I L o/ Uicolátt SUaes fTttcmtbo. 4 .,.nr,<. THESE PERANTE A FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Em NOVEMBRO DE 1870. DE DOTTOE. EME MZDIOlffA. POR. i-r*-B,V^aSa*v Natural da mesma Pro\iucia. S\%o feaítíiuo do Cotouefl %oão cMveó SUhnuGo e De í> O k____-------——. (w. cllfeavía» qR~c<íco gJUW Áiloiu&o. Medico non solum morbus ejus cui mcdcrt tolet, sed «tiain cansucludo falenlis, et natu- ra corporis cognosecüda est. ( Cie. ) jmk JK T$t£ ±y3Jm :^AP*i£^ TYPOGRAPHIA DE J. G. TOURINHO i$90. FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA. ~i»JS>©gSg=— DEfiECTOR O JEap,mo Snr, Conselheiro Br, •Fotío JSaptista tios Anjos» 0 Ex.mo Snr. Conselheiro Dr. Vicente Ferreira de Magalhães. os sns. DOUTORES l.*ANNO. MATÉRIAS que leccionam Cons. Vicente Ferreira de Magalhães . ( ^ti^AS^^™*™ ™ Francisco Rodrigues da Silva.....Chimica e Mincralogia. Adriano Alves de Lima Gordilho . . . Anatomia descriptiva. 2.» ANNO. Antônio de Cerqueira Pinto.....Chimica orgânica. Jeronymo Sodré Pereira .... . Physiologia. Antônio Mariano do Bomfim . .... Uolanica e Zoologia. Adriano Alves de Ltma Gordilho. . . . Repetição de Anatomia descriptiva, 5." ANNO. Cons. Elias José Pedroza......Anatomia geral epathologica. José de Góes Sequeira.......Palhologia geral. Jeronymo Sodré Pereira......Physiologia. A.° ANNO; Cons. Manoel Ladisláo Aranha Dantas. . Palhologia externa. ................Pathologia interna. > Conselheiro Mathias Moreira Sampaio j ^^SS&. ** mülheres pCiadaS e de menlnM S.» ANNO. ..........»..:.. Continuação de Pathologia interna. José Antônio de Freitas.....; .{ An^pia^opographica, Medicina operatorla. e .........,......Matéria medica, e therapeutica. 6.» ANNO, ................Pharmacia. Salustiano Ferreira Souto . ..... Medicina legal. Domingos Rodrigues Seixas.....Hygiene, e Historiada Medicina. ................Clinica externa do 3.* e 4.° annoi Antônio Januário de Faria......Clinica internado 5v"e G.* anuo. Rozendo Aprigio Pereira Guimarães. .} lgnacio Josc da Cunha.......I Pedro Ribeiro de Araújo......) Secção Accessoria. José lgnacio de Barros Pimenlel. . .1 Virgílio Clymaco Damazio . . . . ./ José APTonso Paraiio de Moura. . . .) Augusto Gonçalves Martins.....f Domingos Carlos da Silva......> Secção Cirúrgica. U4 Demelrio Cyriaco Tourinho Secção Medica. Luiz Alvares dos Santos......r O Sr. I)r. Cincinnnto Pinto da Silva. O Sr. B*r. Thomaz e^B»---- A MEU CUNHADO O SENHOR ©ia, jDOimmwDa m skdutsü aatiiiS©- São tantas e tão numerosas as provas de sincera amisade que de vós tenho recebido, já corno bom irmão, já como amigo, que não tenho expressões com que possa compcns?l-as; por isso acho mais conveniente guardar o silencio, já que me é impossível explicar o que a alma sente. a iraia otmim A EXCELLENTISSIMA SENHORA D. MARIA IZABEL DE MATTOS PITOMBO Amisade fraternal. & MWB CÂ&08 8Q8&82?1®8 88GS&SS?lâ3 Amisade pura. A MEUS PARENTES QUE ME DISTINGUEM PELA AMISADE Cordial estima. A MEUS DISTIMTOS COLLEGAS E ESPECIAES AMIGOS OS SENHORES Dr. Rlanoel Pereira Espinheira. Dr* Manoel lgnacio de Vasconcellos. Sympathica affeição e verdadeira amisade. A10 RESPEITÁVEL MESTRE E AMIGO © oiLiLtyjsma©® ©®m§ silbuiiiir® JDr. íWntl)ia0 Hlomra gampat* Gratidão e consideração profunda, AOS ILLÜSTRAÜOS PRACTICOS Dr. José Luiz de Almeida Couto Dr. Joaquim Moreira Sampaio. Testemunho de reconhecimento. Â. METJS AMZ30S Retribuição d'amisade. A ILLUSTRADA CONGREGAÇÃO DESTA FACULDADE Honra ao saber. A MEUS COLLEGAS DOUTORANDOS Um adens do tWuMÍ* AO LEITOR. Lex jubet, legi par cre debemus. 22Ífj^^ ARA obter-se o grau de Doutor em Medicina impõe-nos a lei a obri- ^íllISfegação de apresentarmos este pequeno trabalho, e é esta obrigação que leva-nos a emprehender tão árdua tarefa. Que poderemos apresentar de novo na sciencia ou inaudito para qualquer, nós, cuja intelligcncia é tão acanhada? Quão difOcil não nos é escrever este pequeno folheto? O fim a que elle se destina, a nossa inhabilitacão e a nenhuma practica de escrever para o pnblico sejão razões altenuanles para desculpa dos erros n'elle espalhados. MMo twctor* .'n \ ,.u :. .;..(. SECÇÃO MEDICA. ER7SIPEÜ C01TSIDERADA Eli GERAL Opportet narrationem três habere res, ut brevis, ut aperta, ut probabi- lis sit. ( ClG. ) ARECE indispensável, antes de entrarmos definitivamente em matéria, darmos uma definição da erysipela. Apesar de sabermos que nos é bastante difíicil, todas as vezes que nos vemos na obrigação de dar definições; porque poucas ha que preencham o seu fim; com tudo devemos dizer em que con- siste a erysipela; pois quanto saber, que modificação orgânica a constitue, quasi que ignoramos pelas divergências que ha. Assim pois a definição não pode ser senão hypothetica. Esta moléstia tem sido assim chamada, porque se estende algumas vezes gradualmente sobre as partes vizinhas. E' uma inflammação exanthematica, essencialmente extensiva, mos- trando-se sobre largas superfícies; por isso considera-se como typo d'essas inflammações» Em geral é pouco grave, quando invade simplesmente a pelle; ao con- 6 trario, é grave, quando se approxima das membranas serosas ou mucosas, ou quando ataca o tecido cellular subcutaneo; e n'este caso constitue o que se chama phleumão diííuso ou erysipela phlegmonosa. Quando ella começa de um ponto central para estender-se somente ás partes visinhas, toma o nome de erysipela fixa, o que é raro, porque ella tem por fim estender-se, isto é, invadir novas superfícies. Quando ella tiver invadido uma extensão mais ou menos notável do corpo, passeando, por assim dizer, sobre a superfície d'elle, toma o nome de erysipela ambulante. Sendo uma inffammação superficial da pelle, traz sempre comsigo febre geral, tensão, dor, calor mais ou menos intenso, rubôr desigual- mente circumscripto, desapparecendo com muita facilidade pela pressão do dedo. Algumas vezes existe sobre a parte affectada phlyctenas que, seccando, dão em resultado escamas furfuraceas; modo porque muitas vezes ter- mina a erysipela, ou