Esta these está conforme aos Estatutos. Rio de Janeiro 1.° de Novembro de 1847. Dr. João José de Carvalho. k cry&/{ ^^t-éi^ >?^ '4sUwZr*t/\ ~_ < GENERALIDADES A. CERCA DA. EDUCAÇÃO PHYSICA DOS MEXI3V0S, APRESENTADA A* FACULDADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO, E SUSTENTADA NO DIA 3 DE DEZEMBRO DE 1846. POR JOAQUIM PEDRO DE MELLO, NATURAL DA CIDADE DE PAUACATU (província de minas geraes). doutor em medicina pela mesma faculdade. On façonne les plantes par Ia culture, et les hommes par 1'education. ..... (J. J. Rousstau.) RIO DE JANEIRO, TYPOGRAPHIA DE TEIXEIRA E COMP. RUA DOS OURIVES N 41. 1846. FACUL.DADE DE MEDICINA DO RIO DE JANEIRO. DIRECTOR 0 Snr. Dr. JOSE' MARTINS DA CRUZ JOBIM. Lentes Proprietários. Os Srs. Drs. 1.* ANNO. Francisco de Paula Cândido, Presidente............. Physica Medica. „.„..„.„., S Botânica Medica, e princípios elementares d* Francisco Freire Allemao, Examinador.............< Zoologia. 2.° ANNO. . ± _ IT „ , . S Chimica Medica, e princípios elementares da Joaquim \icente Torres Homem, Exam. Supplente. < Mineralogia José Mauricio Nunes Garcia..................... Anatomia geral, e deseriptiva. 3.° ANNO. José Mauricio Nunes Garcia.,.................... Anotomia geral, e deseriptiva. Lourenço de Assis Pereira da Cunha............... Physiologia. 4.* ANNO. Luiz Francisco Ferreira.......................... Pathologia externa. Joaquim José dí. Silva, Examinador............. Pathologia interna. i„;nu'j.n,™.n,„ $ Pharmacia, Matéria Medica, especialmente a João José de Carvalho............................} Brasileira, Therapeutica, e Arte de formular. 5.° ANNO. Cândido Borges Monteiro........................ Operações, Anatomia topographica e Apparelhos Fiancisco Júlio Xavier........ \ Pajto3> MoIestias da9 mulheres pejadas e pari- ( das, e de meninos recém-nascidos. 6.° ANNO. Thomaz Gomes dos Santos........................ Hygiene, e Historia da Medicina. José Martins da Cruz Jobim...................... Medicina Legal. 2.°ao4.° Manoel Feliciano Pereira deCarvalho....... Clinica externa, e Anat. patholog. respectiva. 5.° ao 6.° Manoel de V aliada© Pimentel............. Clinica interna, e Anat. patholog. respectiva. Lentes Substitutos. Francisco Gabriel da Rocha Freire, Exam. Supplente.} ~ - . „„•„«„•.« „„„„.„,;„ Antônio Maria de Miranda Castro..................\ SecSa0 das sciencias accessonas. José Bento da Rosa, Examinador.................>_ _ ., ,. Antônio Felix Martins, Examinador................\ SecSa0 MedlCa- Domingos Marinho de Azevedo Americano.........f 0 - ~. Luias da Cunha Feijd.............................\ Secc.a0 Cirúrgica. Secretario. O Sr. Dr. Luiz Carlos da Fonceca. 4 A Faculdade não approvu nem desapprova as opiniões emittidas nas Theses, que lhe são aprtsentadat. A.' SAUDOSA, E RESPEITVEL MEMÓRIA DE MEU PAI Intima, e genuína expressão dos sentimentos indefiniveis, que atassalhão o coração d'üm filho ao recordar-se da inconsolavel perda d'um pai, digno desse nome. A' MINHA CARINHOSA MÃI Devida, e sincera homenagem de respeito, e amor íiliaes. AOS MANES DO Il.LM.° SR. CIRÜRGIÃO-MÓR ANTÔNIO SOARES MASCARENH^S, E DE SUA VIRTUOSA ESPOSA. Já que a Morte, essa inflexível Tyranna, cujo cruento cutello nem a virtude respei- ta, não permittiu, que nós, que, desde a nossa mais tonra infância até o derradeiro instante de vossas vidas, recebemos de vós tantos benehc.os, fossemos, ao terminar de nossa carreira escholar, depositar em vossas mãos, em holocausto aos disvelos, e á sin- cera amizade, com que nos honrastes, o primeiro fructo de nossas vigílias, c locvbra- ções; acceitai ao menos, Almas virtuosas, lá da Mansão dos Justos, onde tranqüila- mente repousais, neste dia solemne, em que deve-se concluir a obra dos vossos desejos, lagrimas, e suspiros da mais d, e sublime, que muitas vezes cohonesta a necedade, de quem discorre, este nos- II so opusculo irá inçado de defeitos, e lacunas, até mesmo por que não estamos longt de crer, que a maneira, pela qual o dividimos, e o tratamos, não será talvez a maü conveniente; mas em fim consola-nos a consideração, de que não dirige nossos de- dos a vaidade de nos improvisarmos de escriptor, e sim o cumprimento d'um pre- ceito. Confiado, pois, na bcnígnidade de nossos sábios juizes ousamos esperar, que as ra- zões, que expendemos, nos sirvão de desculpa; e, se formos tão felizes, que com es- te nosso insignificante trabalho obtenhamos o nosso tão suspirado fim, satisfeitos excla- maremos com Horacio. « Sublimi feriam sidera vértice. » O Autuor. INTRODUCÇAO. A palavra educação, derivando-se dos verbos latinos, duco (conduzir) e cdocco (ensinar) quando se refere ao homem, significa na sua accepção mais genérica, a formação de hábitos tanto intellectuaes, e moraes, como physicos. Como, porém, neste sentido tão lato necessite dos auxílios, que lhe possão ministrar todos os ramos dos conhecimentos humanos, posto que uma, e outra espécie destes hábitos estejão entre si tão estreitamente ligadas, que se lhes não pôde traçar uma orbita separa- da, tem-se todavia tractado isoladamente deste importante objecto, oecupando-se os políticos, os philosophos, c moralistas mais extensamente da parte, que respeita aos cuidados, e verdadeiro methodo, por meio do qual se deve velar no desenvolvimento do espirito, e dos costumes do homem, e ficando á alsada dos médicos o attenderem ao, que mais particularmente concerne á mais conveniente direcção, que cumpre dar- se ao physico; por isso que depende, e joga muito especialmente com habilitações, que entrão no vasto domínio das sciencias, que cultivão. Os authores que hão publicado obras á cerca desta ultima parte da educação, de que unicamente tencionamos tractar, divergem todos relativamente â denominação, que mais adequadamente lhes compete. Uns, com Mr. Des-essartz, a appellidão educação corporea. Outros, como Mr. Raulin, a charnão arte da conservação dos meninos. Brouzet, da-lhe o nome de educação medicinal. Alguns, seguindo a opinião do erudi- to, c celebre author dTmilio, a intitulão educação natural. E, finalmente, M.r Bal" lexserd, de Gênova, em sua dissertação, apresentada em 1761 á academia de Harlem, a designou por educação physica. Nós, pouco nos importando o nome que se deve applicar á este interessante ramo dassciencias médicas, poderíamos sem grave prejuízo, do nosso trabalho, declinarmo- nos desta questão, que é sem duvida de pouco momento, visto que em summa quasi todos com pequena discrepância concordão nos meios, que devem convergir para a obtensão do grande íim, a que se propõem: entretanto procuraremos sempre ponderar algumas razões, pelas quaes nos inclinamos á pensar, que a denominação mais apro- priada á exprimir a idéia, a que está ligado o objecto, de que nos oecupamos, é certa- mente a de — educação physica. - Assim o termo corporea, parece-nos, que, sendo íf inteiramente antipoda do— moral — lòmente conviria, se por tentura nos fosse lici- to fazer uma abstracção completa, quando prescrevemos alguns dictames, conducen- tes à uma bòa educação, da poderosa influencia, que exercem as faculdades intellec- tuaes sobre as physicas. Tão bem não poderemos acceitar o epitheto de medicinal; por quanto, envolvendo em si a idéia de pathologia, e therapeutica, não abrangeria todas as bases desta parte das sciencias, que tira muitas vezes sua origem de fontes, manifes- tamente distinetas. Accreditamos igualmente, que não teria satisfactoriamente com- prehendido a transcendência d'uma bem dirigida educação physica, quem a intitulasse arte de conservação dos meninos; por que seu alvo nobre, e grandioso não é simples- mente conserval-os, e sim conjunetamente fazel-os robustos, vigorosos, e morigerados, e tornal-os dignos de preencherem as altas funeções, de que os tem dincumbir a sociedade, e a Pátria, constituindo-os membros úteis, e cidadãos prestantes. Eis em íim, chegado o momento de combatermos o pensar d'alguns, que escre- vendo para uma sociedade civilisada, empregão entretanto, os escudados na sem du^ >ida valiosa opinião de J. J Rousseau, a palavra educação natural, deslembrados, de que a autoridade, em que se estribão, desenvolvendo o seo plano de educação de uma maneira especial, c querendo formar um homem a seu contento, entendeu, que só conseguiria o seu intento, imitando passo á passo a natureza, como elle mesmo se exprime. Ora, sendo por sem duvida inexequivel cm muitos pontos, um tal projecto em uma sociedade organisada, é claro, que, no século das luzes, não é possível que nos sirvamos desse vocábulo em tal accepção, e que de bòa mente com Mr. Ballexserd, « muitos outros a appellidaremos educação physica, Para provarmos a magnitude, e a importância da educação physica, basta que reflic- tamos um pouco sobre a transcendência do objecto, de que se oecupa, e sobre a in- fluencia benigna, ou perniciosa, que pôde exercer na população d'um paiz, confórm» for bem, ou mal conduzi Ja. Em verdade a conservação duma infinidade de victimas, que os prejuízos inveterados, c a ignorante rotina, que principalmente á este respeito ainda dominão a máxima parte dos habitantes do Brasil, immolão sobre a tetrica ara da necedade, deve irrecusavelmente importar um interesse tão vital, e momentoso para um estado tão novo, como o nosso, que tanta necessidade tem de filhos, que por seus talentos, industria, e força o facão chegar ao invejável apogeo de grandeza, a que é des- tinado, que julgamo-nos dispensados de demorar-nos por mais tempo sobre um pon- to, que está sem duvida fora de toda a contestação, contei)tando-nos apenas com a citação d'um eloqüente trecho do grande Helvetius, no qual se exprime assim — A educação não é outra coisa mais, do que a arte de formar corpos mais robustos, espí- ritos rectos, e almas mais virtuosas. Similhanle ao raio de Promotheo, a educação es- clarece, c viviííca os homens, c os dirige e guia, como a cultura embellece a plan- ta. — E de feito, sao os vícios da educação, que occasíonao o abastardamento, e a despovoação da espécie humana; e por conseguinte d'ella depende a prosperidade, ou aniquilamcnto dum povo.. V A Historia ainda confirma a nossa asscrção, apresentando-nos Roma temida, e rainha do mundo, quando a industria, e a pureza dos custumes se abrigavão em seu seio, captiva, e agrilhoada, quando a occiosidade, e o luxo se enthronisarão cm seus muros. Alem disto, se compulsamos as tradicções, registradas nos archivos da historia, ve- mos, que todos os povos, desde a mais remota antigüidade, logo que se constituião em uma sociedade, mais, ou menos civilisada, curavão immcdiatamente, com escru-? pulosa solicitude, de arraigar por todos os meios possivcis no espirito de seus conci- dadãos os preceitos, c dictames, que julgavão mais apropriados, afim de que a pureza dos custumes, e vigor do corpo, e a cultura do espirito os tornassem membros dignos de sustentarem a honra, e a dignidade de sua nação; e neste sentido os seus legisladores promulgavão leis, que ao passo que infligião penas severas, e até lyrannicas aos, que se entregavão aos vicios, e á practica de qualquer acção, que podesse nulliíicar o sco desideratum, decernião prêmios, e honras aos sábios, e aos virtuosos. Os Egy- pcios, habitando um paiz, cujo clima era summamente calmoso, e constrangidos pelas freqüentes inundações do Nilo, que o tornava mais insalubre, não podião olhar im- passíveis a longevidade de seus vizinhos Septemtrionaes, os Gregos; e por isso, de- pois de terem feito tentativas inúteis para descortinarem a verdadeira origem desta desigualdade, que tanto anhelavão reparar, tomarão medidas, que, com quanto não attingissem á desejada meta ; por que a isso se oppunha sua ignorância, e ínnumera- veis superstições, servem ao menos para demonstrarem, que elles havião comprehen- dido a gravidade de tão nobre objecto. Assim, crédulos imaginavão, que com o constan- te uso dos sudorificos, c dos emeticos tinhão achado o grande segredo de prolongar a vida. Entre os Persas, o grande Cyrus, attribuindo com razão ao habito pestilento da molleza, e do luxo, que respiravão, a causa da decadência desta antiga monarchia, intentou uma reforma cm seus costumes, baixando edictos, que marcavão as horas do trabalho, e do descanço, e o lugar, onde se devia entregar aos exercios do corpo. Se lançamos nossas vistas sobre o povo legislador, encontrámos por toda a parte entre os Gregos as mais evidentes provas do extraordinário desvelo, com que attendião para a educação physica dos seus compatriotas, e neste ramo tanto progredirão, <*ue servirão, e até hoje servem, de modello aos outros povos do mundo O prodigioso numero d« estabelecimentos públicos, que se erguerão em toda a Grécia para receberem a mo- cidade que d'ahi pela salutar influencia duma bem dirigida educação, tanto physica, como moral, que por meio dos multiplicados exercícios gymnasticos, que lhes offerecão, quasi sempre á expensas do thesouro publico, e das doutrinas, que lhes nre-avão os philosophos, sahia digna da pátria, que nella depositava suas mais hson- geir°as esperanças, attesta a civilisação deste povo, e alçou-lhe um indelével padrão 4e sloria, que commemorará sempre aos vindouros a sua sabedoria, e grandeza. Nos primeiros tempos da Republica, os Romanos mui pouca attenção prestarão a direccão, que convinha dar-se a educação de seos filhos; porque a s.mphcdade dos costumes, que a industria, e agricultura entretinhão, obrigando-os à uma vida adi- ra, e laboriosa, lhes conservava toda a robustés corporea; mas logo que o luxo, e o desregramento dos prazeres corromperão, e eífeminarao os seos hábitos, tractarao de corrigir os seos perniciosos effeitos imitando os Gregos nas praticas, que faziao, à fim de auxiliarem o vigor, ea saúde da juventude, de aperfeiçoarem o seu espirito. Com este intuito derão esses sumptuosos spcctaculos dos circos, onde se adextravão no pu- gilato, c na esgrima, e em outras espécies de exercícios, e crearão magistrados espe- cialmente encarregados de curar da educação da mocidade. Se reccorremos aos povos mais modernos, nós vemos, que na Europa, principal- mente da meia idade para cá, todas as nações cultas tem geralmente reconhecido a transcendência da educação physica, e o papel verdadeiramente grandioso, que repre- senta, quando se tracta do destino d'um povo. Uma infinidade de obras de todo o mé- rito se tem dado a luz a este respeito; e reformas importantíssimas se tem intentado, e eflectuado, que em verdade hão consideravelmente melhorado a rotina antiga do systema da educação, que participava ainda do atrazo, em que se achavão as scienci- cias, da barbaridade dos costumes, e dos prejuízos, que então vogavão. He assim, que na França, na Inglaterra, na Allemanha, e em muitas outras potências Europeas, ao passo que grandes homens, arrastrados pela força irresistível da experiência, fazem gemer os typos, propalando suas idéias, extirpando os abusos, e demonstrando, que um dos motivos mais poderosos do decrescimento, e amesquinhamento duma popula- ção são os defeitos da educação, os Governos, e os particulares, esposando uma causa tão santa, progredem com pé firme no caminho da reforma, e, fazendo erguer esta- belecimentos convenientes, como Gymnasios, Lycêos, Jardins &c. &c, e espalhando os conselhos, que desejão gravar indestructivelmente no espirito de todas as classes, preparão um grandioso futuro aos seos concidadãos. No Brasil, porém, onde a natureza, auxiliada pela fecundidade do solo, e pela ame- nidade d'um clima, em geral, em demasia saudável, derrama á mãos largas as torrentes de sua graça, reina um indifferentismo, quasi completo, acerca da educação physica dos meninos, embora uma-sabia, e distineta corporação medica tenha já por vezes procurado dispertar os seos patricios desse lethargo fatal, em que jazem. Por diversas vezes a Academia Imperial de Medicina, abrasada pelo acrisolado zelo, com que sem- pre se ostenta no desempenho de sua honrosa tarefa, tem aventado questões de grave momento, que interessão directamente a sorte de todos os Brasileiros. Muitos de se- os íllustres membros tem proferido discursos, e apresentado projectos, que encerrão em si idéias, que poderião servir de base á um methodo mais racional de educação. Entretanto, apezar de tão louváveis esforços, nós observamos, que um grande numero de meninos, que, se recebessem uma educação prudentemente regulada, poderião ser talvez o orgulho de sua pátria, é sacrificado pelo cego espirito rotineiro, que geral- mente se segue, pelos perniciosos prejuízos, que se põem em pratica, c pela imbe- cil, falua, e vergonhosa imitação dusos importados para o Brasil, que as mais das VII Yezes não se podem casar com as suas condições topográficas, e climatericas, e menos eom a índole, hábitos, e costumes de seos habitantes. Ora, quando consideramos, que no Brasil a maioria dos pais de familias, carecen- do de talvez todos os preceitos mais essenciaes á obtensâo do mais almejado voto de seos corações, que é certamente a saúde, e o aperfeiçoamento de todos os órgãos de seos filhos, involuntariamente cooperão a cada momento para a sua ruína: quando consideramos, que na côrle do Rio de Janeiro incontestavelmente o foco da civilisa- ção do Império, não existe um só estabelecimento publico, ou privado, em que se proporcione a mocidade uma educação physica, dirigida segundo as bases, que hoje são reconhecidas na sciencia, como eminentemente úteis ao perfeito desenvolvimen- to dos orgaos, ao bom desempenho de suas funeções, e conseguintemente a sar.de, sentimos immcdiatamente, que a humanidade, que o interesse, e mesmo a honra des- te paiz,que novo, e d'uma extensão immensa precisa mais, que nenhum, de filhos, que o engrandeção, e o tornem respeitado, nos indicão, que é ja tempo de acompa- nharmos as outras nações mais