/vop ss. MEDICINA CURATIVA £J ou O METHODO PURGANTE DIRIGIDO CONTRA A CAUSA DAS ENFERMIDADES, E ANALISADA NESTA OBRA POR LE ROY, Lcui* i»# Cirurgião Consultante* TRADUZIDA DO FRANCEZ. Avec sa Curative, 0,1 yp£t avoir son Medicin chez soi. RIO DE JANEIRO. NA TYPOGRAFIA NACIONAL. 1825. WBC , / III ADVERTÊNCIA DO TRADUCTOR. XXPezar de que o author queira absolutamente que o seu systema seja tão evidente, e tão fá- cil, que esteja ao alcance de qualquer empre- gar o seu methodo; e que mesmo chama a sua Medicina Curativa, Medicina popular; comtudo deve-se attender que o vasto e difncultoso ob- jecto da Medicina, o homem, exige grandes co-" nhecimentos , tanto por se conhecer seu estado physiologico nas differentes idades da vida, e relativo aos seus differentes temperamentos , cir- cunstancias , climas , &c. como para se conhecer no estado pathologico, isto lie, de enfermidade tão susceptível de modificações e differenças pe- las mesmas circunstancias dos indivíduos, ainda que seja a mesma emquanto á sua natureza, mas que obra differentemente, e por isso quando são differentes os reagentes, isto he, o grão maior, ou menor de actividade, ou fraqueza das propriedades vitaes dos individuos. Portanto he conseqüente , e prudente que, sendo este hum systema, não geralmente adoptado segundo os meios Médicos , até agora usados, e segundo os conhecimentos recebidos , e não sendo indifferente ■a applicação deste methodo em casos delicados e arriscados, o que pode muitas vezes accontecer, e compronaetter tanto a vida do indivíduo, como a reputação do remédio , não deve qualquer em- prega-lo setn direcção de pessoa, que professe a Arte de curar, ou que taes conhecimentos te- nha. E quando o author no decurso desta obra explica, e aponta as circunstancias, em que varia a applicação de tal ou tal gráo dos seus pur- gantes , e vomitorios-purgantes, isto he, se- gundo a natureza, estado, adiantamento da en- * ü 415433 rr fermidade, segundo o indivíduo, sua idade, e circunstancias, &c.; mostra bem que não se se- guindo á risca o seu methodo, não só pode ser perigoso, sem bom resultado; mas pelo menos infructuosa sua applicação. Pelo que cumpre ad- vertir, que os Leitores tenhão todas estas pon- derações em vista; e que julguem bem, isto he > conheção bem da acção e effeito dos purgantes e suas conseqüências na economia animal, se- gundo o differente estado delia, e que neste ca- so não podem estar todos, quero dizer, não podem alcançar, pela difficuldade e falta de pra- tica, que he quem principalmente nos determi- na com a razão dos phenomenos analisados pe- la theoria > isto he, pelos conhecimentos prévios á pratica. Assim nos consta que hum hábil Facultativo y que sobre este mesmo methodo tem escrito com tanto acerto e sabedoria, o tem applicado com vantagem, e conseguido auxiliar com a sua judi~ ciosa clinica a experiência de sessenta annos>; que esta obra inculca. ÍNDICE. V A. Abreviação 173 Abscessos, apostemas 161 Absorventes 3CZ Advertência sobre os eracuantes 197 AffecçÕes moraes 13, 116, 119 Agoa, fluido humoral 6 Agoas mineraes 29 Aleitamento 143, 14G Alimentos , sustento 6 , 42 , 212 Alporcas 147 , 164 , 169 Amas 143 Amputação 166 Anatomica-inspecçao 9 Angina trachial 154 Ankilose 163, 192 Ânus , tenesmo 51, 63, 194 ------descida 113 Aphtas 123 Apoplexia 117 Areias 108 Artéria aorta 43 ------pulmonar 43 Astlima 92 Astringentes 102 Autor ( o ) citado como doente B. 68 Baço 161 Banhos 26 Bdelometro 22 Bebida alimentosa 210 ------tônica 2/> Bebidas 209 Bexigas J50 Bile (sua cor ) 6, 43, 208 Boca 123 Bubões C. 161 Cãibras 130 Calmantes 32 VI Calor estranho 8 32 Canaes ( emunctorios ) 43 Cancro 162 Carvão 161 Cataplasmas 130 Cataracta 123 Catarros 93, 94 Cavallo marinho 20 Caule rio 39 Cazamento 40 Cephalalgia 115 Charla tã es 30 Charlatanismo desmascarado 30 Clister , ou ajuda 175 Cholera 101 Chylo 6, 42 Coíica 100 ComichÕes 20 Constipaçíío de ventre 104 Consumpção 114 Convulsões 83, 122 Coqueluche 153 Coração 43 Crises 144 Cuidados geraes dos doentes 208 D. Panado 172 Dartos 159 -Debilidade dos enfermos 55 Defluxo no peito 92 Dentição 145 Depósitos 161 Diabetes 111 Diarrhea 101 Dieta 32 Digestão 6, 42, 196 Disuria 111 Dysenteria 103 Dores de dentes 124 Dores de es omago 97 Doses dos evacuantes 195 , 201 E. Eleclricidade n VII Emetico Empigem Empyema Enchaqueca Enfermidades , sua causa interna «------suas causas occasionaes —^--- erros sobre a sua causa " suas denominações asthenicas, sthenicas — epidêmicas • recentes ■• chronicas ■ do tronco ------ da cabeça ■—----das extremidades <-----— das mulheres —----■ dos meninos e adolescentes *------da pelle ■------nervosas ------ verminosas e—•----das vias superiores e------das inferiores ■ venereas Engorgitamento Epilepsia Erisipela Especifacos Espinhas Esquinencia Estômago Evacuação insufficiente pelos purgantes Evacuantes deste methodo Exostose Esophago F, Febres Febrifugoa Fecaes Ferida3 Fígado Flatuosidade Flores brancaa Fluidos «FluxãQ ' 57, 810 159 95 115 3, 8 12 ,'1* ia 78 80 168 47, 182 47, 185 81 115 126 133 144 157 83, 119, 192 81 174 174 218 163 119 161 30 125 -126 42 , 94 57 57, 1Q5 , 199 Í63 42 84 26 , 85 6 14, 24 , 25 43, 161 105 135, 136 5 VIII Fogo ( calorico ) Fome canina Frescura Frio das partes Frouxo de sangue Funcções do corpo humano Furunculos G ~~-(*alyanismo Gangrena ^Gengivas Glândulas de crescer Golpes Gordura Gota Gota serena Gravidação Hemorragia Hemorrhoides Hérnia Humores ■ causa da sua corrupção ■ sua cor *------seu volume ■------ardentes ------. frios -------tornão-se emeticos —-----tornão-se purgantes ■ resistem aos evacuantet ■ sua infecção Humoristas Hydropisia Hypocondria Ictericia Idade critica Indigestão Inoculação Intestinos lschuria liuto I. K. Lacrimação Leite , alimento ■------dos animaes ------extravasado —-----máo Le hargia Lientheria Loucura M. Madre Magnetismo Marasmo Medicina Paliativa ------- Curativa ■------ Popular Meios de curar desconhecidos Mercúrio Mfsmerismo Miserere Morte Morte prematura Movimentos convulsivos 1 peristalticos ■ anti-peristalticos Moxa N. Narcóticos Nephrites falsa ------ verdadeira Nodoas da pelle O. Observação final Observações communs aos dois evacuantes Obstáculos á cura dos doentes 0> stmcções Ophtalmia Opposição dos humores &c. Ordem do tratamento Ouvido P. Palpebras Palpitação Panaricio X Paralysia Parto Pedicular aífecção Pedra da bexiga Perda Phleugma Phirenes Pituila Plethora PVeuriz Polvpo Pregos Puberdade das donzelas Purgantes . ■ . .. como obrão -, "Não esquentao como se pensa ... Effeitos notáveis que produ- zem nas dores e sorfrimentos —--- Refresca-los para serem mais fáceis de tomar que seja o 49 , 53, Purgar o Pus ( erro sobre Puxos Pyloro ) Quadro da saúde Quedas Quina Q. R. Reflexões preliminares Refrescos Regime Regras ou menstruos ■ immoderadas ■ supprimidas ------ ( purgantes no tempo das ) Remédios para os doentes ------ o melhor de todos Repugnância contra os evacuantes ■ dos meninos aos remédios Rheumatismo Rins Rouquidão 118 140 149 108 13& 6 116 95 114 90 125 161 133 175, 199, 204 61 62- 51, 129 66 47 21 104. 42, 161 181 14, 24, 26 26, 85 192 32 212 133 137 1&6 143 31 £0 65 156 126 43 93 s. Sangria, seu inventor ■ ' ■ ■■ como allivia ■ não evita os depósitos Sangue * -i - comparado ao vinho ■ sua circulação — ■■■ - pertendido máo ■ pizado ou coalhado ■ não tem o cheiro infecto, que se acha nos humo* res corrompidos ------ pelo nariz Sanguexugas Sanguinolentas ( dejecçÕes ) Sarampo Sarcocelo Sarna Sciatíca Scorbuto Sede Sedenho Serosidade Sinapismo Sólidos Soluços Soltura do ventre Sphincter Squiros Slranguria Sudorifico Suor natural ■ > continuo Super purgação Sn rdez Syncope Tacto Temperamento Tenesmo Tímpanites Tinha Tonei f comparação ) Tonturas XII Tópicos 36, 130 Tosse 93 Tratamento curativo 182 Tratamentos ordinários 20 Tremores 122 Tumores U. 161 Ulceras 161, 165 Urina ( incontincncia de j 111 110 ------• na cama V. 147 Vacina 152 Varizes 106 Veia cava 43 43 ------ subclava 43 Veias lácteas 42 Veneno 172 Ventre duro 104 Vermes 81 Vertigens 115 Vesicatorios 36 , 52 Vias excretorias 43 174 174 Vinho 18, 64, 209 Virus 169 Vomicas 95 Vomitorio purgante 199, 201 Vômitos -v 94 PKEÀC10 DO EDITOR. jljl Arte de cursar be dirigida por este methodo a iium só , e único principio , que a Natureza pa- rece ter revelado. Mas fazia-se necessário que fosse bem conhecido , e examinado a fundo. He Pelgas , antigo Mestre cm Cirurgia, e que no espaço de mais de quarenta annos se applicon todo á pratica de sua Arte, que se pode olhar im> contcstavelmente como o auctor da descoberta da Causa das moléstias. He elle o primeiro, que reconheceo os meios os mais promptos, e mais cfficazes para destrui-las, qualquer que fosse seo caracter, ou denominação, e para prevenir as moléstias , objecto principal do cuidado do Medico, que ajunta á probidade a scien- cia de sua Profissão. He também a este pratico, que se deve a so- lução dos problemas os mais importantes, e os mais complicados sobre o objecto. modo de obrar, e eíTeitos dos purgantes ignorados até então. : Estas assenrões parecerão exageradas ao pri- meiro intuito ; mas pela leitura attenta, e reílecti- da desta obra , fixando as idéas que íiuctuão no vago da incerteza , todos que forem imparciaes se convencerão , que elias são a expressão franca , e filha da verdade. Eu, genro deste Practico , tenho adoptado as verdades , que elle publicou; e julguei dever dar á sua descoberta toda a clareza, de que era sus- ceptível. Estabelecendo hum r:;cthodo sobre scos principios, procurei pô-lo ao alcance de todos os enfermos", e torna-lo tão simples, e claro, que qualquer que saiba ler o podesse comprehender, e pródiga Usar os seos benefícios aos scos simi- 1'iantes. 1 A experiência, que tenho alcançado, he o se- guro garante de tudo o que se encerra nesta obra. Quasi 30 annos da minha própria practica, que succederão á de meo predecessor, as poderião confirmar , se disto precisassem. Os factos os mais incontestáveis, certificados pela voz publica, de- monstra© tod^os os dias aos incrédulos, e aos que o não são. Compadecemo-nos da sorte de victimas, que perecem na flor de sua idade, ou que passão os restos de seos dias padecendo males diversos. Logo que hum doente succumbe, á impressão pro-^ duzida por este accontecimento, accorda a sensi- bilidade, e mais ainda a rasão. Conhece-se então,, que se tem deixado de fazer o que lhe teria po- dido conservar a vida, e dar a saúde. Ha alguns annos, que os meios de curar tem incontestavel- mente feito importantes conquistas sobre o erro, ou ignorância da causa das moléstias.. O consumo rápido das precedentes edições, cujo numero che- ga a 6:000, e mesmo a 1,0:000 , prova o que afir- mo. Esta rapidez no consumo he, parece-me, huma forte recommendação para esta undecima edição. Exponho o meo methodo, debaixo da salvai guarda dos homens sensatos , e sinceramente ami- gos da suade de seos Concidadãos., MEDICINA CURATIVA. Exposição das causas das moléstias, e da caasa da morte prematura. (IJ Causa das moléstias* \J Principio da animação he, sem duvida, hum dos mais impenetráveis segredos do Creador. Mas por sua ineffavel bon- dade , parece ter concedido ao homem conhecer o principio motor da vida , e o tem conduzido como pela mão a mos- trar-lhe o meio, por onde pôde chegar ao conhecimento da causa de suas enfermidades , e da morte , que pôde ser a sua conseqüência inevitável. (2) Por esta rasíío , que direitos não tem o Creadòr ao re- conhecimento , e veneração da parte do Ente, que elle se di- gnou crear á sua imagem ! O Auctor da Natureza deo aos entes vivos, que creou , a faculdade de se reproduzir. Seria huma indiscrição , seria iucôherencia dizer , que desta faculdade teria resultado hum excesso de população, se o mesmo Creador não pozesse limite á duração da vida de cada indivíduo? O Creador por sua Divina Sabedoria, determinou a quan- tidade ào contido , (3) segundo a dimensão do continente. (4) Também fez palpáveis os meios, que empregou para evitar este excesso de pop;-h fixo, e por assim dizer, invariável da corrupção inntta. (3) Mas esta corrupção innata , germen natural da destruição da vida , soffre mais , ou menos a influencia das causas cor* ruptoras, ou eccasionaes , de que fallaremos no Capitulo seguinte. i Se pelo effeito desta mesma influencia este germen se augmentou, assim como neste caso pôde accontecer; se a sua marcha he accelerada ; se a fermentação pútrida pôde daqui nascer , a enfermidade se declara com mais , ou menos mali- gnidade , e pela crise , e seqüência de seos progressos , a morte chega antes do termo , ao qual o indivíduo , que suecum- be, poderia chegar, segundo o principio de vida, que nelle- havia. Daqui nasce a dislíneção entre a morte natural, (conse- qüência da velhice) e a morte prematura, ou contranaturaL (1) A corrupção termina a existência de todos os entes, ou de tudo que recebeo a vida : he esta huma verdade fuu» damcntal, e inexpugnável. (;>) A determinação da velhice nos parece de alguma íorfe arbilraria; nós a fixamos, partindo da idade de setenta arnos., (3) Quer dizer a corrupção sem augmento , ou tal qual o primeiro homem a recebeo com a faculdade de a transmitir» (5) A l.a he apanagem da velhice, ou a consequcíicia de huma extensão de vida sufficiente, isto he , relativa a este mesmo principio ; e a 2.a destroe a vida em toda a ct oca de seo curso pelo eíreite progressivo da enfermidade. Todos os entes creados pois tem em si mesmos huma porção deste agente destruidor , por isso que a morte não exceptua nenhum. O homem, que he de todos o que gosa da vida mais dilatada , traz igualmente em si a causa do seo rim , e sem que conheça a sua malignidade , senão no tempo da apparição da moléstia , á qual elle he mais geral- mente sugtito que os outros entes. He de notar , e quasi todos vêm com admiração , que moços, na flor e vigor da idade, e cuja cor annuncia o temperamento mais robusto, são mui'as vezes mais expos- tos aos golpes da corrupção , e da enfermidade, do que mui- tas pessoas reconhecidas fracas , sempre pálidas , e débeis. Certos indivíduos tem maior quantidade de corrupção do que outros. Kstes estão sempre enfermos ; vivem rara- mente até huma idade avançada, se he que sua constitui- ção , ou seo temperamento se não melhora no curso de sua vida. Outros nascem verdadeiramente em hum estado de ex- cepção , que se poderia chamar privilegio. Nestes a causa da destruição emprega cem ou mais annos para produzir o &eo efreito ; mas sobre a maior parte obra pelo contrario com mais prontidão , e muitas vezes mesmo para com mui- tos etla tem empregado sua acção antes que cheguem a ver o dia. Por deferir em sua marcha , esta causa do fm dos entes não muda de naturesa; he infalivelmente sempre a mesma , ou tal como o creador quiz que fosse. Ninguém pude negar que as partis carnosas , tendino- sas , cartilaginosas, e ósseas dos corpos, que se chamão cs srdidos , estejão subordinadas a outra parte chamada os fluidos ," aos quaes devem Mia formação , sua substancia , e se> crescimento. (I) Todos sabem quo estas dias parles constituem o ente material. Distinguimos entro estes fluidos a espécie , que está des- tinada ao "entretenimento da vida, e a espécie , ^ que podo ser o instrumento de sua destruição , como a mais corruptí- vel por sua essência. O Ente dos entes dando a vida ás suas creaturas , as (1) Tudo. emana de hum fluido, como único principio. ( 6) obrigou a tomar alimentos para entretenimento de sua exis- tência , e conservação. Examinemos o uso, que a naturesa faz dos alimentos , c como elles se mudão pelo trabalho da digestão. A primeira parte dos alimentos, que hum ente vivo to- mou para nutrição , ou , o que quer dizer o mesmo , seo óleo , ou quinta essência , serve a formar o que se chama ehylo. Este se filtra , como se dirá no Capitulo 7, na Circulação, para entreter a quantidade de sangue necessária á substancia de todas as partes sólidas do indivíduo , e para reparar as perdas , que continuadamente faz este fluido motor da vida. A seguada parte muita grosseira , e que não pôde ser convertida em ehylo , se divide em duas porções, formando a l.a a biíis , a fleugma, o fluido moral; e a 2.a huma ma- téria viscosa, ou a gordura: esta se une , ou se colla ás pa- redes internas do canal intestinal , por outro nome chamado o estômago e intestinos; emquanto que a l.a porção pôde fil- trar-se na circulação. A terceira parte , que para nada he própria, se evacua debaixo do nome de matéria fecal, dejecçÕes alvinas , ou de- posições diárias. Em todo o corpo humano os humores não são menos naturaes que o mesmo sangue. Não he pois, como acredita o vulgo , que temos humores quando estamos doentes , pois que se não perde a saúde senão depois que estes se corrompem , ou em outros termos , depois que tem soffrido a fermentação ácida ou pútrida. Os humores são mais sus- ceptíveis de corrupção que outra qualquer parte , por isso que nelles existe o germen de corrupção, posto pelo auc- tor da Naturesa , a fim de limitar a existência de todo o ente creado. Quando este germen de destruição tem recebi- do hum desenvolvimento , ou crescimento qualquer , por ef- feito das enusas corruptoras, de que já falíamos , .e que vão a ser indicadas , a duração da vida humana pôde ser mais ou menos notavelmente abreviada. A experiência he em appoio desta verdade, pelas ob- servações que se podem , não só fazer no estado mesmo de enfermidade, como mais seguramente, e de huma maneira mais sensível depois da morte do enfermo. (1) (1) O raáo cheiro, signal certo da alteração das matérias corruptíveis , se deixa sentir pela exalarão antes da morte ; sempre a precede j por isso que quasi sempre sua infecção he (?) A prova de que os humores são, como acabamos de dizer , as partes de todo o corpo as mais corruptíveis , he que são excrementicios. Se o não fossem, se evacuarião pelas vias das dejecçÕes, ou naturaes , ou provocados. Sua corrup- tibilidade , assim como sua corrupção , não são a causa da infecção, que se observa sempre relativa aos progressos de sua degeneração ? He por isso que a matéria fecal traz o chei* ro mais, ou menos infectador que se observa tantas .vezes , e que , no caso de moléstia , as dejecçÕes pelas grandes car- gas , o suor , e mesmo a simples transpitação acarretão ma- térias carregadas de exalações tão fétidas, que são capazes de incornmodar o mesmo doente , e muito mais ainda as pessoas que o tratão. Não podem ser despresadas estas verdades , que se ligão a outras não menos importantes , só sim se nos quizermos desviar do senso commum, ou negar- mos o que está claro , e com evidencia, (i) Admitíamos que os humores estão sãos emquanto o indivíduo que os conserva em suas entranhas está no es- tado de saúde. (2) Mas he preciso reconhecer o que he verdadeiro, e não esquecer jamais que , ainda que os hu- mores já corrompidos não fazem soíFrer, elles estão sempre mais > ou menos adiantados em corrupção dcsdu o instante, em que se sente a dor , ou quando se não está já em hum es- tado de saúde; porque he incontestável que a causa precede sempre ao effeito: verdade firmada sobre huma Lei funda- mental da Naturesa. Se algumas funções naturaes chegão a ser interrompi- das , ou suprimidas , se se passa do estado de saúde ao es- tado de incommodo, ou de moléstia propriamente dita , he porque os humores corrompendo-se perdem pela depravação, que tem soffrido y toda , ou huma parte de sua natnresa , doce, e bemfazeja: causa principal, ou única da saúde, que se não pôde recobrar sem que esta mesma naturesa dos humores esteja perfeitamente restabelecida. presagio da morte inevitável, e sempre o podemos reconhe- cer como causa delia; e muito mais pela inspecção anato» mi ca dos cadáveres. (1) Achar-se-ha nos differentes pontos de&fca obra a cie* monstração destas verdades. (2) Achar-se-ha no Cap. 20. desta obra , huma colleçção de signaes de hum bom estado da saúde , debaixo do titulo — Quadro de Saúde, — que importa aos doentes, e me fu- são aos que passâo bem de saúde, consultar muitas vezes* (8) Estas matérias corrompendo-se, ao depois que estão cor- ruptas tomão hum caracter acre tle calor ardente , e mesmo corrosivo ; tomão-se mordicantes a ponto de fazer sentir nas carnes que as eontem huma sensação mais ou menos doloro- sa , díTicil a su portar, c por vezes insupporíavel. Muitas ve- zes são putrescentes; outras vezes não o são , e raramente são sem calor, ou sem acrimonia sensível, no sugeito que affectão. Mas em nenhum dos casos são menos depravados , nem menos, susceptíveis de adquirir ao depois o mais alto gráo de malignidade. He neste estado de degeneração , e por esta mesma ac- ção mordicante , que os humores causuo todos os males , to- das as dores, todos os incommodos,' ou todas as enfermida- des , quaesquer que sejão sua espécie, e seo caracter. He neste estado , e por causa deste estado, que estas matérias resistem aos esforços da naturesa. Esta não se pôde mais des- embaraçar em rasão do gênero de tenacidade , que ellas tem recebido da corrupção , e a enfermidade se declara. Tal he o que aqui chamamos origem das enfermidades. Resta mostrar suas emanações para complemento da des- cripção da única causa das enfermidades do corpo humano. Esta acrimonia, este calor ardente, ou corrosivo, este instrumento finalmente, que se fôrma por ú mesmo na corrup- ção para produzir todos os incommodos, ou as-moléstias em geral , e mesmo a morte, se compõem de huma parte da massa dos humores : parte esta extiahida do todo. Daremos a esta parte extrahida o nome de ierosidade. Se não escrevêssemos para a classe mais numerosa dos doen- tes , eque, ainda que entende menos as palavras, julga bem dos factos, daríamos a esta matéria huma denominação co- nhecida dos auetores clássicos , mas somos obrigados a não ísahirmos do alcance dos Leitores para quem determinamos nossa obra, a con!er-nos assim nos limites estreitos de nos- sas forças. Se os Neologistas reconhecem e^ta serosidade co- mo causa effíciente de todas as dores e incommodos ( bem mal attribuida até hoje ao principio motor da vida), então estaremos deaccordo, e pedem dar-lhe hum nome da sua in- venção. Chamem-na matéria alkalina , aikaleccnte ; ou ana- lysando todos os gazes , c ácidos, que pertencem ro domínio da Chimica , a assemilharem á espécie que lhes agradar. ; Chamaremos mais a esta serosidade J Iitxão , porque mui límpida , e extremamente sutil (1) esta matéria he sus- (1) He como hum orvalho, cujas paites Juíiuuameme. (9) ceptivel de afluir, como com eífeito ella aflue sobre a paríe onde a dor he ressentida. Ella aflue, pois que se filtra como o ehylo nos vasos , existe nelle como o sangue, e circula como elle, e com elle. Esta Fluxão , com a massa geral dos humores, d1 onde lira a sua consistência ea sua naturesa, e onde tem a sua origem, fôrma o complemento da causa, da única causa da enfermidade do corpo humano , ou, se se quer assim , de to- das as enfermidades submettidas á arte de curar. Corrobora- remos esta asserção , se he que he preciso, quando faUarmos do sangue, e da circulação em geral dos fluidos. Ciwsa da morte prematura. Os humores corrompidos , ou cm putrefação , cm conse- qüência de huma mui longa duração da enfermidade , por sua longa demora , e permanência nas cavidades , envenenão , vulgarmente fallando, as entranhas , e as visceras , que os con- tem , ou os encerrão; e concorrendo a serosidade, causa efli- ciente da dor ressentida, e de toda a desordem, queima, crispa , corroe as partes, que attaca, dettroe a economia ani- mal , e com ella o principio motor da vida. Então acha o enfermo o termo da duração da sua existência. Tal he a causa da morte prematura, a qual chamare- mos contranatural. A inspecção anatômica dos cadáveres prova demonstra- tivamente, que a morte he sempre produzida por corrupção, ou podridão, ulearas, gangrena, lesão das partes , que tem sido a principal sede da enfermidade ; ou por dessecamento , engorgitamento dos fluidos , compressão dos vasos , frouxidão, e cessação total da circulação do sangue. Como se pôde explicar esta contradicção dos grandes Anatômicos , cujas obras servem de guia á maior parte dos práticos dos nossos dias? Dizem elles que tem visto, pela inspecção anatômica as visceras, e as entranhas dos cadáve- res de sua observação , destruídas, com abscessos , gangre- nadas , podres , defecadas, crr:p?.das , e endurecidas , e a maior parte dos vasos no mesmo estado ; e afíirmão ao mes- mo tempo — que estas causas próximas e immsdialas das subdivididas , são imperceptíveis ; pois reunindo-se pouco a pouco se tornão mais, ou menos abundantes , ou palpáveis , c perceptíveis á medida que se reúnem. & ( 10) enfermidades, serão sempre mui oecultas , (]ue a indagação destas causas he mais própria a induzir a erro , do que a aclarar , e que se não pôde faliar senão das causas atrfece- denies e remotas ! ... Ah! que oulra causa mais que a que acabamos de marcar , fez nas vísceras as lesÕei ou fétidas mortaes, que nellas se obscrvão? He huma obstinação da parte delles ? Não se deve crer : a boei fé , a franqueza , não podem ser despresadas por homens, que exercitão huma profissão honro- sa ; de outro modo não seriáo o que devem ser. Ho falt;t de ter entrado no profundo conhecisnento ? Neste caso o nosso methodo pôde suprir, e a classe enferma deve achar- se melhor com elle. Homens de boa fé, e de bom senso, re- fíeeti. He sem duvida que cs mais dos práticos só se occu- pão com o superficial , ou , o que quer dizer o mesmo, não se falia do essencial; isto he, da causa interna das en- fermidades; desta causa, que faz sentir o mal, ou a dor, de que se pôde queixar hum ente soílredor, e que produz welle as destruiçÕes, ou desordens , que trazem a morte em huma idade, em que ha os maiores direitos ávida. He igual- mentu verdadeiro que os tratamentos, que se fundão sobre este erro do principio, são insuficientes ou contrários á vi- da. Não pôde ser de oulra sorte : esperamos pode-lo de* monstiur. C A PI.TULO II. Can,',a da corrupção dos humores. Todos os efíèitos tem sua causa. Ninguém pôde contes»» tar esta asserção; ninguém pôde negar que para a indaga- ção de todas as verdades seja preciso dirigir-se , segundo este ptiucipio de huma eterna evidencia. A causa da morte natural hc, como dissemos no Capitulo precedtnte, o germen de corrupção innata , desenvolvendo-se , ou exercendo lenta- mente a Mia acção ; ou digamos de outro modo : a morte natural hc a conseqüência de huma sufficiaute duração da vida , segundo seo principio , e a vontade do Creador. A causa da morte prematura , e das enfermidades , que a prece- dem , hc o eífeito da corrupção auxiíiar , que exerceo a sua acção sobre este germen de corruptibilidíde. A corrupção dos humores tem suas causas oceasionaes * como a moléstia tem também as suas. Vamos explicar a maior parto das causas desta corrupção. Humci das causas corruptoras dos humores, a mais or-. (11) dínavía ~, ou a mais geral , he infalivelmerde a aspiração de hum ar carregado de exalações infectas , e corruptoras , taes como podem sahir de subterrâneos envenenados , de fossos, e cloacas , onde houve podridão , ou decomposição de partes animaes. Nota-se que ha muitas enfermidades depoh de huma lon- ga secca , e calores extremamente prolongados. Isto deve as- sim accontecer, pois que nestas circunstancias, a athmosphera bebe , e absorve a corrupção, ou as exalações malfazejas, que se evaporão geralmente dos lugares humidos , ou aquáticos , e infectos. A visinhança muito próxima das lagoas , dos lagos, tan- ques , e de todos os outros lugares, . onde a água he lamosa, e estagnada , he a temer , como podendo trazer a corrupção aos humores. Os vapores espessos , ou carregados de máos cheiros são muitas vezes mui nocivos , como o prova diariamente a expe- riência. Nota-se que nos campos, onde se gerava huma quantida- de extraordinária de lagartas, havião muitos doentes. He pois sensível, que o ar, que favorece o desenvolvi- mento destes insectos he muito impuro. Os redores dos bosques , e lugares cobertos de arvores espinhaes, e mattas , e as margens dos rios , contão muitas vezes mais enfermos, que as planícies , onde o ar he ordina- riamente mais são, que nos paizes humidos , e pouco arejados. O accesso de huma pessoa enferma , cujo hálito se as- pira, pôde tornar-se nocivo á saúde. (1) A habitação dos hospitaes , e a frequentação de grandes ajuntamentos, serião muito prejudiciaes, se a salubridade dos lugares, que. as encerra, fosse despresada. Huma habitação humida, ou privada decorrente de ar, e o repouso sobre huma terra lamosa , ou doentia , podem ser outras tantas causas corruptoras. Todas as vezes finalmente, que o ar livre, ou concen- trado se acha carregado de miasmas corruptores, pôde indu- zir a corrupção , e mesmo a corrupção contagiosa nos humo- res daquelles , que o aspirão em assaz grands quantidade, por soffrer a sua influencia nociva. (1) O preservativo por si se mostra. He bastante desviar avia immediatamente aspirante da direcção, que pôde seguir o hálito do doente. 2 ii ( 12) He também sensível , que os alimentos alterados , ou corrompidos , são, como o que precede , e como o que segue , causas corruptoras dos humores. O contacto pode ser huma causa corruptora a respeito da- quelle, que soíFre sua acção , e relativamente ao-estado de depra- vação , que o communica. Neste caso a corrupção se exsuda dos corpos , quer sejão animados , quer o não sejão. O ente in- fectado , a communica pela pelle , ou poros cxalantes , e o contagio tem lugar pelas mesmas vias nos poros absorventes. Pela acção do contacto, todos os vírus , taes como o sarnoso , dartroso , escrophuloso , venereo , hjdrofobico , a peste , po- dem ser communiçados ; e mais seguramente , se os poros se achão abertos; mais infallivelmente ainda, se ha ferida na par- te, que se acha em contacto. A corrupção , ou o vicio cor- ruptor , neste caso obra suecessivamente sobre toda a massa humoral , nas cavidades , como nas vias da circulação , entre as quaes se estabelecem ramificações mais , ou menos promp- tamente. (I) He certamente muito menos essencial, saber como, ou por que modo os humores de hum enfermo se tem corrom- pido , do que dirigir os soecorros da arte , debaixo de hum principio verdadeiro. Não importa menos reconhecer % que a saúde não seria alterada sem a depravarão , corrup- ção , ou putrefação destas matérias; e que ellas podem , sen- do alteradas , causar todas as espécies de accidentes , e mes- mo a morte , assim como sufficientemente se explicou no Ca». pitulo precedente, CAPITULO III. Sobre as enfermidades internai. Segundo o modo, com que discorremos sobre a alteração, da saúde , confundimos sempre as causas oceasionaes das en- (1) Escrevemos para o povo , isto he, especialmente parar doentes , que podem ignorar a quantidade de gaz . que entra na composição do ar athmosferico , e respiravel. Pensamos que lhe he indifTerente o chamar-se azote , ar mefitico , ou mofetta athmosferica , estas partes corruptoras , que este ar. pôde ter em dissolucção para oceasionar as enfermidades pe- las vias da respiração , pela da absorpção } ou pelos poros^ da pelle, ou pela aeção do contacto (13) fermidades com as suas causas efficientes , isto he, com a matéria, que produz a dor, ou a espécie deincommodo, que k caiacterba a enfermidade do indivíduo. He huma falta de raciocínio, e hum erro mui prejudicial. Que se deve concluir deste silencio dos Médicos a respeito de soos enfermos , se he que não he despresada , ou não entendem a verdadeira causa da enfermidade ? Apontão-se como causas dellas os diversos aecidentes, os differentes accontecimentos , que suecedem , ou antes, ou durante as suas enfermidade*. Poderíamos citar neste caso hum grande numero de exemplos ; mas hum só será bastante. Diz-se que a passagem rápida do calor ao frio he a causa de huma enfermidade. Sem duvida esta espécie de transacçao pôde produzir huma repercussão da matéria da transpiração. Porém he esta matéria a causa da enfermidade , chama- da suor supprimido, ou de outro modo ? A sua causa ocea- sional , que neste caso he o frio , sobrevindo ao calor , he também a causa âo accidente. Se o mesmo enfermo não es- tivesse então em hum estado de plenitude humoral , nada lhe acconteceria. Se se pergunta ao mesmo , elle dirá , que ou- tras tantas vezes se tem exposto , sem que tenha sentido no- vidade na sua saúde. O observador ai tento nota mil circuns- tancias , em que os enfermos , e outras pessoas procurão cau- sas ; e que, como se impozessemos huma lei de negar , ou de jamais conhecer a verdade, cada hum illudindo-st*, as es- tabelece , segundo o seo erro , e ignorância, que fazem di* vagar , e tomar hum falso caminho. Em rasão deste erro , se tem attribuido muito ps affecçoes moraes , qualquer que seja o seo molivo. Não negaremos que o numero dc-tas aífecçÕes , entre outras as que tirão sua origem dos pezares , desgostos , dissabores , ou que nascem do vapor, sejão capazes de produzir males de diríerente ca- racter , principalmente se se prolongáo , ou se não cessão a- tempo; porque nota-se freqüentemente as tristes conseqüências de huma viva impressão sobre o moral , e sabe-se que in- fluencia tem este sobra o físico. Quantos destes entes soflre- dores , que não conhecem outras causas de seos males senão estas , estão longe de pensar, que ellas sô são oceasionaes , e que põe em acção a matéria , que os faz soffrer , e que pôde abreviar os seos dias ? He por tanto útil fazer ver a esta classe de enfermos, os factos praticas, qm os actarem. No decurso desta obra , citaremos muitos , particularmente' guando fallar-mos de algumas aífecções mentaes, e da epilepsia,, (14) Sobro as moléstias externas. Quantos enfermos, c valetudinarios acreditão firmemente, que a sua moléstia só tem por causa, e única a acção , ou conseqüência da acção , das causas externas , q;'e tem obrado sobre elles, taes como huma queda, Ivum golpe, huma feri- da , mais, ou menos grave , ou bem hum ttdorço praticado por qualquer motivo. Bem que se deva dar a todas estas causas a parte , que lhes he própria, nos males que tem podido produzir , impor- ta mais do que se pensa para o alivio , e cura das enfermida- des , reconhecer a causa , que complica , e agrava os eífeitos ; assim como as lesões da primeira causa, ou dos accidentes. Supponhamos , entre hum numero qualquer de indiví- duos , que derão huma queda , ou que se ferirão com instru- mento cortante, picante, ou contundente, que a quarta parte destes não se curão pela applicação de soecorros , tanto ã huns , como a outros; sem duvida os que se não curarão, conservão em si mesmos a causa agravante de seos males : por tanto o mesmo accidente, que para com os primeiros foi cau- sa próxima, he para os outros causa occasional. Em favor desta asserção, referirei, em differentes luga- res desta obra , factos práticos , que poderão fixar a opinião do Leitor. Citarei aqui hum , que me he pessoal , e ainda que não fosse apontado em muitas das precedentes edições , não he por isso menos exacto ; e o tenho bem presenle. Hindo hum dia pela rua, e com pressa , quiz passar a diante de hum sugeito , já idoso , e que caminhava lenta- mente. Não sei que corpo , ou substancia estava sobre a cal- çada (declive) em que pisei, e a fez escorregadiça, que su- bitamente cahi sobre o lado esquerdo , o braço , e a mão , estendidos por hum moyimento involuntário ^ e todavia na- tural , em tal caso , ficarão debaixo do peso de todo o corpo; o punho violentamente torcido , me fez sentir huma dor das mais insuportáveis. Esta dor existio quasi huma hora , e ao fim deste tempo me julguei são. Pouco depois sobreveio-me huma dor «o mesmo punho com tal violência , que penetrando-me o mais intimamente , me fazia recear sincope. Qualquer pequeno movimento , me fazia sentir a mais terrivel dor. Nesta triste situação , me vi obrigado a pôr a mão, e o antebraço sobre huma meza, junto da qual me as- sentei , e guardar a mais perfeita immobilidade , para evitar o mais pequeno, movimento , que podesse oceasionar a sincope gle que me vi ameaçado, ( 15) Importava-me saber essencialmente qual das causas obra- va , se a queda , se huma causa secundaria. Lembrei-me ter tratado de hum homem , havia pouco mais , ou menos vinte annos , e era carreiro, o qual levan- tando huma mala, experimentou na região lombar hum acci- dante, digno de notar-se por seo gênero. Dizia elle, senti como huma dislaceração , acompanhada de h um langido nos rins ; e logo fui accommettido nesta parte de huma dor , cu- ja violência seria difricil explicar. Neste estado , e sem se poder mover , custou muito a pô-lo na cama , e do modo que exigião as suas circunstancias , por isso , que o menor toque , ou movimento , lhe fazião dar gritos agudos. A opinião dos circunstantes foi unanime, ( porque ordi- nariamente assim se diz em tal caso) o doente fez algum esforço , e daiui nasceo , segundo elle , e a opinião dos ou- tros , a per tendida causa de seo» incommodos. Eu só fui de f-utra opinião , segundo o meo pensar ; mas huma pessoa, amiga da casa, em que estava o doente, che- gou-se para janto de mim, e me fez lembrar os bens efíeitos do meo tratamento , de que ella tinha sido testemunha em hum ca.co quasi similhante a este: fiz ver aos mesmos cir- cunstantes , e ao mesmo enfermo , que muitas vezes des de que elle exercia o seo officio , tinha levantado , e carregado fardos pesados, sem que lhe tivesse accontecido o menor acci- denle, e que esta malla , com o peso de quasi cincoenta li- bras , não era para hum homem das suas fonas, capaz de produzir huma de:-locação de parte solida, e ainda menos as dores, que elle sofrVia ; e que estas tinhão a sus oiiexm na má disposição , ou de outro medo , da corrupção des humo- res. Já eu sabia de sua própria boca , que elle era su£xi;o a dores periódicas , e ambulantes , cl.amadas reumaticas. O doente penetrado desta luz salutifera, confentio no uso da pur^a , de que usou , como convinha cm tal caso. Ficou ali- viado no mesmo dia, e inteiramente livre das deres no es-* paço de quasi huma semana. Volto ao segundo facto pratico , que me he pessoal. Dis- se então comtni^o mesmo: para que a dor, que agora sinto, fosse o effeito da contusão, que recebi na queda , deveria ter cessado, porque toda a causa produz o seo effeito , assim como tedo o effeito tem sua causa. Pcrcm pelo contrario , a dor da minha queda, deíappucceo por tempo; he pois ou- tra a causa, que veio produzir huma nova dor. A causa primeira , isto he , a causa externa , pôde pro- duzir a segunda, pelo abalo, que os humores de humana ( 16) tu reza má, existentes em meo corpo , experimentarão , e os determinarão a fixar se neste lugar : ou por outro modo obri- gar ajluccãü, mais, ou menos acrimoniosa, como era, a ajun- tar-se sobre huma parte offendida , e enfraquecida. Ver-se-ha , pelo resultado do tratamento , que empre- guei , que as causas externas não são em muitos casos o que importa essencialmente conhecer , senão causas oceasionaes , e que se deve procurar destruir a causa interna, único ob- jecto da grande arte de curar. Tomei somente quatro doses purgativas no espaço de três dias , que evacuarão humores ardentes, e fiquei são. Se me tivesse entregado ao methodo ordinário de curati- vo , e ao systema dos tópicos usados em simiíhante caso , teria infallivelmente fixado sobre a parte enferma o humor ou a jluxao, que para ella se dirigso. Sem hum tratamento análogo, fundado sobre este principio , que a acção ou o effeito de toda a causa externa, chamada remota ou antece- dente, he levar ás partes offendidas a causa próxima, infer- na, ou immediata das enfermidades, teria ficado enfermo; innumeraveis exemplos me obrigáo a não duvidar. CAPITULO IV. Erros sobre a causa das enfermidades. O objecto deste Capitulo he o mesmo do antecedente sobre o erro, em que geralmente se está respeito á causa das t-nfermidades , confundindo-se sempre suas causas com a pró- xima ou efíiciente , tantas vezes despresada e ignorada. A exemplo dos antigos , os modernos pensão ainda que o sangue pôde ser a causa de muitas enfermidades. Se bem pensássemos que a substancia dos corpos animados deriva im- mediataraente da primeira necessidade ( de satisfazer) , ohq experimentão , saberíamos que he para ter sangue que todos os animaes comem. He portanto preciso reconhecer , menos que não queiramos negar huma verdade importante, que io- das as vezes que hum indivíduo sente fome, he a naturesa quem nelle pede alimentos produetivos desta mesma sub- stancia , porque não tem bastante para manter-se ; e sendo nós convencidos de que o sangue he o único liquido, que re- cebe esta substancia para nutrir todas as parles do corpo ani- mal , não duvidaremos confessar , que he deste mesmo li- quido que depende a vida; pois que o seo movimento circu- lar a enlretem, e parando, não ha mais animação. (17) O sangue dá a sauc?e , produz a verdadeira robustez , dá-nos a alegria , e he elle a origem da nossa força , ou a mesma força. Por não reconhecermos estas vcidades , ou não comprehendermos que he á sua abundância que devemos to- das estas vantagens, o julgamos supérfluo algumas e muitas vezes; mas, se assim fosse, a Naturesa teria destinado vias /para expulsar o supérfluo , senão continuadamenté , ao menos periodicamente, e he o qne se não vê. O sangue he contido nos vasos ; e cedes não pôde sahir senão por huma abertu- ra de propósito praticada. Ah ! qual he o mortal tão cego, tão sem rasão, para crer que, dirigindo a mão sobre o que a vida tem de mais precioso , seja superior á Naturesa ?... Basta vermos , ( e ficaremos convencidos ) que a eva- cuação total do sangue produz instantaneamente a morte; e não se reconhecerá, sendo dium fr.eto tão claro , que a dimi- nuição da quantidade deste liquido causa a fraqueza do in- divíduo, sua tristeza, magreza , e o reduz á exlenuação ?... Seria a cousa a mais incomprehensivel. Quando pois finalmente saberemos que o sangue se une com os sólidos , com os espíritos, e os diííerentcs líquidos destinados pela Natureza a favorecer os movimentos das mul- tiplicadas partes , de que se compõem a economia animal ? Esperamos que algum dia se desvaneça a illusão ; a pe- sar de que se pôde dizer que isto longe de se aproximar , pa- rece que se afasta. Tem-se despresado esta pratica abominá- vel , segundo a qual se derramava sem piedade o sangue dos enfermos. A sangria a ponto de desfalecimento tem tal- vez destruído mais homens que todas as guerras , e epide- mias. Parece que sempre acreditamos que o sangue pôde causar enfermidades , e póde-se dizer que só se mudou de instrumento para o derramar. O sangue he o liquido purificado pela natureza , e sempre elle tende á sua puiiíicação, por isso que he motor da vi- da, iv-te principio circulando, não he nem pôde ter a cau- sa de enfermidade alguma, e menos da morte prematura ; mas pava fallar còm propriedade , he relativamente ao que com dor se lhe imputa o conduetor das matérias , que cau- são as enfermidades e a morte. Scn-vindo o exposto incontestável da causa das enrVmi- dades , he impossível não reconhecer , que sua origem e principio residem no estômago e intestinos, e que he alíi, como. de hum lar, donde srdie o fumo , eque partem os hu- ' mores e a serosidade , que tem produzido , para filtrar-se com o sangue nas vias da circulação. E pvecisa-se mais ( IM para demonstrar que o sangue tem a sua origem âo mesmo ventriculo ? Como acabamos de dizer, este liquido tende sempre á sua purificação , e não se liga com cousa alguma impura. Pelo contrario faz contínuos esforços para expellir estas matérias , e he por isso que ellas o epprimem, ou que elle as depõem , que o corpo humano cahe em hum estado de enfermidade. Póde-se dizer que