oi !■; si stí.\t\ Em Novembro de 1805 IWiS VOliTKP. O GRÃO ©E ©OüTDE SRl MEDICINA ÍIMI) M:.O.TIMO DE Slgoatiuljo 3oaquim ^tiituitcí* c bc CK illaria iraiicttKíi íia iBattd Ortfrllar 3ntunfií.( (Nuluivil dVsta cidade)* Otie le n.edeciniinmole sa \ ie» (Mitiéreau soula- j»iMiicii( de riiuiuaniló, (jifil soit peneire de res- pecl pour le carai-lère sacie du nialheur, et qu'ií se; moiilie compatissanl et genereux. Pour snulajjei une inloi lime, il faut souvent plus de c. . ', .11;1|S il|)|l,i(ri,(-„.s ., MVdicina. ri-miífo Rmir iv'i■? d ■Sil>;i. . . . Clumira c Mii>êr:>Iti^iü. Adriano Al.cs de l.ima liordilho. . . An ■ totui.-t de-erinli\a. 2." ANNO. Antônio de (>n| icin Piní>.....C íi-niii orgânica. ...........,. . . I*h\ (iordilho. . . Bepcti ão de anatomia dcácriptira. I..." ANNO. J lias Jc# 1'rdniía........Vn itoinia geral e pathologica. José de ti cs Sii|í:cíim......Pathologia geral. ..............Phvsiologia. 4." ANNO. Cons. Manoel l.ndislau Aranha Dant >s. Palhologia externa. Alexandre Jos de Oticifoy......Palhologia interna. «. ., ■ ». c ) Partos, moléstias de mulheres pejadas Mathias Moreira Sampaio.....j meninos recfmnascidos. 5.° ANNO. Alexandre Jws- de Queiroz.....Continuação de Palhologia interna. Joaquim Antônio dOliveira Botelho. . Matéria medica e therapeulica. José Antônio de Freitas......jAnatomia lopo :raphica, Medicina optra- ) lona c apparelhos. Secoão Ace«ssoria. José Igna«k) Secrã íemetrio Cyriaco Tourinho. Luiz Alvares dos Santos. . . João Pedro da Cunha VaJle. . . . ' í ^í50 Medica- Jeronymo Sodré Pereira. SECRETARIO. O Exni. Sr. I>r. Cinclnato Pinto da Mira. OFFICIAL DA SECRETARIA. O Sr» Br. Thomaz dAquino Gaspar. A Faculdade não approva, nem reprova as opiniões emittidas nas theses que lko *ã« apresentadas. BISST1ÇJ mmmmm®m PRIMEIRA PARTE. Homo interior totus nervus» Van Helmont, EFINIR a moléstia, emittir algumas opiniões á respeito de sua divisão, sede, natureza, e etiologia, apresentar os symptomas que a caracterisam, diagnostical-a, e dizer qual a sua terminação, é o caminho que temos em mira percorrer, antes de encontrarmos o marco onde in- screveremos o seu tractamento. Definição. O tétano é uma moléstia, essencialmente eãracterisada pela con- tracção permanente e mais ou menos violenta de uma parte, ou da to- talidade dos músculos submettidos ao império da vontade. Divisão* Conforme a sua marcha tem elle se dividido em agudo, chronico, c iníermittente. Trink chama recto aquelle em que a contracção muscular ..... " .....""" ' ' 3 —G— ataca os músculos extensores e fíexores, e curvo quando os flexores são os únicos affectados. Muitos authores ainda admittem a divisão do té- tano em geral, parcial, e tônico; porém a opinião geralmente abraçada, e acceita na sciencia consiste na divisão do tétano em espontâneo, ou idiopathico, e traumatieo ou symptomatico. Sede. A anatomia pathologica caminhando sempre em busca de um fu- turo brilhante, no seu progredir incessante na pesquiza e indagação dos factos; ainda não pôde conhecer, e apreciar a verdadeira sede d'esta terrível moléstia. É um problema a resolver-se, e assim com os co- nhecimentos até hoje adquiridos os anatomo-pathologistas consideram o tétano como uma meningite rachidiana, ou uma myelite, sendo incon- testavc1 que em muitos casos principalmente de tétano traumático, tem- se verificado a presença dos symptomas pathognomonicos d'estas lesões como sejam injeecão dos vasos, derramamento de serosidade, pús, e até amollecimento da medulla. Lepelletier assegura ser a moléstia pro- duzida por uma inflammação do nevrilema. Lambron encontrou uma inflammação na arachnoide docerebello, edos lobos posteriores apresen- tando toda a substancia da medulla uma cor rosea carregada muito vYiamfèstae Em alguns casos a medulla submettidaá exame minucioso tem sido achada completamente destruida em grande extensão. O Sr. Dubreil fr;;.r!do no louvável empenho de um perfeito conhecimento do mal, pensando, talvez que esta gloria lhe estava reservada, practicou a au- tópsia em desasete tetanicos, mas depois de longo trabalho trez unica- mente lhe revelaram a presença de matéria branca e solida depositada entre a arachnoide e a medulla espinhal, e nos outros notou apenas congestão intensa, a qual só por só não constitue caracter verdadeiro essencial e univoco, porquanto esta congestão é muitas vezes um phe- "omorjo cadaverico ligado ao gênero de morte, que levou a infeliz vic- mna ao túmulo. Certos pathologistas admittem o tétano como sympto- ma do amollecimento da medulla, principalmente dos feixes anteriores j os quaes presidem ao movimento; somente porque em alguns casos este amollecimento tem sido por ell es verificado. Alguns encontraram stase vmoça, as membranas envoltoras do eixo cerebro-espinhal coradas de vermelho, sem todavia notar-se a menor mudança na sua consistência. e tampem sem a existência de concrecão mórbida. —7— Lobstein encontrou como lesão um abcesso que situado atraz do oorpo das vertebras comprimia a medulla. Andral reconheceu a verme- lhidão dos gânglios semilunares. Outros authores dizem ser uma phleg- masia quer das meninges rachidianas, quer do nevrilema, e muitos fi- nalmente dão por sede da moléstia os cordões anteriores da medulla. Na mór parte dos casos porém, o exame posthumo confessando a sua fraqueza nada revela qu e oriente o practico acerca do mal, nem lhe diz onde é a sede da moléstia, contentando-se, na deficiência de recursos, em confiar ao futuro o descobrimento drestes importantes segredos da organisação humana. Sendo esta terrivel enfermidade conhecida por Hyppocrates, como se deprehende de seu aphorismo—vulneri convulsio superveniens lethale—havendo atravessado tantos séculos, e chegado até nós causando milhares de estragos, cortando o precioso fio de muitas vidas, e sacrificando grande numero de victimas, lastimamos não ser perfeitamente conhecida a sua sede; porque então melhor dirigido seria o seu tractamento. Considerando entretanto, que as lesões mais diversas do systema nervoso cerebro-espinhal teem sido apreciadas nos tetanicos, e que a congestão sendo muito freqüente não pôde comtudo caracterisar a mo- léstia, concluímos com o Sr. Grisolle, que até o presente não existe no tétano caracter anatômico que lhe seja constante. Reflectindo também que na maioria dos casos plenamente justifi- cados não existe lesão do encephalo, da medulla, dos nervos e seus in- vólucros, somos levados á