rv J+ feo^-ÍÃ^ é^^^ »■' 1 \ v cia lP;^£PÍüJ Ê^Mây DA EPIDEMIA DA FEBRE AMARELLA J31JE GRASSOU NA .PROYINGÍA DO CEARA' /EM 1851 E 1852. , PELO DOUTOR wl® mm && Typographíã deNicoláo Lobo \iaima Júnior, RUA DAJUDA N. 79. L 1853. ±&£^?í> \ -x N DA EPIDEMIA DA FEBRE AMARELLA QUE GRASSOU EM 1851 E 1852. PELO V Doutor Liberato de Castro Carreira. Formado pela Escola de Medicina do Rio de Janeiro, sócio e/fcctivo da Academia Medica-IIomceopathica do Brasil, e correspondente da so- ciedade Pliarmaceutica do Rio de Janeiro, Medico da pobreza da província do Ceará, Provedor da saúde do porto da capital por S. M I , Membro da Junta de Hygiene publica do Ceara, e socw cor- respondente da sociedade Auxiliadora da Industria Nacional. RIO DE JANEIRO. typographíã de n. l. vianna júnior, RUA D'AJUDA N. 57. 1853. JLWHmMMiJI. -ü)JU>~ Circumstancias independente de nossa vontade conside- ravelmente retardarão a publicação deste trabalho, que, como se verá, foi escripto na província do Ceará, logo depois da epidemia da febre amarella, mas que não sendo possível ser ali publicado, só agora depois de nossa pas- sagem e residência n'esta corte o podemos fazer. Se não fosse o propósito., que fizemos de nos occupar so- mente., com o que occorreu em nossa província, podíamos augmenlar as nossas reflexões, com algumas considerações mais acerca do que temos observado, mas não servindo, o que temos visto e observado senão de corroborar as nossas opiniões acerca da febre amarella, estamos satisfeitos com aquillo, que temos escripto, pedindo desculpa a todos aquel- les que se dignarão concorrer para a publicação do nosso trabalho, da demora, que não é devida a nós ; é mais um motivo, que temos para pedir a sua indulgência, além d'aquella que lhe pedimos para a apreciação, do que lhe oíFerecemos. Dr. Liberato de Castro Carreira. Rio de Janeiro, Agosto de 1853. s, XHTRODüGaS tf^^^^pr Quando em 1850 a febre amarella flagellava a quasi todas as províncias de litoral do Império, com as quacs tinha á do Ceará a mais freqüente communicação por via dos vapores &c, á todos os momentos esperávamos ver apparecer entre nós este terrível hospede; porém a Provi- dencia Divina nos foi sempre preservando, até que termi- nando-se esse anno, que por tantos títulos ficou gravada na memória dos homens e na historia do Brasil, com elle nos persuadimos, que devião terminar os nossos receios, de sermos visitados pela febre amarella, pois que de toda ex- tineta nas províncias mais visinhas, só nos chegava a noti- cia de alguns factos isolados na capital do Império. Entrou o anno de 1851, e a nossa capital nenhuma al- teração mostrou em sua constituição medica, a excepção d'aquella, que desde 1845 se nota,, e de que mais a diante trataremos. Em Março chegou-nos a noticia do appareci- mento da febre amarella na capital do Maranhão, compa- nheira do Ceará na exempção da epedemia de 1850 ; collo- cada ao Norte e de pouca communicação comnosco, a não ser essa entretida pelos vapores, pouco receio nos incutia a transmissão da moléstia. Com effeito passarão-se os tem- pos, correu a noticia da extineção da febre no Maranhão, II IXTR0DUCÇAO. appareceu o nosso inverno, e com elle de todo devanece- rão-se as nossas inquietações, porém na terminação dessa quadra (Junho) appareceu a febre amarella!! 1 Não sendo nossa intenção na presente discripção senão occuparmos-nos da historia da febre amarella, que entre nósgraçou nos annos de 1851 e 1852; isto é, da enumera- ção dos factos, que vimos e observamos, para cujo trabalho só abunda em nós vontade e desejos de fazermos conhecer, o que entre nós se passou e assim concorrer com o nosso fraco contingente para a grande historia de Medicina Bra- sileira, e conscio de nossa insufficiencia nos animamos a emprehender este trabalho, sem duvida superior ás nossas forças, esperando, que se nos releve, em attenção aos bons desejos, as faltas, que, por circumstancias independentes de nossa vontade, a cada momento apparecem. DA EPIDEMIA DA FEBRE AMARELLA A província do Ceará está situada entre 3o e 10' — 7o 20' de latitude meridional, e 2o 30' — 7o e 30' de longitude oriental do Rio de Janeiro. Tem duas estações, verão e in- verno, este, quando regular e bom, principia em Feverei- ro, e mesmo em Janeiro, porém o regnlar é de Março e termina em Junho; d'essa épocha em diante, a excepção de um e outro aguasseiro em Novembro e Dezembro, não se deve ter receio de viajar pelo incommodo da chuva. O clima é secco e ardente, maximé para o centro da pro- víncia, porém é saudável; a face do paiz é desigual e abun- dante em serrotes, oiteiros e mesmo sorras, quasi todas pedregosas e estéreis. Com quanto sejão diíferentes as es- tações, todavia são imperceptíveis as variações barometri- cas, e pequena a differença de temperatura regulando em todo o anno entre 74° o mínimo e 86° e 90° o máximo. No inverno é o calor bem sensível, maximé nos dias nublados; no verão reina o vento geral de leste; pela ma- nhãa temos o terrol, e algumas vezes o Norte pelo inverno; este não é continuado, isto é, passão-se as vezes 8, 10,15 dias, mesmo em seu rigor, que não chove : é raro ser geral em toda a província, ao menos com a mesma abundância d'agua : não temos um só rio navegável; as mattas são pou- cas ; a nossa lavoura é pequena, e consiste a riquesa da província na criação vacum e cavallar. Tal é a abreviada noticia de nossa constituição climaterica. A capital da província gosa das mesmas influencias ath- -2- N mosphericas, que acabão de ser dcscriptas; csla situada sobre a cosia, a uma legoa ao norte da ponta do Mucunpc, e outra ao sul da barra do rio Ceará. Cidade florescente, mui bem arruada, sendo a pluralidade das casas térreas; além de serem bem espaçosas as ruas torna-se a cidade ainda mais arejada, por sete praças, que n'ella se contém ; collocada sobre terreno arenoso tem o inconveniente de não ser calçada, porém ao mesmo tempo a vantagem de não enipoçar as águas pluviaes, nem fazer o lamaçal cons- tante em outras cidades, mas esta vantagem é muito pe- quena em relação aos benefícios, que se tirarião de seu cal- çamento. Existem alguns pântanos pequenos a balra-veüto da ci- dade, entretidas pela água do mar: na distancia de uma legoa tem outros maiores causados pelo rio Cócó, assim como alguns pelo Oeste entretidos pelo rio Ceará. I E' constante na capital a febre intcrmittente nos princi- í pios c fins d'agua, porém sempre benignas, não sendo por ! nós observado um só facto pernicioso. O anno de 1845, anno de tristes recordações para os Cearenses pela terrível secca, que assolou a província, re- dusindo milhares de seus filhos á mendicidade e á miséria, acarretou um mal para a cidade, e quiçá para toda a pro- víncia. A' medida que a secca apertava no centro, e que os re- cursos dos habitantes se extinguião pela mortandade ex- traordinária nos animaes de toda a espécie, recolhião-se ás cidades do litoral, c foi assim que se contarão ívesta cida- de, por oceasião da distribuição dos soecorros dados pelo governo, 20,000 mendigos; acontecendo o mesmo no Aracaty c outros lugares. Ou porque mudanças imperceptíveis para nós, mas reacs para os factos, se tivessem dado cm nossa constituição me- j dica ; ou por que a agglomeração d'esse povo, que por sua natureza vivia mal nutrido c vestido, tivesse para isto con- corrido, o caso c, que de 1845 para 1846 pela vez primeira presenciou a população desta cidade uma cpedemia, sendo ella de febre gástrica, caracterisada por febre, dores de ca- beça, língua saburrosa, cm alguns vômitos mucosos ou bi- liosos, rubor das conjunetivas, grande lassidão no corpo, — 3 — gaslriles, gaslro-interites e não poucos tomando a forma íyphoidea caractcrisada pela gaslro-interites prolongando- se aos folliculos intestinaes, pethequias, e gargarejo na fossa illiaca direita, &c. O tratamento dessa febre consistia no uso do tartaro emetico em lavagem, e sempre com tal proveito applicado, que não perdemos um só doente quando chamados nas primeiras 24 horas, o applicavamos. A san- gria foi fatal em 3 doentes, que tiverão este trata- mento no começo da epedemia. Esta medicação quando não acarretava a morte, aggravava de tal sorte o mal, que raro era aquelle doente, em quem não tomava o caracter typhoideo, c os poucos cm quem não tinha lugar acontecia, que a sua con- valescencia era extremamente longa. Isto que se deu na capital, foi igualmente observado no Aracaty, para onde fo- mos em 184G mandado em commissão do governo para tratar aos seus habitantes; em Sobral e outros lugares di\ província observou-se a mesma cousa. Desde então em lugar da febre inlcrmilíenle, foi cons- tante depois do inverno numerosos casos de febre gástrica, porém sempre de caracter benigno, cedendo a mesma appli- cação, e assim familiarisou-se o povo de tal sorte, que já não procurava medico para o tratamento desta moléstia. Em 1850 quando a febre amarella grassava nas mais pro- víncias, tivemos a nossa febre depois do inverno, c alguém quiz persuadir, que era a amarella, modificada pela ameni- tlade do nosso clima, o que contestamos, e Junho de 51 in- felizmente veio confirmar nossa opinião. N'essa oceasião cumpre confessar, não foi ella tão benigna, como nos an- nos anteriores, mas nem por isso fez victimas, senão em uma ou outra criança, e estas por não terem o tratamento regular. Sc a gravidade notada em um ou outro indivíduo fosse razão para fazer mudar a designação de uma epede- mia, então estas anteriores, que ninguém negou a deno- minação de — gástrica — mereceria de — typhoidea — porque não forão poucos os casos, que delia se derão. Quando dissemos, que em lugar da febre intcrmittente, foi constante a —gástrica— não queremos com isto dizer, que de todo desapparcccu a inlonnittenlc de entre nós; não, ella sempre persistio c foi um grande numero de fac- tos, que deu principio, ou foi o percursor da febre amarella. Chegando ao conhecimento do governo a existência da febre amarella no .Maranhão, noticia esta que só se vulga- risou muito depois de sua existência, porque os médicos daquella cidade oceultarão por largo tempo de seus habi- tantes o verdadeiro caracter da moléstia para os familiari- sar, como se exprime o Sr. Dr. Maia, com o seu terrível hospede, no que vacillamos se procederão em regra, pois que dessa falta de conhecimento podia resultar graves dam- nos, por não se tomarem as medidas necessárias para pre- venir a sua transmissão, como aconteceu n'esta província, que só foi depois de publicado o folheto ou discripção da epedemia reinante pelo Sr. Dr. José da Silva Maia e sua declaração a pag. 5, que foi para tranquilisar o povo assás atterrado, que elle publicou o seu ofíicio de 0 de Abril, cuja opinião suplantou a de muitos collegas, que o contra- rio pensavão, mas que só cegos podião desconhecer a natu- resa da epedemia, é que se teve conhecimento da febre amarella no Maranhão, e S. Ex. o Presidente ordenou, que se tomassem as cautellas necessárias, pondo—se desde logo em quarentena as embarcações procedentes daquellc porto, etc. Porém com isto não queremos dizer, que o appareci- mento da febre entre nós teve por causa nenhuma destas circunstancias: foi muito depois de seu apparecimento ivaquella cidade, que aqui se manifestou, e a maneira por que teve lugar, é desconhecido de todos. Quizerão dar como causa o encontro de um passageiro do vapor S. Sebastião chegado do Norte no dia 4 de Junho com um filho do Sr. Rocha; este á noite foi affectado da febre e depois delle outras pessoas da família; porém não pode- mos acreditar, que este fosse o principio quando no 1.° do mesmo mez já tinha morrido um filho do Sr. Luiz Vieira com vômitos pretos. Assim pois não é possível determinar a verdadeira causa do apparecimento da febre entre nós. Desde o principio do anno as cousas correrão tão regular- mente, que a idèa da importação da febre de todo se tinha desvanecido dos Cearenses. De Abril em diante entramos a notar de envolta com a febre gástrica um grande numero de casos de intermilten- tes, isto não escapou a nossa observação, e levamos ao co- nhecimento do Sr. Presidente e do publico. Em fins de Maio sahindo para o Sertão voltamos a 8 de Junho, eno dia 11 tivemos occasião de observarem casa do Sr. Cândido JoséPamplona, morador no largo de Palácio, e visinho do Sr. Rocha, quatro doentes, sendo elle, sua senhora, um filho e uma cunhada, para quem especialmente tínhamos sido chamado, porque á 4 dias tinha febre, dores intensas de cabeça, grande prostração e dormencia nas pernas e braços, vômitos pertinazes, dores no estômago e ventre, côr jcterica da pellee algumas contrações nervosas, etc. Os outros doen- tes soffrião com mais ou menos intensidade os mesmos in- commodos. O Sr. Cândido chamou a nossa attcnção para uma discripção feita pelo Sr. Dr. Rego do Maranhão, e então dizia elle — se é febre amarella, a que se acha aqui discripla e grassa no Maranhão, então eu c minha família a temos, porque sinto exactamente, o que se acha aqui discripto.— Não obstante, rcspondemos-lhes, cumpre não aventurar um tal diagnostico sem outros factos, que o comprovem. Com eífeito não tardou muito, que fossemos convidados paru ver outros e outros doentes, e para logo nos convencermos de acharmo-nos a braços com um terrível mal, como é a febre amarella. O povo ressintio-se logo desse extraordiná- rio, e com o coração cheio de cruéis angustias indagava do medico, qual o mal que os ameaçava; foi assim que mais de uma vez se vio elle em embaraços para declarar uma triste verdade. Este estado não podia ser indeffercnte ao governo c por conseguinte convocando aos módicos para se reunirem cm uma das sallas de sua residência, convidou-os, a que dessem o seu parecer acerca da epedemia, c havendo duvida entre elles quanto ao verdadeiro caracter da febre, declaramos com a franqueza, que nos é própria, acreditar ser a febre amarella, a que soffriamos e sendo exigido os nossos pare- ceres a respeito, eis o que dissemos, c só foi publicado muito tempo depois, sem duvida por essa medida de prevenção para não aterrar o povo, o que não achamos prudente. « lllm.0 Exm.° Sr. — Respondendo aooflicio de V. Ex. datado de hoje em o qual exige minha opinião acerca do caracter da epedemia reinante, c quaes as providencias que convém tomar, eis o que a respeito penso. « Que nós actualmanlc soffremos de uma moléstia cpi demica, não resta a menor duvida, o numero de pessoas que todos os dias são affcctadas, e a maneira porque o são assim justifica; e que esta epidemia ca febre amarella, que tem grassado em todas as províncias do litoral do Império, é o que vou demonstrar. « A febre reinante não tendo tempo certo para sua in- vasão, todavia é mais constante de dia, do que de noite, sendo mais freqüente pela manhãa. Seu primeiro symplo- ma é um frio geral mui desagradável, obrigando o doente a procurar logo a cama, a este segue-se a febre mais ou menos intensa, fortes dores de cabeça, maximé supra or- bitarias, bocea amargosa, náuseas, vômitos biliosos cm uns em outros mucosos, em alguns ausência completa desse symploma: sede em uns, cm outros grande seceura de bocea, porém não desejão beber água, e a rejeitão com o receio dos vômitos, que provoca : dores no estômago e por lodo o corpo especialmente pelos lombos, cadeiras e per- nas ; languidez, falta de forças e em alguns prostração ; ex- tremos frios e dormencia nos mesmos ; ourinas pouco abun- dantes, difíiculdíidc da dejecção emui vermelhas. Face vul- tuosa e congesta, olhos inchados e rubros, impossibilidade de encarar repentinamente a claridade, suor viscoso; ca- racteres estes, que me fazem mudar o tratamento daqucl- les, em quem se nota apellcseeca e árida e suppressão com- pleta de transpiração, ele. Grande fastio não só durante o pe- ríodo da febre, como em sua convalescença, em poucos, sendo a maior parte atormentada de uma fome insanciavel, épocha esti do maior cuidado pela facilidade e risco das recahidas. « Taessão Qssymptomas, que tenho observado com mais ou menos intensidade em cincoenta e quatro docnles, que lenho tratado até hoje (25), c também aquelles, que se achão descriptos por diíferentes médicos em diversas províncias, os quaes designão a moléstia por febre amarella. « Os doentes são em geral alacados de repente, poucas vezes apresentando-se a moléstia com prodromos. « Entre os meus doentes em dous observei symptomas de soffrimeulos nervosos, cm um a epistaxis : em alguns vô- mitos amarellos esverdiudos: o prelo c sangüíneo, vi, mas não cm pessoa por mim tratada. « Não perdi ainda um só doente, e isto altribuo não só a energia do tratamento, que emprego, como porque os doen- tes chamão logo, que são aflectados, os soccorros da scien- cia; e também a benignidade, com que se tem apresentado a epidemia. « O tratamento que tenho aplicado, tem sido só e exclusi- vamente o homeopathico, com o qual tenho obtido os mais bellos resultados em 12, 24, e 36 horas, e poucos tem exce- dido á 4 dias de tratamento. « Não entrarei na questão de ser ou não contagiosa a mo- léstia, a oceasião não é própria, e nem eu augmentaria cousa aTguma, ao que tem dito immensas capacidades pró e contra ; o que é verdade, e que a experiência tem mos- trado, c que a moléstia não pega por contacto mediato ou immediato do doente, se assim fora os médicos serião os primeiros contaminados domai a causa existe na athmos- phera, a abi a obtém aquelle, que mais disposto se acha para a contrair, por tanto para ella é que cumpre chamar toda a attenção, e eis o que de momento julgo da maior consideração e necessidade. « Antes de tudo apontarei como a mais urgente e palpitan- te necessidade a installação de um asylo, onde seja recolhida a pobresa, que alem da miséria c nudez, fôr atormentada do flagello da epidemia. Se em todas as mais Províncias onde existem hospítaes de caridade tem sido mister a criação destes hospítaes ambulante, quanto mais entre nós onde até isto nos falta! Eu ouso esperar da sabia e philantropica admi- nistração de V. Ex. que esta medida será immediatamente tomada, apenas chegue a V. Ex. o conhecimento de sua necessidade, e por isso tomo a liberdade de lembrar o edifí- cio do mesmo hospital de caridade, qne se acha em cons- trucção, no qual se pode mandar preparar duas sallas para servirem de enfermaria. Este local é muito melhor, do que o Lasareto da Jacarecanga, o qual além de longe, não tem as commodidades necessárias, e não pôde sem grande in- conveniente e mesmo risco ser para ali transportado a qualquer hora do dia ou noite o doente que precisar, o que não acontece no hospital de caridade, que tem todas as pro- porções. Em seguida lenho de lembrar a V. Ex. como meios hygicnicos: — 8 — « 1.° O escoamento das águas dos quintaes da rua de- baixo, e ordem expressa aos donos dos mesmos para não só conservarem a valia sempre limpa, e a água com livre tran- sito, como o seu maior aceio, e não continuarem, como se achão, no mais triste e deplorável estado de podridão. « 2.° A limpesa das ruas beccos e travessas, que se achão entulhados de cisco e immundicie de toda a espécie aconte- cendo como no cacimbão, chafariz da cidade e da praia, largo da Matriz pelo lado da casa do Sr. vigário : rua nova em frente da casa do Dr. Marcos, e em outras muitas partes, que pelo máu estado de limpesa causão nojo c ver- gonha. « 3.° Não consentir que se faça a limpesa das ruas enter- rando o lixo e mais esterquilinios no meio das mesmas, tendo apenas por coberta uma tênue camada de terra: se aprouver assim continuar para maior commodidade e eco- nomia de tempo e despesa, ordene-se, que se facão vallas bastante fundas, porque desta sorte previne-se a exalação das substancias mephiticas. « 4.