TilESE 3E 5? m *r DE JOSÉ RODRIGUES DE FIGUEIRED 5 < ü3â-i m^díVai i JAIÍ >' 8 (335 \ / ^ ./\y^/^ -^\y\y \y\y \/ /(. - -Secçao Cirúrgica. Antônio Alvares da Silva......•, DemelrioCyriacoTourinho...../ iuiz Alvares dos Santos......) Secção Medica. João Pedro da Cunha Valle.....\ JeronimoSodró Pereira......; O IJxni. Sr. »r.Cincinnuto B»iuto da Silva. O Sr. B>r. Thomaz i mamansà a aaaianü ®&&9itiDÃ(D; E COMO A TYPOS IMITAVEIS DE HONRADEZ E DE VERDADEIRO AMIGO oflcrcço rainha tliesc. MS HIITJS IHHfilDS JlffiBOS Joaquim de Carvalho Bctlamio Jayrae Soares Serva Antônio Carlos Pires de C. Albuqncrquc Olímpio Henriqnes de Souza Dr. José Antônio da Silva Serva José Alves Guimarães Joaquim de Calazans José de Teive e Argollo Não vos lembraes, meus amigos, que sempre que um de nós, na jornada que tão unidos fazemos por este mundo, procura um peito em que recoste a fronte abatida pelo desalento e a fadiga porfiamos todos em ver qual será o primeiro em dar o arrimo ao pobre do amigo? Como, pois, hoje que colho uma flor rús- tica na beira da nossa estrada, não vol-a offerecêra? DR. SALVADOR PIRES DE CARVALHO E ALBUQUERQUE Sincera, perduravel e profunda amisade. Á MEMÓRIA BO MEU AMIGO E COLLEGA JOSÉ HlLinRIQUES DE MEIREIAfig Saudade do amigo, e homenagem eterna á tao grande ta- lento. OS ILLUSTBISSIMOS SENIIORES DOUTORKS Antônio José Alves Antônio Alvares da Silva Antônio Januário de Faria Francisco Rodrigues da Silva Salustiano Ferreira Souto Joaquiún Antônio Rotelho Alexandre José üe Queiroz Domingos Rodrigues Seixas Dcmctrio Cyriaco Tourinlio Não é somente como prova de alta e desinteressada estima, que offereço-vos minha these; falia aqui também um coração brasileiro, que estremee-sc de ?-'ôzo vendo cm vós, sciencia profunda e real, aclimada e florescente n'este que- rido paiz. A TODOS OS ESTUDANTES DA FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA E ESPECIALMENTE AOS MEUS COLLEGAS DE ANNO. Como penhor dos mais ardentes desejos de que se torne a classe cada vez mais respeitável pela fraternidade patriotismo e saber. i Hi AO ILLÜSTR1S8IM0 SNR. 3xxi\o üe fílmqes Nascida espontaneamente a amizade, que vos dou, tem o conhecimento de vossas raras qualidades fortificando-a. É isso uma promessa de perpetuidade ; Deos o permitia. josê «ramo da sm serta i â ma w&mmimmmmà mutoma Fraca demonstração de amisade tão acrisolada, que não precisa de arrimar- sc, para existir, no muito que sou grato ás vossas delicadesas. Á MEJSIOJRSA RE UONHA. AVÓ Veneração e aniigade. Ue). bandida veíccdco De 'ZiSútto » B AOS ILL.mo9 SENHORES Augusto Franco Velasco Dr. Antônio Joaquim Franco Yelaseo É diminuta, meus Tios, porém sincera, esta prova que vos dou do quanto vos quero. AO ILUSTRÍSSIMO senhor DOUTOR JOSÉ PIRES DE CARVALHO E ALBUQUERQUE De alta estima e profundo respeito. MAJOR NICOLÁO CARNEIRO DA ROCHA E SUA EZCELLEBTISSIIU FAMÍLIA A vossa amisade me é um respeitado legado. —«-»<^§ieK-€-o—----- AO ILLUSTRISSIMO SENHOR JOÃO IGNACIO DE AZEVEDO Muita sympathia e reconhecimento. ir I SYSTEMA PENITENCIÁRIO na 3P3lO¥mC3fA Bâ, BÃMJi, PROGRESSOS HYGIENICOS QUE RECLAMA. F Nous montrerons â'abord que parlout les moeurg « ont imprime aux lois leur nature, leur caractère. leur pbysionomie. Matter. Influence âes Slceurs sur les lois. I. O passarem as gentes por junto da cadeia antiga ou da Peni- tenciaria moderna mal sabem ellas, que alli se levanta o pa- drão em que está esculpido o seu estado social. Dos costumes, da religião, do governo, do progresso, da fei- ção de um povo finalmente é a cadeia a photographia. E o ras- gão do vôo, que cobre, ou a ulcera nojenta, ou a fôrma esbelta ou a saúde do corpo social. E por ventura certa d'essa verdade é que a sciencia moderna se assenta contemplando a cadeia ao mesmo tempo que rumina a solu- ção dos mais"altos problemas da medicina social. A marcha da humanidade tem acompanhado a cadeia; e onde os direitos do homem são reconhecidos, conhecidos também são melhoramentos d'ella. II. Um elemento religioso, que nobilitando o indivíduo fizesse valer os seus di- reitos, ao mesmo tempo que refreasse os seus desmandos, faltava á sociedade pagãa, e ella em busca de um arrimo e sem empicilio que a contivesse, de todo entregou-se ao despotismo do maior numero. O indivíduo, si bem qne átomo componente do todo social, era cousa que desapparecia sem valor e postergada, quando fallava o interesse geral. Que importava que o ramo da arvore cahisse decepado, quando necessário era de- safogal-a. Onde estava a caridade que apanhando-o procurasse dar-lhe nova vida ? Ao offensor do que ella chamava seus direitos ia ter desapiedada a sua 4 vingança; o criminoso se consubstanciava com o crime, c ou desapparccia am- putado do corpo social, ou soffria a pena que pelo terror o cohibisse de no fu- turo novamente perpretar a acção prohibida, tão somente por interesses d'ella. O terror era, e devia de ser a única baze possível da penalogia pagãa. As- sim não nos devem admirar as descripções das cadeias e dos carcereiros de Ro- ma. A Tullianum como a descreve Salustio (1) era um cárcere enterrado a doze pós abaixo da superfície da terra, os seus tectos abobadas ennegrecidas, a luz não penetrava, o ar era pestifero, o chão immundo. A Mammertino era outra prizão, que junto ao Capitólio se estendia sob o chão (2) E mãe ou espo- sa que alli quizesse levar alimento do corpo ou do espirito havia de pagar o que marcasse o carcereiro, ainda que descomedidamente. (3) III Quando porém, no meio do charco em que patinhava a humanidade, surgio a luz do Christianistno, a cadeia escurecida pelas trevas, infernaes do desespero começou a alumiar-sc da esperança chrislãa. Os encarcerados não podião ser esquecidos pelo Christo: entre os bemavenlurados estão aquelles que os vizitão. Os diaconos e as diaconisas instituídos pelos apóstolos para serem a conso- lação dos afflictos levavão-na, e também alimentos aos encarcerados. Os arce- bispos e bispos não cessavão de pregar aos fieis a freqüência nas prizões para material e espiritualmente soecorrerem aos necessitados. Certamente, porem, que a benéfica influenciado Christianismo, então perse- guido pelos povos c pelos reis, não poderá deixar de ser tênue e quasi sumida, e de sahir do curto alcance de almas christãas, que desempenhassem os sagra- dos mandamentos de sua religião; e só do tempo de Constantino Magno começou a sua influencia nas leis civis e criminaes, influencia que foi se estendendo pelos tempos dos imperadores Constando, Valentiniano, Theodosio c principalmente Justiniano, que no desespero de ver neulralisadas pela corrupção d'cntão as boas disposições dos seus antecessores sobre prezos e prizões, formalmente en- carregou aos arcebispos a visita e o cuidado d'ellas O que erão as cadeias nesses tempos pode-se ver de um relatório que Libanio dirigio a Theodosio. « Os governadores para agradarem a algum poderoso prendem aquelles que pelas leis não devem sô-lo; e abi os deixão definhar, sem se darem ao trabalho de julgal-os. Muitos morrem, ou pelo mão ar que produz o accumulo de pessoas [i) lit. por Julius Les Prlsons. (2) Fleury—II. Ecclesiastique—paginas 73 v. i.' (3J Julius op. cit. Laurcnt—Etudcs—vol. 5." paginas 875. 5 em um logar insufficiente, ou por outras misérias que ellcs tem de ahi sofírer. » Que os esforços e boas intenções d'esses imperadores, e dos bispos e da Igreja, que recommendão em seus concilios (Nicea) e assembleas do clero (Or- leans) (1) o dever da caridade para com os prezos, havião de ser nullificados, é cousa racional, attendendo á profundidade da lepra moral, que lavrava então. A correcção do prezo, parto de almas angélicas e profundamente religiosas, não podia calar no espirito publico; e o que valem reformas, que não as aprova elle, e que com cilas não se identifica ? De certo que a correnteza as levará logo que lhes faltar o apoio de quem as engendrou, e teve força para vivifical-as, si bem que de uma vidaephemera. Se a razão não tivesse ja mostrado que assim devera sueceder, o facto de ao depois no século 9.° o imperador Leão reviver as leis be- néficas sobre as prizões, e de recommendar que os arcebispos e mais membros do clero, uma vez pelo menos na semana, vizitassem os prezos para indagarem de suas necessidades, curarem os doentes, nutrirem os pobres, vem demons- trar que as caritativas disposições de Justiniano tinhão se tornado lettra morta. E como pois negar os melhoramentos, que o Clirislianismo trouxe á taes focos da desgraça, se vemos que os que ainda sobrenadavão no lodo da corrupção, a elle estendião os braços como ramo único, em que os infelizes podião se segu- rar? Era quanto se podia fazer então; que para corpos gangrenados de nada va- lem médicos e medicamentos, ainda os mais poderosos e virtuosos. IV. Esse estado lastimoso da humanidade não podia por mais tempo existir, que ahi estava a Providencia para iinpcccr de extender-se ás gerações futuras. E os bárbaros do Norte, dizendo-se os vingadores de Deos, atirarão-se sobre o mun- do antigo, que necessitava de sangue puro e são para reanimar-se renovado. Com os invasores veio um principio desconhecido, como já vimos na legis- lação antiga, principio que, já existindo no Christianismo, não tinha podido suf- icientemente introduzir se no estado civil a individualidade. E verdade, porem, que, transfigurado pela barbaria, elle não era então mais do que o direito do mais forte. E o combate judiciário e a muleta pecuniária estabelecida pela equi- dade tão somente resolvem, e accommodão as questões, e supprem a sciencia do pretor (2) Além d'isto existia nas leis, que rcgulavão tão desordenada sociedade a maior (1J Julius. (2) Laurent-Eludcs vol. 7/ F 2 G confusão, e tanta era ella, que bem dizia S. Leão, que as leis em uma localida- de erão tantas quantas as nacionalidades existentes. (1) Do conhecimento d'esse estado de cousas bem se pode inferir qual devera de ser o estado das prisões, e o valor das disposições de Justiniano sobre pre- zos e cárceres. Estas, que tinhão despertado no império ephemero de Theodo- rico, cahirão outra vez no somno de séculos para ao depois serem, cemo vere- mos, despertadas pelos legistas do occidente da Europa. De outro lado então, verdadeira planta exótica, crescia e desenvolvia-se o direito ecclesiastico no meio d'esse cahos, do qual havia de sahir a sociedade moderna. E em quanto dominava o direito da força já a força social, sustentada pelo direito romano, já a força individual sustentada pelo germanismo, a Igreja hia pregando e practicando, que o crime é a violação de uma lei divina; que a pe- na é uma expiação, «Sepuno não é para inflingir um mal, e sim para corrigir aquelle, que commette o mal. » E como materialmente ella nao podesse des- truir os cárceres horríveis do feudalismo, ou impedir as arbitrariedades d'elle, o direito de azylo, e a excomunhão erão afincadamente empregados para apoio dos fracos. Assim inegáveis são os grandes benefícios, que prestou a Igreja em epocha de tanta barbaria, cuja crueldade das penas já peneirava até em algumas ordens religiosas. Em alguns mosteiros, diz Fleury, havia cárceres chamados Vade in pace, onde sem luz, nutrindo-se apenas de pão e agoa, e completa- mente segregados de seus companheiros, se finavão desesperados os infelizes religiosos, que, se julgava, merecião pena tão barbara e anti-christãa. ( 2 ) Quando, porém, o direito romano, sacudido da poeira de doze séculos, co- meçou a ser estudado em Bolonha, e transplantado para as nações oceidentaes da Europa, as disposições de Justiniano e outros imperadores sobre os incar- cerados forão adoptadas e mandadas praticar em varias nações. Na Itália em- bora desde o século 10 e 11 já se encontrassem essas lei praticadas em algu- mas prizões, com tudo foi só no século 16 que em Milão e Gênova teve lugar a creação de certas juntas encarregadas de velarem pelo bem estar physico e moral do prezo ; e grandes forão os serviços prestados por ellas. De que servira essa transplantação e promulgação das leis romanas? De que servirão as evangélicas tradições da Igreja? A verdadeira caridade não podia existir nos corações de então. E improficua é ella quando precisa de insinua- ções das leis para existir. O estado das prisões da Europa era o mais desconso- lador até o século dezoito. Ainda aqui falhavão na pratica as leis, porque erão descordes do espirito da sociedade da epocha, e a cadeia sempre ha de ser o reflexo d'ella. Os tempos erão de luetas sanguinárias e inexoráveis. Luctavão o feudalismo (1) Laurent—op. cit. (2J Flcury-H, Ecclesiaslique vol. ü.