perturbada se torne normal. Temos visto desapparecer a pertur- bação gastro-intestinal em creanças de mezes, alimentadas com substancias impróprias, depois que voltaram ao regimen lácteo. .No caso de haver impossibilidade de sujeitar-se a creança ao aleitamento materno, recorreremos ao regimen pelo leite esterilisado qne é perfeitamente tolerado pelas creanças. Esse genero de alimentação está ao alcance de todos e, com prazer temos visto, que pode substituir perfeitamente o leite ma- terno, uma vez que o processo da esterilisação seja feito de accordo com todas as regras. Já vimos também, que uma causa muito frequente de dys- pepsia nas creanças, é a passagem brusca do regimen lácteo para o regimen proprio do adulto, aconselharemos nesse caso a mu- dança por tentativas, prescripta pela maioria dos pediatras. Parece-nos, porém, como já ficou dito, que a maior parte dos casos de dyspepsia infantil que temos observado, dependiam muito mais de causas oriundas do proprio organismo infantil, pois em muitos delles o regimeu seguido era insuspeito. E’ muito coinmum encontrarem-se creanças victimas de um estado dyspeptico constante, e que só podem libertar-se delle á custa da medicação pelos sáes de quinino. Esses casos consti- tuem a maioria dos que temos observado. Os sáes de quinino, priucipalmente o bi-chlorhydrato de quinino, são os medicamentos heroicos 11a maioria dos casos. A administração do quinino em xarope é tolerada perfeitameute pelas creanças, desde a mais tenra idade. Devemos ainda notar que as creanças supportam perfeitamente certos medicamentos em dose que á primeira vista parece exagerada ; é a timidez com que são dosados, que concorre para a apparente inefficacia de certos medicamentos aconselhados. Muitas vezes não é facil ao clinico desvendar o mysterio de que cercam-se os symptomas apresentados por uma creança de mezes. Como já dissemos, só dos commemorativos é que podemos muitas vezes tirar a explicação para os pheuomeuos observados ; sem elles nunca poderemos usar da medicação mais conveniente. As vezes encontram-se muitos factores residentes no organismo infantil entretendo a dyspepsia, e então vemo-nos forçados a attender a todos, sendo complexa a medicação empregada. Não é possivel, pois, no tratamento da dyspepsia, attender ao apparelho digestivo isoladamente ; se assim procedermos, teremos occasião de ver a creança debilitar-se cada vez mais, apezar dos meios empregados para corrigir a funcção digestiva. Entre nós, o accesso pernicioso poderá vir tardiamente mostrar que a creança era victima da inalaria e que, erradamente, a thera- peutica contra ella não foi dirigida. Quando é uma causa interna que entretem a dyspepsia, contra ella o clinico deve dirigir sua therapeutica no sentido de combatel-a. Muitas, repetimos, são as causas residentes no proprio organismo da creança e que commiimmente entretêm as perturbações gastro-intestinaes, convém portanto que o clinico conheça perfeitamente essas causas, que procure combatel-as ou pelo menos attenual-as, empregando opportunamente a medi- cação apropriada a cada caso em particular, associando essa medi- cação a um regimen beneíico. A tuberculose e a heredo syphilis concorrem largamente para o desequilibrio funccional do organismo da creança desde os primeiros dias depois do nascimento ; o mesmo se pode observar em relação a outros estados morbidos, que concorrem de modo evideifte para a debilidade maior da creança. Passemos agora a tratar da segunda indicação a preencher no tratamento da dyspepsia. Vem a ser : combater a dyspepsia e as complicações que a acompanham. Vimos, quando tratamos da physiologia pathologica da dys- pepsia, que os principaes phenomenos observados correm por conta de um déficit de acido chlorhydrico no sueco gástrico, Dessa noção decorre impor-se a chlorhydrotlierapia como um meio racional de combater o estado dyspeptico, pela correcção do sueco gástrico alterado em sua composição, isto é, fornecendo o elemento que lhe falta ou que contem em proporção dimiuuta. Com effeito, a administração de acido chlorhydrico na propor- ção de meio por cento, em forma de poção, é um meio heroico de corrigir uma perturbação digestiva, não só na primeira, como também na segunda infanda. N’este ultimo caso, a gastro- ectasia acompanha geralmente o estado dyspeptico, que é tradu- zido por lienteria manifesta, a qual é evidentemente combatida pela administração de acido chlorhydrico na proporção de i %. Têm-se observado alguns casos de dyspepsia com hyper- chlorhydria, sendo então contra-indicada a medicação pelo