° Ter a maior cautella e vigilância no matadouro publico, ordenando-se que sejão igualmente enterradas em vallas bastante fundas o sangue e restos daquellas substan- cias, que não se aproveitão, a fim de não acontecer, como actualmente, que se não pôde chegar ao lugar da matança sem grande repugnância, pelo máu cheiro que exhala. « 5.° Inspeccionar rigorosamente o mercado publico, ía- bernas, etc. assim como as substancias alimentares que se vendem, não exceptuando deste exame as bebidas, etc. « 6.° Vellar sobre as fontes donde tiramos água para nossa alimentação. « 7.° Ordenar ao guarda do cemitério, que as covas para o enterramento dos corpos não tenhão nunca menos de 8 a 10 palmos de fundos : assim como não demorar muitas horas os cadáveres na superfície da terra, a fim de não dar lempo a putrefação. « 8.° Que apparecendo mais alguma intensidade da fe- bre não houvessem mais toques de sinos, nem para signaes, nem mesmo para os Sacramentos, podendo o Paracho os administrar sem aparato exterior, que em geral tanto aterra aquelles, que se achão affectados domai. » — 9 — « 9.° Mandar fazer fumigações nas prisões e outros lu- gares onde ha ajuntamentos ou reuniões. « 10. Fazer visitar todo e qualquer quintal, que se tarnar suspeite de não conservar a devida limpeza, e or- denar a seus donos de a fazerem sob pena de multa.» « Os senhores pais de família devem ter o maior cui- dado na limpeza de suas casas. Estas medidas devem ser estendidas a maior parte das casas de palha habitadas por gente, que nenhum cuidado tem nem ao menos de si. « 11. Faser entrar para o hospital todos aquelles po- bres, que estiverem nas circunstancias. « 12. Finalmente fazer comprehender a todas as pes- soas, que a epedemia reinante é assas benigna, e o nosso clima, a estação, em que entramos abundante em ventos geraes, e a nossa pouca população, são penhores suflicicntes para este estado. Procurando-se logo, que for affectado, os soecorros da sciencia, pode se confiar no bom exito do tratamento: ó da maior necessidade, que seja logo chamado o medico, pois que o tempo é precioso: Sendo o medico chamado em tempo poupa-se maior trabalho, e corre-se menos risco; assim pois o molhor preservativo da febre é aplicar em continente o remédio para ella. « Taes são as poucas considerações, que tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Ex., de quem espero des- culpa attendendo a urgência, com que forão pedidas, e o pouco tempo, que tive para da-las. « Ficarei assás contente se merecerem ellas á alta consi- deração de V. Ex. aquém Deos Guarde etc. Ceará 25 de Junho de 1851. « Illm.0 Exm. Sr. Dr. Ignacio Francisco Silveira da Matta. Dr. Liberato de Castro Carreira Medico da pobreza e provedor da saúde. » Ouve um outro parecer, que por partilhar inteiramente a nossa opinião deixa de ser publicado, passemos por tanto ao do Sr. Dr. Marcos em opposição, pois que pen- sando de uma meneira diversa, por outra encarando a epedemia por diversa fôrma acredita ser a —febre gástrica —no que o acompanha o Sr. Machado, Cirurgião do hos- pital militar, eis como a respeito se exprimem. — 10 — « lllm.° Exm. Sr. — Respondendo ao ofíicio de V. Ex. tenho a diser-lhe, que em trinta e tantos doentes de febre que tenho tratado, em nenhum se tem declarado symptoma algum de febre amarella, e nem creio que ellas existãe em ponto algum da província. « As febres aqui reinantes são gástricas e endêmicas em differentes pontos da província no fim do inverno, e se em algum doente ellas affectão o caracter ataxico-a dynamico, como observei em dous doentes, ou algum outro caracter maligno, por isso se não deve julgar que sejão amarellas, ou que tenhão caracter análogo. Estas mesmas febres rei- narão em 1846 na Bahia, e em sèo começo fiserão algumas victimas, quando a sua medicação não estava bem conhe- cida, porém forão tão benignas, que não produsirão terror na população; mas isto não obsta a que V. Ex. se empenhe no aceio da Cidade, que será considerado como meo pre- ventivo. « Um terror infundado se tem derramado na população, que tem de nos ser bastante prejudicial pelo lado do com- mercio e dos viveres, o que cumpre a Y, Ex. tomar medidas a respeito, é o que por ora se me offerece a diser Deos Guarde a V. Ex. &c. Fortaleza 26 de Junho de 1851. Illm.0 Exm. Sr. Dr. Ignacio Francisco Silveira da Motta Dr. Marcos José Theophilo. Persuadimo-nos queas vistas do Sr. Dr. Marcos na ex- posição djestas idóas, nao forão mais, do que calmar o povo do terror, em que se achava, porém infelizmente já estava ella tao propagada, que tudo foi baldado. « Illm.0 Exm. Sr. Acho-me impossibilitado de enviar a V. Ex. o relatório que se dignou exigir de mim, em officio hontem datado, de febres de máo caracter, que tenhão apparecido iresta capital, porque em minha clinica quer no hospital regimental, quer fora delle, somente tenho tido doentes de febre gastriea, eintermülente Deos Guarde a V Ex. etc. Ceará 26 de Junho de 1851. Illm.0 Exm Sr Dr Ignacio Francisco Silveira da Motta José Joaquim Machado 2.° cirurgião. Se o fim do Sr. Machado não foi o mesmo do Sr Dr Marcos como acreditamos, não sabemos explicar como foi por estes collegas encarado o caracter da moléstia. — 11 — Inteirado o governo da existência da epidemia cuidou immediatamente depor em pratica tudo quanto os médicos indicarão como útil e necessário a hygiene publica, senão para obstar o mal, ao menos para metigar o seo effeito... Pela segunda vez forão reunidos os médicos na Salla das conferências do Palácio do Governo, e depois de uma breve discução assentou-se na seguinte descripção que, foi publi- cada, com o titulo de PARECER DA COMMISSÃO MEDICA. « Convocados em sessão por S. Ex. ao palácio de sua residência para deliberar-mos sobre o tratamento e meios prophilatieos, que se dcveráõ empregar para curar-se e evitar a infecção da epidemia actual depois de alguma dis- cussão sobre a naturesa da constituição medica concorda- mos, que S. Ex. devia mandar publicar o parecer da com- missão, para que o publico observasse as regras hygienicas e tratamento, que estivesse ao seu alcance, tendo em vistas os habitantes das villas e povoações, onde não existem pro- fessores, que lhes possão ministrar a medicina, e que mui- tas vezes na ausência de medidas sanitárias perecem a falta de meios e conhecimentos. « S. Ex. deverá ordenar a policia municipal e mesmo coadjuval-a com o seu apoio afim de empenhar-se com todo o disvello na limpesa e aceio das ruas, beccos e traves- sas, policiando o mercado publico, examinando as fontes d'agua potáveis, distruindo Iodos os focos de emanações, e prestando alguma attenção ao matadouro publico. « Para utilidade de todos aquelles, que são alheios a pro- fissão damos os seguintes conselhos para mais ou menos se preservarem da moléstia, e delia se tratarem, quando se vejão acommettidos, e não hajão médicos, que lhes assistão, como acontece em muitos pontos da provincia. « Dos meios hygienicos, prophilatieos ou preservativos. Boa alimentação, isto é, substancias escolhidas, sãas, e de boa naturesa, (boa carne, farinha da melhor qualidade. assim também o pão,) um cálice de vinho ao jantar as pes- soas cuja digestão é lenta, é de grande soecorro, legumes que não estejão putreíeitos, águas que não sejão empoça- das, e que não sirvão para os animaes ele, ele.) aceio diá- rio do corpo e dos vestidos (roupas) banhos lépidos em alto dia, frios antes de nascer o sol estando o corpo bem dis- posto, permanência nos costumes regulares, levantar-se cedo e passear moderadamente pela manhãa, e a tarde, pois isto fortalece o corpo e o torna menos susceptível a infec- ção, socego de espirito, não assistência nas grandes reu- niões, porque irollas se'pôde desenvolver a infecção pelo máu estado da athemosphera, habitações bem ventiladas em ruas largas e aceiadas, limpesa nos quintaes e utencilios da casa, mudanças destas para outras em outras ruas, logo que mais de duas pessoas se affeetem. TR ATAMENTO CURATIVO. « Em alguns doentes uma simples infusão (chá) de ca- nella, hortelãa e cascas de laranja, coadjuvada de um sina- pismo, ou pediluvio (escalda pés) tem sido sufficiente para completo restabelecimento, porém no geral e com muito grande proveito temos aplicado o tartaro estibiado na dose de quatro grãos(1) em uma libra d'agua, e ministrada em um calix de 10 em 10 minutos, ou de quarto em quarto de hora alé acção vomitiva e logo depois que opparecerem os vômitos, parar-se com o medicamento, e dar-se a beber água morna aos copos; ou lambem a ipecacuanha na dose de 16 grãos com 2 de tartaro stibiado misturados e divididos em 3 papeis para se tomar um em meia chicara d'agua morna de quarto em quarto de hora até acção vomitiva, e depois seguir-se como fica dito: se com o primeiro se não declarar a crise favorável ministrar-se-ha segundo, com o qual ella se tem de estabelecer, mas muitas vezes apre- senta-se intermittente (sesões) e então temos de pres- crever as seguintes: « sulphato de quinino 2 grãos cam- phoral ei {2 grão, ópio 1 [4 de grão, xarope quanto baste para uma pílula, e como esta as que forem precisas para se administrarem 3, uma de hora em hora na apyrexia (ausência de febre) e o mesmo tratamento temos seguido (1) KMamos persuadidos que ha engano na dose. que não pôde tjsdo que t a 2 grãos. J * — 13 — quando a febre se declina mas não cede (remitencia). Se há grande color e mesmo dores no ventre prescrevemos ca- taplasmas de linhaça laudanisada em todo o ventre, as bebidas refrigerantes, como o cosimento de cevada com vinagre ou cremor de tartaro e assucar, ou água vi- nagre eassucnr, semicupios mornos (meios banhos) e em alguns casos clisteres de linhaça laudanisados. « Se algun caso se agravar e apparecer muito desasso- cego, falta de somno, dor sobre o ligada, grande abatimento, lingua pardacenta, vomitosda mesma côr; e grande ancie- dade, senão houver muito calor no ventre, e dores a con- seihainos os cosimentos de quina alcomphorada para bebei e clisteres do mesmo e fumentação em todo o corpo com vinagre camphorado, a que se pôde juntar uma porção de álcool, (aguardente de canna ou do reino) veutosas escari- íicadas sobre o hypocondrio direito (sobre o lado do ligado) ,, das quaes se tem tirado grande vantagem. Os banhos frios também tem sido aconselhados. « S. Ex. deve mandar porem execução todas as posturas da câmara municipal, ordenando mesmo, que as cumprão sem condescendência. « E* o que de momento e de geral podemos apresentar ficando ao medico o descriminar e combater a gravidade da moléstia com symptoma de máo caracter, e nem poderíamos entrar em minuciosidades de tratamento, porque perde- ríamos nosso trabalho. « S. Ex. conscio de feus deveres e escropuloso em seu cumprimento não quiz perder um momento na utilidade da suide publica, eo publico confia em seo zelo, sciencia e aptidão. « Cidade da Fortaleza 11 de Julho de 1851. Com restrição quanto ao tratamento. Dr. Liberalo de Castro Carreira sem ella o Dr. Marcos José Tkcophilo. Dr. José Lourcnço de Castro Si Ir a. José Joaquim Machado 2.° Cirurgião. Assignando o nosso nome com a reslrieçãn, que lizemos — 14 — bem se deixa vèr, que correu o tratamento livro de nossa responsabilidade. Não é de nossa intenção reflexionar sobre o parecer da commissão, isso o fizemos verbalmente quando reunidos tratamos do objecto, porém não podemos deixar de notar duas citações, que muito influirão no correr da ! epedemia. A primeira foi essa aplicação de vomitorios ! atirada ao publico sem mais reflexão : é preciso não conhe- : cer os effeitos perniciosos dessa aplicação quando o doente ' passa do primeiro ao segundo período da moléstia, e mesmo no primeiro quando n'elle predomina a tendência ao vomi- to, para atirar-se ao vulgo uma tal medicação sem mais explicação ; se ao menos se dicesse: « o vomitorio é útil e vantajoso nas primeiras 24 horas e na ausência de vômi- tos etc.,, » seria mais de acordo aos princípios da sciencia. A seguüda é que escrevcndo-se para o publico, e aconse- Ihando-se uma medicação, como as pílulas de sulphato de quinino, quando a moléstia torna-se intcrmittente, e se- guindo-a quando torna-se remittente; depois dá todos os caracteres da moléstia no segundo período, o que tem sem- pre lugar com a diminuição e mesmo ausência dos sympto- mas febris; e não se diz, que essas pílulas devem ser su- pressas, maximé quando os symptomas gastro-intestinaes assim reclamão Não podemos concordar com o dizer-se, que se perderia trabalho em s r minucioso escrevendo para o publico : para elle é que acreditamos, que nunca bem se explica dizendo pouco, elle é que exige descripções minuciosas principal- mente quando se trata de matérias desta ordem: os médi- cos é que dispensão muitas circunstancias, porque tem o conhecimento e pratica para dicernir e escolher, o que a sciencia tem ensinado, o publico precisa de tudo para ini- ciar-se. Proseguindo na historia diremos que : A epidemia teve seu principio ou começo no centro da cidade, d'ahi indistintamente as ruas e travessas, misto diffirio ella da maneira, porque se desenvolveo nas outras províncias, o que de alguma sorte também dá a pensar, que sua importação não foi por mar. Sem destínção foi ella affectando a todos os sexos, idades e temperamentos, po- rém não assim estados e condições. Os ricos, as pessoas — 15 — abastadas, a gente do commercio, os casados forão aquelles, que primeiro partilharão da epidemia ; as mulheres menos gravemente, que os homens, as crianças com igualdade, e os escravos menos. Já a epidemia tinha invadido qunsi toda a cidade quando principiou a ter lugar na pobresa. O oi- teiro lugar, que fica a barla-vento da cidade, e com eleva- ção demais de 100 pés talvez, foi o primeiro bairro da po- bresa onde visitamos doentes da febre: depois foi se esten- dendo para o oiteiro de cima confronte a palácio ; passou para o lado do pajahú e garrote, onde se demorou muito tempo : d'ahi seguio a rua da Palha ao oeste pelo lado da Jacarecanga, e finalmente foi a rua da Praia, onde em prin- cipio um ou outro caso apparecia, mas que só no fim da epidemia tornou-se geral, se bem que mesta foi ,onde pri- meiro vimos o vomito preto, quasi no principio da febre. Mucuripe lugar situado a uma légua da cidade a beira mar e habitado por pescadores, não se deu um só caso de febre salvo em um ou outro, que vindo a cidade era contaminada do mal. A epidemia caminhando do centro da cidade para os su- búrbios, dá bem a perceber, que por ahi também principiou sua declinação, a qual estamos convencidos, que só teve lugar, quando não havia senão muito poucos, a quem affeclar. Assim quando já não tínhamos um só doente na cidade (em seu centro), ainda tínhamos 8 alO diários na pobresa dos arredores; seguindo-se nesta a mesma ordem de sua in- vasão. Foi declinando pelo oiteiro depois garrote de sorte, que em Setembro quando sahimos da cidade o maior numero de doentes era da rua da Palha, acreditando ahi e na rua da Praia a sua terminação, contando de existência a febre epidêmica do Ceará cinco mezes até esta data; po- rém consta-nos, que depois de nossa partida a febre recru- desceu e durou até Abril de 1852, não sendo exemptos mesmo d'ahi em diante até Junho aquelles, que de fora chegavão. Tendo ella seu começo em Junho continuou benigna de tal sorte até meado de Julho, que fez julgar-se modificada pela influencia de nosso clima: até então um ou oulro iacto apparecia aggravado quasi sempre por motivos indepen- dentes do curso regular d.i moléstia, porém do meado de — 16 — Julho em diante até Agosto a moléstia recrudesceu e aggra- vou-se- muitos casos de vômitos pretos e sangüíneos, as hemorrhagias, a apoplexia, a algidez, etc. apparecerão, e então foi que a população verdadeiramente aterrou-se. Desta épocha em diante principiou sua declinação de ma- neira, que no fim de Setembro podia-se considerar a febre extincla denlro da cidade. Foi ella fatal aos poucos estran- geiros, que chegarãoe metferão-se no foco da epidemia; as- sim lambem aos nossos certanejos^ porém aquelles, que evitavão o contacto dos doentes, e nao entravao na cidade, não tiverão, e por isso deu-se um singular caso, talvez vir- gem nos annaes da medicina. Todo o mundo sabe a influen- cia, qnc tem a febre amarella para as pessoas do mar, sendo quasi sempre, a que mais soffre em todas as partes, porém no Ceará deu-se o facto de existirem no porto desde Junho a Abril de 1852, 27 embarcações de differentes na- ções, não entrando os vapores da carreira, e demorando-se mais ou menos tempo como se verá do mappa, dando um pessoal de tripulação de 321 pessoas e uma só nao foi affec- tada do mal! Como explicará o Sr. Dr. João José de Car- valho este facto, elle que acredita ser a febre amarella uni- camente produzida pelos miasmas marítimas, e por conse- guinte propiia unicamente para os náuticos, levando o seu rigor a ponto de não admittir a epidemia no Rio de Janeiro, e o numero de factos que se derão sendo devido a pussilani- midade de seus habitantes, em cujo numero figura o Sr. Dr. Carvalho, porque mais abaixo diz, que foi affectado igual- mente do mal? De alguma sorte explicamos esta reserva da gente do mar. Os consignatarios e donos dos navios tomarão a pre- caução de não consentir, que ninguém desembarcasse por conselhos, que lhe demos, e acreditamos, que isto poderosa- mente influio não só por evitar-se o contacto de doentes infectados etc, como porque esta gente ordinariamente desregrada entregão-se a excessos, maximé de bebidas, quando estão em terra. Além disto a thopographia do porto e ancoradouro sobre uma costa desabrigada, bastante venti- lada, estando a cidade, foco da infecção, collocada 150 a 200 pés acima do nivel do mar, também é razão bastante poderosa para explicar esta reserva. — 17 Mappa das embarcações estacionadas no porto durante o tempo da enii 1 N 1 6 < • o < H „• =" CS ■< -.- w cs o QUALI- ,, NOMES DOS -< DESTINO. ~ ~ < MEZ. a C/J < 3 DADE. NAÇÃO. NAVIOS. 2 12 2oo Junho 23 Brigue tnglez George Glan Pará 19dias. » 26 )) Francez A. Marie 11 Caiana 37 n Julho 8 Barca Portugueza Linda 21 Maranhão 10 » » to Polaca Sardo lleole 7 Gênova 26 n » 11 Escuna Brasileira Emitiu 11 Pernamb.0 7 » » 20 B.e Esc. Brasileira Latira ÍU » 9 h Agosto 26 Barca tngleza Andover 13 Liverpool 3/1 » » 27 B.e Esc. Brasileira Laura 13 Maranhão lx » Setembro 28 Pataelio Brasileiro Santa Cruz 9 Pernamb." 13 » Outubro 12 Brigue Francez A. Marie 10 Caiana 26 » »> 15 Escuna Brasileira Ernilia 11 Pará 10 » » 17 » » A rcelina 11 Pernamb." 8 » i) » Barca Ingleza Tinamara 13 Liverpool hk » Novembro 2 B.c Esc. Brasileira IAtura 13 Pernamb." U » » 12 » » Graciosa 12 Pará 9 » Dezembro 10 » » Laura 13'Maranhão 8 n » 11 Barca Ingleza Francisca 13 Liverpool 2Zi » d 2G Hiatc Brasileiro JSova Olinda 9 Pernamb." 