« 9 os populares e o absolutismo, luclavão entre si as nações, luctava a Igreja buscando afogar em sangue as heresias e schismas, que, se nascião, mais cres- cião; era uma lucta, em que cila depunha as suas sempre victoriosas chris- tãas armas de persuasão pela palavra e pelo exemplo para permitlir as de uma intolerância cruel e insaciável, c assim dando ella própria pela inquisição aos seculares lições praticas de cárceres medonhos e requiutes de tortura. Considere-se agora que compaixão poderia inspirar em sociedade assim cons- tituída, que trazia os lábios sempre ensopados na baba da raiva, coração sem- pre a ferver de vingança aquelle que ofíendera os seus chamados direitos, e desprezara as suas leis? Em cpoclias cm que reina o arbítrio, que outra lei pode existir que o terror? De certo que o cadafalso, a tortura, a mutilação, o cárcere doentio serião as taças em que elle se refocillaria para vingar-se, acobertada com o nome da justiça. Ainda bem, que se os princípios dos Gregorios c S. Martinhos erão esque- cidos pelos homens, vivião elles, atravessando os séculos, e surdamente pre- preparando o futuro, c cm vez cm quandu se revelando quando acha vão cora- ções que os aninhavão. Os Claude Bernard, os Vicentcs de Paula penetravão nos antros horríveis, onde existião os desgraçados para consolarem-nos, e os converterem. De certo, porém, que seus esforços serião goll.as d'agoa lançadas no abrazado arcai dos dezertos. O abominável systema commum era o único seguido. Cárceres de velhos castellos feudaes, espaços abertos nos muros que cer- cavão as cidades, masmorras, velhas torres erão aproveitadas para servirem de prizão, e quando alguma fabrica era determinadamente edincada para tal fim, era a segurança a única condição buseada. Espaços erão tão estreitos as vezes, que os prezos vivião cm pranchas suspensas por não terem logar no chão. No meio d'essa apinhoada gente vivia identificada com as enxovias a varíola e a febre das prizões; e taes erão seus estragos ajudados pela fome, que aquelles mesmos que tinhão obrigação de vizitare n as prizões, d'ellas fu- gião espavoridos «inspeccionando apenas o exterior do edificio, sem nem olhos lançarem para o inferno do interior» ; porque o contagio era infallivel nos que lá penetravão. Na prizão de Marshalsea na Inglaterra todos os dias mor- ria um prezo, e no verão oito. Não erão estes os únicos flagellos dos desgra- çados, ainda estavão sujeitos á avidez e crueldade dos seus carcereiros. Di- gamos mais que em alguns paizes, como em a Inglaterra, o logar do carce- reiro era comprado. Então subião de ponto as extorsões de taes homens; porque cllos, obrigados a alimentarem e a vestirem os prezos, lurtavão a co- mida devida á cada um d'elles, e perseguião aquelles que julgavão que tinhão dinheiro; e tudo era meio de renda. As paixões as mais ignóbeis erão açuladas por interesse pecuniário, a sabida do pvezo por ter acabado sua sentença não 8 era pcrmittida sem pagar certa quantia ao abominável guarda. Concluamos dizendo que de envolta com os encarcerados andavão os loucos. Ninguém julgue cfficaz a crueldade de taes prisões para a repressão dos crimes: augmentavão sempre, e o numero das reincidências era elevadíssimo. O homem a tudo se habitua; a impressão má dos primeiros dias se apaga pelo uso, ao mesmo tempo que variavao e requintavão os gozos materiaes, c mais se aguçavão os sentidos na experiência de brutaes sensações pelo ajuntamento daquclles alumnos-mestres da eschola normal da corrupção. V. E o século dezoito um dos mais proveitosos e insignes vestígios da marcha progressiva da humanidade. Às classes desprotegidas e até então desprezadas da sociedade sonhão e buscão possuir os seus direitos naturaes e incontestá- veis. Servas submissas e ignorantes hontem, ellas hoje alevantão-se para enca- rar de frente, apalpar e depois rir-se dos Ídolos, que a sua boa fé hontem hy- perbolizava e mystificava. E ao levantarem o manto fulgurante de umaexterio- ridade imponente acharão lodo ao em vez dos cabedaes imaginados. Então a so- ciedade tcveféeuisi mesma, despedio os tutores, eabroquelada com philoso- phia aprezentou-se possante, e sobranceira ás prcoecupações herdadas. E ca- minhando sobre as ruínas dos edifícios do passado, que cahem sob os golpes do seu alvião, lançou os alicerces do monumento do futuro. Verdade que. infeliz- mente embriagada pelas victorias muita vez desconhece e insulta Aquelle que dá força ao seu braço. Deos hade ter cerrado os ouvidos ás blasphemias dos ebiios pelas idéias; porque ellessão os artífices da sua grande obra—a regene- ração dos opprimidos. Essa revolução moral que abala, magnetizando as multidões, certamente que será resentida pela cadeia—tão necessitada d'clla. E assim foi. As leis de sangue, que região quasi toda a Europa, começarão então a ser abaladas pelos Delictos c Penas de Beccaria e Commentarios ás leis Inglezas de Blakstone; (1) e essa discussão penal muito mais notável se tornou na livre In- glaterra, onde projectos de revogação de certas leis barbaras se aprezentarão nacaza dos communs, e a questão penitenciaria começou a vulgarmente ser tractada, despertado o vulgo por ura Pamphleto aprezentado por Denne sobre as cadeias, que passa pelo primeiro que desenvolvidamente discutio na Ingla- terra o systema de separação cellular. (1) Em alguns logares as idéias de reforma penitenciaria fôrão até a practica. Em (1) CHay-Memoirs. 9 Roma instituio-se a celebre Prisão—hospital—moral de S. Miguel, que tinha por mote—Paium est coercere pcenas improbos, nisi probos efficias disciplina— Em Gand formou-se a—Maison de Force—sob os princípios do trabalho em commum. Na Suissa começou a pratica da cellula solitária, mas tão somente para castigo disciplinar do estabelecimento penal, que ja era conceituado. Erão, porem, exemplos destacados precursores da cruzada, que havião de le- vantar os sustenladorcs dos direitos do homem, ainda decahido pelo crime, eda grande verdade do evangelho. Comooutr'ora de pobres pescadores sahirão os- dcpozitarios e propagadores da mais saneta das religiões, a religião social, si as- sim me posso exprimir, devia de ter por apóstolos os filhos do vulgo. Diderot o filho do cutileiro, Voltaire de um notario, estendem os seus estudos philosopbi- cos até analysar e amplificar as doutrinas de Beccaria. O primeiro dos verdadeiros apóstolos da reforma penitenciaria no século dezoito, não sendo elles, é um que como elles sahio dos populares: é Howard, é o filho do especieiro de Wttlting- Street elevado ao cargo de High—Sheriffde Bedfòrd, é ainda aquelle em favor do qual as próprias virtudes e as idéias, que vão grassando, fazem com que se esqueção esses regulamentos, que determinão um county-magnate-pwà pre- encher tal cargo. O deplorabilissimo estado das cadeias ingtezas e as amarguras soffridas duran- te a sua detenção cm uma escura e suja masmorra emBrcst, para onde tinha- sido levado prisioneiro por corsários Francezes, excitarão a alma evangélica á cruzada do melhoramento penitenciário. Diversas e repetidas vezes viajou toda a Europa desde a Suécia até Kersonr desde Portugal até a Rússia, c por seus escriptos despertou aattenção indigna- da da Europa para o estado deshumano e miserável, em quejazião os infelizes- prezos. As cadeias francezas erão horríveis. O cárcere c as torturas ainda erão usados. Não imperava o despotismo illimitado dos Lirizes quatorze e quinze ? Raio de sol da manhãa da reforma penitenciaria, Howard se entrega deco- ração e cabeça á grande obra; elle falia no Parlamento, insta, pede e roga, es- creve, viaja, reúne amigos para levarem a cabo o intento de levantarem uma prizão modelo, "alcança do Parlamento um bilt, mandando erigir duas peniten- ciárias, uma para cada sexo. Obstáculos porem apparecem, ja pela morte de alguns dos membros dá commissão encarregada, ja pela discordância entre os outros sobre a localidade em que devia elevar-se o edifício, c finalmente porque o governo alarefado com a lucta da Independência americana, com a guer- ra naval que sustentava contra a França, e atemorisado com os germens revo- lucionários, que hião se revelando na população britânica não tinha « tempe* nem gosto para experiência de sciencia social. » Os esforços, porém, de Howard de todo não se perderão; pois que dois condados (Sussex e Gloucestcr) levantarão duas penitenciárias sob o princi- pio de separação cellular, que forão as primeiras em que a ideia de reformar a moral do prezo materialmente separando-os realisou-se em larga escala». S 3 IO e taes forão os seus resultados, que a fama da c\:ccllencia d'ellcs atravessou os annos até bojo. Digno de nota é o echo que as palavras, os escriptos e os esforços do grande philantropo hião achando nas multidões. A sua obra sobre as prisões traduz-se em varias lingoas, pamphletos apparecem discutindo a ideia, e alguns ho- mens tornão-se os continuadores de sua missão. A Philosophia da Historia, que quizer procurar a razão do phenomeno, ha de conhecer que Howard era já um filho das idéias que germinavão, e até abrotavão por entre algumas populações. Uma revolução social se preparava, a cadeia havia de senti-la. VI. Mais adiantada na Inglaterra a revolução social, mais adiantada também se achava a reforma das prizões, que na França. Foi quando a sua revolução scintillou, ao finalizar o século dezoito, que as prizões começarão a merecer mais alguma attenção, A assemblea constituinte, depois o Conselho dos quinhentos, e finalmente Napoleão ouvirão o relatório afflictivo das misérias d'ellas, epropu- zerão medidas, que a agitação do tempo não permittio hirem avante; sobrevi- vendo apenas a Maison de Force, creação de Napoleão. Os governos travados em tão renhida guerra, mais cuidando cm fazer soldados, que emendar o vicio, não podião prestar a devida attenção ás prizões; e somente na Inglaterra em- quanto