cultas, que não cessão de proclamar o subido alcance dum objecto, que evidentemente affecta suas mais caras, e palpitantes esperanças. Ninguém pôde negar a amarga, e dolorosa verdade, cujas provas à cada instante encontramos, de que vícios, e vícios condemnaveis, existem ainda profundamente arraigados no espirito dos Brasileiros no, que concerne a educação physica, e aos quaes, de comeumitancia com outras causas, sem temeridade se pôde attribuir a gran- de mortalidade das crianças recém-nascidas, que se effectua de certo tempo para cá no Rio de Janeiro, e o triste espectaculo, que por toda a parte nos oflerece uma espan- tosa quantidade de infelizes, que, verdadeiros spectros ambulantes, arrastrão uma existência pesada, e contristão o coração daquelles, que sinceramente asp.rão a pros- peridade de seo paiz. A prova, do que avançamos, nós encontramos palpável, e con- cludente na historia dos Scythas, e d'outros povos semi-barbaros, os quaes, posto que carecessem até mesmo dos rudimentos, que devem servir de alicerces á cultura das fa- culdades intellectuaes, e moraes do homem, que é sem duvida a magestosa cupola do edifício social, por desconhecerem esses perigosos prazeres, essa nutrição exqu.s.ta, que de mãos dadas com o luxo, c com a occiosidade, enervão o nosso temperamen- to adquirirão por meio do trabalho, dos exercícios, e da simplicidade de seos costu- mes tão grande robustez em todos os seos órgãos, que se atiravão impunemente a fa- digas, e privações, á que os compeli*, a satisfação de suas necessidades , caferocid - dl de seo espirito guerreiro, que senão superiores ás forças dos, que nao tivessem re- rebido igual educação. . ... Km verdade oS erros grosseiros, que preocupa» até hoje o grem.o das fanuhas, o espalso pragresso, que o luxo, eercado do numeroso, . senistro cortejo d outros v- osue sempre oacompanhao, vai tomando entre nós, ochar.atamsmo, ebcd.ond, c pecuTa ao dcPm.ail0S sórdidos aventureiros, ,ue, com .naudlto ultraje da human.da- dc a Kelegiao, e das Leis, hao aWado seocoiio altivo, a ignoranca de mm.as ma.,, vm a facilidade, com que abração os funestos conselhos, que a brutal ousadia d'alguns se- res degradantes, que se inculcão os mais habilitados na matéria, as comadres, e final- mente o ardente desejo com que muita gente procura libertar-se d'um jugo, que con- sidera em demasia oneroso; por isso que lhe embarga muitas vezes o tomarem parto nos ruidosos, e loucos prazeres das chamadas sociedades do grande tom, nos fazem crer, que, em quanto não se reformarem os abusos fataes, que incessantemente se ve- rilicao no seio das famílias, em quanto os pais, c mais não se convencerem, de que o enfraquecimento, e a vida miserável, e agonisante de muitos de seos filhos, sao quasi sempre o frueto da leviandade de sua condueta, e do desenfreamento de suas paixões, terá a sociedade de presenciar a progressiva diminuição de seos membros, e os pais de lastimarem a perda dos herdeiros de seos nomes, c do amparo de sua velhice 1 \ 1 Cumpre, pois, que o Brasil, conjurando para longe de si esta funesta boceta de Pandora, que lhe ameaça, pouco a pouco roubando a sua mingoada população, obstar a sua marcha na vereda da civilisação, c da grandeza, á cuja meta tem direito de chegar, attentos os inexhauriveis, e invejáveis recursos, com que o dotou a Providencia, evi- te, que se lhe exprobre, que, quebrando as algemas, que roxeavão seos pulsos, ficou todavia herdeiro dos vícios, que então desnaturávao totalmente em sua mãe pátria este importante ramo dos conhecimentos médicos, eque, proseguindo as pisadas das nações mais adiantadas, se esforce para que não sirva também para retratar o descuido, e atrazo, com que olha para este objecto, o escuro painel, que a penna fértil d'um seo distineto filho, o Dr. Francisco de Mello Franco, em um trabalho, que foi publicado à custa da Academia Real das Sciencias de Lisboa, traçou sobre as faltas palpáveis, e graves, que em todo Portugal se commcttião na direcção da educação physica da mo- cidade, e dos quaes por certo muitos ainda permanecem triumphantes entre nós. Só assim poderá galgar o apogêa de nobreza, que o futuro lhe prepara, e nivelar-sc em tyerarchia com as outras nações, que não podem deixar de lançar-lhes vistas ciosas, quando meditao nos germens de riqueza, que encerra sepultados pela vaidade de seos filhos, e de se alegrarem com a consideração, de que, dormindo o somno da indolea- «ia, tarde accordará sua poderosa rival. GENERALIDADES A CERCA DA EDUCAÇÃO PHYSICA DOS MENINOS. PARTE I. Cést l'education, qui rendit courageaur De Sparte, sans appui, les enfans vertueux Cest elle, qui rendit les Romains invenciblea Et íit qu'aux plus grands maux ils furents icsensiblea. ( Armstrong.) Agricultor provido, e intelligente não se limita simplesmente a semear em ter- ra virgem, e erriçada de sarças os escolhidos grãos, que lhe promettem fértil, e provei- tosa messe. Sabedor da grande vantagem, que resulta da propriedade, e do amanho do terreno, escolhe-o, rasga-o com o pesado arado, liberta-o de tudo, quanto contêm de damninho, prepara-o em fim; e então, cheio de esperanças, deposita em seu seio as sadias sementes, das quaes brotáo verdejantes ervinhas, que, nutridas por um solo benéfico, e auxiliadas pelas continuas solicitudes, que lhes ministra o lavrador, afas- tando todas as cousas destruetivas, que as poderião emmurchecer, e definhar, ganhão pouco á pouco, força, e vigor, e lhe offerecem depois em recompensa de seu insano, e desvelado trabalho agglomeradas medas, que aprovisionão seos vastos celleiros. Aquelle, que, conhecendo a prodigiosa influencia, qiie exerce sobre a prosperidade ou decadência dum povo o systema de educação physica dos meninos, que geral- mente adopta, quizer apresentar algumas considerações, tendentes á reformar os ví- cios e defeitos que n*elle se observáo, e a indicar a maneira, pela qual poderão ser corrigidos, não se contentará, para que veja a sua obra coroada por um êxito feliz, e completo, com o mostrar o regimen, que as mais, que não desejarem infelicitar seos queridos filhos, doando-lhes uma vida tormentosa, devem observar, quando já os trazem em seo seio, e com prescrever os cuidados, que lhes cumpre dispensar, desde que o vagido do recém-nascido lhes denuncia, que existe mais no mundo um ente, bue vem compartilhar com ellas os dissabores, e as misérias humanas, ate que, cres- po e vigoroso possa usar de seos próprios recursos para trilhar com d:scnção e pru- __ 2 __ dencia a senda, que a sorte lhe tiver destinado. Convencido da incontestável vanta- gem, que colheria a humanidade, se pais sãos, e bem morigerados procreassem filhos, que mais victoriosamente arrostrassem as horrisonas tempestades, â que em todo o penoso correr de sua existência estão expostos os frágeis mortaes, estenderá tão bem suas vistas sobre o rigoroso dever, à que estão ligados os pães, de concorrerem, quanto possível lhes for, para a felicidade de seos filhos, esforçando-se por não se precipitarem na carreira dos vícios- edos excessos, que, enfraquecendo e deteriorando a robustez de seos corpos, e estragando os mais bellos sentimentos de sua alma, pre- parão a ruina de innoccntes, que só veráõ a luz para attestarem a iniqüidade, e o desleixo, dos que lhes derão uma vida degradante. Ora, nós sabemos perfeitamente, que, quando se pretende despancar do espirito d'um povo hábitos, e prejuisos, que os exemplos, e as tradicções avoengas tem pro- fundamente arraigado em seo coração, quando se intenta abolir praticas, que favo- neião seos caprichos, suas phantasias, offerecendo uma sempre renascente enchente de prazeres e passatempos, que, posto que perigosos, incensão sua tresloucada vaidade, um dos elementos mais poderosos, de que se deve lançar mão para se ir paulatina- mente conseguindo lao grandioso Sm, é indubitavelmente a propagação da instrucção por todas as classes, as quaes, então illuminadas pelo archote da razão, poderão reco- nhecer seos erros, e a necessidade de correcção ; mas, como uma tal obra não pôde ser emprehendida por nós, nao só por que nos fallecem forças, como por não ser esse nosso propósito, deixal-a-hemos á aquelles, a quem compete dar-lhe o impulso, de que precisa, circumscrevendo-nos ao, que essencialmente constitue nosso objecto. E' uma verdade irrecusável, que a boa constituição do corpo d'um menino, a força e o vigor do seu temperamento dependem muito do conveniente regimen de vida, que seos pais tem observado antes de sua concepção, e especialmente da condueta, que a mài guardou durante o tempo da prenhez; por que as más disposições das mais, e dos pais são causas immediatas da fraqueza, e do viciado temperamento doi filhos. Isto posto, concebe-se facilmente, que, se os pais forem sadios, e bem confor- mado* em todas as suas partes, se tiverem uma constituição forte, e robusta, se se nutrirem sobriamente d'alimentos, que por sua qualidade não possão ser nocivos á economia, se se nao extenuarem por trabalhos forçados, e fatigantes, ou pelo contra- rio se se não entregarem á uma vida sedentária, e oceiosa, se comprehenderern ver- dadeiramente os devores conjugacs, cumprindo-os apenas, quando forem incitados p< ia necessidade da natureza, se guardarem as convenientes proporções de idade em seus casamentos, não sendo nem mui velhos, nem excessivamente moços, se gozarem d'um ar puro, s- exibir entre elles a tão essencial uniformidade de índole, e pensa- mento que tão vitalmente concorre para a alegria do espirito, e paz das famílias, e s- em fim, nao tiverem minado o vigor de suas forris por desordenados prazeres, os me- ninoi gerados (!"',:;ixo de tio saudáveis condições terão certamente direito á uma coiisUj çáo, ru-j os haLiíilc a atravessarem lui-nos perigosament? as tormentosas vi- — 3 — cissitudcs, pelas quaes tem de necessariamente passar desde os primeiros momentos de sua vida, até que seu corpo esteja em círcumstancias de, com maior probabilidade ■ de victoria, lutar contra os agentes, que constantemente conspirão contra elles. Certamente, quaes serão os resultados infalliveis, que deverão esperar os pais, que, desprezando tão salutares conselhos, se desusarem da vereda, que lhes indicáo a razão, e a prudência? Sem duvida serão amontoar males, que devem cahir sobre a cabeça de seos filhos, que, fruetos da fraqueza, e duma organisação alterada pela crápula, e por exagerações de toda a ordem, não terão o necessário gráo de vigor, e a indispen- sável energia em todas as suas funcções orgânicas, que possão garantir sua tão precária existência das influencias maléficas, á que tem de resistir, atravessando as quasi sem- pre perigosas phases, que se suecedem em sua primeira infância. D'aqui se diriva o inconcuso direito, de que se não pôde por fôrma alguma demittir a sociedade, de exi- gir, que os pais respeitem o futuro de sua posteridade, conduzindo-sc conformemente aos preceitos dictados pelos sãos princípios d'uma hygiene racional, e confirmados pela luz d'uma moral esclarecida, antemuraes seguros da grandeza d'uma nação. Não cessaremos de repetir, que uma renuncia tão completa de hábitos, que tirao a sua origem impura dos vícios, e da depravação, que desgraçadamente tanto l.son- *eião a nossa sensualidade, e de tradicções, que se transmittem de família cm família umas vezes por tenacidade, outras por ignorância, requer não só a valiosa protecçao das luzes, que desseminando-se irão dessipando as caliginosas trevas, que ainda emba- çao os raios vivificantes do nosso bom senso, como d'um esforço heróico, á cuja prova- do se tem de expor os pais; mas, acaso um tal sacrifício por extremoso que seja, nao valerá a pena, quando elle envolve a mais importante questão de utilidade a socie- dade á sua vida. e á de seos filhos? 11 . P • Pai' entrai em vós mesmos, compenetrai-vos de vossa diflicil posição csat.ste, os sagrados compromissos, que contrahistes perante Dcos e a soc.edadel! Arr.p.a, a c2ra em tempo, o nao deixeis o arrependimento, para, quando o tnste espectaculo, aue presen o áõ diante de vós vossos fdbos racbeticos, o defe.tnosos, vos recor- dar o s s" fls indesculpáveis, ou para quando no leito de dôr, prestes a ,rdes dar t a vosso Creador, nos curtos iotervallos em que a v.ssa lenta agon.a vos con- , um Impejo de reminiscencia, reconhecerdes em balde, que atra.çoastes a so- cièdad" d'ixando-lhe membros inúteis, e pesados, c ma.s um nome para engrossar ° z;:::'r--^-! «--*•—** 7,odos os tí: Begtmcn I J ^ Jo p0 cora„ao do ho. rcspeito dcvulo as mu -*- £» . puni.o com todo o ri, or. quem mesmo n,cm, que os an go as ul a- incli|,brentismo COm que entre nós se atten- ,„vementc as ma!ua.,.c . oUer , last;ii,!;uossi„ceramenl, que nó, ,1c para uma co.sa em erda>,.; d a Ia mp n,cr(,cil!alne„!c se nos c-.probre quc nos vangloriamos de mijados, « ™m0;> J ', ,.„,._ ,,, s01, du. „ descuido, com que tractamos este estado especial da • •-* _ 4 ~ vida por comprehenderem a delicada posição da mulher grávida, que os Lacedemo-J nios, não contentes com a severidade das penas impostas aos, que a offendião man- da vão cercar seos quartos de quadros, que representassem a formusura, e a belleza^ Esta practica servia ao menos para recordar-lhe sua situação melindrosa. Entre nós poucas são as, que se compenetrão verdadeiramente da diflerença de seu estado. As outras só d'elle se lembrão, quando são advertidas pelos incommodos que soffrcm, entregando-se depois a todos os desvarios de regimen, logo que se li- bertão de suas indispozições. Submettidas ao rigor da moda, apertão-se com seos colletes para encobrir o desarranjo, que a prenhez oceasiona em seo talhe, e conven- cidas de que devem satisfazer todos ósseos caprichos, lanção-se imprudentes na vora- gem de suas phantasias, ignorando que assim cavâo a ruina do innocente frueto que trazem em seo ventre. Arrastradas ao turbilhão de prazeres entregáo-se a ellcs com furor: cantão, dansão, usão indiscretamente d'alimentos que lhes não convém, e muitas prestando-se sem a menor reluetancia á seos gostos depravados, vão buscar em substancias nocivas os princípios nutritivos, que devem servir ao crescimento do feto. Sexo amável, e encantador! lembrai-vos, que, de vossa saúde, e de vosso proceder depende a felicidade de vossos filhos! Sacrificai á gloria de serdes mais a fruição de vãos, e funestos passatempos; e sede mais antes de haverdes dado á luz vosso» filhos!! He sobremaneira conveniente disseminarem-se instrucções acerca dacondueta das mulheres pejadas; por que no Brasil não é licito duvidar, a quem tiver observado o que se passa cm muitas famílias, que um sem numero de abusos, prejuízos e desre- gramentos ainda se commettem freqüentemente, e nós acereditamos, que, extirpando- se-os, as gerações se multiplicarão em força, e cm vigor, e as mais, que não derem nascimento a seres fracos, e languidos, não lastimarão a desgraça de sua fecundidade. Desde Hyppocrates que se reconhece a influancia nociva, que o ar exerce sobre o organismo da mulher pejada, e quem attenta para a exagerada sensibilidade, que ella adquire durante a prenhez, não pôde deixar de acompanhar a opinião do venera- vel velho de Cós, e de bradar contra o perigoso uso, que seguem algumas pessoas particularmente das classes abastadas da sociedade, de se encerrarem em seos quartos, ou salas, e passarem quasi todo o tempo mergulhadas em uma temperatura muito ele- vada, expondo-se aos funestos resultados, que lhes sobrevirão, se por ventura a neces- sidade, ou o descuido as constrangerem á sahir dessa temperatura, a que se tem habi- tuado. O ar impuro, e muito dilatado, e a inacção, em que ficão, as lançao n'um com- pleto abatimento, e languidez, e as arriscão, quando se afastão desse estado, aos gravei incommodos, que provém da mudança súbita da temperatura. O calor, o frio, e a hu- rnidade, quando levados á excesso, não podem deixar de perturbar as funcções do feto, de debihtarem-o, e mesmo de matarem-o, e por isso deve-se ter todo o cuidado de ev.tarem-se mudanças rápidas da atmosphera, e a acçíio dos ventos. D'aqui se infere o quanto será ul:!, que f-rj .o d.s passeios em tempo chuvoso, e b. úmido, e que * — 5 — esforcem por habitar sempre um lugar, onde se possa renovar o ar para moderar-se a elevação da temperatura. Nada é talvez mais fatal ás mulheres pejadas, do que o domínio das modas, quan- do sobre ellas influc. Então, deslembradas do seo estado, ignorando as deploráveis ca- lamidades, que sua leviandade pôde fazer pezar sobre a saúde do frágil ente, que com- sigo tem, e fascinadas pelo cego desejo de freqüentarem as mesmas sociedades, que an- tes constituiáo seos mais ineffaveis prazeres, cnvcrgonbão-se de se aprezentarem aos olhos do mundo d'uma maneira, que serviria para encher de orgulho á um espirito, que rectamente pensasse sobre o que constitue um dos mais invejáveis apanágios do bello sexo. Para occultarcm, pois, aquillo, á que chamão defeito, a moda com seos mil perniciosos artifícios lhes empresta suas galas, seos atavios fatacs. As barbatanas, os multiplicados colxetes, as ligaduras, os sempre nefandos espartilhos, apertando, es- treitando, ligando, e comprimindo desapiedadamente partes, que exigem toda a liber- dade, e expansão, coroão a obra da fatuidade humana; c embora esse conalrangimcn- to, essa compressão, que mesmo n'outras épocas são nocivos, empeção o completo des- envolvimento do utero, embaracem a respiração, obstem que uma nutrição conve- niente se reparta com o feto, sobre o qual também estas causas operão directamente, e os tornem languidos, e disformes, a insania tem alcansado o triumpho; porque, em Vez d'um ventre protrahido, e d'uns peitos salientes, se ostenta um corpo csbelto, e uma cintura mais delicada ! ! Cumpre, por tanto, que se não corem da sua fecundidade, e que se vangloriem