o sangue escolhe a parte do corpo, que lhe he a mais conveniente ao seo movimento , e huma cavidade de preferencia , conforme as leis da circulação. Dó' lugar, em que este deposito se tem fixado, e do nome, que se tem dado a cada huma das partes do corpo humano , derivão os que se tem também convindo dar ás enfermida- des. Mas quando a corrupção he assaz forte , e a serosida- de humoral bastante corrosiva para suspender de repente o curso do sangue , desde o principio da enfermidade , o doen- te morre sem que houvesse tempo de dar hum nome á en- fermidade, de que foi victima. Quanto he muito mais importante prestar promptos soecor- ros, do que cançar a imaginação em achar vãs denomi- nações ! Ora, os meios, que este methodo indica, não podem falhar, só se se empregarem mui tarde. Devemos, segundo a nossa convicção, notar como hum erro não só prejudicial , mas ainda extremamente funesto , a espécie de identidade supposta dos humores com o sangue. A rasão appoiada pela experiência não pôde admittir que estas matérias sejão a origem ou a causa primeira deste li- quido , mal conhecido de muitos tempos. Outro tanto seria querer provar que as fezes são a causa produclora do vi- nho , e que ha identidade entre humas e outro. Dissemos em outro lugar que he para ter sangue que comemos. Se hum censor pretendesse que era para gerar humores , se lhe perguntaria se he somente pelo gosto de ter uvas pisadas e fezes, que vendimamos. Fallemos cem os homens, que não sahem do circulo prescripto pela natureza. Os vinhateiros , por exemplo , affírmaráõ sempre que o vinho he a quinta essência da uva. Responder-se-lhes-ha que o sangue se fôrma da quinta es- sência dos alimentos. Dirão elles que esta espécie de tonnel, dentro do qual se lançou o vinho mosto , e emquanto ferve, he huma ex- creção, que não pôde ser própria para fazer vinho nem fezes. Póde-se-lhes dizer que as fezes se compõem da porção ( 19) dos alimentos, que não pôde servir para fazer sangue , nem humores. Elles defenderião que as feires não se ligão com o vinho. Dir lhes-hemos que os humores não se ligão também com o sangue. Sustentarão que o vinho separa , e expelle as fezes por puiificar-se, e são as fezes, que emquanto existem com ó vinho , fazem rebentar as botelhas , e o tonnel. Sustentaremos também que o sangue sobrecarregado de humores depravados, ou de serosidade , que delle emana , faz continuamente esforces para se desembaraçar desta matéria heterogênea, e que he esta mesma matéria, que causa na circulação todas as desordens, que se observão, todas as do- res, que o enfjrmo experimenta , ou todas as enfermidades, que sobrevem , e até a morte chegar , quer os humores cor- rompidos tenhão infecionado as visceras, como o vinho depra- vado damnifica a pipa, tenha suspendido a circulação do sangue , comprimindo , estreitando, ou crispando os vasos circulatórios. Os mesmos vinhateiros attestarão que, depois que o vinho está inteiramente desembaraçado das fezes , nada mais se vê contrario á ordem natural no vaso , que o contem. Conviremos com elles que ha saúde, emquanto-os humo- res conservão huma pureza natural, e que por conseqüência não circulão com o sangue senão partes homogêneas, ou pelo menos líquidos , que nem embaração, nem retardão seu curso. Se se perguntasse porque não haveríão humores sem es- tas matérias, perguntaríamos porque não se faz vinho sem fezes. Ajuizámos que as fezes são até certo ponto uteis^, e o mesmo julgamos a respeito dos humores, emquanto não tem perdido esta pureza natural , de que acabamos de fallar. Po- rém póde-se sempre sustentar com rasão que estas matérias excrementicias , como as fezes, são corruptíveis, como! ella; e que estando no estado de putrefação , bem longe de ser úteis, são então destruidoras das causas motoras da vida. Póde-se igualmente sustentar com huma firme convic- ção que o sangue, sendo igualmente corruptível como o vi- nho , não se corrompe senão no momento de cessar a vida , ou depois da morte. Por tanto jamais he preciso evacuar o sangue; he ne- cessário expulsar os humores logo que estão alterados , ou qje estamos enfermos j he preí-iso g-uardar-se o vinho e re- geitar-se as fezes, 3 ii (20) Se para a saúde, e prolongaçao da vida cada hum fí- 2esse o que faz o vinhateiro , sem duvida a arte de cura? seria a mais útil e bemfr^eja, sendo a saúde o mais precioso de todos os bens. Porem a prevenção contra tudo o que he simples , e contra as verdades dictadas pela natureza, dirige o maior nu- mero dos homens. Hum orgulho mal fundado em huns; em outros hurn^ re&peito pouco sensato para os prejuízos em vi- gor , desvião sua attenção, e impede que se não fixe so- bre os objectos os mais próprios a prolongar a existência hu- mana. Eis a causa das maiores, infeliqidsdes. CAPITULO V. Tratamentos ordinários. Até hoje a arte de curar não se tem fundado senão em systcmas , e huma sabia nomenclatura substiluio o lugar as observações sabias e judiciosas. Estes vãos systemas, que se suecedem com huma rapidez, que a imaginação admira * e ▼erdaaeiramente aterra os enfermos , que quasi sempre são victimas delle, nos tem aproximado da verdade? Sustentare- mos que nenhum destes vãos systemas teria existido , se seos auetores não se desviassem da Natureza, que mesmo indica o gênero dos soecorros , segundo a necessidade, que experimenta. x Sobre a sangria. Muitos Médicos cheios de respeito para com o insíincto do cavallo marinho, inventor da sangria, julgarão dever imi- tar a este animal Tal he a força dos prejuisos , que muitos Médicos nao podem abandona-la, aindaque inteirados de seos desastres. _ O erro , ou engane de huns , a incerteza ou a irresolu- çao de outros , oífendem igualmente a vida dos enfermos , porque nenhum destes práticos conheceo a causa das enferl rnidades; nenhum também parece comprehender o motivo, oue obriga ao hjpopotamo a deslacerar a sua pelle sobre as acu- das canas do Nilo, onde elle habita. Este animal não nrocu- ra sangrar-se , como se julga ; e tanto he assim q;,c elle horronsado com a perda do seo sangue , se revolve na aía para o estancar. d Muitas pessoas estão no costume de crer, ,e di^cr omi- tem m:io sangue , quando, sentem cojnicliõei vivas e ksuppor- (21 ) taveis; e logo se ferem, como o cavallo marinho, até esfol- iar-se , e derramar sangue; e outros aftribuem este incommo- do á maior abundância do mesmo sangue. Estes juizos /cm fundamento dependem da ignorância da causa das enfermida- desv Não se conta com a matéria, que se mistura com o san- gue, que causa em geral todas as enfermidades, a que está o homem sujeito. Não , jamais o homem tem excesso de san- gue. As arvores- seção por ter muita seiva? Este liquido, que íhes dá a vida, as faz perecer ? O erro a este respeito he quasi geral, e os procedimentos, que delle se ressentem , mostrão com toda a evidencia os poucos conhecimentos até hoje «dqtÉfcdos. Aiudaque discorramos o mais rasoavelmente contra a sangria , haverá muitas pessoas , que longo tempo se deixem seduzir pelo alivio enganador , consequentemente prejudicial , que muitas vezes dá , e que ao depois pagão caro. Por hum alivio de vinte e quatro horas, abrevia-se os dias de dez annos; e se expõem a passar o re&to da vida cm hum estado valctudinario. (1) He incontestável que o sangue quando sahe dos vasos he accompanhado da serosidade e do fluido humoral. He á eva- cuação desta porção de matérias, causas efíicientes da dor, o de todas as desordens na circulação , que se deve o alivio momentâneo, que traz a sangria. He esta parte fluida dos humores , que , segundo a depravação de toda a massa, dá ao sangue o aspecto , que appresenta depois da sanaria ; e he a nr.hireza viciada destes humores, sua consistência, e cor, que o põem no estado, em que se observa. He hum crasso erro, quando se dis que o sangue está alterado , mão , escandecido , queimado , gordurento , acre , grosso , negro &c. Todas estas asserçÕes deves ifio deixar de ser acredita- das á vista do sangue , ío^j que esfria depois da sangria ; porquanto vê-se no vaso, em que foi recebido, a parte san- güínea e a humoral separadas huma da outra. Tem-se jamais notado no sangue este cheiro infecto, que he o sig'ial clavo da corrupção, ou da corruptibilidade, que t;j se oLocrva nos humores ? Ec.-.pondei a esta iuterpel- (l) P.kle-se dizer qus e^es são como 03 que , pensando que morreráô de fome para o futuro , preferem fartar--e , e comer tudo em hum dia , antes que ecoivimisar para o tem- po da velhice , e quando a Natureza lhes deve ser menos favorável. (22 ; la^ão , homens presumidos de sábios , e que allucinaes as vos- sas wctimas, cegando-vos a luz enganadora do sophisma. He portanto o sangue a parte a mais sã , a menos corruptivel. (1) Elle pôde cstí.r em mistura com maté- rias alteradas , que o podem também alterar ; mas as resur- ças da arte são inúteis , e sem efficacia , quando o motor da vida esti corrupto ; pois que , logo que o sangue chega a este estado , não he possível esperar viver. Das Sanguexugas. (2) As Sanguexugas substituem as sangrias, crênt/que são menos nocivas , que a lanceta. Segundo a opinião de alguns práticos, ellas chupão o máo sangue. Graciosa nsserção!— Quem lhes tem feito crer tal? Quem lhes pôde fazer ver, que as sanguexugas tinhão o gosto tão depravado , a ponto de se fartar com preferencia deste sangue máo , que elles admittem ; ou do sangue coagulado , ou corrupto , quando existe em algumas partes? Não he divulgar absurdos? Não seria melhor convir francamente, que o uso das sanguexugas he a mais perniciosa de todas as invenções. He portanto hum pequeno inconveniente ter facilitado a todos hum instrumento tanto mais matador , quanto qualquer usa delle (1) Estava-se em outro tempo na persuasão de que o pus se formava do sangue , ou o que he o mesmo , acreditava-se que o sangue dos que tinhão apostemas , teridas , ou ulceras se tornava em pus. Assim como se tem deixado este erro, he de esperar , que todos os de mais erros prejudiciaes á ar- te , como aos enfermos, igualmente desappareceráõ. (2) Triste noticia para os habitantes destes tanques lodo- sos , onde se faz esta espécie de pesca. Hum ramo de com- mercio, que não deixa de ser bem lucrativo, se acha inter- rompido pela descoberta , que acaba de fazer o inventor de certo instrumento chamado Bdelometro , que dará a seo auc- tor hum privilegio de invenção. Por meio de huma bomba guamecida de pontas, os nossos enfermos, ou valetudinarios, não se aterrarão mais ao aspecto destes reptis ; não ficarão in- certos se a sanguexuga he, ou não venenosa. O Bdelometro suprirá tudo. Que economia para os nossos hospícios de hu- manidade ! Quantos milhões se não guardão em caixas pelas nossas administrações de hospitaes ! Mas o Bdelometro não matará menos os desgraçados enfermos. (23) sem discernimento, nem medida , como se notao todos os dias os mais desastrosos effeitos. (3) Não somente o das sanguexugas he o mesmo que o da sangria , emquanto a evacuação de sangue , que sempre oc- casiona huma perda de substancia mui prejudicial , mas os freqüentes exemplos, que agora se poderião citar, não drixão a mnis pequena duvida sobre a sua acção nociva ; e infelizmente não attendemos , que ellas determinão a Jluxão , que attrahem das partes remotas sobre a parte affectada ; e assim tornão a en- fermidade quasi sempre incurável. Quantas ulceras de diffe- rentes gêneros não tem sido a conseqüência da picada das sanguexugas! Dirão talvez, quG esta sanguexuga era venenosa. Admitíamos por hum instante a verdade da supposição. Ha por tanto sanguexugas venenosas; mas por que signal, ou caracter as distinguiremos para não nos servirmos dellas ? Que- rem antes dizer absurdos, do que confessar com ingenuidade , que os diversos accidentes são o resultado natural da lesão feita na parte do corpo, que soffreo a mordedura. Esta espécie de lesão deve-se comparar ás que resultão de todas as causas externas , taes (forno golpes , quedas, fe- ridas quaesquer ; pois que neste caso se vê a fluxão humoral dirigir-se sobre a parte, que tem soffrido , assim como o dis- semos no Cap. III. , fallando das enfermidades externas. Ha circunstancias em que o sangue sobrecarregado de hu- mores corruptos , se desonera delles , depositando-os sobre huma parte qualquer ; assim como ha outras , em que elle se apro- veita da oceasião de huma sabida no tecido das carnes , para expulsar a superabundancla destas matérias. A Natureza es- tabelece pois huma corren'e a favor de qualquer sabida , ou exsutorio , assim como para poder fazer pela parte ferida , ou -lesada. Para seccar esta espécie de corrente, e para evitar os accidentes, que esta fonte pôde causar nas partes, onde se tem estabelecido , como para prevenir no outro caso todas as funestas conseqüências , he preciso empregar os meios curati- vos , que indicamos no Capitulo dos tumores , abscessos , c ulceras. (S) He huna verdadeiro desgosto para o homem, que re- flecte , ver esta degraçada parte do povo deteriorar-se com as sanguexugas , esperando dellas toda a sua saúde. E admi- ram o nos da morte prematura , e do estado de langor dos que a soífrem ! Quando se reflexionará ? (24) Perda de' sangue em casos de ferimento. Consequentemente ao que precede, diremos que nas que- das , pancadas , feridas de todas as espécies , em que se pra- tica a evacuação do sangue, ou pela lanceta , ou por san- guexugas , para remediar estes accidentes , ou evitar conse- qüências , obramos com mais fundamento , do que nas enfer- midades internas ; porquanto , matar para fazer viver , não pôde ser : logo , por conseqüência deita verdade, não se pôde admittir circunstancia , em que se possa prolongar a vida , debilitando o seo principio motor. Haverá sempre contradic- ção , e mais particularmente quando a existência do enfermo está já ameaçada por estes mesmos accidentes de causa ex- terna. Objecfar-se-me-ha talvez , que a sangria faz tornar a si aquelle, que o perdeo por huma forte impressão desta causa externa , e que modera as dores, que delia provem. Em lu- gar desta applicação, e para obter melhores efiéitos, pode-se no primeiro caso empregar os alckalis , ou os ácidos em res- piração , pois que produzem , como se sabe , bons eífeitos ; alguns licores espiiituosos também restabelecem a circulação de seo abatimento. O ferido, ou desmaiado , recolhido á cama, e agasalha- do , experimenta hum restabelecimento de transpiração , ou huma perspiração accelerada , que desengorgitando os vasos , favorece o restabelecimento de huma circulação livre. A ap- plicação de todos estes meios, ou outros análogos, produz o effeito desejado. No segundo caso os mesmos meios desembara- çando por meio da transpiração a circulação opprimida, produzem o alivio, diminuindo a tensão das partes membranosas, ou nervosas. Se ha retardamento nas evacuações-alvinas , deve- se provoca-las por meio de clisteres emollientes. O purgante, da maneira que transcrevemos na ordem do tratamento , pôde ser necessário para expulsar os humores , mais , ou menos corrompidos, que movidos fora do seo lugar pela acção da causa extern i , são muitas veze3 a causa da inílammação, de augmento de dores , ou outros accidentes mais, ou menos graves. Dir~se-ha , que o desengorgitamento dos vasos por meio do sangue tirado , ou pela lanceta , ou p?lr.s sanguexugas , favorece a circulação interceptada pela acção da mesma 'cau- sa externa. Sabe-se bem, que o que favorece a eann-ria , e que a sustenta contra toda a rasão, foi, e he ainda o va- ( 25 ) cttô, que ella faz logo, o qual favorece a reiracção das par- tes distendidas. Porém o effeito mais constante pela evacua- ção do sangue , he que o fluido humoral, ou a serosidade , mais, ou menos acre, e mordicante , de que então as cavi- dades se descarregão , vão a occupar , e encher o vácuo dos vasos : e eis e como o sangue se altera , sendo antes puro. O homem certamente seria mui desgraçado, se só podesse ob- ter alivio á custa de sua própria existência ,* e calmar suas deres, destruindo, e perdendo a faculdade de as ressentir. Muitos crêm que pela sangria se tira o sangue' pisado , ou coalhado. Abramos bem os olhos, e veremos que o erro a este respeito chegou a seo mais alto gráo. He sem duvi- da que o melhor sangue he o que sahe pela picada, e o máo, se he que o ha , fica nos vasos. He igualmente certo que a lentidão da circulação determinada pela sangria , im- pede que o movimento circular rarefaça este mesmo sangue , e o expulse pelas vias excretorias. Huma porção de bom vinho, e velho, misturado com huma pequena parte de água, em que se faça ferver huma pouca de canella com sufriciente quantidade de assucar, he huma bebida que dá tom, e acção aos vasos; e produz seguramente excreções, a fayor das quaes o sangue se depura de matérias , que de outro modo seria forçado a depositar em alguma cavida- de. (1)^ Crê-se que a sangria, ou as sanguexugas, são o pre- servativo contra os engorgitamentos, ou depósitos interiores , que, sem a applicação deste meio, se formarião , segundo a opinião de quasi todos os práticos. Porém a boa rasão mostra que para prevenir hum deposito ,. he necessário eva- cuar logo as matérias, que o podem formar; ora a sangria não tendo tal virtude, pois pelo contrario 9 pôde favorecer-, lie portanto nestes, como em outros casos , que erradamente se uza da sangria e sanguexugas. (1) Se o ferido tem febre , deve sem duvida preferir se o purgante para o evacuar , a esta bebida tônica, que só lhe pôde convir depois do accesso. Ha muitos outros casos além dos já apontados ( taes são geralmente os das enfer- midades puramente internas), em que esta mesma bebida he recommendada para reanimar as forças de abatimento, deter- minado pela enfermidade, ou violência de qualquer crise,. geado dada em pequena dose, em curtos intervallos > e di- ingírrio-se segundo a prudência o exigir. (26) A evaeuação do sangue he sem duvida hum flagello in- troduzido peia Medicina antiga e moderna , e nada annuncia, o fim de seo Império sobre a infeliz espécie humana. (1) Ha ainda outros muitos não menos terríveis. O Mercúrio e a Quinna. O Mercúrio, seja qual for o motivo de sua applicação , e a maneira de o administrar, he sempre hum dos maiores inimigos da espécie humana. F&IIaremos mais extensamente sobre este mineral, quando tratarmos das enfermidades ve- íiereas. A Quinna pôde ser considerada como causa de infinitos accidentes , quasi sempre irremediáveis. ( Citaremos muitos exemplos, quando fatiarmos das febres intermitentes, e ou- tras moléstias. ) Esta espécie de tônico só pôde ter a acceitação daquelles, que não querem que a causa da atonia seja a das enfermidades, que elles estão ainda longe de querer reconhecer. Banhos em geral. Os banhos são quasi sempre perniciosos. Se os seos máos ef- iéitos estivessem bem conhecidos , só usaríamos dos banhos de limpeza, ou lavagem. He hum erro crer que se possa, sem perigo , pôr o corpo humano de infusão, ou quente , ou a frio ; assim como o he negarmos a deterioração evidente dos.. corpos em infusão, ou também collocarmos o homem na es- pécie dos animaes amphibios , insultando assim o.bom senso.. flj Quantas victimas da perda de sangue se nos não, íipprescntão enternecendo-nos, e movendo a nossa compai- xão ; com os vasos vasios de cangue , e cheios da corrup- ção infiltrada, á medida que as veias abertas tem derramado o principio da vida; com toda a pelle impregnada de bilis corrompida, e outros líquidos não menos debilitantes; com numa cor livida ;. os lábios pallidos ; os olhos moribundos; hum abatimento total; hum fim próximo.... Como á vista do hum tal desastre , aquelle que bem conhece a causa, e que observa com piedade , se poderá conter , e não chamar bár- baros até áquelles mesmos, que por seo desmazelo e indifiíx rença todos os dias se fazem compliçcs ? ( 27 ) Banho quente. He incontestável , que hum instante depois da immer- são no banho quente, as veias se torna o mais turgidas, e que isto se manifesta promptamente. Os vasos , que não são apparentes , também se inchão como os que o são ; e os de maior calibre , como os de menor, soffrem igualmente o mes- mo. Porque se faz este augmento de volume nos vasos , se não porque o calor da água os dilata, e em conseqüência contém maior quantidade de sangue , do que a que conti- nhão antes, por isso que seo diâmetro foi engrandecido? (1) O desmaio, que sobrevem a muitas pessoas no banho, não. pôde ter outra causa mais que a maior quantidade de fluido humoral chegado ao sangue , o qual opprime a sua circula- ção , e ameaça intercepta-la. Observa-se na pessoa, que acaba de sahir do banho, que os vasos tornão insensivelmente a seo estado natural , e que tanto os grossos , como os pequenos , se restabelecem á sua dimensão ordinária. Não he para duvidar, que a ausência do calor faça cessar a dilatação , e que huma temperatura opposta faça contrahir as veias. Estes fazem refluir a porção do fluido , que deve voltar ás artérias. Porém neste caso particular , a serosidade, que accompanhou os fluidos durante o effeito da dilatação , e que pôde a favor dos vasos mais tênues chegar ao tecido das carnes, e sobre as membranas tendinosas , e (1) Hum intitulado Doutor, e que se julga mui hábil na arte de curar , nos diz, qae o calorico faz o excesso de plenitude , assim como produz a dilatação , mas nós susten- taremos , que este excesso provém da massa dos humores flui- dos, difundidos em todas as vias da circulação, que delles a descarregão , á medida que a infiltração se faz a favor da dilatação produzida pelo calor do banho. O mesmo sábio nos pergunta, onde he a origem destes humores, e por que via se introduz este fluido na sua circulação ? Dir-lhc-hemos , que tem a mesma origem que o sangue, e que como o de hum fogão, d\>nde sabe o fogo, e fumo, ou como dolagar, que espreme o sumo das uvas , cujo suco , e fezes , entrao no tonnel pelo mesmo lugar, esta origem commum está nas en- tranhas. Explicaremos no Cap. VII. como o fluido humoral m distribuo por todas as parles do Corpo. ( 28 ) nervosas , até ao periostheo , e corpos ósseos , com diuicul- dade se rarefaz. Esta serosidade mui abundante, ou acrimo- niosa , se demora quasi sempre sobre alguma destas partes. Também vô-se freqüentemente que os banhos quentes, que applicão aos accessos da dor, a augméntão em vez de dimi- nuir. Quantos exemplos não se poderia citar de enfermos , que sahern tolhidos do banho? Quantos outros não tem acha- do nelle o termo da duração da sua vida , porque a plenitude humoral tem fe.to parar de repente a circulação do sangue , que não pôde vencer sua resistência ? As illusÕes enganão, mas os factos aclarão , e não enganão jamais, (lj Banho frio. O banho frio , como se sabe , produz h'im effeito con- trario ao banho quente. Cerra, e estreita de tal modo os vasos , que com difficuldade se pôde ver huma vêa. Faz re- fluir para sua origem humores fluidos existentes nos vasos no momento em que se entra no banho. Se a volta destes fluidos não pôde verificar-se , não deixa o sangue de circu- lar, e a compressão dos vasos não mata o doente, ou não oceasiona vários accidentes? Suppondo que não causem engorgitamento na circula- ção , he pelo menos preciso que se accommodem em outra parte ; porquanto a abundância he em rasão da reducção de diâmetro tanto dos mais grossos , como dos pequenos va- sos , e he particularmente nestes, onde a serosidade se de* morará , por não poder rarefazer-se. Daqui nascem todos os accidentes, que se devem recear do banho frio» Banhos, sulphurcos. Ma alguns annos se tem introduzido em Medicina o uso dos banhos de vapores , sulphureos e das águas thermaes; c cada dia, se augméntão os - estabelecimentos deste gênero. Diremos a verdade, a nossa pratica não nos tem dado hunj (1) Todos os nossos theoricos sobre o caloiieo não podem pretextar causa de ignorância a respeito destes accidentes mui freqüentes e numerosos ; accidentes que o publico conhe- ce tão bem como elles. Pretenderão que a matéria do calor se* ja só a causa ? Sim certamente , pois que negão , contra toda a rasão, a existência doi humores nos vasos sanguinec% (2oy s. exemplo de felizes resultados obtidos pelo uso destes ba- nhos factícios. Quando muito tem elles a vantagem de se- rem classificados na classe dos palliativos. De quantns arre- pendimentos ( e já tarde ) não temos sido testemunhas do» doentes, que se tinhão confiado demasiadamente no pratico, que os aconselhara, e cujos pareceres tinhão cegamente se- guido ! ° Conclusão sobre os banhos. Debaixo de qinlquer rela-ão que se olhem os efléitos dos banhos em geral, não se vê senão perigo em seo uso. Vãmente se procura pela dilatação dos vasos provocar hu- ma transudação de humores por meio do banho quente, e depois o tom das partes pelo banho frio*: a verdade he que so podem inveterar as dores , e mais affecçÕes , tornando-as incuráveis , puncipalmente se tem sido prolongado o uso destes banhos. d- E como estes banhos, estas aspersÕes , estas fumigaçoes , que se usáo por moda., podem ser meios cura- tivos.^ Fazem elles sahir dos corpos as matérias, que causão as enfermidades? Estes e outros, muitos meios se usão, por se não ter conhecido a causa das enfermidades , como se de propósito nos quizessemos afastar da Natureza. He preciso appro- ximarmo-nos quanto mais perto delia, se quíiermos possuir a arte de curar. Águas mineraes. Confia-se muito ainda nas águas mineraes. ÍTe hum- meio quasi sempre dispendioso , que por conseqüência nao pode servir senão- aos doentes ricos; mas todavia he meramente hum palliativo, que só he bom como objecto de recreio, ou de divertimento. Ordinariamente se recorre ao uso destas águas depois de haver tratado o enfermo longo tempo , e ter esgotado os meios pharmaeeuticos. Parece hum estra' tagema, que não approvaria aquelle Medico, que estivesse bem inteirado da causa das enfermidades, e seos meios eu- rativos , porque lhe he demonstrado, que, se para restabe- lecer a saúde , se tivesse empregado os meios, que a Natu- reza offerece ao discernimento do homem, em oito ou dez dias se teria curado o enfermo , evitando-se por conseqnenda os incommodos , dores, longa e dispendiosa viagem, eo trabalho de beber tão grande quantidade d1 acua, sem ter sede. (I) (1) A este respeito remettemos á obra, que tem por titu- (30) Específicos. Os específicos ainda fazem a esperança dos que gostão do maravilhoso, destes que tem a infelicidade de não querer comprehender a causa das enfermidades, mesmo sendo-lhes demonstrada. He verdade que o maior numero destes remé- dios não faz nem bem nem mal; não são difíceis de admi- nistrar , e nem os doentes repugnão ; e esta he a rasão, por- que não são despresados. Levãoos á sepultura, porque não fazem caso do perigo imminente, a que se expõem. Alguns destes específicos , cuja maior parte se vende por alto preço , e cuja base he sempre veneno, tem sectários e partidistas entre pessoas, que se jactão de saber, porque a Chimica tem chegado a convence-los que nos podemos inpunemente en- venenar , ainda quando seja acertado evacuar as matérias al- teradas ou corrompidas. Admittem , como principio, que hum veneno destroe o outro; e eis as entranhas do pobre, transformadas em laboratório de Chimica. Os motivos , que nos obrigão a reconhecer a utilidade da Chimica , quando se applica ás artes, nos faz duvidar da perfeição, que ella possa dar á ajte de curar, o que tanto se deseja. Innumeraveis auctores de específicos tem sido muitas ve- zes tratados de charíatães. Ah! E quantas vezes tem elles recebido este nome daquelles, que o merecem mais que elles ! Muitos dirão o contrario ; mas ha muitos que civm, que estes remédios não terião huma grande reputação , sem hum privilegio de venda, o qual parece torna-los mais effic;izes. Costumado por princípios a indagar a causa de todos os effeitos , achamos que os charíatães só tem séquito pela insufnciencia da Medicina ; pois que se pôde ver , que mui- tas vezes certas pessoas fazem mais depressa hum charlatão , do que eu rã o hum enfermo. Merece este nome, aquelle que lhes mostra hum caminho , que lhes he desconhecido , e que ô não querem conhecer. Aquelle, que se affasta dos limites da Arte , he por ella julgado hum innovador , digno de todos os anathemas. Prodigalisâo-se então as qualificações as mais odiosas, o que não exige grande gênio ; em lugar de que para curar se faz preciso ter bastante talento para ad- Jo — o Charlatanismo Descoberto — por hum amigo da ver- dade e da humanidade, 3.* Edição, em que se achão fortes raciocínios, claros e evidentes. ( 31 ) quirir o principio verdadeiro , e pô-lo em pratica. Porém quando milhares de enfermos comprovão huma cura, já não ha charlatanismo. <; Quaes são os verdadeiros charíatães? Os privilegiados , cujos títulos estão escriptos debaixo do véo do trro, em que se deixão ver grossos caracteres. Porque se ha ds enfermos. Segundo a declaração unanime dos escritores, que tem dndo sua opinião sobre o magnetismo , parece que todos estes phuiomenos tão milagrosos *e reduzem aoa effeitos da ele- tricidade repetida até a inteira resolução dos fluidos, que cau- são a enfermidade , então objecto das operações do magne- tismo, g he esta a rasão, por que muitos enfermos , recebendo o choque , cahera huns no lethargo , outros em convulsão :, ou experimentai* outros effeitos , que os magnetisadores chamai.» crisc3 , aind i que não se siga evacuação alguma , o que se não pôde £uhniu:r , pois que, crise, e evacuação neste caso, são synonimos. Estes cífeitos se limitão pois á dissolução , c resolução da porção de fluido animai, que existe na parte e:iferma . e que as commcçúcs fazem entrar na via geral da circulação. 5 ü ( 36) Pôde resultar alivio , bem como excitar o mal , segundo a direcção, ou posição, que a fluxuo tomar -definitivamente , porque deve-se fixar em alguma parle. Mas certamente não se podem curar , sendo as enfermidades causadas por maté- rias corrompidas , de que a Natureza se deve desembaraçar. Se se quizesse reconhecer a causa das enfermidades , e or» meios de a destruir , não se recorreria a similhantes pue- rilidades ; e não se faria caso da descoberta de Gr.lvani, que julgou poder resusciíar os mortos. ; Não he já tempo, que o homem saia deste estado de incerteza , e de ignorância , que o obriga a confessar , que o que elle menos conhece he a si mesmo ! E quando se poderá deixar de dizer , que os que em Medicina tem muito talento, são os que mostrão menos discernimento , e que rejeitão mais obstinadamente as- verdades evidentes ? Tópicos exutorios da pclle. Em quanto se tratar -de enfermos só pelos tópicos, me» dicamentando-os assim exteriormente , não se mostrará conhe» cer bem o interno , e não se curará jamais enfermo algum. <: Como se pôde esperar o restabelecimento da saúde de hum valctudinario, como salvar lhe a vida pela applicação sobre a parte soffredora de todos estes ingredientes, de que geral- mente se compõe os tópicos ? Todos conhecem bem o resul- tado por experiência , e que ninguém se pôde sustentar por ali- mentos exteriormente applicados : o effeito he o mesmo , e a comparação justa. Entre estes tópicos ha hum, que he muitas vezes útil, mas cujo abuso o torna prejudicial , porque se lhe attribue mais propriedades do que realmente tem: he o emplastro vesicatorio. A propriedade, ou effeito deste emplastro, he. atírahir' a si a flúxão, que circula nos vasos com o sangue, de que huma porção se juntou , e fixou sobre qualquer parle, e occasiona a dor . assim como pôde mais, ou menos promp- tamente destruir hum órgão. Por conseqüência o mérito deste emphstr» , he desviar , ou divertir a serosidade , ou obviar sua demora na parte, onde o sangue a trouxe. Mas este tó- pico , que só faz mudar a fíuxão , r.áo pôde evacuar sua totalidade por sua força attractiva , c exsudação ; e menos cxpuhar as matérias contidas nas cavidades, donde esta sero- sidade tira a sua origem. He por isto, que consideremos os cmplaslros vesicatorios , só como hum auxiliar do tratamento (37) geral de nosso methodo , e que este deve ser continuado co- mo se se não tivesse usado deste tópico , e da maneira in- dicada nos quatro artigos de tratamento prescripto no Cap. XX. He hum erro applicar o vesicatorio sobre o lugar da dor, ou na sua visinhança,; por quanto , por isso que este tópi- co attrahe a Jluxão, he evidente que se sobrecarrega a parte em que se applica , em lugar de a desembaraçar da porção deste humor, que alli existe. Enganão-se pois se por occa- sião - da dor no peito , se poe hum vesicatorio entre as es- padoas , ou sobre as verti-bras , ou sobre o esternon , segundo que esta dor se fixa para alguma destas partes , em vista de attra- hir o humor ao exterior. Devia-se saber , que a pelle, que envolve todo o corpo, não tem communicação com as parles contidas no interior das cavidades , o mesmo se deve dizer , relativo ás aífecções dos olhos , ouvidos , e outras partes da cabeça ; he nos braços que se devem applicar estes emplas- tros , e não na nuca , ou por detraz das orelhas , como or- dinariamente se pratica. Nas enfermidades graves de todo o habito do corpo , as pernas , e algumas vezes mesmo as coixas , são os luga- res mais convenientes para esta applicação. A violência das dores locaes , ou os perigos, que corre o órgão aíiectado, ou o que ameaça o enfermo , devem ser- vir de regra para saber se se deve applicar nos dous bra- ços, ou somente em hum; nas duas pernas, ou só em huma, assim como em outras partes do corpo; e fica-se com liber- dade de applicar segundo ; e não ha casos (pelo menos são mui raros ) , em que se deva applicar nas duas extremida- des , superior, e inferior, ao mesmo tempo. Quanto mais tempo se demorarem os cmplastros sobre a parte , mais Jluxão attrahem ; e por isso não se deve tira- los senão quando o enfermo não poder soífre-los mais; e isto accontece, quando a serosidade assim attrahida o faz soffrer cruelmente por seo calor ardente, ou sua acrimonia. He por esta acrimonia que se pôde julgar da malignidade desta ma- téria , e consequentemente reconhecer, com a necessidade de desembaraçar o enfermo' delia , os perigos, em que sua vida tem estado até o momento, em que esta porção tão nociva de humores pôde ser tirada das partes orgânicas e motrices da sua vida ameaçada. Não só seria imprudente tirar os cmplastros antes de terem obrado ,. mas seria cm muitos casos prejudicu- os en- fermos. Temos o exemplo de hum enfermo conservado dez dias; sem nada sentir, e foi ao fim deste tempo que fa« C 38) zendo desvanecer a Jluxão , que embaraçava a descarga , st operou a crise, isto he evacuações consideráveis, que poze- rão a pé o enfermo, que já estava desesperado. Em caso tal de demora de effeito he útil para ajudar a acção destes emplastros nas pernas , applicar outros nas coxas. Accontece que muitos não produzem o effeito, que se deseja. Isto deve ser huma prova não equivoca de huma grande corrupção , ou podridão interna ; e então o perigo he immitiepte, quando não se fazem sentir no espaço de dezeseis horas. Tirados os emplastros , evacuada a água das vesiculas , deve-se applicar logo outros para attrahir mais ; e depois de tirados estes, curão-se as feridas como de ordinário. A continuação deste methodo abrevia muito por huma pronta cura a dilação ordinária destes curativos. Quando he necessário fazer conservar longo tempo o ve- sicatorio no braço , por males rebeldes , seja nos olhos ou em outras partes da cabeça, os quaes o uso da purga não tem podido destruir , he preciso vêr e acautelar que a per- manência deste emplastre não altere o braço, ou tirando-lhe o vigor, ou dessecando-o pela fluxão, que se fixe sobre esta parte. Logo que isto se observa , he preciso applicar outro emplastro no braço opposto , e supprimir o primeiro. Mais de huma vez se tem observado que a acrimonia dos vesicatorios se dirige ao collo da bexiga a ponto de suspender a evacuação da ourina. He forçoso neste caso ti- rar o emplastro para o tornar a applicar depois que o enfermo tenha ourinado. Muitas vezes temos observado que os vesicatorios com- municão esta acrimonia á massa dos fluidos, e que hum mais longo uso deste tópico causaria grandes prejuisos aos enfermos ; he por tanto preciso neste caso supprimi-lo. Se seguissem exactamente o nosso methodo , raras vezes haveria necessidade de recorrer aos vesicatorios. Em caso algum não se deve applica los sem fortes rasÕes ; pois que este meio , que não he verdadeiramente curativo, he mais ou menos do- loroso, e que pôde gangrenar a parte. (1) (1) Este accidente pôde accontecer aos enfermos, cujos humores., são de má natureza, e a quem se tivesse applicado os vesicatoiios antes de tempo , isto he , antes de haver ex- pulsado huma sufficiente quantidade da putrefacção, que seo corpo contém, Apparecendo este accidente, deve-se applicar (39) Empregão-se rmtros diíferentes meios exteriores como o cauterio, sedenho , sinapismo , ventosa, moxa em vista de fazer diversão ; porém he como se quizessemos arrancar pelos ramos á arvore, que tem profundas raizes. Não cederá se se não attaca directamente. Estes meios só podem convir á me- dicina palliativa , de que fatiaremos mais adiante. As pessoas, que por causa de quaesquer affecçnes chro- nicas entretem na pelle algum exutorio ( como o vesicatorio, sedenho , e o cauterio ) notarão ao principio huma mais for- te erupção que do costume; aceontece como em huma ul- cera, cuja suparação augmenta pela diminuição de movi- mento dos humores. Depois , e á medida que a erupção se elanguece , diminue-se a acção do exutorio , e se supprime por grãos. Então he indispensável que os enfermos continuem o purgante, segundo as indicações do Art. IV., da ordem, do methodo , e até a cura. Mas a respeito das pessoas avançadas em idade, e va- letudinarios , e de quem se não pôde esperar huma cura ra- dical , he da prudência deixar-lhe o exutorio, com tanto mais rasão, quanto a prevenção teria força , se estas pessoas che- gassem a experimentar algum accidente posteriormente á su- puração de seo exutorio. CAPITULO VI. Dos temperamentos. Segundo a vontade do Creador , a mãi transmitte a seo filho , formado de seos fluidos , a sua constituição phisica» e' a causa de sua mortalidade. Se a mãi he enferma , seja que a impuridade dos humores de seo marido tenha preveni- do os seos, seja que esta corrup. 5o provenha de outra causa, o menino pôde adquirir hum temperamento pouco r. busto ; ainda mais , reerber a enfermidade com a sua causa suscep- tível do mais funesto desenvolvimento. Eis aqui a origem das enfermidades inherentes á existência de muitos indivíduos ; e he também esta a origem das constituições phisicas , chama- das temperamentos, e a causa das variações, que experimen- tão , durante o curso d*sta mesma existência. He por es»tas considerações , que se deve rccommendar purgante aeúvo para evacuar promptamente a matéria graa- grenosa. ( 40 ) muito aos homens, e mulheres, que se casem em estado de psrfeita saúde , o que geralmente se despresa; o mesmo de- ve fazer durante a sua união; e deve abster-se do matrimô- nio , quando huni dos dous está enfermo , e ainda menos quando ambos não gosão de saúde. Aquelles, que o fazem, não reflectem, cedem a hum sentimento puramente brutal; tem esquecido , e despresado a rasão, para se entregar á paixão de brutos , sem attender , que as conseqüências podem ser extremamente perniciosas a seos filhos , e mesmo a elles, pelas rasões expendidas no Cap. II. Divisão dos temperamentos. A divisão dos temperamentos em bilioso, sanguineo, ou de diverso modo chamados, segundo differentes auetores, deo causa a hum erro, em que tem cahido muitos práticos. Pre- tenderão que o sanguineo he particularmente Sujeito a ter muito sangue. Todos os entes, sem duvida, tem huma cons- tituição , que lhes he própria , e hum individuo pôde ter mais sangue, que aquelle, que he de hum tamanho, e peso igual. Outro pôde ter mais bilis , mais fleugma , mais gordu- ra, mais humores em fim que outro; mas he também verdade, que o sanguineo não tem mais sangue do que o que lhe he necessário para conservação de sua constituição; pois he cons- tante , que todo o que soffre huma perda deste fluido , ex- perimenta huma deterioração , ou debilidade em sua saúde , durante sua vida. Negar esta verdade, seria o mesmo que dizer , que a-natureza he incerta em sua marcha , e não re- conhecer que ella he mais sabia que o homem. Tem-se admittido huma superabundancia de sangue nos indivíduos, que tem o rosto mui vermelho, e susceptível de se enrubecer ainda mais por qualquer exercício , ou impres- são sobre sua constituição phisica ou moral; julgão appoiada esta opinião, quando no mesmo individuo se observa huma oppressfio na circulação dos fluidos , algum engorgitamento , dores de cabeça , vertigens , fluxos de sangue pelo nariz ; por exemplo quando huma mulher soffre regras immoderadas, ou perdas sangüíneas. Para sermos de accordo com a Natu- reza, deveríamos reconhecer que, seo sangue nos vasos des- tas pessoas não tivesse em mistura comsigo partes^ heterogê- neas, não experimentaria embaraço na sua circulação; e que a causa desta dificuldade e conseqüência he huma substan- cia aquosa: chamemos a cousa por seo próprio nome, he como a água que se mistura, com o vinho (rubro ) sem pos (41 ) isto ser a sua cor e substancia sensivelmente alteradas. Etlu, água he a mais límpida parte fluida dos humores. He a serosidade humoral, que obra quando ha calor excessivo , oa quando sobrevem perdas, dores, engorgitaraentos, inttimei- ceneias , e outros accidentes de qualquer natureza que sejão. Estes temperamentos não são tão vantajosos, como se quer imaginar. Se estes indivíduos cedem a esta opinião, con- sentem em perder muito sangue , pois que acreditão ter mui- to , e por este erro se tornão cacochymos, asthmaticos, hy- dropicos , apopleticos, &c. &c. Se pelo contrario elles ti- vessem bom senso de despreear estes prejuisos , e erros bem funestos, conservarião o motqr de sua existência ; purifi- ca-lo-hião , e prolongariáo a vida, evitando os accidentes, que os arrebatão em huma idade pouco avançada. O ente menos favorecido relativamente á saúde , he aquelle , em que predorninão os humores , ou que recebeo com esta constituição humoral alguns vicios, de que seos pais ou ama, estavão mais ou menos infectados, ou que senão purificou de huma enfermidade , que soífresse. Vê-se então existir nelle hum germen de corruptibilidade susceptível das mais funestas conseqüências , por sua disposição a receber a impressão das causas corruptoras. Por conseqüência está mais sujeito que outros a freqüentes enfermidades, ou a huma morte prematura. CA PITULO VII. Bre::* exame sobre as funcções do corpo humano. O conhecimento das funcções do corpo humano podem dar huma illustração vantajosa sobre a causa das enfermidades s e he de grande utilidade para a intelbgencia do que se dis- ser neste methodo sobre a marcha de se;> tratamento. Distin- guern-se estas funcções em vilães , animaes , e naturaes. A cir- culação do sangue , a dos espíritos , ou & acção do cérebro , e a respiração , eutrsTo nas primeiras. Os movimentos do cor- po , e o exercício dos sentidos se atíribuem ás segundas. A digestão , 2 nutrição , a tiitração , o crescimento , a ge- ração , e as dejecçÕes pertencem ás terceiras.