o governo seatarefava comalueta, a causa da reforma penitenciaria não morria, lavrando pelo contrario nos corações dos particulares a esperança de sua próxima realisação. E se Bentham com o seu Panopticon e Samuell Romilly propunbão reformas penaes e das prizões, não menos popular era a ideia até entre o bello sexo. A roda de Miss Fry reunião-se as Ladies Prizon Associa- iions com o fim de cuidarem do bem estar moral e physico dos encarcerados. Associações essas que tanta extensão tomarão, que quasi todas as prizões In- glezas erão protegidas por taes duplamente encantadoras sociedades. Todos tinhão em mente que os sonhos de Horrard havião de ser realizados; pois que, se envolvido nas neblinas do amanhecer nasce o sol dos trópicos, não impede isso que ao meio dia brilhe elle em todo o seu esplendor. VII. Idéias tão salutares e generosas como as que no século passado se intentarão, e começarão a tomar corpo na Europa, não podião deixar de atravessando o Oceano, muito se enraizarem e desenvolverem-se na terra em que o espirito II humano não encontrava no seu caminho embaraços e contrariedades nos des- troços de uma velha sociedade, que ainda moribunda resistia àsinnovações. Francklin, levando seu filho a receber a benção do velho philosopho de Fer- ney, era allegoria da gratidão do novo Estado ao século que se findava. As sua- ves theorias e esforços de Howard havião de achar echo na segunda pátria de Penn. Ao mesmo tempo que na Europa o pliilontropo Howard trabalhava, e dedica- va-se ao allivio das miseri as dos encarcerados, formava-se na Pensilvania a Society for alhvia ting the miseries of Public Prisons, cujo era um dos encar- gos substituir pela prizão cellular a mutilação, o cadafalso e os açoites, apenas copiadas das barbaras leis da velha Europa. (1) Acabada a guerra da independência americana, que suspendera sua útil acção, continuarão os seus humanitários trabalhos, os quaes se bem que intentados com affinco ezelo, forão com tudo longas experiências sem resultado definitivo. E a ideia que tinha r eunido a philantropica sociedade, espalhando-se pelos Esta - dos-Unidos formou outras, cujos ensaios resentirão-se da proverbial extrava- gância do povo americano. No estado de Maine (por ex.) cidade de Thomaston, levarão o systema cellular até o ponto de conslruirem verdadeiras furnas: erão cellulas subterrâneas, um pouco mais longas que uma sepultura, de dous pés delargura, para o nde se descia por uma escada, e que erão fechadas por alça- pão de ferro. A luz e o ar entravão por fendas abertas no tecto, e para que o prezo nada visse fora de sua cova, ahi penetravão por tubos em zig-zag. Bem se pôde prever que fim tiverão aquelles infelizes sujeitos á tal regitnen. (1) Eis por tanto até onde podem chegar os desvarios de alguns reformadores, que por elles estragão, e desaecreditão idéias sãas e proveitosas. Depois de infelizes experiências do trabalho em cominum, sem separação al- guma dos criminosos, vários Estados que as intentarão, reconhecendo a inuti- lidade e erro de qualquer systema, que não se apoia, na separação real dos indi- víduos, começarão a enxergar a cellula, como o único meio profícuo em tal cou- sa conseguir. Era isso em 1816. Nova-York erigio Auburn, Philadelphia dous annos depois elevava Pittsburgo em Richmond, e ontros estados começarão também a ensaiar o systema cellular. A solidão absoluta sem trabalho, sem as consolações do religioso erão a pedra principal de um systema, que levava o rigor ao ponto de não querer que o prezo visse quem lhe dava a exigua refeição, que cm algumas cadeias (Richmond) hia até ter somente pão e agoa. Ao lado d'issoas construcções erão defeituosas, pa- redes delgadas, que permittião se communicarem os prezos, cellulas apertadas, mal arejadas, mal allumiadas, e até não aquecidas no inverno. Então as loucuras, as congelaçõcs e mil outras moléstias fulminando aquelles que erão submettidos (1) Clny—Memoirs. 19 à tão rigoroso e defeituoso regimen, e desaereditando-o, fizerão abandonar uma ideia, que perdera a sua índole, e tornara-se deforme ja pelaignorancia, ja pela obstinação dos seus executores em fecharem ouvidos e olhos á razão para só ou- virem as fábulas e lisonjas de sua phantasia. VIII. Reconhecidos os damnos do systema até então practicado não buscarão os americanos na execução d'elle, voragem em que se somem alteradas e desacre- ditadas as mais virtuosas reformas, as causas do mallogro das esperanças com to- da confiança depositadas, na ideia capital da separação cellular. Não porque a isso se oppõe as mais das vezes a vaidade humana, que mais folga de descarregar sua culpa em estafermo, que pela mudez perfilhe os erros alheios, que confessar o próprio engano. Era no anno de 1825. Nova-York dera de mão ao systema de solidão cellular, e acompanhada de muitos dos outros Estados adoptára um outro systema, que, embora ja existisse por algum tempo na Europa, ella amplifica e aperfeiçoa. É o systema de trabalho silencioso em commum, que toma também o nome do logar onde primeiro é exercido na America-Auburn—O prezo a noi- te dorme em sua cellula, de dia trabalha em ofticina em commum com seus com- panheiros, ecomo sequer estabelecer a maior vigilância para impossibilitar-se acommunicação d'elles entre si, as paredes das officinas são crivadas de pe- quenos buracos, por onde guardas espião-nos, alem dos que dentro das mes~ mas sallas fazem o mesmo. Á menor infracção, ao arbítrio do guarda, lá. vai o azorrague ainda mais aviltar aquelle, cujo primeiro cuidado seria levantar-lhe o sentimento de própria dignidade. Todo manejo de tal systema repouza sobre uma couza—o medo do castigo—e a incapacidade e prejuízos de tal meio adian- te mostraremos. A necessidade reconhecida por todos os partidos de impedir-se a intelligencia dos educandos entre si não consegue a disciplina, e pelo contra- rio é uma escola aperfeiçoada, onde se aprende a illudir os preceitos e os ho- mens; é ainda um despertador de sentimentos mais próprios para desenvolverem o ódio entre o vicio e os seus perseguidores, que trazerem essa brandura de ani- mo, que fazendo o culpado reconhecer o próprio erro, fal-o caminhar para o arre- pendimento. Auburn só preenche um fim—o lucro; a cadeia podendo sustentar- se pelo ganho dos encarcerados. Éo templo do dollarworship. Era a cadeia da gente commerciante. Mais tarde fez-se sentir no Estado de Nova-York a necessidade de uma outra prizão: as 550 cellulas de Auburn já não bastavão, e outra penitenciaria foi erigida em Singsing junto as pedreiras de mármore do rio Hudson, que de- vião ser trabalhadas, como são, pelos prezos. Então, bem como o domador de feras que nos circos faz-se acompanhar pelas pantheras, que cabisbaixas e tre- 13 mulas obedecem aos acenos da vara mágica do domador, assim Elam Lyndã guia cem criminosos para construírem elles mesmos, apenas ajudados por alguns artífices livres, a sua nova prizão. E esse numero de prezos, que ao depois foi elevado a mil, era contido na mais estricta obediência « sem azilos para recebe-los, sem muralhas para con- te-los.» Tocquevílle espantado pelo phenomeno attribue a causai única «á firmeza de caracter, á energia da vontade de um homem» porém se atender- mos que a mais rigorosa e terrível disciplina ahi existia, se attendermos que os guardas vivião constantemente armados de clavinas e pistollas, se atten- dermos que, logo que estes meios falharam, rebelliões arrebentarão logo, fa- cilmente conceberemos que antes ao estado de embrutecimento, aos homens terem-se tornado verdadeiros atomatos pelo terror, deve-se attribuir o facto, que á moralisação conseguida do prezo. Nem só Elam Lynds punha a reforma moral do prezo em duvida, como também as mesmas rebelliões, o facto de um prezo amputar as próprias pernas por não poder mais, desesperado, sofrer o castigo que lhe acarretava o seu instineto de liberdade diversas vezes que intentou fugir, tentativas de assassi- nato de Lynds e outras apontadas por Clay Crawford e Ducpetiaux deixão ver que ella não existia, e qual o rigor da disciplina. De outro lado a quakeriana Philadelphia, para quem a reforma moral do preso é mira buscada com o mais louvável empenho, não se deixando levar pelos exagerados gabos que um estudo superficial dava então á Auburn, pelo fulgor phantastico, com que a novidade a revestira, mandara estudar e discutira cm seu parlamento os princípios d'aquelle systema, e habilitada com esse estudo e com as lições que lhe tinha dado a infeliz experiência de Pittsburgo, alevanta Cherry Hill, verdadeiro typo architectonico de penitenciárias embora excessi- vamente ostentosa seja a sua fabrica, que mais um castello feudal, que uma prisão se parece. Ahi é conservada a disciplina solitária de Pittsburgo, porem augmentada do trabalho na ccllula. Entregando-se, porém, a uma philosophia nimiamente secular Philadelphia confiava demasiadamente na solidão, e no trabalho, como meios moralisadores, e pouca attenção prestava a baze de toda a educação penitenciaria—a religião. A principio ella abrio as portas a todos quantos quizessem entornar na cellula os conselhos e as consolações religiosas, ao depois nomeou um só capellão, que foi o próprio a dizer a Crawford «que lhe erão precisos apezar de sua dedicação trcs mezes para visitar successi vãmente todos os presos. » (I) Eis os dous gandes systemas que a Europa ao depois imitou e tem reformado. (i) Ducpetiaux—Syslemc pcnltcnciaire vol. 1.* F 4 14 IX. Refeitas de forças as nações curopeas depois do batalhar de tantos annos, e cuidadosos do bem publico aquelles governos, que o aguilhão necessário das revoluções tinha tornado sollicitos de seus deveres, e tementes da opinião pu- blica, aquelles emfim a quem dirigia o pensar dos homens sensatos, e não os caprichos de uma vontade absoluta, começarão os ventos do occidente a trazer os rumores dos grandes melhoramentos e philosophicas reformas, por que pas- sava proveitosamente o systema de prisões nos Estados-Unidos. E deslembra- dos por ventura de que a semente da arvore que fruetificava na terra uberrima da America da mesma Europa tinha sido levada, elles enviarão notabilidades, que lá fossem estudar o machinismo e segredo dos systemas. Tocqueville e Beaument e depois Dometz e Blouet pela França; pela Prússia o Dr. Julius e Crawford pela Inglaterra forão os enviados. Divulgados e conhecidos ao depois d'isso os systemas americanos d'elles se apoderou o espirito discutidor do século, e com as relações dos visitantes entre as mãos cada sciencia volveo e revolveo o lado da questão que lhe competia. A Hygiene, a Physiologia, a Psychologia, a Criminalogia, a Estatística e Archite- ctura, cada uma concorreo com o seu contingente para a edificação do monu- mento á moralisação. E se em alguns paizes pódc se attribuir essa dedicação no alevantamento de tão excellente cauza a amor das novidades, e porque « no meio das tormentas revolucionárias a opinião publica apodera-se muita vez de uma ideia, a repre- senta por uma palavra sonora », em outros, porém, a reforma penitenciaria era grito intimo e consciencioso de uma philantropia sãa e formada atravez dos tempos pelo conhecimento e pratica dos direitos do homem. O systema de Cherry Hill foi o geralmente seguido, quer pela revelação que fez Crawford das misérias do systema de Auburn, oceultadas pelo véo de uma apparcncia enganadora, quer pelos graves defeitos da penitenciaria de Genebra, quer pela repugnância dos castigos corporaes, que são o « apoio principal d'a- quelle systema. » (1) A Inglaterra construio Pentonville, e a França Mazas, as quaes, embora hajão muitas outras prisões sob o mesmo systema, são os typos d'elle em cada um dos paizes. Ao se mostrarem os erros, defeitos e lacunas do systema de solidão, o gênio perseverante e cordialmente dedicado dos philantropos inglezes, se alguma vez parecia descoroçoado, era para mais adiante supprir com adequados meios o que necessitava de remédio; e presentemente pode esta grande nação gabar-se (1) Tocq.icvillc-op.clt, paginas 359. 