do titulo de mais. Banindo uma pratica tão insensata não só o seo frueto não soffrerá, mas tão bem se libertarão, ou pelo menos minorarão as ancieda- des, inquietações, engorgitamentos, e mesmo os desarranjos na respiração, á que estão subjeitas, e que consideravelmente se exarcebão com esse comportamento dezasisado. As vestimentas, pois, das mulheres pejadas convém, que sejão largas, que não causem embaraço algum nos movimentos, nem compressão em seos órgãos, lie preciso, que se compenetrem desta sublime verdade « a prenhez não é uma moléstia, senão para as mulheres, em que os órgãos enervados tornão penivois todas as funcções, senão para estas machinas frágeis, e delicadas, em que cada digestão é uma certa moléstia. As outras chegão d'ordinario ao termo de sua prenhez sem outra moléstia, que o emba- raço inseparável deste estado. > (Roussel, Systh. phys., e mor.) Ha muitas pessoas, principalmente nas nossas pequenas povoaçoes centraes, que preconisão altamente, durante todo o período da gestação, os banhos frios; por que dizem, que, dando tom ao corpo, e vigorisando-o, conecorrem efficazmente para a 1 nu ençao dasaude do feto. Basta, que se reílicta sobre a acção d água na no corpo, Zue aLte fallaremos, para que se veja, que devem ser proscriptos formalmente. Oe— que occasíonao, é muitas vezes suíficiente para provocar o a horto, e cau- írTZte do feto. Os banhos mornos pelo contrario serão utcis durante a gestação ^necialmente aos indivíduos pletboricos, e sangüíneos. TuÍ rlriçao, de que devem usar as mulheres no periodo da prenhe, nao * — 6 — podem estabelecer regras invariáveis; por que ella deve modificar-se, segundo as ida- des, os temperamentos, os hábitos, a fraqueza, ou força dos indivíduos c«mesmo scgun-i do os diversos tempos da gestação. Ha com tudo alimentos, que são prejudiciaes cm todas as círcumstancias, tacs são os de difficil digestão, os excitantes, e todos esses con- <'::neníos irritantes, que só damnos produzem ao estômago. O excesso é geralmente perigoso; a temperança, que sempre deve guiar o homem, que quizer conservar a sua saúde, torna se na época da gestação ainda mais essencial, e indispensável. As pessoas rok^tas, affeitas ao trabalho, e ao exercício, e que se nutrem ordina- riamente d'a!imentos grosseiros, poderão impunemente não alterar o seo regimen, quando pejadas, se por ventura não se declarar algum outro incommodo, queascons- tranja á mudança; nns as mulheres delicadas devem nutrir-se d'a'i:nciitos succulen- tos, facilmente digeriveis, e tomal-os em pequenas porções, augmentando antes, se necessário fàr, o numero das vezes da comida. Convém igualmente, que alguma mo- diíicaçáo pru Lmto se oflectue relativamente ao uso das bebidas espirituosas; o vinho, e em geral os licores ali. joücos são summamente perigosos. Felizmente, porem, pou- cos damn.s poderão produzir entre nós; por que no Brasil pouco ha a temer-se entre o sevo amável pelo abuso destas bebidas; mas em compensação sérios receios devem causar no animo, de quem vé a predilecção, e a preferencia, que notavelmente em al- gumas províncias nossas se dá ao café, a exaggeração, e o excesso, com que o tomão as senhoras. Nao o condemnaremos absolutamente, como Geoffroy, que diz, que o ca- fé produz quasi sempre o aborto; mas aconselharemos, que se seja mais moderado, e comedido em seo uso. E' tão bem d'um interesse palpitante, que, na escolha dos alimentos, não se entre- guem as senhoras ás suas phantasias bisarras, que o desgosto, ou uma imaginação desregrada lhes suggerem, e que empreguem uma branda violência resistindo aos apetites ca»>richosos, quando versarem sobre objectos de difficil digestão, ou de qual- quer sorte j rejudiciacs. Os antigos acustumavao prescrever ás mulheres, durante a prenhez, como bebida ordinária, certos cozimentos, de que tratáo as suas pharmacopéas, e as infusões aro- mat-cas; nós, entretanto, affastando-nos de semelhante practica, que nos não parece razoável, entendemos, que á menos que uma circumstancia especial, e da qual só pôde ser juiz um homem d'arte, não a reclame, nenhum resultado vantajoso se deve- ra esperar de tal rotina, que ao contrario poderá ser em muitos casos fatal. Termina- remos, pois, o oue temos á ponderar acerca de alimentação fazendo sentir, que é de sunima importância, que as mulheres pejadas procedão com toda a prudência na mu- dança do seo regimen diectetico, se assim fur preciso, reformando-o pouco a pouco, á Íim ue que naosejão victimas dos incommodos, que quasi sempre seguem á repressão de ha.j.tcs, e que se convenção de que, da mesma maneira que o excesso, a timidez, e uma austera severidade podem determinar males incalculáveis. As evacuações exigem da parte das mulheres pejadas a mais escropulosa atlenção; « por isso cumpre, que procurem entretel-as em seos justos limites, evitando sua sus- pensão, ou repressão. Mr. Ballexserd prohibe expressamente as familiaridades conjugaes; por que, diz elle, o exercício, que a madre faz algumas vezes neste acto pode offcnder o embryão, que contém, além do periga das superfetaç.ões, posto que raras; e escuda a sua opi- nião com os animaes, que se abstem da copulaçao nesta época; entretanto entende- mos, que não será necessário tanta severidade, e nos limitaremos á exigir moderação, e prudência, especialmente nos primeiros tempos; e nem acceitaremos o exemplo dos animaes, visto que nenhuma paridade existe; por quanto clles tem tempo fixo para a procreacão da espécie, entretanto que a natureza não tachou uma época preciza para o homem. Huma infinidade de factos desgraçados comprova os tristes, e lamentáveis effeitos, que podem determinar sobre o feto as moléstias scvphiülicas, de que por ventura se achem as mais nf/ccladas. Temos visto muitos meninos languidos, e miseráveis arras- trarem uma vida pesada, ou morrerem cobertos de chagas, e transidos de dures, quan- do por infelicidade conseguem vencer os mezes de vida intra-uterina. Ora, pensan- do nós, que um tractamonto anti-scyphilítico brando, e methodicamentc dirigido, só trará muito beneficio, parece-nos, que conviria muito, que as nu.i:, q:ie não deseja- rem legar á seos filhos tão cruéis padeciinentos, ou verem-se despojadas, depois de tan- tas fadigas, do objeto de suas sollicitudes, roubado por uma morte prematura, e tru- culenta, se premunao, para desta sorte arredarem de seos filhos tão barbara, quão cer- ta sentença. E' crença quasi geral em alguns paizes da Europa, que uma mulher pejada deve san-rar-se para prevenir os males, a que está exposta; e, em algumas partes, levao o seu prejuízo tao longo, que se fazem sangrar ao h.% ao 7.% e ao 9." mezes quaes- «uer que seião as circunstancias do organismo. Entre nós, posto que nao esteja tao diffundida esta pratica imprudente, todavia o povo, guiado pelos conselhos das coma- dres a adopta muitas vezes etfcmporaneamente; é por tanto importante, que se pu- bliquem os perigos de que é cercada. Ha oceasiões, em que as sangnas podem ser úteis durante a gestação; são, porém, mais ordinariamente contramd.cadas nas pes- cas fracas, e valctudinarias; por que podem muitas „=« determ.nar o aborto, o» influírem sobre os filhos, que nascem entao débeis, e doentes O exercício moderado é sen, duvida muito convemente as mulheres pejadas. O passeio a pé será sempre preferido ao feito em carruagem, ou á çavallo; por que a y luta ag taçáo, que produz, «ao só offende o feto, como pode algumas vezes o- ■ I o abort , e dar lugar a muitos outros incidentes fataes. I>o mesmo caso es dansa, que, sendo prolicua em muitas círcumstancias, é sempre pengosa durante a bestando uo nosso dominio prevenir as paixões dalma, cujos effeitos sao «o no- civÜs á mulheres, como aos fetos, e nao podeudo sempre serem ellas senhoras de re- gulal-as, é preciso precaver seo desenvolvimento, evitando, que se lhes annuncicm accontecimentos próprios á fazcl-os nascer, c cxhortando-as á serem mais attentas á se arrastarem de tudo quanto puder dar-lhes lugar. A surpreza accompanhada de susto, a alegria, o estampido inesperado do trovão, do canheo, etc. etc. podem occasionar- if' lhes graves emergências. — As scenas lugubres, o aspecto d'um homem aleijado, ou disforme, e em üm a vista V de qualquer objecto que impressione repentinamente sobre a imaginação mui suscep- tível das mulheres pejadas, podem causar-lhe grandes desordens. Assim fugindo o perigo, não deverão freqüentar lugares onde mais commummente se encontrem es- tes desagradáveis espectaculos. Em fim, se as senhoras, desde o principio da gestação, empregarem algum esforço para vencerem todos esses óbices, que se oppoem á sua felicidade, e á de seos filhos, se não se escravisarem á estes rediculos desejos, de que são atormentadas, e que, não podendo influir sobre oproducto da concepção, como pretendem os visionários, serão por ellas combatidos, e affastados de sua imaginação, verão logo recompensada a sua coragem pela ausência desses incommodos, que as flagelão, e alterão sua paz, e seo repouso, e pelo renascimento de sua saúde, que se tornará mais vigorosa; e sobre tudo terão a dita de possuírem filhos dignos de taes mais, e capazes de viverem felizes. _ 9 — PARTE II. Nous nàissins foibles, nous avong besoin de forces; nous naissons dépourvus de tout, nous avons besoin d'assistence. (J. J. Rousseau.) O menino, apenas nascido, frágil, e baldo de todos os recursos, é certamente o fcnte mais miserando da eschala zoológica. Arquejaudo, e fatigado da porfiosa luta, por que passa durante o parto, vé-se lançado em um mundo novo, impressionado por sensações desconhecidas, e cercado de agentes, que constantemente conspirão contra sua existência precária, qual dcbil canninha açoutada pelo furacão impetuoso! Mai* desditoso que todos os outros animaes, não pôde exprimir seos soffrimentos, e menos buscar-lhes alivio; e. .. tudo, e até mesmo o encarar os benéficos raios do astro do dia, que tanta influencia já exerce sobre elle, é então vedado ao primor da creação! 1 A sua fraqueza, a sua mesquinhez é nesta épocha a verdadeira antithesa de sua força, e grandeza futuras. Qual será, por tanto, a sua sorte, se desvelos, carinhos, e affa- gos não vierem immediatamente em seu auxilio? 1 Qual será por tanto a sua sorte, se em torno de seu berço, quaes sentinellas vigilantes, não se postarem a prudência, e a mais esclarecida dedicação? ! Certamente, sem soecorros, sem ao menos esse instineto, que ao descerrar de seos olhos já guia os outros animaes, suecumbirá a tão encarni- çada, e desigual batalha. Assim, pois, terminados os oííicios prestados pelo parteiro, o recém-nascido ainda reclama cuidados assíduos, e tão essenciaes, que, se forem esquecidos, a sua existên- cia pôde ser altamente compromettida. De muitos destes, e muito importantes, não deveríamos tractar; por que fazem parte dos soecorros, que cabem ao parteiro mi- nistrar-lhe , dos quaes nos queremos prescindir: entretanto como algumas destas mu- lheres que se intitulao parteiras, quando se achão fora da presença duma pessoa, «ue tenha conhecimento do perigo, aventurão a vida dos recem-náscidos com prac- ticas insensatas, passageiramente tocaremos em alguns desses pontos. Começaremos por um uso muito extraordinário entre ellas, e contra o qual não nos podemos exi- mir de clamar; porque deve muitas vezes ser fatal ao organismo fraco dos meninos. V aRua, em que se tem de lavar o recem-nascido para o despir d aquella pommada viscosa que cobre a sua pcllo no momento do nascimento, addicionão as comadres sempre, e só insufladas por tendência rotineira, e nunca por motivos plausíveis, vi- Toe outros licores espirituosos, óleos, e substancias irritantes. Nenhum proveito s côL de semelhante practica, que nem se quer satisfaz o hm, .que se propõem as se come ut m invólucro gelatinoso, que cerca o recem- pessoas, que a ^^^ZZ^^ ^G dcsPrendMe ^ ° ' ""^ nascido, tão necessário durante o parto, nem semi i ^ — 10 — com a continuação das lavagens, que se consegue inteiramente desligal-o. Não ha, por tanto, necessidade de se lançar mão destas substancias, bastando apenas servir-se d'agua morna, enxugando-se depois levemente com um panno de linho apropriado, c esperar-se que a crôsta vá pouco á pouco cahindo. O único caso, em que parece-nos que será pennettido juntar ao banho alguma quantidade de vinho, é quando a crian- ça se apresenta demasiaJamente dcbil, e fraca; e ainda assim com pequena espe- rança de suecesso. Hamilton, e muitos outros proscrevem absolutamente tal uso; por que longe de irem (como crêem os seos apologistas) estas substancias tonificar a criança, podem, absorvidas pela pelle, estragar o seu estômago frágil. Taobem diremos, que convém muito à saúde dos meninos, que se desprezem es- ses pós específicos, que soem empregar as taesparteiras no curativo dasecção do cordão umbellical, e a celebre mistura de azeite com tabaco, quemuitas ainda adoptão, e fi- nalmente uma infinidade de ligaduras, e pannos applicados sem discrição, e sem uti- lidade, c que somente prestão para affligirem a desgraçada criança. Quanto á vestimenta, e ao leito do menino, não nos demoraremos muito; por is- so que felizmente já se tem, por um lado, exterminado, quasi que geralmente, o tyrannico costume de enrolar-se a criança desde os pés até a cabeça, obrigando-se-a á conservar uma posição incommoda, e por outro conhecido, que tão fáceis são os preceitos à guardar-se, que não ha ahi ninguém, que tenha estado em uma casa de familia, que os ignorem. As roupinhas do menino recem-nascido devem ser largas, leves, e collocadas de maneira, que não comprimão parte alguma de seo corpo, â íim de que, acostumado a viver em liberdade no utero, não soffra por essa coacção. O menino será deposto em um leito, ou berço coberto com lençóes de panno de li- nho, ou do nosso algodão, finos, seccos, e moderadamente aquecidos, á fim de evi- tar-se o frio, que é sempre muito prejudicial nos primeiros momentos. Collocar-se- ha o menino em seo berço sobre um dos lados para facilitar-se a sahida das mucosi- dades, que embaração a trachêa artéria, e por conseqüência diíficultão a respiração, tendo-se o cuidado de se as ir tirando á proporção, que forem expulsas. Muitos orde- não, que se colloque o menino sobre o lado direito; mas, com quanto isto possa ter alguma coisa dutil, será preferível deitar-se-o já dum, já doutro lado; por que uma posição constante trará inconvenientes perigosos. Quando, em conseqüência d'um parto laborioso, ou doutro motivo qualquer, o menino parece debilitado, alguns authores aconselhão, que se o faça engulir uma porção de vinho assucarado; como acreditámos, que em casos taes esta practica não poderá accarretar inconveniente algum, não hesitaremos em seguil-a cm idênticas círcumstancias. Se, porém, o menino estiver animado, e vigoroso, não se lhe deve dar nada, sem que tenha excretado o meconium, e deitado pela boca as mucosidades (glaires); por que se se apressar em fazel-o mamar, antes da expulsão d'estas matérias, o leite se azedará no seo estômago, e nos intestinos, o que, além doutros incommo- dos, pôde occasionar violentas eólicas. Não deve haver receio de differir-se, se o me- — 11 — nino é bem constituído, e forte, o dar-se-lhe nutrição por 24, e mesmo 30 horas, sendo necessário. Hum costume bárbaro, e soberanamente funesto existe ainda, senão aqui no Rio de Janeiro, e em outros pontas, onde os partos são presedidos por homens entendidos, ao menos em muitos outros lugares, nos quaes desgraçadamente os me!;idrosos cuidados do recém-nascido ficãoao cargo de pessoas ignorantes, e supersticiosas, que cumpre ser exterminado, como capaz de determinar terríveis males. Imitando os Cara.bas, e ou- tros selvagens, as comadres, com o fim de emendarem a natureza, ou de arredarem de sobre a criança os máos presagios, que dizem prognosticar certas conformações d'alguns órgãos, costumáo endireitar o craneo, e outras partes, quando julgáo deffei- tuosas. Estas manobras, practicadas por mãos inhabeis cm órgãos tão frágeis, não po- dem deixar de ser funestissimas; e por isso entendemos dever chamar á í tenção das mais carinhosas para ellas, admoestando-lhes, que urge, que se convém,-: <> de que, quando appareção difformidades, ou quando a cabeça se comprima na pu.;> gem, de que resulte fôrma irregular, só á pessoas d'arte, e experimentadas devem reccorrer, se não quizerem immolar a vida de seos innocentes filhinhos á barbaridade, de quem desconhece o perigo, do que faz. Todos sabem a predisposição, que tem as crianças para as moléstias eruptivas cutâ- neas, que, quando não produzem acontecimentos mais assustadores, pelo menos aca- brunhão as suas forças, e retardão o seo desenvolvimento. Ora, como ni-igucm pôde duvidar, que a falta de aceio concorre demasiadamente, ou para o seo apparccimento, ou para sua obstinação, convém muito, que se conserve a criança o mais limpamente, que fòr possível. O aceio facilita, e entretem uma branda transpiraçao, e faz com que os meninos se tornem vigorosos, e prazenteiros. Buflon, para fazer sentir a importân- cia do aceio, e a solicitude, com que as mais devem curar no seo entretenimento, diz que não só os selvagens o attendem muito, como que, não lhes sendo possível mudar amiudadamente aspelles, de que se servem, e faltando-lhes pannos, supprem a sua deficiência com alguma matéria maiscommum, para que não precisem poupal-as. Cumpre pois, que se observe toda a vigilância em mudar os pannos, logo que estive- rem molhados, ou desaceiados; por que ao contrario os meninos respirão um ar vi- ciado eanparecemaIémd'issoamPolas, e phlyctenas nas coxas, e nádegas, que de- terminão comixões, queosagitão, eatormentão excessivamente. Felizmente já se não adopta tanto o deshumano costume de enfaixar o menino em pannos de lua, ligados de cima á baixo com