acido chlorhydrico. N’esses casos algumas vezes observados, logo após as primeiras doses de acido chlorhydrico, vê-se a intolerância traduzida por vomitos, e por fim a aggravação do estado dyspe- ptico. Convém desde logo suspender essa medicação e empregar os alcalinos que produzirão bons resultados. Km alguns casos analogos que observamos, vimos o emprego do bi-carbonato de sodio produzir beneficos resultados para a creança dyspeptica. Como vimos, o déficit de acido chlorhydrico no sueco gástrico, permitte a passagem para os intestinos, de alimentos que no estomago não soífreram a acção desse importante factorde uma boa digestão. Essas substancias podem passar pelos intestinos e ser eliminadas quasi intactas, ou então podem entrar cm fermen- tação e determinar uma auto-intoxicação, que aggrava de um modo evidente o estado geral da creança. Esse phenomeno uma das complicações frequentes da dyspepsia e nelle insistimos para accentuar bem as vantagens da antisepsia intestinal, que constitue o complemento indispensável das perturbações gastro- intestinaes em todas as edades. A antisepsia intestinal pode ser feita por via gastrica ou por via rectaf 39 Para procedermos a antisepsia intestinal por via gastrica, faremos administrar á creança substancias que atravessando o tubo gastro-intestinal, tornem-no um meio improprio á cultura dos germens que nelle residem habitualmente ou que a elle vêm ter pelos ingesta. O calomelanos é um medicamento largamente empregado em creanças de todas as edades. H’ o purgativo de que lança-se mão em geral e que produz resultados vantajosos para o doentinho. Alguns consideram-no como um poderoso antiseptico intestinal. Hayem acredita em sua acçãc autiseptica, quaudo administrado em doses massiças. Infelizmente, porém, experiencias recentemente feitas n’esse sentido, são todas negativas ; nada pois demonstra que o calomelanos administrado por via gastrica, gose de poderosa acção auti-septica nos intestinos. Na opinião de Hayem, elle produz effeitos favoráveis, como medicação auti-dyspeptica, excitando as contracçoes da vesicula biliar, determinando a evacuação da bile já formada. A administração do calomelanos nos casos de dyspepsia infantil, é seguida sempre de bons resultados. E\ além disso, um medicamento sem sabor e de facil administração ás creanças. Como antisepticos intestinaes empregam-se o benzo- naphtol, que se decompõe no meio intestinal em naphtol e acido benzoico, que gozam de real acção antiseptica, o naphtol B, os saes de bismutho, o salol, que pode ser empregado em grande vantagem pelo desdobramento que soffre nos intestinos em acido salycilico e acido carbolico, e outros mais que são considerados como antisepticos intestinaes e diariamente empregados com grande vantagem. O acido láctico é considerado por M. Hayem como um excelleute antiseptico das vias digestivas. Lésage aconselha-o na diarrhéa verde das creanças. Pela lavagem directa da cavidade gastrica, podemos tornal-a aseptica ; para esse fim emprega-se agua alcalinisada pelo bicar- bonato de sodio, ou agua a 25o pouco mais ou menos e a 40 lavagem é feita por meio do siplião de Faucher. E’ um meio esse empregado em condições muito especiaes, pelas difficuldades que apresenta na pratica ; é mais vantajoso ua segunda infancia, em que ha quasi sempre dilatação gastrica concomitante, porquanto n’esses casos pode despertar as paredes do estomago da atonia em que se acham. Não nos demoraremos enumerando os recursos de que lança mão o clinico nos casos em que ha gastro-ectasia, porquanto esta é muito mais frequente em creanças de mais de dous aunos, nas quaes a dyspepsia toma uma feição diífereute da que nos occupa principalmente. A antisepsia intestinal por via rectal é feita com clysteres antisepticos, applicados com seringas de grande capacidade, de modo que com ella se possa injectar a maior quantidade possivel de liquido antiseptico nos intestinos, afim de fazer-se uma verdadeira lavagem intestinal. Os antisepticos mais empregados para esse fim são, o acido borico e o borato de sodio, na proporção de 4 % ; egualmente póde-se empregar o naphtol B, na proporção de cinco ceu tigrammas para cem grammas de vehiculo. A antisepsia por via rectal produz muito bons resultados ; tivemos occasião de ver por varias vezes as modificações que apresentavam as fezes extremamente fétidas de creanças dvspepticas, depois do emprego de clysteres antisepticos. Julgamos ter estudado até aqui os principaes meios que poderemos empregar com vantagem, para attender as principaes questões que se nos apresentam no tratamento da dyspepsia infantil. OBSERVAÇÕES J As observações <|iie apresentamos, foram colhidas 110 serviço de clinica de creanças a cargo do !