dizer com muitos authores, que o tetáno é um phenomeno reflexo, tem sua sede na medulla, e portanto é uma nevrose. Natureza. A irritação inflammatoria a que attribuia-se o tétano não satisfaz o espirito, e com os conhecimentos até hoje adquiridos podemos dizer que esta parte da moléstia é ainda um desideratum na sciencia. Etiologia* Myriade de causas dá origem ao desenvolvimento do tétano. A idade não pode ser tida em pouca consideração. As diversas phases, pelas quàes vae passando o homem, não são garantias, nem ra- sões valiosas e poderosas que militem em seu favor. Observa-se ordi- nariamente que a criança logo ao deixar o seio materno, ainda envolta nas faxas infantis, é assaltada por esta moléstia conhecida com o nome -8- de trismus nascentium—mal das maxillas e vulgarmente denominada mal de sete dias. üm leite de má qualidade, bebidas indigestas, e a compressão do cordão umbilical são capazes e sufficientes de, por uma irritação sympathica, dar lugar á sua apparição. Não se deve dar menos importância ao trabalho de uma dentição difficil, e á presença de vermes nos intestinos assim como a introducção de corpos estranhos o que tudo se explica por uma acção reflexa da medulla. O sexo não deixa de ter alguma influencia, e na phrase do Sr. Gri- solle a moléstia apparece de preferencia nas mulheres; assim como lhe parece que os indivíduos fortes estam mais predispostos; no que não estam accordes muitos pathologistas; os quaes consideram, como causas predisponentes um temperamento nervoso e uma constituição fraca. As mulheres, durante o trabalho de um parto laborioso e difficil, teem suc- cumbido ao golpe d'esta moléstia, e o Sr. Fournier Pascay observou uni/ caso de tétano produzido por esta causa; cessando logo depois de termi- nado o parto. As influencias atmosphericas oecupara um lugar muito < importante entre as causas provocadoras do tétano. Os indivíduos expostos á acção de uma temperatura assás elevada se apresentam soffrendo d'estaaffecção; e muita vez sem outra causa que melhor traduza o facto. Quando a temperatura é quente e humida, como acontece na pas- sagem, ou mudança rápida de uma estação para outra; o tétano torna- se mais freqüente principalmente nos indivíduos dé cor preta, que mui- tas vezes por estarem debaixo da só influencia d'esta causa, apparecem tetanicos, sendo de admirar a facilidade, tendência, e disposição d'estes" indivíduos a contrahirem similhante moléstia. Ainda a respeito da temperatura citamos um facto observado pelo Sr. Larrey. Este reconheceu que depois da batalha de Moscow, sendo excesr sivo e insupportavel o calor, houve pequeno numero de indivíduos tetar nicos; e que depois da batalha de Dresda um tempo frio e humido, suc- cedendo a grande elevação de temperatura os feridos morreram victi- mas d'esta aflecção. Quanto ao ar frio e humido produzindo o tetáno; fomos testemu- nhas de um facto. Uma preta africana tendo no braço um lipoma veio ao hospital, e pediu ao nosso lente de clinica para extirpal-o. Submettida á operação—esta foi feita com muita delicadeza e pe- rícia; mas a doente sendo entregue aos cuidados.das enfermeiras nâo —9— quiz ficar no hospital, e caminhou até a sua morada, que era além do Campo Grande. O dia estava chuvoso; a doente submetteu-se á uma marcha forçada, a qual não estava era relação com as suas forças, visto que acabara de soffrer uma operação; o resultado foi que no dia se- guinte voltou ao hospital accommettida de tétano bem caracterisado, do qual succumbiu no dia seguinte. O Sr. Bajon, diz, que o tétano é freqüente nos lugares visinhos, ou banhados pelo mar; e procura justificar-se, declarando que, nades- cripção feita da ilha de Cayenna, n'uma aldeia que estava ao abrigo do mar em virtude de uma vasta e expessa floresta, eram alli desconheci- dos os casos de tétano, mas depois que a floresta foi destruída a molés- tia tornou-se tão freqüente, como nos pontos da ilha mais desfavoravel- mente situados. Além das causas apresentadas, outras em grande copia dão nasci- mento ao tétano. As feridas feitas por armas de fogo offerecem milha- res de exemplos, principalmente quando as partes molles são dilace- radas, contundidas, elevadas a esmagadura, ficando d'est'arte reduzi- das á papa. Quando um membro é levado pelo projectil, quando os tendões rompem-se, as aponevroses e essencialmente os nervos são despedaça- dos, ou incompletamente cortados, quando emfim esquirolas ósseas fe- rem filetes nervosos ainda se observam os mesmos phenomenos. Nos casos de amputação praticada principalmente nas extremidades dos membros o resultado quasi certo, a conseqüência provável é o tétano. Independentemente das feridas de armas de fogo, outras também dão lugar ao seu apparecimento. Na África dizem Roche e Sanson, basta muitas vezes um simples ferimento feito no pé de um preto com um espinho, um pedaço de vidro, um prego, emfim, para que elles sejam victimas. Entre nós succede o mesmo. Entretanto porque motivo são os indivíduos de cor preta afíectados em maior escala? Dependerá isto de. uma causa orgânica, de uma disposição congênita, até hoje segredo para a sciencia? Poderemos explicar pelo gênero de vida que levam? Condemnados á toda casta de misérias; vivendo uma vida cheia de pri- vações; as regras hygienicas sendo por elles completamente desconheci- das, estas infelizes creaturas submettem-se ás mudanças atmosphericas sem a menor reserva,e quandoferidos dão nenhuma importância aos seus incommodos, contentando-se com a applicação de substancias cada qual mais extravagante, suggerida pela superstição, brutalidade, e íít- 3 — 10— norancia, que desenvolvidas no berço, os acompanham até a sepultura. Em um caso assignalado pelo Sr. Papillaud a applicação de um vesica- lorio foi seguida de tétano mortal; e o Dr. Treille tendo alguns feridos confiados aos seus cuidados, viu esta moléstia desapparecer desde o mo- mento em que os curativos, até então feitos com aguardente campho- rada, e outras substancias irritantes, foram substituídos pelo uso da água simples. Nem sempre o tétano é relativo á intensidade ou gravidade das feridas. Tem-se visto, que muitas vezes elle desenvolve-se em virtude da uma simples escoriação, a qual passaria desapercebida e sem a menor importância, se não sobre viesse este grave accidente. Uma gazeta medica dos hospitaes de Pariz, diz que um abcesso ^anglionario aberto espontaneamente produziu o tétano. Um indivíduo entrou