^ Aí, duas primeiras estão subordinadas ás funcções na- turaes , porque, logo que estas se não füsem , as vitaes , e animaes ficão ameaçadas de cessar também. He das funcções naturaes , que no» vamos oecupar , mas em resumo , e no que sito relativas ao nosso objecto, 6 % (42) FnncçÕes naturaes. Sahs-se , e o dissemos já , que o Creador sujeitou to* J«s os entes a alimentar-se , para entreter a sua existência , £';,; o que perecenão de fome, ou inanição. A boca e os dentes fazem o trabalho da mastigação (- mastigar ). A língua, o pharinx , e o esophago ( conducto da beca ao estômago ) fazem a deglutição ( engolir ). O esi tornago recebe os alimentos pelo esophago para fazer a diges- tão. Logo que são assim preparados por este ventriculo para servir á nutrição (acção de nutrir) , os alimentos descem aos intestinos pelo orifício inferior chamado pyloro. Os intestinos em numero de seis , chamados também tri- pas, piincipião deste orifício. Os três primeiros são os del- gados , e tem este nome por serem mais pequenos qüe os ou- tros. O primeiro contíguo ao pyloro se chama duodeno; o segundo jejuno ; e o#terceiro ilion. O primeiro dos intes- tinos grossos se chama cego ; o segundo collon ; e o tercei- ro recto. A este ultimo está unido hum músculo chamado sphincter, destinado a fechar e abrir o ânus, para reter, ou deixar saliir por sua dilatação as deiecções diari ;s. Os in- testinos fazem no baixo ventre, que os encerra, dobras e vol- tas sobre si mesmos; e se achão prezos por ligações das membranas e das visceras. O nome de tubo, ou canal intestinal, se dá também aos intestinos. Muitos auetores tem mesma dado este nome a toda esta parte das entranhas , que se emende dê*de a boca até o ânus, sejão quaesquer que forem as divisões c deno- minações , as suas funcções não experimentão mudança. Vamos fallar a este respeito. Comparemos aqui o canal intestinal ao rio , que le- va pelos canaes , que a Natureza , e mesmo a arte tem pra- ticado, a abundância e benefícios ás regiões, que elle banha com suas águas. Assim o canal intestinal, provido dos prin* cipios alimentares, distribuo por toda a economia animal O' reparador das forças , suprindo as perdas. Kmfim he hum attento e vigilante provisioneiro , que distribue (e diremos como ) a vida a todas as pastes, que sem esta providencia percecerião-de extenuação c inanição. Passagem do ehylo ao sangue. As veias lácteas são pequenos vasos , ou delgados tu- bos, que. nascem das túnicas internas dos primeiros intestino*. (43) Absorvem continuamente o fluido contido nesta parte do »»- ü?.l ; mas particularmente , e segundo o emprego , a que a Natureza os destinou , absorvem o óleo doa alimentos á me-* dida que a digestão se faz. Estes pequenos vasos , em gran- de numero na sua origem, se reúnem muitas vezes, e por ultimo em hum só canal chamado thoracico. He ejste , que vai lançar na veia subclavea esquerda o chv'o, que as veia* lácteas absorverão , e tirarão dos alimentos. He pois pelas veias que o sangue repara suas perdas; e r.s emprega ainda no entretenimento das funcções em geral , jogo e armoni* de todas as partes, que compõem o individuo , pelas distri- buições nutritivas , conhecidas debaixo do nome de se- C» l; y *^*»-S• Circulação do sangue. Os vasos venosos mui multiplicados , e conhecidos de* baixo de muitos nomes , depois de se reunirem muitas ve- zes , formão finalmente as duas principaes veias, designadas pelos nomes de veia-cava , e veia pulmonar : estes dous va- sos des peja o o sangue nas auriculas do coração. Este mús- culo ecucavo , o principal órgão da circulação , por sua contracção c movimento secundário dos seos dous ventncu- los, envia o sangue aos dous troncos arteriaes , chamados artéria aorta , e artéria pulmonar. Estes troncos principaes distribuem o sp.nrjr.e a todas as partes do corpo pelas nu- merosas subdivisões arteriaes até &s veias, com as quaes se. unem , e estes últimos vasos o reconduzem ao coração, co- mo acabarr.os do di.ar , durante leda a vida do individuo. Vias excretar "ais. Nas vias díi circulação ha humores, que circulão com o s sangue, pois cue muis;^ visceras são destinadas a fzucr a separação destas duas esp^les de fluidos. As substancias rd ■ mantidas experimer.tão por consesjv.en- qia huma nova purificação, que he necessária , e vamos a tlirer como se faz. Os rins fflücm a separação do fluido humoral,_ que passa pelos ureteres á bexiga , e daqui por meio da dilata- ção do seo sphinctcr ao canai da uretra , d1 onde sane , de- baixo do nome de ousina. O figado per sua ccção separa a biiis do sangre. Os canaes , cysdco , hej :.iico , panercai:; o , cíiolidoco, q outros canaes excreícr.ics , que se sabe, vem das vias da: 6 ii (44) .>rr,rdação , e tem sua abertura no canal intestinal, trazem aos intestinos huma porção de bilis , e dos humores , que o sangue sepsra , por ser de huma natureza heterogênea , e que se não pôde ligar com elle. Mc evidente que o canal intestinal he susceptível em sua parte, inferior , ou tripas , de hum movimento que se chama peristaltico, para designar que se faz de cima para baixo. Hc a favor deste movimento que sabem a matéria fe- e.iú , e as outras dejecçÕes, que alli trazem os canaes excre- torios , de que filiamos , quer estas evacuações se facão naturalmente , quer sejão provocadas por hum purgante qualquer. Nota-se também que a parte do canal , que se chama estômago, he igualmente susceptível do movimento peristalti- eo, mas o he também de hum movimento opposto, como se vê pelo vomito natural ou provocado. Entretanto não se pôde chamar antiperistallica esta contracçáo do estômago ; porque esta denominação só pertence a hum estado de en- fermidade , que não he sem risco , e na qual o doente pô- de vomitar até as matérias fecaes. Conhece-se outro vomito , conseqüência da obsfrucção do orifício pylorico, que não he certamente menos perigoso que o precedente; pois que, quando esta obstrucção he com- pleta , não ha mais eomrnunieação entre o estômago e os intestinos. Consequentemente ao que acabamos de dizer, o canal intestinal pôde ser comparado também pela sua íórma , onjani- sação , e funcções, a hum rio, que recebe infinitos regatos. Concebe-se facilmente que o livre curso deste vio favorece o dos regatos. Concebe-se igualmente que o curso do rio não poderia ser retardado, sem produzir hum efTeko de repulsão a respeito dos regatos , que elle recebe. Muitas vezes se observa que, quando o rio es*.; muito cheio , ha inundação nos lugares, por onde passão estes regatos, os ««unes achão hum obstáculo á sua desaguação. A pura rasão, e isenta òe systemas, reconhece que o que se passa no corpo hu- mano, canal intestinal, artéria , e veias, he a imagem sim- ples e natural dos rios , e dos regatos, que nelle dtsaguão. A lei da circulação hc r« mesma em toda a Natureza. Não he de algum modo claro que a plenitude do ca- nal intestinal refluo ao3 vasos sangüíneos , e que nelles cau- sa todos os embaraços, que experimentão, pelo engorgitanaen- to dos canaes excretorios, de que rioabamos de fallar ? He ( 45) menos sev.sivcl que se os soccorros da arte se dirigirem sobre este mesmo canal por tratamentos análogos ao estado de ple- nitude humoral, cm que se acha, as vias da circulação se desembaraçarão das matérias, que prejudisão á saudc ? Quem pôde negar oue, quando a água ' do rio corre , as do regato coricra do niâsmo mudo ? CAPITULO VIII. A Medicina paliiativa , e a Medicina cvmiiva em parallelo. Medicinei palito fiva. A Medicina paliiativa não pôde fundar-ee nos meius, que ternos notado como perigosos, no Capitulo quinto. Ella st ée funda sobre o systema geral dos diluenter , absorventes ■„ eu calmantes ; sobre os ditlerentes tratamentos, de que fal- íamos no mesmo Capitulo ; sobre hum regimen , mi modo de viver, tanto piiisico como moral, apropriado quainn possível ao estado de enfermidade. He sèm duvida appiicavel aquelles, cujos males são re- conhecidos incuráveis , ou pela idade m-uto avançada , anti- güidade de sua moléstia , viros de sua constituição humo- ral, ou de conformação; ou em fim por accidentes interio- res, que tenhão sobrevimb por q-islqutr causa , e que sejão de natureza a oppor-se ao tratamento , propriamente chamado curativo. O homem não se pôde curar dos seos males em todas as épocas da sua vida; e, ie assim não -*-;çe, seria eterno. Não obstante não ha motivo para m-gar que muitos der- mos , que sofFrião moléstias inveteradas , se curarião por es- te methodo, se se lhes tivesse applicado dês de o principio da enfermidade, em lugar dos traír.m^n-os nocivos ou insufi- cientes que temos notado ; e r.'o he isto huma rasão bas- tante para julgar que taes enfermos pereção tão brevemente. Ainda que os humores de hum enfermo estejão corrompidos, não estão sempre em putrefação. A degeneração destas ma- térias não tem a mesma acção em todos os individuo». Vê-se morrer huns em poucos dias , e outros resistem muitos annos em hum estado de langor. Segundo estas verdades , e con- siderações , a arte se dividirá sempre em Medicina paliiativa, de que acabamos de fallar, e eiu Medicini Curativa, da quai (' 46 ) particularmente nos ■ occ.opamos , e he o Hm, a qve w^ t.Q- pomos neste methodo. Mas a incnrabiíidade de Imm enfermo só pôde ser bem contestada pelo emprego, e inutilidade reconhecida dos me. thodos curativos. He preciso sem duvida não fazer tentativas, que nao tenhao feliz suecesso , porque mio íailão pessoas, que notem as meliiures intenções, o que reprovem até os principies deste tratamento; tão grande he a sua ignmanciã, ainda que tenhão viibto curar enfermos reputados incuráveis , como aquelle que succumbe. Pois a maldade , o e.spiiito de intriga , que c-slão sempre á espreita dos accontecimentos, estão sempre prornptos a lançar suas envenenadas flexas. (1) Medichia Curativa. O Auctor da Natureza teria abandonado o homem, o che- fe d^bra das suas mãos , sem esperança , e sem consolação, no meio das enfermidades, que vexão a sua existência ? Não haveria pois algum meio de a prolongar , e leva-la até este termo, que se aproxima mais dos limites, que elle marcou para duração da vida humana? Se se reconhecesse pela evi- dencia das provas, que existem , que as enfermidades do cor- po humano tem por única causa interna , ou efficiente , a que lemos analysado no Cap. I. , reconhecer-se-hia também , que a arte de curar deve referir-se ao principio da nature- za , e que por conseqüência se reduz ao único methodo, que ella ensina. (2) A medicina curativa, segundo a causa das enfermidades já reconhecida e demonstrada por factos incontestáveis , ain- (1) Se a prudência do pratico chegar a pusillanimidade , quantos enfermos , cuja cura for duvidosa , mas não impos- sível, morreráô victimas desta mesma pusillanimidade, ou de sua própria fraqueza , ou de receios chimericos inspirados pe- los pretendidos males, nascidos do tratamento evacuativo ? (2) Leitor de boa fé, não dês mais extensão a. esta as* serção do que deve ter. E vós , que prcferis vãs idéas ás simples da.Natureza , vós vos julgaes bem foi t es contra quem vos mostra huma verdade útil, quando mettendo a ridículo, pretendeis derríbar este methodo, dizendo que elle pre- tende curar todas as enfermidades. Achareis pabulos , que vos acreditem , mas 03 vossos sarcasmos não farão que fa- ctos auüiSiiúçad03 »ão teahão muHos apreciadores, («) da que digtto o contrario os scos detractores , • os homens imbuídos de prejmsns nocivos , não tem e nem pôde ter outro Meio senão os Pm^stntes, conforme as regra* no seo emprego , e segundo a exigência da natureza, como dire- mos nos quatro artigos da ordem do tratamento , e tal qual está prescripto neste methodo no Cap. XX. Purgar : esta palavra tomada em toda a extensão dé sua accepção significa : dissolver , dividir , subiüisar , ta- re fazer , expulsar , limpar , purificar, fazer visivelmente sahir as matérias, que incommodão. Mas purgar o enfermo até huma cura radical , seja nd caso de huma enfermidade grave , ou antiga , e inveterada , ou recente , he huma pratica tão nova para mnitos , como he conhecido para elles o principio , em que se funda este methodo. Entretanto esta pratica he de todas amais útil e indis- pensável para curar tão pronta e seguramente em todos os: 0*0? de enfermidades recentes, e consequentemente evitar as enfermidades de todo o gênero , cuja longa duração as íaá éhssificar na cathegoria das enfermidades chronien-. Cate me- thodo, que lhe serve de base, e que a regula cm sua ap: plicação , dá por huma parte hum soecorro directo á Natu- reza em s'.;:;õ necessidades , e pela entra regeita a srmgriu, , a dieta , e 03 banhos , &.c. como outros tantos procedimentos perigosos, que causão hum p/rejuiso notável á conservação da existência. Ella offerece de mais grandes resursas curativas contra mniír.s enfermidades chronicas, reputadas incuráveis, de que muitas pessoas padecem , e cuja conseqüência inevitável he a morte , se se não oppoern este meio aos seos progressos. Sem esta pratica a arte he insuficiente , pois que entre- ga a Natureza o cuidado de se curar por ííi mesma, como $e observa todos os dias. Ha mui poucos casos, em que com este methodo não tn curem as mo!e.-;ths recentes em oito ou dez dias. Quantas; victinas morrem em menos de cinco dias de enfermida- de, que a medicina curativa teria podido salvar !.... "Não se adinittiria lambem enfermidade incurável por' sua natureza , se se chegasse a reconhecer a verdade a este respeito, porque enfermidade alguma se appresenta cm seo principio com este caracter; n seguramente tem se appresen- tado sempre enfermidades símílhantes a estas, e de quem o nosso methodo tem triumphado completamente. Não ha por tanto outra causa occasional da antigüidade (43 ) da« enfermidade*, c nv? incurabilidadc, síhão' a negligencia do enfermo em procurar soccorros em tempo que aprovei- tem, (1) ou a insufficiencia dos tratamentos, que se tem em- pregado. (2) Quantos erros, summamente prej;sdiciaes á saúde e ávida dos enfermos, se não comm?ttem todos os dias, principiando os tratamentos por vãos palliativos ! Quem he pois, que não nota o quanto se delibera para reconhecer e classificar a espécie de enfermidade , segundo as regras , que se seguem ! Quem não tem sido testemunha, ou ouvido fallar destes miseraveii debates, que tem .havido, e ha todos os dias a respeito do nome, que se deve dar á enfermidade ? E qusm não tem visto desgraçados enfermos morrerem victimas do tempo per- dido em controvérsias ? Estas desgraças jamais accontecem na applicação âo nos- so methodo, porque elle prescreve, e dá os meios de attâcar a causa da enfermidade , logo que he percebida ; e por en- fermidade entendemos todo o estado de incommodo , ou to- da a interrupção, em tudo ou em parte das funcções natu- raes, cujo exercido deve ser livre e regular, como faremos vêr no nosso Quadro da saúde. CA PITULO IX. Üasões e factos de pratica, a favor da Medicina curativa. Os médicos, que viverão nos diíferentef séculos , se f.jm dividido em opiniões contrarias. O methodo de purgar teve numerosos partidistas , mas o numero dos aníagonisías foi muito maior. (1) Entre os modernos (isto hc os°do décimo (1) Quantos indivíduos indoientes sobre sua conservação, ou pouco instruídos a este respeito , reclamão os soccorros da arte , quando seo corpo já encerra cm si a causa indestruc- tivel da morte ! (2) Quantos enfermos vemos, em quem a causa da morte se estabelece durante o tratamento ordinário , por falta da applicação de meios enérgicos ou sufficientes para expulsar & causa da enfermidade, que a precede ? Que refíexíes deixa- mos a este respeito aos homens sensatos , que lerem a nossa obra , e souberem apreciar as nossas intenções ! (5) Tendo-se augmentado o numero dos Médicos, foi pre- ciso complicar, barulhar a Medicina, tirar-lhe o que tinha (49) nono século ) lançarião todo3 os anathemas contra os que se declaiasrem em favor deste methodo , accelerados e repetido em rasão da necessidade. í Os que se esforção em figurar hum quadro espantoso do methodo purgativo , são de boa fé? Muitos tem prova- do o contrario , por motivos , que não só elles conhecem , como ha, ma»s observadores, que o tenhão reconhecido facil- mente. Outros , e he talvez o maior numero , embalados com este erro , seguem de bom grado o methodo usual, sem outra bu?rola mais que a pratica de seos antepassados: serão escravo? nntes que innovem. Em lugar de estudar a Natureza, perpetus-ão errados sysiemas ; e quaesquer que sejão os tris- tes resultados, o uso, os prejuisos recehidos , a cegueira ge- gal os justificará , como até agora. v Nós nos julgaríamos culpaveis perante a humanidade, se não tivéssemos empregado todos os nossos meios; se não nos ti- véssemos esforçado a publicar toda a luz, que nos obriga o sentimento da verdade , authorisados , e fundados em nume- rosos suecessos de huma pratica constante, e sustentada! Di- gamos mais , tomaríamos parte no mal , que fizéssemos , e nossa consciência soffrevia remorsos. O methodo purgativo, ou os purgantes, tem sem duvi- da que lutar muito para vencer os prejuízos. O erro tem- hum tal império sobre os espíritos , que se eucontrão muitos enfermos , que não só vem com indifferença , mas até com praser, salnr o sangue de suas veias tanto estão elles per- suadidos , que esta perda lhes he saudável ; e muitos ressentem que se lhes não tire mais. (2) Taes sugeitos estão bem longe de tomar as precauções necessárias contra os progressos da cor- rupção , que os ha de destruir , porque não sabem oppor-se ás suas destruiçÕes. de simples, de positivo, de natural, e de multiplicar os sys- temas, para que todos tivessem que fazer. Quanto mais a Medicina estiver envolvida em trevas , mais Médicos haverá. Hoje ha cinco em lugar de hum syatema , que havia ha trinta annos. i Havia menos enfermos que hoje ? Morrião os ho- mens mais moços , ou mais velhos ? Isto não está ainda re- solvido. . ,„..„, (2) Tal he aquelle , que tratou com hum Cirurgião , e que estipulou, e conveio tm seo ajuste de não pagar a sora- nia , se nãõ corr> a condição do lhe fazer huma boa sangria; e daqui se seguia deixar correr sangue muito tempere em abundância. > por comparação hum homem, cujo pezo seja de cento e vjf- te e cinco libras , julga-se ser o pezo dos fluidos de cem íibi-sp-. Neste pezo admictese o de vinte e cinco libras tanto ern sangue como em liquores ddle emanados , e que servem pa- ra a sustentação, jogo, e harmonia das differentes, e peque- nas partes , e dos diversos órgãos, de que se compõem hum individuo. Abatendo estas vinte e cinco libras, restão seten* ia e ciuco libras de humores. A outra quinta parte se com- põem de partes sólidas as ouses são os ossos, as cartilagens, as membranas , a carne , e a pelle A maior parte dos homens se admirará da grande quan- tidade de humores a respeito das partes sólidas. Admirão-se , porque não advertem que esta massa, que parece enorme, não he mais que huma reunião de tubos ou vasos, unidos huns a outros, e contendo hum fluido; e para prova eviden- te basta picar com qualquer instrumento mais agudo, e fi- no qualquer parte , para que logo saia muito sangue. Jul- gue-se pois, segundo o volume dos humores, que entrão na composição do corpo humano , da insufriciencia dos purgantes pelfcs mouernos , principalmente nos casos, em que todas es- tas matérias ,estão corrompidas ! Porque rasão se receará continuar o purgante até á cu- ra do enfermo , sendo esta pratica fundada sobre as necessi- dades da Natureza, segundo a massa enorme dos humores, ou segundo a cansa das enfermidades ; e quantas experiên- cias reiteradas , não cem , mus mil vezes, tem provado até á evidencia que se tem feito curas as mais inesperadas ? Per- milta se nos aqui huma comparação: pontamos de huma par- te da balança as vantagens do methodo purgativo ; e da ou- tra as vantagens suppostas, ou verdadeiras , que resultão da sangria. Não se tem repetido a sangria até vinte vezes se- guidas e sem interrupção ? Em muitos casos ; em huma en- fermidade aguda, iníiammatoria (a pleuresia verdadeira por ex ) não se repugna a quatro , ou cinco sangrias seguidas, e com pouca distancia, e muitas vezes mais; como não serão arriscadas , e quasi sempre seguidas da morte , pois não ad- mittindo que o sangue seja o motor da vida , o seo volume a respeito do dos humores, está longe de ser iiwxúnguivel $ (55) e se reproduz; lentamente , mesmo havendo bom appettite , o que não pôde ter hum enfermo. Porque não se preferirá usar, era todos estes casos, de quatro ou cinco doses eva- cuantes , dadas com actividade, como o determinámos no arti- go 3 da ordem do nosso tratamento , sendo certo que mui- tos enfermos, que succumbem pelas sangrias , se curarião sem duvida por este meio , protector da existência, e garante se- guro de prompto restabelecimento da saúde, como o provão innumeraveis exemplos? Para bem julgar desta differer.ça de tratamentos era preciso pôr de parte toda as prevenção ,. to- do o espirito de partido , e reconhecer a verdade. Não se deve attribuir muita importância a elegantes ra- ciocínios , fundados sobre profundas analyses ; pois a arte de curar, e que cura, exige hum senso recto no que a pratica , e huma aptidão análoga ás necessidades da Natureza. Ella nos revela hum principio immutavel; e todo o que se afas- tar delia, he seo adversário , e as conseqüências serão sem- pre funestas. Os systemas se destroe mutuamente,' assim como se sue- cedem , por isso que seos fundamentos são meras conjecturas. O homem simples, como a Natureza, não adopta estas novi- dades ; rejeita fortemente todas estas modas, que a Medicina diariamente acolhe. Conhece que o fausto da verbosidade, e a multidão de systemas não impõe nem á enfermidade, nem á morte. O homem reflectido não se deixa seduzir pelas^ap- parencias; e sabe que a pequena luz, que tem , pôde fazer eahir em precipício aos presumidos ; e por isso está preveni- do contra a seducção. Debilidade dos enfermos. He ordinário achar-se practicos , que julgão os enfermos mui fracos para serem purgados. Não se lhes poderia dizer , som todavia -oíTender o seo melindre , que huma boa rasão facilmente dissipar': este erro ? A causa da dcbilidi.de não he a mesma que a da enormidade? Póde-se duvidar que a morte seja a conseqüência , e o effeito do enfraquecimento dos enfermos, bem como he o resultado das diferentes lesões oecasionadp.3 pela mesma c-ura nas diversas parles, de que se compõe o nosso corpo ? Como se iv-de admittir , que a sa- bida da putrefacção l d^íruidora de !xlcs os corpos, possa enfraquecer os enfermos, sendo expulsada de suas entranhas, pois he o Urdeo meio de ci.bti'«\h.ir as forças , e a vida á acção desta incbina corrupção ? ( 56 ) \ debilidade , que pôde experimentar hum enferno ri principio do tratamento administrado, segundo este methodo, ou durante o uso de fdgumas dores purgativas , he hum ef- feito do vasio , que logo se produz, pelo qual as visceras , o vasos se contrariem , e aproximão suas paredes , até que se desbgão por meio da evacuação. A esta causa de enfra- quecimento, se junta a ácção de calor, mais, ou mer. os ar- dente da serosidade , calor excitado peia agitação, c\v.t eila experimenta pelos effeitos do purgante. A prompta evacuação desta matéria , contribue muito ao restabelecimento das for- ças , pois que as sublrahe á acção desta matéria destruidora. He fácil de comprehender , que o que accontece ao principio pela acção , e effeitos dos purgantes , pouco differe do que se passa , quando se faz a hum hydropico a operarão da parasyntheses. He o abatimento ( murcharnenío, retracção ) das partes habituadas a estarem á muüo tempo tensas , que o faz parecer débil , e que muitas vezes obriga a suspender a evacuação das águas, para que as partes orgânicas tomem algum tom. O mesmo se pratica neste methodo de tratamen- to , marcando o tempo, em que se deve suspender as evacua- ções , ou uso dos evacuantes. Logo que a sabida da água do corpo do hydropico, pela operação, não he a causa do enfraquecimento, que se manifesta, assim também a evacuação das matérias alteradas, corrompidas , e putrescentes , não deve ser reputada como causa da debilidade, que experimenta pela acção do evacuante. Neste caso não ha senão fraqueza , e não abatimento ver- dadeiro , pois que não ha perda de substancia. Os que são de opinião contraria , se attreveráÕ a afíir- mar , que elles não enfraquecem os seos enfermos pelas san- guexugas , e sangria ; pela dieta , negando-lhes o alimento , quando a natureza o exige; pelos refrescos tão contrários ao calor natural; pelos banhos, e com os demais debilitantes, que em pregão ?.... Que contradicção , e que erro! Não ha maior cegueira do que negar que seja indispensável a eva- cuação dos humores corrompidos, bem como adaquelles, que se poderião alterar , ou corromper. Crer que este methodo, e applicação são nocivos , he desmentir a mais útil das ex- periências , e mostrar ignorância. Dizer, que cs evacuantes são mortties em algum caso de enfermidade mais, ou menos agu- da , recente , ou antiga, he despresar a causa das enfermida- des , e a da morte ; he mostrar , que nada se sabe , e que se não quer conhecer o que he conducente ú cura pelos pró- prios soccorros da Arte. (57) Insufficiente evacuação pelos purgantes. Não ha duvida, , que se se administra ao enfermo algu- mas doses de evaeuante , sendo preciso dar-lhe maior numero dellas , não se obterá o fim , a que se propõe a cura. Se estas doses se não repetem, senão de dous , ou de três em íres dias, quando he necessário dar até duas em vinte e quatro horas , faremos augmentar a violência das dores, irri- tar a causa da enfermidade , fazendo-a mais mortal do que era. Muitos enfermos julgão ter feito tudo , quando , segun- do a sua opinião , ou dos que os assistem , tem tomado hum. certo numero de doses. Commettcm hum excesso. O receio não cs deixa raciocionar. Enervão o tratamento, quando se- ria preciso dar-lhe a maior actividade para restabelecer as funcções naturaes em seo livre exercício , favorecer as func- ções vitaes , e uppor-se á morte. O enfermo , que por hum falso raciocínio , ou pelo ef- feito de funestas suggestÕes , despresa a causa das enfermida- des , tal como existe na natureza , pôde ser homicida de si mesmo. Se por desconfiança abandona este methodo , v< m a ser ao pratico que o assiste , hum moíjvo de máo sucesso. Será mais prejudicial a si mesmo , podendo ser a viclima da sua facilidade em se deixar enganar, do que não o poderá ser ao Medico , que ellequizesse infamar, porque este não ti- nha outro fim mais que restabelecer-lhe a saúde. Evacuantes preferíveis pela pratica. Não he por meio do emetico , nem purgantes grossos , e opacos , que se pôde desembaraçar a economia animal das matérias coirompidas, que existem nas entranhas; e menos ainda da serosidade acre, ou corrosiva , que oceasioua todas as desordens, consequtncins das enfermidades. He preciso em- pregar os purgantes resinosos ,' e hydragogos pelas vias infe- riores ; e pelas superiores , os emeticos em vehiculo purga- tivo, a fim de evacuar a plenitude pela via amais favorável á constituição do enfermo , e evitar a violência que sè observa todos cs dias pela acção do emetico ordinário. Não procla- mamos huma descoberta em Pharmacia. Estes meios são co- nhecidos. O Código nada nos deixa a desejar a este respeito. Suo dcspr?sados, e por assim dizer ignoiadcs 5 poique não à 8 <58) se comprehende a causa das enfermidades, esforção-se a não conhece-la, abandonando a pratica bemfazeja dos antigos. Os antigos práticos , que conhecião, melhor que os mo- dernos, a necessidade de purgar , se occuparao muito a res- peito dos purgantes. A elles devemos a descoberta, e indica- ção dos differentes' medicamentos, em que se observa a maior efiicacia. Que justo reconhecimento não tem estes benéficos homens, daquelles que os souberem apreciar ! Houve hum tempo, em que se appliearão a distinguir as diferentes espécies de humores para oppôr a cada hum o purgante, que julgavão ser-lhe especialmente próprio. Derão por conseqüência nomes aos purgantes, segundo o nome do humor , que evacuavão. Chamarão melanagogo, o purgante que appliearão con- tra a melancolia ; phlegmagogo, o evaeuante composto para purgar .t piíuita, ou a fleugma ; cholagogo , o purgante da biíe ; e por hydragogo entendião o purgante próprio para evacuar as águas. i Km fim , para serem mais breves, e segundo o augmen- lo progressivo de seos conhecimentos, estabelecerão hum patu chimagogo , isto he , hum purgante contra todas as espécies de humores. Esta ultima composição , se aproximava bem do ponto essencial, visto , que a superabundancia não se acha só em huma espécie de humor mais que em outro. Os anti- gos observarão esta superabundancia na massa destas matérias, onde era rasoavel suspeita-la , e mesmo suppô-la. Conhecerão por tanto a necessidade de aítacar todas as partes humoraes, que causão a plenitude , para a evacuar completamente ; seo methodo sobre este ponto era preferível ao dos modernos. Reconhecião na superabundancia dos humores hum supér- fluo , que pelo contrario os modernos attribuem ao sangue. Quão grande, e prejudicial he a sua cegueira! No entanto não se pôde dizer , que os primeiros conhe- cerão a verdadeira causa das •-nfermidadec ; e ainda que as- sim não seja , fizerão serviços importantes aos enfermos. Neste tempo os homens chegavão á velhice; os meninos bem cons- tituídos , se tornavão homens foites , e vigorosos; a saúde, era por assim dizer , o thesouro de todos. A nomenclatura das enfermidades era menor , e menos brilhante ; mas at- tendia-se mais á voz do bom senso. Se os purgantes dos antigos forão insuíficientes para cu- rar ceitos casos , fo: unicamente porque estes práticos não ti- nhão reconhecido a existência desta serosidade humoral, cuja (59) origem mostrámos , e definimos no Cap. I.; e por conseqüên- cia não' podião dirigir o seo panchimagogo contra huma cau- sa, que lhes era desconhecida; e ainda menos faze-lo servir á expulsão desta fluxão , e só por acaso podião evacua-Ia. Foi então , que começou a estabelecer-se pouco a pouco os differentes systemas, e com elles se tem obscurecido inteira- mente a verdade •, mettendo-se em hum Iabirintho inextnn- cavel. Invcctivas contra os Humoristas. Os práticos , que nos tempos remotos, como nos moder- nos , usarão dos purgantes , obtiverão curas , que parecião milagrosas. Mas os inimigos dos purgantes não estimão pro- digios , e grítão contra seo uso. Farião as maiores invectivas a aquelle pratico, que administrasse mais de seis purgantes, qurdquer que fosse a duração da enfermidade. (1) Que não devem elles dizer de nó??,... A idéa só de purgantes os arripia, lhe causa contorsoes espantosas, gritão, enfurecem-se, clamão , ameação; são como os marinheiros de Ch. Colombo, que não querem acreditar na existência de hum novo mundo. Com tudo callão-se, porque nada podem estes vãos clamores contra curas numerosas, e notórias ; contra o testemunho de homens , que publicão em alta voz , e a quem os quer ou- vir : eu estava enfermo , bem enfermo , e ás portas das morte , e hoje goso huma perfeita saúde, graças ao desco- brimento da causa das enfermidades , graças aos evacuantes dirigidos contra ella. Huma das causas da insufhciencia dos purgantes âos antigos, e dos modernos, provinha também , de que a maior parte destas composições erão em substancia, como pos , bolos , pdulas. Estas preparações estão bem longe de produ- zir o mesmo effeito que a nossa infusão espirituosa, sendo preferível pela certeza, e promptidão. Sem embargo pode-se algumas vezes admi?í:.r o uso destas composições , porém nãr> se deve confiar muito nellas; he melhor usar alternativamen- te, ou concurrentemente com o purgante liquido, do que emprega-los sós, Ha pesseas, a quem será proveitoso o seo uso , assim como não convém a outras. (1) Ha dez annos, qi>c se podia ainda achar práticos partidistas deste numero de evacuações ( por purgantes ). Po- rém hoje a proscripção he absoluta ; Êanguexugas , e mais sanguexugas , c o enfermo ainda cheio de corrupção.... (60) Sobre o humor phteicgmatico. Hum Medico dos nossos dias quiz imitar x aós antigos por hum purgante dirigido especialmente contra a phleugma. Deo á lua huma obra, na qual motíra o seo syste na , mas seo methodo he fora de principio, porque he tão natural ao corpo humano ter phleugma, como o ter humores ou sangue. Todo o corpo he phleugmatico, e humoral tanto em saúde , como no estado de enfermidade. Os humores, como o dissemos , não são por sua esseneia a causa das enfermida- des, pois para produzi-las, be preciso que estejáo mnis, ou menos alterados. Explicámos no Cap. I. \ como, e porque são sujeitos a corrompsr-se ; e demonstrámos , que , para pro- duzirem enfermidade, como para causar a morte premaUira, he necessário que estejão mais , ou menos degenerado^ , ou putrificados. Desta condição , sem o que não haveria jamais superabundancia , não se falia neste Tratado das phleugmas, mais do^ que nas outras Obras dos que usavão dos purgan- tes. Não se acha nellas a explicação da formação desta viscosidade; nem se diz também donde procede a superabun- dancia , cuja evacuação se quer provocar. A phleuíjma se fôrma pelo calor natural òo corpo, calor que reeose.huma porção dos alimentos, e produz este humor, e em gráo, que constitue a saúde. A superabundan- cia da phleugma só tem lugar em hum individuo enfermo, ou cujos humores estão corrompidos, e que em conseqüência produzirão hum calor estranho ,'isto he, a serosidade humo- ral, que temos amdysado. Este calor contranatural , pôde rc- çozer huma porção maior de alimentos que o calor natural , e formar huma qu-tntidade maior de phleugma no tubo in- testinal. (1) Ora , sendo a supcrabundanehr da phleugma proveniente da sua corrupção , como da degeneração dos mais humores, ,: que pôde fazer contra o estado de enfermidade , que ella produz , o pretendido purgante anti-phleugmutico ? O pan- qliimagogo dos antigos he, sem duvida, preferível, pois quasi que obra sobre toda a massa dos humores. íl) He porque o calor contranatural exerceo sua acção sobre a phleugma, e na circulação, que se vê o sangue vis- cqso, e que a nriua acarreta algumas vezes com sigo huma porçãp. desta viscosidade. ( 61 ) Como obrão os purgantes. Poucos sabem como os purgantes promovem a evacua- ção dos humores em geral. Tem-se feito crer que obravão por indigestáo , que desta resultava huma evacuação de qualquer natureza. Não se pôde sustentar esta proposição. Para poder bem conhecer de que modo obrão os purgantes , he preciso u>r feito largo uso delles , ou ter sido testemunha das curas numerosas , que elles tem feito a enfermos de todos os gê- neros , e espécies. Os purgantes tirados (\o reino vegetal , taes como os que temos indicado , são comparáveis ás producções deste mesmo reino , e que servem de nutrição ao homem , com a differen- ça de que elles não sustentão , porque não tem parto nutri- tiva , e que evacuão , porque he esta a saa propriedade. Po- rém soffrem huma digestão , passando do estômago aos intesti- nos. Distribuermse por toda a economia animal , filtrando-se em parte pelas vêas iacteas , como o óleo dos alimentos. Dão tom ao c^na! intestinal , accelcrão seo movimento peristalti- co , e por meio deste , evacuão a corrupção ; communicão á circulação hum impulso, que provoca as excreções pelos ca- naes , ou conductos mencionados no Cap. Vil.; obrão sobre a massa dos fluidos , e provocão sua excreção pelas vias urina- rias , (1) obrão sobre a expectorarão, e todos os emunctorios, facilitão a transpiração ; emfim , os purgantes tem acção so- bre todos os órgãos excretorios cia economia animal, e assim a purificão. Se houvessem pessoas, que duvidassem dos effeitos do:« purgantes, ou que negassem sua infiltração nas vias da circu- lação, não seria possível desengana-las com a exposição do seguinte facto ? Hum hom<'m foi reduzido a hum estado de enfermidade tal, que a morte foi a conseqüência. Elle conhe- cia bem o seo estado e quiz fazer o ultimo esforço ; © era hum aclo de humanidade ajuda-lo, e procurar com elle se a Nafureza ainda tinha alguns recursos. Esta estava inteira- mente destituída delles, pois que o enfermo j> não tinha aquella sensibilidade, por meio da qual os purgantes podem . (2) He o que se chama iirioa carregada. Observa-se nes- te estado, durante a acção doprrgante, ou o fluxo de ven- tre, e em todas as circurrilancias cm que os h\:rrrres je eva- cuão por esta vi». ( 62 ) obrar , e tomou successivãmente hum grande numero de do- ses em hum dia sem poder fazer huma só evacuação. Po- rém o que aceonteceo ? O enfermo exsudou huma grande parte das doses; a sua pelle ficou banhada , e a camiza mo- lhada , como no caso de hum suor copioso. lieconheceo-aa o purgante por todos os seos caracteres. He huma verdade incontestável , que o corpo humano. nao pôde desembaraçar-se das matérias viciadas, que em si tem sem purgantes continuados , como se explicou nos quatro ar" tigos da ordem do tratamento deste methodo; bem assim he certo que o mesmo corpo humano não se pôde sustentar será comidas proporcionadas ás suas necessidades. Do mesmo mo- do que todas as partes do corpo se sustentão dos produetos dos alimentos , assim também podem ser limpas e purifica-* das pelo uso bem rasoavel dos purgantes, sufRcientemente re- petidos. Purgantes reputados nocivos, por serem escandescenies. Não he raro encontrar entre os práticos alguns, que at- tribuem aos purgantes indicados neste ruethoojo os incommo- dos, que o enfermo pôde exprimentar durante sua acção, que reputão ser nociva. Neste numero podem contar-se os que não administrão duas doses purgativas seguidamente, porque nesta matéria a esfera de seos conhecimentos he mais limitada. Porém ha outros de má fé , que contestão a verdade de hum principio confirmado por curas notórias , e cuja marcha de tratamentos elles tem observado. Se os enfermos dão ouvidos á voz da inexperiência , e á destes homens, de quem acaba- mos de fallar , ouvirão dizer que os purgantes escandecem, queimão ; corrõe &c. A maior parte dos enfermos experi- mentão sempre huma sensação , que parece firmar esta as- serção; mas este erro he ratificado pelo uso dos evacuantes eonvenientemente repetidos. O calor excessivo, que experimen- ta o enfermo, não he senão a serosidade, muito acre , e em movimento pela acção dos mesmos evacuantes. Porém, se os purgantes hydragogos se repetem , como o exige a evacua- ção, da causa ds todas as enfermidades , subtilisão a. Jlu- xão livrão a Natureza do calor da secura , da sede ar- dente , da inflammação , da corrupção e de todos os acciden- tes, de que pôde ser ameaçado o enfermo. Emfim os purgan- tes produzindo os effeitos , que temos explicado , certamente re- frescão, ainda que digão os que não tem huma útil experiên- cia que para refrescar he preciso destruir, e expulsar o calor (63) estranho , que, neste osso, provem menos osidade igual- mente acre , que se tinha fixado nos músculos , e que cris- pando-os , os tinha obrigado á contracção. Certamente havia' correspondência entre estes dous lugares affectados , como a analogia da matéria , que as produzião. Os músculos , não se poderão desembaraçar deste espasmo, e crispação , sem que as membranas do estômago tambsm o estivessem , e assim reciprocamente. Os inimigos deste methodo deixsráõ de ser agradecidos áqnelle qne lhes demonstra o modo de obrar dos purgantes , e do que tem querido chamar corrosão ! Quantas pessoas, cujo estômago he sujeito a azias , is- to he , contem matérias mais ou menos mordicantes ou no- cÍTas , se tem visto obrigados por lalta de iastrucção a não fazer uso do leite , visto que o ácido do seo estômago o coag dava , o que se via pelo vomito; quantos outros se tem também visto obrigulos a abster-se do vinho, e mais be- bidas espirituosas , porque excitavão este humor viciado, qus •d rasão aoornellia a expedir para prevenir 4odos os accidentes, (pie podem sobre vir p.>r falta de evacuação , a pe^ar da raavntsia e mais absorventes, de que se usa ordinariamente. Quantos se teai curado pelo methodo evaeuante! He para. C 65 ) desrjar que esias verdades prevaleçáo a huma cpnvão cc.v traria, adoptada por aquelles , que a experien cía e a rasão ainda não tem suficientemente instruído, Bepugnancia contra os evacuantes. Qu?.ndo o tratamento he longo, e exige hum numero de do-. oitío em muitos outros ; basta querer ; e a diíTimiJdad': e*iá des de já qua^i vencida. He á sua nome vontade >;u^ bdg.»' s incuráveis, ou «ofTren- do moléstias chronira1- de toda as , species , devem a sua •ura : he » sua rcsoíu ;ão cornarv.i lora , que r.;uitas pessoas vile- tudiiiarias devem o piolohgamento de sua existência, purgindo- se algumas vezes , e nas épocas d; terminadas ."este nosso nu. thodo. He preciso saber sempre pôr ao lado dá situação pre- sente , o peor , que possa accontecer'no curso da vida; he este o único meio de nos julgarmos menos infelizes. Aqueile , que repuirna íázer uso dos evaeuante?, ou. couünr.i-los, * 9 ( 65) tanto quanto se exige , reflicta. Achará ellejv a3 composí-? çÕes, que estão em uso, mais desagradáveis que os purgan- tes ? As dif&rentes beberagens em doses extraordinárias , não serão mai3 diíficeis de tomar , do que algumas colheres de purgante ? Não he muito menos penivel tomar huma dose deste evaeuante em vinte e quatro horas , do que repetir moitas vezes no dia differentes beberagens , suecos de ervas , tisana , e todas as bebidas que se usão, e tomão em gran- de dose? Não he evidentemente menos sensível, sujeitar-se por alguns minutos a tomar o nosso medicamento na dose de duas , ou três colheres ( quantidade ordinariamente suffi- ciente ) do que ser atormentado a cada momento , e ter que lutar contra a sua repugnância ? E porque logo que sentimos enfraquecer a nossa saúde , ou qualquer desarranja delia , não nos oppomos ao principio do mal com o favor do purgante ? Evacuando des de logo , e em principio , a depravação dos humores por alguns purgantes to-. mados opportunamcnte , não ha que temer achar se em huma situação , que exija muitas doses , e menos a repug- nância. A nossa pratica nos tem feito vêr que a necessidade de evacuar o estômago por meio do emetico-purgativo , repetido se- gundo a exigência , desvanece esta repugnância. Tamhem temos. observado que muitas pessoas, que experimenlavão huma gran- de repugnância em tomar os remédios pela manhã ao rom- per do dia , ou ao despertar-se , tinhão muito pouca , ou ne- nhuma tomando-os á tardinha, como diremos no Capitulo, XX." , artigo sobre as doses. Com tudo sempre he bom en- xaguar muitas vezes a boca ema agoa sem a engulir , ou fa- zer uso de qualquer frueta , açúcar em pedra, ou cousa si- nnhi«»iie. A saliva despegada pela acção do remédio, e im- pregnada deste liquido desvanece o gosto do mesmo. Nas. estações do esíio, ou nos paizes quentes he bom-mitigar a acção estimulante dos purgantes , ainda mesmo com a neve, antes de o tomar. Opposlção dos humores á acção dos evacuantes. Os effeitos dos purgantes são pela maior parte tão igno- rados , como a causa das enfermidades he pouco conhecida, e daqui nascera muitas dificuldades , não as havendo por oceasião de incidentes, que podem, accontecer. A menor cousa. he muitas vezes huma novidade e espanto. Para acalmar vãs. inquietações , basta despirmos-NOS de toda a prevenção; 014 (67) o que he o mesmo, he preciso flrmarmo-nôs, como em huma ancora de salvação , na verdadeira causa das enfermU dades , e dirigir todas as nossas idéas e esforços para eva- cuar , quanto for possível, em todo e qualquer estado de en- fermidade, sob-pena de se expor á morte. Hum principia verdadeiro jamais pôde enganar. O purgante não produz ne- nhum dos males, que afíhgem aos enfermos, secundariamen- te , ou durante a sua acção. He certamente a origem das enfermidades, as suas emanações, ou & serosidade que obrão; he perciso persegui-las emquanto dão huma esperança de eu* ra, até que a resistência tenha emfim cedido ao vigor úo tratamento. A serosidade humoral põe muitas vezes obstáculos á cu- ra de muitos enfermos. Esta Jluxão pode em alguns reu- nir-se em tal quantidade, e consistência, que não possa ser evacuada, ainda por doses purgativas repetidas e approxi- madas. Pôde aceontecer, tanto no principio como diwante o tratamento de toda a enfermidade , recente, ou chroniea, que os órgãos evacuantes se endureção pela acção da causa, que aca- bamos de indicar. Parece-nos poder comparar esta acção á âo togo a que se chega huma folha de pergaminho : ver-se-ha endurecer-se, enrugar-se, perder a sua flexibilidade e elasti- dade. Pareee-nos igualmente vêr no corpo humano a acção do calor aclivo sobre as membranas, que tomámos por objec- to de eomparação. A practica tem mostrado que nos casos de insensibilidade , e quando o enfermo soffre muito , hô preciso que se augmentem as doses evacuantes, e com acti- vidade; e assim continuar o tratamento no caso, em que ha- ja perigo a recear. Se pelo contrario o seo estado não dá cuidado, ou se não ha urgência, póde-se suspender momen- taneamente o tratamento, na esperança de achar a natureza álbuns dias depois mais disposta á evacuação. Desvanecida, ou vencida esta resistência, ou pela repetição das doses se- guidas da evacuação , ou só pela mudança da serotãdade, que produzio o endurecimento das entranhas e dos canaes da cir- culação , a sensibilidade se restabelece , e pôde ser que então seja forçoso diminuir a quantidade das doses , e sua acti- vidade. *(1) (1) Tem-se visto enfermos que, não obtendo sufficientes evacuações com fortes doses do purgante o mais activo , as tem copiosas com huma pequena dose do purgante o mais brando, ^ recobruo logo a sua sensibilidade primitiva. ( 53 ) lia pessoas, que se espanlão da quantd'/'e ou da força extraordinária das ouses purgalivas, que seda a enfermos que tem pouca sensibii idade interna em proporção de^as mesmas doses. ,; Porem não ha homens que bebem ern hum dia ató dez boteihas de vinho, sem que se embriaguem, e não se vê outros , que huma só os põe fora de si'? Eis effeitos quo por ú mesmos expücão suas causas. Ha pois huma varieda- de de sensibilidade , que não he raro que hum homem forte o vigoroso se purgue com a dose, que se dá a hum menino, e que as mais for(«s doses obrão fracamente sobre elle , ou em.indivíduos de huma compleição ílebil , e delicada. Estas constituições não são certamente as melhores. Ha duas causas da pouca sensibilidade ou insensibilida- de á acção dos evacuantes. Huma he relativa á constituição do individuo , e não muda ; e he esta a de que acabámos de fallar. A outra he o effeito da má natureza dos humores. Neste caso pela reiteração de moitas doses -se evacua a ma- téria, que embota a sensibilidade, e esta se restabelece; e de^de logo o enfermo pôde curar-se. Nestes differentes casos he preciso ter experiência para resistir á pr»meira impressão , que os faz crer que, purgado o enfermo , não deve mais purgar-se , porque não tem mais humores máos a evr»uls?r. Esta opinia> prova que a causa das enfermidades he ainda pouco conhecida ; que a composição do corpo humano, que descrevemos já , não o he mais , e qse as ressurças e efiéitos dos purgantes são desgraçadamente ignorados. Temes tido muitas oceasiões de notar em enfermos in- sensibilidade á.acção do purgante; mas ha-poucos casos símí- lhantes a esti?, que vamos referir circunstanciadamente para utilidade dos enfermos. Tomaremos as observações feitas em nós mesmos , as quais são seguras , e exactas por serem da própria experiência , e segundo o senso intimo. Huma se ie de acconterimentos , que he inútil referir , me levou ao paia, onde habitava o fallecido Pelgas , e por isso tive oceasi to de me instruir, e conhecer os seus princí- pios. Atormentado -por huma moléstia chronica de muitos annos, e proveniente de causas, qtis logo direi, fui ft-iu e-n ter o seo conhecimento. Estava eu aflicto de dores , affe- ctado de deposito , e ulcera ; e ameaçado da morte. Tinha f ro para recobrar a suade quinto estava ao meo alcance, e por muitos annos. Estava imbuido dos princípios , que não são certamente os deste methodo; pensava como os demais hvxens, c seguia os authores, de quem tinha bebido estea (69 ) princípios. Era ém fim preciso , "que raciocinasse bem , ?. o fiz. Pois que abri os olhos á lm , que me appresentarão, espero qae todos os enfermos, em igual estado de sofrrimen- to, raciocinarão também para sua conservação , e seguirão o meo exemplo. Principiei a minha cura , e seçui o trata- mento , seg-rmdo o Art. 4.