>r. Mon- corvo, na Policlínica Geral do Rio de Janeiro. Duas d’entre cl la s, a 6* e a 7% foram trânscriptas do trabalho <* o Dr. Moncorvo: Snr les troubles flyspeptiqnes dans 1’enfance et surleur diagnostic par la recherche chimique du sxic «■astrique. OBSERVAÇÃO I V wv\v uYw Ayswy o— W\s\\.e\vsYU I., branco, tres mezes de edade, natural do Rio de Janeiro, residente á rua Francisco Eugênio. Foi levado á consulta no dia 20 de Maio de 1895. Commemorativos.—Nenhum antecedente hereditário digno de nota. Terceiro filho do casal. Seus irmãos gosando de alguma saude, perturbada ás vezes por accessos palustres. Varias pessoas que habitam a mesma casa são victimas de accessos palustres repetidos. Creança sujeita ao aleitamento materno exclusivo desde o nascimento. Nunca soffreu alteração alguma na saude, alimen- tando-se bem, nada accusando de anormal nas funcçÕes digestivas. . Havia dous dias porém, que alterara-se a regularidade dessas funcçÕes. As evacuações tornaram-se muito frequentes, (mais de oito diarias), mais liquidas, perderam a coloração normal, toruando-se esverdeadas e por vezes grumosas e muito fétidas. Essas evacuações eram precedidas de cólicas, a creança chorava muito, procurava mamar, porém deixava logo o seio materno e continuava a chorar. 42 Referiu sua mãi que uada mais havia dado á creança como alimentação, senão o seu proprio leite ; que ás vezes ao anoitecer sentia que seu filho tinha as mãos e os pés um tanto frios ; que diversas vezes ficou elle com o corpo mais quente á noite, o que o fazia muito irrequieto, tendo um somno agitado. Exame. — O doentinho era uma creança regularmente conformada e desenvolvida, nada apresentando que fizesse sus- peitar da existeucia de uma moléstia herdada ou de um vicio de nutrição. Apenas mostrava-se ligeiramente pallido e abatido. Temperatura normal. Pelo exame do. apparelho digestivo, encontramos a lingua um tanto saburrosa, o baço ligeiramente augmentado e o ventre um pouco abahulado e tympanico. Os mais apparelhos nada accusavam de anormal. Prescripção : Calomelanos inglez ...'.. 15 centigrs. E111 1 papel. Para derramar o conteúdo sobre a lingua da criança e fazel-a mamar logo depois. Bi-chlorhydrato de quinino . . 50 centigrs. Xarope de canella 30 granis. Para administrará creança na dose de uma colher de chá de 2 em 2 horas, depois do effeito purgativo. Dia 22.—Levada de novo á consulta, a creança accusava melhoras sensíveis. Suas evacuações tornaram-se muito menos frequentes e com um aspecto que se approximava mais do normal. Tornou-se mais calma, dormindo tranquillamente. A adminis- tração do colomelanos fora seguida da emissão de gazes intestiuaes pelo recto, assim como de grande quantidade de catarrho de mistura com as fezes. Tolerou perfeitamente a administração da bi-chlorhydrato de quinino em xarope de canella. Foi-lhe aconselhada a continuação do quinino na mesma fórmula. Dia 25.—Verificou-se o resultado completo da medicação empregada. A creança nada accusava de anormal 110 apparelho digestivo ; as evacuações erão regulares e de aspecto normal; alimentando-se regularmente, chorando pouco ; nada de notável em relação á temperatura, somuo tranquillo. Aconselhou-se-lhe a suspensão do quinino, pedindo que trouxessem a creança ainda uma vez á consulta. Dia 28 — A creança apresentou-se no goso de perfeita saude, sempre alimentada com o leite materno. OBSERVAÇÃO II à\Yv\\\cavUyçÍyo yyYyyosyy. — \\s\ve\vsv(.v. — V yy\\y yyYyyAys y\\o . —Ov yysY v o - e cY yys v yy < J., branco, um anuo de edade, natural do Rio de Janeiro, residente á rua da Constituição. Commemorativos.—Nenhum antecedente hereditário digno de nota. Nasceu a termo. Sujeito ao aleitamento artificial desde o nascimento. Aos dous mezes de edade sobrevieram-lhe fortes desordens gastro-intestinaes, acompanhadas de elevação thermica á noite. Foi medicada pelos saes de quinino que debellaram com- pletameute os phenomenos dyspepticos. D’essa data em diante, foi sujeita á alimentação pelo leite esterilisado, com a qual deu-se muito bem. Havia dous dias porém, sobreviera-lhe nova perturbação digestiva, acompanhada de francos accessos palustres, com os phe- nomenos caracteristicos: hypothermia peripherica e elevação thermica do tronco a horas certas. Diarrhéa muito fétida. Exame.—Tratava-se de uma creança regularmente desen- volvida, um tanto pallida e abatida, apresentando visivel gastro- ectasia, confirmada por minucioso exame. Ventre abahulado. Baço augmentado. Figado normal. Língua boa. Temperatura normal. 