para o hospital tendo um tumor ganglionario ulcerado, e engor- gitamentos no pescoço. Havia decorrido um mez que uma das adenites chronicas, que tinha a sua sede sobre o bordo posterior do músculo sterno cleido mastoide ao nivel da parte media, transformara-se n'um abcesso frio, e abrira-se. O doente a principio tinha applicado unicamente cataplasmas emol- lientes, e mais tarde fios untados de ceroto simples. Na véspera de sua entrada no hospital o doente sentiu rigesa na maxilla, e este estado pro- gressivamente augmentou a ponto de no dia seguinte elle não poder afíastal-a. Queixava-se também de dores na nuca, e viu eontrahidos todos os músculos do pescoço. A ferida era formada por uma abertura irregular com os bordos descollados e lividos. No dia immediato os incommodos aggravararn -se e as dores até então limitadas á nuca, estenderam-se por uma maior superfície. A cabeça ficou voltada para traz, e o doente experimentava tamanha eonstriecão no pharynge, que não lhe permittia deglutir a própria sa- liva. A anciedade era extrema, o soffrimento desenhava-se no seu sem- blante cyanosado, banhado de um suor frio. Foi submettido á um trac- tamento conveniente, mas no terceiro dia o doente, congestionando-se cada vez mais, e a contracção invadindo os músculos inspiradores, suc- cumbiu. A autópsia revelou a existência de congestão cerebral da sub- stancia branca e da medulla, e de injeccão passiva das meninges. O _n— tétano desenvojvido n'estas circumstancias seria produzido pela incisão do abcesso? A resposta é negativa, porquanto a sua abertura foi espon- tânea; como a lesão tinha sua sede sobre o trajecto dos nervos do sen- timento, é possível admittir uma nevrite, ou desnudação de um nervo pelo pús, e por conseqüência uma lesão consecutiva capaz de dar lugar a manifestação do tétano. Não passa isto de simples hypothese. Tracta- va-se de um tétano consecutivo á uma ferida em supuração, e como os nervos estavam próximos á ferida, deve o tétano de que se tracta, ser considerado traumático. Na apreciação das causas do tétano não se deve deixar em silencio, a tristeza, o abuso dos prazeres venereos, as bebidas alcoólicas em ex- cesso, a nostalgia, uma emoção viva, o medo, o resfriamento, que muito concorrem, ou antes são outras tantas origens do tétano es- pontâneo. Symptoniãtologia. Dous distinctos pathologistas, os Srs. Roche e Sanson, dizem não existir symptomas, que devam ser considerados como prodromos do té- tano, porquanto aquclles até agora assim admittidos se apresentam acompanhando a muitas outras aflecções. Somente deve-se receiar o ap- parecimento do tétano em um ferido, quando a sua ulcera se tornar muito dolorosa, e mais ainda quando o doente agitado de alguns movi- mentos convulsivos, ou nervosos, e accommettido de rápido terror e es- panto desconfiar do seu estado. Valleix, cuja practica não pode ser con- testada admitte o frio, o estado de mau estar [malaise dos Francezes) o abatimento, a insomnia, e vertigens como prenuncios da moléstia; e também nós cremos, que todas as moléstias tem prodromos, e se muita vez escapam á apreciação do practico, é porque este é chamado quasi sempre nos últimos momentos, ou quando a moléstia atravessando a primeira phase de sua evolução reveste-se de symptomas claros, ca- racterísticos, e univocos, os quaes induzem o clinico ao verdadeiro e exacto diagnostico. Phenomenos muito importantes dão um cunho especial â moléstia. Entre elles domina a contracção tetanica, a qual é o symptoma essen- cial denunciador da scenatregica, que vae representar-se no corpo vivo. Manifesta-se no pescoço um sentimento de rigidez, a qual tornando-se mais intensa difficulta, e até impossibilita e aniquila os movimentos n'esta região. Os músculos escolhidos pela moléstia para sua sede são —12— agitados por movimentos convulsivos, os quaes ao principio fracos, ra- ros, e de pouca duração assumem gradualmente mais energia, frequen- tia, e prolongação; ao depois contrahidos ficam rígidos e immoveis; op- pondo assim uma resistência difficil de ser superada. O ventre tenso não se deixa deprimir. O Sr. Guines observou um tetanico, cujo peito sof- freu tão grande movimento de elevação, que as falsas costeilas estavam.. descollocadas e levadas para cima. Em alsmns casos é tamanha a contracção desenvolvida nos museu- los affectados, que ha despedacamento, e rompimento de muitas fibras. dos músculos antagonistas d'aquelles em que a contracção se manifes- ta. Pouco tempo é bastante para que a contracção invada todo o corpo, de sorte que os músculos extensores fazendo antagonismo aos flexores, o individuo representa, ou parece uma estatua, que pode ser levantada por uma de suas extremidades; fazendo suppor ao observador, que o corpo do doente é formado por uma só peça, ou então que as articula- ções soldaram-se, ou anchylosaram-se. O calor do corpo guarda a sua normalidade, e também o pulso conserva-se no mesmo estado. Muita vez porém a pelle é quente, árida e secca. Do lado do apparelho diges- tivo observa-se que a sede augmenta, quando a contracção dos músculos do pharynge e esophago se oppõe á deglutição. O doente tem apetite, mas nos casos de dysphagia a fome une-se ao desejo insaciável de mi- tigar a sede intensa, que, abrasando o peito ao infeliz doente, condem- na-o ao supplicio de Tantalo, e fal-o morrer extorcendo-se em horrível desesperaçãoü! Os esphincteres convulsivamente contrahidos produzem a constipação de ventre, A emissão da urina, não sendo presidida por leis physiologicas, é acompanhada de estranguria, dysuria, e muitas vezes nem uma gotta é expellida, porquanto a isto se oppõe a ischuria. Tem se notado que em alguns casos as dejecções, e a emissão da urina se fazem involuntariamente; devido istoá contracção forte dos músculos das paredes abdominaes, que por seu turno obrando sobre os órgãos ahi contidos, força-os á expulsão das matérias n'elles encerradas. Quando os músculos respiradores são accommettidos pelo tétano, e por tanto conYulsionados, uma asphyxia lenta se estabelece. Nos últimos instan- tes da vida os batimentos do coração tornam-se tumultuosos, desorde- nados, e irregulares; talvez porque este órgão participa da rigidez dos outros músculos, ou por causa das perturbações da circulação produ- zidas pela asphyxia. Os lábios ficam lividos, a face e o peito banham-se de um suor -15- frio, e o doente morre empregando inúteis esforces para respirar. A voz quasi sempre conserva o timbre normal. A palavra é alterada, e ou- vida entrecortada pelos abalos dos músculos do pharynge e base da lingua. Nem sempre a moléstia offerece um quadro tão completo, nem cores tão carregadas. Algumas vezes o tétano desenvolve-se nos múscu- los da maxilla, constituindo o trismo que é a sua forma mais ordinária. O doente aceusa dor leve na nuca, pequena rigidez no pescoço, e alguma difficuldade na deglutição. Ao depois a rigidez augmenta, a dysphagia é mais pronunciada; e a maxilla inferior menos livre em seus movimentos. A rigeza apodera-se pouco a pouco dos músculos levanta- dores, que a approximam gradualmente da superior, e a contracção n'elles desenvolvida é tão forte, que ás vezes a lingua .