°, porque a minha enfermidade era chronica; mas depois observei o Art. 3.° severamente, co- mo mostrarei. Pela manha ao despertar-me, senthme repen- tinamente atacado de huma dor violenta no baixo-ventre. Quiz erguer-me para tomar huma dose de purgaute , mas não po- dia indireiiar-rr.e , e tinha o corpo todo curvado, de modo , que estava o ventre do1 rado sobre as coixas. Tomei a dose , e esperava ficar bem depressa livre da dor , que se hia au- gmentando; vã esperança; muitas horas se passarão 5em que houvesse evacuação: tomei segund. na esperança de activfu- a acção da primeira , e nro tive melhor successo. Repeti terceira, e mais outras. Deve-se notar, que estas doses trão humas vezes vomitivas purgantes , e outras vezes só pur- gativas , na intenção de evacuar por huma , e outra via; po- rém forão inúteis os meos esforços. Usei de clysteres bem purgativos em ter evacuação, e mal se hia augmentando ; e o delírio principiava' em mim, quando o bom Peigas, que es- tava commigo , me dis-ja : " Eu não vos deixarei morrer , pois ,, pela amizade, as nossas almas estão unidas, e somos hum ,, só. ,, Lembre' lhe a ap.dicaçãõ dos vesicatorios , em qu« conveio , e se appliearão. Pbpois que estes attrahirão ás per- nas huma grande quantubi ie de serosidade , que com acri- monia crispa. i cs meos intestinos , se ertabeleceo , por «ua liberdade , e desembaraço , a evacuação em abundância pro- porciona ia ao numero das doses, que tini-a tomado. Que cii- sè! Tolos aqu',lle>, que não approvavão o meo t ratam e u t@ , ou por pouca capacidade de inteliigencia , ou por falta de co- nhecimentos , forio obrii?;aoos a ceder A evidencia. Evacuei pura podiídão, e tal, que foi preci-o abrir todas asjanellas, e todos confessará.* então que as mais importantes verdades em medicina , para muitas pessoas , estavfio envolvidas de hum veo impenetrável por huma grande falta de conhecimen- to do principio que serve de base a aste methodo. Haven- do o m^o coro » recobrado a sensibilidade < rdinaria , repe- li os purgantes até que a massa dos meos humores se re- novasse , e conforme a ordem ('o tratamento do artigo 4.° Este tratamento consistio em quasi cento e cincoenta doses, que tomei no espaço pouco mais ou menos de seis rre/co. (70) Conhecendo a minha má constituição, julguei dever tomat as precauções úteis e necessárias , fazendo hum uso freqüen- te da purga , para evitar recahidas , a que se está sempre sujeito. Regulando-me segundo este methodo, tenho podido con- servar huma fraca existência , e assim me aconselhava o bom Pelgas, meo sogro , para que, me dizia elle, eu tivesse direito á vida até á idade de sessenta annos ; e elle o en- tendia bem , pois que não se enganou sobre o fim da sua. Nasci com huma constituição propriamente chamada viciosa , e de pais de tal modo constituídos, que morrerão , hum na idade de quarenta e dous annos , e outro na de quarenta e oito, tendo passado os dez em cruéis enfermidades. Os que nascerão depois de mim não poderão viver por causa do pro- gresso da idade, e sobretudo pelo estado de enfermidade dos auctores de seos dias. Débil de organisação passei , a pe- sar dos cuidados assíduos de huma terna mai, a infância em contínuos soffrimentos, e com a enfermidade pedicular , até á idade da adolescência. Esta idade não me foi mais favo- rável ; freqüentes fluxos de sangue pelo nariz, dores de dentes , febres que duravão seis mezcs , muitas enfermidades, em que se não poupou a sangria ; eis o quadro de saúde da primavera de minha vida ! Di-Io-hei ? Na idade da pu* herdade, dando apenas alguns signaes de vigor, os meos contemporapeos me chamavão engana-a-morte. Emfim antes da idade de vinte e cinco annos, estava eu attacado de do- res rheumaticas por todo o corpo, e cessarão no momento, em que menos o pensava. Taes erão a causa , e origem e os progressos da enfermidade, por cuja oceasião tive conhe- cimento dos princípios do falecido Pelgas, que são os da Medicina Curativa : desta arte, que se liga com a Natureza , e em harmonia com as duas necessidades. A opinião de hum medico enfermo, como eu sempre tenho sido , parece dever ser de algum pezo na balança dos systemas. Não poderia ella até certo ponto contribuir a fixar adaquelles, que a se- guem e a acclarar aos que adoptão contrarias ? Eu vi, co- mo outro qualquer pôde ver , tirando-selhe o véo ; mas eü perceba mais que ninguém. Minha esposa, a quem se prognosticou próxima viuvez, quando cazei , não nasceo com melhor constituição que eu ; nasceo contrafeita , e vomitando bile negra. Seu pai a tratou a fivor de seo meio curativo, e favorecendo-a as res- surças da Natureza, desappareceo todo o vicio de conforma- ção; e he tratando-se segundo este methodo 'que ella tem ( 71 ) sobrevivido, e vivirá , eu o espero, ainda longo tempo pa- ra felicidade minha, e consolo de alguns desgraçados. O bom Pelgas foi aecommettido de asthma , e de hy- dropisia na idade de quarenta annos. Como triumphou elle destes dous inimigos ? Fez com sigo o mesmo, que aconse- lhava aos outros ; não se desviou jamais dos princípios, que estabeleceo sobre a sua descoberta , e prolongou a sua vida até á idade de setenta e dous annos, lutando cinco contra o estado de decrepitude , segundo as regras, que prescrevia aos seos enfermos. Deve-se advertir que foi privado de hum recurso da Natureza bem necessário , pois não pôde expec- torar, nem vomitar, nem mesmo assoar-se , por mais deli- gencias que fizesse , e por isso não pôde desembaraçar o seo peito, o que obstou a prolongar mais os seos dias (1). Citarei também a minha filha (42>, que nasceo com sup- puração estabelecida em hum olho , ameaçada de suífooação, dores de çolicas , e era estado que não dava esperanças de sobreviver. Attacada aos dtzeseis mezcs das bexigas , com fe- bre pútrida , dava pouca esperança de vida. Depois padeceo freqüentemente enfermidades de olhos,. inflamatorias e outros :. belidas , e convulsões nestas partes , que produzião movimentos de rotação , seguidos de estremecimentos de toda a cabeça. Além disto padeceo differentes enfartes glandulares; fluxão escorbutica na boca, gengivas, e lábios, em fim soffrco huma serie de enfermidades, que se suecedião rapidamente ; ou an- tes , estava em hum estado permanente de enfermidade, que teria acabado a enferma , se não fosse a nossa resolução a combatê-la até ao fim. Empreguei os meios do nosso míthodo com aclividade, e perseverança, segundo a nossa convicção, as luzes da nos- sa pratica, e tudo o que inspira o amor paternal; e bem eerto de que todo o enfermo perece em conseqüência da en- fermidade , de que he aecommettido , e que não pôde suc- cumbir , nem experimentar o mais ligeiro damno pela acção dos meios evacuantes an&íogos á riu causa, tive a felicidade' de vencer. A menina começou a purgasse lego que nasceo. Este tratamento foi repetido tantas vezes , que receio que se não (1) Sentiremos sempre estarmos longe delle na oceasião de sua morte ; talvez lhe podessemos prestar soccorros... (2) Hoje esposa de M. Cottin Boticário em Pariz , rua< de Sena, subúrbio de S, Germano. ( ^ ) d£ credito ; comludo aífirmo que ate á idade de quasi dez annos repetio as doses na proporção pelo menos da quarta parte do tempo de sua idade , isto he quasi mil doses tan- to vomi-purgativas, como só purgativas. Depois sua constitui- ção melhorou de modo que não se empregou o purgante, dos dez aos doze annos , senão na proporção de huma sex- ta parte, relativa : dos doze aos quatorze na de huma déci- ma parte quasi, e successivamente diminuindo até a idade 1es tra- tamentos , não estavão bem instruídos sobre o caminho mais breve , isto he , que não conhecião a única , e a verdadeira causa das enfermidades, nem as vantagens do tratamento eva- euante , o que se lhes.faz ver nesta obra. Com effeito, como se conduzem os homens em geral? Obrão por dados incertos ; fazem hoje o que fizeráo os seos predecessores Quando se toma hum guia pouco certo, he de admirar que se erre o caminho? Ss se reconhecer bem acuusfi das enfermidades; se se conceber o seo principio; se se cem - p eheader a rasão da causa que produz q incommodo , nao íse hirá por hum caminho inceüo, e .^e tomará o único da cura, que existe, e do modo que indicamos. Não seria isto fnais satisfactorio para os. homens da boa fé, do que formar dis- curses sobre a realidade , ou não de huma descoberta ? Que pede o enfermo, que chama hum Medico? O restabelecimen- to da saúde. Porque se não ha de condesçeuJer com o seo 10 ( 7* ) desejo , e não se ha de adoptar hum melhodo coroado de successos numerosos, e admiráveis? O Cirurgião Felgas não pôde tratar âo seo objecto sem taxar de insuficientes muitos medicamentos, que ordinariamen- te se em pregão no tratamento dos erfermos. Firme nos co- nhecimentos , que a sua pratica , ou experiência lhe tinhão dado , julgou dever publicar a insufficiencia , e inutilidade dos meios adoptados pela rotina. Fez mais ; apontou os pro- cedimentos , que além de insuficientes, são nocivos á saúde, como á vida dos enfermos. Porém divulgando conhecimentos, que faltavão á Arte, quer fossem despresados , quer pouco conhecidos , não honrou menos a memória dos grandes ho-. mens, a. quem se devem tantas coisas úteis. (1) Mas que obstáculos a vencer! Que prejuízos a dissipar! Quantos interesses oífendidos, e daquelles a quem he peni- vel o sacrifício ! Todo o methodo, que destroe a vã ostenta- ção dos systemas, deve achar por muitos tempos numerosos antagonistas. Se o ncsso não faz mais bem á classe dos en- fermos , he porque a ignorância , e a maldade , lhe appresen- tão tantos obstáculos a vencer , como as moléstias as mais inveteradas , ou reputadas as mais incuráveis. Ao principio lutGu contra os esforços reunidos de hum numero incalculá- vel de pessoas de opinião contraria. Hoje os seos successos grangeando-lhe numerosos amigos , lhe suscitão em quasi to- dos es pontos do globo inimigos cruéis, cujo amor próprio humilhado, ou vencido, não confessa a victoria. He huma arma, de que se serve o fraco , que por falta de rasão , re- corre a ridículos meios, que a delicadeza recusa, e que nos seria penivel descrever. (2) Que injustiças se não commetterão ainda contra a Me- dicina Curativa, emquanto não forem geralmente conheci- dos os verdadeiros princípios, em que se funda ! Que males , íião continuarão a afíligir a espécie humana , emquanto esti- (l) Eu me gloriarei sempre de ter adoptado os seos prin- cípios , e manifestado o seo methodo ; e como elle , e a seo exemplo, serei sempre o primeiro a respeitar o zelo illustrado, a sagacidade , as qualidades eminentes, de que estão revestidos muitos práticos meos contemporâneos. Refuto toda a conse- qüência contraria a isto , declarando que, ferido desta injus- tiça , opporei constantemente a sinceridade de meos pr©testos. (2) Vede o Charlatanismo desmascarado, que divertindo* Tos 3 vos instruirá. ( 75 ) Jerem em vigor estes usos absurdos ! Se com franqueza Sè íalla na possibilidade de fazer promptas curas , quantas pes* soas a impugnão, porque lhes custa acostumar-se a esta lin- guagem, tanto he ella desusada, e opposta aos prejuízos re- cebidos! Com dificuldade concebem, que se possa com este methodo prevenir , ou evitar graves enfermidades ; não com- prehendem também , que se possa em alguns dias de trata. mento curar numerosos enfermos , porque o costume lhes tem feito crer que são precisos mezes, e annos inteiros paia ob- ter hum fraco alivio , ou ligeira melhora. Se hum enfermo he promptamente curado , o erro, e a má fé contesta o me^ rho de huma cura, que, segundo os tratamentos ordinários, não seria mesmo provável. A impostura allega que esta9 en- fermidades tão promptamente destruídas, não erão enfermida- des caracterisadas, e somente ligeiras indisposições. Huma vil inveja se esforça a provar dizendo : que apenas algumas doses de purgante forão suficientes para a destruir. Não se duvidará responder a estes antagonistas , que se assim accoti- teceo , e sempre pôde accontecer , he porque o meio evaeuan- te deste methodo se dirige contra a causa, a verdadeira cau- sa de todas as enfermidades. A verdade não triunfará, se os homens, testemunhas dos factos , e por conseqüência con- vencidos , não altenderem por pusilanimidade aos sentimentos dos seos deveres ; se elles se callão com receio de desagradar a taes, e taes , como muitas vezes accontece ; antes que pu- blicar factos que lhes são conhecidos , bem como o bem de seos símílhantes lhes impõe esta lei. A prevenção he , geralmente faltando, que se julga dos conhecimentos do pratico em proporção da duração da enfer- midade. Se a enfermidade durou longo tempo , se houverão grandes perigos , se soffreo muito , e se a Natureza em fim lhe foi propicia , julga-se então , que o Medico triunfou dos maiores obstáculos. Tal he muitas vezes a origem de grandes reputações. Trinta a quarenta visitas, de duas a três por dia, dão muito realce , e importância. Não se vê , e nem crêm , que se a enfermidade durou tanto, foi por falta do tratamento, que não expulsasse a causa desta enfermidade des de a sua apparição. Se perguntássemos aos que se dizem sãos de taes en- fermidades , como se achão presentemente relativo aos restos destas enfermidades , nos responderiao que apenas gosão da vida, que estiverão a ponto de perder, e na substituição de hum estado imperfeito de saúde ao de huma enfermidade saenos positiva, sem poder recobrar seo primeiro estado de 10 ii ( 7<5:) saúde. Nós lhes mostraríamos a causa na falta de evacua* ção de seos humores; dir-lhes-híamos que a origem de sua enfermidade existe ainda era suas entranhas ; far-lhes-hiamos, comprehender que a sua pretendida ou mui imperfeita cura he o etieíto da dispersão, ou da neutralisação , no estado actual , das emanações desta origem , e que tanto esta , co- mo as suas emanações constituem conjuntamente , como dis- semos no cap. IV. , a única causa das enfermidades. ,; Esta verdade prevalecerá sobre o parecer de tantos homens , que de boa fé crêm dever, apesar de factos convincentes , e autenticados , regular-se pela opinião contraria ? (1) Este Methodo he a verdadeira Medicina Popular. (2) Ha huma classe de homens, a quem não falta, para serem seos próprios Médicos, senão o conhecimento do princi- pio, sobre que &è funda este methodo , e esta he a classe mais numerosa e mais utii do Estido. Quantos milha- res de indivíduos delia tem reconhecido este principio , por ter experimentado os seos felizes effeitos ! Seguros pela ra- são elles tem reconhecido a causa das enfermidades tal qual existe na Natureza, e esta lembrança lhes ficará profundamen- te gravada em seo coração. Firmes neste principio estão cer- tos que não ha mais que hum só meio de prevenir as lon- gas enfermidades, e para as destruir quando existem. A des- . (1) Se estas observações desagradarem, (o que não espe- ramos ) chamaremos em nossa justificação a utilidade geral que he o único objecto de nos-;ts vistas. Póde-se saber per- feitamente a sciencia de sua profissão , e não se ser capaz de innovação útil. Póde-se ter muitos conhecimentos e bellas qualidades, e não possuir o talento de curar. As descobertas são pela maior parte devidas ao acaso. Ninguém está ohri- gado a inventar , nem se perde o mérito por não ter encon- trado occasiõrs favoráveis a adquirir conhecimentos além dos ppie se receheo nas aulas, e do estudo ; mas não devemos por isso cntliusia^mar-nos até negar á evidencia. (2) Esta verdade está demonstrada pelo uso, que se faz deste methodo de tratamento em toda a França, snas colô- nias, e colônias estrangeiras; e tudo annuncia sua maior extensão , apesar de todas as intrigas , e gritaria de seos an- íagonisras. He particularmente nas populosas habitações de cultura das Antilhas que tem sido maià bem apreciada. (77) cripção da saúde, tal como se fez no cap. XX. , lhes tem servido de norte ; e se sabem dirigir pela ordem do trata- mento, que se acha neste mesmo capitulo. Existe porém outra classe, que provavelmente não tem conhecimento do contheudo desta obra, e nem entra no pen- samento do auctor pô-la- ao nivel de suas altas idéas. Esta' classe se compõe destas pessoas inimigas da simplicidade,1 que precisão, segundo aetiquetta, e o uso , de médicos que' os livrem de trabalho de pensar , e reflectir sobre o esta-' do de sua saúde. Belía esperança!,.... '* Cora palavras elevadas póde-se deslumbrar as classes polidas ; e os prejuisos de educação e de sociedade fazem o resto. Huma vez illudidos, como se persuadirão que se pôde ser medico de si próprio, a favor de hum methodo simples, que o mais rude camponez pôde comprehender , pois que basta comparar o principio com factos notórios e incontestá- veis ? Como se pide conceber- que ignorantes possão curar- se , em quanto que sábios se deixão levar á sepultura ? He para muitos difficil de crer. He huma prevenção mais q-ue nociva, que nos faz desconfiar de tudo o que tem o carac- ter de fácil; ou querer dificuldades, que não são senão em grande prejuiso dos enfermos. Não se poderia dizer que em geral os médicos são mui reservados , quando se trata de fallar com os enfermos sobre a causa das enfermidades , ou do que lhes faz soffrer dores ? Como a urbanidade, e as refinadas cortezias devem achar-se nos lábios dos consoladores da humanidade soffredo- ra, acreditará desgostar, se dissesse a hum enfermo, por &er pessoa de dístineção , que o seo corpo encerra huma massa tie corrupção, qne he necessário evacuar, e que sem esta evacuação a morte he inevitável ? (1) Esta linguagem ferirá os ouvidos e o amor próprio dos poderosos oo século , e este não he dos menores obstáculos para o triueopho da verdade. Assim como he bem ordinário encontrar homens , que prefere oi o be.llo ao bom , e o agradável ao útil; assim também he de desconfiar que se prenra por muito tempo ainda os palliativos aos remédios curativos ; e consequente- (1) Hum enfermo de descendência nobre tem elle somente humores? Está rodeado de pessoas , que lhe dizem unanime- mente que não os tem, e estes homens são para elle ho- mens sábios !..... (78) menfe quererão antes morrer conforme o uso recebido , âo que prolongar a sua existência por meios simples, naturaes, ou conformes á rssão appoiada sobre factos sensíveis, e pro- vados até a evidencia. He melhor ser enterrado, como se diz, com as honras da guerra do que obscuramente. Estea mesmos enfermos quereriâo antes deixar-se morrer do que to- mar hum certo numero de bebidas purgativas, que os pode- ria curar em curto espaço de tempo. Para estas pessoas fass* se preciso mais apparato. Preferirão ao único meio, que pos- sa existir, hum regimen determinado com muito apparato, combinação, sciencia , e meditações, tanto a respeito doa alimentos como do exercício. He muito mais nobre passear a cavallo, e de seje , e esperar que a natureza se encarregue da cura , do que hir a pé á latrina evacuar a podridão, que conserva em Iangor , e mata hum tão grande numero de enfermos. Assim tantas victimas da ignorância e do erro succumbem prematuramente, eu passão o resto de sua vida soffrendo males, que facilmente se podião destruir. Conten- tão-se com os calmar; fazem diversão ao mal por huma variedade de situações ^ gira-se em roda do ponto essencial, e se não percebe ; a moléstia segue o seo curso , faz pro- gressos, «o enfermo perece.... Reflecti, leitor] CAPITULO XI. Denominação das enfermidades. Era útil dar a cada hum dos modos, c^n q.ie a enfer- midade attaca a suade e a vida , hum nome particular; mas tem-se supposto que podião existir enfermidades distinc- tas em sua causa interna, e se lhes deo nomes próprios. He assim que se engrandeceo o campo das conjecturas, e que os curiosos vagão com suas idéas sem guia, como sem limite. Falla-se sempre do lugar das dores ; mas ninguém ex- plica a natureza ão que alli se fixa. Se se tiver comprehen- dido a causa das enfermidades, segundo explicámos no cap. primeiro , ter-se-ha conhecimentos bastantes ; e então saber- se-ha que os humores depravados, degenerados, corrompidos, ou putrificados ( palavras todas synonimas ) produzem huma ■serosklule, que se mistura com o sangue , como se disse no mesmo Capitulo. Sabe-se que o sangue circula em todas as partes do cor- po; por tanto deve-se também reconhecer que nenhuma de (79 ) svai partes está isenta de ser o sitio de huma enfermidade ,. j-0'5 que o sangue pôde depor por toda a parte por onde circula esta parte fluida dos humores, que se não liga com elle pelas rasÕes, que se expenderão no cap. IV. Com huma continuação deste systema de nomenclatura de enfermidades , já muito extensa, se teria multiplicado ao infinito , pois se pôde fazer do corpo humano hum numero incalculável de pr.rtes e outras tantas subdivisões ; a matéria não ficaria se não mais embrulhada; e o está bastantemente. Porém que importa para a cura do enfermo , que a dor tenha sua sede na primeira ou segunda phalange do dedo ? Será mais cedo livre da dor,, que sente na cabeça, e que por isso se chama enxaqueca , do que da que sente em seos di- fferentes membros , e que se chama rhumatismo , gota, ou sciatica ? De que serve para a sua cura ser o engorgitamen- to de huma glândula parotida , ou o de huma glândula in- guinal ; ou de huma glândula conglobada , ou o da conglo- merada ; o engorgitamento do fígado, ou do baço ? Curar- sedia mais promptamente se a febre fôr terça , do que se for quarta? Todas as differenças, que se obseivão nos me- thodos medicaes, não servem certamente para curar os en- fermos ; a pratica repete sempre provas, para que se pcssa; ter confiança neste systema. Esta theorica he tanto mais no- civa quanto se afasta do fim principal , e que comprometíe a saúde , e a vida dos enfermos : e ainda mais , quando os meios applicados a estas enfermidades , íem relação com a sua causa material, evacuão o motor da existência ; taes a sangria, as sanguexugas, a dieta.... Mas importa para o restabelecimento da saúde, e pro-> longação da vida reconhecer a matéria que se fixou , a sua origem , sua malignidade , como se explica no cap. primei- ro : como também admittir sem restricçáo os meios seguros ? que temos indicado, para delle livrar os enfermos sem offen- iler o principio da vida. Deve-se saber que, segundo o que dissemos no cap. primeiro, a ordem da natureza he tal relativamente á exis- tência de todos os seres creados , á cessação da vida , e á reproducção organisada de cada espécie, que a parte sã, causa motora da vida, e o agente corruptor causa da morte, estão sempre avista; tocão-se tanto de perto, que obrão mais, ou menos de hum modo ostensivo hum contra o outro; e qne a victoria da morte, ainda que mais ou menos retardada pelo motor da vida , não he menos certa., pois nenhum eu* te crendo he eterno. ( 80 ) Porém o instirscto natural impõe ao homem o dever de defender a sua existência , quando a sua morte possa ser prematura. He a vontaJe da Natureza, e parece que seo auc- tor multiplicou os meios para este fim. O homem só precisa de huma firme resolução. Elle achará nas diversas producções, que elle piza , tudo o que he necessário para favorecer sua inclinação á prulongação de seos dias. Mas a primeira con- dição para este fim he que saiba fazer uso de sua rasão. Enfermidades Sthenicas, e Aslhenicas. Escutarão a voz da Natureza estes homens, que pare- cem ter-se querido iIludir sobre a verdadeira causa de suas enfermidades , e oppor-se á propagação da verdade ? He pre- ciso appresentar a estes homens cousas, que nada tem de repugnante.. Por exemplo , não lhes repugnará ouvir dizer : s ia enfermidade he sthenica, isto he, provém de demasiado vi- gor ; sua enfermidade he aslhenica , ou o que he a mesma -coisa , nasce de debilidade. Eis o que he consolador, mesmo debaixo das duas relações. Pela primeira : o que morrer de huma enfermidade sthenica, deve esperar ser hum modo vi- goroso, ou então não seria verdade, que a morte he a con- seqüência , ou o resultado dos progressos das enfermidades nem a conseqüência do enfraquecimento que produzem no en- fermo. Pela segunda relação: póde-se esperar, que aquelle, cuja enfermidade provém , diz se , de debilidade, tenha huma .revolução de tal modo feliz, que no momento mesmo dos maiores perigos a sua enfermidade se mude em sthenica.... Assim esperará o ultimo momento da vida , com tanta mais segurança , quanto he de uso não attender, que a debilidade dos enfermos , não deriva senão da causa material de suas dores , a mesma que lhe rouba a vida , pela não ter evacua- do , assim como lhes tem tirado as forças , porque se não tem espulsado des de o priucipio da enfermidade , e pela de- mora tem augmentado de malignidade. Porém estes enfermos , se revoltarião antes que se conT vmcerião , se algum se atrevesse a explicar-lhe a verdade Elles não conceberião , que a enfermidade aslhenica não tem outra causa mais que a de que acabamos de fallar, isto he a massa de seos humores corrompidos, e que he necessário' evacuar. Não admittuião também que a enfermidade sthenica tem por causa interna qs seos humores bem depravados 0110' como taes, tem produzido huma serosidade mui acrimoniosa ' ou ardente. Conceberião elles , quo esta fuxâo pos«a faz-y (81) •enfír a mais violenta dor , que possa produzir a febre a inais vehemente , a mais caracíctisr.da, a irritação a mais forte , e todas as des cr der»': deste gênero , cuja causa hs at- tribuida por sábios a hum cyresso cie vigor no individuo accommefido da enfermidade, que lhes aprsz chamar sthenica. He diflrcil crer tão promptameníe na ce.ivtisão de símílhan- tes enfermos , ainda que se não possa confiar nas assei ções destes authores, só se tivermos como t'di3 hum e eiiito sthe* nico , ou próprio a accolher similhar.ies novidades.' CAPITULO XII. Enfermidades chamada do t/onco. Enfermidades verminosas. Os vermes fórmão-se na massa dos humores , que se demorão no estômago , e nos intestinos, porque estas matérias adquirem pela degeneração huma natureza lodosa própria á concreção destes insectos. Pense-se o que se quizer da sua origem , e da sr;^ formação , estas matérias -são sempre a causa da formaçãrj dos vermes , e da enfermidade , que os accompanbe.. Não são portanto estes vermes que a fazem soffrer , como comrnum- mente se crê. Dão-se aos vermes differentes nomes, como , lombrígas , aspides , tcenia , ou solitária , £cc. Existem em differentes fôrmas. Algumas ligadas entre si , sahem em no- velos ; as mais das vezes estão divididas , e sabem huma atraz da outra. Quando sobem ao longo do canal , pódera sahir pela boca, e até pelo nariz. Os que as lançao pelas vias superiores, são os mais expostos , porque he prova de que a natureza está fortemente atulhada de corrupção , e de ver- mes. Estas duas aífecções rruriJrs podem causar a morte sú- bita , ou enfermidades mui curtas, seguidas de huma morls inevitável. Falía-se muito da solitária. Dá-se-lhe este nome , prova- velmente porque se acha quasi sempre só. Tem hu-o compri- mento excessivo ; dizem tê-las visto de 60 , e mesmo de 80 pés. He chata, e arrendada de,hum extremo a ouíro Esta animal talvez que nem huma só vez tenha subido inteiro, ordinariamente Lraça-se aos pedaços. Aquelles, que tem vermes nas entranhas, de ordinário tem as faces deecoradas, o contorno dos olhos preto ; são ^liareilos, e frouxos; sofrem muitas dores de cabeia , hum 11 ( 82) pesadello , adormeeimentos , palpitaçóes , cansaços , e òufroi ineommodos. As crianças são mais sujeitas aos vermes pe- quenos , e miúdos ; as pessoas grandes são igualmente sujei- us a elles , porém são particularmente attacadas da soli- íitaria. Seria hum serviço imperfeito fazer somente evacuar os vermes pelo uso dos vermifugos. Este meio até he muitas vezes perigoso ; porque rompendo amassa, que os contém , e em que se fórmão , os vermes podem espalhar-se nas dobras rios intestinos , romper as túnicas , e causar os accidentes mais funestos. Não se precisa muito talento para reconhecer bem a cau- sa da formação dos vermes, porque huma comparação muito simples, e natural nos íllumina sobre o primeiro principio de sua formação. Todos sabem que elles não se fórmão era hum pedaço de carne sã , e ninguém ignora que se gerão na carne podre. Portanto deve-se reconhecer que os vermes não podem nascer no corpo de hum individuo , que tem os humores sãos, e que só se fórmão dos humores depravadas, em qualquer parte que estes se achem. Querendo-se reconhe- cer também que os humores degenerados , que accompanhão, sempre os vermes, enfraquecem a'saúde, embaração o cres- cimento de todo o individuo , deteriorão sua constituição , oppõe-se ao desenvolvimento de suas faculdades, haverá to- do o desvelo em applicar os purgantes de huma maneira proporcionada á necessidade, porque por este meio se fazem á infância os serviços mais importantes: quer elle se consi- dere em rasão do desenvolvimento de suas forças , que as evacuações favorecem; quer ella se allie á conservação dos. dias de todo o doente attacado desta espécie de enfermi= dade. O primeiro artigo da ordem do traíamento he applica-- vol a este ca~o ; salvo se fôr - necessário recorrer ao 4.°, visto que esta affecção he quasi sempre a depravarão chroni- ca dos humores. O vomitorio-purgante he indicado contra o enchimento rio estômago , e particularmente se o doente tem b.nçado vermes por esta via. O purgante expulsa não somente os vermes, mas até as matérias, que servirão para forma-los , assim como aquellas, que contribuem á sua conservação. De- mais tem a propriedade de evacuar tudo que podesse favo- recer huma nova formação de vermes , regenerando a massa* dos humores. (1). ( 83 > Convulsões, affecções nervosas. Se a causa das enfermidades fosse conhecida , não se ouviria todo o mundo dizer que as convulsões, a que os meninos em particular são affeitos, são causadas pelos ver- mes. Aparte do corpo , em que podem residir estes insectos, he seguramente muito distante da origem dos nervos , para causar estas affecções. A inspecção anatômica o tem prova- do sempre, e mui raras vezes se tem achado vermes no cor- po dos doentes mortos de convulsões. Os meninos de menor idade , os adultos , e mesmo as pessoas idosas , são expos- tas ás convulsões, e a outras affecções nervosas. He hum gênero de enfermidade como outra qualquer. A Jluxão , que dimana dos humores corrompidos , quer estas matérias te- nhão formado vermes, quer não, he por sua natureza, e pelo lugar que occupa , a única e verdadeira causa das con- vulsões. Quaesquer que sejão as suas denominações , e o seo caracter , ellas apparecem sempre que o sangue ajunta a Jluxão no cérebro, e que esta se espalha sobre os nervos, que põe em contracção pela sua forte acrimonia. Se esta se- rosidade se torna corrosiva no gráo mais forte, pôde parar o curso dos espíritos , e causar a morte muito promptamen- te , ou ainda de repente, como tem accontecido aos entes , que tem perdido a vida nesta affecção. Que cousa mais miserável que essas asserçÕes , com as quaes se faz crer aos doentes que os seos nervos lhes cau- são os soffrimentos , que padecem. Não he isto negar que os nervos são partes sólidas, e como taes subordinadas á acção dos humores ? A sua sorte he differente das outras partes carnosas ? Dir-se-ha que hum braço , ou huma perna , affec tada de dores , seja a causa dos seos soffrimentos? Como se ha de duvidar disso , se todos os dias se diz que os den- tes causão dor, e que he necessário arranca-los? Se esta atíribuição dada aos nervos continuar , será difficil prever a scmma das desgraças, que ella ha de arrastar com sigo. Os purgantes não fazem excepção ; elles livrão os ner- vos , como todas as outras partes do corpo , se este meio não se emprega tarde. A applicação do artigo 2. , da ordem (1) - Este methodo tem feito lançar muitas vezes a sohta* íia em differentes paizes , como em Pariz , Orleans, Nevers, 3, Quintino , Martinica. XI ii (84) do tratamento pôde bastar , se a affecção he ainda recente : mas se he crônica , he da maior urgência regular se pelo 4. , que neste caso se torna indispensável. He mais seguro , e mnis breve começar o tratamento por huma dose do vomitorio- purgar.íe pela. manhã, e huma dose de purgante dez ou dop horas depois , pc-rqus esta doença partecipa muitas vezes do caso previsto no artigo S.° Esta explicação basta para ensinar a cura de todas ag doenças nervosas, ou attaques de nervos propriamente ditos; ellas cederão áos purgantes repetidos , se a enfermidade não for muito inveterada , ou muito antiga, e se os doentes não forem muito velhos; alias, ou nos casos de incurabilidade, não se faria mais que excitar a irritação nervosa. Neste caso esta affecção entra no domínio da medicina paliiativa. Mas se o doente ainda appresenta recursos , e dá esperança , de- ve livrar-se desta affecção, conduzindo-se segundo o artigo à da ordem do tratamento. Se sobrevier huma forte commoção nervosa durante o tratamento, a qual faça hesitar sobre a sua marcha, po- dem-se suspender os purgantes por alguns dias , para depois continua-los , visto que então se acha muitas vezes disposição na Jluxão , e nos humores em geral , para a evacuação. Es- tas affecções se tem tornado incuráveis por se haver dado de- masiada confiança aos calmantes de todas as espécies , e po? ler despresado a evacuação ' de sua causa essencial. Febres. A febre ,J quer ella exista como enfermidade principal , „ (ai he a febre intermittente ; quer ella accompanhe , ou se- ja complicada com qualquer doença , he sempre o movimento desordenado do sangue ; desordem produzida pela serosidade humoral , que , endurecendo as válvulas dos vasos , e com- primindo as paredes dos mesmos , entibia o giro dos flui- dos , até chegar ao engorgitamento , e causa assim o frio , o tremor, e as dores. Exceptua-se desta nomenclatura aquelle estudo febril, que se chama febre symptomatica, porque he hum dos symptomas de enfermidade orgânica , ou hum sinal de lesão no doente; e não pôde cessar senão com a affecção principal De huma desordem nasce muitas vezes outra, que lhe suecede. He da natureza do sangue fazer esforços contra todo o obstáculo, que se oppÕe á sua circulação, porque elle só he o principio da mesma; o que he tanto verdade, que depois de affrouxar a sua marcha, toma forçosamente huia ( 85 ) "movimento accelerado. Então circula com huma rapidez e huma impetuosidade , que são relativas á impulsão, que a serosidade misturada com elle dá á circulação, á propor- ção da acrimonia , e do calor ardente desta Jluxão ; calor nugmentado alias pela fricção dos glóbulos , ou das partícu- las , de que se compõe a massa dos fluidos. Assim he que a fluxão causa hum calor extraordinário por todo o corpo, iluma sede ardente, dores de cabeça, de rins, e em todos os membros. Finalmente, cessando a fermentação e os dous movimentos extraordinários , o movimento natural na febre interw.ittente se restabelece ; as dores socegão ; o calor excessivo cessa , o accesso termina , e o doente crê muitas vezes que aquelíé accesso he o ultimo , emquanto não he seguido de hum sub- sequente , como nas duplas terças , e duplas quartas. Quanto mais malignidade tern a Jluxão , mais fortes , mais compridos , e mais freqüentes são os accessos. Se o sangue leva , ou ajunta a serosidade no cérebro , pode causar o delírio , ou a febre inflammatoria. Se os humores estão putrefactos , daqui resulta a fe- bre podre. Chama-se vermelha , se sobre a pelle se levantãó pústulas escuras, ou denegridas. Estes dous casos annuncií.o sempre hum perigo imminente. Chama-se febre intermittente toda a febre, que deixa hum intervalío entre os seos accessos : aquella que não deixa in- tervalío , chama-se continua. A febre, da qual se reproduz o ac- cesso iodos os dias, se chama quotidiana ; quando o accesso não volta senão de dois em dois dias, he febre terça; se torna de três em três dias , he febre quarta. A febre he du- pla terça , ou dupla quarta , quando dois accessos distincíos e. separados tem lugar no mesmo dia das febres terçã e quarta. Ha febres particulares e muito ordinárias em certos paí- ses , que se chamão endêmicas. Ha outras epidêmicas , e con- tagiosas, como a febre amarella , ou escarlatina , e outras febres, que ainda que não as denominemos, nem por ísío deixão de comprehender-se no tratamento commum , de- qce se vai fallar , por mais matadoras que ellas sejão. Os febrifugos em geral , a quina particularmente , de que se tem feito hum especifico ,'que tem ainda muitos par- tidistas , ainda que se tenhão muitas vezes observado os seos rnáos effeitos, podem dissolver os humores corrompidos, e se querem , dar hum livre curso á sua circulação, e até mesmo dar tom aos órgãos. Esta dissolução , algumas vezes seguida ( 86 ) rje resolução , fas desapparecer- a febre. Isto se chama cortar a febre. Mas o sangue , que fica sobrecarregado üeist£3 maté- rias , e da Jluxão , e até do remédio , que se torna hura corpo estranho , e por conseqüência nocivo , os ajunta e de- posita em alguma cavidade. Eisaqui a causa mais geral das enfermidades de peito, das obstrucções nas visceras, da hy- dropisia,, e de todas as enfermidades de frouxidão , que le- vão os enfermos ao marasmo, e consumpção , para os con- duzir á sepultura depois de longos , e custosos sofrimentos, Este accontecimento he tão commum , que não se pôde con- testar a causa , que o oceasiona , e que fazemos conhecer. Toda a febre intermittente , tratada desde o primeiro ou segundo accesso , e se o doente gosava dantes de boa saúde, pôde destruir-se, evacuando na fôrma do artigo primeiro do tratamento ; ou do segundo, se o enfermo tem já soffriuo cer- to numero de accessos. Se se trata de hum febricitante , cujü saúde não fosse boa antes de ter sido attacado da febre , de- ve ser tratado conforme o artigo 4.°, como aquelle , cujos accessos se reproduzem depois de quarenta dias ou mais. O vomitorio-purgante he quasi sempre necessário no tra- tamento das febres , e muitas vezes indispensável ; portanto quasi sempre se deve começar por elle : e depois de o ha- ver feito seguir por algumas doses de purgante , se repete, se ainda ha embaraço nas primeiras vias, ou dor, em algu- ma parte superior ; de outra maneira a cura se acaba pela uso do purgante só, sufficientemente repetido. Geralmente filiando , he indifferente que o vomitorio- purgante se tome no principio do accesso , ou na sua dura- ção. Quanto ao purgante , a observação tem demonstrado que aproveita mais , na febre intermittente , toma-lo muitas horas antes do accesso , ou na sua declinação. Com esta cautela se evita que os eíreitos da dose se encontrem com a maior força do accesso, e se poupão alguns incommodos. Mas quando a febre he continua, não ha remédio senão dar todas as doses , em quanto ella dura ; se esperássemos que cessasse a febre , o doente poderia primeiro receber o golpe da morte do que experimentar huma feliz mudança. Todas as vezes que no seo principio a febre, qualquer que seja a sua natureza, annuncia rnalignidade, como ha- vendo inflammaçSo, dilirio, e outros signaes característicos de enfermidade violenta, ou que ella reina no paiz, em que o doente habita , com signaes de epidemia e de contagio , he necessário depois conformar-se ao artigo 3.