cintas; os quaes, cooperando para a oceultação do desaceio, faziáo com que as amas não tractassem, senão vagarosamente, de preencher essa obri- gação se por ventura olhos perspicazes não lhes admoestassem sua incúria. Os mes- mos Turcos, conhecendo a necessidade d'estes cuidados, practicáo um buraco no leito, no colxão do menino para offerecer um curso mais franco aos seos excrementos, e eToilmpão simplesmente as bordas do vaso, que n'clle introduzem, ou o irao Jundo isto convém. O nosso fim, cita* este meio, de que se senem^os Turcos, — 12 &5o é de maneira alguma aconselhar, que se o adopte; por quanto seria elle mais um pretexto para a negligencia das amas. A ternura, e vigilância d'uma mãi carinho- sa regeitão-o por certo : referimol-o unicamente para mostrarmos, que até os Turcos comprehendem a vantagem do aceio nas crianças. Como muito se tem debatido acerca da preferencia dos banhos, de que se deve usar, alistando-se uns como panegyristas dos frios desde a primeira infância, e outros com- batendo essa sua tão preconisada excellencia, considerando-os nos primeiros tempos da vida extra-uterina como soberanamente prejudiciaes, não nos parece fora de pro- pósito, com quanto do que temos dito precedentemente se possa deprehender o que pensamos á respeito, apresentar alguns argumentos, em que se estribão os, que acon- selhão os banhos frios, e, fazendo sentir os effeitos, que operão, interpormos a opi- nião, que adoptamos. Os sectários dos banhos frios buscâo principalmente fundamen- tar as suas razões com os exemplos dos antigos, e d'alguns outros povos, entre os quaes ainda se banhão as crianças n'agua fria. Assim dizem, que os Gregos lançavão n'agua dos ribeiros, e rios, que bordejavão suas cidades, os recém-nascidos; e que por este modo conseguirão dar-lhes essa tempera robusta, que tiverão. Os Lacedemonios banhaváo seos filhos no Eurotas, os Germanos no Rheno, como falláo Virgílio, e Se- neca. Achilles tornou-se invulnerável por ter sido emergido por sua mãi nas águas do Stix. OsLaponios, os Peruvianos, os Indianos estão tão bem habituados á banhar seos filhos nagua fria. Os pobres Selvagens da America, como em muitos outros casos, de que se não podem encontrar exemplos nos paizes civilisados, merecerão igualmente a honrosa menção dos, que sanetificão este costume, Todos estes arestos, e muitos, que calamos, por nos não alongarmos em demasia, relatão-se para abonarem a utilidade da lavagem fria, â qual querem attribuir o vigor, que em geral se nota em estas na- ções. Nós, porém, alliando-nos aos hygienistas modernos, que já julgarão plausível- mente esta questão, não nos abalamos com taes provas. Basta que refílictamos um pouco sobre a acção do banho frio, e sobre as precauções, com que se deve amparar a primeira idade da vida, para que condemnemos completamente n'esta época o seo emprego. Todas as partes do corpo, que se expõem ao contacto súbito d'agua fria, experimentão instantaneamente um certo gráo de tensão, e contracção, e tornão-se mais strictas, e menores. Os vasos sangüíneos, e capillares soffrem esta contracção, mui forte á principio, para depois irem-se gradualmente relaxando. Daqui se infere, que a água fria estreita, e diminue os vasos sangüíneos da pelle, e dos músculos sub- * jacentes, que ficão momentaneamente incapazes de receberem a quantidade ordinária de sangue, e de exhalarem este vapor insensível, que se chama transpiração. O san- ; gue assim e.vcluido da peripheria reflue para os grossos vasos do centro, e das cavida- des do tronco, e causa uma plethora instantânea. Ora, á vista do que acabamos de dizer, quem poderá crer, que a fraca constituição do menino, e a fragilidade de todo o seo organismo sobrepujarão impunemente á acção, ainda, que passageira, dos banhou frios? Além d'isto, comprehende-se bem um outro perigo, de que podem ser seguidos, a — 13 — vem a ser a repercussão das moléstias eruptivas cutâneas, que a natureza traz muitas vezes á superfície, a qual terá certamente lugar, logo que se der qualquer negligencia da parte das amas, ou pessoas, que curem do menino. Quem níio vé, que o regimen, que se observa entre nós, o temperamento, e a natureza do clima, em que vivemos, não offerccem o menor ponto de contacto com esses povos, que, se diz, empregão este meio. Por estas razões, pois, evidentemente se conclue, que entre nós, enervados pela molleza de nossos pais, vindos ao mundo com um temperamento incapaz de re- sistir todas as provações, se deve proscrever os banhos frios nas crianças, aos quaes só se irão famüiarisando gradativamente, e quando tiverem sufiiciente crescimento; c ainda assim não por que entendamos, que d'esta arte alcansaremos transplantar para o nosso paiz esses modelos de grandeza, e robustez, que nos cila a historia entre os Celtas, Germanos, Gauleses etc, mas por pensarmos, que habituando os meninos opportunamentc á estas, e outras practicas, os poderemos formar homens, que se não aceurvarão ás contrariedades, e ás vicissitudes, que nos assaltão á cada instante, c ás quaes facilmente suecumbem aquelles, que, como osOrientacs, nascem, e vivem cons- tantemente respirando uma athmosphera de melindres indiscretos, e de luxunosos, e /oucos prazeres. Em outra parte d'este nosso trabalho, apresentaremos ainda algumas considerações, tendentes á mostrar a utilidade, que cm outras épocas da vida propor- cionaria entre nós este m se cvltc accu. seguem. Como quer qu seja o , » o ^ radamente a ™P«»°£ ' ^ ^ Cgraçailamcnte entre nôs, particularmente ro„ »5o po era ^2»-- lautos abusos, que explico satisfac- „a classe desfavoreeda da forlu,■ <^ , é cci[ada nos s3„s - toriamente a causa pela qual uma gnmie p* ^ ^ ^ primeiros anuos de v,da e o,> ffUu . P baixas, e humidas, como funesta a Saude as »«»»';• ^ „ fogo para cIcv„ mais a principalmente se ncllus Dr pre uso , ^ ^ ^^ ' t™>-atUra; rX-rt n Ít as ou menu, activa. O balanceamento que om- *;;:i::^U determina ordinariamente a cessa,. sub.U da — IV — Iranspiração, como acontece ás pessoas que estão abafadas, e quentes cm seos leitos, cujas cortinas se agitão: accresce mais que semelhante proceder é ainda perigoso,* por que pôde produzir congestões cercbracs, que se tornarão tanto mais graves, quan- to é certo, que as amas, suppondo que a tranquillidade, que guarda a criança, é o effeito d'um bcllo somno, só reconhecem o seu funesto engano, quando já não ha remédio algum. E' tãobem um costume, que se deve banir como eminentemente no- civo, o que adoptão algumas amas, quando para socegarem as crianças, que chorão, as lirão do seu berço, e sahem imprudentemente para o ar sacudindo-as, querendo assim dislral:il-as. Verdade é, que muitas vezes conseguem esse fim; mas infelizmente a sua leviandade é após punida na innocentc victima, cuja transpiração susta-se ao receber uma corrente de ar frio. Por tanto cumpre, que para se evitarem estas fataes emer- gências, se tenha o menino em um meio temperado, que se busque prevenir a sua exposição ao ar repenf^uuente, que se os não faça saltar, balançar, e que se os não não conservem por muito tempo nús, ou descobertos. Se em l 'dos os paizes se reclama, como útil, a stricta observância d'cstes preceitos, torna-s? cila ainda mais indispensável no Brasil, onde as mais são sempre extremas no que concerne à attenção, com que traetão os filhos. Uns são victimas de excessi- vos cuidados, outros da mais revoltante negligencia. Umas vezes opprimcm os meni- nos com coberturas, c vestimentas, fazendo-os sensíveis á mais ligeira mudança : ou- tras vezes, abandonados cm câmaras insalubres, vivem em vergonhosa immundicia. Estas razões, á nosso vér mui poderosas, nos compellem a exigir toda a vigilância da prr.e das mais, e a fazer sentir com quanta solicitude os empregados dos estabele- cimentos d'e\postos deverão ouvir a sineta, que lhes annuncia a chegada de mais um ente, á quem uma demora indiscreta pôde ser muito funesta ; por quanto é ordina- riamente ás des-horas, que costumão levar para esses lugares as desgraçadas crianças, quando o sereno, e os ventos frios são mais intensos. Quando consideramos as immensas vantagens, que sem duvida alguma prodigalisou pelo mundo civilisado a descoberta do puz vaccinico, que com a maior justiça é repu- tada uma d'aquellas, que erguco para a medicina um monumento indelével de gloria, que radiante atravessará os séculos; por que libertou a humanidade d'nm dos mais tormentosos instrumentos da parca, as bexigas; quando consideramos a facilidade, com que em todo o Brasil se podia preservar um numero extraordinário de infelizes, que estão a todos os instantes expostos a serem preza de tão horrivel ílagello, e vemos, que em muitas províncias nossas a máxima parte da população permanece no mais censurável desleixo á respeito d'um objecto, que tão immediatamente interessa o seo bem, ou por que vive fanaiisada por prevenções ridículas, ou por que essa benéfica providencia nao está ainda, como devera, diíFundida por todos os ângulos do nosso lernlorio, não podemos por fôrma alguma resistir á necessidade de dizermos o, que sentimos acerca de assumplo de tanta magnitude, e do qual grau.leniente depende o b;m exilo da educação dos meninos; por que pensamos, que, sempre cercados de — 13 — causas bem patentes, que imminentes tomão o perigo, não é possível, que esperemos accrcscimo da povoação do nosso nascente paiz, sem que curemos com o maior affinco em disseminar até pelos insignificantes recônditos do sec^asto território a salutar in- fluencia da vaccina. Não entra certamente em nossa tarefa o provarmos os benefícios, que d'ella se podem colher; por quanto isto c hoje assumpto fora de toda a contesta- ção, eque tem sido tão brilhante, econcludentemcntc tractado porpennas por tal modo hábeis, c esclarecidas, que tudo o que disséssemos ficaria á quem do que é geralmente sabido. Tão bem, quando pintamos este quadro tão escuro, cumpre-nos declarar, que de maneira alguma nos referimos á corte, e á grande parte da província do Rio de Janeiro, onde felizmente existe um Instituto Yaccinico, tão philantropicamente diri- gido, que não só tem conseguido dissipar os inveterados prejuízos do povo, que já sem susto afílue para ali á munir-se de tão seguro preservativo, como tem feito tão- bem chegar até, onde lhe permitte sua esphera d'actividade, a profícua aura de seos benefícios. Nosso fim é simplesmente fazermos sentir, que principalmente nos lugares centraes das províncias de Minas, S. Paulo, e outras, a maiscaliginosatréva venda ainda os olhos deseosmiseros habitantes á este respeito ; porque n'esscs pontos sabemos perfei- tamente, que se considera como um mal mais temível, que a peste, a inoculação da vaccina; c por esta razão se obstinão todos cm malograrem qualquer tentativa, que os governos provinciacs, ou seos delegados empreguem para a obtensão do tão impor- tante fim. N'csscs lugares a população rude, eivada de grosseiros preconceitos, foge, c embrenba-sc nas matas, quando ouvem fallar, que se pretende vaccinal-a. Povoados existem, onde, ha tantos annos, se não vaccina, que se tracta com pessoas, cheias de filhos, c algumas de netos, que nunca forão inoculadas; e até nestes, quando se quer provar, que um indivíduo conta não pequena idade, ou marcar-se a épocha, em que teve lugar um, ou outro accontccimcnto, se diz— fulano nasceo, ou L,to suece- deo no anno, cm que o delegado do fisico-mór matou por aqui o povo com a tal cha- mada vaccina. -- Em uma das povoações da comarca, donde somos natural, não ha muitos annos, um presidente da câmara municipal, tencionando pôr em execução ordens mui frizantes, que havia recebido do governo provincial, mandou annunc.ar, que de tal dia em diante principiaria a estar aberta uma das salas da casa da câmara onde o povo se poderia ir vaccinar. Este edital enfureceu tão desabndamente o vul- ~axo que nas vésperas do dia aprazado, manifestou-se um motim aterrador, e um numero avultado de gente armada apresentou-se pelas ruas vociferando e ameaçando com o peso de sua louca indignação ao presidente, a quem chamavão algoz, e assas- "ora á v^sta d'Mo, resalta a necessidade d'alguma providencia, que orrede de sobro n cabeça efesses infelizes tantos males, que ainda por ventura os espr-rao. ^oo>, o , cm e quiveis são por certo os meios, pelos quaes, com algum eus* e verdaoe se cbo-ri. à tão desejallo alvo ; não os apontaremos nos,.quc só anhe:amos a re . o Í a Sum d'dH pela fadiga, com que o opprimirão os trabalho, que vence no acto de nascer, privado da nutrição, que até então recebia no ventre materno, depois que um suave, c angélico soumo de innoccncia lhe liberalisa algum descanso, o menino sente imperiosamente a necessidade de tomar algum alimento, que repare as suas forças. Mas (piai será esse alimento? Quem lh'o ministrará? A nutureza, e a razão se con- sorcião, como em muitos cases, para resolverem esta questão, mostrando-nos que à mui pertence alimentar o ente, que deu á luz. Em verdade a natureza, im-alantando indelevelmentc no coração das muis esse sentimento instinetivo, e tão nobre, que as arrasta, entre dores, c gemidos, á procurarem impacientes, e ciosas o filho, que acaba de causar-lhes tão atrozes tormentos, apenas ouvem o seo tremulo vagido, que faz-lhes esquecer os sofrimentos para vangloriarem-se do doce titulo, que recebem : a natureza sempre previdente, dotando a mi.Ih.er dedous órgãos, cujo único fim é a amamentação, eque se vão desenvolvendo, e enchendo-se d'uma secreção que antes não exestia, e que gradatívamente se reveste de caracteres, e qualidades, de que não gozava á proporção, que se approxima o momento, em que tem de servir: a natureza punindo severamente a mãi desnaturada, que ousa furtar-se ao cumprimento d'um dos seos grandiosos fins, enchendo-a de moléstias, não terá evidentemente demonstrado, á quem incumbe o nutrir o recém-nascido, e qual será a sua nutrição? Sem duvida. A razão igualmente, que sempre mais radiante se ostenta, quando accompanha os pas- sos ca natureza, vem com o seo fulgurante archote illuminar-nos, provando a mesma coisa. Basta, que lancemos um rápido olhar, sobre os males immensos, á que ficão sujeitos os meninos, que são privados do alleitamcnto materno, sobre as qualidades eminentemente apropriadas ás necessidades do seu organismo, que se encontrão no primeiro leite, e que se não podem supprir, e ultimamente sobre os exemplos, que os propnes aiuraaes noso.-iliüjj.m, quando instinctivameale alleitão ósseos filho:;, para que — 19 — indubitavelmente reconheçamos, que a razão sanccíona os dictames, que a natureza tão claramente prescreve. E quererá por ventura a espécie humana, esquivando-se á tão salutar obrigação, que as feras, guiadas apenas pelo instincto, lhe offereção a ca- da instante provas de maior ternura, e de mais dedicado amor naterno? Quererá a mulher, que em quanto a leoa cruel ciosamente desempenha os deveres de mãi, ella se rebaixe mais, que os brutos, desprezando os seos, e deixando passar seos filhos á braços estranhos, c mercenários? Onde achará o miserável frueto de suas entranhas os desvelos, tao necessários á sua fraqueza, se quem lhe deu a vida o abandona á merco d'outros, que nenhuma affciçao lhe consagrão? Certamente estamos convencidos, de que as mais carinhosas, que se inteirarem suf- icientemente dos damnos, que um tão bárbaro comportamento produzirá cm seos fi- lhos, e em si próprias, e da abjecção, cem que serão encaradas, não hesitarão um só instante á entrarem na orbita de suas obrigações mais sanetas, sempre que um moti- vo muito poderosa, c real as não dispensem. Muitas causas parecem concorrer para inspirarem ás mais o terror d'alL-iíarem os seos filhos, todas nascidas de prejuizos, e de falsas idéas, com que nutrem o cspirUo, desde que comoção á ter uso de razão. O orgulho, c a vaidade d'alaumas que reccião perder o brilho, e o verdor da mocidade, a nimia condescendência, e talvcs(como diz Tourlellcja vergonha das avós, que não querem, que seos filhos corrijao cs erros, que commettcrão contra a natureza, as pérfidas seducções das comadres, c muitas v< vs 0 insano terror, de que se apoderao alguns pais, que julgao, que os filhos vnáõ os in- commodar com seos prantos, são por certo pretextos, que poderão illud.r a inexperi- ência, e a simplicidade da juventude; mas as m.is, dignas deste nome honras», en- contrarão razões fortíssimas para dissiparem estes sustos nos conselhos dos médicos, c na historia dos povos. A Historia attesta, que, desde a mais recuada antigüidade, entre todos os povos as mais tinhão como um sagrado dever o nutrirem por si mesmas os filhos; porque a experiência sempre demonstrou, que o leite materno é o mais apropriado a consti- tuição dos meninos, emquanto seos órgãos não podem supporlar alimentos mais pe- zades. As Rainhas, e Princezas submettião-se gostosas ao cumprimento de tao doce, e saneia obrigação. Cita-se um facto, practicadopcla Bainha Branca, que manifes amenle a m°ais extremosa dedicação materna, c além di.o o apreces em que, .;i Unha essa nobre tarefa, de que somente mais ferozes se quererão desonerar. Duram, um ac Ldefebrc, que essa piedosa mãi havia sofrido, uma dama de sua real câmara , ^a mo bem um filjdeu de mamar ao príncipe (depois Lu, para aca^r -£o pranto, que vertia. Acabado o accesso, aRainha pede o seo íiiao eu, q. «toe ^va o seio que lhe apresentava, simulou desejar agradecer, a quem lhe ,a a .«to cusava o seio, que i à ^ ac[Q ]o este ofiicio, e então confessando a dama, <„- tini a tn do rrinene a Rainha olhou-a dcsdenhosauieuto, e metteuco o (.cio tZ%&**' ^ °Icitc> *» ünha sucad°'^ *"Jam" Ó° — 20 — que outra lhe disputasse o titulo de mãi. Tanto estava ella ja nesse tempo persuadida, de que o alleitamento constituía uma parte essencial da educação!! 