15 de ter um systema penitenciário que a honra, tornando-se só em tal progresso. O systema lrlandez, que ao depois descreveremos, e desde já dizemos que o adoptamos, é uma gloria do homem e do Chrislianismo. Na França, porém, onde Mazas nunca passou de um lypo architectonico de prisões, opulento de obras d'arte, porem pobre de caridade e cuidados de co- rações dedicados, verdadeira exterioridade e officialisino francez, corpo coberto de brocados com alma enlameada, (1) forão o resultado das vigílias de sábios, e esforços de alguns homens revogados pelo decreto apenas do ministro Persi- gny allegando tão somente pelas condições dispendiosas que traz o systema cellu- lar e porque « le goucernement renonce Vapplication de ce regime d'einprisionne- ment pours'en tenir à celui de Ia separation par quartiers. O que vale o indivíduo, o que significa a pcnalogia chrislãa, que consideração merecem melhoramentos modestos e sem estrondo para aquelles paizes em que impera o absolutismo militar, ou em que as regalias c formas conslitucionacs não passão de pura formalidade? Ainda antes de realizar-se a reforma penitenciaria na França, já Tocqueville punha eni duvida a sua exequibilidade « Na America, dizia elle. o movimento que determinou a reforma das prizões foi essencialmente religioso. Na França a opinião publica se mostra pouco favorável a tudo que o zelo do clero protege, e por seu turno o clero experimenta pouca sympathia por tudo que se aprezenla sob os auspícios de favor popular. Na falta da religião ficava a Philantropia para reformar criminosos. Entre nós a philantropia é um acto de imaginação, nasce na cabeça, não vae ao coração.—O segundo obstáculo que contem as nossas leis se acha em uma centralisação excessiva.—As capacidades, todas as in telligencias se prendem a um só objecto—a vida da sociedade polí- tica; resulta d'isso que elles gastão sua energia intellectual em discussões úteis ao governo, porem estéreis ao bem estar social. » (2) Estará por ventura Tocqueville descrevendo o estado social de um outro Paiz que, situado em opposlo hemispherio, muito caro nos deve ser? Na Inglaterra, Bélgica, Prússia, Suissa e Estados Unidos progride e floresce o systema penitenciário. Na França decahio, n'Áustria, Espanha, Portugal e Brazil está em miserável estado. (1) Não exagero—veja-se Ayres de Gouveia e o próprio Pietra Sancta o que dizem. (i) Tocqueville—op. cit. vol. 1.* pa^. 358 e seguintes IO Tara que garantir o homem decahido? Para que ouvir o clamor christão, que levantão alguns monomaniacos da reforma moral do prezo? Eis o pensar d'a- quelles governos para os quaes são lettra morta as constituições. Será por ventura um erro repetir ainda que a cadeia é a photographia do progresso social, político « moral de um povo? The hystory of lhe wortd arcordinply, prese: tó us wüh asuccession of crimes and punishments, and nt present lhe series appears to be as lar as removed from a termlnation os at any previou» period in lhe annals of lha race. (Comuk s Natcbk oe Mas). E a penalogia uma sciencia que tem de ser reconstituída a luz das insinuações da Physiologia humana. Com o progredir dos estudos sociaes, com o clarão das estatísticas, tão impor- tuno aos princípios illusorios, tem-se conjlindamente patenteado a incapacida- de d'clla em dar resultados úteis ao bem estar da sociedade. Verdade é que' vai ella abandonando as preoecupações que lhe herdarão as epochas passadas, mas reconhece-se o constrangimento com que d'cllas se desapega. Longe de estudar as causas geraes o individuaes do crime, as disposições or- gânicas inherentes ao pensamento do homem, e formar a sua therapeutica ou prophilaxia em conformidade com os conhecimentos adquiridos por tal estudo tem cila lançado mão, como habitualmente faz o charlatanismo,, de um só meio* de um só medicamento moral, para curar e prevenir toda casta de moléstia moral. Essemeio é o terror, ja applicado para einpecer a contaminação dos quetes- femunbão o crime, ja para curar aquelles que, doentes drclle, padem ter novos accessos. E opcioréquemuita vez ao em vez de medica torna-se cirúrgica; para que ao aspecto do membro amputado, pelo lerrivel da sanguinária operação cuide cada um da ulcera, que pode trazer-lhe a amputação,, como se fosse dado a todos serem médicos de si mesmos l E éeste o seu meio favorito, juntamente como ornais fácil de tratar-se, embo- ra incerto e fraco de acção.E então ella exagerada ou apaixonadamente diz com o- Conde Joseph de Maistre: Otez da monde cel agent incomprchensible; (o carras- ca) dam rinstunt mêuie 1'ordre failplace au chãos, les trones ^abiment d lasor- $ I A fíVíc' di Science an*lteligion-Pag. m. 21 dadeiros autômatos pensantes, porque muitos indivíduos ha cuja vontade jamais tem sido chamada em acção por devido exercício, e que gradualmente perdem o poder desenvolvel-os, tornando-se meras creaturas do habito e do impulso.» (I) Ora si assim é, se o erro parte sempre de um defeito psychico, mais ou menos superavel, é verdade, pode o temor porventura suppril-o? Pode elle dar talou qual aperfeiçoamento ao cérebro mais ou menos defeituoso, despertar as quali- dades moraes e a intelligencia, que dormem prezas nos envoltórios de mãos há- bitos e péssimas máximas? Pode elle fortificar uma vontade tocada deatrophia pelainacção? Não de certo, que a acção do medo é uma eunica, e cada um d'es_ ses estados pathologicos necessita de meios diversos e apropriados a si mesmo que somente uma educação bem dirigida pode fornecer. Ainda quando o terror fosse meio educador, é evidente que deveria crescer de intensidade na razão directa da anormalidade moral do sujeito, ora é facto que, quando o rigor da pena é buscado como meio de punição, o habito de testemu- nhal-o enfraquece a sua acção sobre a sensibilidade dos indivíduos; logo temos o meio diminuindo de efficacia na razão inversa da necessidade d'elle. E alem d'isto « muitos homens tornão-se criminosos por imprudência natural e predo- minância de audácia: nelles o perigo opera como urn desafio, estimulando-os a provocar os castigos ameaçadores.» (2) Eis o próprio meio preventivo originan- do aquillo mesmo, que quer impedir! Por tanto se o terror, extreme de outros meios, é essencialmente inefficaz em prevenir crimes, em fazer renascer a moralidade em um indivíduo, é con- clusão legitima de tal premissa que muito diversamente do que tem pensado a generalidade dos penalogistas deve ser considerada a cadeia. O crime só previne a moralisação das massas por educação conveniente. A cadeia só é efficazmente preventiva no tanto que corrigindo o culpado, obsta a reincidência, e entrega ao juiso e culto das multidões a bellesa moral do ho- mem, que diz na praça publica: eu era cego, seguia o crime, porque phantasia- ra-lhe bellezas, hoje que o enxergo abomino-o, porque conheço-lhe a asquerosi- dade ou então porque ella tornada em hospício de monomaniacos prejudiciaes ao desenvolvimento social, impede mecanicamente o mal dos actos dictados por perigosa e incurável insania. Para alcançar-se porem esses resultados necessário é que distinga-se na ca- deia dous fins, a que dá ella complemento, e que tem sido geralmente confun- didos. O primeiro é a punição propriamente do criminoso mais ou menos livre; por que se em muitos casos tão rudimentar existe o poder do livre arbítrio pelo equi- (1) Larpcnícr— Humann Physiology. (2) Combc-Nature of. man Pag. 253. F 6 32 librio, ou domínio em que o tem o império de propcnsoes congênitas, ou adqui- ridas, tornando quasi injusta qualquer pena pela irresponsabilidade moral do agente, em outros existe elle capaz de arcar com as instigações das paixões, e é por tanto castigavel. É puramente a satisfação de uma lei eterna. E então a prisão é o instrumento da justiça social, cuja origem não nos compete presentemente discutir, e cuja pena deve estar na rasão directa da responsabilidade moral do indivíduo. A differença de criminalidade dos perpetradores de actos reprovados e idên- ticos em sua revelação material é reconhecida até pelo direito Ecclesiastico. Os grandes d'este mundo, diz o concilio do undecimo século, devem soffrer penitencias mais fortes que os pobres; porque não ha igualdade entre os robus- tos e os fracos, ambos não podem supportar cargos iguaes; é como si se met- tera na mesma linha o doente e o são. (1) O segundo fim é a educação moralisadora do condemnado, é o complemento necessário do primeiro, é um dever inescusavel da sociedade. Não porque apre- cie egoisticamente, como fazem alguns penalogistas, a moralisação do prezo co- mo meio de «garantir o futuro » (2) sim, porque despresando-a, longe de ser isso uma «negligencia repreliensível» (3) commettia a sociedade christãa um crime, pois que postergava os preceitos da religião sobre os culpados clara- mente demonstrados no direito ecclesiastico, commettia uma injustiça clamoro- sa para com o mesmo condemnado, e lançava mão de meios, que não achaYão na efficacia preventiva a desculpa de sua crueldade. É o que vamos demonstrar. (1) Laurent—Etudes vol. 7 pag. 159. (2) Chauvcau—Theorlc du Cod. pag. 49. (3) Rossi—Droit Penal. Pag. .421 Ia .....Ia justice civile a son organe et son symbole dans le bourreau. Tel n'e;t pas le senti- ment de 1'Eglise; elle punit non pour iníliger un mal, mais par charilé pour celui qui a fail le mal. (Laibent—La Fkodalité et l'Egi.ise. pag. 156.) II. A intima correlação que ha entre as doutrinas da Penitenciaria dos philantro_ pos modernos, e as theorias penacs do direito Ecclesiastico, certamente surpre- bendera a quem n'isso attentasse, se ja não fora couza de esperar pela congruen_ cia que qualquer ideia benéfica á humanidade sempre hade ligar-se com o evan- gelho, e as doutrinas dos Padres da primitiva Igreja. (1) Acima de tudo colloca a Igreja a regeneração e a salvação do criminoso. Ora é Gregorio Magno estabelecendo os preceitos, que devem dirigir os ecclesiasticos no castigo do culpado. « A caridade, e não o furor os anime; se castigão os cri- minosos é porque os amão, as penas temporaes são para substituir os fogos do inferno. » Um concilio de Toledo estabelece que « o fim da pena é corrigir; para corrigir e preciso usar antes de benevolência que de severidade, antes de exhortações que de ameaças, antes de caridade que de auetoridade. » Buscar a pena como occasião de educar eis o grande preceito da doutrina ec- clesiastica. A possibilidade de alcançar-se a regeneração de um peccador, e o dever de empenhadamente trabalhar-se para conseguil-a a bem dos nossos des- graçados irmãos, são os preceitos estabelecidos por todas as lettras do evangelho. Como pois uma sociedade, que se orgulha de ser chrislãa, esquece-se de pra- ticar tão sanetas theorias? A urna só causa attribuo, e é que quando no século duo- decimo os legistasdo occidente forão a Bolonha buscar no direito romano armas (T, Toda base d'este período sobre o direito ecclesiastico é tirada da rica obra do erudito e pro- fundo Sr. Laurent—La Fcodalilé et 1'Egiise—Liv. 2.