9 » » 30 Escuna » Emitia 11 )> 6 » Janeiro 15 Brigue Francez A. Marie 12|Caiana 30 » )> 23 Barca Ingleza Audover 13 Liverpool 26 » Fevereiro Março 23 1 B.e Esc. » Brasileiro » Emitia Laura 12 13 Pernamb. Alaranhão 6 » 6 » 3 Patacbo » Eulerpe 13 Pernamb.0 2 n » 24 Barca Ingleza Tinamara 13 Liverpool 20 » n 27 Galera » Betla 19 » 21 » Abril 6 Brigue Francez A. Marie 10 Caiana 32 » Em Agosto no tempo da maior força da epidemia appa- recerão alguns casos de bexiga e sarampo, o que fez receiar o desenvolvimento dessas moléstias, porém sendo bas- tante enérgicas as providencias para segregar estes doentes da população, não se reproduzirão, en-elles termi- narão o mal, No fim da epidemia, durante os mezes de Maio Junho e Julho de 1852, a febre intermittente appa- \ — 18 — receu de uma maneira espantosa, tomando o caracler epidêmico, tal era o numero das pessoas affectadas, e em muitos casos tendo por terminação a anasarco : mas quando isto não acontecia era ella sempre benigna, não sahindo de seu typo, por mais que se demorasse no doente, apparecerão também alguns casos de cholerina. Para terminarmos o quadro histórico da epidemia da ca- pital do Ceará resta-nos dizer, que em geral foi ella assás benigna, e se o numero dos mortos, como se verá no fim da presente discripçâo, ainda assim subiu a tanto, é porque a maior parte não consultou a facultativo algum, entregan- do-se a recursos impiricos, e ao depois ao pernicioso abuso dos vomitorios, como faremos vêr no artigo tramen- to. Sua população é de 10 a 11:000 habitantes calcu- láo-se os affectados em 9:000, dos quaes morrerão 261. AQUIRAZ. Foi a 23 de Julho do mesmo anno de 1851, que se obser- varão os primeiros casos da febre na povoação do Aquiraz, seu curso foi pequeno, porque também era sua população, todavia messe lugar a proporção dos mortos para os affec- tados é extraordinária, pois que dá quasi 10 por 100. O vomito preto ahi appareceu, assim também as hemor- rhagias e qualquer destes caracteres foi bastante funesto. A epidemia durou sensivelmente até o fim de Dezembro e esteve messe lugar em commissão do governo o Sr. Dr. Marcos José Thiophilo. Aquiraz fica distante da capital sete léguas pelo lado do Sul, e collocada na margem oriental do rio Pacoti, rio que só tem água pelo inverno. Sua população é de 350 habitantes, todos nacionaes, se algum estrangeiro existe é já morador a tanto tempo é se acha de tal sorte aclimatado, que pôde ser considerado na- cional; calculão-se os affectados em 250 pessoas dos quaes morrerão 21. SOURE. Povoação collocada três léguas pelo lado Oeste da cidade a febre ahi se desenvolveu no mesmo tempo da maior in- - 19 - tensidade na capital, sua duração foi breve, assim o per- mittia a população pequena, e o numero das victimas que fez foi insignificante em relação; foi bastante benigna, e isto fez com que a população nem ao menos reclamasse soecorros do governo. Sua população é de 350 habitantes sendo a maior parte caboclos, e o resto nacionaes; calculão-se ns affectados em 200 pessoas, dos quaes morrerão 16. MORANGUAPE. A villa de Maranguape se acha collocada ao pé da serra do mesmo nome, lugar florescente, e aquelle, que se pôde chamar o selleiro d:i cidade A serra é muito fértil eproduc- tiva, tem grandes plantações de café e canna dcassucar; da serra nasce o rio Maranguape, o qual passa por uma parte da villa; todavia o lu^ar é quente e a temperatura eleva-se as vezes a 88° e 94°. Ò seu commercio é todo com a capital, e sendo mui freqüente, não podia por muito tempo deixa- rem os seus habitantes de partilhar a sorte de seus irmãos; por conseguinte o apparecimento da febre teve alli lugar, logo depois que ella tornou-se geral na capital, c lendo ao principio atacado com benígnidade, cm Setembro e Outu- bro exacerbou-se, e em relação a outros lugares de muito maior população, produzio extragos extraordinários. O vo- mito preto appareceu com freqüência, depois delle o estado apoplctiforme foi o mais preponderante, e lambem o mais funesto não só alli como cm Ioda a parte. Na estatística ver- se-ha o numero dos atacados e mortos. Nessa villa esteve em commissão o Sr. Dr. Marcos José Teophilo. Sua população é de 2,500 habitantes, quasi todos nacionaes, abundando os indígenas, os estrangeiros são domiciliarios de muito tempo e portanto gozando dos privilégios da aclimata- ção, porém messa época forão 6 ou 8portuguezes recém-che- gados á provincia c de preferencia melles a febre fez sua victima: calculão-sc os affectados em 1,360 pessoas, das quaes fallecerão 89. QÜISERAMUB1M. Villa central collocada a 60 léguas d- distancia da capital: — 20 — o apparecimento da febre nesse lugar foi quasi contempo- râneo da cidade, e por isso até certo tempo negou-se a exis- tência de ser a febre amarella, porém sendo encarregado o Sr. Francisco José de Mattos cirurgião alli assistente da commissão do governo, descreveu de tal sorte o caracter da moléstia, que não deixou duvida acerca de sua existência ; todavia o numero das pessoas affectadas foi insignificante, assim como o dos mortos em relação a população da villa, como se verá no fim da estatística. Sua população é de 1,500 habitantes. ARACATY. A cidade do Aracaty collocada sobre a margem oriental do rio Jaguaribe a 3 léguas de sua fóz acha-se situada sobre uma extensa varze de mais de légua. E« extraordinaria- mente ventilada no verão, assim como no inverno, seu cli- ma é saudável, sua temperatura regula entre 72° e 74° mí- nimo 82° e 86° máximo, chegando algumas vezes a 88° e 90°, porém é extraordinário. O rio pelo inverno sahe quasi sempre do seu leito, e então ha mnundacões, as vezes tão extraordinárias, que entrão lanchas, barcaças e até hiates dentro da grande rua da cidade, como aconteceu em 1842, porém nem por isso são seus habitantes flagellados pela in- tcrmittente e outras moléstias endêmicas. Esgotadas as águas não ficão pântanos, nem lamaçaes que infeccionem a athmosphera. Compõe a cidade uma grande rua sendo a maior parte das casas de sobrado, mui bem arejadas e edi- ficadas; existem outras mais pequenas habitadas pela po- bresa, existem muitas casas de palha não formadas em rua e sim quarteirões, espalhadas sem ordem e occupadas pela gente mais pobre do lugar. Dados estes promenores entraremos na historia da febre Tendo ella seu principio igualmente em Junho, ao mes- mo tempo que se desenvolveo na capital, para onde tinha e tem freqüente communicação, assim como nesta foi intei- ramente desconhecida a verdadeira causa da importação e para maior confusão daquelles, que desejão aprofunda-la 'ou ínrrtn i3 íf i*"a a S,ua eütracla t)e,° Iu?ar denominado Córrego do Rodrigo a leste da cidade, e lesua e meia dis- — 21 — tanto, lugar este o mais saudável possível, onde seus ha- bitantes passão annos, que não presencião uma moléstia grave, onde a febre inlermittente apparece per acidens, onde em 1846 quando o Aracaty era ílagellado pela febre gástrica, lá nãoapparaceu um só doente : situado em lugar arenoso, de uma bella vegetação de cajueiros, não tem um pântano, se o contrario já publicamos, é porque fomos mal informado, examinando o lugar, achamos, o que acabamos de escrever. Mais de duzentas pessoas forão affectadas da febre, uma só não morreu, nem mesmo perigou, não obs- tante o tratamento impirico e absurdo, que empregavão. Dahi circulando ainda a cidade foi ella se desenvolver ao norte no lugar denominado Cumbe, onde existe grande plantação de coqueiros, canna de assucar, etc. Também foi nesse lugar assás benigna. Foi pouco mais ou menos em princípios de Julho, que se derão os primeiros casos den- tro da cidade; então foi justamente no centro da grande rua no quarteirão mais laborioso pelo commercio, que íez ella a sua estréa de uma maneira assás aterradora fazendo em 15 dias quatro victimas da maior importância nas pes- soas dos negociantes o coronel Domingos Theophilo Alyes Ribeiro, um mano e dous sobrinhos, pessoas estas, que pode se dizer de uma mesma casa, estimadas pelas cxcellentes qnalidades, que os distinguião, e por isso causarão a maior consternação. Quando a 17 de Setembro do mesmo anno chegamos a essa cidade e fomos encarregado pelo governo da commis- são de tratar a pobresa, etc, ainda se achava a lebre nesse quarteirão um pouco mais estendida ; dahi em diante a se- guimos passo a passo, e observamos irem sendo aüeciadas as pessoas quasi uma a uma, e não passar avante em quanta não preenchia a sua terrível tarefa, de sorte que os auazeres do medico erão limitados, o que não aconteceu na capital, onda ella invadio ao mesmo tempo todas as ruas e tra- vessas. , , , Esgotado o quarteirão do centro passou para o lado do Sul onde não deixou de fazer victimas assás importantes, sendo a mais notável a do negociante João Luiz berre.ra Tavares. Até esse tempo quasi que não havia lebre na po- bresa ao menos não era cila, que mais soíínu, e so loi de- __ 22 — y>o;s dr contaminado esse lado da cidade, que a pobresa do Vellame (porção de casas de palha) foi affeclada. Foi neste tempo, que o lado donorte foi invadido pela febre, islo regulou de 15 a 20 de outubro em diante. Nessa parteda cidade não obstante fazer duas victimas bem sensíveis nas pessoas do thesoureiro da alfândega José Pamplo, e escripturano da mesma Carlos FelippeRibeiro deMiranda, todavia cumpre dizer,, não apresentou o caracter tão virulento como nas ou- tras partes, e muitas pessoas até familias inteiras deixarão de a ter. Em Novembro principiou ella a ter lugar na Camboa, quarteirão bastante extenso de casas de palha, habitadas por pescadores, e gente mais pobre da cidade, a este tempo outros quarteirões bem como a rua do Piolho, Carqueija, ele. habitadas igualmente por pobres, crão invadidos pela epidemia. Nessa epocha podia-se considerar extineta a febre dentro da cidade, um ou outro facto apparecia, porém nos subúrbios senão achava-se em seu principio, ao menos es- tava em seu máximo de intensidade. Sobre a margem do rio se acha collocada a rua da Parada, cujos quintaes vão até ao rio, o qual nas marés vasanles descobrem um lama- çal terrível; a sua posição ao oeste da cidade, por conse- guinte a sota vento, parecia assás dispo-la ao contagio da epidemia, porém por uma singularidade inexplicável não oppareceo messa rua igualmente habitada por pobres! A epidemia da febre no Aracaty foi mais longa do que a do Ceará, isto attribuimos á maneira de sua progressão ca- minhando de quarteirão em quarteirão. Tendo ella seu prin- cipio em Junho só em Outubro foi considerada em seu má- ximo de intensidade ; em Novembro pelos diminutos casos na cidade pôde ser considerada em declinação, porém cm Dezembro pela mudança rápida da temperatura, tornou a recrudecer e fez não poucas vitimas; em Janeiro e Feve- reiro diminuio. em Março pôde ser considerada extineta, não porque, já não apparecesse um só facto, mas sim por que os existentes, nãopodião constituir epidemia. Em geral a epidemia do Aracaty não foi mais maligna do que a do Ceará, porém particularmente considerada foi muilo mais grave, queremos dizer no Aracaty se deu uni maior numero de victimas nas pessoas de primeira — 23 — classe, e principalmente nocommercio. Poucos forão aquel- les doentes em quem a moléstia passou do primeiro ao se- gundo período, que escaparão, pois que o seu mal era logo acompanhado de um tão funesto cortejo de symptomas, que o doente para logo desanimando, perdia toda a esperança, e lodo o mundo sabe quanto é prejudicial um tal estado. Não foi o vomito preto o symptoma, que caracterisou o maior numero dos mortos, foi a hemorrhagia maximé pela mucosa da bocea, os soluços e as affecções dos centros nervosos, a que mais predominou. Os diffcrentes povoados dos arredores da cidade bem como oCorrigo, picada do Cabreiro, Barra, etc, forão visi- tados pela epidemia, deixando de partilhar a mesma sorte a Canoa Quebrada, lugar situado na beira mar e habitado por pescadores, assim como não consta, que das embarcações ancoradas no porto, (1) um só de suas tripulações fosse aífectadu. Terminando a historia da febre no Aracaty resta dizer, que com ella grassou o sarampão, fazendo não poucas victimas em crianças, porém felizmente não se prolongou muito, tanto que em outubro não se observava caso algum.Outro sim observamos quatro factos do croup., em uma casa sendo todos fataes, esta epidemia muito re- ceiamos o seu desenvolvimento, porém graças a Providen- cia com o ultimo doente desappareceu ornai IScssa cidade não ha moléstia alguma endêmica, e já era alli medico as- sistente o Sr. Epifanio Astudille Busson, quando para Ia fomos chamado, e depois encarregado pelo governo da commissão de tratar a pobreza. Sua população no geral formada de nacionaes, havendo não poucos estrangeiros, porém de tal sorte aclimatados pelo numero deannos de residência, que nao se distinguem dos nacionaes, quanto ao principio de aclimatação, é de 8,000 habitantes, calculando-se os affectados em 5,000 pes- soas, das quaes morrerão 99. (í) \s embarcações de maior lotação por falta d'agua no no fundeiao 1 a 2 léguas distante da cidade; as pequenas sobem até perto, mediando apenas meio quarto de légua. Ahi ainda houve a cautella de nao deixar desembarcar ninguém. — 2Í- — CASCAVEL. Villa collocada em uma espécie de colina dearôa;de cada lado leste e oeste corre um alagadiço; lugar sadio e situa- do quinze léguas distante da capital, e outras tantas do Aracaty, passando pelo centro da villa o caminho, que ser- ve de communicação as duas cidades, mas foi muito depois, que ellas fòráo invadidas pela epidemia, que seus habitan- tes forão pela febre visitados. O caracter foi assás benigno, e muilo poucos forão os doentes, em quem ella chegou ao segundo período, a estatística o demonstra. Não esteve iresse lugar medico algum em commissão. Sua população é de 1,200 habitantes; ainda gosão os pou- cos estrangeiros ahi residentes do privilegio da aclimatação pelo numero de annos de sua residência: calculão-se os affec- tados em 580, dos quaes morrerão 26. S. BERNARDO. A villa de S. Bernardo, onde igualmente estivemos em commissão do governo, se acha collocada no mais beilo var- jado da ribeira do Jaguaribe, situada na margem Occiden- tal do rio Guixeré braço do Jaguaribe, e que só tem água pelo inverno, está distante do'Aracaty 10 léguas ao sul e 40 da capital. Fôrma a villa um perfeito quadrado, cons- tituindo um dos seus lado a Matriz, é habitada por quinhen- tas a seissentas pessoas, as quaes póde-se dizer forão todas alfectadas da febre sem excepção de sexo, idade, condicçào e estado. A temperatura dessa villa é assás elevada e regula de 80° a 90°; é bastante ventilada pelo verão. O appjrecimento da epidemia datou do meiado de outu- bro pouco mais ou menos, e foi bem significativa a sua im- portação. Um indivíduo que sahio do Aracaty alli chegando apresentou os encommodos da febre, os quaes sendo toma- dos por característicos de constipação e indigestão, não de- rão motivos a sustos o receios, e encarregou-se de seu tra- tamento, queremos dizer de estar com elle, e administrar o que se applicava, um escravo do Sr. João Carlos de Sa- boia ; ainda o doente não se tinha completamente resta- belecido ja o escravo se achava affectado do mesmo mal, — 25 — que não sendo considerado ainda como febre (cumpre di- zer que não erão observados por medico, pois que nenhum havia no lugar) encarregou-se de seu tratamento uma mana do mesmo Sr. Saboia, e também foi affectada, logo depois umafiiha,quecom ella habitava no quarto, e assim foi indo toda a família: depois passou as pessoas visinhase desta sor- te se desenvolveu a epidemia, quatro mezes depois da sua existência no Aracaty. Convém dizer, que desde seu appa- recimento nesta ultima cidade as autoridades policiaes de S. Bernardo tinhão o maior cuidado de não deixar entrar na villa pessoas vindas daquella cidade, e por já haver passado muito tempo se persuadirão garantidos, e deixarão o rigor de sua quarentena. Ainda messa villa preponderou o caracter benigno da epidemia, apesar de um tratamento pouco regular que tiverão, e nem podia assim deixar de acontecer, visto a nenhuma idéa que se tinha de uma epi- demia dessa ordem. Em relação dos affectados poucos forão aquelles em quem a moléstia passou do primeiro ao segundo período, mas essa proporção infelizmente não se guarda para os mortos. Preponderou extraordinariamente o vomito preto, sympto- ma que quasi na totalidade manifestou-se naquelles, que a moléstia levou a sepultura, pois que de 29 mortos 20 forão de vomito preto. A moléstia tendo seu principio em outubro recrudesceu e aggravou-se em novembro e desembro, com as chuvas pa- receu extinguir-se, porém em fevereiro reappareceu, ma- ximé pelos subúrbios onde fez algumas victimas Em abril estava inteiramente extineta. Sua população é de 800 pessoas, das quaes calculão-se, que forão affectadas 700, destas morrerão 29. BATURITÉ. Neste lugar onde esteve em commissão do governo oSr. Dr. Marcos José Theophilo, e a quem pedimos informações acerca da epidemia, deixemos que elle mesmo falle: « A febre manifestou-se em Baturité de julho para agos- to (de 1851) e d'esse tempo até o mez de dezembro poucas forão as pessoas affectadas, e raros os casos fataes. — 26 — De principio de janeiro (1852) a fins de fevereiro apre- sentou ella o seu maior incremento. De março a fins de junho a sua declinação. Nos casos fataes que se derão de meiado de dezembro a meiados de janeiro havião gastrorrhagias nas ultimas horas da vida e esse facto sem apparecimento da hematemesis, ou do vomito negro, levava os habitantes d'aquelle lugar a sup- porem, que não era a febre amarella, a que reinava, c sim uma outra moléstia. Dessa época em diante desenvolveu-se o vomito negro em grande escalla, as dejecções também ne- gras, as hemorrhagias das gengivas e as dysenterias com- plicando a febre. Poucos tiverão a hematemesis, e nesses poucos a terminação da febre foi feliz. No segundo e terceiro período manifestavão-se muitas vezes symptomas typhoideos, e a dinâmicos, porém o do vomito preto foi mais constante. O numero dos affectados da febre foi aproximativamen- te de mil a mil e duzentos, e dos mortos de cento e dez a cento e vinte. Os tratados com mais regularidade forão seiscentos e tantos, e destes morrerão trinta a quarenta : não sei se posso chamar regular o tratamento medico, que se dá aos quatro quintos de um povo rude e duro aos preceitos da me- dicina, e que messas crises melindrosas a ignorância os pre- cipita freqüentes vezes ao humicidio, que assim posso cha- mar uma morte produzida por desvio ou falta de observân- cia as prescripções e conselho do medico. A situação topographica da villa parece a primeira vista não dever influir na intensidade e máo caracter da febre, mas o facto deu-se, explique-o se puder. Ella fica situada quasi nas abas da serra, cercada de montanhas, pouco po- voada, tendo em sua frente um corrente permanente, que deságua d-uma parte da serra e se dirige de norte a leste: o dia é calmoso a noite é fresca. Eis o que a brevidade permitte, agradecendo-lhes o fa- vor de querer juntar a sua obra as minhas estatísticas. &c.» Apresentando a discripçâo feita pelo nosso collega nos dispensamos de entrar em mais detalhe, pois que resume tudo o que existe de mais essencial. Interpondo o nosso parecer acerca do caracter da febre, que o nosso rolle»a — 27 — acredita não haver disposição da parte do local da villa para ser affectados os seus habitantes da maneira porque o forão, somos levados a pensar, e ter disto firme convicção, que sendo o caracter da febre amarella o mesmo em toda e qual- quer parte, produzirá ella sempre seus terríveis effeitos, onde quer que appareça, comtudo não queremos por exem- plo acreditar, que o clima das Antilhas da costa d'Africa, &c, onde esta moléstia é endêmica, e que produz assim como na Europa, tanta destruição, seja comparado com o do Brasil; mas ceteris paribus vimos, que a febre do Rio de Janeiro foi sempre a mesma na Bahia, Pernambuco, Maranhão Pará, etc, e destas capitães para o centro e luga- res onde appareceu. Póde-se quasi avançar, que salvas pou- cas excepções, a mortalidade regulou igual em todo o Bra- sil, combinadas as suas proporções. A população desta villa éde 2,500 habitantes, dos quaes calculão-se terem sido affec- tados 1,200, e destes morrerão 120. ICO'. Sentimos não ter conhecimentos topographicos da cidade do Icó, sabemos que collocada