1 Os Georgianos, que amamentâo seos filhos, conservão por longos annos toda a lou- çania da mocidade á tal ponto, queChardin em suas viagens avança, que cm nenhu- ma parte a natureza tem espalhado mais graças sobre a physionomia, do que na Geór- gia. Strabon da mesma sorte refere-nos, que não ha paiz, em que os homens tenháo um porte tão magestoso, e sejão mais robustos, e as mulheres mais encantadoras, c bellas, do que na Geórgia ; por que abi todos nutrem os seos filhas. Os Gregos tão bem nos exhibem provas, de que entre elles se adoptava este systema ; por quanto le-so nas obras deDemosthcnes, que uma mulher foi aceusada por ter-se allugado para dar de mamar á um estranho. A historia nos ensina, que os Romanos compartilharão es- te costume dos Gregos, e que virão a sua raça degenerar-se, quando amas mercenári- as receberão das mais o previlegio, que lhes deu a natureza. Entre os Chinezes uma das principiaes condições, para que uma mulher seja admittida á algum emprego mais imnortante, é, que tenhão nutrido seos filhos; por que dizem, que a mulher, que não allcita as suas crianças, se assemelha antes á uma meretriz, do que a uma senhora ho- nesta. O Imperador Marco Aurélio pensava, que a mulher devia por si mesma nutrir os seos filhos, para que se tornassem mais completas, e não imperfeitas; sendo sua opinião, que a mulher era meio mãi por dar a luz, e meio por alleitar o filho, dema- neira que elle só considerava mãi perfeita, a que reunia em seo favor estas duas con- dições. Ponhamos entretanto de parte estes exemplos tão edificantes, que nos minis- trão os antigos, e vejamos, se a razão confirma a necessidede indeclinável, em que se constitue a mulher de amamentar o seo filho, desde que vio o mundo, quando con- veniências transcendentes, de que depois fallaremos, áisso se não oppuzerem. Em verdade o leite é o alimento, que mais se coaduna ás forças digestivas do me- nino, e o mais análogo á constituição primordial do homem; por que o recém-nascido, desmunido ainda de dentes, não pôde fazer uso de qualquer substancia alimentar, que reclame o soecorro da mastigação, e mesmo os seos órgãos da digestüo, nao tendo sido exercitados, estão impossibilitados de operarem sobre matérias, que não sejão aquellas, que exijão pouco trabalho cm sua assimilhação. O leite preenche incontestavelmente todas estas condições ; por isso que é formado, e elaborado nos órgãos maternos, c desta arte adquire um caracter de homogeneidade, que seapproxima muito ao estado da economia do menino. Isto posto, cumpria agora, que examinássemos, qual seria o leite d'entre todos os mamíferos, que é mais útil; mas, como iríamos muito além do nosso propozito, se entrássemos nesta questão, que tão brilhantemente tem sido já decidida, contentar-nos-hemos com asseverar, que o da mulher; por quanto, se assim não fora, a natureza, que nada faz sem vantagem real não teria dotado o bello sexo de órgãos desti- nados à esse fim, que se desenvolvem, quando a mulher se torna capaz de conceber, c que vão de mais á mais segregando esse liquido alimentar á medida, que se avizi- nha o tempo, em que deve ser empregado. Se, porém, o leite da mulher é o mais — 51 — conveniente para a nutrição da criança, nenhum é certamente mais adequado, e mais análogo á sua constituição, e ás suas forças, do que o da própria mãi; porque o leite, preparado no seio materno, mais se parece com a nutrição, que até então recebia quando na vida intra-uterina, e tem qualidades medicamentosas, que exercem uma influencia benéfica sobre o recem-nascido, como a de ser o mais benigno, e profícuo purgativo para a expulsão domeconium, o que nunca se consegue impunemente por qualquer outro meio ; entretanto que se observa, que essa evacuação tem lugar com facilidade algumas horas depois entre aquelles, que são nutridos por sua mãi: por quanto o primeiro leite, pouco consistente, chamado colostrum, possue virtudes purgativas. Ora, sendo tão saliente a utilidade do alleitamento materno, não só para os filhos, como acabamos de mostrar, como para as mais, que igualmente se expõem á graves perigos, como por exemplo diversas affecções das mamas, que resultão do engorgita- mento produzido pelo acumulo do leite, e outras, que a experiência nos faz vér, que sofrem principalmente na idade critica, nós acereditamos sinceramente, que as Brasi- leiras não quererão demittir de si o sagrado dever, á cuja satisfação a natureza as cha- mou, e ao qual os mesmos brutos se não furtão. O nosso illustrc patrício, o Dr. F. Mello Franco, fallando do alleitamento materno, exprime-sc desta fôrma — basta para se convencer da influencia do alleitamento materno lançar-se os olhos para o que se passa no reino vegetal; por que facilmente se descobre, que a fortaleza das arvores, e a exccllencia dos fruetos dependem sempre da qualidade das águas, e da terra, que lhes ministrão nutrição; de maneira que uma planta fruetifera e excellente cm um terre- no será estéril, e sem prestimo transplantada para outro differentc. — O alleitamento afasta uma infinidade de perigos, que accarreta a suppressão da lactacão, entrelem a frescura, e a belleza, c sobre tudo dá lugar á inestimável, e do- ce satisfação, de que se saturão os corações das mais, quando perserutando suas cons- ciências se cerlificão, de que jamais lhe poderão caber as justas censuras, que todos diri-em' ao ente desnaturado, que sem forte razão torna sua condição inferior a das fcra°s Não lhe poderão por sem duvida incutir pavor os prejuízos populares, nem os trabalhos multiplicados, de que se vé cercada uma extremosa mãi; porque a aquelles será sempre sobranceira uma alma bem formada, e esclarecida, e estes serão pagos com usura por um meigo sorrir da innoccncia, que em sua eloqüente mudez exprime mais que tudo; e depois pelo amor, e gratidão, com que eternamente a considera- ria seos filhos. Estamos certos de que as nossas bellas patrícias, em cujos peitos se abrigarem sentimentos, que caracterisão um peito compassivo, e humano, nao dc«a- r o °quc, deslisando-se da sonda, que lhes prescreveu a Prov.denc.a, lhes possuo ca- be/a! amargas verdades, que a pcnna sublime de Rouss.au traçou, quando assim se rLu - a tendresse, qu il conserve pour sa propre mére est une grace, et ce le q^l a pour sa mere adoptive, est un devoir: car ou jai trouve les soin> d un ,&ere, ne dois je pas rattachemeut d'un lils? » fc 22 — Entre tanto, posto qiiL1 do que havemos dito se deprchenda, que o leite materno é o mais conveniente, podem todavia apparecer motivos mui fortes, que contraindi- quem esíe alleitamento, e então a mulher, subjeitando-se á elles, não é responsável por não nutrir o seo filho, c pelo contrario se constituirá culpada, se, dadas estas círcumstancias, que lhe inhibão o alleitamento, c a advertência d'uma pessoa, que conheça o seo alcance funesto, pcrscverar por um indiscreto amor cm alimentar o menino, compromettenio sua vida. Estas causas podem-se multiplicar considera- velmente; por que umas vezes são passageiras, outras perennes: algumas só de- verão ser rasoavelmcnto apreciadas por um medico habil, e outras pertencem ao domínio da inspecção de qualquer pessoa sensata. Nós, pois, não referiremos todas, quantas podem impossibilitar o alleitamento materno : apontaremos apenas algumas, que nos parecem attendiveis. Devem-se em geral considerar dispensados do alleita- mento as mais: 1.° Quando os seios, posto que bem desenvolvidos, não produzem, senão uma matéria lymphatica sem as qualidades do leite, e por tanto imprópria para nutrir: 2° quando o leite, bem que de boa qualidade, é com tudo assás insufliciento para a nutrição do menino; por que se apesar disto se obstinarem, compromettem a saúde de seos filhos, e ás suas mesmas cahindo em um verdadeiro marasmo: 3.° as mu- lheres cujos mamelões são mui unidos aos peitos, são incapazes de nutrir, assim co- mo aquellas, que pelo contrario os tem mui volumosos, e compostos de muito tecido cellular gorduroso, que comprimem, e obstruem os reservatórios do leite, são expostas aos engorgitamentos, e não servem para amas: 4.° as que tiverem os mamelões des- truídos por um accidente ; por que isto embaraça o alleitamento : 5.° as que se tor- não mais mui cedo, e cujo corpo não tem ainda tomado inteiro desenvolvimento: G.° as mulheres que são dotadas d'uma constituição fraca, e aquellas cujo peito é es- treito, e deprimido, ou que nascerão de pais pthysicos. Alem destes motivos, muites mencionao outros, que vedão a continuação do alleitamento, taes são o serem pessoas dispostas á hcmorrhagias pulmonares, attacadas de moléstias r.prvosas, ou d'anecções orgânicas, como epelepsias, pthysicas pulmonares, porque entendem, que nas molés- tias hereditárias um leite puro pôde prevenir sua apparição. As moléstias agudas, c a affecção denominada por Boérhaave «diabetes mamaria» impedem igualmente o alleitamento. As causas moraes podem da mesma sorte impossibilitar o alleitamento. Os meninos tomão muitas vezes com o leite o caracter, os costumes, c as inclinações d'aquellas, que os nutrem ; por tanto as mais, cujas paixões são violentas, dispostas á cólera, e á embriaguez, devem ser dispensadas. D'estas círcumstancias muitas só em- pedem temporariamente, outras são duradouras: ao medico compete fazer esta dis- criminação. Ha mesmo casos, em que, posto que pareça, que a mãi deve ser alliviada da amamentação, convém todavia» que executem o seo officio; assim osmeniuos, que nascem de mais syphiliticas, podem ser amamentados por cilas, com tanto que se- mediquem. No mesmo caso estão os que trouxerem a varíola, o scorbuto. Para sup- prirem-sc alguns d'estes inconvenientes, que apontámos como capazes de constituírem) — 23 — motivos de dispensa de alleitamento, tem-se proposto muitos meios mecânicos, dos quaes não trataremos; por que reputamos uns improficuos, e perigosos, e outros de tal alcance, que nos casos especiacs, cm que talvez se possão empregar, somente um homem d'arte conhecerá sua utilidade. Quando, porém, por qualquer das razões, que temos ponderado, ou por outras, que muitas vezes a riqueza, e o capricho fazem predominar, e que, com quanto não devessem merecer attenção, não é todavia possivel dissiparem-se, ou finalmente nos hospícios d'expostos, não seja exeqüível o alleitamento materno, cumpre enlão que se busquem amas. Ora, como nem todas essas mercenárias, que por abi andei o muitas ve- zes especulando com a vida dos innocentcs, que tem á infelicidade de se verem priva- dos dos cuidados de suas mais, satisfazem as condições, que se devem guardar na selec- ção duma boa ama, força é, que explanemos alguns requisitos, que indispensáveis se tornão, a fim de que preenchão louvavelmente sua missão. A primeira condição, á que se deve sempre altender, é, que a mulher destinada para ama tenha dado á luz quasi ao mesmo tempo, em que pario aquella, que vai substituir ; por quanto é perigoso scr- vir-sc d'uma ama, que haja alleitado já a outros, por isso que o seo leite muito consis- tente não é mais análogo á fraqueza dos órgãos digestivos do recém-nascido, que torna- se d'ordinario presa, como assegurao muitos practicos, d'affecções nervosas, c convulsi- vas, além da perturbação constante de suas funcções digestivas, conseqüência quiçá infallivel. Uma coisa, que se não deve perder de vista, é, que, sendo impossível, que uma ama alimente simultaneamente á muitos meninos, por que o seo leite não chega para todos, não é vantajoso, que se consinta, que qualquer assim proceda, incumbin- do-se d'alleitar á muitos, como accontece nas casas d'expostos. Isto tãobem faz sobre- sahir o perigo de se entregar um menino á ama para criar cm casa; por isso que cm muitos casos, compellida pela escassez de sua fortuna, ou por cálculos de sórdidos interesses, presta conjunclamente seos cuidados á vários meninos, donde resulta, que, por um sentimento natural tractando mais solicitamente do seo prorprio filho, vem este á ser mais bem nutrido ; entre tanto que os alheios definhão, e mirrão-sc pela def- ficiencia d'alimento, e tão bem de desvclos. Felizmente encarando-sc a questão por este ullimo lado, pouco teremos a lamentar no Brasil, onde este costume está exigua- mente introduzido. Uma ama deve ser sadia, dotada de constituição vigorosa: o seo semblante convém, que seja animado, e jovial. Bom é, que não seja gorda, nem magra, que possua dcnles alvos, e um hálito suave, á fim de que, abraçando-sc com cila, a criança não respire um ar infecto. As mamas serão duma grossura mediana, nem mui duras, nem mol- les Os mamellões devem ser firmes, e suflicientemente espessos, para que o meni os possa apanhar com facilidade. O seo leite possuirá as seguintes qualidades: isto é será branco, doce, ligeiramente assucarado, sem cheiro desagradável, e de tal cons.s tencia, que, deitado em pequena porção sobre a unha ligeiramente inclinada, na escorra ; devendo-se, porém, reputar como mui gorduroso, e consistente^ pcrsist no io istir — 24 -J em gotta na unha, quando bastantemente inclinada. A idade da ama é ccrtamenío tão bem um objecto, á que se cumpre attender, visto que, tanto a em demasia verde, como a avançada, não offerecem as conveniências, que se requerem ; por quanto, quando as amas se achão nesta, esíão cspostas á revoluções, que nunca se terminão tranquillamcnlc, e que influem poderosamente sobre a qualidade, e quantidade do leite, c, quando n'aqr.c!la, o corpo não tem ainda adquirido o seo completo cresci- mento, e o seo leite é exiguamente nutritivo. E' difficil, senão impossível, marcar-se exactamente a épocha, desde a qual uma mulher se constitue apta para este ministé- rio, e a, em que perde esta habilitação; por quanto isso depende de causas mui va- riáveis, como o temperamento, a constituição, e sobre tudo o clima : entretanto em geral parecc-nos, que entre nós se pôde escolher dos 18 aos 35 annos, pouco mais, ou menos. O caracter da ama deve ser sincero, e prazenteiro, será pouco irascivel, e de costumes bem morigerados; por que a observação tem demonstrado, que os meni- nos são muitas vezes assaltados por convulsões, e mesmo pela morte, suecando os seios d'amas em accesso de cólera, e que muitos vícios ignóbeis se transmiltem por esta fôrma. Estes signaes simplesmente não são na grande maioria dos casos sufficientes; por quanto as apparencias podem iüudir: urgente é, pois, que se assegure, se estão atta- cadas de moléstias venercas, de scorbuto, se são subjeitas á perdas, se padecem hyste- ria, epilepsia, cmfim se não soffrem destes males, que se podem temer como nocivos, ou contagiosos; e para este exame será necessária a intervenção de practicos experimen- tados, e de informações minuciosas de pessoas, que se não considerem suspeitas, c que as reconheção. Quanto ao regimen, que a mulher, que nutre, deve observar, mui pouco teremos á dizer; por quanto parecc-nos, que não é preciso restringir-se á um particular uma vez, que se ache revestida dos requesitos, de que falíamos. Certamente uma mulher, ou uma ama, para ser sadia, para reunir em si as prendas, que cumpre ter, não pode deixar de ter sido sóbria, moderada, e em fim ter passado uma vida commum, que é quanto basta. Tomada uma ama nestas círcumstancias, que mudança razoável se de- verá imprimir no seo regimen? Cremos, que nenhuma útil, á menos que se não pre- tenda impor-lhe uma alimentação exquisita, e libidinosa, que á nosso ver é inteira- mente condemnavcl, tanto mais quanto todo o mundo sensato sabe, que uma transi- ção súbita na maneira de viver determina sempre alteração na saúde. Pensámos com Moschion, que diz, que « é somente preciso fazel-as viver d'uma maneira, como todo o mundo vive ». São, por tanto, os alimentos, de que devem usar, os mesmos, de que se servem todos os, que prezão a sua saúde, sãos, simplices, pouco adubados, tirados dos Reines vegetal, e animal. Tão bem não nos demoraremos fazendo sentir a incon- veniência das bebidas espirituosas; por que estas, quando tomadas immoderadamcntc, são nocivas á qualquer indivíduo; e além disso no nosso paiz, quanto á bebidas alko- oiicas, e excitjntes, só teríamos à censurar o excessivo uso do café, v isto que as outras — 25 — são unicamente, d'um modo prejudicial, procuradas por pessoas, que náoprestso pa- Ta amas. Sobre estas o que podemos apenas advertir é, que cumpre, que as nossas pa- tricias se previnão contra essa infinidade d'annuncios, de que estão quotidianamente pejados os jornaes. A maior parte dessas amas offerecidas ao publico por essa fôrma são pretas, às quaes de nem-um modo se deve confiar uma criança. Dadas à embria- guez, e inçadas de vícios, logo que se lhe apresenta uma occasião, eil-as xafurdadas no lodoçal immundo, e crapuloso de sua antiga conducla, compromettendo o bem estar das crianças, e abandonando-as ao acaso, e ao desalinho. Para terminarmos o que diz respeito às amas, julgamos apropositado o recommendar-mos, que se inteirem as, que pertendcrem conduzir-se de maneira à não entenebrcccrem os dias de seo filho pró- prio, ou adoptivo, de que o exercício, c a actividade fazem uma parte importante do seo regimen ; por que a occiosidade aqui, como em quaesquer outras circumstancias, só pôde produzir males. Como acontece muitas vezes, especialmente nos hospitaes, que se não possa encon- trar um numero sufliciente d'amas, que sejão abonadas pelas qualidades, que ennume- ramos, não ha remédio, senão lançar-se mão do alleitamento artificial, c servir-se do leite d'animaes, devendo sempre ter a preferencia o de vacca; por que é dotado de pro- priedades, que o tornão superior. Muitos tem proposto criarem-se os meninos com águas panadas, gelcas etc ; mas estas substancias, como se terá inferido do que temos dito, não podem convir á fraqueza de seos órgãos digestivos; e por isso é actualmente reconhecido por todos, que na carência do leite da mulher é o melhor o dos animaes, c d'entre estes o da vacca. Como, porém, o leite da vacca apresenta muita conven- cia para o recém-nascido, aconselha-se, que se o dé durante os 15 primeiros dias d,- luido com um terço d'agua pura, a qual se irá paulatinamente diminuindo, ate qu, 9e iul-ue, que o menino possa nutrir-se com esse leite cm seo estado natural. E igual- mente um preceito, de que failão alguns authores, o aquecer-se o leite alguma cousa para avisinhal-o da temperatura do da mulher, logo que é chupado Para sanar a sem duvida grande desvantagem, que resulta da falta de sucção por meio da qual o leite se satura mais das secereções bocaes, que representão importante p cl na digestão, tem-se pretendido, que é mais uli» o tomar-se uma ca ra, cm a 2 atada de pés, e mãos, o menino poderá alimentar-se; mas nos não sabem* ate nu p to seja preferível uma tal maneira de nutrir-se a criança; por quanto prime - que ponto s.ja pi comnensar o damno, que oíferecem, principal- mente para «•""" ' h domesliroja, que seja a cabra, .Uenla .