° da ordem do tra- tamento. (87) ? O vomiíorio-purgante , alternativamente com o purgan- te , convém neste caso , até que o cérebro esteja desem* baraçado. Depois emprega-se o purgante só , e segundo aquel- le artigo do tratamento, que se reconhece applicavel, até sarar. Se os processos , que havemos indicado contra as febres propriamente ditas, ou centra a febre em geral, se viessem a adoptar , os olhos do observador sensível não se aflio-iriao tantas vezes com o espectaculo de tantos milhares de fnfeli- íes, victimas, huns de febres epidêmicas, e outros de febres tenaces , e contumazes , mezes e annos inteiros , e que pela maior parte acabão cem o termo da existência. Quantos ma- les ^ quantos soffrimentos, quantas mortes prematuras se evi- tarião , e até com facilidade; porque de ordinário não ha doen- ça mais fácil de destruir , segundo este methodo , do que a fehre , quando he recente , ou não tem tido tempo de se inveterar. fíi/dropisiüí. Huma enfermidade , que fa.i quasi tantas victimas, quan* tos são os indivíduos , que ella attaca , he a hydropisia , quaesquer que sejão o gênero, a espécie, a denominação, e o local , que occupa. Muitas vezes he annunciada pela in- chação periódica, ou continua dos p/s , e das outras partes do corpo. Esta enfermidade, cujo caracter he hum ajunta- mento de água, em qualquer parte que se taça, he quasi sempre o resquício de huma enfermidade primitiva , que foi curada segundo o uso , sem evacuar a causa. Taes são as febres , quando o accesso tem desapparecido por via de algum febrífugo ; huma sarna , ou outras erupções, quando tem si- do extinetas superficialmente ; huma ulcera cicatrizada , sem estancar a sua origem ; em fim todas as outras doenças , das quaes se não tem expulsado a causa humoral.. As perdas c!e sangue , mormente se tem sido abundantes ou mvdtinli- cadas ; quer hajão tido lugar pela sangria , por sanguexugas , ou por accesso ; quer por hemorragias , fluxos de sangue pelp nariz , abundantes ou freqüentes , perdas accontecidas és mu- lheres por excesso de menstruação. Todos estes processos, todos estes accidentes são outras tantas causas oceasionaes da li/dropisia, porque a diminuição do volume do sangue des- troe a acção tônica dos vasos , assim como o vácuo , vue daqui resulta, favorece a infiltração do fluido humoral, cue vem tomar o lugar de!le , para depois causar esta enfer- midade. s (88) r Os meles, que se empregão ordinariamente, são as tisaiias Aperientes , diureticas , sudorificas , a fim de fazer urinar ex- traordinariamente o enfermo (bebe huma canada, urina hum quartilho ) ; e quando tem bebido por muito tempo , e em mui grande quantidade para se tomar demasiadamente volu- moso , se lhe faz a punção. Esta operação lhe tira muita água do corpo ; no outro dia ha outra tanta. Geralmente faltando , he conhecido de sobra o resultado desta triste situação. Esta enfermidade se preveniria quasi sempre , e seria in- finitamente rara , se se empregassem os meios curativos con- tra as enfermidades , a que suecede de ordinário. Muitas ve- zes se destruiria , se primeiro que se enchesse o corpo doa doentes com todas estas beberages, que não sabem, se usasse de purgantes para evacuar em abundância a água que domi- na , assim como toda a massa dos humores corrompidos. Achãose ainda muitos doentes curaveis entre aquelles, que tem confiado muito tempo dos meios futeis , que engei- támos ; o suecesso depende da sua " idade , e do mais ou menos progresso da enfermidade; como também da sua ener- gia para combate-la. A ordem dos purgantes, que se ha de seguir neste caso , he a do art. 4. Se a hydropisia he no peito, ou em huma parte das primeiras vias, o vomitorio- purgante deve ser muitas vezes alternado com o purgante. Se não ha mais que o enchimento momentâneo do estôma- go , basta o vomitorio purgante de tempos em tempos. Se a -hydropisia he no baixo ventre , nos pés, nas pernas, nas co- xas , ou em outras partes baixas, basta o purgante só; mas deve ser dado , quanto for possível , em doses fortes , a fim de obter grande numero de evacuações abundantes , como requer este estado de enfermidade, se se quer destruir a causa , e sarar o doente. Enfermidade de peito chamada pulmonia. Enfermidades de peito são todas as affecções , que se fa- zem reser.tir na capacidade do thorax. A maior parto dellas são tão temíveis , que passão por mortacs. Os erros e o pre- juízo si-o vn litas vezes os maiores inimigos das pessoas, que são attacadas de enfermidades de peito. Conforme a theo;ia estas doenças tem nomas differentes ; mas como a nomencla- tura nada tem de eommum com a cura de alguma , porque se podem destruir todas da mesma maneira, seguindo o mes- kso raciocínio., e attacando-as em tempo próprio; citaremos somente huma parte dos signaes , qne as favzem reconhecer. (89) Seos symptomas mais communs , ou mais ordinários, se reconhecem pelos caracteres seguintes: Enchimento das pri- meiras vias : oppvessão , rouquidão , náuseas , vômitos , calor abrazador por todo o corpo, sede ardente, ou freqüente ap- petencia de beber, tosse, escarros de sangue, pus, dores de cabeça, entre os hombros, ao longo do espinhaço, so- bre o s ter num , nas partes lateraes, na região lombar, muitas vezes arripios , febre mais ou menos violenta, pela continuação lenta ou surda, a constipação ou a diarrhéa , &c. &c. O enfermo , nestas affecções, he muitas vezes força- do , estando de cama , a conservar-se com a cabeça e peito mais levantados que o costume sobro o travesseiro. A neces- sidade de conservar esta posição annuncia que o peito se en- che. Quando ha derramamento em hum dos lados do thorax, o enfermo nao pôde deitar-se sobre o que he cpposto ao der- ramamento , em rasão do pezo doloroso , que a matéria depo- sitada exerce sobre o mediastino. Se o derramamento I e dos dois lados, o doente não pôde deitar-se de nenhum ; he obrigado a ficar de cosías , com a cabeça e o peito muito altos. Estas enfermidades devem ser freqüentes. Elias o são effectivamente, e a maneira de as tratar não lie própria a operar a cura. Porque não se purga o corpo ..da cansa das enfermidades , que podem accontecer a qualquer pessoa , em toda a idade , em qualquer época da vida , a parte fluida dos humores eorrompidos passa com o tempo á circulação; então o sangue he obrigado a depo ia para conservar seo movimento. Esta matéria , com a parte vistosa, recozida e eoílada ás paredes das vísceras , e a que apodrece nas entra- nhas , fórmão o todo da cousa de todos os symptomas, como de todos os accidentes , que accontecím , em conseqüência das enfermidades chamadas de peito. A estruetura cava do peito .dá luicamente inelficazes para, expellir as matérias corrompidas , qo© o sangue tem deposi- tado , e amontoado na capacidade do peito , e que só se po- dem coliocar na classe dos palliativos ? Não podem ter outra* virtude mais que deixar hir talvez mais de vagar os doentes- á sepultura. As matérias corruptas , que enchem o corpo,. acabão ( e muitas vezes prontamente ) por apodrecer as vís- ceras, estragar as entranhas,, consumir as membranas, endu- recer os. vasos ;..da mesma sorte que estas matérias destroem todo o principio constitutivo da vida* Tem-se dividido a pul- snonia em differentes gráos; mas esta divisão ainda não pro- duzio nada saudável aos doentes. A única cousa que apro- veita,_ mormente no primeiro gráo desta moléstia, he a ap- plicação de hum raciocínio exacto, o único remédio bom, que pôde existir; preferir aos palliativos, de que havemos fal- lado , os meios curativos , qye indicámos. As enfermidades recentes do peito estão no caso do ar-- tigo 2. da ordem do tratamento , salva a applicação do 3.% sendo reclamada; e no do artigo 4.° se são chronicas , ou resultado de huma enfermidade precedente, da qual por con- seqüência não se evacuou a causa. Todas ellas, quer recen- tes quer chronicas, estão nos casos das enfermidades das primeiras vias, de que se falia na abbreviação deste metho- do , capitulo, XX. Pleuriz. O pleuriz he outra doença de peito, ou dás primeiras vias , que causa muitos estragos , e que fará sempre succumbir muito promptamente a maior parte daquelles, que delia fo- rem attacados, emquanto se crer que o sangue pôde causar a inflammação , e pontadas de lado , e que o derramarem Distingue-se em verdadeiro e falso. Verdadeiro quando a pleura está mflammada , quando ha tosse , escarros de san« gue , febre ardente , dores de lado. Falso quando a inflamma* (91) çno e as dores existem somente nos músculos intercosfaes do peito, e quando os simptomas desta enfermidade são muito menos graves que na primeira. Os tratamentos ordinários destas duas enfermidades con- sistem , mais ou menos, nas sangrias reiteradas , ou para variar a effusão do sangue , como se houvesse hum meio de evitar que ella fosse igualmente mortífera , na applicação das sanguexugas. Praticão-se differentes fomentaçÕes sobre as costeltas; applicão-se emplastros de differentes gêneros, e os vesicatorios mais próprios para fixar a causa da dor do qua rpara evacua Ia i se elles a deslocassem, não expellirião a origem , o que he incontestável. Faz-se tomar aos doentes diurna quantidade de bebidas emolientes e diureticas; usa-se dos expectorantes, dos sudorificos; e se o doente sobrevivo ao insulto , que a effusão do sangue tem feito á sua vida, he as mais das vezes para soffrer muito tempo , ou até o ííira dos seos dias. Nunca se ha de attacar com bom resultado huma en- fermidade tão freqüente e tão funesta , emquanto se não per- suadirem do principio que esta enfermidade he causada pelo calor ardente da serosidade. Seria para desejar que se con- vencessem de que huma parte desta Jluxão , que se tem derra- mado nos vasos, he a causa da febre symptomatica, que accompanha esta moléstia, e que he o deposito da outra par- te desta mesma fluxao sobre a membrana chamada pleura^ que faz ressentir a dor chamada pontada de lado. Emquanto se não quizer ver que a serosidade he que corroe a pleu- ra, que ella fôrma a sua adherencia com o polmão., e que ella produz a rotura, assim como o deslaceramento dos va- sos sangüíneos & esta parte , donde resultão os escarros e vômitos de sangue , nunca se ha de explicar , e ainda me- nos prevenir, a causa da uíceração , a da gangrena , nem a lesão, ou podridão das visceras, que trazem com sigo a morte dos doentes. He de absoluta necessidade procurar a evacuação das matérias corruptas, causa única desta enfer- midade. O pleuriz verdadeiro exige que se opere no principio do tratamento, como se diz no artigo 3 , e para diante conforme o 2.° O falso se destroe muitas vezes seguindo somente o artigo CZ.° O vomitorio-purgante, porque tem hum objecto., segundo a abreviação deste methodo , deve tomar-se alterna^ tivamente com o purgante , como se tem ensinado a cerca de todas as enfermidades das primeiras vias. 12 ü (92) Defluxo no peito. Se aos symptomas do falso pleuriz se ajunta huma for- te oppressão, hurua grande difficuldade de respirar, a tos- se , com febre, ou sem ella, póde-se dar á enfermidade o nome de defluxo de peito. Náo ha differença desta enfermi- dade á primeira senão porque o sangue tem feito de outra maneira o deposito da Jluxão nesta que na outra. O mesms processo , e os mesmos meios empregados contra o falso pleu- riz, são capazes de,destruir esta enfermidade. Por tanto o seo tratamento he determinado pelo artigo 2; mas temendo que seja insufficiente , deve-se muitas vezes dar ao doente duas doses no primeiro dia. Começa-se pelo vomitorio-pur- gante, e se repete , quando he preciso; depois rei ler a-se. o purgante até concluir a cura. Asthma. A difficuldade de respirar , periódica ou continua, est' racterisa a asthma. Esta enfermidade causada pela serosida- de, que o sangue tem depositado nos polmÕcs , endurece os bronchios, e diminue a sua capacidade, a que lhes impe- de absorver o ar necessário á respiração. (1) Dizem que a asthma lie humida , quando o doente tem hum enchimento de peito, que o faz tossir , e escarrar mui- to ; do contrario chama se asthma seca. A asthma, qualquer que seja o seo caracter, se destroe facilmente , quando esta affecção he recente; só se torna incurável quando he mui- to inveterada, ou porque o doente he muito velho para se desembaraçar delia. A asthma recente e conlinua deve ser tratada confor- me o artigo 2.° da ordem do tratamento , com o vomitorio- purgante , e o purgante altemadamente, excepto que em ca- so de accesso violento , ou de huma grande difficuldade de respirar , se deve seguir o artigo 3.°, segundo as observa- ções apontadas na abreviação acfeica do vomitorio-purgante. A asthma periódica, ou chronica , reclama a applicação do ar- tigo 4.o, e segundo as observações da mesma abbreviação. (1) He como hum folie, cuja compressão apertasse a via aspirante; elle não poderia receber tão grande quantidade de ar, como se não estivesse encolhido na sua capacidade. f 93 ) Accòntectv cciri esta affecção o mesmo que a muitas outras enfermidades, de que os enfermos não podem sarar ; muitos experimentarão ao menos allivio neste caso, purgando-se mui- tas vezes , isto he cada vez que conhecerem a necessidade , logo que se convenção dos princípios deste methodo : en- tão os accessos se tornão mais raros, ou são de menos duração. Catarro , rouquidão , tosse. Estas affecções são causadas por se amontoarem matérias mais ou menos acces , contidas nas primeiras vias. A passagem súbita do calor ao frio , ou o frio soffrido muito tempo, podem sor a causa occasional , ou dar.lhes o caracter, qne se lhes observa. Ha muitas pessoas, que são muito sujeitas a cons(ipar-se, quer dó peito, quer do cérebro ; esta dis- posição provem sempre de plenitude humoral. Muitas vezes he tal, em certos indivíduos, que a transpiração insensível se affrouxa á menor mudança de temperatura ; então a pleni- tude dos vasos , resultante da repercussão , que o frio soffri- do tem produzido, reflue para as cavidades. Estas pessoas tem necessidade de se purgarem por differentes vezes, e até mui freqüentemente, e por muito tempo. A acrimonia destas matérias , pousando sobre os bron- chios dos pulmões, excita a tosse; sobre a traca-arteria, produz a rouquidão. Esta affecção conduz muitas vezes a perder a palavra, porque a Jluxão passa aos nervos recor- rentes, que são os órgãos da mesma palavra, e lhes tira o som ea vibração, que são capazes de produzir, quando não estão affeciadcs. Está plenitude fluindo para o cérebro , causa a espécie de constipação desfa parte ; o canal nasal torna-se o emonc- torio. Muitas vezes são affectos o septo do nariz, e a mem- brana pituitaria , e daqui resulta o entupimento , e os espir- ros mais , ou menos repetidos. Algumas vezes a matéria , que dahi corre , he tão acre que faz huma sorte de erosão no nariz , e no beiço superior. O calor da serosidade humoral recoze huma porção da fleugma , que o peito expectora por escarros de huma matéria mais ou menos condensada , ou viscosa. He certo , que quando a evacuação desta superabun- dancia se faz bem , e o peito , e o cérebro podem desem- baraçar-se delia, a affecção, como muitas vezes se observa, passa da mesma fôrma que vem, salvo se a causa ou dispe- s'ções hum raes, que podem favorecer a freqüente reproducção, forem capazes de dar hum caracter mais serio a esta affecção. (94) Pelo que ensina a observação e a experiência, ti^o há duvida que para destruir estas differentes affecções ( não ex- ceptuando a perda da palavra ) he sempre útil evacuar os humores, com o vomitorio purgante , e o purgante alternada- mente , eomo affecção das primeiras vias , como se ensina nos quatro artigos da ordem do tratamento. Esta pratica he preferível aos meios usados, com que se querem adoçar estas matérias. Este systema faz defluxos despresados , que dege- nerão muitas vezes em doenças de peito capazes de condu- zir os doentes á sepultura. Deveria ter-se feito caso desta advertência, porque o accontecimento citado tem numerosos exemplos. ■Çatarros. Catarros : termo que exprime huma queda de humores sobre qualquer parte do corpo. O peito he huma das mais expostas a esta affecção. He preferível sem duvida evacuar as matérias e a fluxão, que causão esta enfermidade , ao parar em calmantes., que não a destroem. No caso de suffocação deve proceder-se conforme o artigo 3o; em caso contrario , basta reger-jse pelo artigo 2Q ; e nos dois casos, o vomitorio- purgante e o purgante devem empregar-se alternadamente, até que a oppressão e a tosse sejão destruídas , ou notável, mente diminuídas. O tratamento se acaba com o purgante só, em quanto pôde bastar , empregado até sarar. Vômitos , azedumes de estômago. Os humores por sua degeneração são susceptíveis de to- mar qualquer natureza. Elles se tornão erneticos no caso, erft que fazem soffrer vômitos repetidos; he de alguma sorte fa- zendo as funcções de emetico que fazem contrahir o estôma- go; e lhe dão o movimento repulsivo. Muitas vezes se oppõe íi este movimento o que se chama anti-emeticos ; mas admit. tindo que elles os neutralizem , nem por isso a Natureza fica menos aflectada de matérias nocivas; e o doente cahe bem depressa era outro genro de incommodo , e de soffrimento As matérias depravadas adquirem muitas vezes no estômago' hum principio ácido, que convém evacuar, porque alias se torna a origem de (odos os males, espalhando-se pelas veias lácteas , em toda a economia animal. A existência deste prin Cípjo não he duvidosa a respeito de pessoas, que vomitão os alimentos decompostos, ou que não podem supportar o vi- (95) hho, ou a sua bebida habitual, mesmo temperada com água , ou que fazem coalhar o leite, quando o bebem. (1) Por estas considerações , he necessário evacuar com o vomitorio-purgante , e o purgante , alternativamente até alli- viar; e depois com o purgante só até sarar , conforme o ar- tigo da ordem do tratamento , que convier , quer ao estado recente,, quer ao estado antigo destas affecções. Pituita, ou peito encatarrado. Falíamos de huma plenitude humoral , dè que muitas pessoas são incomraodadas, e que ellas mesmas designâo pelo nome que lhe damos. Este incommodo se faz particularmente resentir á hora de levantar , em que ella oceasiona huma expec- toração mais ou menos laboriosa. He raro que esta affecção não tenha conseqüências serias, e até funestas; evitar-se-hao sem duvida , evacuando esta abundância de humores degene- rados , segundo o artigo da ordem do tratamento , que for applicavel ao seo gráo de antigüidade e de tenacidade , mor- mente empregando o vomitorio-purgante e o purgante, con- forme o que se diz na abbreviaçãoi Vomicai A vomica he hum deposito dè matéria, que se fôrma em huma espécie de saco, que tem o nome de kisto. Quando está cheio , faz a erupção , e o doente vomita. Esta affec- ção he sempre o produeto da degeneração chronica dos hu- mores. O vomitorio-purgante , e o purgante são indicados al- ternativamente segundo o artigo 4. da ordem do tratamento j e a cura he segura neste easo, como era todos aquelles, em que se pôde evacuar a causa , que he capaz de produzir to- das as desordens no corpo humano. Empyema. Esta doença he hum deposito purulento no peito , que Bnuitas vezes vem apoz dos outros symptomas das enfermida- des desta parte do corpo humano, que resultão sempre de (1) He o único caso, em que o leite pôde deixar de con- vir ás pessoas, que delle ee nutrem, ou o tomão por gosto ^ assim em saúde, como em estado de enfermidade. ( 90 ) huma enfermidade chronica , por falta de haver evacuado os humores corrompidos , que tem feito soffrer muito tempo o doente antes de caracterisar esta affecção. Não ha duvida que o effeito cesse, se a causa attacada em tempo conveniente for destruída : mas raras vezes he certo o resultado. O vo- mitorio-purgante e o purgante alternativamente , indicados segundo o art. 4. da ordem do tratamento, começando porém a conduzir-se conforme o art. 3., são applicàdos neste caso. Palpilação. A palpitaçuo he hum movimento extraordinário e irre- gular do coração , ou das principaes vias da circulação; ella parteoipa da affecção nervosa , e deve ser considerada como tal , salvo se houver lesão ou aneurisma neste órgão. A se- rosidade , banhando os ventriculos , ou o tecido do coração, desarrauja a contracção natural , ou regular. Dcstroe-se esta affecção , como todas as affecções nervosas , das quaes nada differe, quando não he nem muito antiga , nem muito inve- terada,; purificasse- o. sangue por hum purgativo sufficiente- mente prolongado conforme o artigo 4.o, se p 2.". houyer sido insuficiente. O vomitorio-purgante só he necessário* contra o enchimento do estômago, manifestado evidentemente. Syncope, desmaio. Estas affecções, ás quaes certas pessoas são sujeitas, dei signão sempre nas mesmas huma saúde pelo menos muito delicada , e as mais das vezes huma affecção chronica, com- plicada mais ou menos com os signaes característicos de outra enfermidade, cuja causa não pôde ser differente desta. Pur- gando se conforme o art. 4.o da ordem do tratamento , estes doentes evacuão a'Jluxão,, que prende o sangue no seo mo- vimento , fa-los eahir sem sentidos', pela compressão, que exerce sobre a circulação, c poderáõ recuperar huma boa saúde. Solluços. O solluço he hum movimento convulsivo da &ringe que se estende sobre o esophago para o estômago. Pôde ser oceasionado, como muitas vezes se nota, em conseqüência da deglutição dos alimentos ; e neste caso cessar de repente JVías as pessoas sujeitas a elles tem. infallivelmcnte de cuidar na sua saii^e , porque raras vezes deixão de soffrer outras (37 ) affeeções. Pôde esperar' vei>co-la^, assim 'como âo solluço pe« riodico , attacando-os por evacuar;?';!* rcpnf.das até lesíabele- çe:-sç , na couíbrrr idade do artigo 4.°, se o segundo não ti- ver bastado. Quando o soioço hc sympiomatko em huma enfermidade grave, só finda co*m elia. Indigestão. A indigestão, que acconteee Ú3 prrsoas, que não teia usado de hum alimento estranho á especi^ , de que ."ostumão §ustentar-se , tem sempre por causa hiitai parle de yiscosi- dade , ou outros humores corrompidos , tyue forvão o interior do estômago , e embaração aos sucos digestivos a penetra- rem os alimentos para fazerem a digestão'. As pescoie , que são sujeitas a este gênero de indisposição , são seguramente doentes. Devem cuidar seriamente na sua saúde, conforme o ariigo 2.° , e sendo necessário conforme o 4.° da ordem do tratamento até o inteiro restabelecimento das funcções do es. tomago. Porém , qualquer que seja a causa da indigestão , he incontestável que aquillo que a caracterisa , he hum cor* po indigesto o nocivo. Quanto mais incommodo elle he , ou quanto, mais ameaça, menos se de?e usar de meias medidas; he "preferível pára evitar qualquer conseqüência fiinesta, provocar a sabida daquelle corpo , antes do que enterter-se com quaesquer bebidas diluentes , de que ordinariamente te usa sem proveito. Deve-se começar por huma dose de vomi- torio-purgante , e continuar o tratamento pelos purgantes ne- cessários até o inteiro rcstabelet-imeuto desta parte das func* çêes naturaes, a mais importante sem dmida. Dores de estômago. Ha muitas pessoas, que soffrem huma sensação , como irritação , de sorte que Fe toma o que se passa dentro do «tomago por huma. necessidade de alimentos ; mas esta idea não pode sustentar-se , quando este mesmo sentimento se re- produz pouco tempo depois de comer, e que se tem tomado huma quantidade suiSciente de alimentos. Esta affecção soce- •*a muitas vezes, tomando-se logo alguns alimentos, por- que elles embotão a natureza acidulosa, nu mordicante Ua serosidade, assim como das matérias corruptas^ que o esto- rnado encerra , e que exercem huma acção nociva sobre es- ía "víscera. Esta situação be incontestável mente o resultado da depravarão quasi sempre chronica. dos humores; he hum Ó08 ) estado cie enfermidade, que ha do ceder aos evacuanfes, corr* forme o artigo 2.° eu o 4.° da ordem do tratamento , se forem empregados, como em todos os outros casos , antes que o mal se torne incurável (•!). Fime canina. Esta affecção pôde proceder a aquclla, de que falíamos , assim como se lhe pôde seguir. Tem a mesma causa , cuja acção he mais vezes periódica que continua. Da mesma sor- te que na primeira, a fluxão, - que-obra sobre o estômago, pôde tamhem dirigir-se ás veias lácteas, e deforganisa-las a ponto que filtrem desmesuradamente. Neste caso ha mais desperdi- io no estado verdadeiro de saúde , e o doente come assombrosamente. Por tanto pôde ser que huma enfermidade excite hum apprtile desordenado, como ha outra que estor- va comer bastante, Esta affecção pertence á classe das en- fermidades chronicas; deve-se regular o tratamento como tal Jivacuando as matérias, que desarranjão esta parte d.is func- ções naturaes, ellas se restabelecerão infallivelmente. O sueces- so dependerá de se haver attacado a causa cm tempo op- portuno , ou de não. ser muito inveterada , quando se empre- gar este meio. Hemorragia* A hemorragia nunca tem lugar sem romper-se, ou gas- tar-se algum vaso, ou túnicas de muitos vasos ao mesmo tempo. Este estado de cousas be causado pela serosidade que circula no sangue , e que não he nada menos que cor! rosiva. Esta terrível affecção não pôde ser considerada , no momento, em que se manifesta , como huma enfermidade re- cente , porque he sempre o resultado de huma depravarão chronica dos humores. Se assim não fosse , a Jluxão não te,ia lanta mahgmdade, quanta appresenta neste caso; e ella não seria tao volumosa, quanto deve ser em buma de sangue (1) Curámos muitos indivíduos attacados desta moléstia" que erao obrigados , quando se deitavão, a ter a cautela dè deixar ao lado da cama hum pedaço de pão , e hum copo de bedida, para usarem pela noite quando erão accordados por esta mesma necessidade de alimentos. Restabelecidos , não precisarão desta cautela, ' IW0 (99) He evidente que para destruir esta enfermidade , e salvar a vida do doente, deve-se retirar da circulação ã serosidade, que dá lugar a effusão de sangue , e que esta s.; deve fazer eahir com as matérias, que a formarão. Como o caso he muitas vezes dos mais perigosos , não convém meias medidas. Ou a hemorragia se manifeste pelo nariz, ou pela boca , ou por outras vias ; a vida do doente está sempre em grande perigo , mormente se a effusão de sangue he considerável. Nunca se de- ve augmentar a força deste fluido , quer pela sangria , quer pelas .sanguexugas. Se o sangue fosse hum ente animado, ellç diria indubitavelmente a aquelles , que o dcrramão neste caso, como em todos os outros : " Não he a mim que deveis des- ., truir , porque vertendo me abreviacs os dias do individuo, ,, que quereis conservar. Ao contrario deveis tirar o queem- „ barga o meo movimento, comprime os vasos, e tem rom- ,, pido as túnicas 4 sem o que eu não sahiria Deveis eva- ,, cuar a causa da enfermidade; eu lambem padeço, deveis „ curar-me. Já a vida do doente tem recebido da hemorragia ,, hum golpe mortal ; pela perda do calor natural , e pela „ dissipação dos espíritos , que dimanão do meo todo , e „ e que constituem em perigo essa vida , que vós ides des- 9, truir por hum procedimento mais que temerário. ,, Os astringenles , que se empregão não são mais saudá- veis que os outros meios, de que ordinariamente se usa; não podem suspender o sangue senão estreitando os vasos, e por conseqüência contendo nelles a Jluxão. Quando a Na- iureza não está desembaraçada do pezo , que a opprime, po- deria alguém lisonjear-se de haver subtraindo hum doente ás enfermidades, que mais tarde hão de destrui-lo ? Se os doen- tes tratados com estes remédios, ao menos insignificantes , não suecumbem aos attaques da hemorragia , elles cahem depois , huns em syncope, ou em pthysica , outros em hy- dropisia , e em affecções de peito ; do contrario sofírem huma serie de accidentes , conseqüência natural do seo estado va- letudinario; vexada a sua vida de enfermidades de toda a espécie ; não lhe resta outra esperança mais que o fim pró- ximo , ou languido de sua existência. Admitíamos o emprego desses fracos recursos , quanto poderem casar-se com o processo curativo; mas attaquemos na sua presença , a causa interna da enfermidade , e sejãQ as evacuações praticadas na fôrma do art. o.° da ordem do tratamento do nosso methodo. Se a perda do sangue tiver lugar pelas vias superiores , deve-se ( se não houver cousa que embarace) purgar.com os dois evacuantes alternativa» 13 ii ( 10DJ mente r do contrario cmpregue-se só o purgante. A1 medida que se aífastar o perigo , o doente deve entrar no artigo -£.» O vomitoiio-purgante não sendo já necessário , se se tive* empregado no principio, admitte-s? exclusivamente o purgan. te. Quando a hemorragia se declara no ânus, e nas mutue* fes na.-í partes sexuaes, o vomitorio-purgante não tem appli- cação senão nos casos de enchimento de estômago; dá-se, e repete-se o purguite só. Em ambos os casos deve ser appli* fcado em doses h rtes, para produzir abundantes, o numero* sas evacuações, .: fim de retirar, o mais promptamente posí sivel, da circulação , a serosidade, .que causa o accidente. • Hum emplastro vesicatorio em huma perna , ou em am* bas , se quizerem , temendo que hum não s«ja suíiieiente, he para assim dizer sempre necessário ; porque suppundo quç «eja inútil para muitos doentes, que os purgantes poderiãc livrar sem este soecorro , he incontestável ,, que em tal cir* constância se devem empregar os meios, que dão huma sur perabundancia de segurança, porque tem elles podem morrer alguns doentes. Co lie a. Colica he o nome de huma dor, que se sente no canjjtf intestinal ; esta doença se chama colica, porque dizião que 0 intestino eclon era attacado deiia mais vezes que as outras entranhas. Deo-se á colica differentes nom. s , como calica tfatulénta , ventosa . biliosa , histérica , nervosa , &c. ; os soffrimentos se estendem .-rró- o estômago. As eólicas tem tot das a mesma causa, m*s cilas attacão differentemente as vis» ceras. " Gastar tempo com licores espirituosos, com fricções seca* sobre a parte anterior do tronco , com panos quentes sobr* ©.ventre, com a theriaga ?obre o estômago, he deixar in* vcerar esta enfermidade, e torna-la talvez incurável. Outro tanto so pôde dizer das bebidas d\igua de cevada, de asxo* quente, ou panada, dos banhos, das sangrias/, das ajudas; © dos cairr.antes em-geral. Até se tem visto em casos siroU iliantes alguns práticos fazei oro tomar a scos doentes , até huma. libra de azougue , e balas de espingarda, com rUco cios maiores accideiítos. Nenhum destes meios pôde ser cura». two , porque não tem relação alguma ,com a causa bus. moral. ■ As eólicas não se podem destruir senão pela evacua-ão daí mate«aS ?ue * faiem soff,er. Ou sejáo produzidas pelo volume destas matérias, e a contracção dos intestinos que ( ioi ) 3*odu scgnir-se,' ou o principio dellas seja a'serosidade*, que pôde roer as entranhas , e causar o pailecimento , quanto ,-á cura he a mesma cousa,. ou o mesmo processo. Se a dor he no estômago , deve usar-se do vomitorio purgante alternati- vamente com o purgante, até que mude de lugar. Se he co- lica verdadeira, a dor he íó nos interinos; o purgante a des- vanece; o vomitorio purgante não tem neste caso outro ob- jecto senão despej Estas duas enfermidades , cujos symptomas assustuo, tem |)or causa a sei Oi idade , que neste caso , summamente abra- íadora , ou corrosiva , enrosca o intestino ileum , supprime ioda a dejecção pelas vias inferiores, excita horríveis vômitos, encrispações , conlracções , huma febre muito violenta , e pro- duz em fim os signaes mais atterradores , relativamente aoe .solFrimentos , e á vida do doente. Indicão-se os emplastros vcsiçaíQrios em ambas as pernas. Prescreve se a evacuação mais activa conforme o art. 3.° da ordem de tratamento ; p vomiíorio-purgante e o purgante devem ser admioiíitrados al- iem a ti vãmente , até que o primeiro não tenha mais objectou, e q ultimo k';é a cura radical, segundo a marcha ordinária tio tratamento. ! DiarrMa , lienteria , sol/ura de ventre. Se estas *:es affecções , ou somente huma dellas , fos- sem causad&s pelo-uso.de certos alimentos estranhes á natu- reza, ou aos hábitos da pessoa, conviria sem contradicção abrir mão desses alimentos, ou ao menos corrigi-los. He ra^- 10 que esta mesma causa não seja complicada com a canga shumoral, <>u agçravada por ella ; também he raro que não sejão necessários alguns purgantes nos tres casos, para expul- sar o principio da degeneração, que se acha estabelecida nas entranhas. (102) Quando falíamos da causa do vomito , dissemos que os humores adquirem algumas vezes a natureza d.e emeticos. -De- víamos dizei* que também podem tomar a de purgantes ; rmis tínhamos reservado fallar a esse respeito , quando tratás- semos das affecções do canal intestinal e das evacuações, que soíire pela acção desses mesmos humores , que o seo estado de corrupção avisinha á natureza dos evacuantes. A diar- rhéa he causada pelas matérias depravadas que accelerão o movimento peristaltico do canal intestinal , e produzem eva- cuações extraordinárias , e mais ou menos numerosas. A lien- leria difrere da diarrhéa, em que cm primeira affecção os alimentos se evaruão sem ter soffrido alteração , para me expressar assim. Não ha duvida que o canal intestinal e o estômago neste caso estão forrados de matérias viscosas capa- zes de paralisar toda a acção digestiva ou de cocção ; igual- mente he sem duvida que os alimentos diários não podem serwr mais que de entreter este estado de desorganisação e de enfermidade , que não tardaria em tornar-se funesto , se não se appressasse a expulsar hum símilhante fundo de hu- mores. O emprego dos astringentes em geral, procede de hum systema errôneo; não faz mais que concentrar a causa de toda a soltura, e conduzir aos resultados mais tristes. As pessoas , que não reconhecem a causa das doenças , crêm fa* cilmente que he inútil ou perigoso empregar os purgantes quando , como dizem , o doente já evacua muito. Entretanto he verdade que , quanto mais se purgão neste caso, mais se diminuem as evacuações da diarrhéa. (1) (1) Lembramo-nos de hum homem, que foi attacado de huma diarrhéa tal que no espaço de 24 horas as evacuações chegavão a 6. Esta doença durava muito tempo ; o doente já não comia; esteve bem , e devidamente condemnado amor- le9 ou reputado em hum estado desesperado : náo podia achar-se em pior situação. Applicou-se-llie o nosso methodo ; deu-se lhe huma ligeira dose de purgante; suas evacuações reduzirão-se quasi aos dois terços do numero costumado ; a dose do dia seguinte as reduzio ainda; e successivamente hou* ve reducção , de maneira que depressa foi necessário nug- mentar a acção, ou o volume das doses, para ter o numero ordinário de evacuações recommendado por este methodo. En- tão o pobre doeute hum pouco alliviado pode achar gost© nos alimentos ; apparecco o appetite , e ficou fcão. ( 103) A evacuação, neste caso , deve praücar-se conforme o art. 2 da ordem do tratamento , por meio de algumas doses do vomitorio-purgante , quando for indicada a sua necessi- dade , e que devem ser seguidos de outros tantos do purgan- te qurntos se julgarem necessários para restabelecer as func- ções naturaes e a saúde. (1) Dj/ssenteria. Esta doença se reconhece pelos caracteres seguintes : Evacuações humoraes accompanhadas de febre , e de tenes- mos, de dejecçÕes sanguinolentas , e algumas vezes de sangue puro. A scosidade provoca o canal intestinal ás evacuações, e por sua grande acrimonia rompe , ou despedaça os vasos sangüíneos. A evacuação desta matéria he recommendada conforme o artigo 3.o, até que o perigo se remova , depois deve se se- guir o 2.o Nesta affecção , o uso do vomitoric-purgante he geralmente necessário, e talvez não haja hum só caso, era que se possa dispensar inteiramente. Quando no paiz, que se habita, muitas pessoas estão ja attacadas desta doença , cumpre desconfiar ; e como acer- ca de todas as enfermidades epidêmicas , deve observar-se de perto , consultando muitas vezes o Quadro da Saúde. Quan- do se sente desarranjo na saúde , ou attaque desta doença , não deve haver demora , ou evacuar-se activa e fortemente. He muito máo systema pretender adoçar o humor dissente- rico , e oppor-lhe os astringentes, que o concentrão nas en- (1) Em todos os casos da diarrhéa , a prudência requer que se comece, ou que se continue a evacuação por doses mais ligeiras que nos casos ordinários. Nota-se muitas vezes a cerca de certos doentes em tra- tamento , que huma dose purgaráva he seguida de soltura, ou que a pessoa no outro dia , como no mesmo, em que a tomou , o que lhe faz crer que esta dose era capaz de purga-la dois dias ou mais. Esta soltura pôde sobrevir aos indivíduos , cujos humores encerrão hum principio purgativo , com aquelle de que falíamos na paff. 102, e que provavel- mente estavão próximos a experimenta-lo. Quando accontece este caso, devemos conduzir-nos como prescrevemos, isto he , continuar os purgantes , diminuindo porém a doae como re- commendámos. ( 101 ) trailhas.' A disscnteria não produz ordinariamente estragos tão assustadores. e terríveis- em seos resultados , senão cm conseqüência deste engano que tem conseguido voga, que estava bem longe de merecer. (I) Tenesmo , puxos. ^ A serosidade acrimoniosa , junta na extremidade do ca- nal intestinal , chamado recto, põe esta parte em acção quasi continua , e excita de tal maneira freqüentes desejos de hir á banca, com dor , sem que dahi resulte, para assim di- aer, evacuação alguma. Esta aífecç:To pôde sobrevir durante 0 tratamento de qualquer espécie de enfermidade , assim co- mo pôde ter huma causa primitiva , e que lhe seja particu- lar. O purgante suficientemente repetido livra desta doença, que desprezada , tomará bem depressa hum caracter bem serio. Constipação , ventre duro , preguiçoso. Esta affecção tem por causa o calor dos humores , ou a fluxão ajuntada sobre o canal intestinal para a sua parte superior ; ella o endurece , e o torna insensível á expulsão das dejecçÕes diárias. Este mesmo calor produz outro effeito que he dessecar as matérias, fecaes , e coze-las muitas vezes om fôrma da massa dura; este effeito se torna huma segun- da causa ; e da sua reunião á primeira , se fôrma a cons- tipação ou suppressão de huma parte importante das funçõea naturaes- Estas funções devem fazer-se, como diremo6 no Qua* dro ela Saúde; de outra'sorte o sujeito está doente ou em hum estado mais que visinho da doença. Não se deveria demorar a evacuação da causa da cons- tipação , nem deixa-la estabelecer em posto fixo , porque de- ve-se dahi esperar os peiores effeitos. He sem duvida que as e.xcreções retidas , adquirem , por sua corruptibilidade hum , (l) Observa-se algumas vezes , particularmente no trata*. mesto das doenças chronicas , evacuações sanguinolentas , e até sangue puro. Enfio os que não conhecem a causa das uoeuças , tornão se inquietos. Soceguem , e reconheção neste eífeito a natureza acrimoniosa ou corrosiva dos seos humores ^ que produz huma erosão nos vasos , e que neste caso he ne^ cessa rio expulsar promptamente similhantes matéria», como nó "da disscnteria caracteri%ada. (105 ) gtáo de corrupção susceptível de produair os mais fcmcstes resultados. Deve-se ás Observações da pratica a convicção, que a metade das doenças chronicas, nas mulheres, mormente as moças, provém da constipação ; a ella devem as cores anir madas , quasi roxas , as freqüentes dores de cabeça , de esi tomago , cs frouxos, que tantas vezes são seguidos de afTec- çoes nas partes sexuaes, &c. , Stc. Quanto são funestos os prejuízos, que fazem crer que a constipação he hum signal de força, de saúde !.... Estas victimas do erro não perce- bem que a saúde , que ellas pensão possuir , não he mais que o simulacro, e que se parece boa , devem-o a que esse humor caloroso tomou antes pousada nesta parte do corpo ào que em outia qualquer; eque, se esta fluxão chegar a des*-- viar-se, se declarará huma doença mais ou menos perigosa.; Com a constipação se descansa sobre hum yolcão , cuja, eru- pção quasi infallivel he sempre temível. (1) O tratamento evaeuante repetido segundo o art. 2. , se a constipação he moderna , e conforme o artigo 4. , se he chronica , restabelece esta função importante da Natureza. Flatuosidade, Tympanites. A plenitude humoral he a causa , que intercepta o livre curso do ar, que se respira; embaraça-lhe rarefazer se , e sahir pelo movimento de expiração, em quantidade igual a aquella, que entra pelo da aspiração. As flatuosidades , ou os ventos , não podem por tanto deixar de reproduzir-se emquanto se não houverem evacuado suflicientemente os humores. Esta pratica he preferível sem duvida ao uso dos remédios carmi- nativos , porque a plenitude não pode existir sem mais ou, menos corrupção nestas matérias , e que expulsando-as antes que sejão mais malignas, se preservao de seos etícitos ulte- riores. Demais o estado ventoso existe raras vezes só; ha sempre alguns outros soffrimentos, que dão ao methodo pur- (1) Reconhecei vós, a quem afflige esta doença, que as forças que vos attribuem , não são senão o effeito da tensão da fibra e da irritação do systema nervoso , pela acção da causa , que se vos tem indicado. Reconhecei igualmente que a constipação vos faz o mesmo prejuízo que, se cm hum caso ãe soltura de ventre , hum máo fechasse a sahida pela qual a Natureza quiz que voelJ corpo expulsasse suas dejecçÕes, A comparação he das mais justas. ( 106 ) gativa dois objectos. A necessidade de purgar hc assaz indi- cada, quando os ventos, que sahein, trarem hum cheiro, que não deixa ignorar a existência de hum germen , ou de hum foco de corrupção nas entranhas. A tympanites , que he huma inchação , que resulta de amontoar-se o ar nas difTerentes partes do tronco, ha de ceder, como a affecção ventosa; ás evacuações repetidas ; o art. 2.°' para os casos recentes-, e o artigo 4.°, se as affecções são chronicas. Hemorroides. A hemorroide he huma varise similhanfe á que se obser» xa nas pernas de algumas pessoas. He causada por huma parte de água, que depois deter feito huma intumesceucia, ou engurgitamento, produz depois a dilatação dos vasos \enosos. OS que estão perto do ânus se charuao hemorroidaes; por esta Jasao se tem chamado hemorroide, quer seja interna, quer externa, ou fina, ou não flua. A serosidade, que se demora para fazer soíirer o eugurgilamento hemorroidal, he muitas ve- zes excessivamente acre; quando o he tanto que penetra os vasos corre hum sangue, que está longe de ser sangue puro ; está empregnado da mesma Jluxão, e algumas vezes de matérias purulentas. Ordinariamente não se oppõe senão alguns tópicos ado- çantes e insuficientes. Todavia he huma doença curavel corm* outras muitas. Não importa menos destruir as hemorroides do que as outras affecções , porque tem a mesma causa ; porque o transporte da serosidade, que abandona o local das hemor- roídes, pode fazer-se sobre qualquer outra parte do corpo e causar nova> doença, ou hum grave accidènte. Quasi tem Havido o arrojo de affirmar que para passar bem se deve soffrer hemorroides. Que estranha maneira de discorrer sobre a causa das doenças ! Porque ?■ Porque ha de haver huma espécie de exsutorio estabelecido no ânus , pelo qual corre buma porção de serosidade , se julgará algum seguro, quando tenvtudo, que temer dessa fluxão f quando de repente , dei^ xando o seo local , pôde hir ter a algumas válvulas dos va- sos , e estancar subitamente a circulação .' Reflictamos pois Deixemos de sacrificar ao erro, reconhecendo os factos attesl tados pela obserTação. <*«es- Contra a hemorride recente, deve praticar-se o methodo { 107 ) Nephritis verdadeira. A dor nephritica , ou a inflammação dos rins, merece grande attenção. Aquelle que reconhece bem a sua causa, as- sim como os meios de destruída , evitará seguramente os fu- nestos effeitos deita doença. Pela continuação pôde conduzir ao que se chama calculo , ou á formação da pedra. Traba- lhando , segundo os princípios, que adiante se hão de desen- volver , por prevenir este gênero de enfermidades , não se poderia esperar obter alguns direitos ao reconhecimento de tantis entes, que poderão preservar-se desta doença? A dor nephritica he causada, como as outras dores, pela serosidade, que o sangue tem depositado sobre as membranas nervosas, que forrâo interiormente esta parte do corpo , cha- mada bacia ; também se chama alguma vez colica nephritica. Esta dor podia ser periódica sem que a serosidade , sua cau- sa efficiente, se fixasse definitivamente sobre esta parte; e elh he viva, ou aguda , como são todas as dores, todas as *ezes que esta fluxão he revestida de huma grande maligni- dade , ou he mais ou menos corrosiva. Se em lugar de sangrar , ou pôr bixas aos doentes , è refresca-los ; se em vez destes tópicos insuficientes , de que ordinariamente se usa , se empregassem os purgantes , con- forme o art. 2" da ordem do tratamento., e sendo preciso o 3.