* 21 com que esmagassem a feodalidade, de Ia trouxerão as almas contagiadas da ruim penalogia pagãa. Se, porem, impellida por uma philosophia bastarda a justiça social, fechar os ouvidos ao evangelho, retleclindo, hade perceber a monstruosidade sua egoísta justiça. Ainda encarado socialmente merece o criminoso os maiores cuidados da socie- dade. Se a sociedade foi dada ao homem como « meio de soccorro, como meio de desenvolvimento, » claro é, que entre ella e o indivíduo ha deveres mútuos a cumprir. E se criminoso é aquellc que colloca o obstáculo do crime na estrada do des- envolvimento social, também o é ella, quando não allumia com a luz da instrucçáo, aos que, cegos do espirito, não podem convenientemente enchergar no horisonle a estrella, que os chama ao alto destino do homem. E sobe seu crime de ponto, si altendermos que pôde a ignorância cegar ao indivíduo, porem jamais ao Estado como um todo. É deleixo criminoso o seu descuido em instruir as multidões de seus deveres. É desprezo do alto fim para que foi creado por Deos. E, por tanto, pôde se dizer que o próprio crime é uma pena imposta por Deos á sociedade. É ainda a confirmação da inexorável lei das causas e effeitos. Da anemia prolongada nasce a hypertrophia do coração, da anemia moral c's Nalure of Man—Pag. 251. (2) Clay's Meinoiis—Pag. 201. 3S Os ofticios reconhecidos assim necessários são celebrados ate na própria Ma- zasnos corredores; e o prezo da entre-aberta porta da cellula expiava-os. A in- decência e a inutilidade, de que são por essa forma revestidas as ceremonias re- ligiosas, não necessitão de commentarios: é uma verdade demonstrada pela pró- pria natureza, e pelo fim do culto externo. Na generalidade, porém, as cadeias inglezas temsuacapella, eadeBristol cujo plano pode-se ver no relatório da commissão, já por mim citado, é um primor de architectura penitenciaria. Ahi o prezo pode tudo ver, que se deseja que elle veja, sem se communicar com os «eus companheiros, nem os ver. Le problème d:1 1'education c'est ia balance de» forces pbvsiques et des facultes intellectuelles. (Levy—Bygiene toI. 2.* Pag. 80tí). VI. Determinada e intencionadamente nos demoramos n'essas considerações sobre a educação moral do prezo; pois que tão intimamente ligão-se a hygiene d'alma e a do corpo, que buscar estabelecer preceitos para uma sem attender a outra é levantar edifício incompleto e de fácil desabar. Acceitamos o systema de separação cellular dos criminosos como o maior adjuvante no empenho de regenerar o homem decahido de sua nobre gradua- ção; para effectuar porem essa funcção necessário é que a cellula não destrua pela base por influencias prejudiciaes a saúde, os grandes esforços dos cora- ções evangélicos. Apezar d'essa intima relação não tem comtudo, como já vimos, havido equi- líbrio entre as duas hygienes; e por isso mesmo que mais fácil é elevar edifício de alvenaria e obras de pura mechanica, mais avantajado, senão já perfeita- mente resolvido se acha esse lado da questão penitenciaria, que o de levantar a fabrica de caritativos cuidados e da moralisação do prezo. Em attenção as vantagens que apresenta relativamente á vigilância, á admi- nistração e economia do estabelecimento, é geralmente adoptado o systema ir - radiado, ou de raios ou azes partindo de um edifício central, onde morão direc- tores e empregados das repartições, e tudo que diz respeito á administração do estabelecimento. Os azes são corredores, tendo de um e outro lado duas ou trez ordens de cellulas, cujas portas abrem para o corredor central, dando as janellas dos andares superiores e outras partes do inferior para os espaços in- termediários aos azes, os quaes são divididos em pateos triangulares completa- mente separados uns dos outros, em parte cobertos por um tecto, e que con- vergem para um observatório central, d'onde um guarda pôde espreitar as ac- ções dos prezos, que abi por tempo e occazião determinada espairecem, não os: E » 34 impedindo o máo tempo, pois que, como ja \imos, são em parte abrigados os pateos de recreio. A cellula, cujo tamanho é quasi o mesmo nas prizões de Mazas e Pentouville. (I) tem o leito, uma pequena meza, tamborete, bico de gaz, torneira d'agoa, ba- cia de rosto e uma banca, que presa a um tubo conduetor leva as matérias fe- caes a depósitos, que existem em subterrâneos herincticamente fechados, que se extendem por baixo dos azes. Pois que um logar onde um homem inspira e expira pode ser comparado a uma banheira occupada por pessoa, que é obrigada a defecar eaourinar nessa mesma agoa de que elle tem de beber; particulares cuidados tem merecido a ven- tilação e desinfecção das prizões, e d'ahi originarão-se dous systemas de venti- lação (de pulsão c aspiração) sobre cuja preferencia a sciencia não decidio ainda. E como o de aspiração, inventado pelo Engenheiro Grouvelle, é o adoptado em Mazas, tomemos de Tardieu a sua descripção—Debaixo dos seis corredores, que formão os grandes azes do estabelecimento existem grandes subterrâneos her- meticamente fechados abrindo para um chemin de ronde por urna porta duplamen- te forrada de pelles de carneiro, e cujas duas bandeiras são separadas por um tam- bour, onde faz-se o despejo. Neste corredor subterrâneo são arrumados barris em numero igual ao das cellulas. A cada barril corresponde um cano, ao qualé adaptado um tubo em angulo, pelo qual o cano e a cellula se communicão com o subterrâneo, o qual por sua vez cominunica com uma grande chaminé central, on- de o fogo é constantemente entretido, de maneira a chamar todo ar dos subterrâ- neos e das cellulas. As cellulas tomão o ar puro dos corredores por aberturas feitas junto aos tubos de aquecimento. Com esses meios de ventilação constante tem se julgado sufficienle 28, 30 ou 35 metros cubicosdear para evitar a contaminação doar respira vel. Porem, se graças ao nosso clima, ea uma vigilância esmerada que impossibilite a communi- cação dos prezos, julgar o nosso governo que pode substituir por economia a ven- tilação artificial pela dajanella, necessário é que esta cubagem doar sejaaugmen- tada; pois que, determinadas como são oito horas de dormir, e durante esse tem- po devendo estar fechadas as janellas para que as cxhalações cutâneas e pulmo- nares não alterem o ar, necessário é que haja uma quantidade de ar, que sttppra a falta de renovação d'elle. Ora pelos cálculos de Boudin, sendo necessário duran- te esse mesmo espaço de tempo uma ventilação de 27 metros cúbicos para um es- paço de vinte metros cúbicos, temos assim a sonuna de 40, o que está conforme a quantidade, que pelas experiências de Peclet e outros, Levy determina para os quartos de dormir em que não ha ventilação regular, e isso quando a profissão que o prezo exercer na cellula não necessite de utensis, que diminuão notavelmente (l) Na primeira a cellula tem & metros) ou 18 palmos) de comprimento; 2,25.'" (ou9p. ei polegadas ) de largura, e 3 (ou treze e meio d.: altura.) Na 2.' tem treze pés (ou 19 t/2 palmos) de comprimento, 1 de largura, (ou 10 1/2 palmos) e 9( ou 13 1/2 palmos) de altura. 35 o espaço. Ainda bem ventilada a cellula não ha nella « esse banho de ar vivifi- cante » de que falia Ilufeland, (1) forçosoé que o encarcerado respire o ar livre, c estimulado seja o seu organismo pela acção tonificante da insolação por tempo c occasião, que só o medico pode determinar, medindo as necessidades do indiví- duo, e d'ahi a grande utilidade dos pateos de recreio. Toda encarceração tem uma acção prejudicial sobre a digestão, que torna-se indolente, diminuindo o apetite, e por conseqüência podendo trazer alterações graves; obvial-a na maior exten- são possível dentro dos limites de tal estabelecimento deve ser todo cuidado do medico da prizão. A comida abundaute, sãa c de fácil digestão, variável com o estado e natureza individual, merecem particular cuidado, assim como os banhos, os quaes aceião o corpo, attenuando o mephitismo das exhalações cutâneas, e alem d'isto confor- me a sua qualidade produzem elles effeitos graves e benéficos. Os banhos frios, se a saúde os permiltir, devem ser usados; fortificão a pelle, dão agilidade e força aos músculos, adivão e facililão as digestões, trazem certo sentimento de bem es- tar e de força, tornão o organismo menos impressionável ás variações atniosphe- ricas, eafião a intelligencia ealegrão o espirito. Em summa aceio, ar puro, ali- mentação e sobre tudo exercício devem ser cuidadosamente realisados. A ultima condição preenche-a na prizão o trabalho; não é elle só um meio da Hygiene mo- ral, o seu usoé indispensável na prizão cellular. A ociosidade se enerva o opu- lento, que reclinado nos fofos coxins vai deixando que a inércia exhaura suas for- ças, que acção nociva não será a sua sobre o encarcerado, que entre quatro pare- des leva a sonhar com a amplidão dos campos que percorria? As digestões languidas vão desappareccndo, as funeções secretarias se adivão pelo trabalho moderado, que, produzindo também um cansaço salutar, indireda- mente oceasiona osomno reparador durante as horas determinadas, o qual refo- cille as forças, e acalme qualquer excitação cerebral, que por ventura haja. Sc assim hygienico é o exercício moderado, o trabalho excessivamente fatiganlc, co- mo desejão alguns penalogistas, augmentaria as causas de enfraquecimento phy- sico, próprias de toda encarceração, impossibilitaria que o corpo, extenuado, con- sentisse o espirito embeber-se das lições de moralidade, e desenvolver-se a intel- ligencia. Conseguintemente, despresando como cruel, maligno e maléfico o uso de fáligantes eimprodudivos trabalhos, como o de certas machinas usadas nas prizões inglezas, (Crank e Treadmillo) não posso deixar de querer que officios produetivos sejão ensinados e exercidos nas cellulas pelos prezos. O amor que to- dos tomão ao resultado de seus esforços, a necessidade observada, que sente o prezo encellado de oecupar-se em alguma cousa, a facilidade notada delles apren- derem os misteres a ponto de um negro cm Cherry Hill tornar-se perfeito sapatei- (1) Levi—Hygiene. 