<».<. ,-. n, nôr um vaso pas d'crvas, e os f; uctos bem maduros; além disto temos no nosso bello solo a fa- rinha de araruta, e a mas:n, feita da g'»mma do aipim, de que muitos se servem sem i:»c jnvementes, e que nos parece preencherem hoilamontc o que queremos. — 27 — Educado debaixo destas regras, ousámos asseverar ás mãís, que cordialmente anhe- lão a prosperidade de seos filhos, que o menino atravessará incólume a época muitas vezes tempestuosa da 1 a dcntição, e marchará robusto por entre os perigos, aos quaes o expõem sua fraqueza, até que se passem todas as phases mais temíveis, de que se compõem a sua l.a infância. Forte, jovial, bem constituido, e no gozo d'uma saúde vigorosa, só lhe faltará um guia, que dirija seos passos vacillantes através da espinho- sa vereda d'uma existência nova, que vai abrir-se ante seos olhos. Nesta época não são já tanto osoíücios verdadeiramente maternos, que antes tão indespensaveis se o>- tentavão, como um mentor esclarecido, e prudente, o que deve velar os seos actos, e a regra de sua vida. Os exercícios moderados, e sabiamente proporcionados, o esme- ro em imprimir em sua alma pura só aquellas idéias, que eslejão á par de sua curteza de comprehensão, e outros meios, de que nos oecuparemos no Capitulo seguinte, co- roarão os nobres esforços da educação d'uma mãi, digna de tão respeitável honra, c lhe prodigalisarão a doce consolação de possuir um filho, que poderá herdar suas vir- tudes, ser o seo amparo na velhice, e que em todo o deslisar de seos dias bemdirâ o nome sagrado d'uma mai exemplar. i — 28 — PARTE m, Tout ce que hous iTavons pas ànolre naissance et dont nous avons besoin etant grands, nous est donné par 1'education. (J. J. Rousscau.) Rodeado de cuidados, e amparado pela prudência, e pela círcumspecção de prac- ticas, dictadas pela razão, e pelo amor, o menino rompe victorioso, e sadio as tem- pestuosas phases de sua primeira infância, e vê rasgar-se diante de si uma nova era, cm que, posto que mais robusto, e mais forte, será ainda certamente o joguete de tantos agentes destruidores, que continuamente o abalroaráõ, se por ventura lhe fa- lecerem os auxilios d'um guia dedicado, e amigo. Em verdade os seos órgãos achão-sc mais fortificados; e por isso esta épocha é sem duvida por este lado mais calma, e menos temível, que a primeira; masquem os dirigirá convenientemente? Quem mostrará ao menino inexperto a maneira, pela qual em seo proveito deverá servir-sc de predicados novos, que pouco a pouco virão appareccndo, e de cuja boa, ou má applicaçáo depende a sua ruina, ou a sua prosperidade? Certamente desvelos d'uma ordem mui elevada cumpre ainda, que se dispensem, a fim de que sua existência seja preservada dos perigos, que a ecreão. Com cíTeito operão-se novas elaborações, que muitas vezes affectão a sua saude, o retardão o seo crescimento; aos dentes caducos, ou aos da primeira dcntição suecedem outros mais fortes, que os tem de substituir : affecções, que mais especialmente su desenvolvem nesta quadra, o assaltão : e em fim suas faculdades intellectuaes, am- pliando-sc de mais á mais, abrem campo vasto à mil perniciosas, e fataes conseqüên- cias, se por acaso, longe de seguir o norte, que convém tomar, para que o homem se ostente o soberano da creação, se desviar para a senda da ignorância, e da per- versidade. E', por tanto, indispensável ainda, que se busquem os meios de se tornar perduravcl a obra, que se emprehcndcu, aplanando os óbices sem numero, que se opporão á marcha regular da vida do homem, se negligencia, ou estúpida vaidade su- bstituírem a diligencia, e o cuidado, que até aqui presidirão os seos dias. Nos primeiros annos da vida se em pregão para ambos os sexos os mesmos vestuá- rios; mas, quando se approxima a épocha, em que se cosluma enviar os meninos para os collegios, a qual entre nós principalmente, onde muitas vezes se observa um crescimento precoce, é susceptível de muitas variações, porém, que em geral co- meça dos 7 annos mais, ou menos, adopla-se a practica de mudar-se o trajar commum, procurando-se dar â cada um o, que distingue o seo sexo. Entendendo nós, que nesta transição devem-se guardar os mesmos preceitos, muilo pouco teremos á acerescentar ao, que em outro lugar dissemos á este respeito: por tanto limiltar-nos-hemos a fa- — 20 — zer sentir, que julgamos muito prejudicial o procedimento d'alguns pais, que, sacrifi- cando a conveniência á moda, trazem seos filhos constrangidos com roupas aportadas, que embargão o crescimento de seos corpos, c imprimem-lhes configurações viciosas, donde quasi sempre resullão graves inales para a saúde, e andamento regular d'uma machina ainda tenra, que facilmente se desarranja. Toda essa multiplicidade de peças, todos esses meios, de que geralmente se serve para comporem-se as crianças, são á nosso pensar inúteis, e nocivos, por que não só não se conformão com as nos- sas condições climatericas, c topographicas, que cumpre sejão sempre guardadas, como tão bem diflicultão movimentos, que se devem obviar, e comprimem órgãos importantes, que, não funecionando livremente, ou retardão, ou muitas vezes des- troem o equilíbrio, c a harmonia do jogo normal das diversas funcções, ouc consti- tuem o estado de saúde. Assim, pois, convém, que os nossos pais de famílias se con- venção da necessidade de se comportarem com toda a circumspccrão, afim de não aclimatarem costumes, c modas, que não se casão com a fragilidade da constituição dos meninos, e menos com a climatologia do nosso paiz. Desta maneira evitarão, que clles adquirão moléstias, e o funesto habito de depois não poderem cüsp.er.sar cer- tos objectos do seo toucador, que nem um prestimo tem, e depois acereditem, que os ar- tifícios, que o luxo, e a especulação inventão para satisfazerem seos loucos caprichos, c mesquinhos interesses, nâo podem de maneira alguma entrarem concurso com a graça, c a affabilidade, com que a natureza dulou os habitantes do Brasil. Uma prova desta ver- dade tomos nós evidente, e palpável entre as nossas camponezas, c provincianas, cujos allraclivos naturaes, cujo vigor não são envenenados pelo bafo impuro das modas, e de vaidosos, e insensatos prazeres. A mesma prudência deve presidir a escolha das matérias das vestimentas, de que S;- servirão os meninos. Os vestidos compostos de matérias conduetoras do calorico, fies como o linho, a seda, proporcionar, lo-sc a sua qualidade, e espessura á tem- peratura da estação, poderão ser usados pelas classes abastadas, e o nosso algodão mesmo tecido entre nós tão delicadamente, como cm algumas províncias, substituíra os outros pannos, que pelo preço, e escassez não chegão para a parle mcno5iavr.ro- cida da nossa população. Os vestuários quentes, c pesados não convém nem a mlancm, nem á juventude ; por que augn^lão a transpirarão, c tornão sensível a mais ogcira mudança na tem o, .atura. Os hábitos muito leves deisão o corpo exposto a todas as va- riações*atmosphcricas. E\ pois, preci*> evitarem-se os dous extremos, pref,r.nlo-se o tVer-sc o menino accompanhar a marcha das estações; por que assim serão ma:, sa- dios c robustos, e escaparão á muilas enfermidades, como as aííVcões cataarraes a conu duche etc. Conhece-se a dim-rença, obsemda por IleroJoto entre os crancos oo freios c dos Persas. Os Egypcios tinhao oscraueos c os ossos m:us duros, e n..u com^' t i,: por que não costumarão trazer as cabeças cobertas, e cxpu:ono-se a Io:!,. variar.-;,, do tempo desde a infância; entre tanto que os IV;sas, cr» u0 luxo', com os soo. ricos turbantes, não aprerentavão a mesma t Persas, criados na umilv-za, < xtura, e co.npi.il; 30 —i lidade em seos ossos. O habito se enraiza tanto em nós, c depois exerce uma in- fluencia tão notável, que fôrma, como se diz, uma segunda natureza; como, pois, poderemos esperar, que, educados luxuriosamcnte, os meninos triumpharão depois de tantas contrariedades, que erição a estrada da vida? E' pela poderosa interven- ção do habito, que o rei Massinissa, segundo Mr. Montaigne, conseguio chegar á extrema velhice, trazendo a cabeça descoberta, e que César marchava a pé á frente de sua armada com a cabeça núa, qualquer que fosse o tempo, e Annibal fazia o mesmo, como inferimos de Sil. Ital. m. 250 « Tum vértice nuda, excipere insanos imbres - ccelique ruinam.» Quanto aos alimentos, de que devem usar os meninos, desde que víngão o primeiro periodo de sua existência até chegarem a idade, em que a sua razão já os esclareça á cerca dos perigos, a que os exporá a sua leviandade, bastar-nos-hia referir-nos aos conse- lhos, exarados em outra parte deste nosso trabalho: todavia sempre diremos, que ainda nesta épocha a sua nutrição deve ser módica, e razoavelmente dirigida; por que assim não só se tolhe aapparição de muitas moléstias, que podem sohrevir, ten- do-se um comportamento diverso, como se reprime um vicio, muito comesinho entre os adolescentes, aglutoneria, que quasi sempre se conserva com grave comprometlr mento da saúde até a velhice. São mui triviaes, e sabidos os dictames, que convém seguir-se, para que nós nos estendamos mais sobre este assumpto, reservando algu- mas considerações, que poderião ter aqui applicaçáo, para quando em outro lugar tractarmos das paixões, que se devem reprimir, e combater desde esta quadra, á fim de que não produzâo os immensos males, de que continuamente são victimas, os que por ellas se deixão apoderar. Em todas as idades a alimentação simples, e frugal é maisconsentanca com a conservação da saúde; e agora, posto que já se possa lan- çar mão de substancias animaes, e vegetaes, é com tudo necessário toda a modera- ção c parcimônia. Devem-se fugir os alimentos excitantes, c uma grande quantia de nutrição, que, tomada d'uma só vez, possa sobrecarregar o estômago desmesurada- menle. Entre nós o uso do café, e do chá está demasiadamente introduzido, e quasi que em toda a parte constitue o almoço, e a ceia : e, se estas bebidas, tomadas parca- mente não podem determinar consideráveis males, o seo abuso não deixa de ser noci- vo. Nisto concordão todos os hygienistas, fundados na excitação, que causão ao syste- ma nervoso; c a experiência igualmente nos mostra, que os indivíduos, que se entre- gao excessivamente ao uso destas bebidas, soffrem demasiada exaltação nas suas fa- culdades intcllectuaes, e tornão-se susceptíveis de se assustarem por qualquer cousa, e mesmo trêmulos. Mello Franco refere ter observado uma família, que, sendo desco- medida no uso do café, ficara toda, sem excepção d'um membro, nervosa, c tremula das mãos; e que algumas pessoas d'esta casa, que attenderão as suas advertências mo- derando-se, conseguirão ficar livres destes incommodos. Por aqui vé-se, quanto ó vantajoso, que se prohiba o emprego abusivo d'estas bebidas, que entre nós com especialidade em alguns lugares se vai fazendo. — 31 — Tão bem merece accurada atlenção o aceio, que cumpre seja observado, não só cm todas as partes do corpo, como mui particularmente nos dentes; por que tudo isto coo- pera sensivelmente para a saúde, e belleza dos meninos. A limpeza do corpo, conser- vando abertos os poros do corpo, que facilitão a transpiração, e outras excreções, com que o organismo se depura dos princípios inúteis à economia, o cuidado dos cabellos, tolhendo a invasão dos piolhos, e de certas erupções, que são inseparáveis do desali- nho, entretem sem duvida a alegria, e a joYÍalidade dos meninos, c os libertão de muitas moléstias, e fiagclos, que tanto os perseguem, c os definhão. Estes cuidados deverão ser principalmente dispensados com maior esmero, e vigilância nos estabele- cimentos públicos, e nos collegios, onde se educão meninos; por quanto é indubita- velmente ncllcs, que o seo desprezo accarretará infallivelmcnte graves inconvenientes. Se os seos directores ou impregados se esquecerem destes desvelos, ou se os dei- xarem ao arbítrio dos educandos, a conseqüência muito provável, senão necessária, será o viverem envoltos cm immundo desalinho, c irem-se depois definhando, e per- dendo as cores, como infelizmente temos observado algumas vezes cm muitos lugares, onde esses miserandos se apresentão para demonstrarem a razão, que nos assiste, quan- do contra isto erguemos nossas fracas vozes. Com pequeno trabalho, e alguma solicitude se consegue sanar, ou pelo menos minorar, os terríveis incommodos, que oceasionarão os dentes, se nao forem velados desde a nossa infância ; por que não são simplesmente as dores terebrantes, que supportamos, quando os deixamos cariar, nem o hálito mcphi- tico, e intolerável, com que atordoamos os que se nos approximão, o que nos deve le- var á tractal-os cautelosamente, é tão bem o importante papel, que representão na mastigação, e as perturbações, que a sua falta produz na digestão, que ostormio dig- nos dos nossos constantes disvelos. Além disso, quem poderá negar, que com especia- lidade no sexo amável os dentes concorrem consideravelmente para o remate da bel- leza d'um rosto: não ha abi moça, que não deseje possuir um lindo fio de alvas, e luzidías pérolas. Para conscrval-os, pois, é preciso, que se procure dar-lhes na épocha da segunda dentição uma conveniente direcção, à fim de que uns não se acavalguem sobre os outros, para o que muito importa tãobem, que não se deixe ficar algum dos da 1." quando abalado; c evitar muitas causas, que os podem corromper, como por exemplo o deposito de matérias alimentares por muito tempo, o contado dos ácidos, c alkalis concentrados; c por isto devem se limpar todos os dias, depois da ingestão dos alimentos, servindo-se para este fim d'agua pura, ou d'alguma outra composição, que se conheça não ser nociva, c d'uma escova macia, que será levada por todos os la- dos, e direcções, se por ventura já não estiverem completamente sãos. Se estiverem profundamente cariados serão arrancados para não estragarem as gengivas, c não se communicar a podridão aos outros, e se pouco chumbados, ou limados. Não nos pare- ce útil o emprego desses pós dentreficios, que tanto se usâo, e que só servem para gastar o esmalte, c assim desprotegidos exporem mais facilmente os dentes á causas detóerias. Sao estes em geral cs preceitos principaes, que se podem guardar, a íim — 32 — de que os dentes S3 conservem illesos: muitos outros poderíamos ainda accrcsccníar, os quaes por sabidos omittimos. Se nos primeiros annos de sua vida, não se deve senão cuidadosa, c discretamente consentir, que os meninos se exponhao á todas as vicissitudes atmosphcricas, e se então os banhos frios não crão favoráveis; por que a debilidade do seo organismo não poderia supportar as mudanças súbitas, que experimentarião, quando submetii- dos á sua acção; agora que a constituição se acha mais robusta, e os seos órgãos mais fortes, convem, que se exponhao ao ar, que gozem da salutar rcacção, que sobrevem depois d'um La-nho frio, tanto mais quanto estas provações não lhes serão de fôrma alguma iusupportavcis; por quanto serão, como cm outra parte dissemos, pouco á pou- co, cá proporção que forem adquirindo mais energia, habituados áestasmudanças. Náoé possível, que se enriqueça um estado de homens bem constituidos, e sadios adoptan- do-se o costume de se educarem os meninos clausurados em casa, e privados da frui- * ç":o d'um ar livre, e do exercício, que tão essencialmente coopera para a saúde sua. Os indivíduos, que, desde o seo nascimento, se vêem rodeados de imprudentes dis- velos, com que muitas ve/cs a inexperiência, ou o amf.r mal entendido dos pais lhes cohibem o darem a necessária expansão á inclinação natural para os passeios, e para outros entretenimentos, que agradão ás crianças, serão sempre homens imcompletos, próprios para viverem uma vida d'um cunuco d'algum Harem da Turquia, e incapa- _zcs de encararem ascontrariedades do mundo, ás quaes sem difíiculdadc suecumbirão. l-y por isso que desejávamos, que o.; nossos patrícios não recebessem tão molle edu- cação, c que se f.uniliarisassem, quanto possível fosse, com as freqüentes intempéries das estações, que não são senão o transumpto das vellcidadcs deste mundo, para as quaes será bom que estejão preparados até mesmo os que virem a luz do dia entre os magníficos e ephcmeros baíejos da fortuna ; por que á qualquer hora podem ver-se re- duzidos á triste c indeclinável necessidade de arrostrarem as provações da pobresa, ou da ad,c; ;:aade. Os nossos provincianos nesta parte são mais aquinhoados, do que os habitantes do Rio de Janeiro ; por que soltos, e cm liberdade, desfruetao todos os prazeres, que a sua condição lhes espalha, exercitão-se, brineno pelos rclvosos campos, e nos pequenos regatos, nos ribeiros, e nas espumantes cascatas por si mesmos, ou ajudados per seos companheiros, se amestrão na natação, a qual algumas vezes de- pois salva a sua vida, que uma fatalidade ia arrancar-lhes. Aqui a existência do me- nino passa-se muito mais penosamente, e isto sem remédio; porque ou hão de estar emparedados dentro da casa paterna, ou em um collegio, oule não se lbcs propor- ciona meios de se recrearem, como devem; ou então viverão, entregues á sua dis- crição, eu á dY.m pedagogo, ou pagem por estas ruas, ora imundas, ora cobertas de pó, atravessando praças vasias, que, cm outros paizes, emhidiezadas pela plantação d'ar- vores, que com suas copadas sembras ofFercceiião uma perspectiva encantadora, eum amparo ao calar do scl, scriao um meio de salulridadc, e de passatempo innocente, e que entre nós e.