então pela resolução, ou pela suppuração, e rara- mente pela gangrena. A erysipela tem recehido diversas denominações; assim tem-se chama- do, fogo sagrado, febre erysipelatosa, fogo de S. Antônio, mal dos arden- tes, &e; mas o nome geralmente seguido hoje é o de erysipela, Jamais question ne fut plus con- troversée que celle relative à Ia nalure et au traitement de 1'erysipèle; toutes lcs feuilles médicalespériodiques Pont agitée tour-à-tour, et cependant les opinions sont encore bien divergentes sur ce poinl. (Gaz. Med.) Muito tem-se discutido, ou antes divagado sobre a essência ou causa próxima da erysipela, que, por algum tempo, considerou-se como produ- zida pela estagnação ou pela alteração da bilis. Não ha duvida que a ery- sipela seja uma phlegmasia cutânea; mas será uma inflammação simples, ou esta alteração ^da pelle será um dos symptomas de um estado patho- lógico geral? E' difficil resolver-se de prompto semelhante questão; mas, em todo caso, somos mais propensos a aceitar a segunda proposição, pois que de facto a erysipela parece ser uma manifestação de uma causa geral, e é exactamente o que explica, na maioria dos casos, sua gravidade. Para esclarecermos de algum modo esta questão, é necessário que nos occu- pemos em primeiro lugar das causas predisponentes, e determinantes ou occasionaes da erysipela, e depois que verifiquemos a sua naturesa. Innumeras são, por certo, as causas a que se tem attribuido o appare- cimento d'esta moléstia: vejamos porém á qual d'ellas deve-se verdadeira- mente attribuir sua producção. As principaes causas predisponentes são as seguintes: a idade. Todas as partes do corpo são sujeitas a ser affectadas de erysipela; entretanto está predisposição de ser affectada tal ou tal parte, varia nas differentes idades da vida; assim nos recemnascidos, de preferencia ella se manifesta no abdô- men, occasionada pela inflammação da veia umbelical; nos adultos, com especialidade, insulta a face; nos velhos os membros, e com particularida- de os membros inferiores. O Sexo.—Quanto ao sexo, as mulheres são mais predispostas do que os homens, a soffrer de erysipela; o que se deduz das estatísticas fornecidas por muitos auctores como Louis, Chamei, Blache, Crisolle e outros. Follin assignala muitos factos de erysipela ligadas, periodicamente, as mesmas pessoas, durante o fluxo catamenial; e J. Frank confirma as mes- mas idéias. J. Béhier assignala também dous factos, dos quaes o primeiro é idênti- co ao que acabamos de referir; o segundo elle observou em uma mulher que chegada a idade da menopauza, suas regras eram substituídas, nas epochas correspondentes, por erysipelas da face. Estes mesmos médicos estabeleceram que a erysipela é vinte vezes mais freqüente na cabeça, do que nas outras regiões; e que em geral as partes as mais das vezes soffredoras eram aquellas, que habitualmente estavam descobertas. Os climas e estações.—Pelo que diz respeito ás estações, os auctores divergem; é assim que o Dr. J. Frank diz: as erysipelas são mais communs 8 durante o inverno; pelo contrario asseverão Chomel e M. Blacbe serem mais freqüentes na primavera, e principalmente durante o outomno. O que cremos, é que as estações pouco influem para o desenvolvimento da tal moléstia. Pelo que importa aos climas, sabemos que ella é mais fre- qüente nos climas quentes. Considera-se também, condições favoráveis ao desenvolvimento d'esta moléstia, a alimentação excitante, e o abuso de bebidas alcoólicas. Não podemos admittir que estas causas, por si sós, possão produzir semelhante moléstia, senão de accôrdo com a constituição medica, e a predisposição individual. Numerosos factos nos mostrão, que em certas epochas as erysipelas são muito freqüentes, pois que a menor lesão ao desenvolvimento cutâneo, torna-se a causa occasional de uma erysipela; e é por isso, que debaixo d'este ponto de vista, muitos cirurgiões deixão de praticar amais simples operação; porque de tempos em tempos, vê-se as erysipelas reinarem em maior escala, e tornarem-se epidêmicas, debaixo da influencia de consti- tuições atrnosphericas muito diversas. * . Ha lugares, em que a erysipela reina de uma maneira admirável, simu- lando uma endemia- Paul Dubois, Moreau e outros notaram que, durante as epidemias de febre puerperal, os recemnascidos eram freqüentemente atacados de ery- sipela; e que certas sallas de Hospital tornavão-se, as vezes, verdadeiros tocos de erysipelas, consideradas como endêmicas. Foi o que também observou o Dr. Grisolle de 1829 a 1833 no Hôtel- Dicu de Paris. Herança.—Aqui mesmo entre nós podemos apreciar o valor d'esta causa; porque vemos em certas famílias a erysipela produzir-se com grande facilidade; e também debaixo da influencia da causa a mais leve, lndividuos ha na mesma família que são particularmente dispostos á erysipela, e quasi sempre são atacados; e mesmo sem causa conhecida tem uma, duas, trez e mais vezes no anno, Os indivíduos que soffrem de algumas enfermidades são mais predis- postos a adquirir a erysipela, que com muita facilidade produz-se e torna-se grave, do que aquelles que estiverem em completa saúde. Diz o Dr. Louis: quando a erysipela da face sobrevem a um indivíduo sadio e robusto, termina sempre pela cura; ao passo que no caso contrario, 9 occasionara a morte; o que é muito commum no fim de certas moléstias chronicas, principalmente se for uma erysipela ambulante, que venha com- plicar a moléstia primitiva. Comtudo ha quem vá de encontro a esta regra do Dr. Louis. Nos escrofulosos, diz Bazin, a erysipela longe de aggravar a moléstia, parece antes apressar a cura. O mesmo diz Hardy: que, apesar das escrofulides serem muitas vezes complicadas de erysipelas, comtudo vé-se ordinariamente uma feliz modifi- cação da escrofula cutânea, e algumas vezes até a cura. A vista do que acabamos de expor, não devemos crer que a acção das causas externas, por si só, seja sufficiente á producção d'esta moléstia; apesar de, em casos muito raros, uma irritação