44 Receitou-se bi-chlorhydrato de quinino e lavagens intestinaes de acido borico a 4 %. Com a medicação empregada a creança melhorou, os accessos palustres não se repetiram mais, as funcções digestivas tornaram-se mais regulares e por fim perfeitamente normaes, após a administração de benzo-naplitol e salicylato de bismutho OBSERVAÇÃO III V \w\> wYynAyswyo.—v o ■- ecXvvWvA. — Ô v \>sv a R., branco, um anuo e seis mezes de edade, natural do Rio de Janeiro, residente á rua da Ajuda. Foi levado á Poli- clínica no dia 24 de Maio de 1895. Commemoratwos. — Nenhum antecedente hereditário digno de nota. Filho nnico do casal. Pai e mãi bem constituídos e gozando de perfeita saude. Foi sujeito ao aleitamento materno até a edade de dez mezes ; até essa data sua saude conservou-se perfeita. Funcções digestivas normaes. Com a edade de dez mezes, a creança foi confiada a pessoas estranhas, que sujeitaram-na a um regimen desbaratado, a uma alimentação nociva ás suas funcções digestivas. Era alimentada como um adulto. Desde então, sobrevieram-lhe grandes desordens diges- tivas, traduzidas por cólicas, vomitos, lienteria, expulsão fre- quente de gazes intestinaes, ventre abahulado, etc. Por esse tempo foi victima egualmeute de francos accessos palustres que a prostraram muito e que por fim foram combatidos. Foi levada á consulta por ter sido de novo acommettida de diarrhéa lienterica, sem comtudo apresentar symptoma algum proprio de accessos palustres. Exame. — Pallida e um tanto enimagrecida, a creança ostentava á primeira vista enorme dilatação de estomago ; era 45 notoria a desproporção entre o ventre proeminente e o resto do corpo. A gastro-ectasia foi comprovada pelo exame mais detido qne fizemos, pelo processo da gastro-resouancia-plessimétrica. Receitou-se a essa creança uma poção chlorhydrica a i %, que produziu muito bons resultados. OBSERVAÇÃO IV vwvcw uV\a\\cyOuvy à.^e\\Yvo&o.— M., pardo, dons mezes de edade, natural do Rio de Janeiro, residente á rua Formqsa. Consulta no dia 9 de Julho de 1895. Commemorativos. — Pelas informações, antecedentes hereditários insuspeitos. Terceiro filho do casal, seus irmãos foram creados sem que o seu desenvolvimento fosse perturbado por qualquer moléstia. Foi alimentado pelo leite materno, até a edade de 11111 mez e vinte tres dias ; durante essa época, nenhuma alteração sobreveio 11a sua saude, nada de anormal 110 apparelho digestivo. D’essa data em diante, esse excellente genero de alimentação, foi substituído por sopas de pão, mingáos e até feijão. A mudança de regimen foi seguida immediata- mente de forte perturbação digestiva. Sobrevieram evacuações muito frequentes, liquidas, esverdeadas, contendo, por vezes, partículas alimentares indigestas. Passou a dormir mal, chorar muito, o que sua mãi attribuia á cólicas. Depois sobrevieram vomitos, acompanhados de eructaçÕes. Não accusava modificação alguma na temperatura, quer de dia, quer de noite. Exame. — A creança que se nos apresentou era regular- mente conformada e desenvolvida, um tanto emmagrecida e muito fraca. Temperatura normal. O exame a que procedemos nos revelou ausência dos signaes caracteristicos da syphilis herdada ou tuberculose. Pelo exame do apparelho digestivo, encon- tramos a lingua saburrosa, o ventre um tanto abahulado, figado augmentado e baço normal. Prescripção : Calomelanos inglez .... 15 centigr. Km 1 papel. Para etc., etc. Acliando-se a mãi da creança em excellentes condições para amamentar seu filho, aconselhamos-lhe que o fizesse e que nada mais addicionasse a essa boa alimentação, mostrando-lhe os j t perigos a que expunha seu filho se assim não procedesse. Dia 11.—Levada a creança de novo á consulta, referiu sua mãi que após a administração do calomelanos deram-se tres evacuações ; que 11a primeira observou a emissão de gazes intes- tinaes e grande quantidade de catarrho, de mistura com as fezes, sendo as mais evacuações de aspecto normal. A creança apenas vomitou uma vez, dormiu tranquillamente, alimentou-se bem. Foi seguido á risca (segundo informações) o conselho relativo ao regimen alimentar. Pelo exame, verificamos resultado muito satisfactorio do tratamento adoptado. Temperatura normal, lingua boa, ventre em boas condições, figado normal. Dia 15.