-lão muitas vezes cheias de imnnmdicias, ou alclilicadas de aréa — 33 — solta, e de resquícios de folhas scccas, que voão á mercê dos ventos, e sómcnle ser- vem para accarretar males, e nunca despertar a quem passeia d'essa apathia, que busca distrahir. Já cm um sábio discurso, pronunciado pelo nosso delineio mestre, o Ii!.mo Sr. Dr. Paula Cândido na sessão publica da A. I. de ?J cm 1838, com a força de raciocínio, que todos lhe conhecemos, c com luminosos argumentos demonstrando a causa, á que se devia attribuir certas epidemias, que grassavão no Rio de Jar.eiro, o iiiustre pro- fessor da escola de medicina apresentou muitas, c importantíssimas medidas, que lhe parecerão urgentes a fim do que se conjurassem os perigos, á que ficarir.o suhjeitos seos habitantes, so continuassem por mais tempo tantos gcrmensdo males, imlretánlo des-^ graçademente seos philanlropicos esforços não fora o coroados de successo ; por que em fim no Brasil só se põe cm execução qualquer medida de salubridade publica, quando bate á porta o inimigo. Desejáramos transcrever muitos cxcelleníes lrecl:os do seo esti- mavel trabalho, que Intimamente se cntrclação com o nosso objecto : todavia, como longe deixaríamos o nosso propósito, se o fizéssemos, limitar-nos-aemos á exarar a seguinte, que robustece, o que, ha pouco avançámos. Eallando da plantação d'arvo- redos, que abriguem O viajante dos raios do Sol, c lhes ollcrcçno um ar oxjgenado, c vivificador, como o mais efficaz meio contra a intensa acção solar, assim se exprimio o Iil.mo Sr. Dr. Paula Cândido — «... permilta-se-nos aqui d.erramar uma lagrima de compaixão por alguns míseros alleljados do reino vegetal, destacados no Campo de San- ta Anna. E' para iaslimar, que no paiz dos gigantes vegetaes se recruícm allcijados pygmeos! 1 Mas elles lá ctão, cada um mudo, c quedo, atilando o desleixo de quem os plantou. » — Não se oá.Ie !W)r lauto par cm dm.ida a cenveuh ucía de melhorar á este respeito a sorte da população do Rio da Janeiro, que, acompanhando em tudo o progresso das na- ções civilisadas, ainda está n'este ponto tão mal dotada, que não pôde deixar de atira- hir o reparo do estrangeiro, que aportar em suas hospitaleiras praias; porque cm fim o numero de seos habitantes, a sua íopographia, c o seo clima exigem imperiosamente, que se cura mais aííincadamoute das medidas de salubridade publica, cuja falta á ca Ia passo deparamos. Os parcos, onde a mocidade p.osra achar ref/igerio as fadigas de seos trabalhos, c ao rigor das estações, a limpeza das ruas, a sua boa com.lrucçã», c a creajão d'a!mns estabelecimentos publico.;, que preenchao cerlas lacunas, que se r.otão na nossa educação physica, c outras tantas coisas, que melhores penas tem lembrado sem cxiío, são objecl >s, de (pie não devemos ficar por muito tempo privados sem grave damno Os antigos attenderão sempre muito disvelaJamentc para as causas da sate- bribade de suas cidades; c com eimilo assim devera ser, por que dVIla depende a in- felicidade d-urn povo. Os Ass;. rios, os lúcios, os Gregos, c os Romanos de.xirao muitas provas, do que acabamos de dizer, c que a historia commemora, como teste- munha da sabedoria dVssas nações. Strabon, defendo Ilhote,, refere, que no seo interior não se via uma pequena casj ao lado dhnua grande ; por que ....as era-, a igiul -- 04 -- altura, eoflcrccião a mesma ordem d'architectura, de maneira que toda a cidade pn- ecia um vasto edifício. Ruas largas, bem calçadas, e alinhadas a atravessão cm toda sua extensão. Passeios, e vastos pórticos servião de ponto de reunião aos ha- bitantes das grandes cidades. Na Itália ainda se encontrao em algumas praças, «loggie » ou perystilos cobertos, debaixo dos quaes se pôde refugiar em tempo de chu- va, e onde se acha sombra, e frescura no estio, e um abrigo exposto ao sol no inverno. A elegante « loggie » em Florcnça na praça do Palácio velho é um exemplo das outras, que se notão em algumas cidades da Itália. Em França, em Inglaterra, c n'outros estados da Europa os governos se tem compenetrado desta necessidade; c assim Paris, Londres, e outras cidades possuem já muitos passeios, e jardins publico», para onde o povo sequioso por desabafar-se das lidas, e por divertir-se afíluc em pro- digioso nu n cr o. Todos reralmcnte reconhecem as vantagens, que traz ao corpo o exercício, regu- larmente feito ; e ninguem pôde duvidar por conseqüência, quanto influiria sobre o vi- gor, e robustez dos meninos a creação d'um gymnasio, onde a mocidade fosse entre- gar-se á diversos gêneros de exercícios. A acção da gymnaslica n'um apparelho, o Io- comotor por exemplo, é fortificar, e desenvolver os músculos, tornal-os mais dóceis ao império da vontade, dar ás suas contracções maior energia, e habituar alguns d'cnlre elles à exercitar mais precisamente certos movimentos: assim, pois, ella estabelece uma efrecie de educação no svstema locomolriz, a qual, unida à sua natural forta- leza, o deve fazer alquirir em seos movimentos uma precisão, e uma regularidade, que a natureza não lhe tinha dado. E" por tanto para lamentar, que uma arte tão pro- veitosa, c que tantos beneficios pôde espargir, esteja totalmente desprezada entre nós. Em nem-um estabelecimento publico de educação, cm nem-um collcgio se procura tornar a mocidade, que nellcs aprende, participante de sua utilidade; nem mesmo no collcgio de Pedro 2 °, conforme nos consta, se dá importância, que merecem, ao» exercícios gymnasticos; embora Iodos os dias estejamos vendo, que os habitantes das íoças, que se lanção francamente á vida activa, superão aos da cidade em força, e agi- lidade: por que se entre clles falta um gymnasio bem organisado, ha com tudo um campo vasto, e muitos serviços, com que adexírão seos corpos, e que supprem o, que nas cidades é indispensável. Os poves antigos tão convencidos estavão da utilidade dos exercícios para o desen- volvimento do corpo, que mandavão construir edifícios públicos, onde os jovens»» adexíravão na presença dos velhos, que decernião prêmios, e coroas aos vencedores, que cr. o então por este facto respeitados por todas as cidades visinhas. D'csta manci- la estes homens com delicadeza, e vantagem servião-se do instineto, que arrastra a mocidade aos prazeres, e actividade para consíiíuil-os capazes de preencherem um dia os devores de eidadões, para fortalecerem seos corpos, e para germinarem cm seos cora- ções uma nobre emulação, e preparal-os á supportarem as fadigas da guerra, na qual ncfsas eras consistia toda a ambição de seos corações. Os exercícios do Campo do — 35 — Marte desenvolverão uma infinidade de talentos, e virtudes entre os Romanos; ptír elles se tornarão por muito tempo temíveis aos seos inimigos, e se cobrirão de gloria immorlal. E' essencial habituarem-se os meninos á uma vida activa, e dura, e para isto muito oonccorre a gymnastica, cujos innumcraveis benefícios a historia altamente proclama, «itando muitos exemplos de homens, que por sua intervenção conseguirão, ou corri- gir os vicios de sua organisação, ou em fim aproveitar beneficamente de sua natural predisposição. Herodico, dotado d'uma constituição fraca alcançou por meio da gym- nastica chegará uma grande longevidade, gozando de saúde, evendo-se mesmo cura- do de pthysíca, segundo Plutarco. Agcsiláo, sendo mui débil, c coxo nos primeiro» annos de sua existência, perdeo todos os seos defeitos pelos exercícios gymnaslicos, « tornou-se um dos mais valorosos guerreiros de seo tempo. Dcmosthcncs, o grande orador, deveu tão bem a sua vida à gymnastica ; por que tinha nascido demasiada- mente adoentado. Estes exercícios, que occupao todo o tempo da recreação dos meninos, tem igual- mente uma utilidade de não pequena monta, c é, que, faligando-os, osobrigão á bus- oar um somno reparador, e á se distrahirem de funestas inclinações, e de vícios hedi- ondos, que ordinariamente segarão, e se arraigão nos momentos da occiosidade. Nao é de menor importância o regular-se o tempo, em que os meninos devem-sc entregar aos exercícios, e pôl-os em relação com sua força, ou fraqueza. Os exercícios violen- tos e muito prolongados não convém ás pessoas fracas, e as mesmas robustas podem ser'incommodadas, logo que excedão os limites da moderação. Ha um grande numero de exercícios, que se podem dar aos jovens, proporcionando-os á delicadeza, ou energia de sua constituição. Assim a marcha, o salto, a dansa, a carreira, a natação, a esgri- ma c os diversos jogos, em que se executão movimentos do corpo, e braço, como a malha, a bolla, podem ser empregados com vantagem. A eqnitação, e a lula entrao igualmente no numero dos exercícios, que se podem practicar. A preferencia, que se d°eve dar á este, ou á aquelle exercício, depende de certas circumstanc.as opecaes da pessoa, que o tem de fazer, e doutras causas, que somente serão ^^^ das pelo director, ou indivíduo, encarregado deste mister, como entre o, Cr. gos u.0a- Z certos empregados dos seos gymnasios, que se chamarão gymnastas. Do que t mo. ponder do *-concluo manifestamente, que é sobremodo interessante a erecçao d um Z emento desta ordem, no qual alémdisto se poderia tão bem organ,ar uma casa de banhos tanto salgados, comodoces, cuja deficiência c geralmente sentida por q; t mo L de dentro da cidade estão'privados dos salutares eme.tos dos banhos, que u n-n r-as oarticulares, onde nunca se reúnem as condições pre. .^ f, -S^r^r-s—..n—-».-............ — 3G — cera, em que se imprime a fôrma, que se lhe quer dàr, e que conserva por muito tem- po, e muitas vezes para sempre; por quanto nesta idade os seos órgãos tem tanta fle- xibilidade, que as impressões, que recebem, produzem sensações vivas, profundar, c duradouras, é summamenío necessário, que se applique lodo o esmero, a fim de que paixões desenfreadas, e vícios abomináveis não venhão abortar cs germens, que uma educação se.1 iamente cuidada começa á desenvolver nos espíritos dos jovens; por isso que se os deixarmos entregues á sua natural leviandade, se não accostumannos sua attenção á fixar-se sobre objectos úteis, a imaginação a moderar seo fogo, e seos deva- neios, cm uma paio/, ra, senão refrearmos as paixões, e não fecharmos as portas ao vicio, só teremos cm resullado inconstancias, i "reflexões, amor de prazeres grosseiros, e dc- pravação do coração, c ainda mesmo, que uma feliz inclinação luetc contra tão cul- pavel negligencia, não sahirá por certo triumphante de tão renhido, e perigoso comba- te. Conscguintemcnte cumpre, que uma sabia educação desenvolva as faculdades in- tellectuacs, e moraes, dirija as afiecções da alma, c afíaslc a mocidade dos exemplos pe- rigosos, e máximas obnoxias; por que só assim conseguiremos levar ao desejado ter- mo intacta, ou ao menos pouco polluida a vida dos meninos, que, debaixo destes dic- tames, viráõ á ser orgulho de seos pais, e anchora da pátria. Desta sorte se aprovei- tará, cm beneficio da humanidade, a reciproca inffucncia, que exerce a educação so- bre os costumes, e estes sobre aquclla, c se preservará a nossa mocidade do hálito con- tagioso do vicio. Os homens são, não só cercados de perigos, durante todo o decurso de sua vida, como declinados á serem presas das paixões da alma, que os podem tornar felizes, ou desventuramos, bons cidadões, ou membros inúteis da sociedade. As paixões brotão na infância, c juventude, e deitão tão profundas raízes, que cm balde se tentaria arranca!-as cm uma época mais avançada: urge, pois, que as pessoas, encarregadas da educação dos meninos, e dos moços, assim cm estabelecimentos públicos, como parti- cvdares, invidem todos os e .forros, para evitarem o desabroxamento de paixões, que puderem dcsJourar a iníeliigcncia, c offuscar a razão, c para desenvolverem em sua alma os sentimentos, que ennuhrccem o coração humano. O | aladar é entre os meninos d'uma extrema sensibilidade, c por isso ordinaria- mente a elutoneria é a partilha da infância c muitas vezes mesmo da idade mais avan- çada, se esta paixão não tem sido cm tempo combatida Ora, sendo tão óbvios os ma- les, (pus cila pó de determinar, concebc-se quanto convém, que se procure dcstruil-a cpportunamentc. Quando se entrega á glutoneria, o estômago mio executa facilmen- te suas funcções; e d'aqui rcsultão affecçõcs, que muitas vezes perturbão, ou arrui- r.ão completamente a economia. Muitos auíhorcs a considerão, como causa da mor- talidade de muitas crianças, e além disto é terrível pela perniciosa influencia, que exerce sobre os que a eonservão até a velhice. E' a fonte da intemperança, c do deboche, amesquinha as faculdades intcllectuacs d'aquel!es que a solírem, tornando- os incapazes de engenhosas concepções, e unicamente sem-i\cis á jrespectiva d'um — 37 — manjar, que llsonjeie o seo appctitc, parecendo como mui bem disse Broilzet, que a sua alma está toda inteira no estômago. Os meninos são ainda susceptíveis de zelo, e de inveja, e, quando são assaltados por estes funestos sentimentos, a sua saúde se ressente tanto, que cm breve se apre- sentão magros, e descarnados. Ora, quando não se pôde altribuir esta mudança, es- te marasmo á outra causa, é de suppôr-se, que seja devido á alguma destas paixões, que sao tanto mais perigosas, quanto a experiência nos ensina, que os, que são por ci- las apossados, costumão dessimulal-as: é por tanto conveniente, que, loco que se aceredile na sua existência, se busque fazer cessar os motivos, que as estimulão. E' um procedimento deshumano, c insensato o dos paes, que costumão traclar com dc- ferencia á uns, e mostrarem-se indiffcrentes á outros filhos. Mesmo nos collcgios, e estabelecimentos pubiicos os instituidores devem ser mui cautelosos á este respeito; por isso que, ainda que a applicação, e os talentos d'alguns educandos os facão dignos de estima, não ha necessidade alguma de levar-se essa predilecção á ponto de desgos- tar aos outros. A conseqüência maiscommum deste procedimento é o tornarem-se os meninos tímidos, indecisos incapazes dobrarem por si mesmos, e desgraçados por to- da a sua vida. Não tem menos império sobre os meninos o temor, e o medo, que os podem infe- licitar; mas desgraçadamente poucas pessoas dão importância aos resultados desastro- sos, que ordinariamente espalha», e nem lhes attribucm a imbecilidade, c estupidez, que inutilisão absolutamente um indivíduo, que se reduz á tão deplorável estado por descuido. Todos os dias observamos este brutal systema de conseguirem das crianças certas coisas por intervenção do pavor, contando-se historias de phantasmas, doendes, e encantamentos, que se implantão fortemente na imaginação curiosa dos meninos e os constituem pusilânimes, e supersticiosos, e supplantão a energia de sua alma; d'aqui resulta, que será mui proveitoso, que se proscreva esta vergonhosa partilha da ignorância, que ainda existe entre nós em grande escala. ' A cólera, funesta, e indigna paixão, que torna o homem mais degradante, que os animaes, e cujas terríveis conseqüências mais se podem receiar na idade adulta, e neu- tros períodos da vida, depende quasi sempre da pressa, com que se satisfazem todos os caprichos, e fantasias dos meninos; a prudência, c alguma resistência á suas desarrazoa- das pretenções bastão muitas vezes para suflbear esta paixão. A ira pódc determinar, além da vergonha, e do arrependimento, que acompanhão depois os actos, que nesse estado se praÜcão, a morte, dando lugar àhemorrhagias, áphlegmazias intensas, á apo- plexia e á convulsões. Tourtelie, pai, vio morrer duas mulheres, uma com convulsões no fim de C horas, e outra de suffocaçao no espaço d'um dia por se haverem entregado á transportes furiosos. . Todas estas paixões devem ser vigorosamente combalidas, á fim de que nao deixem sobre o moral, e o physico do homem impressões indestrucliveis A ^temperança murcha as graças da mocidade, e imprime no corpo os signaes da decrep.tuue. O ho- — 38 — mem dissoluto é magro, secco, e se assimelha mais á um spectro, do que á um homem vivo; além disso ella é a porta de muitos outros vícios degradantes, à cujos laços nào podem escapar os homens desregrados. O zelo occasiona um espasmo geral, diminue a activídade de todas as funcções, e dá origem á dissimulação, e á inveja, esta sombria rival do mérito, que não procura senão rebaixar as virtudes d'outrem. O medo deter- mina uma contracção geral das forças no epigastrio, perturba todas as funcções, e quasi sempre motiva graves desordens; os cabellos seerição, e ha impossibilidade até de articular. « Obstupui, otetcruntque coma;, et vox faucibus haesit. » Não menos perigosos são os accessos de cólera, por trazerem sempre os damnos, que se seguem ao embaraço da respiração, e á concentração do sangue, e à um abalo geral em toda a economia. «Ora tumentque, tremuntque, nigrescunt sanguine vena?, Lumina gorgonea ssevius angue micant. » (Ovid.) Do que acabamos de expor fica fora de duvida, quão assíduos devem ser os disve- los dos educadores, ou pedagogos em arredarem as causas, que fazem germinar nos meninos estas paixões, que para adiante terão de os reduzir á mais miserável con- dição ; e serão o manancial de inquietações, e de