na margem oriental do rio salgado, (1) 53 léguas da foz do rio jaguaribe acha-se circulada de pequenas serras ou serrotes : a temperatura assáz elevada faz com que os seus habitantes vivão continuadamente abra- sados de calor, maximé no verão, apenas refrescada das 9 para as 10 horas da noite por uma viração, a que chamão Araca- ty ; porém esta viração assim se denomina pela lembrança, que traz esse goso, que experimentão os Aracatienses e de nenhuma sorte o pensamento, que seja um vento, que vá daquella cidade, pois que por suas posições não pôde vento do Aracaty ir para o Icó c ser por esse motivo o vehicu- lo do germen epidêmico. Collocada esta ao sussueste daquella e em distancia de 50 léguas c sendo a direcçao do vento de leste a oeste, não pôde o vento passando pelo Aracaty levar (1) Este rio não é navegável e nem se communica com o Jaguaribe senão pelo inverno quando ha abundância das águas pluviaes ; no verão <5 um pequeno regato, c ás vezes de lodo sécca. ^ -- 2S — a peste para o icó, cuja causa é assás conhecida. Tendo nós consultado ao Sr. vigário Miguel Francisco da Frota deixe- mos, que elle nos explique os differenles pontos, que lhe apre- sentamos acerca da epidemia dessa cidade. « Informando como pede acerca da epidemia que acaba- nios de soífrer, tenho a dizer-lhe que em dias de Outubro chegando a esta cidade um soldado vindo do Ceará e tendo passado pelo Aracaty e S. Bernardo já foi adoentado, mas ignorando-se a verdadeira moléstia foi tratado em casa do . eommandante do destacamento na rua da beira do rio: observou-se que todas as pessoas, que moravão na casa forão cahindo do mesmo mal suecessivamente e logo as casas visi- nhas ou mais próximas a do eommandante por ume outro lado da rua, mas tão benignas a principio que não causarão sustos. Em fins de novembro apparecerão alguns casos na rua da Matriz, que fica confronte a da beira do rio e já com caracter assustador e principiou a mortalidade. No dia 6 de dezembro appareceu o primeiro caso de vomito preto, e como que a população sucumbio, pois que só então teve verdadei- ra idéa do terrível hospede, que lhes batia a porta : agravou- se o mal de sorte, que deste dia cm diante a 13 de Janeiro to- do o povo da cidade com rarissima excepção achou-se affec- tado do mal tendo morrido 85 pessoas, entre as quaes só 3 escravos. Já vê pois que do dia 16 de Dezembro a 13 de Ja- neiro foi o tempo da mortalidade, e observou-se que sempre, que a athmosphera apresentava-se carregada apparecia re- irudescencia na epidemia, e o numero das mortos subia a 4 e 5 diários. Os enfermos que apresentarão o vomito preto todos mor- rerão, assim também muitos que tiverão a hemorrhagia e a compressão no peito e ataques cerebraes. A nossa infelicida- de permittio, que não tivéssemos um medico para cuidar de nossa existência, entregues aos únicos recursos da Provi- dencia, só por ella éramos protegidos, e por isso como nem sempre ella açode, força é confessar, que muitos morrerão victima de cruel abandono em recursos médicos, isto prin- cipalmente era manifesto, quando a moléstia tomava qualquer dos caracteres assustadores, de que afinal vinha a ser victi- ma, porque não tinha quem soubesse applicar o conveniente remédio. Tratou-se de o mandar buscar, porém a noticia que SS. se linha oííerecido e era mandado pelo governo, a quem se tinha pedido taes recursos, fez descançar em sua vinda, aliás nunca realisada. (1) E assim expostos devemos render graças ao Todo-Poderoso de ser tão benigno no cas- tigo, que nos destinou, pois que ainda assim fomos felizes de ter perdido tão pouca gente. Alguns curiosos apparecerão prestando soccorros, aliás bem valiosos, eapplicavãoos sua- dores, xaropes de flores cordiacs e purgantes de óleo de ri- cino ; mas esta applicação do óleo aproveitou mais nos ho- mens, do que nas mulheres. Para completar o que me pedio resta dizer, que calcula-se em 3,500 a 4,000 pessoas a população desta cidade, poder- se-ha calcular cm 150 a 200 aqucllas, que não tiverão a fe- bre, &c )) As informações prestadas pelo Sr. vigário Frota nos dis- pensa de entrar em maiores detalhes sobre a epidemia da ci- dade do Icó, responde-nos tão satisfactoriamente, que quasi nada deixa a desejar. ARACACU'. Foi em princípios de Fevereiro de 1852 pouco mais ou menos, que se desenvolveu a febre amarella na villa do Ara- cacú, collocada na barra do rio do mesmo nome; e isto se deu, segundo afíirmão as pessoas do lugar, depois da che- gada de diversas embarções com doentesa bordo chegadas de Pernambuco, Ceará, etc, e para maior esclarecimento dei- xemos fallar o Sr. vigário Antônio Xavier de Castro Silva, a quem consultamos a respeito, e eis a sua discripçâo. « Informando como me pede acerca da epidemia de fe- bre amarella desta villa tenho a dizer, que teve ella seu prin- cipio ou apparecimento aqui, no principio do inverno, aug- mentando progressivamente á medida da abundância das chuvas, as quaes nunca por mais extraordinárias forão suffi- cientes para mitigar ou extinguir o mal: coincidia um extraordinário calor, que tudo abrasava. Foi-nos sensível a (1) Dizem que não foi SS. mandado pci ter o governo encarregado ao Dr. Thebcri;r porém esle cá não veio. — 30 — lalta de ventanias, assim como o incremento das febres na* occasiões de enchentes do rio, talvez por allagar conside- ravelmente os salgados. « Não me é dado entrar nos conhecimentos das causas da moléstia, porém para sua producção julgo sufficiente a viciação da athmosphera emprcgnada de substancias mephi- ticas emanadas de um lamaçal pútrido das grandes gam- boas, que circumdão esta villa pelo norte, leste e oeste, e sobre tudo pelo transporte de doentes vindos de Pernam- buco e Ceará no patacho Emulação, hiate Eulerpe e garo- peira, etc, etc O caracter mais violento da febre foi o vo- mito preto ; em alguns pardo, e as hemorrhagias; poucos forão os casos de dejecções pretas. Calcula-se em 700 as pessoas affectadas da febre na villa e seus subúrbios, e o nu- mero de óbitos é de 32. Sua população é de 1,200 habitan- tes. O tratamento applicado foi variado, como tem aconte- cido em toda a parte, maximé não tendo um medico, que o dirigisse : cada um foi aplicando aquillo, que melhor pa- recia, e foi assim, que vimos em uns osvomitorios ao prin- cipio, sudorificos, chá de larangeira, café com ginebra, ma- cella, etc. Nós porém applicamos a homceopathia, que se dignou mandar-nos, e temos a presumpção de dizer, que a applicamos a mais de cem pessoas não perdendo nem uma, e nem mesmo perigarão. Eu rendo ao Altíssimo graças por tão salutar medicação. » Apresentando as observações do Sr. vigário Castro Silva com quanto sejãolocanicas, todavia tocarão em todos os pon- tos da questão epor isso nos dispensa de maiores reflexões, e nós não exigimos mais, porque não devemos tanto querer daquelles que não nos podem resolver questões próprias a ; scienciaproífessional. Ao governo compete o exameminucio- so, habilitando a médicos para este fim. Como se vê é sempre ;, a febre transportada por um meio qualquer, mostrando-se em toda a parte a mesma, revestida de seus caracteres dis- tinctivos, quer appareça junto as emanações paludosas, a borda do mar, quer no interior do certão. SOBRAL. A cidade de Sobral collocada na margem occidental do < — 31 — rio Acaracú a 20 léguas de sua foz. se acha situada em uma bella planice de taboleiro cercado da vegetação própria desses lugares, arbustos e arvores de pequeno porte. A ci- dade é bem arruada, tem bellos edifícios e vai em progres- são espantosa. Sua população é de quatro a cinco mil ha- bitantes. Pelo oeste tem a serra Meruoca 3 léguas distante seguindo sua cordileira pelo lado do norte talvez 6 a 8 lé- guas; serra produetiva e cheia de uma bella vegetação. A leste e a 5 léguas de distancia se acha o barriga, serra es- téril, cuja composição (só pedra) dá o aspecto ouapparen- cia vulcânica* Com quanto a cidade esteja sobre a margem do rio, todavia não tem pântano algum, o terreno é pedre- goso, e o leito do rio arenoso, e fica inteiramente secco durante o verão. Nos mezes de Abril e Maio apparecerão grande numero de casos de febre intermittente, porém não sendo isto r3ro na terminação do inverno não excitou cuidado ; mas sendo descouhecida a existência da febre na cidade, já não pou- cos casos se davão nos moradores da beira do rio, gente pobre, que prestando pouca attenção a esta circumstancia não determinou bem o caso, sendo porém real, que haven- do muita communição para a villa do Aracacú, muitos ao chegarem erão affectados; mas sendo assás benigna e con- fundindo-se com a intermittente, que grassava na cidade, não produzia sensação, até que em fins de Maio sahindo do ponto de invação e estendendo-se por dous lados para a cidade (norte e sul), atacou toda a rua da praia invandindo logo o centro. Então não teve mais ordem em sua progressão, em 24 de Junho já havia um grande numero de affectados e deu-se o primeiro caso de vomito preto, e morte logo de duas pessoas. Em Julho porém fez ella verdadeiros estragos, e atacou de uma maneira inaudita. Fomos convidados por alguns de seus habitantes e che- gamos a 14 desse mez. O nosso coração se constrictou na presença de um facto, que já tendo chegado a nosso conhe- cimento, todavia não fazíamos verdadeira idéia, quero fallar da solidão ou ausência de vida de uma cidade, onde sem du- vida quatro ou cinco mil habitantes morão e vivem em con- tínua lida e sociedade! Uma ou outra pessoa apparecia, c rara a casa que apresentava suas portas abertas; as orações — 32 — ou bilhetes, que pregavão nas portas da vão o aspecto de uma cidade sem gente, na qual os senhorios pregavão escriptos para serem alugadas as casas. Tal foi a primeira impressão, que sentimos ao entrar na cidade, e sem tempo de repouso principiamos logo a visitar doentes, e não pou- cas forão as casas, em que vimos dez, doze e vinte doentes affectados a um tempo, e isto observava-se em tantas fa- mílias, que para logo deu a perceber achar-se a febre em seu máximo de intensidade. O calor era intensissimo, a falta de ventos geraes produzia unida aos ardores do sol uma temperatura de 88° a 96°, sendo porém as madruga- das tão frias, que parecia estar-se no rigor do inverno, cessando tudo com a presença do sol. Nesse mez das mais triste recordações para os Sobralen- ses, se deu a totalidade das victimas da febre, 89 forão ellas e em abono da verdade, nem por isso devemos deixar de acreditar benigna a epidemia, que atacando a um tempo para mais de três mil pessoas; apenas fez 89 victimas, sendo mais de dous terços fornecidas pela gente pobre, que sem recursos e meios de levar a effeito um tratamento re- gular, morre a mais das vezes pela falta de cuidado, que reclama o mal, e sobre tudo á alimentação foi a causa pri- mordial da maior mortalidade, pois que sem atlenderas observações dos médicos, a titulo de fraqueza comião desre- gradamente e a conseqüência era a morte ; isto se deu não só em Sobral, como em toda a parte onde a febre ap- pareceu. O vomito preto foi o symptoma, que quasi na totalidade dos mortos presidio ao exito fatal da febre, poucos forão os doentes, em quem a forma hemorrhagica apresentou-se, á apopietiforme, algida, syncopal e typhoide não foi feliz- mente freqüente. A febre foi fatal ás pessoas de fora (certanejos), e mesmo notou-se, que a maior mortalidade teve lugar naquellas pes- soas, não filhas do lugar, embora já a muito domiciliarias : esta circunstancia não escapou a observação. Dos lugares por onde temos andado bem como a Capital Aracaty, S. Bernardo, etc. em nenhum presenciamos a fe- bre tao intensa e atacando ao mesmo tempo um tão grande numero de pessoas como íreste, pois que dias houverão de se- — 33 — rem affectadas 200 e mais,e também em nenhum se demo- rou tão pouco tempo; dous mezes forão mais que suííicientes para ella produzir seus terríveis effeitos. Talvez concorresse para este estado á medida pouco hygie- nica de se enterrarem os corpos dentro da igreja,acontecendo que fazendo-se isto mal, as igrejas Matriz e Rosário fica- rão de tal sorte empestadas pelo máu cheiro dos cadáveres, que não só tornou-se impossível a celebração dos Oííicios Divinos, como atrahião os urubus, que todo o dia esvoaça- vão pelo telhado. Além de nós havião nessa cidade o Sr. Dr. João Francis- co de Lima medico do lugar, e o Dr. Antônio Domingues da Silva, ambos forão encarregados pelo governo de trata- rem a pobresa. Ora parece-nos, que o apparecimento da febre ama- rella nos differentes lugares, que acabamos de notar, al- guns dos quaes 50 e 60 léguas distantes do litoral, prova exuberantemente, que não se torna mister a infecção marítima para sua produecão, e por conseguinte desti- tuída a opinião do Sr. Dr. Carvalho, que a julga única e indispensável para sua existência. Deixamos a conheci- mentos mais profundos a solução desta questão ; não con- cordando também com a opinião do Sr. Dr. José Maurí- cio Nunes Garcia, que attribuio a progressão da febre na nossa província a naturesa do terreno plano ; o illus- tre Professor foi mal informado da topographia da pro- víncia, se não é abundante em serras altas, nao deixa de as ter'em grande quantidade, embora não sejão muito ele- vadas. Sempre que a febre se manifestou em algumas das Villas è Cidades do centro, teve a sua causa conhecida, foi importada por pessoas idas de lugares infeccionados; esta é a verdadeira causa, o verdadeiro motivo de sua ap- parição, tudo o mais são conjecturas. Resta-nos uma observação, que foi geral em todos os lugares onde appareceo a febre, e vem a ser, que no cor- rer da epidemia, quando o dia se apresentava nublado, e que a athmosphera se carregava de eletricidade, os doentes passavão muito mais encommodados, e um grande numero de pessoas erã9 aífectadas, levando a sua influencia ao dia seguinte, em que ainda muitos cahião doentes. — 34 — Uma outra consideração cumpre não ficar desapercebida, e é a extraordinária influencia, que tem a febre amarella sobre a economia animal produsíndo ou predispondo ao desenvolvimento de certas moléstias orgânicas, predomi- nando consideravelmente as a ffeções pulmonares ; e se o indivíduo já tinha alguma alteração, então fazia ella rápi- dos progressos. Isto de que se queixão os habitantes desta Província, e que infelizmente é observado na pratica ; já tem sido notado em Pernambuco, Bahia, Rio de Ja- neiro, etc IMPORTAÇÃO E CAUSA DA MOLÉSTIA. Quando lançamos as vistas sobre a enumeração das causas, que dão todos os authores, que se tem oecupado d'esta moléstia, para seu desenvolvimento; quando vemos o concurso daquellas, que no Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco etc, influirão para sua manifestação; quando lemos as opiniões daquelles, que admittem condições ath- mosphericas para seu apparecimento, bem como elevação ou abaixamento de temperatura, humidade e outras va- riações athmosphericas, assim como outras influencias peculiares as localidades, bem como importação de estran- geiros, de africanos, reuniões, pântanos etc. etc, e lan- çamos as vistas para o nosso Ceará, para onde um só afri- cano não é importado, onde não chega, pode-se assim dizer, um estrangeiro; onde athmosphera limpa, pura e secca nos apresenta os mais bellos dias, quer na oceasião, em que gosamos do estado sanitário o mais saptisfatorio, quer no principio meio e fim da epidemia, quer em seu máximo de malignidade, quer de benignidade ; onde nm vento forte, e geral banha constantemente a Cidade, con- servando uma temperatura quasi constante e regular, quer no verão, quer no inverno j finalmente onde suas ruas largas e espaçosas offerecern garantia a uma boa hy- giene; quando attendemos a todas estas considerações fica- mos em deciso se para o apparecimento da febre amarella se torna mister mais, do que o concurso do quid epidê- mico, que nós não conhecemos apesar de todas as inda- gações ; convencemo-nos, que elle o somente elle é bas- — 35 — íante para produzir o mal independente de outra circuns- tancia ; se assim não fora como explicar o apparecimento da febre entre nós? Será por ventura, porque uni ou outro dia fez mais calor e esteve á athmosphera mais carregada pela manhãa dissipando-se quasi sempre ao meio dia todas as nuvens, apresentando-se o sol brilhante e raidoso? Será porque em uma ou outra travessa se des- cobre mais um pouco de lixo ? Será finalmente pela pre- sença desses pequenos pântanos, que circulão a Cidade desde a mais remota antigüidade, e hoje menos do que em tempo algum, porque tem sido dissecados? Porém não são Iodos estes objectos ou causas constantes, e pode-se dizer, regulares e permanentes em todos os annos? ; Não vemos em todas as epochas as mesmas circunstan- cias climatericas, a mesma constituição da athmosphera? Já entre nós por ventura appareceo desde 1845 para cá outro motivo ou alteração, que nos chocasse a ponto de fazer receiar uma modificação qualquer em nossa consti- tuição medica ? Não tem todas as cousas regularmente ca- minhado este.; dous últimos annos, como os passados, em que a epidemia lavrava as mais províncias do litoral, e assim passou igualmente o atrasado, e subsequentes? Sc a observação não falha e a reminiscencia não engana, as- sim aconteceu, e por isso não podemos crer, que a epi- demia tivesse por causa disposições peculiares de nossa província ou capital, pois que reunidas todas estas cir- cunstancias, a que impropriamente se poderão chamar— causa— não poderão ser senão predisponenles, porem de- terminantes ou diretas para a producção da moléstia não podemos conceder. Se no*Rio de Jaaciro e outras províncias onde muitas causas próprias do lugar, c nas melhores condicções de propagar a moléstia não poude ella deixar de ser conside- rada, e com toda a rasão, como importada, pois que factos positivos c concludentes a isto levarão, que dirá entre nós, onde tudo nos falta a excepção do fluido imponderável, desse germen produtor, finalmente da epidemia em si 1 ? Piamente acreditamos, que a moléstia nos foi impor- tada, porem quando, e por quem é, o que não poude ser 6 — 36 — descoberto e conhecido, talvez pelo descuido, em que estávamos; desapercebidos, já não pensávamos em tal im- portação, e foi tal a nossa distração, que quando nos pre- sentimos, ella se achava disseminada na população, e nin- guém percebeo o fio de sua entrada. A não admittir esla , . mais que plausível circunstancia, como explicar o appa- recimento da febre entre nós? Crer que por si mesmo se desenvolvesse em uma pequena Cidade, onde faltão todos os elementos de sua produção, a medida, que não se admettio este desenvolvimento nas grandes Capitães do Império? Não é possível. Quando em 1850 ella grassava em outras Províncias, os vapores, que por ellas passavão chegavão á nós, e quasi que nenhuma cautella se tinha. Assim nos exprimimos porque as quarentenas que fa- zíamos ter estas embarcações não tinhão o rigor que exigem estas medidas, pois que pela necessidade que havia de levar a bordo o carvão e outros misteres punhão estes navios em communicação constante com a terra por via das jangadas e pessoas, que se oecupavão meste trabalho, e até nós como Provedor da saúde iamos a bordo desinffectar as malas, inspeccionar o navio e declarar a quarentena, que consistia em não deixar desembarcar pessoa alguma ; to- davia acreditamos, que estas medidas si bem que imper- feitas concorrerão cm parte para nossa isenção, sendo ' quanto a nós a causa principal não ter nehuma dellas tra- zido pesssa doente a bordo; e assim estivemos preservados da febre de 1850 que de Pernambuco passou ao Pará dei- xando de permeio Ceará e Maranhão. Mas como*"èstá "dito em nenhuma dessas embarcações havia doente de febre, donde concluo, que se ella não nos tivesse vindo por um meio directo, (presença de algum doente) não a teríamos; e esta nossa maneira de pensar não éfilha somente da experiência de hoje, pois que muito antes de : a ter, já nós dessa sorte nos exprimíamos, quando tivemos de aventurar algumas palavras a cerca da epidemia, que então reinava pelo sul do Império. Eis o que dicemos no Pedro 2.