viva e continuada da pelle, determinar uma dermatite erysipelalosa, devida a uma inflammação, que partindo das paredes dos vasos lymphaticos, propaga-se ao tecido visinho do derma, dando logar a producção de vesiculas sem exsudação sensivel, ou destruindo os tecidos, se a intensidade da causa for enérgica. N'este caso podemos verificar pela observação directa, que a substancia tóxica foi a principio absorvida pelos lymphaticos, e provocou a inflammação de suas paredes; e que emfim a dermatite desenvolveu-se secundariamente, como diz o illustre professor Niemeyer. Ainda sabemos que ha lesões que favorecem muito o desenvolvimento da moléstia; haja vista o edema a elephantiasis dos Árabes, as ulceras, e certas operações que se praticam sobre a face. Querem também alguns auctores que o uso de certos alimentos irritantes se considere como causa occasional do desenvolvimento de tal moléstia. São regras estas em que não devemos acreditar, senão quando, de con- cumitancia com o uso d'estes alimentos, houver uma predisposição da parte do indivíduo quefôr affectado; ou quando no logar em que elle ha- bitar, reinar uma epidemia de erysipela. Assim pois podemos provar o que acabamos de dizer com as observações feitas por eminentes practicos, como: Chomel, Blache, Biett, Cazenave, Rayer, J. Guerin, Lepelletier, Valleix e outros que também negam o ver- dadeiro contagio como causa da erysipela; porque contagio é a transmissão p. % IO da moléstia de um indivíduo para um outro pelo effeito de um contacíü immediato ou mediato; essa transmissão deve estar ainda de accôrdo com as condições de aptidão especial do indivíduo novamente afíectado, afim de por sua vez propagal-a com os mesmos caracteres e nas mesmas circums- tancias; pois admittimos, como Anglada, como condição essencial, a elabo- ração mórbida de um principio especifico. Somos mais propensos a crer que a erysipela seja, em certos casos, uma moléstia infectuosae não contagiosa; porque infecção é a acção exercida sobre a economia por miasmas morbificos, differindo do contagio que se produz por contacto independente, até certo ponto, das condições atmos- phc-ricas, e que uma vezprodusido, não tem necessidade, para se propagar, das cauzas que lhe deram origem; o que não acontece com a infecção que obra somente na esphera do foco d'onde emanâo os miasmas morbificos; pois considera-se como uma alteração do ar aímospherico, devida á acção que substancias animaes e vegetaes em putrefacção exercem sobre elle. Destruído este #fóco desapparecerá a moléstia. A infecção transmitte-se de um indivíduo são para um doente, mas não por contacto, e sim indirectamente. Assim pois não podemos explicar de outro modo o pensar de tantos practicos que citam casos em que a erysipela se transmitte por contagio. Algumas vezes basta um só indivíduo afíectado de erysipela para cons- tituir um foco de infecção, concluio Ch. Martin de suas numerosas obser- vações, e transmittir sua moléstia ás pessoas que morão mais ou menos em suas mediações. Mas isto não é por contacto immediato; e sim o resultado de condições individuaes especiaes; e como nós, quasi que ignoramos estas condições, ó bom que tenhamos prudência em procedermos a respeito do seu contagio^ como querem alguns, e em tomarmos todis as medidas de hygiene pos- síveis, como diz Gosseliu. O professor Niemeyer diz em sua bella obra de Pathologia interna que não só não se deve considerar a erysipela verdadeira, ou exanthematica no quadro nosologico dos exanlhemas agudos, o que quer Bosieri, como tam- bém consideral-a como uma moléstia infectuosa. Porém adiante exprime-se o mesmo professor, dizendo: «enfim, nousmentionnerons, en terminant, quilya en effet, une forme d'érysipcle qui doit étre consideiée comme le symptome d'une maladie infectueuse. Cest 1'érysipèle symptomatique qui se declare dans le cours de Ia pyohémie, dans les dernières périodes du II typhus ou dans d'autres maladies graves, dans lesquelles cette dermatite n'est qu'un épiphénomène des troubles nombreux et élendus de Ia nutrition. » É justamente a nossa opinião acerca do contagio da erysipela, não que- rendo dizer com isto que somos exclusivamente de parecer que toda ery- sipela seja infectuosa, não; o que dizemos é o seguinte: que não podemos explicar o apparecimento de certas erysipelas, sem causas conhecidas, senão pela infecção; sirva de exemplo o apparecimento de erysipelas, e de outras muitas moléstias em certas epochas, em grande numero e sem causa apreciável, debaixo da influencia do que se chama disposição epidêmica. Ainda podíamos ir adiante a respeito das causas accasionaes, mas ha- vendo tantas divergências nos auctores, achamos conveniente ficar aqui e tratar dos principães symptomas da erysipela,exanthematica. Somos da opinião d'aquelles que concordão em que a erysipela seja quasi sempre precedida de alguns phenomcnos precursores, taes como: indisposição geral, langor, febre, cephalalgia, anorexia, bocca amarga, vô- mitos, etc, e ainda mais de um symptoma muito notável e commum, que se observa na maioria dos casos, o enfarte doloroso dos gânglios lym- phaticos, que recebem os vasos provenientes da parte que deve ser affec- tada de erysipela, ao passo que a pelle e as mucosas não apresentão modificação alguma. Mas como este estádio prodromico não é constante; como em outros casos, as perturbações do estado geral e a febre não se ligão, senão mais tarde aos symptomas locaes, não podemos de modo algum comparar estes prodromos da erysipela com a febre de erupção dos exanthemas agudos, e sim consideral-os como análogos a este estado febril que pre- cede algumas vezes a um violento coryza como diz o professor Niemeyer. A erysipela simples começando por symptomas geraes, estes durão pouco tempo e manifestão-se do modo seguinte: o indivíduo que vae ser affectado accusa horripilações, calefrios, sede, e todos os symptomas que acima dissemos, como annunciando que uma phlegmasia muito intensa vae desenvolver-se, sem