°, destruir-se hia esta doença, como se destroem todas aquel- las, que tem huma causa igualmente interna , qnando se at- taca em tempo útil. O vomitoiio purgante não he necessário senão contra a plenitude do estômago. Requer se o purgante até sarar , e conforme o art. 4.°, se a affecção he antiga cft inveterada. Nephritis falsa. Esta affecção he huma dor muitas vezes reumatica , que hc causada pela Jluxão ajuntada nos músculos dos lombos, ou algumas vezes na bacia; mas esta serosidade não tem a ma- lignidade, que s>e nota na verdadeira nephritis. Designa-se muitas vezes esta dor pelo simples nome de dor de rins. At- tacada no principio , el!a pôde ceder á applicação do arti- go 1.° da ordem do tratamento , e sendo necessário do 2." Se he chronica, deve observar-se o art. 4.° O vomitorio- purgante não tem aqui objecto senão no caso de enchimento de estômago : e geralmente fallando, o purgante he sufliciente contra este gênero de doença. 14 ii ( 108) Areias , Pedras. Não se evacuando a causa da nephritis falsa , esta pó. de adquirir o caracter da verdadeira ; assim como de não se evacuar a causa desta ultima, resultarão, como temos dito as conseqüências funestas, de que imos traçar o quadro af- flictivo. Em principio geral (já muitas vezes o temos repe- tido ) quando a serosidade he producto de matérias corrom- pidas em extremo , he sempre ardente , ou ao menos exces- sivamente calorosa, Com este caracter hs que ella obra na formação da pedra ou das areias, e he também porque estas matérias em certos indivíduos se compõe de partes passivas de concreçÕes pedregosas, ou arenosas, juntas na substancia dos rins , que a serosidade opera o cozimento dô liuma porção salina da phleugma que ahi se acha, e cr> meça por converte Ia em huma substancia semi purulent». Huma parte destas areias demora-se algum tempo nos rins; jporém o mais ordinário he descerem á bexiga pelos ureteres! Alli se reúnem , e fórmão a pedra propriamente dita , que" he capaz de tomar com o tempo hum volume , mais ou me- nos considerável. Algumas vezes fòrmão-se muitas pedras de differentes grossuras ; ou se ha só huma , pôde ser accom- ;>:uihada de grãos de areia , símílhantes a pedaços de saf, ou de assucar candi. A pedra nada sobre a urina , e se apl presenta no collo da bexiga. Esta víãcera entra em acção para expulsar o fluido excrementicio, todas as vezes que está cheia. Este corpo estranho ostrangeiro sobre o collo da bexiga embaral ça a suhida; daqui vem as dores, que o doente soffre. Estas do- ses se augméntão muito, tanto pelas pancadas repetidas, que a pedra bate , ou deve bater contra a membrana nervosa-, como pela acrimonia ou calor excessivo deste fluido, e pela plenitude resultante da suppressão parcial ou total da pas^ sagem da urina. A operação da lithotomía consegue tirar a pedra da be- xiga ; mas accootece muitas vezes que no espaço de hum anuo, ou dois, forma-se outra pedra, e então "he necessária nova operação. Tem-se feito successivamente até três; o que ítí deveria esperar , porque não se havião empregado os meios próprios para destruir as causas forraatrizes desse corpo es- tranho. Emquanto se não fizer isto , poderáõ repetir se os mesmos accidentes; da mesma sorte também haverá periga para aquelles, que soffrerem esta operação, quer para o fL turo, quer no momento, em que se pratica. ( 109 ) Pensamos por tanto que antes de fazer a operação da pedra , seria necessário purgar o doente segundo o artigo 4." da ordem do tratamento , até que a sua saúde houvesse me- lhorado , de sorte que elle podesse dizer que passaria perfei- tamente bem, se não tivesse este incommodo. (1) Se a chaga resultante da operação não vai sarando , co- mo deve accontecer a huma chaga simples e recente em hum sujeito de boa saúde ; se vem inflammação ; se suppura mui- to , e por muito tempo; se ameaça degenerar em ulcera; &e a saude do doente se altera ; se as funções naturaes se desarranjão ; se finalmente , não está no quadro da saude , he necessário repetir os purgantes na fôrma do mesmo arti- go 4.° Depois da cicatrisada a chaga, o doente deve ter euidado de repetir , de tempos em tempos, alguns pur- gantes para evitar qualquer espécie de reproducção. Seguin- do pontualmente as regras, que havemos prescripto , o doen- te se livrará de novos attaques. £2), (1.) Temos tido muitas vezes na nossa pratica oceasião de verificar a excellencia deste curativo. Podemos citar o pai do nosso amado genro , M. Coítin ; soffreo a operação da talha depois de se ter sujeitado ao. tratamento prescrito neste methodo, e da maneira que fica explicada. O primeiro be- neficio , que experimentou, foi não ter febre depois da ope- ração; e em segundo lugar, a chaga, que não suppurou, ra- pidamente cicatrisou. Este homem , pelo menos de 6'0 annos, na oceasião da operação, goza hoje de huma saude tal que, segundo elle dia , nunca teve melhor. Recobrou forças, e hum vigor tal , que naquella idade poucos homens poderião gabar-se de similhante , mesmo daquelles que não tem soffri- tío doenças graves. Ora , pergunta-se aos homens imparciaes; a quem deve este doente esta preciosa vantagem , senão á depuração dos seos fluidos pelo uso dos purgantes suficien- temente repetidos í (2) Dissemos que os purgantes obrão sobre as vias uri- r.arias; todos podem \erificar este facto. Elles exercem alli tal acçáo, que muitas vezes faz lançar pequenas pedras ; particularmente em Nevers , na Ferté-sous-Jouare , Elam- pes , Orleans , Verdmn, na Martinicia , e em outros luga- res. Podemos afirmar que o mesmo accontecerião ás que appresentar maior volume, sem a estreiteza da passagem , que se oppõe á sua sabida, mormente no homem. ( HO) Ischuria* A retenção, ou suppressão de urina, chamada ischuria, lie causada pela fluxão junta no collo da bexiga, e sobre o sphineter ; ella os crispa tão fortemente por sua acrimonia , que estas membranas não podem dilatar-se mais para daf passagem á urina. Õs processos, que se oppoe a esta affecção, consistem na iutrodueção de differentes velinhas, a fim de dilatar o ca- nal da uretra, bem como a entrada da bexiga; emprega-se a tenta oca com o mesmo intento , isto he para ex- trahir a urina junta , que então se torna huma matéria no- civa , cuja demora prolongnda pôde trazer com sigo os maio- res perigos. Que ? Não sk tem ainda reconhecido que estes processos nem mesmo são meios palliativos, porque a tenta e as velinhas são corpos estranhos, que obrão de viva força contra huma causa, que lhe resiste ? Este s meios são tanto mais peri- gosos , porque da violência, que fazem ao sphineter e ao cllo da bexiga para abri-los, resulta huma destruição total de elasterio nestas partes; donde vem a incurabilidade da mcít le*tia , eu a puneção no perineo , cujas conseqüências são quasi sempre accompinhadas dos mais funestos accidentes. Esta doença , caracterisada pela absoluta supressão da urina , requer que os purgantes se empreguem na forma de artigo 3.0 da ordem do tratamento , a fim de deslocar a fluxão, que tem tomado assento sobre as vias expulsivas desta parte exerementicia dos fluidos. Para ajudar a acção dos purgantes , es emplastros vesicatorios podem alguma vez ser uíeis. Neste caso devem-se applicar ás pernas com preferen- cia a qualquer outra parte do corpo. Restabelecida a pas?a- gvm da urina, segue se o tratamento na fóima do artigo 4.° até se restabelecer. (1) (\) Suppondo que em hum caso urgente fosse necessário recorrer "ao que nós chamaremos remédio extremo , isto he,, á iutrodueção das tentas, ou velinhas, nem por isso se dei- taria de-empregar os purgantes na fôrma dos artigos citados^ para desviar a causx da srippressão ,. e esperando evacuar^ e sarar o doente. [( líí J Incontinencia de urina. O corrimenfo involuntário da urina não pode ter lugar sem a presença da Jluxão sobre o collo e o sphineter da bet. xiga , que crispándo-as , de dentro para fora, os tem conti- nuamente abertos , e embaraça que se fechem. Neste caso esta affecção pôde ceder ao tratamento dos purgantes pratica- do , conforme ella he moderna ou antiga , por aquelle artigo da ordem do tratamento, que lhe for appiicavel, pelo estado de inér- cia e de paralysia das partes orgânicas das vias urinadas. Stranguria , dysuria. Estas duas affecções se confundem , e a sua causa he pouco mais ou menos distribuída da mesma maneira no local que elle occupa. A vontade de urinar he continua na stran- guria , e a urina sahe gota a gola com dor. Na dysuria , a urina corre com difficuldade , mas descarregada a bexiga , cessa por muito tempo a vontade de urinar. Isto basta para reconhecer a existência da serosidade , em extremo acre de sua natureza , que está junta ao collo e no sphineter da be- xiga , e que dalli se derrama no canal da uretra. Demais , quem poderá duvidar que a urina contém hum principio acre, mais ou menos empregnado de partes salinas , ou nitrosas , e capazes de agravar a moléstia ? Estas affecções são o produeto da depravação chronica dos humores; cumpre evacuar estas matérias com os puri» gantes èm conformidade do artigo 4.° da ordem do tratamea» to. O vomitorio-purgante raras vezes he necessário. Diabetes, A deença chamada diabetes, he huma excessiva evacua- ção da urina , isto he , muito mais considerável do que a quantidade de liquido de que o doente costuma fazer rso. Esta urina está muito longe do estado natural ; appresenta "varias mudanças, e todas as qualidades de alterações em sua natureza ordinária. A diabetes em alguns casos he huma crise saudável; em muitos outros, ou quasi sempre, esta evacua- ção he nas vias urinarias o que a diarhéa e a lienteria são no canat intestinal; por conseqüência he huma affecção pro- duzida pela depravação dos humores. Os nossos sábios tem inculcado muitas cousas «obre hum pertendido principio sac- ( »2 ) carino , que se diz haver achado cm muitas destas uri- nas. Daqui se pode tirar conjecturas , e construir systemas a perder de vista (1) ; porém he mais útil reconhecer a causa, e curar os doentes do que divertir o espirito com vãs chi- mécas. Os purgantes , na fôrma do art. 4.° da ordem do tra- tamento, podem dar saude aquelles que a tem perdido, sem embargo de que a sua urina appresente cousas curiosas, e susceptíveis de judiciosas analyses. Hérnia. He fácil explicar a causa da desloeaçao das parfes con- tidas nas cavidades; da mesma sorte lie fácil explicar aber- tamente a de todas as hérnias , ou quebraduras. Este gênero de enfermidade he muito mais do que pensa a maior parte dos homens, o effeito de huma causa de doença , ou quando menos o de huma má disposição de fluidos. Attribue-se or- dinariamente a causa das hérnias , ou quebraduras , a hum «xercicio violento , a esforços , a gritos , sem reparar que a hérnia sobrevem da mesma maneira a aquelle, que nunca ex- perimentou algum destes contratempos , nem accidente algum. Reduzem-se ordinariamente á operação da mão , para reduzi* Ia , e conte-la ; o que he muito insufficiente para curar. Quasi toda a hérnia he precedida da colica ; algumas vezes apparece em hum accesso desta dor do canal intestinal. Não faremos nomenclatura , nem descripção das hérnias ; bas- ta saber-se que todas ellas tem a mesma causa inter-na , e se curão pelo mesmo modo. A hérnia he o effeito de huma relaxação tanto das mem- branas , que envolvem as visceras contidas , como dos ligamen- tos, que os prendem; a parte continente dilatada ou relaxa- da , deixa escapar aparte contida. Dissemos no Capitulo I., que os sólidos são subordinados aos fluidos. Ninguém pôde duvidar desta verdade , porque em conseqüência delia, e de huma depravação qualquer dos humores he que ha hérnias , e todas as oiatras desordens nos sólidos. No estado de saude , que suppoe sanidade nos fluidos , os suecos nutritivos ali- mentão, e corroborao iodas as partes, que compõe o corpo (1) Quem sabe, nos disse hum engraçado, se se acharia nella hum gênero summamente vantajoso para supprir o as- «ucar da cana, ou de belterraba,,.., ........m ( 113) dos sólidos. Quando pelo contrario os humores esião corrom- pidos , quando o sangue está sobrecarregado delles , bem co- mo da Jluxão , que elles produzem, as carnes , os tegumen- tos , as partes continentes em fim , que são estes mesmos só- lidos , não são já alimentadas senão de hum fluido debilitante e relachante. Destroe-se o equilíbrio entre ellas , e as partes contidas ; a força, que retém, he então inferior á sua carga, e declara-se a hérnia. Se nesta circunstancia o doente tem feito algum movimento extraordinário , ou se tem soffrído a acção de alguma causa externa, attribue-se-lhe a causa da hérnia. Parece que se não adverte que este mesmo doento muitas vezes tem feito outros exercícios summamente laborio- sos , e não lhe sobreveio desloeaçao alguma. Não se repara que em tal caso , a acção da causa externa , ou accidental, não haveria tido conseqüência alguma sem a preparação, ou a adjunção da causa humoral. Logo que apparece huma hérnia, ou ella seja completa, ou apenas começada, deve reduzir-se, e conte-la conforme o methodo costumado O tratamento purgativo repetido póu^ ajudar a reducção , e destruir a inflammação sobrevinda. De- morando-se este soccorro, torna-se a cura duvidosa , mormen- te nas pessoas adiantadas em idade. Se o individuo está em relação a seos humores , ou á sua saude, em hum estado de depravação antiga , será diíncil de curar. Acabada a reducção da hérnia, e bem conservada , pratica-se a evacuação dos humores na fôrma do art. 4.o da ordem do tratamento com o purgante só , emquanto for possivel ; ou se he indispen- sável o vomitorio-purgante, deve empregar-se huma fraca do- se , para obrar brandamente. (1) Ictericia. Esta doença he tratada eficazmente pela evacuação da büis, que enche as cavidades, assim como inunda a cirruia- ção. Os purgantes são sem duvida preferíveis a todas e «as beberagens, que nao podem faze-la sahír do corpo, i3eve.sc (1) Nas hérnias se comprebendem as quebraduras etc; ma- dre, e a descida de vagina. Os pessarios são como a ligadu- ra hum palliatívo, que tem necessidade de ser ajudado pclüs mesmos mesmos purgantes. A dsscHa do intestino recto , ou. do ânus , não tem outra causa se não a depravação chronica dos humores. Estas três affecções são como as hérnias. 15 ( »o Conformar ao artigo 2.0 da ordem do tratamento, e se for necessário ao 4 °; o vomitorio-purgante he geralmente neces- sário , como se tem indicado nas aílecções das primeiras vias* Gordura. Este estado se confunde muitas vezes com o que ver* dadeiramente não he mais que huma plenitude humoral. A; gordura he cousa natural,, e não faz soffrer. A plenitude pelo contrario incommoda ; a cacochymia pôde ser a conse- qüência. Contra estas duas affecções, deve se usar dos pur- gantes , quanto fôr necessário para se desembaraçar dos seos incommodos ; deve seguir se o artigo 4.° da ordem do trata- mento , porque esta afféeção he sempre o resultado da de- pravação dos humores , que cumpre renovar, quanto pôde sof- frer a constituição do individuo. O estado plethorico se attribue quasi sempre a huma superabundancia de sangue : he hum engano. Se se tem cahido neste erro, e cm outros muitos do mesmo gênero,, he por não se reconhecer a presença da serosidade humoral, que superabunda nos vasos. Deve-se conceber que a evacua- ção desta serosidade he o único meio , que remedeia esta doença. He preciso pratica-la com o purgante, conforme o artigo 4 da ordem do tratamento. Consumpçao , Marasmo. A atrophia , o marasmo , a consumpçao , a tisica , são ou- iras tantas denominações de hum estado de magreza , que he sempre causado por huma depravação chronica dos humores,, á qual se podem ajuntar os effeitos nocivos da dieta , ou das perdas sangüíneas, dos banhos , quaes nos proscrevemos; és que resultão do uso das preparações mercuriaes , de qui- na , &c. Pelo seo calor ardente he que os humores corrom- pidos miuão , consomem , dessecão o individuo, assim como lhe fazem soffrer as dores , que supporta neste estado. Quan- do não ha que recear lesão interior , e quando o doente não he muito velho, póde-se esperar a mudança desta situa- ção. Deve evacuar-se ua fôrma do. artigo 4. da ordem do tratamento, e usar de bons alimentos capazes de fortifica-lo. Tem-se visto neste estado muitos doentes recobrarem huma saude perfeita. (115 ) CAPITULO XIII. Doenças chamadas da cabeça. A cabeça he o principal continente do cérebro , e ãé varias par tes -otganisadas para executar differentes funções vi-' taes e anunaey, e a que se referem, todas as affecções mo- raes. A cabeça também tem suas doenças physicas, como' tonturas, vertigens , e outras affecções de differentes gêne- ros , tanto interior como exteriormente. A causa de suas doen^ ças, isto he a fluxão , lhe he conduzida pelas artérias caroti-' das , assim como eüas lhe transmitem também a substancia, ■i Cephalalgia. À serosidade chegando ao craneo, e sendo alli deposi- tada ou demorada, faz sentir huma dor muito aguda, a que se dá o nome de cephalalgia ; esta dor he accompanliada de febre , e alguma vez de hum abatimento geral. A ordem do -seo tratamento será regulada pelo artigo 3, se a violência da dor o exigir; ou do contrario ., conforme o artigo 2. O vomitorio-purgante e o purgante são necessários alternada- mente no principio deste tratamento ; e para o fira pôde seç «ufficiente só o purgante. Enchaqueca. Quando a fluxão occupa só hum lado da cabeça, a doença toma o nome de enchaqueca. Esta dor he muitas ve- zes periódica , e em muitos doentes he chronica. Não diíFere das outras dores chamadas reumaticas senão no nome , e no local que occupa. Se he recente , destroe-se na fôrma tio art. 2.a da ordem do tratamento; se he chronica , convém re- gular-se pelo art. 4.°; e em hum e outro caso, o vomitorio- purgante e o purgante são necessários alternativamente , ao menos no principio do tratamento, acaba-se , como se pratica, geralmente , com o purgante só. Loucura* A loucura he hum movimento desordenado dos espíri- tos , como a febre he hum movimento desordenado do san- gue. A cautsa da loucura não diílere da causa das outras 15 ii c "6 y enfermidades; preyem igualmente da depravação dos humores contidos nas cavidades. A serosidade, que diraana destas maté- rias , he sempre ne^ta doença summamente acre ; ella se mistura entre os espíritos, eomo ella se tem filtrado com o sangue, quando causa a febre. Perturba o curso regular dos espirites , assim como para fa?rr soffrer a febre, elia íjíifarranja o movimento natural de sangue. Ella obra sobre o cérebro e os órgãos da circulação dos espíritos, assim co- mo endurece as válvulas, as túnicas , e as paredes dos vasos san^aineos para produzir o engorgitamento. Como a febre , a loucura fera seos accessos , suas intermittencias , sua con- tinuidade , seos períodos ; he mais ou menos caracterisada, conforme a malignidade da serosidade , que a faz soffrer. Ha muitas situações , que participão do estado do espi- rito alienado , que algumas vezes precedem a loucura, ou lhe suecedem. A vertige, a hypocondria, o frenesi, a mania ç as aberrações em geral são deste numero. Estas affecções tem a mesma causa que a loucura ; mas como esta causd está fixa. de maneira diversa que nesta moléstia , estas affec- ções se caracterisão de outra sorte. Tratadas como a loucura , Jogo que apparecem, em hum individuo bem constituído , se destroem como qualquer outra doença , pela evacuação da sua çiusa material , praticada com o vomitorio-purgante alterna- tivamente no principio do tratamento , e até que enfraqueça o caracter da affecção. Em geral he mais seguro regular-se pelo art. 3, que pelo segundo , mormente contra a loucura propriamente dita; e ao depois se segue o artigo 4.o, porque estes desarranjos são sempre o resultado da depravação mais ou menos chronica dos humores. Os emplastros vesicatorios nao podem deixar de produzir bons effeitos neste easo , para fazer diversão á fluxão fixa no cérebro. (1) Os meios , de que se usa ordinariamente, são as sangrias, as sanguexugas, as emborcações , os banhos, os tópicos, e (1) Hum ente, que perdeu o espirito, não he fácil de tra- tar ; he necessário muitas vezes usar da força , e violência para conte-lo , e sempre custa muito a consegui Io. Huma affecção moral , como aquella de que se fallou no Cap. III. se na em todos os casos hum grande obstáculo á cura destes doentes. Elles tem a este respeito urgente precisão de serem soecorndos por actos de benevolência , e talvez também de beneficência, e finalmente por tudo que o amor da humanU ciada pode inspirar aos corações bons e generosos» ("7 ) todas as concas , que , como infelizmente se experiracita mui- tas vezes , sno ou perigosas , ou pelo menos insuficientes. A perda do sangue , e o uso prolongado dos banhos , não são para esta sorte de doenças o menor dos flagellos. Esta- belecem a incurabiiidade da doença; ou ao menos a tornão muito difficil de d-etruir , acerca dos doentes , a que para adiatte se quizes e app icar o nosso methodo , porque es- tes processos fixão irrevogavelmente , nos órgãos da circula- ção dos espíritos , sobre o cérebro , e sobre as suas mem- branas, a serosidade, que as desorganisa muitas vezes para sem- pre. Se tem parecido que a sangria modera os accessos da loucura, he por hum effeito similhante a aquelle, que pôde produzir a effusão do sangue, em todos os outros casos, em que se pratica, porque huma porção desta serosidade se eva- cua com o sangue ; mas este processo , destruidor da causa motriz da vida , he alias muito insufficiente para estancar a fonte desta fluxão desorganisadora. Apoplexia. O caracfer da apoplexia he a privação dos sentidos e dos movimentos voluntários. Costumão dividi-la em sorosa , e sanguinea, ou golpe de-sangue. A primeira he já reconhe- cida humoral, a segunda dizem ser causada pelo sangue. He hum erro crer que o sangue embaraça por si mesmo algu- ma vez o seo movimento. A lei da circulação não he sem- pre fixa e invariável ? A agoa no rio estorva a sua corren- te natural ? Não se vê distintamente a causa especial deste embaraço ? Não são corpos estranhos , como terras , areias , quaesquer immundicias, ou o trabalho dos homens, que tem desviado a corrente da agoa, quando a sua marcha se per- turba ? Não pôde ficar duvida, a quem quizer reflectir que por falta de ter reconhecido a natureza da serosidade humo- ral, e a sua presença nos vasos, he que se tem acreditado que o sangue podia atalhar a si mesmo , assim como se tem admittido a plethora sanguinea, que não existe. Não se pôde persistir neste mesmo erro sem admittír, contra toda a ra-< são, effeitos sem causas, que os produzão. Estas duas espécies de doenças se podem destrvrir eva- cuando a sua causa, pelo vomitorio-purgante e 'o purganta álíernadamente, se se trata da primeira , chamada sorosa ; e com o purgante só, na apoplexia vermelha, chamada san- guinea. Em ambas, deve-se seguir no momento do aítaque o artigo S.° da ordem do tratamento, e com muita activi- ( 118) dade , ueando de ajudas purgativas ao mesmo tempo ; e de* pois o 1°, em rasão de que estas dcenças são sempre ef,. feito de huma depravação chronica dos humores. Na apoplexia vermelha deve-se começar pelo purgante , porque ordinariamente os sujeitos estão muito repletos; e a estes sempre he muito útil evacuar pelas vias inferiores , an- tes ide lhes dar o abalo vomitorio purgativo , empregando porém mais tarde o vomitorio purgante , quando se indicar a necessidade. Por tanto ha casos , em que este evaeuante he tão necessário, que não se pôde deixar de seguir o mesmo trilho, que na apoplexia branca, porque ha tal enchimento de estômago, que , se não fosse diminuído por hum vomitorio pur- gante, o purgante não passaria ás vias baixas , e as superiores o rejeitarião. Os emplastros vesicatorios , applieados no momen- to do attaque , podem produzir bom effeito , mas quando se appÜcarGm , deve ser sem descuidar-se nem suspender os pur» gantes, até que o doente esteja fora do perigo. Lethargia. Esta affecção absorve tão fortemente o doente, que se $rê privado de vida. Este estado não se pôde aítribuir se- não á massa dos humores corrompidos , e á sua serosidade , que absorve os espíritos comprimindo os vasos. Se a Nature* za tem ainda bastante força ; se o sangue pôde apartar a matéria, que tende a embargar a sua carreira , o doente vol- ta á vida , mesmo sem o soecorro da arte. Mas se a natu- reza he ulilmente ajudada por evacuações próprias a de- sembaraçar a circulação , a vida do doente será efiicazmenta protegida. São necessários o vomitorio-purgante e o purgante, al- ternativamente , conforme o artigo 3.° da ordem do trata- mento; porem depois de allivio, deve seguir-se o 4.» Os emplastros vesicatorios não se devem ommittir ; deve-se lançar oy-io de todos os meios, que podem evacuar, seja porque vias for , ou que ao menos são susceptíveis de produzir hu- ma diversão útil. Paralysia. A paralysia he caracterisacla pela perda do movimento» o algumas vezes do sentimento. Ella pôde ser geral , ou» particular ; neste ultimo caso , se conveio chama-la hemiple- gia. A paralysia suecede ás vezes á apoplexia; e então se reputa mais difnçil de destruir. Esta doença he sempre o ( 119) resultado de huma depravação chronica dos humores. A id*.- de adiantada he hum obstáculo mais , ou menos invencível para a cura do doente. Em todos os casos , convém para se conseguir , se não a cura , ao menos a esperança de sa- rar , accelerar a evacuação começando o tratamento pelo ar- tigo 3, e passar ao 4. O vomitorio purgante he necessário, e ainda mais se a affecção tem passado a huma das pattes superiores do corpo. Epilepsia. (1) Levada ao cérebro, sobre a dura-mater , a serosidade pôde causar accessos de epilepsia, ou fazer o que se chama eahir do alto-mal ou mal caduco. Neste caso a fluxão ema. (1) Tem-se dissertado muito , e por muito tempo sobre esta doença. Sempre se tem mettido ú cara as causas ocea- sionaes , ou as affecções moraes. Tem-se publicado, e pratica- do os systemas mais arriscados ; porém nas scientificas disser- tações, que se tem feito sobre este objecto , não se tem dito huma só palavra sobre a causa humoral , que todavia mere- ce attenção. No cap. III fizemos huma promessa, que cum- priremos agora. Emprehenderemos com confiança encher o vasio, ou ao menos lançar hum clarão luminoso sobre este ponto importante Com factos de pratica nos propomos a re- duzir ao seo justo valor todo o effeito destas impressões, que se ehamão causas, e de que a moral de hum individuo pôde s-er passiva em toda a sua vida. Dois homens attacados desta doença, e que forão curados pelos meios indicados no nosso methodo , nos fornecem cada hum seo quinhão no re- latório que imos fazer. O primeiro era hum mancebo. Bastou-lhe talvez este ti- tulo para ter sido muito sensível á morte de huma senhora , que tinha sido sua comtemporanea. Esta morte lhe foi an- nunciada de huma maneira, que o surprehendeo e affectou muito. Esta moça era epiléptica, e morreo disso, ou do pro- gresso dessa moléstia. Pouco tempo depois da noticia , o mancebo teve o primeiro attaque de epilepsia , que foi logo seguido de outro, e assim successivamente por muitos mexes; no cabo dos quaes , não esperando mais nada do curativo or- dinário , recorreo ao nosso methodo. Poderíamos cita-lo por hum exemplo de valor e de resolução, que são necessários a quem emprehende livrar-se de huma doença grave , e in- veterada. ( 120 ) na da bílis negra , ou ao menos de matérias rr-.uito corrompi- das. O sangue a envia ao cérebro pelas arte: as carótidas.; eíit- ajutita gota a gota em hum saco membraaoso , chamado kisto, que se fôrma acima da dura-mater [Jj., Quando este f-*HV« O segundo doente era hum homem de idade madura. Negócios do seu commcrcio o conduzirão a huma casa fazer huma compra. O objecto, que se queria vender, lhe foi mos- trado por huma criada, que elle ignorava ser attacada de epi- lepsia; ella teve hum attaque em sua presença. Só com ella; elle lhe prestou os soccorros , ou os cuidados que pôde. Pe- )ialisou-o a situação daquella infeliz, e sentio certo susto. Na mesma semana cahio com o primeiro accesso , e a doença se caracterisou pelas repetições subsequentes. Hum dos seos amigos , que devia o restabelecimento de sua saude ao tra- tamento do nosso methodo, por oceasião de huma doença igualmente chronica e grave , lhe fez reconhecer a urgência de abandonar os tratamentos inúteis , de que era objecto ha- via já algum tempo, e preferir-lhes o da Medicina Curativa, antes que a doença fosse mais inveterada. O doente cedeo aos conselhos do seo amigo , e porque não tinha experimen- tado os tratamentos destruidores, que assignalámos, sarou mui promptamante ; ou ao menos não desesperou de nós , como nós desesperámos do primeiro , e não teve necessidade, como este, de recorrer ao valor heróico ; aquelle valor que desen- volve hum homem valente e intrépido, que tem adoptado a divisa dos bravos : Vencer a doença, ou suecumbir combat- íendo. Qual pôde ser o resultado de tratamentos, que nao tem relação com a causa das moléstias ? Serão inteiramente nullos, mesmo prejudiciaes. Para que elles tivessem relação com a causa, seria necessário reconhece-Ia , e he o que ainda não teve lugar , ao menos em geral. E que querem dizer perten-? didas causas; que não são mais que circunstancias ou effeitos da vida ? A arte não pôde nada contra ellas , porque ninguém pôde embaraçar que aquillo que he seja, que o que foi tenha existido. Quando se conhecerá^ bem (outra vez o dizemos ) que o melhor dos remédios , que podem existir, consiste na applicação de hum raciocínio exacto ?.,.. (1) Logo fórmão-se no corpo humano, e sobre differentes partes, que delle dependem , membranas mais ou menos den- sas ou sólidas, a ponto de poder conter hum corpo voIu-> moso; tal he , por exemplo 9 huma quantidade de agoa na ( 121 ) kisto , que não pôde conter mais de certa quantidade , está cheio , o movimento das artérias , e a acção da membra- na nervosa, irritada sem duvida pela acrimonia da ma- téria, o obrigão a despejar-se; em conseqüência faz-se hutn derramamento desta fluxão sobre as meninges , ao longo da medulla allongada , e sobre os nervos, que ella põe em con- tracção pela sua corrosão. Esta serosidade de paroxismo , ou de accesso, desarranja o giro dos espíritos , faz perder conhe- cimento ao doente , e o faz eahir; os nervos, que são forte- mente irritados , communicão tão violenta acção aos múscu- los , que o doente volve os olhos , e sacode os membroí com a maior força. Sahe-lhe da boca huma matéria escumo- sa ; os dentes se apertão tão fortemente , que muitas vezes o-movimento convulsivo dos queixos corta a lingua. A íli- xão corre do cérebro ao estômago; algumas vezes se sente esta passagem ; quasi sempre o doente parece engulir a ple- nos sorvos, como se bebesse agoa em abundância. Pelo jco volume ellapeza sobre esta víscera, e sobre as artérias principaes, que comprime, assim como aífroixa o movimento dos fluidos; he por isso que o doente adormece neste momento. Quando acorda , não se lembra do que acconteceo ; está atordoado ; seos espíritos não estão ainda seguros; não sabe o que disso, nem o que fez ; ao menos esta observação he geral. Nesta doença ha mais e menos, como em todas as ou- tras. Ha doentes , que tem accessos infinitamente mais vio- lentos que outras pessoas attacadas da mesma enfermidade. Alguns grítão quando cabem ; outros sentem que se apprè- xima o attaque a tempo de se poderem deitar; muitos s"e lem- bydropisia chamada enkistada. Huma de nossas doentes da Cidade de Amiens , durante o seo curativo , deitou huma membrana de dimensão de três sobre cinco poilegad.is; ducra que ella tinha mais densidade que a peliicula que envolve a circumferencia interna do ovo. Alguns dias antes de lançar esta membrana a doente tinha senlido no ventre hum rugido tão forte , que a sua enfermeira também a sen tio. Pensamos que este rugido proveio do rompimento daquella membrana. Não he provável que para adiante se formasse hum kisto , e depois hum tumor enkistado no cerpo desta doente , sup- pondo que ella sobrevi/esse á gravidade da doença, em ra^ro da qual sujeitou-se ao nosso curativo ? Esta me.ma doente nos affirmou também ter evacuado insectos , dos quaes mut- %q% vivos, que lhe paredão símílhantes ao perceYejo. br".o de tudo, e contituiílo a ouvir; outros nada ouvem,. e de nada se lembrão. Os accersos são mais ou menos longos ©u freqüentes, conforme a maligoidade da fln xão, e o gráo cie corrupção dos humores, que a formarão, e segundo a antigüidade da doença. Tcai-se visto enfermos s.;ííVerem ac- cessos muitas vezes no dia. Não he sígnai favorável ; sem embargo alguns tem triumphado. Esta doença deve ser attacada na firma do art. 4.° da ordem de curativo, ainda mesmo quando está em principio,. ou no primeiro accesso ; porque não pôde deixar de ser con- seqüência da depravação chronica dos humores. O vomitorio- purgante, pelo qual começa o curativo, deve repetir-se ao menos huma vez contra quatro ou cinco doses de purgante ; em muitos casos deve alternar se por muito tempo com o. purgante. Esta doença , que se pôde con-iderar como hunsa das mais tenazes , e teimosas , não se pôde reputar destruí- da radicalmente , porque seos accessos não se fazem sentir em seos períodos ordinários, ou porque tem corrido certo espaço de tempo sem apparecíuem os accidentes. O doente de- ve estar muito tempo em desconfiança ; e não temer repe- tir demasiado ©s evacuantes de distancia em distancia, mes«< mo quando se reputa são. Movimentos convulsivos , tremores. Derramada sobre os nervos ou sobre as membranas ner- vosas, a Jluxão causa tremores, movimentos involuntários, quer periódicos, quer contínuos, e em toda a parte do cor- po , conforme a distribuição desta matéria , e a sua acção sobre o órgão do sentimento , ou sobre os diversos mem- bros , sem exceptuar a cabeça. Estas aííecçÕes sendo con- seqüência da depravação chronica dos humores , não se pô- de attribnir a cessação das mesmas senão á evacuação da- quelles matérias , a qual se deve pr licar na fôrma do arti- go 4.° do tratamento. O que se disse das doenças nervo- sas e das convulsões , assim como da epilepsia , se applica in- coníestavelmente a este gênero de affeeção, mais ou menos, Enfermidades dos ouvidos. Levada ao interior das orelhas; distribuída sobre os di- versos órgãos do ouvido, a serosidade pode causar zunidos, tinidos , e sibilados , e produzir a surdeza. Algumas vezes fórma-se hum deposito, e estabelece-se a suppuração, Esta» (123) differentes affecções , e a surdeza não consumm^da pela pa- ralysia do nervo acoustico , se destroem pelo uso dos dois evacuantes tomados alternadamente no principio do curativo, e na fôrma do artigo 2 em caso recente; pelo artigo 4.* se he chronico; e t>e tem dor aguda , conferme o artigo 3.° Affecções dos olhos. Ajuntada sobre o orgao da vista , a fluxão faz soffrer as differentes doenças de olhos, como a inflrmmação e pega- mento das palpebras , seo reviramento, o sarcomio , a lacri- mação, a ophtalmia seca e humida, as manchas que escu- recem a cornra , a cataracta, opacidade do cristallino, a gota serertà, que he a perda da vista sem vicio apparente no olho, e todos os accidentes, que accontecem a estas par- tes, assim como aquelles que pela continuação podem conduzir á perda parcial e total da vista. A sangria , ou as sanguexugas , ordinariamente se era- pregão não sendo mais saudáveis, nem fixando menos a matéria sobre a parte affectada neste caso que em todos os outros , em que se empregão. Quanto aos tópicos e ás ope- rações , de que se usa ordinariamente contra todas as doen- ças de olhos, não podem produzir seguramente hum bora effeito sem o soecorro dos únicos meios capazes de evacuar a causa material, que faz soffrer a dor , ou o aceidente. Todas as affecções, que ameação a perda da vista, exi- gem , attendendo á sua violência , ou á delicadeza das par- tes , que são- attacada6 , evacuações na fôrma do artigo 3.Q da ordem do tratamento. Toda a pressa he pouca para sal- var a vista. Duas doses do vomitorio-purgante contra huma de purgante , são indicadas geralmente neste caso. Esta or- dem de evacuações não se pode interromper sem risco d* paralysia do nervo óptico , e sem perigo de ver bem de- pressa a doença incurável. Nos outros casos segue-se aquelle artigo , que lhe pode ser applicavel. Se se emprega o em- plastro vesieatorio, muitas vezes indicado contra as affecções dos olhos , nem por isso deve affrouxar a evacuação ; não se deve também , emquanto fôr possível , descuidar do vo- mitorio-purgante, que convém sempre contra esta sorte de SOOiÊotiílS. Affecções da boca. A serosidade espalhada na boc» pôde por seo calor , ou „por sua corrosão , causar aphtuá , affectar as gengiyas, ui- 16 ii ( 124) cera-las , roe-Ias , desencavar os dontes , e produzir o carac- ter, ou os sjnnptomas do escorbuto ; também á sua presença se deve a tumefacção da Iingua , a destruição da campai- nha , as differentes inehaçÕes que se notão , &c. &c. Todas as affecções da boca e das partes adherentes se destruirão pelos purgantes sufTícisntemente repetidos; confor- me o artigo 2.9 da ordem do tratamento nos casos recente- ; e na fôrma do. 4. o sendo chronicas. , ou se ellas se maniiés- tão em conseqüência ou resultado de hum vicio de depra- vação existente antigamente. O emprego do vomitorio-purgan- te se recommenda geralmente. Dores de deiites. He huma gota de serosidade, ou de agoa fervendo, que o sangue tem depositado sobre a membrana chamada pe- riosteo, que causa as dores de dentes. Esta membrana for- ra interiormente o alveolo , e envolve a raiz do dente. A sensibilidade desta membrana, e a corrosão, que a serosida- de exerce sobre ella , fazem que as dores sejão ás vezes tão vivas, que se tornão insupportaveis. A causa das dores de dentes he a mesma que as de todas as affecções dolorosas ; e. quasi sempre este mal he o signal precursor de huma doença mais grave. Evacuando-se o humor , que faz soffrer nesta parte , se evitarão outros accidentes , com o que elles podem ter de Mtnesto; porque e^te mesmo humor pôde eahir sobre todas as outras partes do corpo , ou se desloque , eu se reparta. He de alguma sorte impossível ter dores de dentes, porque cll^s são quasi insensíveis; por isso, quando a Jluxão se ajunta na sua parte esponjosa , os caria, os apo- drece , e faz eahir aos pedaços , muitas vezes sem se sentir dor alguma. Se a Jluxão se derrama sobre a face, esta parte se in- cha ; a dor he então menor , e algumas vezes não se sen» te , porque a fluxão mudou de local. Usa-se de differentes tópicos, que alliviâo , se mudão de lugar a fluxão, ou se a amortecem. Não he menos desarrozoado arrancar hum dente bom, do que seria absurdo cortar hum braço ou huma perna, por ter alli corrido huma dor. Todos tem precisão de den- tes para triturar alimentos ; também he sabido que huma bocav5 sem dentes articula com difficuldade ; de mais ellea são o omato da boca, Esta extjrpação de dentes não eslan* ( 12.5 ) ca a fonfr da fluxão; o sangue continua a depo-la nos lu- gares, que elles occupavão, e no dente visinho. Muitas ve- zes esta fluxão se espalha por todo o queixo, de maneira que não se pôde distinguir qual dos dentes está mais af- fectado. A violência da dor decide o artigo da ordem do trata- mento, que se deve seguir, para evacuar os humores , e deve seguir-se aquelle, que se crê próprio para procurar o allivio mais pronto. Para o tratamento faz-se differença da pessoa , que soffre ha muito as dores de dentes, e da que he attaca- da de fresco; indica-se para esta o artigo cÀ.o , e para a ou- tra o 4."o. O artigo 3.° he applicavel quando, seguindo os ou- tros , o doente não sente allivio pronto. O vomitorio purgan- te he necessário , e se repele mais freqüentemente e se o purgante não allivia com bastante prontidão. Os dentes podres são os únicos que se devem tirar. No- tão-se pessoas que, tendo cuidado de Sc purgar conveniente- mente , conservão muito tempo dentes attacados de caria, sem que ella faça progressos sensíveis ; e es'»s dentes lhes servem como se fossem bons , com muito pouca differença* Polypo. O polypo he huma affecção , que pôde vir em diffaren» tes partes do corpo, porém o canal nasal he mais vezes at- tacado. He huma excrescencia carnosa qus , para o polypo do nariz , nssce na membrança pituitaria ; varia em seo ca- racter , conforme a malignidade do humor. A extirpação do polypo he o remédio usado : mas he insufficiente , se se não seca a fonte da matéria, que o formou , porque ha de re- produzir-se ; ou então a chaga resultante da operação não se ha de curar. Deve-se evacuar segundo o art. 4.° da ordem do trata- mento ; isto he, algumas semanas antes da operação , quo não se deve fazer senão quando o doente passa bem , quanto ás funcções naturaes. Feita a operação , o doente tornará á evacuação na fôrma do mesmo artigo , e até cicatrizar a cha- ga , e restabelecer-se perfeitamente a saude. Algumas vezes se deve empregar o vomitorio purgante ; isto quando o exi- girem as indicações , que ordinariamente deíerminão o seo uso. Rosto cheio de espinhas , e pontos vermelhos, Difundida nos vasos do rosto, porque o sangue alli está ( 125 ) acanhado em seo movimento , a serosidade he a cattsa dessa ▼ermelhid Io accompanhada de gomos, botões, e pústulas, que caracterisão a gota rosa , ou o rosto semeado de pústulas e pon- tos vermelhos O vomitoiio purgante he necessário algumas vezes ; o purgante deve empregar se conforme o art. 4.