° do 1 de Maio de 1850. « E' hoje facto sabido c averiguado, que só foi depois, « da chegada do brigue Americano Brasil na Bahia, a '< bordo do qual morrerão alguns passageiros, que se desen- « volveu a epedemia; este pondo se em contacto com um « brigue Sueco, a tripulação foi logo affectada c então « activou-se o mal, e a Cidade da Bahia foi a primeira, que « presenciou as destruições de uma febre amarella, e desta « sorte nos foi importada a moléstia. « Dicemos que a simples communicação de um lugar « infectado para outro, que não esteja, por meio de embar- « cações &c. sendo.o estado destas scptisfatorio, não im- « porta a moléstia,'c o que assim nos faz pensar é, além de « outras rasões, nada soífrermos. Pois se a simples commu- « nicação, fosse sufficiente para seo aparecimento nós esta- « riamos exemptos; nós que pelo menos duas vezes por mez, « e desde outubro do anno passado, temoscommunicações « directas com a Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco &c. c sédeda epidemia? Mas j)orquc assim temos estado livres? « E' porque estes vapores e embarcações não tem trasido « um só doente, que empregue na athmosphera este fluido « epidêmico, que foi a causa de seu desenvolvimento nas « outras Províncias. Como é que o Rio de Janeiro, Pernam- « buco &C. forão logo victimas da epidemia da Bahia? E' « porque o commercio de cabotagem alli é muito freqüente, « e sem duvida algum doente foi transportado. Não vimos « por ventura o Pará igualmente com nosco exemplo, até « que de Pernambuco lá chegou a charrua Pernambucana « com doentes, e que logo se desenvolveo terrivelmente a « epidemia? Seria possível que fosse importada pelos va- « pores &c. ou por meio da athmosphera ficando o Ceará « e Maranhão de permeio livres, fazendo cila este « salto? De certo que não. » Chegando-nos a noticia da febre no Maranhão tomarão se as mesmas cautellas, que anteriormente quando cm 1850 grassou no Sul do Império; e quando lá se acliavão extinetas, eis que apparecem entre nós, importada sem duvida, porém por quem, e de que maneira nós o igno- ramos, enem nos envergonhamos de assim nos exprimir, pois que preferimos a franqueza, ao aventurar-mos mal fundadas razões. TRANSMISSÃO E CONTAGIO. Não é sem aiinm; rccülo, que "»amoi. a vcnlurar algumas — 38 — reflexões sobre um ponto, que tem servido de litígio a tantas e tão illustradas capacidades, quer nacionaes, quer estrangeiras, porém cumprindo-nos relatar tud" quanto entre nós occorreo, forçosoé, que entremos mesta questão, nos sendo permetlido corroborar com algumas rasões, ou argumentos colhidos de outras fontes. A transmissibilidade da febre amarella no Brasil, assim como na Europa, segundo muitos aucthores, éum ponto de sciencia hoje admettido sem contestação, e por conse- guinte concedido o contagio da moléstia por um grande numero de respeitáveis médicos. Quem á vista do judicioso trabalho do Sr. Dr. José Pe- reira Rego, sobre a febre amarella do Rio de Janeiro, po- derá negar, que a febre sendo importada para a Bahia pelo brigue Brasil chegado da nova Orleans, foi dahi transmittida para o Rio de Janeiro pela barca americana Navarre, para Pernambuco pelo brigue francez Alcyon, e desta para a província do Pará pela barca Dinamarqueza Pollux e charrua Pernambucana^ E a não admittir isto como explicar o apparecimento da lebre no Pará communi- cada por Pernambuco ficando o Ceará e Maranhão de per- meio sem serem affectadas ? Parece-nos que ninguém. Depois disto quem poderá duvidar da existência do con- tagio a vista das observações appresentadaspeloDr. De-Si- moni extrahidas do relatório de uma commissão medica insíallada em Gevona, e publicadas nos AnnaesBrasilíenses ;dc Medicina de Novembro de 1850, cujos factos são da maior transcedencia e importância? E sobre tudo a vista das reflexões apresentadas pelo Sr. Dr. Lallemant anti- coníagionista, que já tendo escripto uma obra meste sen- tido, modificou inteiramente as suas opiDÍões a vista dos factos apresentados por Sr. William Pym inspector geral dos hospítaes do exercito e super intendente geral das quarentenas na Inglaterra ? A obra desse illustre medico tem porfim principal mostrar a summa contagiosidade da febre amarella ; são tão convinientes as rasões, que apre- senta e os factos, que não podem deixar de extraordinaria- mente impressionar e abalar as convicções daquelles, que não crêem no contagio da febre. Dilferentes epidemias sao descriptas pelo illustre medico, em cada uma das quaes * — 39 — tira argumentos mais fortes a cerca do contagio, demons- tra e nota um grande numero de lugares invadidos pela febre, ou antes em que a febre foi levada por um contagio direto e positivo: e finalmente a pag. 143 conta o tristís- simo facto do vapor inglez Eclair, que não podemos deixar de copiar. « Este vapor sahio da Inglaterra no dia 2 de Novembro « de 1844, ecrusavana Costa d'Africa. No anno seguinte « uma pequena expedição deste vapor foi em differentes « botes explorar alguns rios cpedras perto da Serra Leoa. « Pouco depois os homens empregados n'esta expedição « adoecerão um depois do outro, c mais alguns do mesmo « vapor : houverão differentes mortes a bordo, bem que o « vapor mudasse de ancoradòuro. « Nestes apuros o vapor retirou-se para a ilha da Boa « Vista do Cabo Verde, em que não havia febre amarella, e « os doentes forão desembarcados na ilha deserta do forte, « separada da Boa Vista por uma distancia de meio quarto « de legoa. O medico portuguez da Boa Vista julgou a febre « do Eclair de natureza innocente, e havia communicação « entre a tripolação do navio e os habitantes da ilha. « Os médicos do vapor Growler, (que estacionará pouco « tempo, antes no Rio de Janeiro) ajudavão aos seus col- « legas do Eclair, nos seus trabalhos. E como o comman- a dante do Eclair, o capitão Estcourt adoecesse também,os « médicos reunidos para salvar o resto da tripulação, julga « rão necessário, que o vapor Eclair fosse mais para o norte « ao menos até a ilha da Madeira. » « Sahio o vapor Eclair da ilha da Boa-Vista, mas a doença « ficou muito pior; o medico doEelair, Macoushy adoe- « ceu, e o eommandante Estcourt e o medico M. Clure de « Growler morrerão. Avistada ilha da madeira o medico « Macoushy falleceo também e mais alguns marinheiros, e « o vapor não pôde obter communicação e soecorro da « ilha. « Continuando a doença de um modo tão inexorável, « o vapor fugio até a Inglaterra: mas a doença acompa- « nhou-o em toda a viagem. Chegando a ilha de Wight « no dia 28 de setembro o Eclair foi posto em quarentena; « a febre reinava sempre c cousa espantosa ! morreo até — 50 — « o piloto da ilha de Wigkt, e o Dr. Rogers, que tinha « ido a bordo do Eclair desde Sheerncss. « No dia 12 de outubro somente é que a doença desap- « pareceo. Logo depois da chegada do Eclair a Boa Vista, « logo depois de ter elle communicado com os habitantes « dessa ilha, dcsenvolveo-se a febre amarella na ilha, e « fallecerão até 400 pessoas! « A historia mais minuciosa destes factos com autos, « relatorics, cartas, interrogatórios mais circunstanciados « de todas as pessoas interessadas meste tristíssimo acon- « tccimento, forma a segunda metade deste livro, summa- « mente interessante variado e consciencioso. « O autor acaba suas sabias indagações pelas seguintes « palavras: Assim demonstrei que a febre de Bulam é « uma doença sui gcneris summamente contagiosa, ata- « cando uma só vez o homem de origem externa, poden- « do propagar-se em paizes de certo gráo de calor, mas « que em todo o tempo pôde ser empedida por leis de qua- « rentena e regulamento de reclusão bem estabelecidos. » O illustre inglez tem tanta confiança em suas observa- ções e factos, que apresentando umas cartas de Sir Rockct da ilha de Jamaica relativamente a febre amarella, e es- pecialmente á do regimento inglez n.° 54 de que resulta, que a doença só uma vez ataca os mesmos indivíduos, exclama: « Não parece uma infatuação exlranha, que « homens de sciencia e de capacidade com taes provas « positivas de contagiosidade perante os olhos, ainda es- « tejão sonhando em influencia da estação, predisposição, « miasmas, palustres? &c, &c. » Deixando o que se passa fora, que muito mais se pode- ria dizer, prossigamos a nossa historia e com ella não menos cabalmente demonstraremos a contagiosidade da moléstia. Tomando o fio de nossas observações, o que vimos? A fe- bre apparecida na Bahia importada da Nova Orleans pelo brigue Brasil, dahi para o Rio de Janeiro, Pernambuco e Pará por outras embarcações com doentes da mesma mo- léstia; e com quanto o Sr. A. J. Peixoto em suas refle- xões acredite, que a febre não pôde ser importada porque então diz elle: « Se a epidemia tivesse sido importada de « qualquer parte, de certo que não apresentaria tão nota- — 41 — .< veis epiphenomenos, tanta diífercnça sobre tudo no « modo da invasão, e no caracter não continuo, nas ma- ce nifestas apirexias, que nunca deixão de apresentar-se, « e que são tão favoráveis ao emprego do sulphato de qui- « nino, de que temos tirado innumeras vantagens, combi- « nando-o com o calomelanos depois de sobre estar ao « progresso por meio da sangria. » Quando lemos este tópico das observações do illustre pratico do Rio de Janeiro ficamos abalados; porém se- guindo o encontramos adiante adescripção dos symptomas, pelos quaes se manifestava a febre; reconhecemos então, que da parte do illustre collega não havia mais, do que suceptibilidade, encontrando differença de symptomas em circumstancias dependentes da constituição, idiosincrasias, e disposições do doente; o caracter geral da moléstia era o mesmo, e o mesmo tem sido cm todas as partes onde tem apparecido. Não sejamos tão rigorista, que enxerguemos differença de caracter de uma epidemia, porque um ou ou- tro indivíduo apresenta excepção, e muito principilmcnte na febre amarella, que é susceptível de tomar tantos ca- racteres como tem sido observado. Assim o Sr. Dr. Pei- xoto, que sem duvida terá modificado os seus pensamentos, teria observado como a febre levada da Bahia, teve seo começo no Public-house da rua da Mizericordia no Rio de Janeiro pelos marinheiros da barca Navarre, dahi foi affec- tando todas as pessoas, com quem seposerão em contacto, passou ao depois a rua da Mizericordia, e o resto o illustre collega, melhor, do que nós sabe. O que soubemos doRio de Janeiro podíamos dizer das outras partes, mas como são sempre os mesmos argumentos, passe- mos á nossa Província,de quem especialmentenos oecupamos. Já vimos como a febre entre nós appareceo em S. Ber- nardo, Icó, Acaracú, Sobral, &c. ; todos os mais lugares, com quauto não seja positiva a causa da invasão, sem du- vida por ter escapado a observação, todavia os seos habi- tantes queixão-se de um ouautro indivíduo, que atenha importado. Depois qual o medico, que tem observado esta epidemia, e não tenha seguido a sua tram.nissão de casa em casa e de pessoa a pessoa? São tanlaá as casas e famí- lias, em quem vimos um após de outros irem cahindo, que - 42 — se foramos apontar seria nunca acabar. Em nossa casa não só se deo o facto de serem aílectados uns depois dos outros todos os membros de nossa família, como aquellas pessoas, que de fora vinhão se occupar do trabalho de nos tratar : ainda uma outra circunstancia se deo, de triste recorda- ção ! Todos os membros da família tinhão sido benigna- mente affectados ; porém uma ama, o foi gravemente com vômitos pertinases e dejeções pretas, para logo nos cahio um escravo, com convulções tetanicas, e depois uma nossa filha de 4 annos de idade com vômitos de sangue, dejeções da mesma natureza, tornando-se depois pretas ; appare- cendo depois hemorrhagia pela mucosa da boca ; e quando estes terríveis symptomas declinavão, uma ferida da boca entrou em putrefação, appareceo a gangrena, e a morte foi sua conseqüência. Não menos extraordinário foi, o que observamos em casa do Sr. Raymundo Theodorico de Castro, no Aracaty. Foi elle o primeiro atacado, o qual já soffrendo de uma gas- trites chronica, padeceo consideravelmente da febre, to- rnando esta a fôrma syncopal. Depois é affectada uma filha de 18 annos, que sempre estava á sua cabeceira, ao cabo de 5 dias de febre intensa tem a hemorrhagia pela boca, soluço, &.c. Na mesma oceasião cahe outra de 12 annos tendo no fim de 3 dias vômitos pretos com extraordinárias dores pelo ventre , caimbras no estômago , extremos frios, ôíc. A esta segue-se logo um outro filho de 6 annos, que ao quarto dia de moléstia, toma esta o caracter apo- pletiforme com vômitos pretos, e depois hemorrhagia pela mucosa da boca. Uma filha de 8 annos é affectada, parece benigna a moléstia, porém no quinto dia tem lugar uma extraordinária hemorrhagia pela boca. Ainda um outro filho de 10 annos éaffectado, no qual se manifesta a he- morrhagia bocal. A estes segue-se uma escrava, na qual além da hemorrhagia pela boca soffre uma parotides. Vê-se que todos estes doentes forão affectados gravemente pre- dominando a hemorrhagia, o que parece ter a moléstia lomado um caracter, e este sendo transmittido as pessoas, que forao tendo a febre. Nesta casa só a senhora e uma filha de 16 annos e outra de2 tiverão benignamente. Todos estes doentes escaparão. — 43 - Em Sobral observamos a mesma cousa, em casa do Sr. João Antônio Cavalcanti: fomos convidados para ver um filho de 12 annos, que se achava de vômitos pretos ; logo depois um outro de 6 annos com o caracter apopletiforme. Seguio-se uma cunhada com vômitos pretos, dejeções, he- morrhagia pela boca, um susto a matou já em convales- cença. Depois teve uma pequena de 10 annos, em quem a febre teve muita difficuldade de ceder; finalmente o mes- mo Sr. Cavalcanti esteve gravemente enfermo. Em uma outra casa vimos um pai e quatro filhos serem affectado da febre um depois do outro, em todos manifes- tar-se o vomito preto, e morrerem. Não nos lembramos, se tivemos uma casa de família, onde um só caso se desse; quasi sempre era toda levada de rojo pela febre, quando não a maior parte, e por isso em não poucas casas tivemos 8, 10, e 12 doentes, que visitar, e no Aracaty vimos 22 em casa do Sr. Fiusa, porém em nenhuma parte estes casos se derão tão extraordinaria- mente, como em Sobral, onde de 24 de junho a 20 de ju- lho cahio a população inteira, póde-se assim avançar, e então a totalidade das famílias forão affectadas, e 12, 16 e 20 doentes erão freqüentes em todas as casas quando este numero havia para ser affectado. Centenares são os factos, que temos de pessoas, que fo- rão affectadas da febre, porque estiverão ou visitarão a doentes. Um grande numero também a tiverão sem com elles se porem em contacto; mesmo conheço alguns, que forão refractarios a epidemia, lidando com doentes sem nunca serem contaminados do mal; mas este numero, que não pôde deixar de ser muito inferior ao outro, nada prova em contrario. Talvez se nos apresente em favor do não contagio as experiências de Guybu, Potter, Fsirth, Parker, Pfert, Laveilli, Cabanéllas dé terem injectado em si o suor, a sa- liva, a matéria do vomito preto, &c, e mesmo de terem bebido; estas experiências podem levar a convicção que não é por esta via, que se faz a transmissibilidade; eá resposta que a esta questão dá o Sr. Dr. Rego a juntamos o seguinta facto, que mostra até onde a natureza zomba da predicção dos homens privilegiando o organismo. — 44 — O facto de haver pessoas refractarias a bexiga é fre- qüente nesta província -. conhecemos muitas pessoas em quem a vaccina tem sido inutilmente inoculada, e andando entre bexiguentos, não é a moléstia transmittida; ou seja isto por predisposição natural, ou seja porque a carne de onça tenha a propriedade dessa preservação, o caso é que, é ella muito usada pelos nossos certanejos, como preser- vativo da bexiga. Porém vamos ao nosso caso, e com elle terminaremos, o que a respeito do contagio ou transmissão temos de dizer. Parece que ninguém desconhece, ou porá em duvida o contagio syphilitico, pois conhecemos ura ho- mem tão refractario, que ostenta o seu privilegio pra- ticando grandes imprudências: foi por nós observado o se- guinte facto. Três indivíduos inclusive elle tiverão coha- bitação com uma mulher impura : elle foi o segundo, os dous ficarão contaminados e soffrerão extraordinaria- mente, e elle ficou incólume. Um segundo facto do mes- mo indivíduo. Era conhecida a impuresa de uma mulher elle mostrou, que cohabitando com ella nada lhe succede- ria : o seu estado calamitoso foi observado: o acto consum- mou-se, e o homem ficou tão perfeito como d'antes. Cum- pre dizer, que não usou de artificio algum para se livrar desse contagio, se assim praticasse nada havia que admi- rar. Outros conhecemos, que se julgão refractarios, mas que não se tem exposto as provas, que acabamos de apre- sentar. E por ventura o contagio da syphilis será posto em duvida, porque um ou outro assim apparece afrontando-o ? De certo que não; portanto reunindo a nossa fraca opinião á do distincto pratico do Rio de Janeiro o Sr. Dr. José Pe- reira Rego, diremos que « os argumentos dos anti-con- tagionistas, ou daquelles que negão a transmissibilidade da febre amarella, não podem por em quanto abalar, nem distruir, os que se baseão na opinião opposta, e que antes pelo contrario razões mais fortes parecem apoiar esta ulti- ma opinião. » Julgamos a propósito fazer nesta parte o transcripto das conclusões da inspecção geral de saúde de Londres apre- sentado ao parlamento; fazendo-lhe as notas, que acha- mos conveniente, segundo o que foi por nós observado: eis. — 45 — « 1.° Que as epidemias de febre amarella rebentao si- multaneamente em cidades differentes e distantes, e em pontos differentes e distantes de uma mesma cidade, mui- tas vezesemeircumstanciasem que a communicação com as pessoas infectadas é impossível. (1) » « 2.° Que as epidemias de febre amarella são prece- didas geralmente pela occorrencia de casos sporadicos ou individuaes dessa enfermidade, sendo também communs esses casos sporadicos nas estações em que não reina epide- mia alguma. (2) » « 3.° Que as epidemias de febre amarella, bem que algumas vezes se estendão a grande extensão do paiz, li- mitão-se mais freqüentemente ao espaço onde rebentao, não envolvendo toda uma cidade, e algumas vezes nem mes- mo um grande districto dessa cidade. (3) » « 4.° Que as epidemias de febre amarella não se communicão de districto á districto por meio de uma regra de progressão gradual, mas muitas vezes asso- lão certas localidades ao passo que poupão inteiramente, on fazem muitos pequenos estragos nas visinhanças im- mediatas, com as quaes estão os habitantes em constante communicação. (4) » « 5.