que se possa affirmar qual será a sua sede. Para corroborar essa nossa opinião apresentamos o professor Chomel 13 annunciando uma erysipela da foce, antes mesmo da apparição do rubÔF erysipelatoso, pelo simples facto de existir uma tumefacção nos gânglios submaxillares. Apesar dos Drs: Gubler e Ciure sustentarem que essa tumefacção, quando apparece antes que haja traço algum de erysipela na pelle, é tida como symptomatica de uma erysipela do pharynge, a qual se estende depois á face; em todo caso, dá sempre em resultado uma erysipela da face, como disse Chomel. Yelpeau por sua vez diz: que o apparecimento de adeníte submaxilíar não é considerado symptoma prodromico de uma erysipela que vae nas- cer; e sim é um signal de que ella já existe, mas invisivelmente; seja existia é o que não afiançamos; o que é provável é que ella pode ap- parecer. A dor, que os doentes accusão, é tensiva, acompanhada de um pruido desagradável, continua, e as vezes exacerba-se á noite. Ha um rubôr mais ou menos circumscripto, de cor variável, desapparecendo pela pressão do dedo, e reproduzindo se immediatamente. A pelle torna-se estendida, luzidia, espessa e intumecida; o que se aprecia pela palpaçâo. Esta intumescencia pode tornar-se considerável, se o tecido que tiver por sede a erysipela for muito frouxo, como é o das palpebras, o dos grandes lábios, o do escrôto, e etc. Ha augmento de calor nas partes af- fectadas. Os movimentos se difíieultão e estão na razão directa do grau da intumescencia. De concumitancia com estes symptomas locaes, ha os geraes que mui- tas vezes são intensos, taes são por exemplo: pulso accelerado, cheio e forte, apresentando pouco mais ou menos cento e vinte pulsações por minuto, cephalalgia, agitação, insomnia e algumas vezes delírio, devido á febre; todos estes symptomas varião muilo de intensidade, e as vezes aeahnão-se, antes que os locaes moderem de alguma sorte a sua inten- sidade. VMIKBIDÀIDIK3 Nem sempre a erysipela mostra-se com os caracteres que acabamos de descrever; pois offerece variedades numerosas quanto aos symptomas locaes, geraes, a sede, e aos modos de terminação. 13 Quando a erysipela é muito intensa nota-se, sobre a parte inflammada, verdadeiras phlyctenas ou bolhas, contendo um liquido que ou se escoa em conseqüência da ruptura das vesiculas, ou secca, dando em resultado crostas. Estas vesiculas reunem-se em uma só, formando uma larga bolha, d'ahi vem a denominação de erysipela phlyctenoide ou bolhosa. Se estas vesiculas são pequenas e assemelhão-se ás do eczema dá-se n'este caso o nome de eczematosa ou milhar. Se o liquido que subleva o epiderme deixa de ser soroso, como no primeiro caso, para tornar-se crasso, a erysipela chama-se pustulosa. Ha casos em que os indivíduos afíectados apresentão manchas enne- grecidas no epiderme, semelhantes ás eechymos?s de cor azulada, que nota-se no começo de uma gangrena. Estas manchas são devidas á infiltração, no tecido do derma, do liquido, que ellas contém; que sendo sangue denegrido e irifiltrando-se no derma, havia necessariamente de produzir na superfície da pelle semelhantes placas. Quando houver uma infiltração de serosidade nas malhas do tecido cellular subcutaneo, dando lugar a molleza e intumescencia dos tecidos, a pelle torna-se lisa, luzidia, menos dura e menos dolorosa, offerecendo grande depressão pela pressão do dôdo; é a erysipela dita edematosa, a qual observa-se de preferencia nos indivíduos lymphaticos e debilitados; e no caso contrario, procura sempre por sede o logar em que abundar mais o tecido cellular frouxo. Ha ainda uma variedade de erysipela, notável pelo seu cortejo de sym- ptomas geraes e locaes graves; quero fallar da erysipela phlegmonosa. Esta espécie de erysipela é caracterisada, além da infiltração do tecido cellular, pela inftammação d'elle e pela intensidade de seus symptomas. O rubôr estende-se ordinariameute em forma de linhas anastomoticas tomando a direcção dos vasos lymphaticos. Os gânglios tornão-se bas- tante engurgitados e dolorosos; a parte muito tensa; o calor bastante ele- vado; e todos estes symptomas vão-se aggravando, até que chega uma oceasião, em que torna-se clara a fluetuação e formação de piís, que mais tarde terá sabida ou espontaneamente ou pelo bisturi do cirurgião. Algumas vezes, como admittem alguns practicos, a suppuração torna- se inexhaurivel, e ha absorção do pús formando abscessos metastaticos; ^es- te caso trata-se de uma pyohemia, e a terminação é quasi sempre a morte. u Quanto aos symptomas geraes, podemos dizer que ha três variedades de erysipela: a l.a toma a forma inflammatoria; a 2.» a forma mucosa; a S.a a forma biliosa. Nenhuma d'estas formas é apyrctica; todas são sempre acompanhadas de um movimento febril, proporcionado ao grau da inflammação; a ce- phalalgia é intensa; a pelle ardente; ha calefrios; indisposição geral etc. Na forma mucosa, além d'estes symptomas, nota-se que a língua tor- na-se saburrosa; a bocca pastosa; hálito mau; náuseas; e vômitos mu- cosos. A 3.a formas, uma das variedades mais freqüente da erysipela, é notá- vel, porque sempre se complica de embaraço gástrico, com todos os symptomas do estado bilioso; como: cor icterica; bocca amarga; sede vi. va; língua e ourina amarelladas; náuseas; vômitos e dejecções de matéria biliosa; grande prostração; e muitas veses reina epidcmicamente. Quanto a sua sede, podemos dizer que a erysipela, á vista do que te- mos exposto, invade indifferentemente qualquer parte do nosso corpo, com especialidade a face, e o couro cabelludo. D ahi a erysipela pode transmittir-se quer externa quer internamente; e até onde, não podemos dizer; pois que ha muitas supposições, navegando todos os auctores em um mar de hypotheses. Como a erysipela da face é a que mais freqüen- temente observa-se, digamos alguma cousa em referencia a ella. Quasi todos os practicos estão de accôrdo que a erysipela da face vem sempre debaixo da influencia de causas traumáticas; disemes nós, de