é cortada, e um ou ma\s dentes quebrados; e será mais fácil romper os músculos que se atacam aos maxillares, do que affastal-os; não obstante não ser imme- diata a aproximação d'elles; visto que sempre existe um pequeno es- paço por onde se escoa grande quantidade de saliva viseosa, e d'este in- tervallo, ou dovasio deixado por um ou mais dentes utilisa-se muitas vezes o praetico para a applicação do medicamento. O olhar é fixo, a fronte enruga-se, as palpebras immoveis cahem sobre o globo ocular, sem comtudo cobril-o. A contracção invadindo todos os músculos da face; segue-se que a base do nariz é puxada para baixo e para traz. As commissuras dos lá- bios dirigem-se para forav As bochechas retrahem-se procurando os temporaes; pelo rque ha uma alteração profunda na physionomia do indivíduo. Ha o quer que seja de horrível e sobrenatural. Em sua face está desenhado o espasmo cyr.ico, e o riso sardoriico. Quando as contracções espasmodicas oecupam as partes anterio- res do tronco, e os músculos flexores; a moléstia reveste a forma do emprosthotonos; o qual attingindo o mais alto grau dá ao tronco o as- pecto de um arco de concavidade anterior. A parede anterior do abdômen é tensa e applicada a columna ver- tebral, que dobra-se para adiante. As extremidades convergem para o umbigo. A cabeça e os membros são forçosa e imperiosamente contra- hidos, de modo que o membro fixa-se ao externo, os joelhos encostam- se á região epigastrica, e os calcanhares ás nádegas. Os cotovelos no estado de flexãoapproximam-se doshypochondrios. A contracção dos músculos da parte posterior do tronco determina 4 ■ —14— o opisthotonos; cujos phenomenos são diversos aos que se passam no cmprosthotonos assim o tronco descreve um arco de convexidade ante- rior. Os membros e a cabeça ficam n'uma extensão forçada, pelo que o doente descanca somente sobre ella, e os calcanhares. Em casos menos desenvolvidos ha somente curvadura do tronco para traz. Faltaremos também de um modo de manifestação do tétano conhe- cido com o nome de tétano lateral, ou pleurosthotonos. A contracção é n'um dos lados do tronco, e pescoço; o que dá lugar á uma curvadura lateral, de maneira que a cabeça vae de encontro á espadua, e o quadril dirige-se para o lado correspondente do thorax. Este é o caso mais raro. No meio de .tamanha desordem; a intelligencia conserva-se intacta na continuação dos seus actos, o que é mais uma prova de que a sede do tétano não reside no cérebro, porquanto se assim fora, sendo este o instrumento de que se serve a intelligencia para exercer suas funcções; uma aberração qualquer, um desarranjo seria a conseqüência, visto que o cérebro doente e alterado não pode regular e harmonicamente trabalhar. Diagnostico. Reconhecer o tétano não é difficil. O seu começar quasi constante pelo trismo; o caracter continuo, e tônico das convulsões com exacerba- cões dolorosas, a invasão quasi geral dos músculos voluntários põem, fora de duvida a existência da moléstia. Não a confundiremos com outras nevroses, porque cada qual tem um symptoma que lhe é peculiar; que lhe pertence exclusivamente, e que discriminando-a d'entre as outras moléstias estabelece o diagnostico differencial. Prognostico. E' mais um túmulo que se abre para esconder em seu seio a vic- tima offerecida em sacrificio? Os estreitos, e fortes elos da cadeia da vida solvem se ao sopro gélido da morte! A sentença eterna pendida dos lábios do Creador mais uma vez é irrcsistivelmente cumprida? A victima até então embalada em doces esperanças, luctando com a morte deixa-se levar de vencida? O tétano c quasi sempre fatal. A sciencia conta poucos casos felizes. Quando o letano segue uma marcha aguda uma asphyxia vem trocar a vida pela morte do indivíduo; e nós presenciamos um facto d'esta ordem. Um africano entrou para o hospital accommettido do tétano proj veniente de umas pancadas que soffreu. Na occasião da visita do medico; elle estava deitado sobre o ventre; fazendo porém um pequeno esforço para mudar de posição foi rápida, e instantaneamente victima de uma asphyxia. Mais prompta não seria a morte produzida pelo raioll Quando porém o tétano perdura mais dias, o doente morre de um esgoto ner-^ voso. A terminação grave é modificada, segundo o tétano é traumático,! ou espontâneo, attribuindo-se mais perigo ao traumático, Temog visto^ e sabido de muitos casos infelizes. SEGUNDA PARTE. Toules les fois qu'une médication quelcen- que est vanlée dans le Iraitement du tétanos, il s'éléve d'abord dans 1'esprit une juste idée de dcfiance, car peu de nous ont vu échapper á lá mort ceux qui avaient élé atteints par le tétanos traumalique. Ce n'est pourtant pas une raison pour ne tenler aticum essai et pour rejeter comme apocnphes les fails de guérison cites pour di- vers auteurs. (Trousseau et Pidoux). therapeutica do tétano não assentando sobre bases bem definidas ressente-se ainda hoje, apezar dos progressos da medicina, de um empirismo grosseiro. Muitos e variados são os medicamentos até agora aconselhados, mas de nenhum d'elles lança mão o practico com a mesma confiança e segurança; assim como prescreve a ipecacuanha no tractamento da dy- sinteria; o mercúrio para debellar a syphilis, e o sulphato de quinina na cura das febres intermittentes. Os pathologistas que filiam o tétano á uma inflammação sobrevinda na medulla, ou nas membranas que lhe servem de invólucro, tiveram muita rasão quando aconselharam as sangrias para combater o ele- mento phlegmasico. Com este intuito muitos practicos recorreram ao tractamento ^ntiphlegmasico; e abriram a veia aos tetanicos, practi- cando largas e repetidas depressões sangüíneas, sempre porém em re- lação com as forças do