° Que as epidemias de febre amarella quando in- (1) Isto se deu entre nós porém na maior parte" teve por causa a presença de doentes com este mal. (2) Não observamos entre nós esta circnmstancia, nenhum caso sporadico se deu, ou precedeu o apparecimento da epidemia, só se as- sim quizer se acreditar alguns casos aggravados de febre gastnco-bi- liosas nos annos anteriores. (3) O contrario observamos entre nós; vimos que quando a febre apparecia em uma cidade ouviUa, só terminava a sua acçao quando nao havia mais a quem affectar; quando não era com esse rigor, podia se acreditar que sempre 2;3 erão affectados, por mais pequena que fosse a cidade villa ou povoado. (lx) Pela razão precedente vimos que se não observou entre nós, não endo poupados os quarteirões, ruas e«dade^^f J?g" res onde a febre uma vez appareceu, levando de vencida todos os ha- bitantes e moradores das cidades, villas, povoaçoes, etc. 46 — vadem a un» districto não se communicão das casas pri- meiramente atacadas para as casas immediatas, e dalli para as adjacentes estendendo-se assim de um centro; antes pelo contrario se limitão rigorosamente muitas vezes a certas casas de uma rua, a certas casas de um lado da rua, a certos quartos na mesma casa, e muitas vezes quartos no mesmo andar. (5) » « 6.° Que em geral quando a febre amarella re- benta muma família só um ou dous indivíduos são ataca- dos, escapando geralmente os enfermeiros; e que quando muitos membros de uma família são successivamente ata- cados, ou adoecem os enfermeiros é que a epidemia ou era geral na localidade, ou os indivíduos atacados tinhão ido a um districto infectado. (6) » « 7.° Que quando a febre amarella reina em um dis- tricto a reclusão a mais rigorosa nessa localidade nenhu- ma protecção offerece contra a propagação da molés- tia. (7) » (5) I0rqUe dÍfm°S' f/ue os SV ^omas se exacerbão, Mo* ma5, íl'? f G P-°g,'edh' e °rgaos' ^solíVer, elles se exace^ bao mais esta exacerbação em si não é o que constitue período, e sim o caracter que toma o soffrimento em relação aos anterores — 59 — dos, escapa , do contrario, elles e somente elles vão augmentando de intensidade e a morte chega-se. Ora, se a morte chega no segundo período da molestia, para que dar- se um terceiro, somente para designar esse ultimo mo- mento, em o qual os recursos d'arte são quasi sempre im- potentes, pois que só é do dominio deste período as ul- timas horas do passamento ? Parece-nos, que se pôde dispensar sem errar 05 preceitos d'arte, e tanto mais certeiro avançamos isto, quanto mais consultamos a obra do nosso distincto collega. O que nos diz elle na discrip- çâo, que faz do terceiro período? nada absolutamente de novo, do que está descripto no segundo: um só órgão não apparece novamente soffrendo, uma só funcçâo não alterada por essa passagem, o doente conserva todos os seos soffri- mentos, a única modificação, que experimenta, assim como todas as moléstias, que tem uma terminação fatal, é o acréscimo do seo mal, não dizemos bem, é o incremento, que tomão os seos padecimentos pela extinção da vida, que vai experimentando o corpo, em ultima analyse, é a desorganisação geral do organismo produzida pela falta de equilíbrio das funções, pelo aproximo da morte. Quaes sao as alterações necroscopicas do segundo e terceiro período, que se encontrão destinctas nos indivíduos mortos em qualquer delles ? Nenhuma. Chegando-nos as mãos o n. 12 dos Annacs Brasiliense de Medicina encontramos a resposta do Sr. Dr. Rego ao Sr, Dr. Carvalho, e muito folgamos de ver perfeitamente combinarem-se as nossas opiniões acerca da destínção dos períodos das moléstias, porém não achamos, que o collega nos saptisfizesse em suas razões para provar o terceiro pe- ríodo da febre, manifestado por phenomenos indicadores de uma desorganisação geral, sem lesão apreciável de ór- gão algum novamente interessado, e apreciado pela authop- sia. Ora, se o segundo período se manifesta por lesões anathomicas e funcionaes, que com ellas coincidem, seja é elle o período bastante avançado da molestia, em que sobre sahe uma desordem no systema de inervação e circulação; para que determinar-se um terceiro período manifestado somente por symptomas, ou antes incremento de sympto- mas, que por aproximar-se ao termo fatal, se mostrão a — 60 — expressão de uma desorganisação geral ? Assim como acre- ditamos, que a argumentação tirada da organogenia e lei pathologíca geral não é a melhor para saptisfazer as vistas do pratico á cabeceira do doente, pois que muitas vezes se encontrará embaraços semelhantes aquelles notados pelo Sr. Dr. Rego no Sr. Dr. Carvalho. Uma das verdades que se pôde avançar acerca, do que temos tratado, é, que a passagem do primeiro ao segundo período, e clara, e basta uma vez a ter observado para não se enganar, e se ha a deste para o terceiro, é ella tão imperceptível, tão impos- sível de a seguir, que chegar-se-ha a seo conhecimento, quando os phenomenos da desorganisação geral indicar o próximo termo do infeliz : se para isto é preciso dar um terceiro período, nós oadmittimos. Pôde muito bem acon- tecer, que estejamos em erro, e nem apresentamos a nossa opinião como a melhor, dicemos, o que pensamos, nem mesmo sabemos se vai ella de acordo com o parecer de al- gum author, só tivemos em vista a nossa observação. Não desenvolvemos mais o nosso pensamento, primo porque não temos a presumpção de figurar de author de idéas novas; secundo porque sendo o nosso firn unica- mente fazermos a descripção histórica da epidemia do Ceará, não é de nossa intenção entrar-mos em questões in- dependentes deste objecto. PROGNOSTICO. A febre mostrava ser tanto mais benigna quante os symptomas porque ella se manifestava erão mais fncos. Muitas vezes a sua duração era de algumas horas, outras vezes excedia de 4 e 6 dias terminando no primeiro pe- ríodo, isto acontecia sem inconveniente no principio da epidemia em todos os lugares, onde appareceo. Quando a moléstia tinha de perigar, os doentes torna- vão-se inquietos e queixosos do terceiro ao quinto dia, quando tinha lugar o perigo no terceiro, a crise era no quinto; quando n-esse dia apparecia a gravidade era no septimo a crise. Aquelles doentes em quem a exacerbação do mal tinha lu- gar no terceiro dia, o seo estado eramaisdereceiar, do que — 61 — os outros, eterminavão os seos dias quasi sempre no quin- to dia de molestia. O vomito preto acompanhado de so- luço era quasi sempre fatal. O sub-delirio naquelles em quem afinal se desenvolvia a forma comatosa ou apopletiphorme era também demáo pre- sagio. O desassocego ou impossibilidade de guardar uma posi- ção não só no corpo como nos membros era máo, e quasi sempre o presagio da passagem do primeiro ao segundo período, e quando meste, de morte próxima. A indifferença do estado de molestia também era de máo agouro. A decomposição da face depois do vomito preto, ou ou- tro symptoma do segundo período, as extremidades frias, o tympanismo do ventre erão symptomas infalliveis da mor- te, ainda que o pulso se conservasse esperançoso por algum tempo, como observamos algumas vezes; após estes symp- tomas apparecia a anciã mortal, o desassocego, e a morte feixava este quadro deafflictiva dôr. Algumas vezes depois de ter desapparecido a febre e mais symptomas atterradores, os doentes continuavão em uma tristesa eabatimento considerável, com fastio extre- mo, e assim terminavão os seos dias no momento, em que menos se esperava. Algumas vezes todo este cortejo assustador nos differen- tes estados descriptos era vencido por uma reacção forte e salutar do organismo, influenciada pelos medicamentos, e o doente triumphava de seo mal, restabelecendo-se. Quantas vezes os prognósticos dos médicos tem sido falli- veis, e muito principalmente nas moléstias agudas e epi- dêmicas !... TRATAMENTO. Dous são os meios pelos quaes os médicos hoje exercem a grande arte de curar Allopathia e Homoeopathia , se as- sim o querem, grande tem sido a controvérsia entre elles para negar e deffender : não achamos razão em nenhum, quando se trata de extremar a sciencia. Nem allopathia e exclusiva, nem também o é a homoeopathia; de mãos da- — 62 — das é de grande recurso ao medico, de grande vantagem a humanidade. Firme nestes princípios nós empregamos os dous systemas, e isto fazemos,porque estamos convencidos de sua utilidade, e applicação. (1) Não sabemos o motivo porque os novos e antigos parti- dários dos systemas opinão pelo exclusinismo: não pode- mos mesmo compreender, qual o motivo porque unrme- dico não pôde applicar o antigo e novo systema; nem mesmo podemos atinar com a incompatibilidade desse proceder; pelo contrario a razão mostra, que nada é mais justo e plausível, do que o medico lançar mão de tudo quanto for útil e vantajoso á humanidade. Estamos per- suadidos que se nos responderá; « para que inovações uma vez, que obtemos todos os resultados pelo systema, que applicamos, se nelle encontramos todos os recursos da (1) Chegando no Rio de Janeiro em 1853 ficamos maravilhados de ver a pratica dos nosssos collegas, quer em um, quer em outro syste- ma;'aquelles que seguem o exclusivoUa allopathia a exerce tão differente- mente, de algum tempo, tem de tal sorte simplificado as suas receitas, e tem aproximado tanto as suas doses as nihilidades da homcepathia, que a não serem ellas uma vez por outra misturadas com os cáusticos, as san- grias, os vomitoriose purgantes podia-se dizer,que no Rio de Janeiro hoje não havia senão a homoeopathia! IJm cem numero de receitas se vêem todos os dias sobre os balcões das boticas, pedindo somente—água desti- lada duas ou três gottas de tintura de aconito,de belladona de chammomilla, ou de outra qualquer substancia! Quantas vezes não tem as pequenas gottas de aconito nas mãos dos allopathas substituído as sangrias, as ventosas e as bixas, e assim livrado ao pobre doente, do tormento de taes applicações, e sobre tudo poupado a extração desse precioso ele- mento de vida e saúde ?! Que bellos resultados não são tirados todos os dias pelos allopathas das gottas de belladona pulsatilla, noxvomica &c. ? A differença da pratica de nossos collegas homceopathas consiste no uso quasi exclusivo de tinturas que hoje se faz na applicação dos remé- dios; a medida que os glóbulos mui raras vezes são empregados; nós que sempre tivemos muita reserva de fazer uso das tinturas admiramos essa applicação, e confessamos, que hoje a fazemos da mesma sorte, que acha- mos aqui estabelecido na pratica, e temos tirado mui bellos resultados; talvez que dessa falta proviesse um grande numero de casos, em que achei falhar completamente á acção dos medicamentos homoeopathicos em glóbulos, que todavia produzirão em outros muitos bellos resulta- dos, e não julgamos conveniente os dispensar, pois que circumstancias peculiares ao indivíduo reclamão muitas vezes uma doze nimiamente fraca, e n'esse caso os glóbulos são úteis e vantajosos. (Nota do Author.) Rio, 31 de Agosto de 1853. L. C. C. — 63 — medicina,, para que lançarmos mão de ura, que não temos confiança ? » talvez seja esta a resposta de qualquer dos partidários exclusivistas, porém permita-nos, que respon- damos, primeiro que tudo negamos a inutilidade de um ou outro ; em segundo lugar não basta, que o medico en- contre recursos no systema, que applica, é do seu dever alliviar o mais promptamente possível os males de seus se- melhantes, a humanidade exige, e ao medico cumpre lançar mão daquelles meios, que forem mais promptos e específicos, na grande arte de curar. Muitas vezes conhecemos, que um doente tratado pela allopathia cura-se, porém tratado homoeopathicamente pôde curar-se mais depressa, e vice- versa, é dever do medico empregar, o que for mais prompto; em um pl< uriz, em uma pneumonia, quem tratando homoeo- pathicamente empregará no seu doente allopathia ? A promp- tidão da cura, a vantagem da applicação lhe dá toda a pre- ferencia, na chlorose em um doente escrophuloso, quem não applicará os tônicos, as preparações de ferro da allo- pathia ? Não queremos com isto dizer, que promiscua- mente se confundão, porém separadamente, que razão ha para o contrario? Tem alguns médicos clamado contra isto, e nós temos sido uma das victimas desse injusto pro- ceder, mas não nos arrependemos, e havemos de prosse- guir, a posteridade nos julgará. Pelo que diz respeito a humanidade parece-nos, que nada é mais justo, do que ter um medico á sua disposição todos os recursos, que offerece a grande arte de curar : e pelo lado de sua dignidade não compreendemos, que desar pôde um medico ter em dizer, que applica a homoeopathia e allopathia. Acreditamos que de boa fé ninguém hoje dirá que o systema de Hahnemann é uma burla; muitos médicos não o seguem, disso estamos convencidos, a razão desse proceder elles daráõ perante Deos e sua consciên- cia. (1) Não teráõ por ventura estes médicos encontrado (1) Praza aos céos que tivéssemos tantos momentos de prazer, quantos aquelles, que os médicos conhecendo a insufficiencia dos meios que applicão desejão recorrer ao outro, mais que não o fazem por um mal entendido orgulho, sendo muitas vezes a causa d'aquillo, que evi- tarião com seu sangue, se fosse possível. — 64 - ás vezes obstáculos no tratamento antigo, já devidos a certas disposições e ediosincrasia dos doentes, já a sua idade etc. ? Nós as tivemos, e hoje nos é de grande auxi- lio o novo systema. Também fomos daquelles, que negarão a utilidade da homoeopathia, não a abraçamos, logo que nos chegou ao co- nhecimento, estudamol-a com vontade de acertar, leva- mos tempo, praticamos, e depois que por estes meios chegamos ao conhecimento de sua utilidade, a abraçamos. E quem nos quererá convencer, que a homoeopathia não cura, quando todos os dias obtemos a prova irrefragavel de suas vantagens? Aquillo que vemos e meditamos, que com o maior escrúpulo e consciência observamos, pôde ser des- mentido enegado por palavras e argumentações? De certo que não. Que importa, que a dialética appareça em sua grandeza, quando com toda a sublimidade de seus argu- mentos, não destroe a valente argumentação dos factos positivos ? Negar esta verdade é desconhecer centenares de milhões de factos, que todos os dias a pratica e a expe- riência demonstrão, isto que levamos dito a respeito de uma, tem referencia a outra, não negamos as suas vanta- gens, e reconhecemos os factos. Concedemos, que homens enthusiasmados tenhão avan- çado proposições exageradas, porém isso é devido em grande parte ao nenhum methodo, que se tem seguido na contestação dos princípios do systema ; a maneira obs- tinada, com que se nega, e se deprime não só ao systema, como os homens, que o pralicão. Nada com effeito mais revolta ao espirito humano, do que negar-se a verdade reconhecida por tal: esta maneira de argumentar tem sido o movei para a grande copia de des- gostos dos homens, e tropeços para a sciencia. O novo sys- tema não é, nem pôde ainda ser perfeito, como alguns no fogo da discussão tem avançado; o pouco tempo de sua existência, as difficuldades e embaraços, que tem encon- trado para sua manifestação, são obstáculos impostos á seu engradecimento. Se o antigo systema, que conta milhares de annos não preenche immensidade de vezes as vistas do pratico, como poderá um que apenas vai contando meio século, do qual quasi metade esteve desconhecido e com seu author em Anhalt-Koethen. onde viveu como em captiveiro debaixo da protecção do duque Fernan- do ? tal é a fragilidade humana! o homem é perseguido, porque apresenta ao mundo, á humanidade mais um meio de salva-la, o que dirão os nossos vindouros? o mesmo que hoje dizemos dos perseguidores de Jener, dos sábios da França que responderão a Napoleão, que Fulton sonhava, quando dizia ter descuberto o vapor: parece ser da natu- resa das verdades, que ellas não progridão sem o obstáculo e reprovação dos sábios, uma só não existe, principiando por aquella propagada pelo próprio salvador do mundo, que não tenha soffrido a reprovação dos doutos, e portanto não admira que o mesmo aconteça a homoeopathia. Conhe- cemos muitos médicos, que a seguem exclusivamente, e dizem, que nella encontrão todos os recursos, não temos sido tão feliz, algumas vezes nos tem ella falhado, e nos temos valido do antigo. Não duvidamos, que o deffeito seja somente nosso, porém em quanto assim acontecer, não ces- saremos de repetir, que por ora a homceopalhia nao preen- che (para nós) todas as indicações da medicina, e portanto lançaremos mão de um ou de outro segundo a utilidade, eom que se apresentar. Não duvidamos de exclusivamente a seguir, quando ella se nos mostre vantajosa e prompta em todos os casos. A nossa maneira de pensar chamão os médicos exclusivistas repugnante, porque dizem, que os systemas se repellem; não os comprehendemos, e ignora- mos, se a faculdade de perceber é susceptível de repulsão, pela afirmativa então concedemos a impossibilidade da pra- tica dos dous systemas, mas como não é possível um tal pensamento, não podemos dar incompatibilidade do me- dico na applicação dos dous systemas, com tanto que não faça uso promiscuo dos medicamentos preparados se- gundo os preceitos de um e outro. Nisto não receiamos de estar em erro, a nossa consciência é o verdadeiro movei de nosso proceder; entendemos que assim preenchemos os deveres de medico, e vamos de accordo com os princípios de honra e dignidade, que deve caracterisar o homem pro- fessional. Somos partidários da regeneração medica, a creditamos mesmo, que a homcepathia seja um passo para ella, e isto ja — 66 — foi reconhecido pelo grande congresso de Strasbourg onde se reunirão os sábios e grandes médicos da Franca e Alle- manha ; no seio da faculdade sob a Presidência do professor Forget foi proclamada a necessidade de estudar os medi- camentos no homen são : e mesmo a nossa Imperial Aca- demia de Medicina do Rio de Janeiro o reconheceo apro- vando a memória do Sr. Dr.Laílemant tendo por tituloEpis- tolam de prbgressibus in arte medica apud Germanos hoc trienniofacti$,m qual o Sr. Dr. Lallemant na segunda parte prova, que foi um resultado do aperfeiçoamento da sciencia e apparecimento da homoeopathia &c. e na terceira parte prova, que dos debates havidos entre os homoeopathas o allopathas resultou para sciencia o conhecimento da acção dos medicamentos e sua simplificação &c. (1) Por tanto a Imperial Academia do Rio de Janeiro aprovando a memória do Sr. Lallemant, no parecer da qual o Sr. Dr. Rego como relator não reprova um só dos seus pensamentos, e assim também á Academia, aceitarão as suas opiniões e justifi- carão, que a homoeopathia é um augmento da sciencia, da qual se tem tirado resultados, e descoberto verdades, que a outra com dous mil annos nunca poude alcançar. Ainda o Sr. Dr. Rego como relator da memória do Sr. Dr. Feital deo uma prova do quanto não é para despresar a homoe- palhia, reprovando em muitos pontos as proposições e combatendo as argumentações, com queaquelle Sr. procu- rava deprimir c redicularisar ao novo systema, o qual para seo engrandecimento só precisa de tempo e preserve- rança, dedicação e estudo pois que quanto a outra já podemos estar descansado, que explorado sempre no mesmo campo, um alluvíão de systemas tem nascido, os quaes nada aug- mentando, vão morrendo no nascedoro, a homoeopathia, que pareceo ser um destes partos vai a 50 annos progre- dindo, e todos os dias parece aperfeiçoar-se, pela utilidade, quevae manifestando, apezar dos exforços d'aquelles que a tem atassalhado, porem não abalhão os factos, que (1) Hoje o Sr. Dr. Lallemant tudo nega a homoeopathia, talvez até aquillo mesmo que escreveo; é com facilidade que o Sr. Dr. muda de opiniões! são os argumentos mais fortes, apresentados pelos seus adeptos; por tanto já que a dous mil annos trilhamos na mesma estrada sem podermos chegar ao porto de sal- vação, uma vez que se nos offerece um outro caminho cumpre que seja explorado; para isto é que desejávamos ver concorrer todos os médicos dignos desse nome, os ver- dadeiros amigos da humanidade, e assim estudada e averi- guada adopte-se a homoeopathia, no que for útil, assim como allopathia,e desprese