concumitancia com as condições individuaes e geraes; porque a não ser assim, como explicar a razão porque indivíduos debaixo da iufluencia de causas traumáticas, e no mesmo logar em que estão aquelles que soffrem de erysipela, não são atacados do mesmo mal? O Dr. Gubler diz: que a erysipela da face é o resultado da propagação da erysipela do pharynge, mas nem sempre podemos admittir como ver- dadeira esta propagação, porque ella pode fazer-se no sentido inverso; isto é, a erysipela primitivamente desenvolvida sobre a pelle ser susceptí- vel de ganhar as membranas mucosas. Não podemos deixar de admittir uma causa predisponente existindo, quer no indivíduo, quer fora d'elle, para a apparição de tal moléstia; por- que sabemos perfeitamente que ha epochas, em que o medico não pode praticar uma operação, por mais insignificante que se a considere, que 15 não seja complicada de erysipela; ao passo que, em outras occasiões, as operações as mais graves não dão logar a accidente algum. Considerão estas erysipelas sobrevindas no decurso de certas lesões como traumáticas. A erysipela da .face tendo por causa uma lesão traumática, começa sempre por essa lesão, estendendo-se ás partes visinhas; isto é, ao cou- ro cabelludo, á nuca; d'ahi pode ir ao tronco, dirigindo-se depois ás es- padoas, peito, braços, hombros, abdômen, coxas, etc, é o que se chama erysipela ambulante; que também pode tomar outra direcção, conforme o ponto de partida; pois pode ser occasionada por uma ferida, pela applicação de um vesicatorio etc. etc; c a inflammação partindo então d'este ponto estender-se ás outras partes. Esta forma de erysipela é para alguns practicos bastante grave, cuja terminação é a morte; para outros, não; pois que considerão a cura mui- to mais freqüente. Ella ataca de preferencia as extremidades, e se dirige estendendo-se, para o tronco e cabeça com uma marcha continua; pas- seando pela superfície da pelle, algumas vezes sem deixar logar algum incólume; e outras vezes saltando, por assim dizer, de um logar para ou- tro, deixando um intervallo são entre um e outro ponto. Esta moléstia deixa de ser grave para alguns practicos, pela pouca in- lensidade de seus symptomas geraes e locaes; assim vc-se a febre, que parecia dever ser intensa, mostrar-se ordinariamente moderada; c a hy- peremia e intumescencia dos tecidos serem pouco notáveis etc. etc; o que leva alguns practicos a darem pouco valor. Para outros, torna-se grave; porque sendo uma moléstia de marcha longa, demarando-se algumas ve- zes mezes, e o doente sempre conservando a febre, ainda que em peque- na escala, esse estado é por demais sufficiente para consumir-lhe as for- ças e leval-o ao túmulo. Para nós, esta moléstia é grave. Tornando a erysipela da face, dizemos que quando um indivíduo sof- frer de qualquer lesão, que tenha por sede a cabeça, isto é, qualquer le- são situada num angulo do olho, no nariz, nos lábios, atráz das orelhas, no couro cabelludo, e a esta vier ligar-se uma predisposição individual, e ainda mais a influencia de uma causa geral, estará sujeito a ser affecta- do de uma erysipela da face. Ordinariamente começa por um dos lados do nariz, se elle soffre por 16 4 exemplo de um eczema, e d'ahi ganha o outro lado, invadindo as boche- chas, e depois dirige-se para o couro cabelludo. Observa-se logo como prodromo o engurgitamento dos gânglios sub- maxillares, e o das partes lateraes do pescoço. Se a face toda é affectada, os indivíduos tornão-se deformes, inteira- mente desconhecidos; as palpebras bastante intumecidas; os lábios arre- dondados; o'nariz adquire um volume espantoso; o indivíduo não pode fallar; as orelhas, como são dotadas de um tecido mais firme, tornão-se muito dolorosas, e o conducto auditivo se obstrue, dando logar a zum- bidos e surdez. É raro que a erysipela do couro cabelludo seja primitiva, apezar de Chomel e Blache dizerem que observarão casos d'esta espécie. Mas, se fos- sem procurar minuciosamente suas causas, talvez achassem alguma trau- mática; pois, a não ser motivada por esta causa, vem sempre consecuti- vamente ligada a uma erysipela da face. Reconhece-se que existe uma inflammação no couro cabelludo, pela dor viva, e grande sensibilidade que os doentes accusão, e pelo edema experimentado pela polpa do dedo. Depois da erysipela da face, á que mais veses sé apresenta, é a dos mem- bros inferiores, procurando sempre de preferencia os velhos. Esta não deixa de ter também gravidade, principalmente tendo por se- de as alavancas que supportão o peso do corpo. Ha ainda uma variedade muito raramente vista; quero fallar da erysi- pela universal, que o Dr. Renauldin diz ter observado invadindo toda su- perfície da pelle; e elle cita o caso seguinte: «uma rapariga teve uma gonor- rhéa, que subitamente desappareceu, dando logar logo depois ao appa- recimento de uma erysipela, que lhe invadiu a face e o pescoço em me- nos de vinte e quatro horas; que no dia seguinte propagou-se ao peito e dorso; dous dias depois ao abdômen, apoderando-se dos membros, e estendendo-se rapidamente sobre toda pelle; mas deixando pallidos os pontos a principio atacados, ao passo que os ultimamente affectados tor- navão-se rubros. » Esta erysipela, que o Dr. Renauldin considerou como universal, a maioria dos practicos como Vidal de Cassis, Monneret, e outros muitos considerão como ambulante. E nós partilhamos desta ultima opinião por ser a mais seguida, e razoável. O Dr. Grisolle não admitte a erysipela universal; e considera-a como sen- p"o casos de escarlatinas desconhecidas. 