36 ro em seis dias, (ij a practicabilidade na cellula de muitos officios, e a própria economia; (pois que o producto das manufacturas pôde diminuir as despezas do estabelecimento) são certamente motivos bastante poderosos para o ensino e practica de artes mechanicas, se a hygiene e a sciencia da educação de taes ho- mens não reprovassem qualquer natureza de trabalho, que por sua crueldade e inutilidade só podem ser oriundos da caduca theoria do terror. VII. Não são porém a excellencia architectonica do edifício, e o cumprimento dresses preceitos de Hygiene fiadores seguros da saúde dos encarcerados. O primeiro pre- ceito hygienico para as prizões é a primeira necessidade para os bons resultados moraes da penitenciaria é indubitavelmente a escolha acrisolada dos homens, que hão de dirigir as suas molas. Intelligencia, instrucção, dedicação, benevolência e valor são qualidades indis- pensáveis nos principaes empregados para elles avaliarem justamente as circums- tancias fortuitasque se apresentarem, eutile efücazmente d'ellastractarem. Osannaes das prizões cellulares todos os dias estão a dizer-nos, que a acção d'ellas é infinitamente variável, como variáveis são as organizações e os tempera- mentos, o estado de saúde eas circumstancias da vida do prezo, anteriores a sua prizão e condeinnação. É ao conhecimento pleno d'essa verdade, que deve a In- glaterra principalmente o satisfactorio e animador quadro da estatística medica de suas melhoradas cadeias. Indivíduos ha que, por sua constituição ou estado mao de saúde physica e mental, são incapazes de soffrer o rigor de uma penitenciaria; esses são enviados para prizões—asylos, onde ha meios próprios de educação e punição: o Invalid Prisonat Waking e Criminal Lunatic Asylium at Broadmoor po- dem attestal-o. Entre aquelles mesmos, que são capazes e aptos para soffrerem a disciplina commum, ha tanta variedade de caracteres, que apropriados a cada um devem ser os meios disciplinares empregados. Uns submettem-se facilmente ao regimen, outros apresentão alguma reluetancia, que ao depois é vencida, finalmente ha ca- racteres de indocilidade selvagem de tal quilate, que qnerel-os domar pelo rigor é abrir-lhes o caminho do desespero e do suicídio. « Um duello trava-se então: entre o prezo e o carcereiro, e uma vez começado hade ser terrivelmente dispu- tado; um louco e desesperado combaterá com a cega fúria de besta fera, o outro (1) Ducpetiaux—Reforme Penilcnciuirc—Vul. 1.' 39 provocado c irritado crescerá em ferocidade; em geral tal conflldo terminará ou por um assassinato, ou por um suicídio.» (l) Em uns apparece certa exaltação nervosa, que pode ir ao delido, em outros a impressão triste da cellula pode leval-o a melancolia. Estes effeitos, que, abando- nados a impossibilidade da cellula, podem trazer tristes conseqüências, são ob- viados e vencidos pelos cuidados de um capellão caridoso, o de empregados de- dicados. » Os mesmos afTectos do prezo conveniente e intelligentemente dirigidos são de uma utilidade incalculável relativamente a sua saúde e moralisação. Nenhum inconveniente ha em permittir algumas vezes ao preso a sociedade em sua cellula de pessoas, que tragão conforto sem comtudo destruírem o edi- fício da sua regeneração. Na Inglaterra é permittido aos prezos receberem de trez em trez mezes uma carta, que deve ser lida assim como a resposta pelo ins- pector antes de ser entregue ao dono, e até permissão é dada para a vizita de uma pessoa estimada, sendo porem vigiada pelos guardas durante a conferên- cia. (2) E na realidade: tal indivíduo sonha sentir o anediarem-lhe os cabellos as mãosinhas de uma filha, ou de um esposo querido, ora abraçar um amigo, ora ler tal livro de doutrina reconhecidamente inoffensiva etc. etc.......para que prohibir-lhes o desejo naturalissimo e innocente, e que pode alem d'isto tornar- se fonte de excellentes resultados, e cuja prohibição talvez estragará o edifício, que se quer levantar? O erro do systema penitenciário que ainda hoje se faz sentir, se bem que di- minutamente, é que confiava-se mais nas cousas que nos homens, mais no si- lencio ou no trabalho que na palavra moralisadora, mais em uma regra infle- xível e dura que em preceitos amolgaveis ás circumstancias e apropriaveis ás individualidades. VIII. Ainda que a mortalidade nas velhas prizões seja muito mais crescida que nas modernas cellulares, (3) a inspecção medica dos prezos deve merecer em (1) Clays Memoirs Pag. 262. (2) Reportsfron the select eommitter of the houseoflords in the present state of discipline in gaols. pag. 33. (3) Vide Tardieu—Dict. Hygiene. Nas antigas prizões a mortalidade era de 4 , 5 ou 6 por 100, al- garismo que nas prizões cellulares de Montepellier Tours, Versailles, Bordeaux, Rhetel, Renure- niont, Mazas está muito abaixo d'aquelle, e que o próprio Pietra Saneia reconhece procurando com tudo attenuar por considerações arbitrarias. Em Pentonville de 61 a 62 morrerão dous indi- víduos em uma população de 1512, vinte dous forão removidos para as prizões de inválidos, d'estes vinte e dous apenas cinco gozavão perfeita saúde na occazião da entrada. Soffrião: um de Endocardile, 3 de Bronchite e Pleurisia, e um de Phtyslca pulmonar—PentonvHles Medicai Report—1862. F 10 3$ um systema regular de prizões o maior cuidado. Entregar aos rigores de uma prizão qualquer constituição deteriorada certameute que é lavrar-lhe a sentença de morte. E sobre tudo o estado mental do encarcerado na occazião, e depois da sua entrada, merece ou exige tal attenção e exada inspecção, que jamais peccaria por excessiva. Longe de ser originada pela própria cellula a maioria dos casos de alienação mental, que se desenvolvem nas prizões, não são mais do qffe explosão de uma predisposição infeliz, e ainda as exacerbações de um mal chronico. In some instances the prisonners have been previoutly insane and confined in lunatic asylinms, in other cases there has been an obvious predisposition to in- sanity. Another and peculiar class of prisoners received into Pentouvillc is dis- cribed in a former report of the medicai officer; they occupy, asit were, a neutral territory between crime and insanity.ln lhe prisons they areregarded ascrazy, but in lunatic asyliums as impostors. (1) E o facto de quasi todos os casos de loucura se darem nos primeiros tempos e até dias de encarceração, e a va- riação que no mesmo numero de indivíduos apresentão os annos na somma dos loucos, bem demonstrão a necessidade de certa predisposição previa para ex- plical-os. Ainda quando porem as estatísticas de Lelut, Tardieu, da commissão nomeada para estudar a questão, e de muitos outros não demonstrassem que nas antigas prizões a razão das loucuras era de 4, 5, 6 ou 7 e mais por 1:000, em quanto que nas modernas é de 2, 3, 4, 5 ao máximo, e que os suicídios na vida livro são na proporção de 1 por 1.512, ao passo que em Mazas são na de 1 por 1.571 (proporção que certamente longe de atemorizar deve socegar os espíritos tími- dos, (2) ainda quando assim não fosse, serviria isso de argumento contra a escolha do systema cellular? Não de certo. Tirar das cadeias francezas argumentos contra o systema é um erro de lógica. O estado deplorável de suas cadeias, o ofiicialismo até dos homens da religião já o pintamos. Os erros de Mazas reconhece-o até o próprio Pietra Sancta, e por números demonstra a impossibilidade do capellão vizitar convenientemente os prezos. Se nós condemnamos o silencio e a solidão absoluta, se collocamos como ali- cerce do systema reformador, que adoptamos o tractodo prezo com homens vir- tuosos, se queremos o trabalho para todos, (o que não se dá em Mazas) podem os resultados das prizões francezas servir de objecção, ou antes de soccorro em nos- so combater o systema de solidão? A nós que temos sempre procurado demonstrar que mais aproveita uma disciplina suave e intelligentemente dirigida, que o rigor surdo e a crueldade calculada podem o suicídio e a loucura atemorizar? (i; Medicai Report fron Pentonville. (2) Tardieu—Dictionario de Hygiene. 39 Certamente que, demonstrando os factos que taes effeitos são a melhor medi- da da relaxação, ou demasiado rigor de uma prizão, mais se deve attribuil-os aos homens encarregados d'ellas, e a seus regulamentos, que a mesma cellula. Houve uma prizão ingleza onde a mortalidade e a immoralidade erão espanto- sas: um homem partidário enthusiasta da cellula, dominado pelos preceitos do Evangelho, escolhendo-a para theatro de sua missão, entregou-se de corpo e alma a saneta obra da moralisação dos prezos, e com estatísticas nas mãos pode esse homem contente clamar—a loucura sumio-se da prizão de Preston. Em Pentonville, que de 1862 a 1863 não apresentou um só caso de suicídio, em 1853 uma disciplina severa e implacável foi estabelecida, e a somma dos suicí- dios sobremodo subio. Cl) O suicídio é a loucura partida do desespero, não foi produzindo-o que os de- positários da túnica inconsutil de Christo vivificarão o mundo, gangrenado pelos vicios da antigüidade. (1) Medicinal Reports—já xit, ......a principie no-w recognised by ali the mo<« -enligiitened cducatois that lhe developementof ihis power of scir-central ought to beobject of ali nur- scrvy discipline. ( Carpenteu—Uuman Phvsioi-ogí.) IX. Aguçada a intelligencia, desenvolvidas c aperfeiçoadas as idéias do justo e do "«injusto, avivada a consciência, cousas alcançadas pela instrucção moralisadora na cellula, não está completa a educação do prezo. Embora tenha elle sciencia -plena de seus deveres, embora tenha firme intenção de não mais peccar, a sua ■vontade ou naturalmente fraca ou enfraquecida pelo pouco uso que d'ella faz na cellula, pode ser o joguete de influencias más. A cellula educa a intelligencia, educa a sensibilidade, porem a vontade ella an- •tfes atrophia que desenvolve. É um fado de observação, que os prezos por muito &tcmpo encellados tornão-se mais próprios a serem guiados que ase governa- rem. (1) Se porem a separação cellular é necessária para o ensino de bons prin- cípios e extirpação dos mãos, é lógico que continuada por outros meios, que con- sigão aquillo que «lia não pode, deve ser a cellula substituída. Foi conhecendo ■esta verdade que os homens pensadores na Inglaterra formarão systemas quecom- .pletão progressivamente a educação do pnczo. O English Probatisn System eolrish System attestão o cuidado que tem me- recido a disciplina penitenciaria nesta grandetiação. Não basta incutir doutrinas. É necessário voluntariamente practical-as. E ne- cessário estabelecer no espirito a lueta entre os princípios bebidos eas tendências •más, que se offerecem, comparal-as,julgal-as, para voluntariamente seguir aquel" !