o inútil de ambas. Terminamos estas reflexões pedindo disculpa de ter por algum tempo distraído com uma questão alheia ao nosso objecto, e entramos na descripção do tratamento por nós seguido na epidemia de febre amarella, que grassou no- Ceará. O systema homceopathico foi sempre aquelle por nós preferido, quando tínhamos de prestar cuidados a alguns doente, porem algumas vezes sahimos desse propósito por circunstancia peculiares. Na maioria dos casos foi sempre o aconito o primeiro medicamento, de que fasiamos uso, quer em tintura (5.a attenuação), quer em glóbulos forma mais geral, que em- pregamos. (1) Deitávamos em um copo tantos glóbulos, quantas as colheres d'agua, que pretendíamos applicar, e fazíamos o doente tomar uma colher de hora em hora, se a febre era intensa, e havião grandes dores de cabeça, e aridez da pelle: algumas vezes applicamos de meia em meia hora seos symptomas erão muito intensos, enão apparecia a transpiração nas primeiras horas. Depois de algumas co- lheres desse medicamento, as vezes logo nas primeiras, uma diaphorcse notável se apresentava, sem mesmo ter pre- cedido aos cobertores, opulso tornava-se mais desenvolvido, a temperatura do corpe se elevava, c não poucas vezes todos os symptomas se exacerbavão, porém longe de pro- longar-se este estado, não passava de uma reacção passa- ra A experiência tem demonstrado, que os glóbulos tem acçao nron Pta e mesmo superior ás imturas, nos Paizes cuja temperatura e sècéa sem dTi vida porçue não os altera, e como o Ceará está neste caso, rSo'attribuunos as vantagens, que sempre tiramosdos glóbulos, nao duvidando, que fossem impotentas algumas vezes. — 68 — geira, eosencommodos deminuindo pouco e pouco, a mo- léstia era debellada por este único medicamento em 8, 12, e 24 horas. Algumas vezes aconteceo. que o doente tomando o aco- nito por 24 horas, nem por isso era a molestia combatida, não obstante ter apparecido alguma diaphorese (transpi- ração) Neste caso recorríamos ou a tintura, se a febre ainda era forte, e intensos os soffrimentos da cabeça &c. se porem tinha ella alguma cousa declinado administrávamos o argentum nitricum, uma colher de 5 em 5 horas, e com este precioso medicamento raro foi o doente, em quem uma diaphorese franca não tivesse lugar, e a febre não desappa- recesse completamente, e com ella os mais encom- modos. O Sr. Dr. Marcos nos dice ter tirado os mais bellos resultado da applicação desse medicamento logo no prin- cipio da molestia, ena maioria dos casos conseguia abortar o mal; nós praticamos a mesma cousa, porem não sendo tão feliz, e muito confiando no aconito, preferíamos sempre estes nas primeiras applicações reservando os outros para quando nos faltava a sua acção, e então era o argentum, que empregávamos, quando outras indicações nos não guiava a outro medicamento. Se em lugar da aridez da pelle, encontrávamos o do- ente com uma transpiração qualquer geral ou parcial, abundante ou pouca, photophobia, ou inflmação nas conjuntivas, dores fortes de cabeça e face congesta então applicavamos a belladona, e usando das mesmas proporções do aconito (um glóbulo para cada colher d'agua) fasiamos o doente tomar uma colher de duas em duas horas, e espaçávamos o tempo a medida , que a febre, e mais encommodos deminuião. Rara vezes quando os symptomas deste medicamento tornavão necessária a sua applicação, recorria-se a outro ;' por si só ordinariamente combatia a molestia, pois que delle lançávamos mão, quando no final do mal combatido por outro qualquer, continuavão as dores de cabeça &c. symptoma este, que muitas vezes durava por algum tempo nao obstante o desapparecimento dos outros. Porem por assim fallarmos da belladona não segue-se. que apparc- — 69 — cendo outros symptomas, que indicavão a administração de outros remédios, deixassem elles de serem applicados. Um dos symptomas que algumas vezes persistia nos do- entes mesmo depois de concluída a febre erão as dores pelo corpo, pernas &c. para isto nada foi mais útil, do que uma só dose ( 3 glóbulos para duas colheres d'agua ) de bryonia. Um dos medicamentos, que se nos apresentou mui útil, e quasi sempre vantajoso nas crianças, foi o sambugus ; este medicamento, cujas proporções ainda forão as do aco- nito, era indicado quando a temperatura do corpo muito elevada, não coincidia com a freqüência do pulso : ainda era a diaphorese a crise, por que se terminava a febre com este medicamento. Foi quase o único remédio, que appli- camos as crianças,, mas isto não era obstante, para que algumas vezes recorrêssemos a outros, quando indicações se apresentavão para sua administração. A pulsatilla foi um remédio sempre útil quando no correr da molestia apparecia o fluxo catamenial (mens- truação); depois de combatida a força da febre com alguns dos medicamentos indicados, aconito, belladona, sambugus &c. persistia pezo ou mesmo dor de cabeça, cadeiras, pernas, e sobre tudo se o aparelho urinario soffria, uma só dose de pulsatilla em geral dissipava todos estes sof- frimentos. Não poucas vezes os vômitos, que acompanhavão o appa- recimento da febre continuavão até depois de ter ella de- sapparecido, ou então não tendo o doente apresentado o vomito no principio da molestia, depois de declinados todos os soífrimentos elles apparecião : Para este symptoma, o mais incommodativo desta molestia, tínhamos a ipecacüa- nhv, remédio poderoso, que sempre se mostrou enérgico em seus effeitos: muitas vezes o applicamos quando o doente queixava-se de indisposição do estômago com dor, náuseas &c. Nestas occasiões também lançamos mao da nux v com vantagem e proveito manifesto, maxime se os doentes acostumados a sentir incommodos hemorrhoi- daes erão exacerbados pela febre, com essa predominância para soffrimentos de estômago àc. Taes forão os medicamentos, que nos servirão no trata- — 70 — mento da febre amarella em seuprimeiro período; e quando os doentes se submetião a elle sem terem antecedentemente feito applicações impiricas, e mesmo inprudentes foi utile vantajoso obtendo a cura em muito curto tempo, dous mil cento e cincoenta doentes (2:150) forão por nós tratados, esó 58 o forão allopathicamente. Não poucos forão aquelles, para quem fomos chamados, quando os symptomas carac- terísticos do segundo período já se tinhão declarado; de- minuto foi aquelle, dos que chegarão a este período, quando desde o principio soffrerão o tratamento methodico e re- gular da homceopathia. Passando a molestia ao segundo período uma outra serie de medicamentos offerecia se a observação, e sua adminis- tração era reclamada pela enumeração de symptomas, que se apresentavão. Por tanto quer a molestia passasse ao segundo período debaixo de uma medicação methodica e regular, entregue a qualquer tratamento, ou fosse franca ou insidiosamente, e tínhamos de faser applicação de qual quer medicamento, sempre nos guiávamos pela enume- ração de symptomas, que apparecião. Assim se era o vomito sangüíneo, ou de sangue, ainda era a ipecacuanha o nosso predilecto medicamento, o qual não poucas vezes fòi igual- mente vantajoso nos vômitos pardos, e mesmo pretos ; se porém era impotente lançava-mos mão da bryonia, e dávamos uma colher de duas em duas horas. Se em lugar do vomito de sangue, era o preto que logo apparecia administrávamos o argentum nitricum, medica- mento muito recommendado pelo Sr. João Vicente Martins, mas que não nos pareceo tão infallivel, quanto foi procla- mado; algumas vezes nos falhou em occasiões, que nos pa- receo bem homceopathico: antes nos foi muito mais útil no primeiro período da molestia, como já dicemos. Qando o applicava-mos nos vômitos pretos, dávamos uma colher e continuávamos se havia necessidade, do contrario suspendia-o salvo se outros symptomas reclamavão á administração de outros remédios. O argentum nos pareceo mais prompto para combater as dijecções pretas, quando o arsênico não aproveitava. Tivemos um doente, sobre outros, em quem mostrou-se verdadeiramente heróico: este doente em estado desespe- — 71 — rado com face de composta, extremos frios, subdelirio, sendo as dijecções extraordinárias e tal o seu estado, que supondo-se terminados os seos dias fiserão-se todas as disposições para o enterro, demos-lhe o argentum em tin- tura (5.a att.) e tivemos o praser de ver pouco a pouco reanimarem-se suas forças, asdijecções suspenderem-se, e a final restabelecer-se. Nas dijecções pretas e sangüíneas recorríamos em pri- meiro lugar ao arsênico, que não deixou de ser útil; depois passávamos ao argentum; e administramos o veratrum álbum com o melhor resultado em dous casos, que falharão o arsênico e argentum. O nosso amigo o Sr. Dr. Sabino Olegario Ludgero Pinho nos communicou de Pernambuco, que com a bryonia tinha conseguido sempre salvar os seos doentes de vomito preto, acolhendo o seo aviso, com quanto não fossemos sempre feliz, com tudo mais de uma vez tivemos de nos gloriar de seos effeitos. A bryonia se tornava tanto mais recommendada, quanto com os vômitos pretos coincidião grandes dores no estômago e ventre; muitas occasiões tivemos de observar, que a pós a administração de uma colher desse medica- mento as dores deminuião , ou cessavão inteiramente. Ainda é útil este medicamento quando existem dores pelo ventre sem vômitos, e tivemos um doente em quem estas dores coincidião com contrações tetanicas, e foi salvo por esse remédio. Se o estado apopletiphorme caractensava o segundo período usávamos do aconito em tintura, e tive- mSs occasião de applicar com vantagem em dous doentes o arqentum, uma colher de duas cm duas horas mlelis- mente poucos forão os casos de restabelecimento deste es- trados medicamentos mais úteis equasi sempre especi- fico em seus effeitos foi o carvão vegetal ^h^hog^ pela mucosa da boca, e lingua; a china bambem appl camos, porém nos pareceo mais efficaz para as W**™^™™*e era combatida pelocofféa. Quando o doente m»tcafi.c o^e onciado não encontrava lugar, que « «tistecs^uitas vezes foi mitigado e mesmo suspendido «teatoto pelo uso da digüalis, e dávamos uma colher de 2 em 2 horas, __ 72 __ erolalus horridus ainda nos foi de grandes vantagens para combater o delírio, e mesmo a febre no 2.° período. Na convalesencia dos doentes muitas vezes a febre to- mava o caracter intermittente maximé para o fim da epi- demia, usamos com proveito da china, arsênico, sabadilla &c, e se era para combater o estado de debilidade, en- fraquecimento e falta de forças, em que ficava, dávamos a china, o carvão v. o ferro o posphoriacido &c: assim como a ictericia, era victoriosamente combatida pelo mercúrio. Para completar o tratamento das febres devemos dizer que não poucas vezes quer no primeiro, quer no segundo período da febre, quando a constipação do ventre era re- belde mandamos applicar algum clister d'agua morna sim- ples, isto era o mais geral, porém algumas vezes mandamos ajuntar óleo de recino e sal torrado REFLEXÕES. Apresentando o tratamento, que acabamos de descrever e do qual nos servimos na presente epidemia, applicado com mais ou menos modificação segundo as circunstancias, nós temos o maior prazer em assegurar, que elle se nos mostrou útil e vantajoso: sendo a prova de nosso enuncia- do os numerosos factos, que servem de base ás nossas ob- servações. Não é um limitado numero de doentes, que constituo a nossa estatística, e quando tão repetidas provas se offerece de um tratamento, parece haver uma garantia de sobra de sua utilidade e applicação. Dizem alguns médicos, não sabemos com que fundamen- to, que a homoeopathia só cura aquellas moléstias, que entregues aos únicos recursos da natureza, também por si curavão-se. Sem combater esse bello pensamento, sublime pela sua infelicidade, perguntaremos, sem nos occupar com o mais, e somente em relação ao objecto presente, se- rá possível que entre 2,092 (1) doentes, que tratamos, não houvesse um só, que não estivesse nas disposições de ser (1) Hoje pela continuação de nossa clinica é o seo numero de 2,286. — 73 curado pelos únicos esforços da natureza, ao passo, que os outros médicos encontrão de momento a momento casos, que só pela intervenção d'arte se pôde obter a cura com os sudoricos, purgantes, &c. ? Pois nem aquelles doentes, em quem os vômitos pretos, os soluços, as hemorrhagias, as convulções, a apoplexia &c., complicarão a febre, e que forão salvos pela homoeopathia, não se concede a intervenção d'arte ? Se a arte não inter- vém mestes casos assim como nos do primeiro período tra- tados pela homoeopathia, então acabemos com a medicina, e confessemos que tal arte não existe, porque a allopathia também não intervém para curar em casos idênticos. Se os factos apresentados pelos allopathas de curas obtidas pelos escalda-pés, sinapismos, as infusões, cosimentos, &c- ' são valiosas para a sciencia, porque delia emanão estes co- nhecimentos, permitta-se-nos, que quando nao se appli- carem estes agentes, e sim os glóbulos de aconito, bella- dona, sambugus, brijonia, &c, &c, se tenhão como valio- sos para a grande arte de curar, pois que por ella chegou-se ao conhecimento destes agentes para a cura destas e outras moléstias. Admittir uns e outros negar, é um contra senso, que não concedemos, em quem de boa fé meditar. Quasi que é inútil aventurar estas considerações, porque hoie não sabemos se haverá, quem negue a propriedade de curar pelo systema de Hahnemann, por isso d-ellas abs- traindo vamos entrar na enumeração das vantagensque, co- lhemos deste systema. . Todos que tem presenciado uma epidemia conhecem, que a primeira vantagem para combater a molestia capromp- tidão da applicação do remédio. Um dos mais dist.nctos práticos do Rio de Janeiro o nosso illustre mestre o Sr. Dr. Manoel de Valladão Pimentel a este respeito diz: «Em «uma molestia de tão veloz curso, como acabamos de mostrar toda a vantagem do tratamento estava depen- dentedapromptidão/com que era ™*^ « riDio e da energia necessária em relação ao caracter de Cavidade e intensidade de seos symptomas. Uma vez fecorrido o tempo preciso de combatel-a activamente, e deX n°e °os syínpLnas de *™W^£™*£ « tavão todos os recursos da medicina tomai ao se imp — 7í — « tentes. » Portanto vè-se quanto é precioso o tempo, que se perde, quando uma prompta medicação não é applicada, e a isto nada se presta com tanta utilidade como a ho- moeopathia. Munido de uma caixa com os medicamentos próprios percorríamos as casas de nossos doentes, e em continente preparávamos os medicamentos, e os doentes d'elles faziao prompto uso. Nestas occasiões o medico é chamado por onde passa, e que vantagem tão extraordinária nao é aquella de se dar immediatamente o conveniente remédio, que principia logo a produzir o seo effeito ? Em quanto o medico receita, nós preparamos o remédio, e damos, de sorte que ao sairmos da casa do doente, já o deixamos me- dicando-se, pois que para a homoeopathia não se torna mister mais, do que uma vasilha e um pouco d'agua fria e pura, onde se dissolve o medicamento: no entanto que o medico receita, e isto quando na casa encontra os utensí- lios necessários, e não se gasta o precioso tempo em pro- cural-os. Receita o medico, vai o portador para a botica, já o doente tratatado homoeopathicamente usa do remé- dio, a medida, que o outro ainda o vai procurar (per- da de tempo) chega o portador, vai o pharmaceutico pre- parar o remédio, sabe Deos o tempo, que gasta (a molestia vai progredindo) chega o remédio depois de um tempo im- menso da visita do medico, (quando não fica para o dia se- guinte) é que o doente entra em usodoquereceitou-Ihc, e no Ceará onde apenas existem três boticas, o que seria dos boticários e dos doentes especialmente, se não fossem os milhares daquelles, que recorrerão a homoeopathia? Que tempo terião elles para preparar tantos remédios, que lhe fossem receitados? Muitos dias, e isto seguidamente, forão por nós vistos 30 e 40 doentes, fora aquelles que já tínhamos, e de nossa casa sahião centenares de dozes. Pelo que se vô, á applicação dos remédios homoeopathi- cos é mais prompta, poupa um tempo precioso a favor do doente, previne o augmento da molestia, epor conseguinte é esta mais promptamenle debellada. Ainda não parão aqui as vantagens dessa applicação, maximé na pobresa. Todo o Ceará conhece o estado de sua pobresa, habitando em casas de palha, inteiramente arejadas, abertas e sem commodo (uma ou outra o tem) sem aquellas commodida- des, que o tratamento de qualquer molestia exige, muitos só tendo a roupa do corpo, tendo por cama uma rede ou giráo de tallo sem lençol nem cobertores (é uma condição verdadeiramente digna de lastima) não fallando na alimen- tação, que é a mais miserável possível, acontecendo que muitos pobres passão dias sem comer ; mestas condições compreende-se quanto é difficil dirigir um tratamento, e mais difficil ó aquelle que, como na epidemia actual, torna necessário certas comodidades. Todos sabem que os suado- res são os primeiros remédios, que se applicão mesta moles- tia, ora como dar um suador a um doente, que por toda a cobertura só tem a roupa no corpo ! e depois esse suador, que é forçado pelas bebidas quentes, quanto não é perigoso dado em um lugar onde ha vento constante e desabrido ? Além disto um vomitorio, um purgante quantas vezes não tem sido antes prejudicial, que útil pela falta dos commo- dos próprios á sua applicação? No entanto que observamos na applicação dos remédios homoeopathicos? Não ha du- vida, que quando se apresentão as commodidades próprias dos tratamentos, são estes muito mais regulares, e vanta- josos, porém quando não, nem por isso se apresentão os inconvenientes, que offerece o outro systema. Assim a transpiração provocada por esse trabalho suave da natu- resa, independente de cobertores (aliás necessários), e ou- tros agentes produtores da transpiração forçada, tinha lugar sem risco, ainda que o doente não estivesse perfeita- mente agasalhado ; e assim vimos centenares de doentes se curarem em miseráveis choupanas de palha, a mercê de uma alimentação incompleta e irregular, ao tempo e sem cautella alguma do seo estado. Na qnalidade de medico da pobresa, da província tratamos a todos os pobres, quer da Capital, quer de Aracaty, S. Rernardo e Sobral pelo systema homeeopathico, (1) á todos demos remédios, e a estatística fl) O Illm. Sr. Dr. Joaquim Marcos d'Almeida Rego no relatório com que abrio a Assembléa provincial do Ceará em 1851 na qualidade de Presidente da província assim se exprime tratando dos médicos —sao dignos dos maioresencomios por sua solicitude, zelo e dedicação pela falia bastante alto em favor do tratamanlo, principalmente quando se attende, que estes doentes privados de todos os commodos da vida, não podem ter um tratamento re- gular e vantajoso, como aquelle que dispondo de meios pôde ter á sua disposição tudo quanto é conveninte e salu- tar a vida. Uma das maiores provas e grande vantagem do trata- mento homoeopathico é manifestada pela conversão de três distinctos médicos nesta província. Na capital o Sr. Dr. Marcos José Theophilo não sendo indifferenle aos effeitos manifestados pelos remédios ho- moeopathicos, abraçou o systema, e tirou grandes vanta- gens dessa applicação. Em Sobral o Sr. Dr. João Fran- cisco de Lima, medico respeitável por seos conhecimentos, dando até então pouca ou nenhuma importância ao novo systema, não pode desconhecer as vantagens e effeitos dos medicamentos, applicou na febre e trata de estudar o sys- tema a fundo, aacquisição que a homceopathia fez na pes- soa do Sr. Dr. Lima, é muito importante, e nós nos glo- riamos bastante de ter para ella concorrido: o Sr. Dr. Antônio Domingues da