indivíduo, e com a intensidade, e marcha da moléstia. Não se pouparam á applicacão de sanguesugas por toda a ex- 5 —Í8— tensão da columna vertebral, cujo numero caminhando n'uma progres- são ascendente, excedeu a quinhentas; com o que tirou-se algum pro- veito. O Sr. Lisfranc teve a felicidade de no espaço de desenove dias curar um indivíduo que se apresentou soffrendo de tétano espontâneo. Para tal acquisição fez desenove sangrias, e applicou setecentas e cin- coenta sanguesugas. Lepelletier foi bem suecedido, quando durantedous dias e meio practicou cinco sangrias de um kilogramma cada uma, e é o próprio a confessar e proclamar, que as sangrias abundantes e reite- radas até a desapparição dos accessos devem oecupar o primeiro lugar entre os meios therapeuticos indicados. O Sr. Jobert partilha da mesma opinião. Ao passo que estes dão tamanha importância á tal methodo de cura, outros o repellem como prejudicial. Berard e Denovilliers se oppoema este tractamento; e procuram jus- tificar-se, dizendo que a moléstia não é inflammatoria, porquanto o sangue extrahido da \eia nào se apresenta coberto com a codea caracte- rística. Mais tarde Boyer querendo conciliar os ânimos, e fazer desap- parecer a divergência das idéas, ensina que recorra-se á phlebotomia uma, duas, ou mais vezes; quando o doente de temperamento sangüí- neo estiver plethorico; e quando houver suppressão de uma hemorrha- gía supplementar considerada até então como salutar, por exemplo uma epistaxis n'uma mulher, cuja menstruação é difficil; ou uma hemoptises benigna n'um indivíduo, que por uma causa accidental viu desappare- cero fluxo hemor hoidal, á que estava habituado. Se accidentes inflam- jmatorios ameaçam a vida do doente o practico não receie sangrai-o. O Sr. Andral não hesita em reconhecer que no tétano convém recorrer ao tractamento antiphlogisüco muito rigoroso; e que além das sangrias ge- raes, é mister a applicação de sanguesugas não só na região rachidiana, mas também leval-as a maxilla enuca. Nós acompanhamos aos practicos que assim se pronunciam em favor da sangria; e seguimos aos Srs. Ro- ehe e Sanson; que exprimem o seu modo de pensar e proceder n'estas palavras:—On obtiendrait probablement plus de guérisons par Ia mé- thode antiphlogistique que par toute nutre, si ou Temployait avre moyn de limidité dans cette redoutable mal adie. Vai cas remarquable de gué- rison, dü evidemment à Tactivité du ti aiiement, a élé publié par M. le doucteur Pelletier. Six saignées de deux liv eschacuneont été practiqaées par ce medccin, et le suecés a couronné sa hardiesse. Nous n* esiterions pas a imiter cette conduite en pareille circonstance. Dans les maladies presque constamment mortelles,1 ou di.it tout tentcr, peurvu que cela — 19— soit rationél. Também Hufeland havia dicto:—Si le malade est en dan- ger de mort risque tout pour le sauver, même ta reputation. 0 sulphato de quinina empregado com proveito nas febres intermit- tenles quiz estender sua acção benéfica sobre a infeliz victima do téta- no. O "Sr. Briquet considerava que os saes de quinina não correspon- diam á espectativa desejada, ao contrario o seu emprego era acompa- nhado de maus resultados; atlribuindo e concedendo toda a primasia ao ópio que | ara elle é o medicamento heróico, e o remédio principal. En- tretanto exisle grande numero de observações de tétanos tractados, e cu- rados por meio do sulphato de quinina. Assim Carlos Fruáteve occasião de ser chamado para acudir a um doente de tétano, e pol o restabeleci- do, e curado com esta substancia ministrada na dose de quinzedecigram- mas. O Sr. Maxence observou um tétano combatido inutilmente pelo ópio em dose elevada; e lambem pelos calomelanose fricções por espaço de vinte dias. Deu-se então ao doente sulphato de quinina nas doses de dous a trez grammas por dia, e immediatamente houve diminuição notá- vel na contracção; e a cura operou-se no fim de vinte dias. O tabaco tem sido aconselhado, e conta em seu apoio alguns casos felizes. Applica se esta substancia em clisteres sendo um escropulo de fo- lhas de tabaco para oito onças d água, e augmenta-se a dose conforme os-effeitosprodusidos. Entre nós alguns practicos dizem ter obtido muito resultado, dando banhos geraes com o cosimento do tabaco. E um clini- co inglez Curling considera-o como o melhor remédio até agora conheci- do pa.a combater o tétano, dizendo que ainda não teve o desgosto de perder um doente todas as vezes que este meio tem sido administrado de um modo conveniente, e completo antes do enfraquecimento das for- ças vitaes. A dose deve estar em relação com a idade, constituição e há- bitos do indivíduo, de modo que uma dose maior deve ser dada á aquel- les, que indirectamente concorrem para o seu deperecimento, e aniqui- lamento, usando, ou abusando desta substancia. *m virtude da acção estupefaciente, de que é dotada a substancia que discutimos, ao seu em- prego succede profunda prostração; e para dar-se a reacçõo é necessário levantar e sustentar as forças do padecente por meio dos tônicos. E'contraindicado aos indivíduos muito enfraquecidos pela moléstia, e condemnados á extremo abatimento. Não devemos elevar a dose, porque a reacção pode não ter lugar no organismo, e o doente suecumbir. —20— Os mercuriaes administrados externa e internamente gosam dé al- gum conceito; tanto que Trink considerava-os superiores ao ópio; não obstante alguns práticos trazerem estatísticas, mostrando que estas pre- parações aproveitavam, quando eram associadas ao tabaco ou ao ópio. Os banhos mornos, prescriptos porBajon parecem hoje proscriptos. Muitos indivíduos, que se submetteram á este tractamento, experimen- taram os seus funestos effeitos, ou porque as crises augmentavam com o esforço que fazia o doente para mudar de posição, e collocar-se no ba- nho, ou talvez pela acção do próprio meio indicado. Muitos tetanicos sentiram-se peiores, e outros mais desditosos morreram no banho. Os revulsivos sobe o canal intestinal são sempre favoráveis ainda que de umeffeito secundário. Para o Sr. Rochouxas verdadeiras bases do tracta- mento são simplesmente a dieta, o repouso, uma posição conveniente, as bebidas diluentes, clisteres emollientes, e banhos mornos. Os purgativos servem para combater a constipação produzida pelo ópio, e quando suspeita-se a presença de vermes nos intestinos. Os banhos frios tiveram seus partidários, e sectários. Depois de haverem exposto o corpo