—A pedido nosso voltou a creança á Policlinica e, com prazer, vimos que estava nas melhores condições possiveis, continuando a gozar da benefica alimentação pelo leite materno. OBSERVAÇÃO V V yv\\y uYw\\v o—\\c v c 0u>-sv\\>Yvv\vs — VV\s\v\>svu M., pardo, um mez e vinte dias de edade, natural do Rio de Janeiro, residente á rua D. Julia. Foi apresentado á consulta no dia 27 de Maio de 1895. Commemorativos. — Primeiro filho do casal. Antecedentes hereditários muito suspeitos. Seu pai, homem de compleição vigorosa, referiu : que é victima de frequentes ataques de rheumatismo e soffre muito de dores de cabeça. Affirmou não ter sido victima de infecção syphilitica,e lembrava-se que no decurso de sua extravagante vida de solteiro apparecera-lhe uma erupção generalisada, que desappareceu algum tempo depois. Sua mãi referiu, que toda a familia goza de saude regular, que tem sido accommettida de accessos palustres repetidos. Durante a gravidez foi victima de fortes accessos, que a prostra- * ram no leito durante muitos dias. Referiu mais,que a esse facto attribuia o estado de fraqueza que seu filho manifestava,desde que nascera; que alimentava-o com o seu leite, mas que elle uão alimentava-se bem, porque respirava com difficuldade e suffocava-se quando procurava mamar ; que tinha o somuo muito agitado e que suas funcções digestivas eram normaes a priucipio, mas tornaram-se irregulares depois e esse estado aggravou-se, o que a fez trazel-o á consulta ; que chorava muito ; evacuava cerca de dez vezes por dia ; dejecções fluidas e esverdeadas e por vezes sobrevinham vomitos. A’ noite, sua mãi notava-lhe sensivel resfriamento nas extremidades, com ligeiro calor no tronco e, ás vezes, quasi que não dormia chorando constantemente. Julgando fraco o seu leite, começou a administrar á creança, sopas de pão com leite, regimen que adoptara havia dous dias. Exame. —Bra bem visivel o estado de fraqueza d’essa creança. Pelo exame encontramos os signaes reveladores da heredo-syphilis. Temperatura normal. Apparelho respiratório normal. No apparelho digestivo encontramos, lingua e superfície interna da cavidade bticcal cobertas de espessa camada de placas brancas (muguet); ventre abahulado, tympaniço e com pequena elevação thermica local, baço bastante augmentado de volume e doloroso á pressão. O doeutinho apresentava-se muito irrequieto, e ouvia-se-lhe 110 respirar o ruido caracteristico do coryza. Receitou-se-lhe calomelanos inglez, quinino, fricções de unguento napolitano nas paredes lateraes do thorax e loções para a cavidade buccal. Acouselhou-se a alimentação da creança pelo leite esterilisado. A medicação empregada foi seguida de satisfactorio resul- tado ; em poucos dias melhorou e por fim cessou a perturbação digestiva. As placas esbranquiçadas, que revestiam a superfície interna da cavidade buccal, desappareceram com as loções anti- septicas. A creança deu-se perfeitamente com o regimen alimentar aconselhado. Alguns dias depois sobrevieram as desordens intestinaes, e sua mãi foi-lhe administrando uma poção com sub-nitrato de bismutho até, que levou-o, de novo, á consulta, depois de vel-o acofnmettido de fortes-accessos palustres, que difficilmente foram combatidos. Nota. — Alguns mezes depois de havermos redigido a observação supra, soubemos que essa creança fora acommettida de novo de francos accessos palustres e que veiu a fallecer d’um accesso pernicioso. OBSERVAÇÃO VI V Y\s\vc\vAav — Cvyyva. \\Aav e\\Yóv\vv\*Yy o\\vev tv\vvcv. (c No dia 28 de Julho de 1888 é levada á Policlinica uma uegriulia de dez dias apenas, nascida a tenno e regularmente desenvolvida.—Aleitamento materno. Isenta de muguet. Cólicas frequentes, seguidas de expulsão penosa de fezes esverdeadas e grumosas. 49 A uai y se do sueco gástrico uma hora depois de ter a creança mamado; a phloroglucina vanillina não descobre o menor traço de acido chlorhydrico. Um novo exame feito nas mesmas condições tres dias depois, chega ao mesmo resultado negativo. Prescripção de acido chlorhydrico, e poucos dias depois as fezes já se tinham tornado amarellas e homogéneas.» OBSERVAÇÃO VII — Cvvv cv \v*Aav e\vYo v\vv\Av oY\vev lv\yyu «Trata-se de uma creança de tres mezes, levada á consulta no dia 25 de Julho de 1888. Alimentação viciosa; desordens gastro-intestinaes; diarrliéa verde e lienterica ; cólicas. Apezar das lavagens intestinaes com aguaboricada a 4 %, permanência de fezes lientericas de reacção acida muito accusada. Seis dias depois de sua admissão, exploração do sueco gástrico, que analysado pela phloroglucina, parece revelar ausência completa de acido chlorhydrico livre. Por meio do reactivo de Uffelmann, encontramos uma forte proporção de acido láctico, A administração de acido chlorhydrico produz Testa creança melhoras evidentes.» OBSERVAÇÃO VIII 'YvvWvcvvYo^e—\v*v\v tvYw Avs wv o —CsusYyo-JÈícYcvWviv A., branco, dous mezes de edade, natural do Rio de Janeiro, Levado á consulta da Policlinica no dia 5 de Junho de 1895. Commemorativos.