Silva ainda é umaacquisição, que a homceopathia teve em virtude do reconhecimento da acção dos seos medicamentos, e é bastante importante : portanto a homoeopathia ostentou-se garbosa em todas as partes onde appareceo, e fez curvar a razão aos gênios obstinados, sorte dos Cearenses, que lutarão com taes epidemias, seos horrores e conseqüências ; não devendo omiltir que o Dr. Carreira tratara a maior parte (*) da pabreza pelo systema homoeopathico fornecendo os medi- camentos á sua custa, a que nunca se recusou, ainda mesmo durante o tempo em que foi acommettido do mal. —O Exm. Sr. Dr. Rego queé medico, e medico allopatha não é suspeito n'esta causa, era clie presi- dente e nós empregado publico, se não conhecesse a vantagem podia mandar suspender o tratamento, que applicavamos, porém longe disto, elle nos elogia em seo relatório. Nossos serviços ficarão plantados no co- ração da pobreza reconhecida, e esta é a maior recompensa, que pôde aspirar um medico, é o que nos saptisfaz e nos orgulha. (*) Certamente S. Exc. foi mal informado, não tratamos a maior par- te, foi toda a pobreza ; para a botica não foi uma só receita nossa, de- safiamos a quem queira mostrar. (Nota do Author.) L. C. C. — 77 — porém de boa fé, que reconhecem os factos, e não os nega apesar de tudo. Passemos agora a dar algumas idéas acerca do trata- mento allopathico appíicado á alguns dos nossos doentes. Cincoenta e oito apenas forão aquelles, a quem appli- camos esse tratamento; irelle seguimos pontualmente o aconselhado pelo nosso collega o Sr. Dr. Rego em sua obra. Os sudorificos sendo de preferencia applicada a tintura de aconito, as infusões de flores de borragem, espirito de Minderere, vinho deantimonio, ou o cosimento anti-phlo- gistico de Stoll, tendo precedido aosescalda-pés, &c. taes erão as applicações, que fazíamos. Se a febre prolongava- se dávamos a mistura salina simples feita em cosimento de flores de borragem, e continuávamos com o cosimento de Stoll, tintura ou extrato deaconitu com água, &c, &c. Se apparecião os vômitos e a molestia passava ao segundo período recorríamos á água de alface com elexir pare- gorico de Londinense, a poeção calmante com água de louro cereja ; as pílulas de ópio, as applicaçõos ethcreas nos so- luços, vômitos &c, as limonadas purgativas e mesmos pur- gantes maximé na terminação da molestia, quer no pri- meiro, quer no segundo período; usamos d'agua ingleza, das pílulas marciaes quando o estado adinamico apparecia &c. Porém as repetidas vantagensdas applicações homoeo- pathicas fasião com que, quando em algum dos nossos do- entes se prolongavão os solfrimentos, ereceiavamos a pas- sagem para o seguudo período, empregávamos todos os meios persuasorios, o muitas vezes conseguimos mudar o tratamento, assim aconteceo com o Sr. M. J. Pereira Pacheco e outros já em segundo período; porém infehs- mente nem sempre fomos attendidos, ou quando o éramos já o estado não permetia mais esperança, e assim impo- tente vimos sucumbir dous doentes, que tínhamos o maior interesse em salvar, os Srs. João Luiz e Carlos Fehppe Ribeiro de Miranda ambos do Aracaty. Cumpre diser, que no Aracaty foi onde nos vimos quasi forçados a applicar allo- pathia, pois que no Ceará, ondehavião outros médicos, ja todos sabião, que quem não se queria medicar pela homceo- pathia, procurava outro. Nestes dous Sr. seguimos o tia- — 78 — lamento aconselhado no todo pelo Sr. Dr. Rego e tivemos o desgosto de os ver sucumbir. Não queremos com isto desmerecer o tratamento recom- mendado pelos distinctos práticos, porém tendo-nos habitua- do a observação do outro, consagramo-lhes mais confiança, maximé no tratamento da epidemia da febre amarella. No primeiro período foi prompto, e só a homceopathia o ex- cedeona vantagem, com que era applicada, que não é pouca, na promptidão do effeito e na facilidade de tomar os re- médios, o que sem duvida é incalculável, maximé nas cri- anças éíc. e no mais que fica dito, cuja repitição seria fastidioso. Não aplicamos o tartaro senão duas vezes em lavagem (1 grão para uma libra de infusão de folhas de laranjeira) e isto como diaphoretico; jamais seguimos o uso dos vo- mitorios, que afinal tornou-se em pernicioso abuso. Sendo proclamada a sua vantagem pelos médicos, pela facilidade, com que se obtinha um tal remédio, o povo se entregou a elle sem regra e preceito, e houverão doentes, que tomarão 2 e 3 Os vomitorios no principio da epidemia forão em- pregados com vantagem, ou ainda quando as indicações erão manifestas, d'elle se usava nas primeiras 24 horas; porém entregue ao demônio do vulgo, elle que não apre- ciava as indicações julgava-o conveniente em toda e qualquer occasião, e assim longe de faserem delle primeira applicação, lançavão mão de outros remédios, e quando no fim de 3, 4 eSdiasnãoobtinhão decrecimento do mal, oqual muitas vezes já tinha passado ao segundo período, é quando re- corrião ao vomitorio!.. Ora mestas circunstancias todo o medico prevê qual seria o resultado de tão útil applicação; muitas e muitas vezes encontramos 2, 4 e 6 muribundos, victimas desse salutar remédio, e quando clamamos, que os médicos tomassem em consideração esse proceder, sem duvida devido a imprudência das vantagens, que procla- marão dessa panacea sublime, longe de merecer sua atten- ção, o que disiamos, persistio-se em declarar o erro, e assacar-nos insultos e infâmias, que despresamos, por quehaactos, que para logo caracterisão seus authores ; mas nós que não tínhamos em vistas senão o bem da humanidade, cotinuamus, esenliinos, que só fossem conhecidas as nossas — 79 — reflexões pela triste experiência dos factos, os vomitorios fmão se desacreditando, e se bem que tarde, quasi desap- parecerão; porém foi grande a vantagem, que tiramos de nossa persistência, porque se foi tarde para a Capital o conhecimento da acção maléfica dos vomitorios, não dados a propósito, aproveitarão os outros lugares, onde appa- receo a febre; assim vimos no Aracaty elle pouco usado, em S. Bernardo quasi nada, no Icó pouco, em Sobral nem ouvimos fallar &c. &c, e compare-se a mortalidade desses lugares, ceteris paribus, com a da Capital e conhecer se ha, que uma causa iníluio para o acréscimo da ul- tima. Para terminar-mos, o que temos a diser acerca do tra- tamento, resta-nos aventurar algumas palavras a respeito do tratamento vulgar, a que se entregou talvez dous terços da população afiectada da febre, pois que nem era possível, que toda recebesse os cuidados da medicina proffessional, quando só três médicos existião na Capital, e por fora um, e as vezes, nem um, e por isso uma medicação caseira e geral foi adoptada, e que sempre foi feliz, quando a mo- lestia não passou do primeiro período. Entre as substancias, que servião messe tratamento, erão de applicação geral e de reconhecida utilidade a in- fusão ou cosimento de raiz de angélica, ipecacuanha: a quina não poucas vezes foi louvada : estas applicações fasião desde o principio da febre até seo desapparecimento, no fim tomavão um purgante; e se apparecia dores pelo es- tômago e vômitos, davão a infusão de macella do campo, ou de pluma. A ictericia era combatida com a raiz de camapum, muçambê &c. . De muitos tratamentos extravagantes estão cheios.os annaes da medicina vulgar, e assim de cada lado se ouvira a historia de um tratamento impirico e extravagante, um curado com uma bebedeira de aguardente, outro com pon- che de viuagre, de vinho &c. vimos dous meninos em bo- bral, que disserão os Pais ter tido vomito preto epararao, e restabelecerão-se com água de sal commum, bebida em grandes porções; e outras muitas historias que nao se- íindo para a sciencia terminaremos esse artigo com a su- cinta exposição das - 80 — DIETAS. O doente durante o período da febre tinha dieta abso- luta, apenas tomava o remédio e água; logo que ella se extinguia principiava a usar de caldos simples de arroz, ou mesmo galinha ; o estômago se habituava a essa alimen- tação e os doentes quando queixavão-se de grandedebilidade principiavão a usar de canja de arroz, ao principio simples depois com galinha, frango &c, entravão a usar destas carnes do oitavo dia em diante, as vezes antes, se as circuns- tancias o permittião, ordinariamente não usavão de pirão se não no fim de 15 dias; porem estas regras não forão invariáveis, dependeo das disposições do doente; muitos vimos nós ao quarto dia lançarem mão de toda alimentação e não lhe fazer mal; porém o que é verdade, é, que a falta de cautellas necessárias na dieta e alimentação se deve a grande mortalidade, que houve na febre. Terminando o nosso trabalho bem conhecemos a sua imperfeição, porém animado pelos desejos de prestar-mos algum serviço a medicina do nosso Paiz, de bom grado e resignação nos submetemos a censura, que sendo dos doutos receberemos com praser, e nos submeteremos aos seos preceitos; dos críticosedaquelles, que nada fasendo, julgão-se habilitados para tudo redicularisarem, a estes perguntaremos, pelo que tem feito e onde se achão as ma- ravilhas de suas sublimes producções ? aquelles pedimos des- culpa e bemvolencia, a estes nem satisfação. (££gcB ffiBB Estatística do hospital regimental dirigido pelo Sr. Dr. José Lourenço de Castro Silva medico allopatha. Entrarão para o hospital................................ 171 Destes: Restabelecerão-se....................... 1W Morrerão............................. ^ Mortalidade de 10 por „r* em um estabelecimento onde ha todas as commodidades. Estatística do Dr. Liberato de Castro Carreira. CLINICA CNBANA NA CAPITAI.. Homens Mulheres.......................... Destes : Restabelecerão-se....................... 6*?°. 315 358.......... «73 Morrerão. Não completou o tratamento............. Mortalidade de 2 por -7. medicação homteopathica, tratamento re- ;uíar toda a commodidade dos doentes. CLIMCA DA POBREZA NA CAPITAL, ___ 360 Homens........................ ,^ >'....... 855 Mnlheres,.......................;..... — 82 Destes: Restabelecei ão-sc....................... 786 Ignoro o resultado...................... 48 Morrerão............................. 21 Mortalidade menor de 3 por „;° entre os mortos e restabelecidos, des- presada a cifra dos ignorados: tratamento homoeopathico solTrendo os doentes muitas privações. Estatística do mesmo na Cidade do Aracaty e S. Bernardo clinica URBANA. Homens.............................. 73 Mulheres.............................. 66........ 139 Destes: Restabelecerão-se.................132 Morrerão..................... 7 Mortalidade de 5 por 0;° tratamento homoeopathico e regular, com toda a commodidade dos doentes. clinica da pobreza nos mesmos lugares. Homens......................l&l Mulheres..............,......181........ 322 Destes: Restabelecerão-se................283 Morrerão..................... lZl Ignoro o resultado................ 25 Mortalidade de 5 por „f tratamerito homoeopatico e soffrendo os doentes privações. Estatística do mesmo na Cidade de Sobral. Homens...........................___ 62 Mulheres......................•.......- 79.......... 1A1 Destes: Restabelecerão-se..........•..-..•........ 136 Morrerão.............................. 5 — 83 — Mortalidade menos de h por 0?° tratamento homceopathico c regular, josando os doentes de toda a commodidade. Estatística do mesmo no hospital de Caridade. Homens............................... 8 Mulheres.............................. 12 Destes: Restabelecerão-se....................... 17 Morrerão.............................. ,5 Para este estabelecimento, que o governo com tão boas disposições apromptou para a pobreza, não entrarão senão aquelles, aquém a policia recolhia por achalos de todo abandonado o que acontecia quasi sempre quando a molestia já muito adiantada pouca esperança dava de vida. Estatística allopathica. Homens.............................. «,_ Mulheres............................. Destes: 5° Restabeleccrao-se....................... £ Morrerão............................. Mortalidade de 12 por X tratamento allopathico, gosando os doente* de toda a comodidade. Resumo da estatística do Dr. Liberato de Castro Carreira. 959 Homens...............................^ ^ j .......... 2150 Mulheres.............................. Destes: .......2014 Restabelecerao-se............... 7i Ignoro o resultado de.............• • • • 62 Morrerão.......................... Jactos, 12 — 84 — De vomilos pretos--- hí » » de sangue 17 » hemorrhagia 22 » apoplexia 18 » dejecções pretas.. 20 » convulções...... 5 Tiphoides....... 18 Casos graves....... 136 escaparão.. .. 18 e morrerão.. .. 22 » 13 » k » 18 » k d h » l/l » 12 d 8 n 3 d 2 » 10 » 8 » 81 » 55 Os outros 7 doentes tiverão uma terminação, que não foi bem veri- ficada. A. JB. Quando íascmos a distinção dos differentes estados, que ca- racterisarão a molestia n'estes doentes, não queremos dizer, por exem- plo, que o doente só teve vomito preto, hemorrhagia, convulção &c. queremos significar, que tendo a moléstia percorrido seo primeiro período, ievestio-se dos caracteres do segundo, presidindo sobre elles qualquer Tim dos symptomas indicados : e nem isto é novo, parece-nos, que não haverá medico, que fasendo a resenha dos seus doentes não tenha dito ou diga, que teve tantos de vomito preto, tantos de hemorrhagia &c, &c. sem que com isso queira diser, que o seo doente só teve vomito preto ou hemorrhagia, desde a invasão da molestia e sem ser acompanhado de nenhum outro symptoma. Quasi sempre apezar da predominância de um destes symptomas, coincidião outros do mesmo período, isto é, por exemplo com o vomito preto apparecia o soluço a hemorrhagia, ou o delírio, a convulção &c. &c. Sentimos que os collegas a quem pedimos suas [estatísticas não nos remettesse, e assim apresentando só a nossa ficamos privado de apreciar o trabalho dos collegas; colhemos as observações do Hospital militar nas pessas officiaes remetidas ao Governo, era tudo quanto con- tava deste gênero na secretaria. Estatística mortuaria de todos os lugares onde appareceo a febre amarella na Província do CEARÁ. Calcula-se o numero das pessoas affectadas da febre amarella nos differentes lugares da Província em 28:Zi90 pessoas, das quaes morrerão 919 distribuídas da maneira seguinte. CAPITAL. i.^kula se o numero das pessoas affectadas em 8000 — 8o — Destas morrerão. Homens............................... 98 \ Meninos............................... 93... 151 f <>,., Mulheres.............................. 58 ----01 Meninas............................... 52... 1107 AQUIRAZ. Calculão-se os affectados cm.............................. 250 Destes morrerão. Homens............................... 13 ", Meninos................................ 0... 13 f t>1 Mulheres............................... 6 ^" Meninas............................... '-... 8 SOURE. Calculão-se os affectados cm.....................•....... 20° Destes morrerão. Não dcrão designação de sexo &x. c forão................. i6 MARAUGUAPE Calculão-sc os affectados cm......................... Destes morrerão. 1300 Homens. Meninos Mulheres Meninas. 15---- 55f....89 21 l. 13.... 3'|,' Estatística moriuaria dos differentes lugares. CASCAVEL Calcula-se on." dos affectados em.......... Destes mouei^'. 550 — «S(i — Homens................... 15 \ Meninos................... 5. . . 201 ^ Mulheres.................. 5 í Meninas................... 1 . . G) ARACATY. Calcula-se o n.° dos affectados em............. 6:000 Destes morrerão. Homens................... 31 \ Meninos.................. 32. . . 63 ( OT ■< W 3 J -t; c« = a o < 9,000 200 250 11,360 580 1,200 * 700 700 6,000 6,000 6,500 61,600 28,690 w 2 261 16 21 89 26 120 32 29 99 92 126 909 Dr. Liberato de Castro Carreira. Mappa demonstrativo dos doentes tratados peloDr. L. de Castro Carreira em sua clinica urbana. Doentes de Febre amarella . Febre gástrica . Febre intermittente Ophtalmia. . , Sarampos. . . 1:167 953 112 96 86 — 89 — Bronchücs............... 68 Angina...... ... . . . ... . ■ . 66 Acesso........ . . . ....... . . 32 Gastroses................ 30 Flactuosidades............... 28 Gastros interites.............. 28 Gastrites................ 20 tracturas............... . 20 Pleuris................ 19 Feridas................ 18 Aslhma................ 18 llheumatismo.............. 18 Amenorrhea............... 16 Desenteria............... 16 Otites................. 16 Constipação............... 11 Erysipella................ 10 Indigestão................ 10 Blenorrhagia. . . ............. 10 Colites................. 9 Bubão venereo.............. 9 Syphilis................ 9 Phtysica................ 9 Spasmos................ 8 Cephalagia............... y Diarrhea.............. • 8 Hepatites................ 8 Interites................ j* Pneumonia.............> • ' Alienação mental............. 7 Sarnas........:........ ' Hemoptyse................ Metrites................ 6 Vermes................ Ulceras ........ :.,..,.. Hemorrhagias.............. Colicas ulerinas.............. o Cancros ................ j? Coryza........•....... ^ Convulções.........•..... v Cancros venereos................ o Congestão cerebral............. ^ Dartros................ \ Tumores internos............ . . Erupção de pelle............... Scorbuto............ ^ Metrorrhagia. ............ ^ Anemia............ f Hemorrhoides.......... ,( Gangrena............. Apoplexia Leucorrhea Cataporas Zoster Febre peurperal Diabetes Histerismo Orchites Anasarca Coqueluxe Palpitação do coração Contusão Nervralgia Croup Octorrea Tétano (holerina Epistaxis Envenenamento Carie Gastro-hepatites Pleuro-penenmonia Hérnia Hemoptyse Clorose Manomania Pleurodinia Sciatica Emfisema Exofagites Scirro do utero Tico doloroso Fungus Peritoniles Melena Pericardite Vol vulos Glossites Artrites Extretamento de uretra Afonia Aneurisma Hidro-pericaidetes Nefrites Stomatites Apoplexia pul Mielites Ao todo — 91 Doentes por mim tratados de differentes moléstias de 1865 á 1852 2:676 Pobres tratados no mesmo tempo ........ 3:336 5:810 Destes doentes morrerão. Clinica civil ..............« 75 Dito da pobreza . . . ^.......... 129 270 Comprehende n'este algarismo o numero de 2:366 doentes de febre amarella; porém não o de 106 operações, como se demonstra no se- guinte quadro estatístico. Operações Cirúrgicas praticadas pelo Dr. L. de Castro Carreira cm sua clinica civil e da pobreza no Ceará. Paracentheses............... | Extração de tumores glandulares........ ® Extração de tumores cancrosos......... ° Extração de tumores carcinomatosos....... » Amputação da coixa............ . Amputação da perna............ . Amputação do braço............ . Operação da catarata............ . Trichiases.............. Amputação do penis............ 3 Amputação do dedo ...'••••••• 3 Abertura da hymem........... 3 Polypo nasal............... 3 Extração de temores elephantiacos........ 2 \blacão da glândula mamaria........ 4 Ablacão de tumores fungosos......... 2 Paracenthese dorhydrocelles.......... 4 Ligadura da braquial.......... , Pupilla artificial........... ± Carnosidade da uretra.......... Operações de obsterticia. Extração de criança pelo forceps _........ 6 Extração a mão sendo feita a versão...... 22 Extração de placenta a mão.....• • • ______ 106 .... 5:810 Doentes tratados ...•>••• ------- .... 5:916 Total • • • • ■■•*** Dr. Castro Carreira. Bio de Janeiro. — 1853. — Typ. de Vianna Júnior, rua d'Ajuda n. 79. EneontrSo-se no correr desta obra erros typograplucos, que a primeira vista seráõ reconhecidos pelo leitor como taes; como porém não ouve tempo para a correcçao pe- dimos desculpa desta falta. y ei '■10* tO ,-*, { /•• **l ,. í»i ♦J tjfc