a acção d'agua fria, deita-se o doente n'uma cama bastante aquecida, e dá-se-lhe grande quantidade de ópio, e assim continua-se por algum tempo até a desapparição das crises. Comquanto a bydrotherapia tenha estendido a sua força medicatrix a ponto de ser lembrada para combater tubercul >s pulmonares; todavia estamos con- vencidos, ou ao menos persuadidos de que deveu-se ao ópio de conco- mitância empregado os felizes resultados obtidos pelo Sr. Fournier Pascay. Os sudorificos foram lembrados por Trink nos casos em que a mo- léstia é devida á suppressão brusca da trans^iração, á um resfriamento súbito; e Fournier Pascay diz ter curado á cinco tetanicos por meio de bebidas sudorificas; não declarando quaes as substancias empregadas. Quando o tétano desapparece debaixo da influencia de uma causa mais ou menos enérgica, o corpo do doente banha se de um suor abundante; e durante este periodo os músculos relacham-se até voltarem ao estado normal. Levados por esta experiência os Srs. Berard e Denonvilliers aconselharam no tractamento do tétano, de preferencia, os banhos de vapor. —21 — A bellãdona não passou desapercebida no tractamento d'esta ne- vrose. Quem compulsar as paginas de Matéria Medica de Trousseau e Pi- loux lera o seguinte. Le docteur Lenoir a publié, il y a quelques années, quatre faits de guérison de tétanos traumatique obténue par 1'emploi de Ia saignée, suivie de celui de bains de vapeur, et de Ia belladone á dose elevée. II commence par des vigoureuses saigneés, et, immédiate- ment aprés, il fait prendre matin et soir uu bain de vapeur de deux heures au moins. En même temps il administre, dans le courant de Ia journée, des doses de belladone pour amener un peu de stupéfaction. II prolonge cette medication jusqu'au morcent on les espasmes entiè- rement dispam, et encore quelques jours par de lá. O ammoniaco foi julgado por alguns practicos, como o meio ma- nos infiel para debellar o tétano, e quando este medicamento é prefe- rido, deve-se prescrevel-o em alta dose, podendo ser administrada meia onça d'elle no espaço de vinte quatro horas; havendo sempre da parte da pessoa encarregada do doente, o cuidado de fraccionar as doses. A pomada mercurial applicada em fricções nas maxillas, no pes- coço, e por toda a superfície da columna vertebral, tem sido acompa- nhada de felizes resultados no tractamento do tétano, principalmente espontâneo. A potassa cáustica foi empregada na mesma moléstia por Antheane de Tours. Elle mergulhava o tetanico n'um banho contendo uma á quatro onças de potassa cáustica. Demorava-o dentro d'agua ate á ap- parição da resolução dos membros. Repetia os banhos por muitos dias. até que os espasmos houvessem totalmente desapparecido. O curara trazido como medicamento contra o tétano não gosa ainda hoje d'este previleizio. Claude Bernard que fez um estudo especial d'esta substancia em relação ás suas propriedades no organismo, tendo visto que a absorpção e acção tóxica eram mais promptas quando adminis- trada pelo recto ao passo que inertes quando ingerida no estômago; ainda mais depois de suas lindas experiências, reconhecendo que o cu- rara tinha uma acção especial sobre os nervos que presidem ao movi- mento terminando assim se exprime—Le curare employédans le tétanos ferait cesser les convulsions. II ne guérirait pas pour cela. ti —22— O chloroformio, que tantos serviços tem prestado a cirurgia, fa- zendo com que o operador com mão firme, e surdo aos gemidos de seus doentes practique operações importantes, foi lembrado n'esta affeciio; entretanto é um meio do qual só em ultimo caso se deve lançar mão, por quanto in extremis morbis extrema remedia exqúisite optima. Cer- cado de graves perigos o chloroformio estendendo sua acção anesthesica por toda a organisação trará em curto espaço de tempo a morte do in- divíduo por meio de uma asphyxia, ou syncope. Alguns casos lisongei- ros, piincipalmente de tétano espontâneo, são referidos em abono d'esíte medicamento; entre elles existe um do Dr. Bargily, o qual assistiu a um caso de tétano traumático muito violento, que cedeu ás inhalaçõea do chloroformio continuadas por algum tempo, de modo a produzir uma anesthesia constante por espaço de uma hora. Mais outro exemplo de cura é narrado pelo Sr. Baudon; entretanto os doentes tinham sido por alguns dias submettidos ao uso do ópio, o da belladona em altas doses. Certos empregam em vez de ihhalações, fricções exercidas por trez vezes com vinte grammas de chloroformio. Seremos sempre muito reservados; e só nos momentos desespera- dos recorreremos a chloroformisação. O tartaro emetico em dose crescida passa como excellente meio contra o tétano. O Sr. Valleix cita um facto notável do Dr. Ogden, o qual tendo dado a um tetanico enormes porções de ópio, sendo qui- nhentas gottas de tinetura, e oito grãos de extracto, no decurso de vinte quatro horas, não percebeu modificação alguma nos symptomas; appli- cando ao depois o tartaro emetico ainda associado ao ópio, e ajuntan- do-lhe quatro gottas de óleo de croton, o doente teve evacuações alvinas abundantes, e em pouco tempo ficou restabelecido. O ópio é o medicamento sempre empregado no tétano. A tolerân- cia do organismo é tão extraordinária, absorvendo este precioso remé- dio, que os practicos chegam a dar aos doentes quantidades de ópio ex- cessivas, sem comtudo notarem os phenomenos narcóticos, que soem desenvolver-se no estado physiologico, quando algumas gottas delau- dano são ingeridas pelo indivíduo. Consistindo a moléstia n'uma excitação do systema nervoso motor, 4 necessário, para que elle volte ao estado normal, que as doses sejam augmentadas, havendo d'est'arte uma relação entre o grau de exaltação. —23— e a substancia dotada da propriedade de produzir a sedação do mesmo systema. E' o medicamento coroado de mais felizes resultados, e pelos Srs. Wliitte Chalmers considerado especifico. Das estatísticas de Curling conclue-se, que o ópio aproveita principalmente no tétano espontâneo. Trink quer, que elle seja administrado após curtos intervallos, a ponto de attingir-se immediatamente os últimos limites prescriptos pela pru- dência. Os Srs. Berard e Denonvilliers dizem, que as doses podem ser maiores, do que aa aconselhadas em qualq ter outra moléstia, sem to- davia determinar phenomenos de envenen imento. Glater prescreveu a um doente setenta e cinco grammas de ópio no espaço de desesete dias. Os Srs. Trousseau e Pidoux