—Sua mãi referiu que foi sempre sujeita a bronchites e que já tivera pneumonias por mais de uma vez. 50 Seu marido é tuberculoso. Nada occorrera de notável durante a gravidez ; teve um parto prematuro. Desde o nascimento a creança foi sujeita ao aleitamento artificial, e desde essa época foi victima de perturbações digestivas, traduzidas por cólicas, evacuações frequentes, liquidas, esverdeadas, alternando esse estado com a constipação de ventre. Por vezes resfriamento das extremidades, seguido de elevação tliermica notoria. Julgava seu filho muito fraco. Havia dons dias accen- tuaram-se as perturbações digestivas, sobrevieram cólicas frequentes, seguidas em geral da expulsão pelo recto de gazes muito fétidos; diarrhéa esverdeada ; a creança passara o dia em constante agitação, chorando sempre. A’ noite franca elevação de temperatura, somno bastante agitado. Exame.—A’ primeira vista se reconhecia que tratava-se de uma creança cujo organismo fora victima de constantes embaraços ao seu desemvolvi mento. Era bem visivel a proeminência das paredes do ventre, contrastanto com a extrema magreza do corpo. Pelo processo da gastro-resonancia plessimetrica, encontramos enorme dilatação do ventrículo gástrico. Eram evidentes os signaes caracteristicos da turberculose infantil. Temperatura 37,5. No apparelho digestivo encontramos, lingua saburrosa, baço augmentado, ventre tympanico, com alguma elevação thermica. Prescripção : — Calomelanos,- bichlorhydrato de quinino, lavagens intestinaes com acido borico. Hm poucos dias essa creança foi liberta da perturbação digestiva, passou a usar leite esterilisado e algum tempo depois, apresentava-se em estado mais lisonjeiro. PROPOSIÇ0ES PROPOSIÇÕES > Cadeira de Physica Medica DO ESTHETOSCOPIO I A intensidade do som varia em razão inversa do qua- drado da distancia do corpo sonoro. II Atravez de um tubo, o som transmitte-se sem perda sensivel de intensidade. III O emprego do esthetoscopio na auscultação, é baseado n’essa propriedade do som. Cadeira de Chimica Inorgânica Medica I O acido chlorliydrico faz parte do sueco gástrico, e existe em dissolução uas aguas que procedem de montanhas vulcânicas. II Prepara-se-o no laboratorio, fazendo actuar, a quente, acido sulfurico ( H2 SO4 ) sobre chlorureto de sodio ( NaCl. ) DO ACIDO CHLORHYDRICO III B’ um corpo normalmente gazoso, incolor, de cheiro picante, sabor azedo, e extraordinariamente solúvel u’agua. Cadeira de Botanica e Zoologia Medicas DAS QUINAS I As quinas, da faniilia das rubiaceas, divideui-se em ver- dadeiras e falsas. II Distinguem-se as verdadeiras das falsas quinas, pela deliisceucia do fructo. III B’ na zona liberiana do geuero cinchona calissaya vera, que se encontra a quinina em maior proporção. Cadeira de Anatomia Descriptiva DO APPARELHO DIGESTIVO I O apparelho digestivo é constituído pelo tubo digestivo e seus annexos. II O tubo digestivo é constituído pela bocca, pharynge, uesophago, estomago e intestinos. 55 III Os orgãos annexos do tubo digestivo são : os dentes, as glandulas salivares, o figado, o paucreas e o baço. Cadeira de Histologia Theorica e Pratica DOS EPITHELIOS I O tecido epithelial é exclusivamente formado de cellulas, unidas umas ás outras por uma substancia intercellular. II Dividem-se os epithelios em : epithelios de revestimento e epithelios glandulares. III Segundo a opinião de Zweifel, nos dous primeiros annos da vida, a secreção das glandulas salivares é muito incompleta. Cadeira de Chimica Organica e Biologia DO SALOL I O salol (salicylato de phenyla) é muito empregado em medicina como antiseptico intestinal. II Apresenta-se sob a forma de crystaes brancos, losangicos de extremidades truncadas. II Obtem-se-o, pela acção do phenol sobre o acido salicylico 56 Cadeira de Physiologia Theorica e Experimental DA ABSORPÇÃO ALIMENTAR I A absorpção dos alimentos dá-se nos intestinos por plieno- menos de diffusão e endosmose. II Esses pheuomenos dependem principalmente da natureza do epithelio, que forma uma barreira entre o organismo e os líquidos depostos em sua superfície. III As condições do sangue e da circulação influem muito sobre a rapidez da absorpção. Cadeira de Matéria Medica, Pharmalogia e Arte de Formular DO CALOMELANOS I O calomelanos pertence á classe dos medicamentos de origem chimica. II K’ um medicamento perfeitamente tolerado pelas creanças. III O calomelanos não tem sabor algum e é de facil admi- nistração