19 Quanto aos modos de terminação da erysipela, dizem que ella pode terminar por delitescencia; isto é, haver desapparição súbita de seus sym- ptomas, pouco tempo depois de sua invasão, antes mesmo que tenhão percorrido seus períodos, e sem que resulte, d'esfa desapparição, acci- dente algum, e nem a moléstia apresente-se em outro qualquer ponto do corpo. Querem também que ella termine por metastase; isto é, que sendo violenta, e com a desapparição de seus symptomas, sobrevenhão acci- dentes graves, como sejão por exemplo a inflammação de certos órgãos e de membranas internas. É muito eommum vêr-se a erysipela atacar um ponto já abandonado, quer espontaneamente, quer em virtude do desvio de regimen. Estas visitas podem ser feitas em grande numero, trazendo sempre como resul- tado uma intumescencia hypertrophica da pelle, com infiltração no tecido cellular; é justamente o que se nota nos velhos que são atacados de erysi- pelas dos membros inferiores. De ordinário a erysipela termina pela resolução, e é esse o termo mais favorável; mas não são os únicos modos de terminação; porque sabemos perfeitamente que a inffammação, estendendo-se ao tecido cellular, pôde trazer suppuração, gangrena, etc. Mas será mais rasoavel considerar isto uma complicação, do que como modo determinação da erysipela. Assim também não podemos dizer que a gangrena seja sempre o resul- tado da intensidade da inflammação, mas sim, o resultado do estado geral, e de definhamento em que se achava o indivíduo atacado; haja vista, sua freqüência nos velhos, e nos lymphaticos etc, etc A marcha da erysipela é constantemente aguda, e apresenta exacer^ bações com intervallos mais ou menos afastados conforme a espécie de erysipela; notando-se que n'estes intervallos, quasi que a moléstia desap- parece, para de novo recobrar as suas forças; é a razão porque alguns practicos dizem que a sua marcha é intermittente. Mas não admittimos semelhante intermittencia, pois sabemos que na erysipela nota-se muitas recahidas, devidas, sem duvida alguma, a desvios 19 dejregimen ou a uma Ídiosyncrasia em certos indivíduos para adquirirem tal moléstia, que constantemente são atacados no mesmo logar, em que teve origem a primeira, principalmente na face. Ha erysipelas que còm muita facilidade mudam de lugar, tornando d'este modo sua marcha interrompida; sirva de exemplo as erysipelas erráticas que, nunca deixando abandonado o primeiro ponto, percorrem todos os períodos até a descamação. A duração da erysipela é muito variável, e está na razão directa não só das differentes espécies de erysipela, como também do estado cm que se acha o indivíduo, e do grau da inflammação. Se a erysipela tiver por sede a face, sem que haja complicação alguma, a sua duração media é de dez a doze dias. Se for ambulante ou errática, prolonga-se muito mais, e pode-se con- siderar a affecção como uma erupção de erysipelas successivas. Se for phlegmonoea, a duração torna-se muito longa, por ter ella de percorrer todos os seus períodos; a saber: o de inflammação, o de suppuração, e o de cicatrisação. Independente da erysipela estar sujeita a certas perturbações, que. a complicão, todavia, se a considera também como complicação de cer- tas enfermidades que, por sua duração e naturesa, não terião compro- metido tão promptamente a existência do doente. Haja vista quando ella sobrevém no decurso de uma febre typhoidéa, de uma pneumonia adynamica, e quando vem desrespeitar as mulheres recemparidas e as crianças recemnascidas &c Não insistiremos sobre este ponto, porque procuramos somente esta- belecer aqui as relações que existem entre esta phlegmasia cutânea e certas complicações que se apresentão, tornando-a d'este modo mais grave. Já dissemos alguma cousa a respeito das complicações, quando tratamos das variedades da erysipela. Agora vamos estudar as complicações que se manifestâo do lado do systema nervoso, das vias digestivas, e da serosa abdominal. As erysipelas da face, e do couro cabelludo são quasi sempre acompa- nhadas de um accidente grave, que é o delírio, que alguns considerão 19 como efteito da intensidade da febre; e outros como o resultado da pro- pagação directa da inflammação aos centros nervosos, pelos vasos e pelo tecido cellular das palpebras e da orbita, que se acharião sempre sup- purados. Somos mais propensos a crer que seja devido a intensidade da febre e não a phlegmasia das meninges e do cérebro. Apesar dos Drs. Piorry e Malle dizerem que os accidentes cerebraes sobrevindo no curso das ery- sipelas da face, dependem principalmente da inflammação ter-se prolon- gado ao cérebro e as suas membranas pelo tecido cellular das palpebras e da orbita, que se acharião sempre suppurados, todavia, dos trabalhos delles mesmos, resultou que em casos em que houve accidentes cerebraes durante a vida, e em que se achou, depois da morte, o tecido cellular da orbita suppurado, o cérebro e as membranas periencephalicas quasi sem- pre se achavão intactos; d'onde se conclue que não houve transmissão da moléstia. Não podemos admittir, de accôrdo com a opinião de muitos practicos, como Behier e Hardy, Grisolle, Yalleix e outros, que essa idéia prevale- ça, porquanto vemos delírio em casos de erysipelas limitadas ao tronco e membros, e que pela autópsia não se verificou lesão alguma no ence- phalo e seus accessorios. Ainda mais dizemos que é muito commum haver delírio na queima- dura; mas não devido a uma inflammação das meninges; e sim um phe- nomeno purameute nervoso. Porque razão, não havemos de considerar o da erysipela da mesma natureza? Querem alguns practicos também que após uma erysipela do couro cabelludo, sobrevenha algumas vezes uma paralysia geral, que começa depois de algum tempo de sua desapparição; mas que n'esse intervallo imperava uma cepbalalgia intensa e continua. Quanto as outras complicações que se manifestão do lado das vias digestivas, citamos a enterite, que é uma phlegmasia da membrana mu- cosa do canal intestinal, explicada não só pelas relações sympathicas que ha entre a pelle e a mucosa intestinal, como também pela extensão da inflammação por contiguidade; n'este caso alguns practicos conside- rão-n'a como erysipela interna; e tendo como prova cabal as ulcerações jiitestinaes, que se encontrão pela autópsia. SO mammmm O exame dos symptomas tem por fim reconhecer a moléstia, todas as vezes que ella existe, qualquer que seja a forma sob