citam em seu tractado de therapeutica muitos tétanos tractados com proveito pelo ópio em doses espantosas; e as- sim Mouro viu dar-sea umdoente centoe vinte grãos de ópio durante um dia sem sobreviremaccidentestóxicos. Chalmers assistiu a um doente, que tomou uma onça de tinctura thebaica no mesmo espaço de tempo. Mur- ray citou o exemplo de um homem restabelecido, depois de haver toma- do durante muitos dias consecutivos mais de vinte onças de laudano, sem que esta incrível dose produzisse immediatamente somno, nem a reso- lução do espasmo. Gloster falia de um tetanic > restabelecido depois de ter tomado trez onças de ópio. Litteton combateu o tétano manifestado em dous meninos de dez annos administrando a um no espaço de um dia tjma onça de laudano liquido e ao outro quatorze oitavas de extracto de ópio em doze horas. Estas observações que acabamos de referir ou reproduzir, levam-nos a insistir na applicacão d'esta substancia, todas as vezes que assim se fizer mister. Emquanto os accidentes persistem, ou tornam-se mais pronuncia- dos e fortes, devemos ir augmentando gradualmente a dose, até que elles tenham diminuído; não cessando senão depois que muitos dias houve- rem decorrido sem o apparecimento das contracções; porquanto tem se reparado, que muitas vezes ellas declinam para depois reapparecerem mais enérgicas a ponto de matar o doente. Devemos dar o ópio pela bocea, emquanto a isto se não oppuser o trismo, mas logo que elle se manifeste, applicaremos o remédio em clisteres, 9 pelo methodo ender- mico, servindo-nos para isto das soluções de continuidade, quando trau- mático; e dos vesicatorios se o tétano for espontâneo: um medico ita- liano diz ter obtido dous curativos empregando a morphina pelo me- thodo endermico. Apezar de tantas experiências que attestam a efficacia —25- deste medicamento, é por alguns pric icos considerado empírico o uso do ópio no tractamento do tétano; porque, dizem elles, parece não haver relação alguma entre as modifica1, ões nrodnzidas pelos preparados the- baicos, modificações que se dão quasi exclusivamente na massa ence- phalica, e as perturbações características do tétano, perturbações, cujo ponto de partida só na medulla espinhal se deve rasoavelmente consi- derar. A' esta objecção responde o distincto practico portnguez o Dr. Souza Martins.—Se rcflectirmos que as duas secções do systema ner- voso central, a intracraneana, e a inlrarachidiana, comquanlo dotadas cada qual de sua acção própria, se acham pela anatomia e pela physio- logia tão intimamente unidas para o desempenho da grande funcção nervosa, que em certos casos as alterações de uma se fazem sentir, e se podem medir pelas altarações da outra: se admittirmos que a excessiva vitalidade da parte meduüar deve diminuir tanto mais, quanto maior for a sédação da parte encephalica, acharemos a rasão pela qual o ópio diminuindo a vitalidade do cérebro vae abater indirectamente as exalta-. das propriedades da medulla es.inlial, e operar a cura do tétano. Apontamos outras substancias também aconselhadas no tetanor como sejam a camphora, o musgo, o castoreo, e a essência de there- bentina, não ficando no esquecimento a electricidade, a cauterisação e a secção do nervo porém o empivg» d'estes meios tem sido sempre unido ao do ópio, de modo que é impossivel reconhecer a acção especial de cada um d'elles. Na apreciação dos meios empregados para curar o té- tano, não devemos passar em silencio uma preparação feita pelo nosso mestre o Illm. Sr. Dr. Cunha Valle, com aqual mais de uma vez tem elle colhido bons resultados. Temos muita satisfação em leval-a ao conhe- cimento dos practicos, desejando que todos sejam bem succedidos admi- nistrando este remédio, todas as vezes que assim houver mister. Eis o que diz o mesmo Sr. Dr. Cunha Valle. No tractamento do té- tano tenho empregado por varias veses a tinctura do gyrasol. Em dous casos, um de tétano espontâneo, outro de traumático, em soccorro dos quaes intervim a tempo, o resultado tem sido infallivel, e os doentes que teem succumbido, teem sido os que tarde submettem-se ao meu tractamento. E' notável que os doentes, a que me refiro, deno- tam pelo estado saburral da lingua más disposições das primeiras vias, o que me tem levado a lançar mão do tartaro emetico em dose vomi- tiva; afim de preparar o estômago a recepção e absorpção do gyrasol^ —25— Este tenho administrado em cosimento misturado á um adjuvante al- coólico, que é ordinariamente a aguardente, ao menos emquanto se pre- para a tinctura; para cuja maceração são necessários pelo menos oito dias. Esta tinctura de que sempre tenho em reserva; depois dos felizes successos com ella obtidos, uma porção sufficiente para acudir ás exi- gências repentinas, compoem-se proporcionalmente de uma corolla (pé- talas e ovario) e quatro onças de aguardente forte de 24° á 26e. De hora em hora administra-se ao doente, se é adulto, depois do vomitorio, um calix de tinctura simples, ou do cosimento bem forte do gyrasol misturado com duas colheres de álcool; para uma creança a dose é a metade menor, ou duplo o espaço de tempo em que se deve em- pregar o medicamento. Em todo caso, quer se tracte de um adulto, quer de uma creança, quer se administre a tinctura simples, quer a mistura do decocto e do álcool, addiciono uma colherinha de julepo almíscarado, e mando dar banhos geraes prolongados e quentes, quanto possam ser supportados pelo doente. Estes banhos compoem-se de aguardente na dose de meio pinto para doze de água. A' proporção que as convulsões di- minuem de intensidade, ou espaçam mais seus accessos, compete ao medico assistente modificar suas applicações. As vezes no decurso do tractamento é conveniente interrompel-o para de novo fazer vomitar ao doente ou desafiar-lhe as dejecções alvinas pelo óleo de ricino ou infusão de senne tartansada. Podem contestar, como já se me tem feito, a effica- cia do gyrasol no tractamento d'essa nevrose, attribuindo-se ou ao álcool ou ao julepo almiscarado o protogonismo na cura da moléstia; a isto só tenho a responder, que, tendo tractado muitos tetanicos, não só com o almiscar e a aguardente, como com o ópio, o tabaco, acanabina, oether, o chloroformio &c., nunca logrei a suprema alegria, com que por duas vezes tem coroado os meus esforços médicos, o incomparavel medica- mento, que eu folgo em submetter ao domínio de meus collegas em pro- veito da humanidade paciente. Gomo o gyrasol, muitos outros vegetaes existirão no nosso paiz; dotados de idênticas, e diversas propriedades medicinaes, que prestan- do-se aos mis eres de nossa profissão seriam aproveitados sem que preci- sássemos pedir ao estrangeiro as suas drogas, que muita vez chegam-nos inertes. No exerci io de nosso sublime sacerdócio, guiados sempre pela luz esclarecida da rasão e da observação; sendo o nosso maior e único em- penho, soecorrer aos infelizes; lançaremos mão de todos os recursos fornecidos pela sciencia, ainda que nenhum d'ellesgose o direito de in- falibilidade; pois como bem disse=Alexandre Herculano—Infallivel so- mente Deos. SECÇÃO MEDICA. DO CASAMENTO. 