ás creanças. Cadeira de Pathologia Cirúrgica DO CEPHALEMATOMA DOS RECEM-NASCIDOS I Dá-se o nome de cephalematoma a uma collecção san- guínea assestada entre o pericraneo e os ossos do craneo. II Encontra-se-o geral mente na angulo postero-superior do parietal direito, podendo ser bilateral. III E’ um tumor irreductivel, o que distingue-o do meningo- encephalocele, que é um tumor reductivel e que assesta-se na linha mediana das regiões occipital e fronto-nasal, Cadeira de Chimica Analytica e Toxicologica DO ANHYDRIDO ARSENIOSO I O anhydrido arsenioso é um composto altamente toxico ; sendo absorvido, é transportado aos diversos orgãos, cuja nutrição e funccionalismo altera profundamente. II Seus antidotos chi micos mais convenientes são : o hydrato ferrico preparado recentemente, e o hydrato de magnésio. III Para a analyse chimica, o perito deve recorrer aos primeiros vomitos e dejecções da victitna,e aos seus orgãos no caso de morte. Cadeira de Anatomia Medico-Cirúrgica e Comparada DAS APONEVROSES CERVICAES ANTERIORES I As aponevroses cervicaes anteriores são tres : aponevrose cervical superficial, aponevrose cervical mídia e aponevrose cervical profunda. II Kssas tres aponevroses formam com a pelle adeante, e com a face anterior da columna vertebral atraz, quatro espaços cujo estudo é importante para o cirurgião. III D’esses espaços, o terceiro comprehendido entre as aponevroses media e profunda, contem os orgãos mais impor- tantes do pescoço. Cadeira de Operações e Apparelhos DA HEMOSTASIA CIRÚRGICA I Dá-se o nome de hemostasia cirúrgica aos meios de que lança mão o cirurgião para prevenir ou sustar as hemorrhagias. II Divide-se a hemostasia cirúrgica em : hemostasia provi- sória e hemostasia definitiva, III A tira elastica de Esmarch é um meio de que lança mão o cirurgião para fazer a hemostasia provisória. 59 Cadeira de Pathologia Medica DA ENTERITE I A enterite é uma moléstia de todas as edades. II K’ geral mente acompanhada de fermentações intestinaes, que dào em resultado a reabsorpção de princípios toxicos. III Essa reabsorpção de princípios toxicos dá logar aos phenomenos de auto-intoxicação estudados por Bouchard. Cadeira de Anatomia e Physiologia Pathologicas DAS NEOFORMAÇÕES ÓSSEAS I Dá-se o nome de hyperostose, ao crescimento diffuso e extenso da totalidade de um osso. II Chamam-se osteophytos a depositos de tecido osseo de nova formação, assestados em pontos limitados d’um osso. III Se esses depositos são abundantes e assemelham-se a tumores, recebem então o nome de exostoses. Cadeira de Therapeutica DA QUININA I A quinina é facilmente absorvida pelas mucosas e pelo tecido cellular subcutâneo, e elimina-se principalmente pela urina. II Tem acção tão efficaz no tratamento do impaludismo, que é considerada como sua medicação especifica. III H’ perfeitamente tolerada pelas creanças, desde a mais tenra edade. Cadeira de Obstetrícia DO PARTO ESPONTÂNEO I Quatro condições são absolutamente necessárias para que o parto possa terminar espontaneamente. II No que diz respeito á mulher é preciso que as dimensões do canal pelvi-genital permittam a passagem do feto, e que as forças expulsivas sejam sufficientes. III No que diz respeito ao feto, é preciso que seu volume possa adaptar-se ás dimensões do canal pelvi-genital, e que sua attitude seja favoravel. Cadeira de Medicina Legal DO INFANTICÍDIO I Conforme os meios empregados para conseguir a morte da creança, o iufanticidio diz-se ; pot' commissão ou por omissão. II No infanticídio por commissão, os meios directos geral- mente empregados são : a asphyxia e o traumatismo, III Dá-se o infanticídio por omissão, quando a creança morre por não lhe serem administrados certos cuidados indispensáveis. Cadeira de Hygiene e Mesologia DA VENTILAÇÃO DOMICILIARIA I A ventilação é o principal elemento de sanidade das habitações. II Os aposentos em que a ventilação se faz por jauellas oppostas, são os melhor ventilados. III As paredes exteriores das habitações devem ser per- meáveis, para que se possa fazer a ventilação intersticial. Cadeira de Pathologia Geral e Historia da Medicina DA RECEPTIVIDADE MÓRBIDA I A penetração de um germen pathogenico no organismo não basta para que elle ahi se desenvolva. II E’ necessário que o organismo esteja em condições favorá- veis á sua evolução. 62 III vSe realiza-se essa condição essencial, diz-se que o orga- nismo está em condições de receptividade mórbida. 