trabalhos, e ruina de sua saúde, e sobre tudo a entrada de todos os vícios, à cuja furiosa torrente nada poderá oppôr diques. Por este meio conseguiremos tão bem escudar o coração dos moços contra os eiva- dos farpões d'um dos mais horríveis, e abomináveis vicios, que podem corromper a candidez do seo peito, e sobre o qual se deve vigiar com olhos d'argos; por que infe- lizmente o seo sopro contagioso raras vezes deixa de empeçonhar a alma dos meninos, logo que vão tocando á certa idade. A mysantropia, e o isolamento, c mesmo um certo estado de desconfiança, que inspino nos jovens as paixões, de que acima fal- íamos, são incentivos mui próprios para despertar este vicio hediondo, infame, e fata- lissimo, a mansturhação; entre tanto que a amizade, e a confiança, que se ganha pelo comportamento opposto, fazem com que se possão insinuar no seo animo senti- mentos nobres, e elevados, que servem de barreira, que se oppõe ao nascimento d este horrível habito. Os perniciosos effeitos da mansturhação são assás conhecidos, e tem sido brilhantemente proclamados por immensosescriptores : assim bastar-nos- ha dizer que além da profunda perturbação, que imprime em toda a economia, e cu- ja conseqüência é a morte mais miseranda, se por ventura não se tracta immcdiata- mente de o reprimir, a mansturbaç m destroe todas as esperanças dum porvir ditoso para aquelle, que tem a desgraça de thuriferar este immundo idolo; porque reduz-se á mais completa estupidez, e ao idiotismo, e incapacidade de se dedicar com êxito á qualquer profissão, que exija a mais superficial meditação; por tjuanto estanca-se, e embota-se todo o vigor das faculdades intellectuaes. Os indivíduos, que tem a infeli- cidade de se lançarem a tão torpe vicio, vem em pouco tempo á apresentar-se entre os seos simelhantes, como o opprobrio de sua espécie, visto que, tanto que se multi- plica por algum tempo a perpetração de tão grave attentado contra sua própria vida, — 39 — trazem em seo semblante, em todo o seo corpo, e tão bem em sua intelligencia es- tampado o ígnomínioso ferrete, que à todos denuncia a sua lastimável paixão. Assim a magreza, o marasmo, a pallidez, o encovamento dos olhos, a timidez, a melancolia» o gosto excessivo de viver isolado, a imbecilidade, a inaptidão para qualquer acto, que reclame alguma concentração de espirito, e depois a perda completa de appetite, e muitos outros incommodos, que lhe vão paulatinamente minando a existência, for- mão o fúnebre cortejo, que acompanha sempre tão deplorável estado. A' vista disto resalta a necessidade, em que se achão collocados todos os pais de familia, e pedago- gos de attenderem muito circunspectamente para os meninos, logo que suspeitarem, que se lanção aos prazeres solitários, evitando por todos os meios possíveis, que o mal tome incremento. Os exercícios activos, que ponhão em jogo todos os músculos do corpo, como a lucta, a natação, a esgrima, em fim todos os exercidos gymnasticos são outros tantos expedientes, de que se pôde com vantagem servir. Nao se deve ja- mais consentir , que fiquem isolados, e que oecupem o espirito com idéias voluptuo- sas, que lhes sirvão de incentivo, que durmão á sós em leito separado, ou em lugar retirado. A sua nutrição deverá consistir em alimentos temperantes, e pouco nutriti- vos, evitando-se os excitantes, e substanciaes. Se, porém, depois de se ter recorrido a todos os expedientes, observarmos, que se não ha obtido o, que se pretende, então será o caso de, como aconselha Rousseau, dirigir-se ao menino, e, exprobrando-se a fealdade do seo delicto, e pintando-se com suas verdadeiras cores o negro quadro de suas loucuras, Ular-se-lhe ao seo coração, epor meio da persuasão fazer-sc-lhe sentir os perigos, que o ameação; e, quando se mallogrem todas estas tentativas, dever-se- ha por ullimo reccorrer-sc ao rigor. Accreditamos, que por esta fôrma se conseguirá subtrahir a victima das garras do seo desapiedado algoz; e por isso não pensámos com alguns, que, suppoem este mal irreparável, e somente depositão confiança no casamento. Se assim fosse muito mais desgraçada seria a condição destes infelizes; por que muitas vezes o vicio apparecendo em uma idade mui tenra, ou em indiví- duos de constituição mui dcbil, resultaria que, quando chegassem ao tempo oppurtu- nopara o enlace, já eílc teria feito os seos estragos; aceresce ainda que nem todos estão em circunstancias de tomarem este estado, e que mesmo não se consorcia com os princípios de justiça o querer-se curar um mal com outro maior, qual o, que se causaria ao ente desditoso, que se ligasse á um outro incapaz de satisfazer os deveres conjugaes; por que se chegaria a este extremo alvedrio, depois de burlados os outros meios, quando apenas o indivíduo conserva de homem a fôrma, e essa mesma extraor- dinariamente desfigurada. Quem reflecte mais calma, e desapaixonadamente sobre algumas inclinações natu- raes e irresistíveis, que nos compellcm à practicar certos actos, quando a natureza bra- da pelos seos inauferiveis direitos, não pôde certamente deixar de lembrar-se com dôr, de que a máxima, seguida por muitos pais, que. nao querem prestar attcnçao as idades de seos filhos, e para as necessidades, que estas criao, é quasi sempre a cansa — \0 — de sua ruína; porque os constranje á procurar a satisfação das exigências da natureza na solidão ; visto que um jugo ferrenho, c mal entendido o inhibe de cncontral-a d'outra sorte. A civilisação, e a humanidade, pois, pedem, que os pais se recordem, c saibao que o instineto úã propagação, que a tendencia d'um para outro sexo são sen- timentos innatos no coração humano, eque, o que ha unicamente á observar-se, é a opportunidadc do tempo, em que se desenvolvem, e a prudência, e a moderação, com que cumpre proceder-se. Verdade é que um monstruoso escolho se apresenta onde naufraga muitas vezes a cnexpcricncia, c que só mui indirectamente se pôde evi- tar; por que depende isso das nossas leis, e das nossas instituições. Entre tanto simplesmente por esta razão não devemos adoptar o extremo; antes, já que nesta parte não somos protegidos, traclemos de advertir aos pilotos sem practica os perigos, que os rodeião, pois que assim talvez lhes seja possível conjurar a tormenta. A moci- dade deve estar prevenida, á fim de que incauta não caia nas babujentas, e lethacs fauces duns monstros, que por todas as partes se lhe apresentarão, oceultando debaixo d'um exterior, que seduz por artifícios, e dissimulação, um foco insondavel de males, com que funestaráõ todos ósseos dias: queremos fallar dessas mulheres abjectas, verda- deiros flagcllos da humanidade, que se chamão meritrizes, as quaes escoltadas pelo sé- quito pestilento de vícios, edepravações, espalhão pelos inexpertos as venenosas semen- tes de males sem conta, que prodigiosamente augmentão a colheita da morte. Todo o mundo reconhece a gravidade dessa horrível espada do extermínio: todo o mundo concebe o acerescimo, que sobreveria á nossa população, se por ventura algumas pro- videncias se tomassem a este respeito. Balexscrd, fatiando neste sentido, assim se exprime « Pretende-se, que é de prudência em uma grande cidade o tolerarem-sc as mulheres publicas; por que por este meio as senhoras honestas estão cm maior segu- rança, do que se a policia fosse mais austera. Eu deixo aos políticos, e aos moralistas a resolução deste problema pela parte, que lhes toca. Quanto ámim, que não procuro senão o bem physico geral, e particular, direi somente, c com muita confiança em minha opinião, que se se podesse fazer o parallelo, e supporem-se dous estados de igual numero de habitantes, da mesma idade, e sexo, c vivendo debaixo do mesmo clima, e governo etc. etc, differindo simplesmente, em que um tivesse mui poucas prostitutas, mas que soffrcssc uma peste de 5 em 5 annos, que ceifasse de cada vez a vigésima parte dos habitantes, comparando-se este com o outro, em que não se desse a peste, e sim um grande numero de lupanares, como se vêem nas cidades populosas, como Londres, Paris etc. etc, creio sem duvida, que no fim d'um século achar-sc- hia o primeiro estado ainda mais povoado, e seos habitantes de constituição, e tem- peramento incomparavelmente mais vigorosos. Estou que se tira muito proveito da severidade das leis da Allemanha a este respeito. » — Eis o juízo, que formava Bal- lexscrd acerca de simclhantes entes, juizo muito exacto, e diariamente confirmado por dolorosas experiências, que salientcmentc provão a necessidade de se adoptarem tutre nós algumas medidas, que ao menos minorassem os immcnsos damnos, que — u — tem trazido a negligencia, em que vivemos até aqui. Todos os governos dos paizes mais civilisados da Europa toem reconhecido esta verdade, e sabemos, que hoje em suas grandes cidades a policia vela com toda attençao sobre a boa execução de muitas medidas, de que se tem lançado mão para acabar-se com este mal. Em Portugal mes- mo, hadous annos, se nôs não falha a memória, promulgou-se uma lei, que providen- ciava sobre isto. Se se entende, que as mulheres publicas devem ser toleradas por motivos, que não nos cumpre discutir, deve-se ao menos tractar de impedir, que cilas illudao a innocencia, e que a arrastrem ao turbilhão do vicio ; e para isto talvez fosse sufficiente o designar-se um quarteirão retirado, d'ondc não pudessem sahir sem certas precauções, e submettel-as á inspecções freqüentes, sequestrando-se aquellas, cuja saúde fosse duvidosa. Deste modo é provável, que se evitasse parte dos males horrorosos, que produzem a libertinagem, e a crápula. Até aqui temos nos oecupado das paixões, que se devem, com todo o afinco, arre- dar dos corações dos meninos; por que tendem á corrompel-os, c á destruir a sua saú- de ; mas como ha muitos affectos, que abrilhantão, e honrão a nossa alma, convém agora, que sobre estes digamos algumas palavras. Os Persas, segundo Xcnofontc, tra- tavão de infundir nos tenros corações de seos filhos todos estes sentimentos próprios á conduzil-os á felicidade, e á tornal-os úteis aos seus simelhantes, c que constituem o mais bello apanágio da espécie humana: ensinavão, diz um author, a ser virtuosos, como hoje se ensinão as sciencias, e as artes Os filhos dos reis daváo o exemplo d'u- ma boa educação ; por que erão confiados aos principaes da nação, que na idade de 7 annos ensinavão a montar a cavallo, ea se fortalecerem por diversoscxcrcicios do corpo. Aos 14 annos ficarão debaixo dos cuidados de h pessoas, que, como assevera Montaigne, erão os mais sábios, os mais justos, os mais moderados, c os mais valentes d'entre todos. O primeiro se encarregava de implantar cm seo espirito os dogmas da religião: o segundo de ensinar-lhes a amar a verdede: o terceiro á ser senhor de suas acções, e seos desejos; e o quarto â nada temer. D'aqui, pois, se ve, que os antigos não ignoravão, que era necessário familiarisarem-se os meninos com os sent.mentos nobres e virtuosos para os habilitarem á preencher um dia os devores, que a socie- dade lhes impõem, e desta arte a prepararem as bases de sua felicidade; c que estavao certos, de que as primeiras idéias deixao n'alma traços indeléveis; c por isso procura- vao evitar os tristes resultados d'uma má educação. Em verdade todos os momentos da infância são preciosos ; c, desde que os meninos estão cm circumstancia de se divcr- cm uns com os outros, cumpre que se cxforce, por forma,-os homens, fazendo-. observar as regras da temperança, e da sobriedade, que prepara, constituições robôs- ^ tornão apreciáveis as suas faculdades physicas, e moraes; e para isto e prcc.so ^esquece^ Lm restos em seos divertimentos, e eiactos no cua.pr.mcat. Je .«. -..ençou, mostrar-lhes-hcmos a fonte, donde cmanâo os primeiros principios da probidade, dá justiça, e da equidade. Os exemplos tem um grande poderio sobre os meninos; por que elles os faro compassivos, benéficos, e generosos. A frieza do coração, ea dureza da alma, sao (como diz Rousscau) sempre a nossa obra ; por que um, e outro fora» feitos para serem ternos, e sensiveis. Deve-se desenvolver o amor da gloria, innato no coração dos homens, e excitar esta nobre emulação, que inspira grandes cousas, e os torna capazes de as executar; por que póde-sc predizer, logo que um menino é agitar- ei 3 por heróicos sentimentos, que estàapto á, depois, devotar-se ao bem da pátria, e da humanidade. Infundindo-se nos seos ânimos paixões doces, e agradáveis influir-se-ha sobre sua constituição physica; por quanto estes sentimentos, augmentando ligeira- mente sua intensidaie, favorecem todas as funcções, e desenvolvendo o corpo, e acti- vando convenientemente a imaginação, contribuem muito para o entretenimento da saúde. Se, porém, do que temos dito se deprehende, que na primeira idade da vida, o em quanto o espirito nao está sufficientemcnte forte, e o corpo bem robustecido, os meni- nos não se devem consagrar, senão aos exercícios corporeos, que forlificão a sua consti- tuição, facilmente concebe-sc quão perigosos serão os estudos precoces, que os enfra- quecem, e enervao. Com cffeito a natureza não pôde operar ao mesmo tempo o des- envolvimento do corpo, e da intelligencia. O crescimento do corpo deve ter lugar an- tes do do espirito ; e por conseqüência, seguir-se-ha uma ordem inversa, se se exforçar por desenvolver a intelligencia, quando o corpo é ainda fraco, e delicado, e interrom- pendo-se a marcha livre, de que este precisa para expandir-se, elle se depauperará, e não sahirá victorioso do combate da puberdade, ecntaoserá acabrunhado pela morte, depois de ter sido precedido de moléstias cruéis. Adoptando-se uma rota contraria, fazemos com que os meninos comprem bem caro uma celebridade anticipada, e exigi- mos um impossível da natureza. Fleury diz « querer-se que sejão doutores (os meni- nos) é exigir-se, que uma planta nova tenha, d'um dia para outro, um tronco solido, e profundas raizes. » A experiência constantemente nos faz ver, que, procurando-se desenvolver as faculdades intcllectuaes antes do tempo prescripío pela natureza, e exer- tendo-as continuamente por estudos sustentados, chega-se muitas vezes á dar-sc-!he uma grande energia ; mas tao bem cabem logo no enfraquecimento de maneira, quô cs mcnmos, que linhão começado por prodígios de sciencia, e erudição, acabão por £e tornarem imbecis, e estúpidos. Assim Iíermogenes, que na idade de 18 annos era o mais habil Rhctorico da Grécia, perdeu todos os seos conhecimentos aos 24 annos, e viveu até os 48 em um completo estado de idiotismo. O imperador Caracalla, que tão bem aos 18 annos, era um portento de instrução, perdeu todos os seos conhecimen- tjs, e ficou depois reduzido até ao miserável estado de desconhecer as letras doalpha- beto. Convém, por tanto, que se preste muita attençao aos estudos da infância, e que nao se siga o costume de inviarem-se os meninos logo, que comecão á andar para as escolas, onde fkão quasi todo o dia. A obrigação de ficarem sentados, a attençao. — 43 — que applicarão aos livros, a coarção, em fim, em que se ach5o, os opprímem, e osas- sassinâo lentamente; por que tudo isto é opposto á sua natural vivacidade. Um cele- bre filosofo da Grécia, Anaxagoras, tao convencido estava da utilidade do exercício para os meninos, e d.>s perigos dos estudos prematuros, que, indo os magnatas da ci- dade de Lampsaco, algum tempo antes de sua morte, perguntar-lhe, se tinha alguma ordem á intimar-lhes, respondeu, que não almejava outra coisa, senão que se permit- tissc aos meninos o divertirem-se todos os annos no mcz de sua morte : esta sua ultima vontade foi executada, e durou este costume até o tempo de Diogenes Laerces. E', pois, prudente, que se accompanhe o desenvolvimento das faculdades intellectuaes, fi- xando primeiramente a attençao sobre os objectos, que cabem debaixo dos nossos sen- tidos, cultivando a memória, fazendo comparar as coisas entre si; depois, n'uma idade mais avançada, dirigir-se cautelosamente a imaginação; e o juízo, e o raciocínio, exe- «utando-se gradatívamente, amanharão o terreno, onde viçosamente desabrocharáõ oa grãos, regados por uma prudente educação moral. Taes são os meios, que nos parecem adequados para constituírem a base d'uma edu- cação publica, consentanca ao bem da humanidade, e aos progressos scientificos do século; por que entendemos, que por meio d'elles teremos corpos robustos, espíri- tos esclarecidos, e almas virtuosas, e doaremos o nosso joven Brasil com filhos, digno* de sustentarem a sua honra, e as instituições, que felizmente nos regem. FIM. f HTPOCRATIS APHORISMI. I. Somnus, vigília, «traque modum cxcedentia, malum. Sect. 2. aph. 3." n. Non satietas, non fames, non aliud quidquam, quod naturae vires excedat, bo- num. Sect. 2. aph. 4.° III. Lassitudines, spontè obortae, morbos denuntiant. Sect. 2. aph. 5." IV. In omni corporis motu, quando dolere cceperit, interquiescere statim lassitudi- ncm curat. Sect. 2. aph. 49. V. Si metus, et tristitia multüm tempore perseverant, melancolícum id ipsum. Sect. 6. aph. 23. VI. Qua3 longo tempore extenuantur corpora, lente reficere opportet; quaj vero brevi, celeriter. Sect. 2. aph. 7. TYFOCiRAPHIA ífi TEIXEIRA E COMPANUIA RUA DOS OURIVES S. 2 1. Esta These esta conforme os Estatutos. Rio de Janeiro, % de Outubro de 1840. Dr. Paula Cândido^ CONSIDERAÇÕES GERAES SOBRE tUELLJ ERRATAS. PAGINAS, LINHAS. ERRATAS. CORRECÇ.ÕES. I 28 que filhos &c. que, filho &c IV 24 , os escudados , escudados. id. 19 pontos, &c. pontos &c. 1 19 bue que. 2 7 edos e dos. 9 9 anthitcza anthitese. A pressa, com que vimos esta nossa these, não nos permiltiu, que pudesse- mos corrigir alguns erros typographicos. Deparamos agora com alguns, que emen- dámos, e dos outros pedimos desculpa a quem ler. NA TYPOGRAPHIA DO ARCHTVÕ MEDICO BRASILEIRO, •»n* nn« ARCOS N. 46. RÜA nOS ARCOS N I»47.