a qual se apresente; e sendo o diagnostico o ultimo juizo do medico a respeito do mal em questão, não devemos ser levianos quando estivermos em tão árdua e critica situação. Não queremos dizer com isto que seja sempre difficil diagnosticar uma erysipela; não. Todas as vezes que se nos apresentar um indivíduo, queixando-se de uma indisposição geral, tendo febre, um engurgitamento doloroso dos gânglios lymphaticos, e accusando ter soffrido já de erysipelas, não du- vidaremos em predizer o desenvolvimento de uma erysipela exanthema- tica, se não houver, de concumitancia, lesão alguma traumática; por que então é tida como a causa occasional. Se o engurgitamento tiver por sede os gânglios submaxillares, e cer- vicaes, podemos dizer que a erysipela é da face ou do couro cabelludo. Se os gânglios inguinaes estiverem enfartados podemos dizer que a erysipela é das nádegas, dos membros inferiores, etc. Se a tumefacção tiver por sede os gânglios axillares, será uma erysipela situada nos mem- bros superiores, ou nas paredes da caixa thoraxica. Será faeil reconhecer-se uma erysipela declarada, pelos symptomas e causas que temos enumerado; mas como ha enfermidades que, com faci- lidade, se confundem com as erysipelas, é bom que estudemos os seus symptomas differenciaes. As moléstias que com mais facilidade se confundem com a erysipela são: a urticaria, o sarampão, a febre escarlatina, a roséola, o herpes, o eczema, o erythema e etc. Se compararmos os seus caracteres, havemos de colher grande dis- tincção: vejamos. A urticaria é uma inflammação exanthematica, caracterisada por man- chas proeminentes, mais rubras ou mais brancas do que a pelle que as 91 cerca, pouco persistentes, apparecendo por accessos, e produzindo um pruido desagradável. O sarampão distingue-se da erysipela pela irregularidade das manchas, pela sua côr, epela affecção concumitante dasmucosas. Esta enfermidade, além de só affectar o indivíduo uma vez na vida, não pôde ser produzida a vontade. A febre escarlatina é uma moléstia geral, caracterisada por uma erupção cutânea contagiosa e as vezes epidêmica, que ataca quasi exclusivamente as crianças, que não a tem ordinariamente senão uma só vez, seguida depois de três a quatro dias de uma angina que as vezes torna-se maligna. Com estes caracteres e os demais, que deixo de enumerar, não podemos confundil-a com a erysipela. A roséola é uma erupção cutânea muito pouco notável, sobrevindo no curso de affecções internas mais ou menos graves, mostrando-se por pe- quenas manchas roseas differentemente traçadas. O herpes é uma erupção vesiculosa, formando grupos limitados sobre uma base inflammada, com intervallos sãos; a dôr persiste muitas vezes tempo depois da*desapparição da erupção. O que não se vê na erysipela onde as phlyctenas são espalhadas sobre uma larga superfície inflammada, e a dôr cessa com o exanthema. O eczema é uma affecção caracterisada por um numero considerável de vesiculas muito pequenas e de tal sorte tênues, que mal podem ser vistas pelo medico. Seu desenvolvimento é momentâneo e logo depois desapparece; a erupção é annunciada por uma sensação de comichão na pelle. O erythema nodôso é o que mais se confunde com a erysipela; é ca- racterisado por manchas rubras, de diâmetro variável, um pouco elevadas no centro; mas estas manchas, no fim de alguns dias, tornão-se pequenos tumores dolorosos que, amolleeendo, desapparecem. Esta erupção affec- tando diversas partes do corpo, acompanhada sempre de dores, asseme- lha-se ao rheumatismo. Emfim, o medico que observar attentamente e com practica a marcha dos tumores, sua sede e terminação, que quasi sempre é pela resolução, não confundirá com a erysipela. 29 vmmmmm O prognostico é grave, todas as vezes que a erysipela, ainda que sim- ples, invadir a indivíduos affectados de uma outra moléstia; pois consi- deramos a affecção antecedente como causa da gravidade. Não é para estranhar que ella termine pela morte, quando affecta indivíduos sãos e robustos. Nós devemos distinguir a gravidade dos casos em que a erysipela ó considerada como complicação, e que a temos como secundaria, pois que a gravidade da moléstia anterior pode ser muito maior, e vir ligar-se á sua, que nesse caso só influe por ser o presagio de uma morte próxima; o que se vê, quando a erysipela apresenta-se no ultimo período da phti- sica, e da febre typhica, etc. As erysipelas da face e dó couro cabelludo são consideradas como mui- to graves, quando vem acompanhadas de complicações, e quando tendem a propagar-se ao interior. As vezes, a erysipela vindo no decurso de moléstias graves, ao envez de aggravar o mal, antes vem protegel-o; o que se observa nos casos ci- tados acima por Bazin e Hardy. Importa muito que tenhamos em vista algumas circumstancias, para podermos fazer um juizo mais ou menos exacto sobre o prognostico da erysipela. Devemos attender ao estado geral do indivíduo e seu temperamento, á sede, variedade, extensão e complicações da moléstia; dados estes que muito esclarecem o prognostico, principalmente fornecidos pelas com- plicações. A erysipela dos recém-nascidos é uma moléstia quasi sempre fatal, e a sua gravidade está na razão da idade; isto é, diminue com o desenvol- vimento das crianças. Quando sobrevêm nos quinze ou vinte primeiros dias da vida, é sem- pre fatal; opinião esta de eminentes practicos, como Trousseau, Yalleix faul Dubois e outros. 