1.—E' grande, importante e sublime a instituição do casamento. 2.—Para justificação basta-nos dizer que nas bodas de Canaan foi elle abençoado por Deus. 3.—O casamento tem por fim a procreação da espécie. 4.—Nem sempre, porém, a procreação é o seu único movei. 5.—Muita vez esta missão é sacrificada aos brazões de familia, aos interesses individuaes, e ao desejo de accumular fortuna. 6.—O casamento moralisa o homem. 7.—E' tão conhecida a influencia, que a mulher exerce sobre o ho- mem que Madame Stael disse:—Os homens serão sempre aquillo que as mulheres quiserem que elles sejam. 8.—O casamento entre consanguineos é seguido de maus resul- tados . 9.—As más conseqüências d'esta união reflectem-se no futuro ser. 10.—Dos casamentos precoces, quando o organismo do homem (não está completamente desenvolvido para encarregar-se de tão grande funcção, e a mulher apta a preencher a sublime missão da maternidade originam-se graves moléstias. 11.—O rachitismo o idiotismo, a tuberculisação e a escrofula são partilha da nova existência. 12.—Os casamentos tardios não são aconselhados pela hygiene. 13.—Não devemos esperar bons fructos de uma arvore, cuja se- mente enfraquecida pela idade foi confiada á terreno que se achava nas mesmas condições. 14.—O casamento contrahido entre a mulher na primavera da vi- da; cheia de calor riço e animação, e o octogenário debilitado com os pés a borda do sepulchro, é um abuso,é um escarneo em face da sciencia. 15.—Os vicios de conformação da bacia, a phthysica pulmonar, e muitas outras affecções são outras tantas contraindicações do casamentoJ 16.—Entendemos que a hygiene deve intervir no acto casamento. 17.—Todas as vezes que o casamento assim não for praticado, será considerado illegitimo perante a sciencia do Velho de Cos. SECÇÃO CIRÚRGICA. DO CENTEIO ESPIGADO E SUAS APPLICAÇOES EM OBSTETRÍCIA. \,—o esporão do centeio é uma alteração sobrevinda no centeio pela picada de um insecto denominada—sphacelia segetum. 2.—A sua manifestação é muito freqüente durante as estações chuvosas. 3.—O centeio espigado está collocado entre os excitantes. 4.—Em algumas partes da Europa o centeio faz grande parte da alimentação. 5.—Os indivíduos a elle submettidos experimentam uma espécie de embriaguez. 6.—Sendo muito prolongado o seu uso, como alimento; apparece o esphacello. 7.—Entre as propriedades de que é dotado o centeio espigado, uma das mais importantes é excitar as contracções uterinas, quando o utero- se acha no estado de inércia. 8.—Muitos exemplos felizes attestam a veracidade da opinião que acabamos de emittir. , 9.—-As contracções uterinas provocadas por esta substancia desen- volvem-se com muita presteza; porém não seguem o typo intermittente,. como as contracções naturaes. 10.—Nos casos de delivramento tardio, quando a placenta se tem demorado por muito tempo dentro da cavidade uterina, determinando pela sua presença hemorrhagias abundantes, e quando o parteiro pas- sando a mão pela região correspondente não sentir o utero contrahido, deve immediatamente lançar mão do centeio espigado. 11.—Quando depois de terminado o parto o utero contiver coalhos sangüíneos, a expulsão d'elles será promovida por meio do centeio es- pigado. *2.—E' empregado em infusão, tinctura, decocção etc. '«*•—O practico deve prescrevel-o com muita reserva e prudência. H.—A constituição da mulher, o estado de adiantamento do parto. —29— o maior ou menor grau de dilatação do collo do utero. os vicios de con- formação querdaparturiente, quer do feto, apreciados pelo medico, devem aer outras tantas circunstancias; que não devem passar desapercebidas, afim de que sejam coroados de felizes resultados os esforços empregados ôra bem da sua cliente. SECÇÃO ACCESSORIA. TINCTURAS ALCOÓLICAS. 1.—Tincturas alcoólicas são dissoluções de differentes matérias no álcool. 2.—O álcool representa dous papeis importantes n'estas prepara- ções, o de dissolvente, e o de conservador. 3.—Elle não altera a qualidade dos productos dissolvidos. 4.—Convém observar que os effeitos do álcool reunem-se aos da substancia medicamentosa; e devemos ter isto em consideração sempre que empregarmos o medicamento, de que agora tractamos. 5.—As substancias submettidas a acção do álcool devem ser dese- jadas e divididas. 6.—Estas duas condições são indispensáveis para que as matérias sejam mais facilmente atacadas, e as tincturas não contenham água de vegetação. 7.—O contacto entre a substancia e o álcool será tanto mais de- morado, quanto maior difficuldade houver da parte dos corpos em ce-* derem os seus principios. 8.—O aleool empregado na preparação das tincturas é de grau variável. 9.—As propriedades dissolventes das substancias são relativas ao grau de concentração do álcool. 10.—São muitos os processos para a preparação das-tincturas. 11.—Quando as substancias empregadas são completamente solu„ veisno álcool, preferimos a simples dissolução quando, porém, não se achamn'estas condições recorremos a maceração, adigestão e a decocção. 12.—O ultimo processo é pouco usado. 13.—As tincturas alcoólicas são simplices e compostas. 14.—As tincturas ai eólicas são destinadas ao uso medico. HIPPOCRATIS APUORISMI. Vita brevis, ars longa, occasio preceps, experientia fallax, judiei um díflicile. Sect. l.aÀph. l.° Ad extremos morbos extrema remedia, exquisite optima. Sect. l.a Aph. 6.° Somnus, vigília, utraque modum excedentia mal um. Sect. 2.* Aph. 3.° Cibi, potus, venus, omnia moderata sint. Sect. 2.* Aph. 5.° Vulneri convulsio superveniens lethale. Sect. 5.aAph. 2.° Qui á tétano corripiuntur in quatuor diebus pereunt, si vero hos effugerint, sani fiunt. Sect. 5.a Aph. 6.° '//cem emet/caa a cainmcJdao tevtJoèa. <~>0uÃta ijAzctcázaoe ae ^/fôecuccna aa $as£ca2.ff ae Jsefewvfrro ae sééS. *=-£/£ Jj,a