2a Cadeira de Clinica Cirúrgica DAS FERIDAS DO COURO CABELLUDO I As feridas do couro cabelludo, em geral, são acompanhadas de abundante hemorrhagia. II No couro cabelludo, só pelo aspecto, confundeui-se em geral as feridas incisas e coutusas. III O afastamento dos lábios da ferida é pequeno quando a aponevrose epicraneana não foi lesada. Cadeira de Clinica Dermatológica e Syphiligraphica DA TRANSMISSÃO DA SYPHIUS I A syphilis transmitte-se ordiuariameute por contacto directo. II A heredo-sypliilis é observada com grande frequência. III A transmissão da sypliilis póde dar-se da creança infec- cionada á mulher que a amamenta. 63 Cadeira de Clinica Propedêutica DO EXAME DO FIGADO I Só pela mensuração das linhas vertical e transversal, que coincidem com a verdadeira matidez hapatica, não podemos ter uma idéa exacta do desenvolvimento do figado. ii Pode acontecer que um figado pouco desenvolvido apresente uma larga superfície em relação ás paredes sobre as quaes se faz a percussão, e vice-versa. III O comprimento da linha xypho-umbilical e a amplitude da base do thorax elucidara-nos perfeitamente sobre o desenvol- vimento da glandula hepatica. 1? Cadeira de Clinica Cirúrgica DOS FERIMENTOS POR ARMAS DE FOGO I Graças ás modificações que têm soffrido as armas de fogo, os ferimentos porellas produzidas são actualmente d’um prognos- tico muito mais favoravel. II Quando o projectil atravessa tecidos de egual densidade, as aberturas de entrada e de sabida são perfeitamente regulares e eguaes. III Os ferimentos produzidos por armas de fogo modernas prestam-se muito mais á realisação da cirurgia conservadora. 64 Cadeira de Clinica Obstétrica e Gynecologica DO PARTO EM RELAÇÃO A ESTATURA DA MULHER I As mulhereres de pequena estatura e regularmente conformadas, parem em geral com mais facilidade que as de grande estatura. . II A altura do sacro e dos iliacos principalmente, é menor nas primeiras que nas segundas, o que estabelece uma differença no comprimento do canal pelvi-genital. III De dous canaes curvos de egual largura, o mais curto forçosamente será atravessado com mais facilidade. Cadeira de Clinica Ophtalmologica DA OPHTALMIA DOS RECEM-NASCIDOS I A ophtalinia dos recem-nascidos é uma infecção que se produz durante a passagem da cabeça do feto pelo canal vaginal. II A antisepsia ante-partum pode evital-a. III O methodo preventivo mais geralmente empregado é o de Crédé. 65 2a Cadeira de Clinica Medica DA TUBERCULOSE PULMONAR I Das diversas formas por que se apresenta a tuberculose pulmonar, as formas chronicas são as mais frequentes. II Das formas chronicas, umas são apyreticas e são as mais communs, e outras são incidentemente pyreticas com periodos de remissão. III Nos casos de tuberculose pulmonar chronica, o tratamento deve consistir principalmente em manter a integridade da funcção digestiva e combater os incidentes febris possíveis. Cadeira de Clinica Psychiatrica e de Moléstias Nervosas DA EPILEPSIA I A irritação da substancia cortical dos hemisplierios cere- braes, é condição essencial no mecanismo pathogenico da epilepsia. II Apezar da identidade de natureza e patliogenia, as diver- sas epilepsias apresentam differenças clinicas, cuja importância é considerável. III Os bromuretos em geral, e principalmente o bromureto de potássio, constituem a unica medicação séria na epilepsia. 66 Cadeira de Clinica Pediátrica DA PSEUDO-PARALYSIA INFANTIL I A pseudo-paralysia infantil é uma das manisfestaçÕes da heredo-syphilis. II Cura-se perfeitamente pela medicação anti-syphilitica. III A medicação iodo-hydrargirica por via gastrica, ou as fricções de unguento napolitano nas paredes do thorax, dão bons resultados. 1? Cadeira de Clinica Medica DA TENSÃO ARTERIAL I Nas diversas cardiopathias, as indicações therapeuthicas são tiradas principalmente da tensão arterial angmentada ou diminuida. II A dyspnéa cardíaca que sobrevem nas affecções mitraes e nas dilatações do coração, é acompanhada de hypo-tensão arterial. III N’esse caso, a indicação therapeutica consiste em elevar a tensão por meio dos tonicos cardio-vasculares, principalmente da digitalis. H1PP0CRATIS APH0R1SMIS I Vita brevis, ars longa, occasio prceceps,*experientia fdllax, judicium difficile. ÍSect. I -Aph. I.) II Natura corporis estin medicina principium studii. (Sect. I — Aph. VII.) III Mulieri, menstruis dejicientibus e naribus mnguinem fluere, bonum. (8ect. V —Aph. LV.) IV Natura môrborum curationes ostenduni. (Sect. II — Aph. III.) V Ad extremos morbos extrema remedia exquisite óptima. (Sect. —Aph VI.) VI Quce medicamenta, non sanant, ea ferrum sanat ; quce ferrum non sanat ea ignis sanat; quce vero ignis non sanat, ea insanabilia existimare opportet. (Sect. VII —Aph. XXXVIII.)