° da ordem do tratamento , visto que esta affecção he sempre o resultado de huma depravação chronica de humores. Esquincncia. Ajuntada na garganta, a fluxão com o seo calor arden- te pôde inflam mar. a pharlnge, a larinx , o esophago , a-tracha- artena, e todas as outras partes adherentes; assim caracterisa a angina , ou esquinencia. Esta enfermidade , tratada pelo me- thodo ordinário, pôde ser seguida dagrangrena, em rasão da maior ou menor depravação dos humores. Se esta enfermidade tem tido tempo de tomar hum caracter serio , deve ser tratada pelo art. 3.o da ordem do curativo, até perder este caracter. Depois trata-se conforme o art. 2. ; o qual basta quando ella he ainda benigna , ou se toma deste caracter. Em todos os casos deve começar-se pelo vomitorio-purgante, e repeti-lo quanto for necessário para desembaraçar a garganta em geral ; então se administrará o purgante só , conforme se desembaraçar o local primitivo da doença. CAPITULO XI7. Enfermidades cliamadas das extremidades. Dores rheumaticas. Hum estado de soffrimento, que se faz muitas vezes sen- tir sem febre , nem perda de appetite , ou sem desarranjo nas funcções naturaes ,, se designa ordinariamente pelo nome genérico de dores. Estas affecções são muito communs, e geralmente espalhadas. Ha climas e paizes , que oceasionão mais do que outros. Mas em nenhuma parte estas affecções diíferem pela causa efrlciente ou interna. Distinguem-se as dores por seo caracter; ellas são ambulantes , periódicas, ou fixas. Designão se pelos nomes , que se conreio dar-se-lhes. O caracter da dor ambulante se reconhece por cila mu. dar muitas vezes de bfgar ; isto he , quando a serosideide, que ainda ruo tem parado , não faz de alguma sorte mais do que toesr as partes. Ella vai ter huraas vezes á perna , (.1*7 ) á coixa , á espadua , ao braço , ao pescoço ( lorticolis) , è successivamente a todas as partes carnosas do corpo. Da-se a esta dor o nome de reumatismo. Dor periódica he aquella que , depois de ter deixado de se fazer sentir , não se renova senão em épocas indetermina- das , e que , quando se reproduz , vai ter indistintamente , ou sobre a mesma parle , ou sobre outra, que ella não tem ainda aífectado. Dor fixa ou continua procede incontestavelmente de que a matéria , que produzio ou huma dor ligeira , ow as dores ambulantes , ou periódicas , não se evacuou em tempo con- veniente. Pelos effeitos progressivos da depravação dos hu- mores , formou-se maior quantidade de serosidade , assim co- mo es\afluxão augmentou em principios acres, ou mordican- tes , de sorte que o sangue he obrigado a depô-la , e a fi- xa-la. Os práticos , que não tem ainda reconhecido a causa das moléstias, consultados sobre este gênero de enfermidades, pensão muitas vezes ter satisfeito aos seos doentes respondendo- lhes que não ha que fazer. Esta resposta lhes he suggerida pelo estado exterior, onde não se vê inchação , nem tumor, nem inflammação. Esta falta de experiência compromette & saude dos doentes, sem os livrar dos seos soffrimentos. Jul- ga-se ter resolvido a difnculdade , quando se tem empregado o termo vago de frescura ; termo , que nada exprime ; ou quando muito, huma causa occasional. Quantos erros hum poz outro , e que somente se devem attribuir á falta *de conheci- mento da verdadeira causa das dores , e das doenças em ge- ral , qualquer que seja a sua denominação ! Em falta de boas rasões dão-se más. Assim não he nada mais ordinário que ouvir attribuir ás variações da athmosfera a cau?a das dores, e em conseqüência destey futil raciocínio , os pobres doentes se remettem para a bella estação , que muit.is vezes nada pôde contra seos soffrimentos. As observações mais minuciosas so- bre a espécie e a quantidade d is alimentos não tem o ultimo lugar , e se reputão de grande pezo. Apioveitão-se até as phases d\ lua a par de hum doente cheio de docilidade e de confiança. Tudo he causa , segundo se crê , excepto a verdadeira , na qual o ente que soffre está bm longe de pensar. Desta sorte se folga de confundir as causas oceasio- naes com a causa efficiente, ou a causa própria e verdadeira. Todos conhecem as variações, que tem lugar no tubo de huni barometro , quando se avisinha a chuva, ou o tempo bom. Ebtas mudança» diversas são a imagem do que accontece áè ( 128 ) pessoas , que attirbuem suas dores ás variações atbmosphe- ricas. He evidente que se os seo6 corpos não contivessem matérias especialmente próprias a faze-las soffrer, ellas nada sentirião de extraordinário por oceasião das mudanças de tem- peratura. A prova he sensível. Se as mudanças de tempo , como tudo que diz respeito aos hábitos , e á maneira própria de ca- da individuo , se podessem assignar como causa efríciente, está physicamente demonstrado , que todos sentirião os effei- tos da mesma causa, da qual experimentarião a influencia inevitável. Ora a experiência prova todos os dias o contrario. Logo ha nos eorpos enfermos huma matéria susceptível de variação, de dilatação, ou condensação; e eisaqui a ver- dadeira causa eficiente subordinada á influencia das causas oceasionaes. Não mostra a simples rasão que se deve eva- cuar a primeira, ou ao menos não fazer á segunda se não a parte , que pôde pertencer-lhe ? Huma vez formada a matéria, que pôde fazer sentir as dores em geral , eslas são quasi sempre ambulantes e perió- dicas , e he raro que comecem com o caracter de fixas ; pelo tempo adiante he que se tornão continuas , ou se fixão. Se se evacuasse a causa logo que ellas se manifestem, evitar- se-hião grandes males para o futuro. Se se praticar a evacua- ção da causa das dores desde os seos primeiros attaques , se livrarão dellas observando o art. 2.° da ordem do curativo , e mesmo de ordinário basta o art. 1.° Se a dor for muito violenta, terá mais prompto alivio , ou se curará mais bre- vemente , seguindo o art. 3.° Se se tratar de dores chroni- cas , regular-se-hão as evacuações pelo art. 4.° Bem entendi- do que, se a dor for em hum braço , em huma mão , nos dedos , ou em outras partes dependentes da circunscripção das primeiras vias, pôde ser necessário o vomitorio-purgante; muitas vezes até he indispensável que se tome no principio do curativo, rdternativãmente com o purgante. Está reconhecido por huma longa pratica, que toda a dor que muda muitas vezes de lugar , não he de perigo , em qualquer parte que se sinta. Ella muda , porque a maté- ria , que a faz sentir, he ambulante. Não tem tempo de es- tragar a parte, sobre a qual não faz mais que passar, para me explicar assim. Esta dor he quasi sempre fácil de destruir, porque a matéria, que a faz soffrer, estando em movimento, he fácil de evacuar. Mas aquella , que não varia , e que por isso se chama dor fixa , pôde ser perigosa; ella o he em particular, se a parte affectada he delicada; porque a de- mora da serosidade pôde lesar essa parte, e destrui-la, Es.» ( 129 ) tt rftesrna dor também pôde ser muito difncil de fazer desap- parecer, porque a fluxão ajuntada, ou depositada pelo san- gue , tem muito mais trabalho em entrar na circulação , que antes de estar fixa ; por isso he sempre rmds difncil de eva- cuar do que se a dor fasse ambulante. No intervalío de tem- po , em que a acção da dor he suspensa , a serosidade, causa única da mesma dor , entra nas vias geraes da circulação , e se mistura com a massa dos fluiu os , a!é que pára outrit vez, a fim de fixar-se em alguma parte nova. Esta he a cau- sa, que produz a ausência de toda a dor periódica , ni? a causa efficiente não ckixa de existir no individuo , que hj attacado. A mesma pratica nos tem feito observar que , se duran'3 ã acção dos purgantes a dor cessa , ou se torna menoi aguda, he porque a causa está evacuada no lodo , ou <*m parte , ou ao menos muda de lugar. Quando os evacuantes fazem cessar os soffrimentos em quanto elles obrão , he por- que deslocão a causa, e a chamão a si ; he hum simlcert) da cura, que mesmo parece próxima, porque esta mesma cau- sa está então em boa via dè evacuação. Quando depois de cessarem os effeitos de huma dose evaeuante, se reproduzem, as dores, he sinal que & fluxão , que não está ja vencida pela acção desta dose, continua a ir á parte affecíada. Esla observação diz explicitamente . que devem continuar as eva* cuaçÕes , isto he , repetir-se os purgantes quantas vezes forent necessárias para expulsar inteiramente a causa da dor. Em» verdade esta mesma advertência se applica igualmente a toda a espécie de doença, contra qual hum doente segue o trata- mento deste methodo. He claro que, se accontece hum eíreito: contrario, se a dor he mais forte, ou a doença mais grave no tempo e depois da acção das doses purgativas, deve-se dahi concluir que ellas tem excitado a causa , o que não he para admirar, porque devem evacua Ia; então se deve per- severar o mais tempo possível nos purgantes antes de sus- pende-los, para repeti-los depois de rdguns dias de descanso, a fim de apanhar, e expulsar esta causa de dor. Não se pôde desconhecer que todas as doenças são do-; ies da natureza daquellas , de que havemos fallado , e cuj* causa material he sempre a mesma , quer se sintão nas ex- tremidades do corpo , quer se soffrão nas cavidades ; porque aoífrimento he dor ,' e toda a e ifermidade faz .'offter. A orig.m domai, qualqi' r que seja o seo caráter, seja dtr, eeja ul- cera, seja tumor , i-eja deposito, não cs'á onde se ser te 9 mal ; o que faz soffrer he sempre huma emaiação desta 17 ( 130 > origetn ; ámbã* sao indicadas no Cap. I. deste mèthoda. Con- forme esta verdade , as regras da nossa língua deveriao per- mittir que se podesse dizer : Os doentes animados morrem por dentro , e nenhum he doente , nem morre por fora , porque a causa das doenças he toda interna. Logo he inútil trata- las somente por fora. Em todos os casos deve haver cuidado que hum tópico não produza hum mao effeito , a ponto de fazer derramar o humor de maneira que depois não se possa mais evacuar. As cataplasmas emolientes são quasi sempre perigosas , quan- do se não quer conduzir á suppuração a parte affectada por deposito , ou de outra maneira , visto que muitas vezes af* frouxão demasiado, e podem provocar a diffusão da matéria, e trazer com sino a mortificação da parte. Chumaços mo- lhados em hum liquido indicado pelo caracter ou gênero do deposito , nãa appresentão os mesmos inconvenientes. He in- contestável que os purgantes são os únicos meios que exis- tem contra as affecções de causa interna, e as dores era geral. Sciatica. A dor sciatica he huma dor fixa. Quasi sempre he pre- cedida de dores periódicas ou ambulantes, de que temos fal- lado. He causada pela fluxão , que circulava nos vasos sem tomar assento , e que o sangue a final depositou nos mús- culos de huma das extremidades inferiores. Esta dor occupa muitas vezes desde a nádega até a ponta do pé , onde cau- sa quasi sempre as dores mais diíficeis de supportar ; e deo- se-lhe o nome > em rasão do local que occupa. As sangrias , as sanguexugas , os banhos ordinários ou espirituosos , assim como os tópicos não fazem mais do que a doença incu- rável. A gota sciatica, se he muito aguda , requer os purgan- tes na forma do artigo 3.° da ordem do tratamento ; do contrario combatte-se pelo artigo 2.° Se he chronica , ou se he precedia'. de dores, segue-se o artigo 4.° O vomitorio- purgante só se prescreve, quando ha enchimento de estômago, Caibras. A serosidade levada sobre os músculos , ou sobre as r/ifr^bvrmas aponevroticas, põe estas partes em contracção ; fc^la produz estas convulsões locaes , que caracterisão as cãi- \jwas, cujas dores muitas vezes são insupportaveis, Ellajr não ( 131 ) appresenlão perigo algum , emquanto se fazem sentir sónK-a- te nas extremidades ; mas podem causar accidentes graves , obrando sobre as vias principaes da circulação, porque po- dem embargar o sangue. Hts raro que a cãibra não seja logo seguida de hum accesso de dor, porque pôde ser a pre- cursora delia , assim como he a sua causa. A cãibra he hu- ma affecção passageira , e de pouca duração; não se pôde remediar, emquanto ella existe; então não ha outro meio que empregar'senão agitar se, dar-se hum movimento qualquer % para a fazer cessar. As pessoas, que são sujeitas ás cãibras , farão bem era purgar-se largamente , conforme o artigo 4 da ordem do tratamento : não se cevem admirar se tiverem attaques du- rante o curativo. O vomitorio-purgante raras vezes he ne- cessário. Gotta. A gotta passa por incurável. Mas nao o he para todos que ella attaca, e seria muito menos temível, se se podesse comprehender bem a causa qual ella existe ; e se para des- trui-la se reconhecessem os meios , que a experiência appro* va depois de numerosos aproveitamentos. A serosidade, que neste caio he muito acre, e muitas vezes muito calorosa, passa á circulação, onde acha huma porção de phleugma, que coze em consistência de caldo. O sangue leva esta ma- téria ás extremidades superiores ou inferiores,, c a depositai nas articulações. A fluxão pelo seo calor recose esta espécie de caldo, e o converta quasi em huma espécie de massa branda, que serve ao depois para formar os nodos ; só a flu- xão causa a dor e a inflammaçao. Esta dor começa ordinaria- mente por accessos muito curtos , e que voltão em épocas distantes; muitas vezes hum armo, dezoito mezes ," e até muitos annos : então he periódica. Quando a doença se in- vetera , ou as matérias augméntão em depravação, e por oonsequencia em malignidade , os accessos são mais freqüen- tes , mais dilatados , mais dolorosos , e pela continuação os; doentes se tornão tropegos, carregados de nodos, e atormen- tados por mado , logo que apparece o accesso, na fwma do art. 2.° da ordem do tratamento , ou- segundo o. art. 3.o se a violência da dor o exige. Se a depravação dos humores he antiga ; se o individuo tem já soffrido muitos' aocessos desta dor , assim como se o accesso por sua duração-: he chronico, ou se não cede á precedente ordem de trata- mento , o doente deve seguir o art. 4.° Cumpre usar do vo- mitorio-purgante , todas as vezes que «e reconhecer a sua ne» cessidade, quer contra o enchimento do eòtomago, quer por» que a dor está fixa nesta parte ou nas extremidades superiores. As pessoas , que forem attacadas da gotta , e aquellas que- já são sujeitas a sentir esta dor, poderáõ prevenir a repetição dos accessos pelo freqüente uso que deverão fazer dos pur* gantes , no intervalío de hum accesso a outro; porque he desta maneira que se pôde applicar á gotta o remédio mais* ^íicaz, com particularidade nas pessoas de meia, idade, e ( m) tta hypothese de repetir o attaque, sua duração será abreviada ; sua violência moderada ; ainda com mais segHrança, se as pessoas , a quem temos recommendado os purgantes , não re- cearem purgar-se muitas vezes, ou em muitas occasiõe*, pró- ximas humas das outras , tanto quanto devem ser. CAPITULO XV. Enfermidades das Mulheres. Puberdade das donzellas. Quando as meninas , que tocão a idade da puberdade, são doentes , altribue-se ordinariamente a causa, de suas enfermi- dades á demora da emissão do fluxo menstrual. Porque até agora se não tem raciocinado melhor, e reconhecido que pelo con- trario, porque estão enfermas, he que a Natureza não pôde prestar-se a esta ftmcção ? A experiência quotidianamente pro- va , e demonstra que as donzellas, quando gosão saude na idade nubil, são menstruadas sem soffrer incommodo algum , e sem mesmo a sentir. £ste erro provém , como muitos outros , do pou- co que se discorre sobre a causa das enfermidades. Empregão-se os chamados emenagogos , de que se compõe differentes bebe- ragens , que não tem a virtude , que se lhes quer dar. Desem- baraçando-as da masMi de hile, e outros humores, que causão a côr amarella e pálida , e todos os males que soffrem, he que se pôde ajudar a circulação , e restitui-la a suas funcções na- turaes. Se assim se fizesse , seriáo estas enfermas livres dos accidentes, de que são ameaçadas. Faz-se tão pouco caso de os evitar, que se vê muitas eahir em Iangor, e morrerem de morte , que justamente se pôde chamar prematura. He necessário curar as meninas cm toda a idade , por- que se ellas são doentes , ou tem fraca saude , as suas regras custarão a apparecer na idade competente, de que podem resultar funestos accidentes, e mesmo a morte, São bem per- niciosos estes contos de velhas , que fazem persuadir que as me- uinas sarão de suas enfermidades pela apparição das regras , que se devem esperar sem outros meios mais que a Natureza. Também discorrem pouco os que pretendem que , st a menina continua a ser enferma ainda depois de ser regrada . se curará casando-se , e que por conseqüência deve casar. He muita ignorância affirmar, que, quando o matrimônio, e a regra são iiisuíficientes para sua cura, deve-se capera-la , quando tenha ( 134 ) nMh^s. Quintos absurdos tomão o lugar da verdade! Quanta» victimas humas sobre outras ! Se ambos os sexos reílectisscm , não se casarião senão es« t-in Io em boa eaude, por quanto não se deve atribuir a de- generação da espécie humana , senão á falta det,ta precaução» E as causas e motivos se expíicão no Cap. VI. Se a rapariga he enferma na idade, em que deve ser men^ruada, não terá a sua regra emquanto se não curar. Neste caso devem-se evacuar os humores , que obstão a esta funcção , seguindo o artigo 4.o da ordem do tratamento até a perfeita cura, que mostre hum verdadeiro estado de saude, conforme ao que demarcamos. Neste estado o fluxo menstrual apparecerá quando menos se pensar , e continuará com regu- laridade em quanto gosar de boa saude. Idade critica. Attnbue-se muitas vezes á idade avançada a causa das enfermidades, que soffrem as mulheres des de quarenta a cin- coenta annos, mais ou menos ; he hum erro, que se deve destruir. Sabe-se que nesta época se termina a carreira de muitos indivíduos, sem excepção de hum e outro sexo. O que he natural não causa enfermidade ; jamais nos afastaremos deste principio. As mudanças , que experimenta a Natureza na muxlier , nada tem com a causa das doenças , nem com a da morte; porque huma e outra são sempre determinadas por corrupção , e a cessação das regras he huma cousa natural. Deve-se aqui considerar a Natureza em três estados dif- ferentes. No primeiro , e durante o crescimento da menina, a substancia individual prepara a abundância do fluido neces- sário para o estado nubil. No segundo , e sua duração , a Natureza derrama periodicamente o supérfluo do fluido, que ella ministra á mulher para a obra da reproducção. E no ter- ceiro estado, em que chega o termo da duração desta abun- dância ou superfluidade , cessa a emissão periódica , mas a Hatir.reza por esta mudança não fica decrépita no individuo, que a experimenta ; nem se desseca; e só tem perdido a sua aptidão do segundo tempo. Só quando chega a velhice (o que he commnm a hum e a outro sexo ) he que o flui. do vital se diminue até extinguir-se (1). (1) Observaremos aqui que a morte, effeito da corrupção ( 135 ) Quando a mulher deixa de ser mensfmada em huma idade conveniente, não exp rimenta huma suppress^o. A ex- periência nos ensina que a mulher, que gosa perfeita sande na época da cessação das regras, não soffi e enfermidade pe- la mudança desta idade. He p< is necessário conhecer em que consiste a verdadeira causa do6 accidentes, que *e ob- servão nesta época , e explicar com claresa as causas ocea- sionaes , para se não confundir a causa com o effeito , e se tomarem medidas .mais efficazes nestas circunstancias , do que ordinariamente se pratica. O fluxo meustrual corre puro , ou sobrecarregado da se- rosidade dos humores corruptos, segundo o estado de sau- de , ou de enfermidade da mulher. Aquella, que foi doentia', padecendo continua ou periodicamente até á idade critica , sem duvida está sujeita a soffrer mais , logo que deixe de ser menstruada : e porque? Porque p< Io fluxo menstrual a mulher desembaraçava o sto sangue de huma quantidade de serosi- dade , que circula com elle. Quando cessa este corrimento, accontece a esta porção de humor como a hum rio , cuja corrente se detém , sem que por isso seque a sua origem; assim a mulher conserva os humores nas suas cavidades , como outro qualquer doente. He neste caso , que não tendo o seo corpo mais este meio natural de purgar-se , se faz preciso ajudar a Natureza provocando evtcuações. Deve-se portanto usar do purgante , como te diz na ordem do tra- tamento , até recobrar perfeita saude, e que os humores que accompanhavão o fluxo menstrual , e com elle sahião , tomem a via das excreções , a única que lhes resta. Se as mulheres podessem comprehender os effeitos salu- tiferos dos purgantes competentemente applicadcs ás diversas circunstancias, que oceorrem no tempo da sua juventude, quan- tos accidentes não evitariao ellas ! Vc-se usarem as jovens , quasi como recreio , dos banhos, da sangria, e das sangue- xugas , em vez de evacuar esta massa de podridão , que as faz soffrer differentes incommodos , e que se vai augmentando todos os dias. Sem duvida ficão sujeitas a todos os acciden- tes , bem como a este corrimento tão geral , e tão conhecido pelo nome de flores brancas (l), que melhor se chamaria corri- innata, a qual se oppÕe a que a existência seja eterna , he muito rara , porque a corrupção secundaria e auxiliar , á qual somos sujeitos , abrevia a duração da vida dos que não tem St felicidade de livrar-se delia , ou de sabe-la prevenir. (1) Bonito nome, que designa feia cousa» ( 136) mento amarello , verde , ou mixto , como se observa. Daqui provem a perda de suas cores naturaes , que todos os cos» rneíicos imagináveis não podem restabelecer , e daqui esta presença de velhice antes do tempo. Se contra todos estes accidentes ellas se purgassem a tempo, conservarião a sua sau- de , e nada teriuo que receiar para a idade critica. Destrui. rião os corrimentos , os calores ardentes, as inflammaçÕes, as acrimonias, os depósitos glandulosos , as chagas que del- les resultão , a consumpçao , e se prtfeervarião da morte, que muitas vezes sobrevem em huma idade, em que ellas tem mais direitos á vida. Demais a mulher, que gosa saude , ain- da que não seja formosa , tem em seo physico attractivos , que a preferem áquella, que está habitualmente incommodada, e doente. Suppressão das Regras. Não se deve confundir a suppressão das regras com a sua cessação na idade própria , o que se attribue ás diffe- rentes causas , segundo a maneira de pensar de cada bum ; porém há só buma e material, a qual obra só, e he a mes- ma de todas as enfermidades; e o tratamento para restabele- ce-las he o mesmo que se emprega por destruir as demais enfermidades. Só se faz caso, das causas moraes , por cuja influencia as regras se suprimirão ; só se falia das posições e situações, mais ou menos oppressoras , e prejudiciaes , e dos contratempos, que a mulher soffre na oceasião da evacuação menstrual. Para que se possa curar , he necessário que se ponhão de parte todas estas considerações, e causas occasionaes, que não obstante não devem inteiramente despresar-se , e á* quaes as mulheres devem subtrahir.se , quanto possão ; mas não at- tribuir-lhes maior influencia, nem dar-lhes mais valor do que tem. He portanto necessário altender aos humores mais ou menos degenerados , e á fluxão que delles resulta. Esta du- plicada causa he o maior, e talvez o único obstáculo á era- cuação natural e depurante das mulheres ; e que produz to- dos os accidentes , que quasi sempre são sua conseqüência inevitável. Só se deve chamar svppressão , quando no tempo em que a Natureza ainda abundante do fluido , e reproduzindo em épocas fixas o supérfluo deste mesmo fluido, experimenta de repente hum* retardação na emissão periódica dos mens- Aruos ; o que he causado pela plenitude humoral , e pel» Jluxão , que obstroem os conduetos, e órgãos excretorios des- te fluido, fazendo assim apparecer no individuo o estado da ( 137 )- enfermidade; e consequentemente pode experimentar dores de cabeça, e nas differentes partes do corpo; a febre, a perda de appetite , a vigília , &c. O purgante , segundo o artigo 2.° da ordem do trata- mento , faz apparecer as regras ; se ha dor aguda , allecção de qualquer órgão, ou receio disso, deve-se seguir o artigo 8.ç'; e sendo affecção chronica o 4.°, por tanto tempo quanto ü,v necessário para o restabelecimento de huma perfeita saude ; pois neste case, bem como nas jovens nubeis , as regras não se effectuão, se não com o restabelecimento delia , o que ao» contece algumas vezes, quando menos se espera, estando-se no uso deste tratamento. Regras immoderadas , frouxos de sangue. A mulher, que padece regras immoderadas ou extraordiná- rias, quer na quantidade, quer na duração, não gosa d<; perfeita saude. Este desarranjo apparece quasi sempre em conseqüência de huma enfermidade anterior. He huma espécie de hemorragia, produzida pela água misturada com o san- gue; e por isso faz-se necessário evacua-la até estancar a ori- gem. A irregularidade na emissão deste fluxo provém d.i mesma causa , e requer os mesmos meios. Algumas mulheres , em lugar de ter o menstruo verme- lho , o tem branco, e mesmo de diversas cores ; e por con- seqüência estão no mesmo caso que as que tem flores brancas, de que já falíamos na idade critica. Outras experimentão nos approches de suas regras , dores agudas em toda a bacia , nas regiões dos rins , &c. Todos estes incommodos indicão hum máo estado dos humores , e a saude consideravelmente; deteriorada. He, como dissemos já, huma abundância de água, que causa a plenitude dos vasos sobrecarregados do fluxo mens- trual , donde provém as regras immoderadas. He huma ma-- teria acrimoniosa, que oceasiona a dor, que precede a appa- rição das regras; a plenitude -da bile, e phleugma corrompida, concentrada nas entranhas, ou nas cavidades, he quem pro- duz estes corrimenfõs acres , algumas vezes sem acrimonia , e de differentes cores , de que á pouco falíamos. Deo-se a estes corrimentos o nome de gonorrhéa benigna , e tem-se". reconhecido que podião adquirir toda a malignidade da gonor- rhéa propriamente dita, Estou longe de contentar esta asser- ção , como se verá na minha dissertação sobre as enfermida- des veneieas, . ; 18 ( 13-8 ) Julgo que faço grande serviço ás mulheres, explicando* lhes o como , e porque estes corrimentos humoraes as incom- moda o. A Natureza, quando de o á mulher hum fluido supérfluo ( o das regras ), lhe deo tambem huma via para o expulsar. Quando a mulher está enferma, isto he, quando tein as ca- vidades cheias de humores corruptos , que , roubando lhe a saude, ameação a vida, soffre igualmente como o homem ; e a este respeito nada differem. Mas não se adverte que na mulher a Natureza se serve da via do fluxo menstrual para expulsar o supérfluo destas matérias: he como hum rio quer ella estabelece , e esta a rasão porque a mulher pôde ter corri- mentos pela parte sexual. As que estão em tal estado , tem quasi sempre o estômago desarranjado , e doloroso ; e são ameaçadas deste accidente. Por falta de instrucção , estas vic- timas do erro attribuem os seos incommodos de estômago ~ á existência deste corrimento , ou á evacuação da matéria que corre , emquanto que he preciso reconhecer a sua causa na corrupção, e serosidade, de que esta víscera , ou outras par- tes do corpo estão sobrecarregadas, e que são a sua conse- qüência v bem como podem ser a causa de todo e qualquer outro incommodo morboso. Porque as mulheres, que estão neste caso, soffrem taes accidentes ? Não he evidente que he por ha- verem despresado prestar á sua saude os cuidados, que ella indis- pensavelmente reclamava; ou por se não terem purgado quan» do o exigia a Natureza , isto he no tempo em que os hu- mores não tinhão a malignidade, ou o gráo de corrupção, que depois adquirirão ? Se a affecção he chronica, deve regular-se segundo o artigo 4.° da ordem do tratamento ; se pelo contrario he recente, será sufficiente dirigir-se conforme o artigo â.° Usar-: se-ha do vomitorio-purgante , se se achar indicado. No caso de perda considerável, a mulher deve conside- rar-se attacada de hemorrhagia , e conduzir-se segundo o di- rectorio, que se prescreve ao tratatamento desta enfermidade. Mulheres no estado de Gravidação. Nao se deve attribuir á prenhez a causa das enfermi- dades , ou incommodos, que as mulheres supportão , porque, como já o temos notado , o que he natural não he causa de enfermidades. Huma mulher grávida não adoece senão pela mesma causa, porque adoece hum homem, ou mulher que não esteja no mesmo estado. A corrupção »ão excep- ( 139 ) tua ninguém , e he somente quando ella tem alterado og humores da mulher grávida, que esta pôde ser inc.o.mmod.a- da ou enferma. A corrupção não exceptua ninguém, e he quando tem alterado os humores da mulher grávida , que esta padece. O estado de prenhez pôde occasionar somente o estada de enfermidade, mas não a causa; são os humores corrup- tos , e a serosidade que causão os incommodos. Assim a mulher grávida pôde enfermar, bem como a que está na épo- ca da idade critica , pela falta da evacuação natural ; e o ijue se diz desta , póde-se applicar á aquella. O filho não pôde ter saude estando no ventre da mai; não pôde ter boa constituição physica , se a mai he adoentada; huma vez que he elle constituído dos seos fluidos ., e que por isso he contagiado da corrupção. Se se purgar a mulher grávida, qnando precisa, is- to he , quando não está em verdadeiro estado de saude , fi- cará boa (1); se evitará a corrupção dos seos humores, e do embrião , e por conseqüência o parto laborioso (2), Se se usar convenientemente deste meio, curar-se-hão dous in- divíduos de huma vez , a mai, e o filho. Se se não curar a mai , o filho será doente, ou talvez morrerá antes que veja a luz do dia. As mulheres prenhes fazem bem, tanto para si como pa- ra seos filhos , em não se deixarem sangrar , nem consenti- rem a applicação das sanguexugas. Dissemos no Cap. IV- que o sangue jamais he supérfluo. Se qualquer se declaras- se contra esta asserção, o convidaríamos a fazer-lhe vêr o quanto está enganado. O fluxo menstrual he huma superflui- dade do sangue; mas deixa de o ser , logo que a mulher lis grávida ; não ha mais esta evacuação, porque este sangue $e emprega na formação, e desenvolvimento de seo filho. Portanto as mulheres acertarão sempre, tanto a bem seo, (1) Exceptuaremos aquellas , cuja enfermidade he chronica £ grave. He da prudência esperar que a mulher tenha o seo parto para eomeçar a cura , porque , sendo o parto laborio- so, ou havendo outros accidentes, durante o tratamento, a inexperiência não deixará de lhe imputar. (2) Attribue-se muitas vezes o míio parto a circunstan- cias ou a pretendidas, causas que não tem relação alguma com elle. Enganão-se a este respeito , como a respeito da hérnia , como o fizemos vêr quando falíamos desta affecção, 18 ii (U6) Como da sociedade em geral , se livres de hum erro fune»- to usarem do purgante tanto quanto for necessário para go- sar perfeita saude. Limpando as entranhas , e "apurando o sangue por este meio, evitarião não só os partos laboriosos , como outros immansos accidentes mais ou menos perigosos; e darião á luz filhos fortes e vigorosos , pois serião consti- tuídos de elementos puros e sãos. Por não se fazer huma justa idéa da causa das enfermidades, e incommodos, e por se ignorar os benefícios, que resultão dos purgantes em tal caso, como em todos os outros, vemos nascer , por assim dizer , meninos, cujos corpos parecem ser o produeto da mas- sa dos humores das mais , e que , pela maior parte , pere- cem na aurora de sua vida , por isso que são enfermos ao liascer, como o erao antes. Já fiz huma breve narração so- bre o estado de s^.ude de minha filha única, hoje Mada- me Cottin ; e a citarei também neste artigo. Ella purgou-se, '"eomo muitas outras o íízerão, não huma vez , mas em dift 'Ferentes épocas de sua gravidação; e seo parto foi tão feliz, como se poderia desejar, e o menino , que aproveitou do tratamento da mai, appresentou todos os caracteres de huma constituição robusta , e vigorosa (I). Partos Laboriosos. Sendo a causa da dificuldade dos partos a mesma das enfermidades em geral , deve-se tanto neste como em outro qualquer caso empregar os purgantes a fim de prevenir os ac- cidentes , principalmente prolongando-se muito as dores , e julgando-se em perigo a vida da doente. Se , conhecendo-se a utilidade deste meio , se empregasse a tempo , não Jiave- vião partos trabalhosos, e poucos serião contranaturaes; con- vir var-se-hia a vida de muitas mais, e dos pequenos entes, -"pie correm o maior perigo nesta oceasião. He hum grande erro, e prejudicial o derramar o sangue das parturientes ; e procurando-se por este meio ajudá-la, tirão-se-lhe as for- ças , que necessita para este fim. Quando huma mulher não dá á luz, com facilidade |. (1) Censurar-se-há que hum pai falle dos objectos dê seo amor , sobretudo quando as suas observações se firmão na conservação dos filhos, esperança da sociedade? Ainda ,;faliarei a este respeito quando tratarmos das enfermidade* -da, primeira idade. ( M« ) tendo-se appresehtado a criança de modo que podia facilmen- te sahir, he porque ella está enferma; consequentemente suas cavidades contem humores alterados , e seo sangue so- brecarregado da serosidade a ajnnta nos vasos das partes pró- ximas ao utero , e partes sexuaes , que contribuem á expul- são do feto , para onde a fluxão foi attrahida pelo trabalho do parto , e este não segue a sua marcha natural. Este ac- cidente accontece tanto neste caso como naquelles, em que a porção fluida dos humores se dirige sobre a parte ou for- çada por qualquer trabalho, ou irritada por hum esforço, pancada, queda, ferida, como dissemos no Cap. III. Para que a mãi tenha facilidade em dar á luz a criança , será necessário em vez de a sangrar , purga- da das matérias, que produzem a plenitude, mchação, en- gorgítamento, corno também da serosidade acre ou ardente, que crispa e endurece as membranas susceptíveis de dilata- ção. Como me custa a crer nos vicios de conformação , es- treites;» da bacia , ou da passagem , que ordinariamente se apontão , direi que a Natureza tem providenciado tudo. A opinião contraria he seguida pelos que não tem conhecimen- to da causa das enfermidades, e das vantagens dos purgantes. Se se desconfia das forças da Natureza , he preciso purgar conforme o artigo 3 da ordem do curativo. Deve começar-se por huma dose do vomitorio purgante ; se no espa- ço de sete ou oito horas, ou antes , a mulher não pare , e se igualmente está em perigo , he necessário administrar-lhe huma dose do purgante ; e se senão effectua o parto pelos effeitos desta dose, deve-se dar terceira, dez horas depois , ou mesmo antes. Julga-se que estas doses tem obrado convenien- temente segundo o numero de evacuações determinadas nes- te methodo ; porque do contrario será preciso repetir pelo seo pouco effeito. Não ha exemplo de que hum parto tenha resistido a três doses ; mas se accontecer, deve-se repetir o purgante conformo o mesmo artigo 3. Terminado o .pp.rto, se a mulher nada""tem de novida- de , deve-se alimenta-la, e fortifica-la; se pelo contrario tem dores agudas , ou se sua vida está em perigo , não se deve perder tempo em repetir os purgantes. He pena que se crea que huma mulher não se possa purgar por ter tido o seo parto de próximo. Se a mulher continua a soffrer de- pois de parto, está claro que he por não ter sido sufücien- lemente purgada. He melhor continuar os purgantes até a perfeita cura, antes que deixar-se morrer , e do que eo:i- èar na e\acuação dos lochios, que pôde ser insufficiente. ( 142) Leite Extravasado. Qussi todos crêm que os depósitos e engorgkamentos dolorosos , que se fórmão nas mamas da mujher, que aleita , ou que tem criado, ou depois do parto , são causados pelo leite ; e ha muitos que também acreditao no leite derrama- do. Se quizessem reconhecer a causa das enfermidades, e ra- ciocinar mais justamente sobre as funcções do corpo humano em geral , não considerari;lo o leite , que he hum liquoc berafíwejo , emanado do sangue, e tão puro como eile, como hum pus corrosivo, que produz dores, róe, e queima a carne, e acaba por corroer a pelle, como se nota quando o deposito chega a suppurar. Se o leite fosse cáustico , se« ria hum veneno , e a criança , que mamasse algumas gottas , seria logo attacada de convulsão ; morreria de repente , do que não ha exemplo. Portanto não ha rasão de attribuir a pretendidos derra- mamentos leitosos a causa das dores periódicas, continuas, fixas, ou ambulantes, que a mulher soffre. O leite só he mal- fazejo , ou máo , quando a mulher está enferma , e seos hu- mores estão corrompidos, e só huma porção tem passado com o sangue e leite, e que causa todas as dores , e accidentes , que podem sobrevir a todos os indivíduos doentes. Se a cor- rupção faz progressos, a enfermidade se torna grave, e a criança, que se nutre deste leite, soffre a mesma sorte da mãi. Saibão pois, e já he tempo, distinguir os fluidos puros da corrupção, que os envenena , e os corrompe. A verdade pro- duz tanto beneficio, como mal o erro. O leite na mulher he como o sangue em todos os indivíduos , sujeito a ser embaraçado em seo movimento, em suas secreçoes , ou em sua marcha natural. Se o leite apparece algumas vezes entre as matérias corrompidas que se evacuão , he porque esta parte, que se observo, está também corrompida ; não he mais o leite que obra neste caso, assim como não obra o mesmo sangue, quando de hum abcesso sahem matérias misturadas com este fluido corrompido , coagulado, ou podre. Para destruir todas as enfermidades que se attribuem ao leite , empregáo-àe os mesmos meios , que contra todas aquel- Jas , a que não se dá estas attríbuições , e que se considera© provenientes de causas humoraes , e que devem ser tratadas como todas as dores , e depósitos de que se faz menção no Cap. XVIII. desta obra, ( 143 ) Os purgantes nas mulheres que aleitaõ. Quando a mulher que está criando se purga poi1 qualquer affecção ligeira , deve , durante os effeitos do purgante , fa- zer mamar a criança em ambos os sidos , huma vez ao me- nos ; sem esta caufella pôde dcsapparecer o leite. Quando, tan- to a criança como a. mãi, estão indispostos, deve ella faze-lo mamar muitas vezes durante a acção do purgante , por quanto assim a criança se purga também , e fica livre de seos in- commodos. Se a mãi adoece gravemente, não deve mais criar para segurança da saude , e vida do filho , e muitas vezes por ella mesma. Quando a mulher quer suspender o leite , deve purgar-se huma vez pelo menos, e quando applica aos peitos 03 tópicos que se usão; e he hum meio de prevenir toda a congestão ; além de que deve purgar-se , sendo preci- so , conforme o estado de sua saude. Os purgantes no tempo das regras. Supponhamos huma mulher attacada de huma enfermi- dade grave , e que ameaça tirar a vida em dous , ou três dias , ou antes ainda, como no caso de epidemia. Se dei- xará morrer sem soccorro , porque está menstruada ? Não pôde accontecer que tenha huma dôr aguda, que seja amea- çada de hum perigo imminente, oa da perda de hum órgão, a vista por exemplo ? Nesta hypotese deve-se esperar o fina das regras, que podem durar huma semana , e mais, para lhe prestar soccorro ? A enfermidade neste espaço de tempo não pôde fazer estragos irreparáveis ? Pois que os purgantes res- tabelecem as regras, como dissemos quando tratámos de sua suppressão, não são portanto nocivos neste caso ; suppondo que huma dose purgativa suspende as regras , as doses subi. sequentes as restabeleceriao. Porém quando se trata do cura- tivo de huma enfermidade chronica , ou de huma ligeira in- disposição , e quando não he cousa urgente , deve-se atten- der ás épocas da menstruação, para não se purgar durante sua erupção , ou corrimento. Esta excepção se funda em que considero as regras como hum purgante natural , e sua presença como li um estado de oppressão, que se augmentaria pela acção dos purgantes , sem que disto resulte vantagem notável para a doente. ( 144 ) CAPITULO XVI. Enfermidades dos meninos , e adolescentes. Crises, ou evacuações naturaes. A duração da vida de muitos individuos , he p resul- tado de crises, ou evacuações saudáveis , que a Natureza opera nestes corpos , ou individuos , que se podem chamar privilegiados ; porque se observão numerosos exemplos a este respeito nas partes do mundo , onde a Medicina não he co- nhecida , e entre nós na classe mui pobre , ou que se des- cuidão de chamar o Medico. As solturas de ventre , as dif- ferentes erupções , quer no couro cabelludo ou na pelle dx cabeça , quer pelos poros da pelle , ou por todas as outras vias abertas ás excreções , são crises , a que a juventude está particularmente sujeita. São proveitosas , sem duvida , todas as vezes que se terminão felizmente , por isso que he por meio dellas , que os meninos , e mesmo os adultos sobrevi- vem ás suas moléstias, ainda que tenhão sido abandonados.\ A Natureza em muitos he, sem duvida, o primeiro Me- dico ; porém se por suas evacuações he bastante a si mesma, muitas vezes também succumbe por falta dellas não serem suffícientes. Jamais ella regeita as soccorros, que são próprios a dirigi-la á depuração do fluido motor da vida : único fim a que se dirige constantemente. Se não se deitasse á Natu- reza o cuidado de se curar; se a arte mais segura em sua marcha, a ajudasse com a evacuação da corrupção , se sal- varia a vida de muitos, que succunibem ; se curarião muitos outros de saas enfermidades actuaes; e finalmente se des- truirião pela raÍ3 estas enfermidades chronicas sempre dif- íiceis a c.urar , quando se tem deixado inveterar. Os pur- gantes empregados com estas vistas , e para este fim são sem- pre opportunos ; e porque se faz pouco caso, ou se praticão insuficientemente , succumbe a Natureza , e morrem prema- turamente muitos individuos , que tem direito á vida» Os purgantes , segundo o principio , ou a cçuufu das cr- ■fermidades internas , se podem administrar des de que nasce o menino até a idade a mais avançada da existência huma- na, ^e reflexionamos que "em todas estas dhierentes idades e oppostas , o horsem come , facilmente se reconhece , que para applicar este meio de curar todos os individuos he bas- ( 145 ) tante proporcionar as doses purgativas (1) aos differentes pe- ríodos da vida , bem como se faz com os alimentos. As moléstias, que padecem os meninos em sua infância , são as eólicas, etenesmos; estes infelizes dão grilos, e mui- ^ to trabalho ás mais, ou a quem os cria. Se estas quízerem seguir os conselhos da experiência , acharão proveito , dando ao mesmo tempo a seos filhos a saude , pela evacuação das matérias, que lhes corroem as entranhas , seguindo o pres- cripto no artigo !.• da ordem do tratamento. (2) Ordinária- mente se lança mão dos adoçantes, dos calmantes , mas neu- tralisando a acção da matéria , nem por isso o indivíduo fica menos sobrecarregado , e he para temer , que ella venha a produzir huma doença grave. Evita-se este inconveniente peia evacuação ; portanto ella merece a preferencia sobre o syste- ma dos absorventes. Dentição. Também se crê, que a dentição faz moléstia aos meni- nos, e isto pela inflammação e dor, que ha na boeca, o que he hum erro que importa destruir , bem como o dizer-se , que os dentes produzem dores. Se os humores destes meni- nos não estivessem corrompidos , e não fossem corrosivos , seos dentes sahirião sem incommodo, e sua dentição se faria quasi imperceptível. Neste caso , e naquelle de que falíamos no Cap. III., he a presença da serosidade em qualquer par- te soffredora , e estimulada , sua acrimonia , e o trabalho da dentição que causão a dor. Os dentes não são nem a cau- sa das dores , que se podem soffrer em qualquer idade , nem de enfermidade alguma , porque o que he natural ( o repito ) não faz nunca soffrer. (1) He o que fizemes quando falíamos das doses para os meninos no Cap. XX. (2) A experiência, que tinha a este respeito na aleitamento de minha filha , se juntão ao de meo neto. Nada mais lhe f««'a do que applicar-Ihe huma bebida evaeuante , e repeti-Ia toda a vez que a dor repetia , em qualquer incommodo que se lhe appresentasse : e assim já sua mái, ou ama , nem pessoa alguma foi perturbada de seo aoecego , estando sempre paci- fico. Certificamos , que nos dous primeiros annos de sua vi- ria, elle. f-d purgado sessenta, a oitenta vezes, primeiro com o vomh ,ri • purííü"'o , cumo com o purgante , em doses apro- priadas ^ sua i-•;■:..h, . 19 ( 146 ) Se se evacua o que he contra a natureza , isto he-, n corrupção que cansa toda a dor interna , corrupção que faz perecer mais da ametade das crianças , como a morte pre- matura de muitos adultos , vêr-se-ha a feliz ditíerença deste methodo , comparando scos resultados com os de huin sys- tema opposto.. Máo leite. Os purgantes bem applicados a seo objecto ,. e muitas vezes repetidos na primeira idade, isto he , conforme o artigo- 4.