93 ÜMÍfiUItlKüM) Os meios prophylacticos que possuímos para afastar da humanidade sof- fredôra os estragos e perdas sensíveis, causadas pelas aguçadas garras de um inimigo invasor, a que chamamos erysipela epidêmica, que ordinaria- mente visita os hospitaes cirúrgicos, são os seguintes: afastar os indiví- duos, que soffrerem de qualquer lesão traumática, de toda proximidade d'aquelles que estiverem affectados de uma erysipela, quando no logar reinar uma epidemia erysipelatosa, cuja causa é universal e mysteriosa, e de cujo poder só vemos os seus effeitos. E' a razão porque só tratamos de tomar as precauções para prevenir ou deter os seus terríveis estragos. Ha indivíduos aos quaes estes meios preventivos não aproveitão, por- que elles são naturalmente dotados de uma predisposição a adquirir tal moléstia-em epochas mais ou menos determinadas; para estes, não co- nhecemos meios preventivos. Se no logar infeccionado houver convales- centes, devemos removcl-os, podendo; e no caso contrario, submettel-os a um regimen todo analeptico. Emfim, a prophylaxia da erysipela epidêmica consiste em afastar todas aquellas causas que possão contribuir a seu desenvolvimento, por exem- plo: devemos suspender as vaccinações n'este tempo; pois tem-se visto produzir-se nas pústulas vaccinicas a erysipela, e dias depois succumbi- rem as creanças. Como a dermatite erysipelatosa pode apresentar-se debaixo de formas variadas, e ser susceptível de complicações, que exijão ser combatidas por meios apropriados, é justo também que a sua therapeutica seja va- riada n'estes--casos. Assim visto, isto, podemos dividir estes meios em geraes e locaes. II vaut mieux laisser Ia íiature agir seule, que. de faire quelque chose qui ne convient pas ou qui est intempestif. IlUFFELAND. Antes de entrarmos particularmente no tratamento dizemos, abra- 24 çados com a opinião de illustrados practicos, que a erysipela é uma moléstia que muitas vezes termina de um modo favorável, somen- te com os recursos do organismo. Haja vista também, o que é muito commum entre nós, os indivíduos habituados a soffrer de erysipelas, que, quando são atacados, não dão a menor importância e limitão-se a tomar um pouco de cerveja preta, ou outro qualquer antiphlogistico, com o fim somente de moderar o estado febril, e o mais deixão entregue as mãos da natureza, que, em certos casos, é a verdadeira therapeutica; estes indiví- duos, confiados em sua practica, procedem d'este modo, porque sabem que a erysipela tem de percorrer todos os seus períodos para então ter- minar favoravelmente. Não se segue, por ter-se moderado a marcha de uma inflammação, e acalmado certos symptomas, que seja possível sustar completamente sua evolução, diz Yidal de Cassis, e ainda exprime-se do modo seguinte: « je suis bien convaincu que de deux malades ayant un érysipèle également sim pie, celui que será abandonné aux seules forces de Tor^anisme en- trem pour le moins aussitôt en convalescence que celui qui aura cté sou- mis à un traitement perturbateur. J'ajouterai que Ia convalescence de celui que aura été soumis à un traitement perturbateur. J'ajouterai que Ia convalescence de* celui que aura été abandonné à lui-même será plus franche, et quil pourra plustôt se livrer à sesoccupations habituelles, car U na pas àrecouvrer des forces qu'il n'a pas perdues.» O professor Trousseau cita numerosos factos de erysipelas da face aban- donadas a si mesmo e tendo bons êxitos, usando unicamente da medir çina expectante, Devemos, todas as vezes que se offerecer occasião de tratarmos de ery- sipelas simples, aconselhar que os doentes conservem a parte affectada de phlogosis na posição a mais conveniente, afim de prevenir o affluxo de sangue para a parte; que usem dos laxativos e vomitivos nos casos de embaraço gástrico, e que emfim usem de bebidas acidulas e antiphlogis- ticas etc, Não podemos deixar de expor os differentes methodos de tratamento contra a erysipela, todos elles infruçtiferos para fazer abortar sua e- volução. O tratamento da erysipela da face tem sido motivo de grandes deba^ t#s entre a medicina expectante e a activa, superando em parte a primei-: 95 ra, pois é a que parece que devemos seguir, hmítando-nos a combater os symptomas que possam aggravar a moléstia; e confiados sempre na mul- tiplicidade de suas formas, é que não podemos sujeital-a a tratamento algum fixo. Dissemos superando em parte, nos casos em que a erysipela surpre- hender o individuo em boa saúde, e não nos casos em que vier no de- curso de uma outra moléstia qualquer, e em certas condições especiaes; porque então ella reveste-se de caracteres todos differentes, e sua gra- vidade dependerá, não d'ella, mas do estado geral de que é a expressão, como diz o illustre professor Trousseau. Um dos principaes meios empregados contra a erysipela por alguns practicos, é a phlebotomia, de que é partidário acerrimo o Dr. Bouillaud, que julga curar as erysipelas, empregando o seu mal entendido methodo de sangrar seguidamente. A experiência de muitos practicos, e d'elle mesmo, tem mostrado que este modo de proceder é errôneo; e que longe de deter a marcha e trazer a cura da moléstia, em certos casos vem aggraval-a; porque branquear uma erysipela, permittão-me a expressão, não é cural-a, nem mesmo mo- dcral-a, como diz o sábio Trousseau; pois tem-se visto cilas marcharem descoradas e preencherem o tempo determinado. A practica também tem mostrado que grandes perdas de sangue trazem accidentes ataxicos e prostração das forças, que devemos em todo caso poupar; principalmente se a erysipela tiver tendência a propagar-se.. Não negamos que alguns auctores citem casos de erysipelas sanadas por abundantes sangrias. Mas o que é também certo, é que não haverá perigo, em sangrar um individuo moço, vigoroso, e robusto, que apresentar uma inflammação e cephalalgia intensas, reacção febril notável, isto é, o pulso freqüente, cheio e duro; porque são estes dados que favorecem a indi- cação da sangria, que apenas servirá n'este caso para alliviar os doentes; pois não cremos que a duração da moléstia seja abreviada, nem tão pouco modificada sua marcha. O que resulta da sua applicação é que a superfície phlegmasica tor- na-se branca, em razão da subtracçãQ da matéria corante; e que depois a cor vae augmentando tranquillamente, e o edema produzido sendo subs- tituído pela phlegmasia primordial. Finalmente apresenta-se viva a ery- sipela com todos os seus caracteres para assim percorrer todas as phases de sua evolução. Vt .4 2ákoófo c/e têfo-, ££>>>. <%fa/íáj/a 2)it«ctot.