ías que são conformes, como sendo intimo ja convenientemente educado. Occasião ;para essalucta não a dá a cellula, ebellamente a offerece o systema Irlandez. Ao «nesmo tempo que vai dando liberdade nalucta, outros meios vem soccorrer dos (i) Clay Op.CiL 4f verdadeiros princípios a emulação o originar do sentimento de própria dignidade pela distincção, as classes, os prêmios são meios notavelmente combinados, com- binação ainda maisinsigne, porque vai acompanhando proporcionalmente a re- tirada da direcção estranha, áque eslava sujeito o-educando. Descrevamos este bello systema— (1) Depois de passar nove mezes em prirão cellular de Montjoy em Dublin,- j»rizão dividida cm duas, uma de mulheres e outra de homens, e onde cuidadosa- mente é exercida a educação religiosa c moral, é o prezo, se lavrador, mandado* paraSpikcIsland,semechanico, para aprizão do governoem Fhilipstouwn. Em qualquer d'essas duas prizões ha quatro classes: terceira, segunda, primei- ra e a adiantada. Asprerogativas que tem cada uma drellas vão proporcionalmente augmenlandc- da terceira para a adiantada, onde o prezo gozadeuma disciplina já bastante be- nigna, eé lhe perinittido dirigir-se elle próprio nomeio de muitas das tenta- , ções da vida ordinária. Assim na terceira classe tem elles direito a um penny por semana, na segunda a dous, na primeira a quatro e na adiantada a nove, dinhei- ro que depositado deve formar um pecúlio, que receberá na occasião da soltura:. o uniforme da prizão vai sendo alterado, até que na ultima é despido, podendo- elle trajar a seu capricho. Quando o sugeito chega de Montjoy entra para a terceira elasse, e con- forme o seu procedimento, seu progresso na escola c seu trabaiho tem um prêmio- mensal, cujo máximo é nove marcos: trez por cada um d'aquiles motivos. Esse dinheiro, que o prezo não recebe, csim mensalmente um bilheite, que-lhe diz a quantia à que tem direito, e a que lhe falta ganhar, é destinado para comprar elle o accesso de classe. Ora, como ja se sabe que o máximo que pode o prezo ganhar mensalmente- é nove marcos, segue-se que tantos mezes julgar-se-ha conveniente que elle passe em uma classe, quantas vezes nove marcos lhe serão exigidos. Essa de- ~i mora em cada classe é determinada pela extensão de sua sentença e em relação* ao seu procedimento anterior em Montjoy. Quando procede mal, castiga-se-o^ inutilizando—um certo numero de marcos, ou cassando conpletámcnte o seu bilhete, que faz tornar ou para uma classe inferior,, ou para a terceira, d'onde de novo tem de trabalhar para a sua elevação. No fim do mez cada prezo pode assistir ao assentamento cm um livro das no- tas do seu procedimento, e appellar ao diredor, se julgar soffrer alguma injustiça. Alvorota-se-nos o coração ao descrevermos o ultimo período do systema pe- nitenciário irlandez, fogem-me as idéias pelo immenso prazer de ver que no meia- do redemoinhar do egoísmo cominercial do século, ainda se anistia em alguns corações a verdadeira caridade. (ij A desciipção do systema é toda tirada do Cloy's Memoirs. 4S Vós, que estaes acostumado a ligar a ideia de prezo a de vingança è terror, vinde mentalmente comigo a Smith field e Lusk as Prizões Intermediárias, aquel- las que preparão o homem ja talvez ex-criminoso a entrar na sociedade, como útil membro d'ella, de prejudicial que era elle, aquellas que fazem dobrar agra- decido o joelho a Deos, aquelle que outr'ora lhe virava o rosto. Smith-field é uma prizão—fabrica dentro da mesma Dublin, os prezos são até mandados as ruas da cidade com dinheiro para compras! Lusk é uma prizão—granja onde se lavrão os campos. Traduzamos a sua descripção. «Os prezos em Lusk alojão-se em duas gran- des cazas de ferro, cada uma das quaes tem dormitórios para cincoenta homens, e custara 330, (2,970.000); facilmente desmanchão-se e removem-se ellaspara onde se queira. Nada existe que designe o caracter de uma prizão; nem muros, nem guaritas. A única chave que as fecha é a que M. Demets chama Ia clef des champs. As suas vestes são as dos lavradores communs; os guardas vestem a mesma cousa, e são mais uns mestres que vigias. O freio moral, porque são go- vernados os condemnados, é inteiramente tão efficaz como as grades e o ferro- lho. » E no entanto; gosando d'essa liberdade relativa é o prezo ainda sujeito á uma áspera disciplina. O trabalho é penoso, nunca menos de 8 a 9 horas por dia, alem do serviço do- méstico da prizão; a refeição é demasiadamente parca, de tal sorte que os prezos algumas vezes comprão-na a sua custa. Os rendimentos do trabalho são destina- nos ao costeio da prizão, do qual elles preenchem grande parte. Apenas meia coroa lhes é dada por semana, e só podem ter para a algibeira seis pence. É ahi que os prezos tem de terminar seu tempo, demorando-se pelo menos quatro mezes, e quatro annos quando a sentença tem sido de 15 annos. O prezo porém pelo seu bom procedimento pode ser licenciado antes da expiração de seu tempo de prizão. Logo que Lusk foi instituída, os lavradores circumvizinhos atemorizarão-se com tal população sem freio, e entregue a suas próprias determinações; hoje são elles mesmos que admirão o procedimento irreprehencivel d'aquelles a quem temião. De mil prezos que lá tem ido apenas dous fugirão, e esse facto estupendo acha sua explicação no próprio systema. Os bons resultados do systema não o demonstrão somente os gabos, qu« dão os Capellães em seus relatórios, á religiosidade dos prezos; (1) não o demons- trão somente casos designados da mais completa reforma moral, attestão-nos principalmente as estatísticas: em quanto que na Inglaterra onde recahidas de muitos dos tiket of leave men passão ignorados são na razão de 15 por cento, na Irlanda, onde é dificultoso commetter um crime sem ser descoberto, e ainda (1) Reports of. Iriíh priioni for 1862. 43 mais deixar de ser identificado o ex-condemnado, a razão das reincidências é de 4 por cento. Esse bello systema não é em sua totalidade applicado a ambos os sexos: para as mulheres é elle idêntico até a classe adiantada, sendo comtudo toda sentença cumprida em uma só prizão, a de Montjoy, e ahi se termina, podendo ellas pe- los seu bom proceder alcançar uma remissão de pena. Na classe adiantada ellas Ia vão e cozem em commum com as outras mulheres. Eis por tanto esboçado o bello systema, que, supprindo as lacumas dos que tinhão prevalecido, e ainda durão, parece chamado a ser a demonstração practica da grande verdade da possibilidade de regenerar o vicioso. Solto o prezo, não se terminarão os graves e assíduos cuidados que necessita elle. As imporficuas e nocivas penas outras e as prizões de uma penalogia crimi- nosa, lançando no ceio das populações as suas victimas peioradas antes que me- lhoradas, tem sido geradora dos receios que a sociedade nutre ao bater-lhe a porta um ex-condemnado, pedindo-lhe trabalho. Elle, embora traga a alma limpa e curada, é tangido da fabrica, ou da porta domiciliaria por temerem-lhe o contagio da lepra, e dura necessidade fal-o, por entre lagrimas de pura dor, ou ardendo em ódio, lançar mão outra vez do crime, como de umataboade salva- ção ou vingança. Foi pára obviar esse perigoso escolho que em França se forma- ra a Societé de Patronage, e na Inglaterra as divinas (como lhes chamão os directores das prizões em seus relatórios) Discharged Prisonefs Aid Society para procurar-lhes meios de levarem uma vida honesta. Com taes sociedades completa-se o systema de Penalogia Christãa. O legado do paganismo deve sumir-se do meio d'essa sociedade que apresen- ta a assombrosa incongruência de entrar nos templos do Crucificado depois de indiferente ter passado pelas Tullianas conservadas até hoje para escarneo da crença do progresso dos paizes, que as conservão. As instituições do mundo antigo no meio das gentes regeneradas no Jordão são monstros deformes, com- postos definidos de partes mutuamente repellentcs, por isso mesmo nocivos ao bem estar social. A cadeia antiga dizia—tu que passas teme—a moderna diz—regozija-te, por- que o seo moto he: Frater tuus mortus erat et revixit; perierat et inventus est. (S. Marcos Caf. XV.) A' medida que for merecendo cuidado e estudo1 das causas dos crimes entre nó?, ha de progressivamente manifestar-se a verdade—que a generalidade dos nos- sos criminosos mais digna é de compaixão e de peni- tenciárias essencialmente moralisadoras, que de pura e excessiva severidade. I. Quem ha ahi que sinta pesar-lhe no coração cada lettra da palavra Pátria, co- mo cabedal de incalculável valor, e à roda de si veja escoarem na enxurrada dos governos que vivem, e que morrem, indecisas as questões mais vitaes á morali- sação e conseguinte bem estar d'esse Brazil, e não experimente o desalento e o temor a constringir-lhe a garganta? Onde está a instrucção moralisadora das « classes perigosas da população » ? Onde se ensina ao vulgo a separar o joio do trigo da civilisação que ahi vem, e a neutralisar o virus herdado de uma me- trópole decadente e viciosa? Onde repercute o echo do púlpito rasgando as des- lumbrantes capas em que se envolve o vicio para mostral-o ás multidões em sua própria e repulsiva nudez ? Onde está em nosso sertão a força que efficazmente dê garantias aos fracos, e ataque e empeça as prepotencias dos poderosos? Cala-se a predica moralisadora; porque o panegyrico do santo da festa é que lisongeia a ambição do padre publicano; cruzão os braços os homens do poder, porque o estudo e o edifício das altas questões sociaes roubar-lhes-hião o tempo e as forças necessárias á resolução dos problemas da ambição de subir. Açula- se a injustiça do grande, porque elle é uma escada eleitoral. E onde isto é! Em um paiz em que a immoralidade assentou-se com o pri- meiro colono d'elle, onde a escravidão é fonle fecunda de tantos vicios! Se isto já não é um inferno de immoralidade é por um especial favor do Céo; é porque a miséria ainda não destampou o cofre das mais productoras causas do vicio. 45 Os crimes dos homens asselvajados crescem no campo, os bastardos da civi- hsaçao ja se mostrão patentemente em nossas «randes cidades. O que ha para punil-os, moralisando o perpetrador? Nos nossos sertões, nas villas e nas cidades ou uma caza incapaz do fim á que apphcao-na, ou a antiga cadeia do município, legado da estupidez e barbaria do despotismo colonial, onde se misturão, e se pervertem cada vez mais os crimino- sos onde aprendem requintes do vicio o suspeito, eoque ainda não foi julgado. IVao para abi esse nojento estado de cousas; muita vez a velha e fraca cadeia nao tem segurança, o carcereiro teme a fuga do seu deposito, e não tendo gri- lhões a prizão, serve-se de que? do tronco! E poderá o filho da própria cidade do Salvador voltar o rosto ante esse repu- gante quadro? Não de certo. A prizão dos forçados do Arsenal de Marinha, onde ainda se ouve o estallo do azorrague do sargento da galé, a prizão de S. Antônio, onde o prezo de sim- ples delido policial, e o que ainda tem de provar no jury sua innocencia ou cul- pabilidade são em intima mistura, não estão no meio da cidade, que se diz ci- virisada ? ^ Para que discutil-as, se ellas não passão de pellourinhos em que atrozmente são açoitados a Hygiene e a moral Christãa? Trazer a sua descripção em uma the- ze seria apanhal-as do lodaçal em que as lançarão por prejudiciaes e irremediá- veis todas as sciencias. Dóe-nos rasgar o vêo que encobre essas asquerosidades de nosso corpo social, mas é necesssario fazel-o, a ver se o mào cheiro da gangrena desperta o cri- minoso indifferentismo da opinião publica. ufano nos mostra o governo a Penitenciaria (?) da Conceição. Entremos nella. II. Com espanto vemos surgir de um pântano de águas pluviaes e do mar a Pe- nitenciaria da Conceição, que, assim collocada, mais parece destinada a alliviar os govejnos do gravame de manter grande numero de homens, dizimando-os por morte lenta, que a levantar-lhes a saúde d'alma e do corpo. Já nos fôra isso de prevenção contra o que lá dentro do edifício se passa, se cançada de amarguradas decepções não nos estivesse a imaginação a desenhar desde já o que lá teremos de ver. Quasi que não nos resta mais esperança de encontrar uma instituição publica entre nós que dilate e estremeça um coração verdadeiramente patriótico. O Systema Penitenciário na Bahia c huma mentira. O nome de penitenciário posto naquellc edifício condemnado até pela archi- F 12 46 tedura de prizões, é mais um escarneo lançado á futilidade de nossa opinião publica. Quizerão que entre os serviços escriptos de algum presidente apparecesse o necessário melhoramento das prizões, e baptizarão com o nome de Penitenciaria o que labora nas mesmas immoralidades das outras abjectas cadeias. Do edifício planeado apenas dous raios achão-se acabados; contém um d'elles as cellulas, o outro é destinado as officinas, que ainda não estão em exercicio. O primeiro raio é uma prova de copiarmos aquillo que a própria experiência e a sciencia tem condemnado, e sido consegumtemente desprezado em outros paizes mais felizes. O plano architectonico é o mesmo, que foi primitivamente adoptado na péssi- ma Pittsburgo, e ao alevantar Cherry Hill a Philadelphia reformara completa- mente. É por esse novo plano amplificado e melhorado ainda que Mazas, Pentonville e todas as Penitenciárias modernas tem sido construídas. As ordens de cellulas ao em vez de darem as portas para uma só galeria cen- tral, ede serem construídas de encontro as paredes lateraes da caixa do edifício, são justamente estabelecidas por modo opposto: as cellulas estão no centro do raio, que é dividido em andares, juntas costa á costa, e abrindo as portas para duas varandas ou corredores lateraes. É nestas varandas que estão asjanellas do edifício. No aperfeiçoado systema tendo cada cellula suajanella a necessidade da ventila- ção é satisfeita, e pode o prezo gozar do beneficio da luz solar e da insolação, e per- manecer fechada a porta inteiriça da cellula, alem de que um só guarda collocado na galeria central pode vigiar todo um raio. No desgraçado systema da Conceição, alem de serem necessários tantos guardas quantos os andares, não havendo a ventilação artificial, e não sendo directa a das janellas, não pode a escura e mal arejada cellula ter outra porta senão uma grade de ferro, e ainda assim quem lá penetrar hade nauseado sahir pelo ar infecto, que ali respira-se, e banhado de suor pelo calor que faz. Em summa cubagem diminuta do ar, que ja é infeccio- nado pelas exhalações somáticas, e as do bacio, que ali leva vinte e quatro horas cheio de matérias fecaes, o prezo esfomeado e a rogar que o deixem respirar no corredor, nenhum exercicio nos pateos de recreio, que não existem, inércia completa, pouco aceio do corpo.....eis as regras de hygiene physica da prin- cipal prizão da Província da Bahia. Se alem d'isto ao ver-se o rosto sympathico de alguma victima da ignorância, do clima, dos princípios errôneos deixados pelos nossos primeiros colonisado- res, e alimentados pelo deslavado deleixo dos nossos governos, procurar-se pela hygiene moral, buscar-se o director intelligente, o padre moralisador, o profes- sor primário; ver-se-ha que o primeiro, verdadeiro pensionado da província, não mora no estabelecimento, e que o segundo e o terceiro não tem sido julgados necessários. 49 O systema adoptado no regulamento é o de trabalho em commum, sob o prin- cipio do silencio, systema reconhecido presentemente o peior, e que para o Brazil é péssimo, porque só pode produzir alguma cousa, e deixar de ser peri- goso, quando tiver a sua frente os Elam-Lynds, e não a proverbial falta de de- dicação da generalidade dos nossos assalariados públicos. Praticamente, se o meio necessário à moralisação e castigo, reconhecido por todos os systemas modernos é a separação individual dos presos, na Conceição ella não existe nem poderá deixar de assim ser sob pena de morrerem asphixia- dos ou loucos os pobres encarcerados. Com a cabeça mettida por entre as gra- des conversão os presos. Isto se passa nem somente no andar do raio em que cada preso é só, como também no outro em que existem dous indivíduos na mesma cellula, systema reprovadissimo, animador dos mais torpes hábitos, e destruidor de todo esforço de moralisação. Os máos effeitos na mesma Conceição, em que a moralisação do homem é cousa sem valor, ja se sentem. Muita vez tem-se visto o vice-diredor obrigado a ir separar os companheiros de cellula da briga renhida em que se travarão. Ainda mais, si é um preceito das prizões bem ordenadas que os prezos leve- mente doentes se curem na mesma cellula, na Conceição necessário é que hajão sempre deseseis doentes no hospital; porqne si o numero das cellulas é de 208 o dos prezos é de 224. A comida fornecida pela Misericórdia, que a arrematou ao Governo, é deter- minada por uma tabeliã que acho diminuta no almoço, e apresentando a grande falta de nem uma tisanna alimentícia, ou outra qualquer cousa determinar-se para a ceia, como nas boas prizões. Por esse lado a ausência das regras da Hy- giene ainda se faz sentir; porque, embora haja uma dieta determinada, é o medi- co quem somente pode medir as necessidades individuaes de alimentação indis- pensável á saúde. Se a comida determinada no papel é insufficiente; quem vê finarem-se des- graçadamente os loucos, quem aprecia o que se passa nas enfermarias do hos- pital da Misericórdia pode deixar de duvidar, que na pratica ainda peior está a cousa, c de cremas lamentações dos prezos? A túnica do Christo quasi sempre não cobre a fanfarronice ostentosa? Eis a largos traços veridicamente esboçada a prizão, que se diz a primeira da província. Eis mais uma mentira do nosso progresso social atirada a rua. Eis mais uma decepção para quem preza os altos deveres da sociedade. Das reformas, que necessita a penitenciaria da Conceição, a primeira é, ou a construcção de um novo raio em conformidade com o que hoje a experiência tem demonstrado que deve ser adoptado, ou destruição do que está feito, ron servando-se apenas a caixa do edifício. O nosso pensar sobre a hygiene moral c physica do prezo temos era outro logar delineado. 4§ Ha porem em nosso coração a esperança de presenciar brevemente melhora- mentos tão urgentes e necessários? Não ! A opinião publica entre nós triste paralytica observa muda e aphtica as ulce- rasgangrenosas do corpo social brazileiro, os lamentos dos afflidos cobrem-nos as celeumas dos lisongeiros e ambiciosos, e seguros trilhão os homens do poder a estrada do egoísmo e da incúria no meio de notas festivas sem ouvirem os ge- midos da desgraça, e dos que com ella se confraternizão! Consola-nos, porem, uma esperança: só o remédio de Deos tarda o tempo que leva a atravessar o espaço o ai do afflido para chegar aos pés de seu throno. Pias, SECÇÃO ACCESSORIA. E condição indispensável para o infanücidio a vilabilidade do recém-nascido? Deverá ser iserapto de criminalidade o que matar o infante não vitavel, ignorando comtudo a existência de tal circumslancia ? I. Infanticídio é^a morte voluntariamente dada a um recém-nascido. II. A classificação de infanücidio por omissão e comissão serve apenas para o conhecimento da causa da morte. III. Em direito criminal sua importância é nulla. IV. A voluntariedade do ado é a condição necessária para dar-se o crime. V. A vitabilidade do infante não é indispensável para que haja o crime. VI. Muitas legislações reconhecem esse principio. VII O código criminal brazileiro sabiamente desconhece a questão. VIII. Renega o código moral da medicina o medico legista que julgar a vitabilida- de do rcccm-nascido cousa indispensável para dar-se o infanticídio. 5(1 IX. É immoral a legislação que julgar necessária a vitabilidade do rcccm-nascido para dar-se o crime. X. Ainda quando todas as legislações assim pensassem, era o caso do medico guiar-se pelo código da moral, e combater o social. XI. Ê um crime que em geral tem por si muitas circumstancias attenuantes. XII. É barbara e injusta a pena de morte imposta a infanticida. ^V^^f§^^í-Hr— SECÇÃO CIRÚRGICA. Resecçòes. i. A resecção é a extracção de um osso ou partes d'elle, conservando-se com tudo as partes molles. II. A extenção da alteração orgânica vital ou traumática deve ser presumida antes de intentar-se a operação. III. O estado geral do doente muito decidirá da conveniência ou inconveniência da operação. IV. A conservação do periosteo fora cousa de desejar todas as vezes que se fizes- se a operação, e deve ser attendida quando for possível. V. As incizões longitudinaes nas resecções dos ossos longos devem ser preferi- das a outras quaesquer. VI. Em muitos casos a resecção não pode soffrer cotejo com a amputação. VIL A operação requer cuidado, cujo desprezo é do mais pernicioso alcance. VIII. A indicação da operação não tem a mesma força para todas as naturezas de lesões. 53 IX. É mais indicavcl a operação nas lesões traumáticas, que nas vitaes e orgâni- cas. X. Todas as vezes que se tiver de fazer a resecção de porção extensa dos mem- bros inferiores a amputação deve ser preferida. XI. A resecção das partes ósseas componentes da articulação coxofemoral é pre- ferível a desarticulação. XII. É caso desesperado a alteração da regíã-j cotiloidiana, seja de que natureza for, que por sua extensão contraindiquc a resecção. SECÇÃO MEDICA. E a erysipela doença local, ou antes um padecimenlo symptomalico de certo estado geral? Que relação haverá entre a erysipela e certas moléstias do estômago? i. Erra o systematisador que collocar pura e simplesmente a erysipela na classe das inflammações. II. E moléstia geral. III. É uma alteração do sangue. IV. A angiolencite quando percorre todas as suas phases termina-se por uma verdadeira erysipela. V. É a erysipela mais um apoio da theoria de Addison therapeutica—cellular. VI. íntimos são os laços de parentesco da erysipela com as febres eruptivas. VIL Erra perigosamente o medico que limitar o seu tratamento a applicações tó- picas. VIII. Estudo desvelado precisa o tratamento d'essa moléstia. 54 IX. As alterações dos órgãos internos sobrevindas á uma resolução ou a delites- cencia da inflammação externa na erysipela não são mais do que puras metas- tases. X. As erysipelas sobrevindas ao desapparecimento de uma dermatose chronica e ainda á uma aguda extensa e intensamente desenvolvida são essencialmente perigosas. XI. O estômago serve também quasi sempre de sede da revelação organo-pathica da moléstia. XII. Quando isso se não der poderá explicar-se as alterações gástricas por uma irritação do órgão pelo estado bilioso, ou saburral, que quasi sempre acompa- nha a erysipela. IIYPPOCRATIS APIIORISMI I. Vita brevis, ars longa, occasio praeceps, experientia fallax, judicium difficile. II. In omní morbo mente valere et bene se habere ad ea quod offeruntur, bo- num est, contrario vero malum. III. Ubi somnus delirum sedat, bonum. IV. Gibi, potus, venus. omnia moderata sint. V. Ubi fames, non oportet laborare. VI. Animadvertere proeterea oportet hominis mentem et mores et corporis vires. Alíi enim facilius aut difíicilius, alia imperata facient. IÍA1IIA—Tjp. Poggctli de Tourinlio, & C.a—1864. £/Le?nctiic/a a fêcmtnejbãc ^euiàoia. &ane'a e &aceiú/ae/e e/e >s/êec/tccna 3 c e/e ontem vi & e/e sé 64. 2ZJ*. r/aó/iai, Vectetaiio iutetuio. (fà/a //{de edéácon/oime oJ Sti/atuéoJ. o&aftta sé e/e C/u/a/io e/e /<^/. tÊÊ*. s/. <$//Laica c/a cnAa. ê/)?. Wun/ia CcVà/ce c/anteM*. êè*. J£at* S^diaie*. Jm/tUma-4?. £6a/íta e &^acutc/ac/e e/e ^èee/tccna ap o(e 0u/uMo e/e té64. gfiy. £3cz/iÚíSa, ÊDiwclot. i