° da ordem curativa , mudão quasi sempre estas más cons- tituições, que os meninos recebem como leite de suas m;:is, ou amas enfermas. Mas para sempre empregar este meio com- as vantagens que elle assegura, seria preciso que os pais, e mais destes meninos , rompessem o véo que lhes cobre os olhos, e que os faz estar no erro, com que estão familia- risados geralmente; seria também preciso , que as pessoas que por seos conhecimentos servem de guia aos que não fa- voreeeo a educação , se penetrassem da verdade , e que sa- crificassem a rotina , ou os prejuízos contrários. Ha outro erro , que por ser tão universalmente espa- lhado quasi parece huma verdade. Ouve-se dizer todos os dias, que o leite da mulher grávida torna doente a criança, que ella aleita. Com que dados , ainda que pareça provável , se- pôde arriscar huma asserção tão pouco fundada, que a con- cepção corrompe o leite a ponto de o alterar , e fáze-lo no- civo ? (1) He também huma equivocação sobre a verdadeira causa do effeito, de que se oceupão. O que havemos expen- dido a respeito da mulher enferma na idade critica , pôde aclarar sobre este prejuízo, dando-lhe o seo justo valor ,. por que he a mesma causa, que neste caso obra sobre a mulher nestes dous. estados. Glândulas chamadas dè crescer. Parece que ainda se crê que o engorgitamento das glân- dulas he necessário para o crescimento dos meninos, ouí (1) A marcha da Natureza he constante, e conforme. Se a concepção corrompesse o leite da mulher grávida , outro tanto se poderia dizer dos animaes domésticos, cujo-leite nos serve de alimento. Deixamos de nos utilisarmos deíle só quan- do acaba, Que nome daremos aos partidistas desta opinião ? ( ui) que he huma conseqüência delle, pois que se chamao, segun- do esta falsa idéa , glândulas de crescer. He hum grande erro , que importa fazer conhecer. As glândulas não se podem engorgitar, senão pela pre- sença da fluxão ; porque o sangue delia sobrecarregado a depõe nas partes, cuja estruetura cava serve de deposito a esta matéria , e daqui resulta huma moléstia caracterisada com o nome de glândulas engorgitadas. A mesma matéria, mudando de lugar pôde dar nascimento a outra enfermidade eomo se vê pela experiência. Pais e Mais, examinai pelo tacto, se as glândulas do pescoço de vossos filhos estão en- go.gitadas. No caso cm que estejão, seria preciso fazer uso dos purgantes, tanto quanto fôr necessário , isto he confor- me o artigo 4.o da ordem do tratamento , para evacuar esta abundância de humores, e com elles a sua malignidade. Por este meio pódem-se evitar as conseqüências tristes, que resul- tão, e que se realisão , laes como as escrofulas, os humo- res frios , de que já temos fallado. / Meninos que urinão na -cama. Acredita-se geralmente que os meninos, que urinão na cama, em huma idade em que deverião ter mais asseio , o fazem por negligencia, e preguiça; e se castiga© com injus- tiça pois que não são culpados. Esta affecção he huma- es- pécie de hydropisia particular a estes meninos. Elles tem agoa derramada na capacidade do ventre. Quando estão dei- tados , esta agoa sobe acima das artérias principaes, e lheg retarda o movimento, que he o que os põe era hum sono profundo , similhante a hum abatimento. Os rhins , os ure- teres, e o collo da bexiga inundados desta agoa perdem a sua força natural , e o menino não sente a expulsão deste fluido excrementício. He raro , que os meninos pela idade eu pelos próprios soccoíros da Natureza , triumphem desta en- fermidade-; e não conservem hum germen capaz de lhes fa- zer para o futuro soffrer todos os incommodos ou enfermi- dades. Cura-se radicalmente esta enfermidade, purgando-os conforme o artigo 4.° da ordem curativa, até perfeito resta- belecimento. Fluxo de sangue pdo nariz. Pouca attenção se dá á perda de sangue pelo nariz; he huma affecção própria e commum tanto aos meninos co- mo aos adultos, e que tem conseqüências muito mais serias 19 ü ( 143 y ão que se pensa (3). Só se falia vagamente a rcspeüo dei- ta affecção, ou para dizer que he escandecencia, ou por pretender que he effeito do ardor da juventude, da viva- eidade do sangue, da robustez do individuo, do exercício, da applicação , &c. &c. Se, geralmente fatiando, as funcções do corpo huma- no , e a causa das enfermidades fossem mais bem conheci- das , ou se a experiência fosse mais universalmente segui- da , pensar-se hia de outra maneira, e se praticaria segun- do reclama este estado de enfermidade. O fluxo de sangue pelo nariz differe da hemorohagia somente pela natureza da causa , que a produz. Pôde accontecer que com o tempo esta causa toda humoral adquira a malignidade da hemorrhagia ; e he por isso que o fluxo de sangue do nariz a precede muitas vezes. A fluxão reunida pelo sangue nos vasos do ca- nal nasal , ou nos que e^tão visinhos á membrana pituita- ria, produz por sua quantidade hum inchaço , e engorgi- tamento nestas partes; rompe ou dilata suas túnicas, e cor- re tineta do sangue, que accarreta comsigo. Esta incoramodi- dade ho periódica , e se reproduz mais ou menos vezes. Porém se a serosidade he tão ardente , que rompa estas mes- mas túnicas , de modo que corra o sangue puro , então he huma hemorrhagia, a qual he também periódica, e se repro- duz em épocas mais oa menos approximadas. Muitas vezes o fluxo de sangue do nariz he precedido de dores ou pezo de cabeça. Estas incommodidades cessão momentaneamente por meio deste corrimento, porque descarregão os vasos turgi- dos ; e jamais desapparecem sem que a pessoa soffra pouco tempo depois huma outra enfermidade mais ou menos grave , segundo o grão de depravação dos humores , e a maligni- dade da Jhixão. Esta serosidade para produzir nova affec- ção , seja qual fôr sua denominação, não faz mais que mu-. dar de lugar. (3) Tenho a este respeito a experiência em mim mesmo. O fluxo de sangue pelo nariz, a que fui sujeito muitas ve~ zes na minha infância , quando desapareceo, foi substituído por dores periódicas , que se tornarão continuas, e me poze- rão no triste estado, de que já fallei. Os meos máos humo- res mudando de lugar , augmentarão de malignidade com o tempo , o que não teria accontecido , ee me tivessem purga* do convenientemente para distrahir a causa do fluxo de san^ gue pelo nariz* ( 149 ) £■ Tanto para destruir a freqüência de fluxo de sangue pelo nariz, como para evitar os accidentes, que podem ap- parecer ( e podem ser bem graves ) , convém applicar os pur- gantes, e repeti-los sufhcientemente até que se restabeleça huma saude livre de todo o incommodo. E como esta af- ferrão he sempre o resultado da depravação chronica dos humores , deve-se por conseqüência purgar conforme o arti- go 4.° da ordem da tratamento. Affecção Pedicular. Esta affecção consiste em huma grande quantidade de piolhos ; e quer exis-ão na cabeça , quer por todo o habito do corpo, são causados por huma corrupção interna, quando não provém do exterior. Sabe-se que os piolhos podem ge- rar-se pela falta de pentear os cabellos, e por falta do as- seio da cabeça ; assim como da falta de mudar as roupas a miúdo ; e concebe-se também que he a corrupção dos humo- res na pelle que contnbue ao seo desenvolvimento. Porém quando , tendo-se empregado todos os meios para manter a limpeza exterior, o individuo continua a ter piolhos, he necessário reconhecer que a causa, que os produz, está no interior, e por conseqüência nos humores degenerados; he e:}tão a enfermidade pedicular. Esta afrecção , a. que são su- jeitos muitos meninos, adultos, e ainda velhas, se destroe ccmo todas as outras, evacuando os humores depravados , conforme o artigo 4.° da ordem do tratamento. Se esta verdade fosse geralmente recebida , quantos ma- les se não evitarião para o futuro aos meninos; pois que^ livrando-os dos piolhos , se preservarião de enfermidades mais graves , e mais incommodas ! Muitas mais se persuadem que os piolhos dão saude a seos fólios ; e assim o crôm por ve- rem que, quando os piolhos desapparem , os meninos fic;ío doentes, e mais íncommodados do que quando os tinhão. Se a arte de curar se fundasse sobre o principio verdadeiro, que a mesma Natureza indica, os facultativos tendo então hum talento certo e útil cm lugar de huma siencia puramente conjectural, terião certezas em lugar de duvidas, e o pu- blico, que he muitas vezes o éco de suas asserçÕes , publica- ria verdades em lugar de vãs conjecturas ; se hum individuo enferma quando a affecção pedicular desapparece , he porque o humor, que se dirigia á pelle, e que nella mantinha 05 piolhos; deixou este lugar,, e se encaminhou para outra par- ( 150 ) te do corpo , onde eslas' matérias produzem huma enfermidade ilífferente da primeira por seos caracteres. Tinha. Segundo a maneira ordinária de tratar a tinha , não admira que esta affecção seja classificada na ordem das in- curáveis ; e fazendo soffrer muito , nada se faz em proveito da cura. i Que mais mal applicado á origem das enfermi- dades do que este emplastro em fôrma de callota , com que se &rrancão as crostas produzidas pela tinha ? Esta operação dolorosa chama cada vez mais o sangue a levar a esta parte as mesmas matérias. Isto he tão verdade, que muitas vezes he reiterada esta operação sem que por fim haja proveito seguro; porque deve-se notar que , se a tinha deixa o seo lugar, o individuo não fica menos affectado , por falta de depurar a sua constituição. Pode-se empregar sem perigo todos os tópicos emollien- tes , e resolutivos, e muitas vezes com vantagem; mas a des- truição desta enfermidade se faz, evacuando inteiramente sua causa material; e em conseqüência deve-se purgar segundo o artigo 4.° da ordem do tratamento ; muitas vezes he necessá- rio o vo-nitorio-purgante , pelo menos na proporção de huma dose contra três , ou quatro do purgante. Bexigas. Esta enfermidade he huma crise mais própria da infân- cia , do que de outra qualquer idade, mesmo debaixo da fôr- ma da erupção. A causa desta moléstia consiste em huma porção de matérias viscosas , que se misturão na circulação, onde he convertida em pus com huma parte da phleugma , pelo calor da serosidade. São estas matérias, que causão os calefrios, a febre, o lethargo , as prostrações, as dores, por- que opprimem , e desordenão a circulação do sangue ; e es- tes são os symptomas do primeiro periodo desta enfermidade. Então o sangue, que neste, e outros casos procura depurar-se, obra contra estas matérias , leva á extremidade dos vasos capíllares para as expulsar, fazendo a erupção ; e logo a pelle se cobre successivamente de pústulas purulentas , em maior , ou menor quantidade; feito o que, cessa a febre, e tste he o segundo periodo. Doze dias depois, pouco mais, ou menos , as pustu- (.151 ) Ias seccão , e se destacao em poeira ; he o terceiro tempo da enfermidade. As bexigas são mortíferas , ou pela malignidade de seo contagio , ou pela má índole dos humores do doente. Se o individuo não gosava saude antes de ser aecommettido desta enfermidade , ou se os seos humores estadão corrompidos a mais , ou menos tempo , está certamente mais exposto , do que se gosasse delia ; e mais o será , se o contagio he ma- ligno. Se a malignidade appresenta o caracter de pintas , ou de putrefacção , pôde embaraçar que esta crise se faça completamente. Estas matérias, resistindo aos esforços da Na- tureza, podem causar a morte mais promptamente, grangre- nando as visceras, ou parando o movimento do sangue , pela compressão, que neste caso a serosidade ,. excessivamente ar- dente , exerce sobre os vasos. Para obstar que esta enfermidade não seja mortal, c para evitar todos os mais accidentes , ha huma precaução preservativa, e fácil a tomar. Quando se sabe que o contagio se tem espalhado pelo lugar , ou cidade em que se habita , he hum motivo de desconfiar, e não confundir os seos sym- ptomas precursores com hum incommodo passageiro. Em to- dos os casos devem ser bem advertidos pelos signaes do primeiro periodo, de que se acaba de fallar. Para não nos enganarmos a este respeito, deve-se logo que hum individuo mostra ter a saude alterada , provocar reiteradas evacuações com o vomito- rio-purgante , e o purgante , como para destruir a causa de huma febre ordinária , ou de toda outra affecção ; regulan-- do-se eonforme o artigo 2.° da ordem do tratamento, e mes- mo segundo o 3.°, até que a violência do mal tenha cedido* Supponhamos , que não são bexigas, de que está affectado o doente, obtém por estas evacuações curar-se de qualquer outra moléstia que seja, e appareça ; e será preenchido do mesmo modo o fim , quanto á sua saude^ Quando a febre continua , e o estado do doente faz re- ceiar por sua vida, deve-se continuar as evacuações, ainda que haja a erupção variolica, a fim de prevenir qualquer en- gorgitamento , ou deposito nas cavidades. Com este methodo se effectua a crise , quer as matérias estejão ligeiramente cor- rompidas , quer estejão mui depravadas , a vida do enfermo está a salvo do perigo, e todavia no caso de nova dor , ou receio de accidente , se repetem os purgantes no intervalío^ do dessecamento das pústulas. He igualmente certoo , que evacuando assim a serosidade , que corroe a pelle, e causa comichões excessivas , as bexigas nao deixarão signaes j a a (1.02) doente as?im tratado nao experimentará resto algum capaz ãé produzir em diante estas incommodidades, que freqüentemente se notãc* Descobrio-se, e tem-se praticado a inoculação das bexi- gas : este systema soífreo a sorte de outros muitos; e devia acabar mais cedo, por isso que a tem sempre rejeitado a sã rasão. Outro tem substituído o seo lugar, e hoje gosa gran- de séquito ; he a vaccina ; que tem reunido todos os votos. O objecto da inoculação era communicar as bexigas, esperan- do-se tornar por esle meio menos funesta esta enfermidade (vã esperança, enganadora illusão !) ; mas o da vaccina , he de as fazer extinguir de todo. A vaccina , he a operação, pela qual se insinua no cor- po poroso da pelle o pus vaccinico. Esta matéria foi tirada, no seo descobrimento , de huma pústula na teta de i.uma vacca Ingleza , ou Escosseza. Tendo-se adoptado esta desco- berta , o menino vaccinado deo pus vaccinico para os outros, e deste modo se transmitte esta matéria , como em outro tempo a do vírus variolico pela inoculação. Tem-se como certo , que a vacinação extinguira as bexigas , de modo que não haverá esta enfermidade emquanto se praticar a vacoina. Não excitaremos duvidas a este respeito; mas deve-se crer que a causa material das bexigas não subsista mais ? Para isto era preciso que não houvesse mais causa capaz de pro- duzir as enfermidades. Ora se não houve mais causa de en- fermidade, seguir-se-hia que ninguém seria enfermo, pois que a causa das bexigas , he a mesma que a que está unida á existência de todos os entes , e que occasiona todo o estado de enfermidade. ; Taes nos parecem as conseqüências, que devem derivar-te deste principio : sendo as bexigas por seo caracter huma cri- se , tendo a mesma causa , e o mesmo objecto que as crises em geral , deve julgar que os enfermos, que tem escapado dos estragos dellas por meio da vaccina, não ganliarião muito, se a arte não viesse depois em seo soccorro. Não se pôde duvidar, que os doentes vaccinados , e os que não forão, po- dem igualmente perder a vida, quer por falta de crises , quer por insufhciencia dellas, que são essencialmente benéfi- cas. A observação prova , quo muitas vezes lhe devemos a vida, em muitos casos, em que a malignidade da corrupção dos humores he tal , que a Natureza não pôde fazer a crise, ou provocar a evacuação. Se hum pai deve á vaccina que seos filhos não sejão infectados das bexigas , que talvez os «roubarião, devem estes Gütar bem Sfithjfeitos com este sya$ ( 153 ) tema preservativo. Porém se estes mesmos meninos, depoía de terem experimentado as differentes crises, quer por diar- rhéas, quer por outras erupções na pelle ; oü bem por al- gum deposito , alguma febrs ephemera , ou outra , se tornao enfermos de modo , que a morte he o seo fim , ou pela in- flammação, grangrena, corrupção das entranhas , ou por ef- feito de qualquer outra lesão ; então fica evidente , que este accidente deve sua origem á impossibilidade, em que se tem achado a Natureza, de evacuar as matérias pútridas, que tem occasionado estes estragos. E se depois de haver em tempo opportuno chamado a arte em soccorro de seos filhos , cde bom pai chega cora tudo a perde-los, a pezar de todas as sabias precauções para conserva-los , não fica visível que sua, morte provêm da falta de evacuação destas matérias ? He constante que a arte não tem até agora ajudado a Natureza com hum purgante análogo ás suas necessidades, e relativa- mente aos humores depravados, que causão todas as enfermi- dades; e que por esta impossibilidade da Natureza , estas matérias corrompidas, causão a morte justamente prematura, por isso que esta accontece , quando a cessação da vida não he a conseqüência de sua sufíiciente duração. Sarampo. O sarampo he outra crise; mas he geralmente menos funes- to, e he caracterizado por erupções , e pústulas serosas. He sem duvida indispensável evacuar a fluxão, que as produz, coma massa dos humores, donde derivão. He incontestável que se deve seguir o mesmo meio, tanto no caso desta affecção, como contra as bexigas , attendendo á benignidade ou malignidade desta affecção , ou ao caracter do estado geral do enfermo, iíequer os mesmos meios , tanto nos casos em que periga a vida do enfermo , como para evitar suas conseqüências, por se não ter evacuado suficientemente os enfermos. Tosse Convulsiva dos Meninos. Os meninos são mais sujeitos a encatarrhar-se do que es adultos, quando por pouca experiência, ou descuido doa que são encarregados de sua educação, se expõe ás varia- ções repentinas de calor ao frio, por fogos ou exercícios, que muitas vezes não tem outro fim mais do que a extrema fa- diga : tal he a principal causa occasional desta enfermidade* Mas o embaraço ou empache das primeiras vias, por causa ( 154 ) da plenitude humoral , merece outra atfertção para desemba- raçar os enfermos da cansa ,. quo nelles produz a tosse , o catarrho , o vomito e outros simptomas que delia nnscem» A acrimonia de seos humores , bem depressa corrompidos , produz a fluxão; esta toma huma mercha varinda com inter- vallos e voltas periódicas ; npparecem logo accessos mais ou menos violentos , e mesmo convulsivos, segundo a maior ou menor malignidade da matéria, sobre tudo se as membra- nas do peito , e os órgãos da respiração se achão affectados. Tal he o caracter desta tosse, a que os Francezes chamão Coqueluche. Esta enfermidade tira muitas vezes a vida dos doentes depois de os fazer soffrer muito tempo. Usa-se , segundo o co;tume, somente de adoçantes e mais adoçantes. Se elles calmão a enfermidade , não evacuão a sua causa ; e esta he a rasão porque os doentes ficão sempre com hum prin- cipio de degeneração nos seos humores , que cedo ou tarde produz todas as enfermidades , e até a morte. Se esta tosse he attacada logo em seo principio, será; destruída, evacuando conforme o artigo primeiro da ordem do tratamento , ou , quando mais, conforme o segundo ; se a moléstia he chronica se dirigirá pelo 4.°; se .os accessos por sua violência fizerem recear , se seguirá o artigo S.o Seja qual íor o artigo, que se siga , não se deve ommittir o uso do vo- mitorio-purgante , o qual neste caso he indicado pelo menos alternativamente com o purgante, e a miúdo, na proporção. de duas doses ao menos contra huma do purgante. Angina Tracheal. Esta doença , particular aos meninos , e sobre que se tem dissertado tanto , he comtudo ainda o escolho doS^ raetho- dos curativos, que se tem imaginado. Sigo a opinião dos que tem observado esta enfermidade, sobre a existência de huma membrana, que se estabelece na traca-arteria, accompanhada de suppuração. Não tenho visto em parte alguma a explicação da causa , que forma estes dous corpos estranhos , nem o meio de evitar sua formação. d- Os tratamentos por meio das san- grias , dos vesicatorios , e expectorantes em geral, são aná- logos com a causa desta enfermidade? Creio poder provar que não. A causa desta enfermidade he a mesma das de mais, que accommetem o corpo humano , e os meios curativos não podem diflerir também dos que a Natureaa indica,, e cujo- (155) successo a experiência todos os dias justifica. Tenho demons- trado mais de huma vez, que a corrupção inherente aos hu- mores^ lhes dá differentes naturezas; e o quanto pôde a res- peito de todos os males a serosidade, tão pouco conhecida como a origem -que a produz. Tenho explicado a formação do pus , das matérias viscosas , da do nodo, e das arêas, e da pedra , pela acção desta metma serosidade-, que faz todas as condensações , e concreções, que se fórmão no corpo hu- mano. Creio por tanío poder avançar, que a membrana da an- gina hc como a do kisto, de que já falíamos, effeito da se~ rnsidade humoral , que obra sobre huma quantidade de fleu- ;gmas , que evidentemente se ai terão nas primeiras vias muito autos da manifestação da angina propriamente dita. He da massa do pus, antes formado pela jluxão com estas matérias, que se fôrma esta membrana ; e a serosidade he o agente , -coi-onuo com o seo calor especial huma porção desta matéria até u consistência membranosa. O que accontece neste caso, he o que se observa em muitos líquidos-, onde ha também hum agente formador , provado pelos seos effeitos, para produzir corpos coagulados, e condensados, peiies, e mesmo membra- nas : taes são o vinho , o vinagre , a cerveja , a cidra , hc., onde se encontráo estes mesmos corpos , formados pela presen- ça de hum agente, que nelies reside. A causa predisponente da angina , se prevenirá , e cu- rará por meio dos purgantes , se se quizer attender á ver- dadeira causa das enfermidades. Os meninos são muito sujei- tos a plenitudes , e como não sabem escarrar, não tem o re- curso da expectorarão. He bem fora de propósito o deixar- se á Natureza o cuidado de se desembaraçar dellas , pois este estado pôde ser ceguido da affecção anginosa , se bem 'Outras vezes a preceda. Pelos progressos , e como conseqüência do principio desta enfermidade, se manifejgão signaes de al- teração na saude ; faz-se então necessária a cauiella, como em todos os outros casos de indisposição. Deve portanto purgar sem medo até ao restabelecimeu» to total do enfermo; muilas vezes será bastante a appli- cação do artigo l.y da ordem do tratamento. Seguindo se hum methodo cppoüto , se manifestão a febre, e dores ; a enfermidade se aggrava , a respiração se embaraça , e a voz muda de modo, que causa espanto. Então he quando se ar- repende de não ter-se precavido no principio da enfermidade; he logo preciso não perder tempo , evacuando confoane o artigo 3.o, com o vomitorio-purgante , pelo menos duas doses auceessivas , e o purgante em terceira; devendo repetir de&te gO ii ( 156) modo até não haver perigo , e então se segue o artigo 2.o, ou o 4.° Se a matéria purulcnta não se tem demorado muito tem- po , de modo que tenha podido alterar as entranhas ; e se a membrana não tiver ganhado huma consistência muito com- pacta , ou indestructivel, salvar-se-ha o doente. Repugnância dos meninos aos remédios. O que accontece aos meninos , accontece aos adultos ; e o que havemos dito a respeito da repugnância, que tem os segundos, se applica incontestavelmente aos primeiros. Ho huma verdade de facto , que os meninos são sujeitos a fre- qüentes enfermidades, e achaques. Está bem provado por cbservações feitas a este respeito, que.de mil meninos quo nascem ao mesmo tempo , só restão quinhentos ao fim de dez annos. Que motivo para reflexionar! Pais, e mais. sede médicos de vossos filhos. Purgai-os logo que a enfermidade appareça. Se tardaes em faze-lo , a enfermidade fará pro- gressos , e á proporção do augmento delles , assim se devo augmentar as doses. Penetrai-vos bem deste principio. Além çle lhes evitardes os incommodos , lhes poupareis o trabalho de tomar maior numero de doses. Poderia mesmo accontecer que não podendo vós vencer a sua repugnância a tomar o ivmedio , os visseis perecer. Não consegui minha filha tomar hum tão grande nume- ro de doses , senão á força de lutar com a sua repugnância , e má vontade. A primera vez que recusou . foi na idade de quatro annos e meio. Sem perder tempo a tornámos, e abrin- do-lhe por força a boeca , lhe introduzimos a dose ; porém vomitou-a. Demos-lhe segunda dose , pelo mesmo meio. Teve a viveza de occulta-la em hum dos lados da boeca , para fazer persuadir qim a tinha engolido, para depois a lança? fora , como o fez." Fizemos-lhe tomar terceira , que também lançou pelo mesmo estratagema ; e por isso se lhe deo quarta dose , que tomou com resignação , e docilidade. A's ameaças , e violências , suecedeo a recompensa. Des de então a meni- na não mostrou repugnância a tomar , de modo que bastava deixar na véspera ao lado de seo leito a dose para o dia seguinte, e ao erguermo nos já a tinha tomado! Este trium- pho não se limitou a poucas doses; tomou com a mesma facilidade desde a infância até a idade da adolescência hum tão grande numero de doses , que custa a, crer* (157) CAPITULO XVII. Enfermidades da pelle. As enfermidades da pelle resultão geralmente de todos os casos, em que o sangue lança pelos poros huma porção da massa fluida dos humores corrompidos , que circulão com elle: esta evacuação accompanha evidentemente a insensível transpiração, e se effeitua pelas mesmas vias. Porém sendo a pelle huma espécie de crivo muito apertado , não pôde transsudar por seos poros senão huma parte muito fina das matérias fluidas; por isso a transpiração e o suor provoca- do pelos sudorificos, que se empregão em muitos casos, he insufficiente para dissipar todo o humor fluido , que circula com o sangue, e causa os accidentes, em rasão dos quaes se empregão os sudorificos. Estes pretendidos remédios, in- dependentemente da sua insufhciencia para curar , causão accidentes temíveis, quando tem feito levar á pelle huma matéria, que não he susceptível de evacuar-se por esta via, e daqui podem resultar diversos depósitos , ou abscessos pe- lo decurso do tempo. São quasi insufficientes para expulsar a? matérias grosseiras , que se demorão nas entranhas . e pro- duzem a serosidade. Esta fluxão levada ao exterior pelo sangue , se diffunde mais geralmente , e mais vezes na-? dif- ferentes glândulas, que estão engorgitada.s , do que sabe pela transpiração , como muitas pessoas pensão sem alguma espécie de fundamento. Por tanto a pelle soffre suas enfermidades, como as ou- tras partes do corpo sujeitas a differentes affecções ; mas co- mo tudo vem do interior , tanto a origem das enfermidades , eomo o principio vital , para destruir esta origem he neces- sário dirigir-se ao interior ; assim como para alimentar o principio da vida , he necessário sustentado por dentro. Suor ordinário* O suor ordinário he o effeito do calor pelo exercido do corpo , ou de outra sorte. He alimentado por huma pj^nitu- de de fluido mais ou menos quente , e em relação ao es- tado dos poros da pelle, da temperatura, &c. Provocado na oceasião de enfermidade , por meios internos ou externos , como huma sobrecarga de cobertores em huma cama bem aquecida, o suor faz serviços mais apparentes que reaes, A ( 158 ) espécie de allivio , que se experimenta, não lie mais que mo- mentâneo, íncontestarelrnente elle enfraquece ; não attaca a orurem da enfermidade; ao contrario faz passar huma parte ddh com o sangue , e esta matéria he a causa da fraque- za , de que falíamos. A provocação do suor he hum pro- cedimento todo externo; logo pelo menos he hum meio in- suficiente; adopta-se porque hum c; ro constante o tem pos- to á sombra do prejuízo. Mas porque pôde 6er perigoso forçar o suor por meios próprios a accelerar a transpiração, não se deve por isso embaraça Ia , nem combatte-la. A pru- dência consiste em fugir dos extremos ; deixem obrar livre- mente a Natureza pelas vias excretorias da pelle. Suor continuo. Sc as cavidades encerrão huma quantidade de matérias aquosas; se estas matérias não cessão de dirigir-sa á pelle, resulta hum suor abundante e continuo. Muitas vezes esta transpiração tem hum cheiro, que mostra a corrupção da matéria , e da origem , que a produz. Qualquer que seja o seo caracter , he sempre de muito má natureza , que com rasão se deve temer. Se esta matéria cessa de passar á pel- le, se se concentra em alguma cavidade , provem a hydro- pisia , ou outra enfermidade. Sendo este suor sempre effeito da depravação chronica dos humores , para destrui-lo cum- pre praticar a evacuação na fôrma do artigo 4.° da ordem do tratamento, até qwe a sua origem esteja evacuada intei- ramente , e o doente tenha recuperado a saude. Sarna. De todas as enfermidades da pelle, a sarna he a mais contagiosa, pôde communicar-se pelo toque da pessoa ou pelo da roupa e vestidos, que lhe tem servido. Tem-se afirmado que na matéria da sarna se achão animaes muito pequenos. Não disputamos ao microscópio o merecimento de aiigmcntar os objectos, nem examinamos os fundamentos der- ta opinião. Mas não temos a menor duvida que esta doen- ça h^causada pela corrupção dos humores fluidos, por meio do contacto ; corrupção , que se insinua pelos poros da pel- le, e que bem depressa estabelece suas ramificações com a massa inteira dos humores , como se disse no Cap. II. Ha mintas espécies de sarnas, humas mais malignas e mais dií- ficeis de curar do que outras. Seguramente o indivíduo ia* ( 159 ) tcetado de hum vírus contagioso, venerco por exemplo, findo a ler sarna, poderá communica-la de hum caracter maligno, até dos mais rebeldes de curar, que rc-querá huma longa perseverança do mesmo para se restabelecer inteira- mente. De ordinário se empregão differentes pomadas, ou ou- tros tópicos, que cada hum compõe á sua vontade, ou se- gundo seos conhecimentos; estas absorpções cutâneas estão li- gadas ao falso systema de curar pelo exterior enfermida- des , que tem huma causa toda interna. A sangria e as be- bidas dilnentes ou aperitivas , são os medicamentos , ou a base dos curativos do interior. Esle modo de curar só ser- ve de dar lugar mais tarde a huma doença seria, cuja cau- sa procede então do que ao principio era apenas hum in- commodo ligeiro e fácil de destruir. A sangria faz evidente- mente entrar, nas vias da circulação a matéria da sarna : e porque o sangue se torna sobrecarregado delia, e fôrma de- posito , he que para diante resultão affecções de differentes espécies , e ainda as mais graves. Para destruir com segu- rança a sarna , se ella he recente , deve purgar-se a primei- ra semana, conforme o artigo primeiro da ordem do trata- mento ; repetir da mesma sorte a segunda ; e assim a ter- teira, se ainda fôr necessário. Se a sarna se complica com alguma doença antiga, ou se por si mesma he maligna ou ehronica , deve purgar-se conforme o artigo 4. da mesma or- dem do tratamento, até a cura radical. He evidente que trabalhando por fazer desapparecer esta affecção, a acção dos purgantes pode destruir, muitas outras enfermidades , de que o mesmo individuo esteja attacado : tal he a vantagem de hum methodo , que tem reconhecido a unidade da causa das enfermidades, que curando-se de huma , se pôde ao mesmo tempo destruir mintas. Para ajudar a curar a sarna , he necessário huma fricção diária , eom huma pomada anti- psorica inodora , que tem por base alvaiade em pó e hum» pouco de precipitado rubro, incorporados com banha, Dartros. Os dartros se appresentão debaixo de differentes fôrmas, ■porque são de varias espécies. Humas são farinosas; são aquellas em que a serosidade queima a epiderme, ou a so- brepelle, a desseca , e reduz a pó. Outras se chamão vivas; e também as ha corrosivas; taes são aquellas que tem por causa a acção da serosidade summamente calorosa , ou cor» ( 160 ) roénte , e que se tem concentrado na substancia da pellè propriamente dita. Estes dartros relativamente a algumas pes- soas , não se communicão. Os que são contagiosos se adqui- rem como a sarna , e se pegão, como ella , por effeito do contacto. O mesmo curativo, tanto exterior , como interior- mente , consegue a cura radical do dartro seco. O que está inflammado, e suppui a, requer neste estado outra applica- ção , já para favorecer a suppuração , já para calmar a in- íiammação , já finalmente para ajudar a dessecar a pelle. Qualquer que seja o caracter do vicio dartoso , reclama o mesmo tratamento que as outras enfermidades, porque tem a mesma causa. O artigo 4.° da ordem do tratamento lhe he applicavel, como a todas as outras affecções chronicas. He applicavel a mesma pomada , que contra a sarna , excepto quando o dartro está inflammado, ou em suppuração : neste caso pôde convir o unguento. Nodoas da pelle. Muitas pessoas, particularmente mulheres , são expostas a ter nodoas na pelle. Esta affecção mostra depravação de humores , e quasi sempre as nodoas são sinaes , ao menos precursores das enfermidades , se he que não são caracterís- ticos. He raro que existão sem que o individuo soffra altura incommodo mais ou menos notável. O melhor cosmético he o purgante. Deve repetir-se quanto for necessário , até que se- que a origem dos fluidos alterados , ou corrompidos, que so- brecarregão a limpha, e que o sangue leva á pelle. Pur- gando-se conforme o artigo 4.° da ordem do tratamento , o sexo experimentará duas vantagens ; a que bonita não se fará feia ; a he menos favorecida em formosura , será mais interessante com suas cores naturaes , do que com hum co- lorido arteficial ; e ambas trabalharão para restabelecer sua saude , assim como para conservar sua existência. (1) (1) Não per tendemos proscrever os perfumes ; e desejá- mos ao contrario que se casem melhor o agradável e o útil, do que nunca o forao. A mesma pomada anti-psorica , de que falíamos, tem muitas Yezes lugar nesta espécie de af* fecções. ( 161 ) Erysipela. A erupção erysipelatosa he hum tumor mais ou num os caloroso ou inflammatorio, com botões sobrepostos na pelie ; ella tem por causa efíiciente a plenitude humoral, como as outras enfermidades; o sangue a leva do centro á circumferencia , cc- mo para alliviar as visceras , que então se achão muito carregadas. Seria erro crer que se deve deixar ao corpo en- fermo o trabalho, ou cuidado de livrar-se da fluxão humoral, que caracterisa esta affecção , antes de empregar os purgan- tes ; pelo contrario convém , logo que apparece a enfermida- de, usar do purgante ao menos conforme o art. 2.°; porqos o art. 3.o he indicado muitas vezes , e não pôde fane-r n ai, no principio do tratamento. O vomitorio-purgante he sen^ne necessário quando o requer a plenitude das primeiras vias. Toda a pressa he pouca em evacuar a causa da erysipela , para prevenir as suas funestas conseqüências , como a gran- grena, e até a morte, que muitas vezes accontecem, porque se preferio aos meios curativos a sangria, as sanguexugas , as differentes fomentações , os adoçantes , ou outros palliativcs , ou applicações nocivas. CAPITULO XVIII. Tumores , depósitos , e ulceras. Todos os tumores humoraes , todos, os depósitos , bobeies , pregos ou furunculos, carbúnculos, apostem as , e outras emi- nências na pelle , que são formadas de matrviss espessas eu purulentas ; os outros depósitos, produzidos por matérias serosas, qualquer gênero, e caracter que tenhão exteriormente, ter- minão todos , como se sabe , por huma ulcera , quando apos- temão por si mesmo, ou quando se segue a operação. A sua nomenclatura he muito extensa ; mas como o >s não conside- rámos aqui estas sortes de affecções senão relativamente á sua origem , e cura que se seguirá, de truindo se esta mesma ori- gem , abriremos mão de todos os detalhes , que serião aqui supérfluos. A causa, que produz exteriormente estas affecções, he a mesma que dá lugar interiormente aos depósitos , aos tu- mores , aos engurgitamentos de differentes naturezas , ás obs- trucçÕes de differentes gêneros , seja no pyloro , no fígado , no baço , ou em qualquer entranha. Unicamente esta cauta (162) tomou differente dírecçao ; no primeiro caso , passando á cir- cumferencia do corpo; e no segundo ajuntandose no centro. De qualquer maneira que estas affecções se manifestem , seja qual for seo caracter, e denominação, por dentro, e por fo- ra , são sempre causadas pela corrupção dos humores, e da mesma sorte que todas as outras enfermidades. A respeito das affecções, formadas de matérias purulen- tas , procedem de que huma porção de muco se filtra, como o phleugma com a fluxão nos vasos, e alli he recozido pelo calor desta serosidade. O sangue, para desembaraçar o se» movimento acanhado por estas matérias, as lança sobre as partes , que por sua forma , sua estructura , ou suas dispo- sições particulares, são susceptíveis de receber humdeposilot taes são as differentes glândulas , e em geral as cavidades , &c. Se a serosidade está junta , e depositada só, como ac- contece nos tumores chamados serosos, que mencionámos , como scirros , cancros , polypos , sarcocelos , e alguns lohi- nhos, a affeeção he differente , e ella appresenta outro ca- racter diverso do que quando grossas matérias tem seguido a Jluxão no deposito. A febre, que precede , ou accompanha os depósitos em geral : a inflammação , que sobrevem : as dores que se se- guem , são causadas pela serosidade , e pelas matérias, que embaraça© o sangue no seo movimento. O calor ardente desta jluxão, converte definitivamente a matéria em pus ; esta mes- jna fluxão pelo seo principio corrosivo , roe a pelle, e faz o buraco , que dá sahida á matéria purulenta, quando o tu- mor ou o deposito suppurão por si. Portanto he incontestável que he revestida de maior malignidade , todas as vezes que o corpo humano se acha em estado de soffrimento. Sem em- bargo em todos os casos de enfermidade interna, e de do- ses quaesquer , em que a serosidade tem esta mesma malig- nidade , parece que a não reconhecem pela poaoa cautela^ que geralmente se toma para livrar os doentes. Engana-se quem pensa que a serosidade he menos nociva , por exemplo, no caso de huma febre inffammatoria , ou de huma dor vio- lenta interior, ou exterior, do que no caso citado. Essa mes- ma fluxão , em quanto a sua origem existe no doente, en- tretem , segundo as operações cirúrgicas ordinariamente pra- ticadas , ulceras cancerosas y schirrosas , sarcomatosas , e as que tem succedido aos tumores carnosos , enkistados , ou sem kisto , assim como tem contribuído á formação dos tumores depósitos , e abscessos , que precederão essas affecções. Fil- trando-se na substancia dos ossos, a serosidade causa as exos^ ( 163 ) toses, e dá lugar á formação da ankilose verdadeira , ãa, mesma sorte que, accumulando-se sobre as partes carnosas e tendinosas , produz a falsa ankilose. Estas affecções estão li- gadas ás precedentes quanto á cura, que não pôde ser diffe- rente Todo e deposito, tumor, engorgitamento, obstrucção, que se fôrma em qualquer parte do corpo , exterior ou interior- mente , demostra que o sangue está sobrecarregado de Imma matéria humoral corrompida , e estas affecções attestão o es- tado de enfermidade do individuo. Esta erupção da parle do sangue algumas vezes se faz lentamente ; então ha hum deposito por congestão; se o deposito se faz rapidamente , se o tumor se eleva, para assim dizer, a olhos vistos , he de- posito por fluxão. Os depósitos termináo pela resolução, ou pela suppuração, conforme a matéria, que elles contém, ou segundo os remédios, que se applicão exteriormente. He sem- pre mais vatajoso por diversos motivos , destruir a causa, e a origem , como he possível, pelos purgantes sufficieutemente repetidos , do que abandonar o doente aos próprios esforços da Natureza. Suppondo que o deposito termine vantajosamen- te sem ajuda dos purgantes , o individuo fica sempre exposto a soffrer hum novo , ou todos os outros accidentes , mais ou menos graves. Não estando o seo corpo depurado , deve te- mer pela sua saude. Se ao contario se pratica a purga con- forme o art. 2.o da ordem do tratamento, e applicando-se o resoíutivo , ou repercutivo convenientes sobre o deposito ou tumor , logo que apparece , pódem-se fazer desapparecer por estes purgantes, se são susceptíveis de dissolver-se. Se o deposito não se resolve, ou não se dissolve; se a matéria, que o fôrma , quer vir á suppuração , entfro abre por si mes- mo , ou opera se sendo necessário, e cura-se pelas indicações cirúrgicas. Dos purgantes, que se empregarão com fim de der- reter o deposito , resulta que ha tanto menos na massa das matérias , quer por falta de evacuação , ent.etenão a suppura- ção ; e estes purgantes seguidos dos que ainda se devem ap- pliear depois da suppuração estabelecida , e na forma do mes- mo artigo 2 o, -ou , se for neeessario , do 4,o, destruirão a origem das materas , e favorecerão a cicatriz da chaga, pela regeneração , isto he sem que o doente conserve restos desta affecção. He incontestavelmente porque não se usa dos meios prescriptos neste methodo, que tantos depósitos ou abscessos, degenerão em ulceras chronicas, eque accontecem tantas des- grJças ás pessoas que ellas afnigem. Neste estado de affec- Câo chronica, devem applicar-se os purgantes, segundo o v 21 ii ( 1Ô4 ) artigo 4.° da ordem do tratamento. Se estas affecções são nas partas dependentes das primeiras vias , deve-se usar do vo- mitorio-purgante , conforme a indicação , para desviar & flu- xão e os humores, que alíi vão ter , a fim de facilitar a ac- ção do purgante, qie deve operar a sua evacuação. (1) Cumpre curar ao mencs duas vezes em vinte e quatro horas , as ulceras exteriores com hum emplastro carregado de hum unguento supurativo brando (2) , que receba as matérias, que o sangue expulsa pela sahida praticada, e que. as preserve das injurias do ar, a fim de que os suecos nutritivos regenerem a carne , e a pelle, á medida que o purgante os livra das matérias , que estorvão sua. acção. Humores frios. A regra commum tem excepçÕes , quanto á natureza da serosidade, e dos humores , que a produzem sempre. Algumas vezes pôde accontecer que esta fluxão seja despi- da de todo o calor, que mesmo , para assim dizer, não te- nha muita acrimonia , como observámos no capitulo primei- ro. Com este caracter he que existe em huma affecção glandulosa conhecida pelo nome de alporcas ou humores frios. Esta doença pertence á classe des depósitos e ulce- (1) He grande desgraça quando huma ulcera se estabe- lece na garganta , ou no esophago , ou nos intestinos , ou no rectum , como accontece pela fistula nesta parte. Estes lugares de passagem hão mister suppridos, o que não he possível. Neste caso he necessário que os doentes dobrem de valor e perseverança para triumpbarem das difficuldades. (2) Os fios , as mechas, assim como o systema de lavai as ulceras são nocivos á sua cura radical. Estes meios não se podem tolerar senão no momento, em que o deposito se ulcera , ou soííre a operação da mão. O unguento suppu- rativo, como he conhecido e existe nas boticas, se pôde empregar emquanto a ulcera deita muito; adoçando porém a acção deste unguento quando fôr de mais , como quanda a ulcera vem a suppurar muito menos, e então mistura-se com o cerato ordinário. Póde-se empregar depois o cerato só para dessecar a chaga, e póde-se augtnentar a acção secan- te , acerescentando em huma meia onça de cerato, algumas gotas de extracto de saturno ; então se chama ccrato satitr* ( 165 ) í-as , e exige os mesmos processos. Esfas affecções n?o cau- são dores, ou causão muito leves. Acabamos de deduzir as lasões , que são plausíveis ; a matéria que he fria , não faz soffrer , a qualquer parte que seja levada , como a que he de natureza opposta. Combattem-se estas affecções, com es- perança de proveito, seguindo o art. 4. não dispensando os meios cirúrgicos quando forem reclamados. Panarichi O panaricio vem de ordinário aos dedos da mão ; mas não são isentos os do pé , ainda que sejão attacados me- nos vezes. He hum deposito, que vem muitas vezes depois de huma picada , ou ferida ; e até muitas vezes sem sev provocado por alguma causa externa. As dores, que faz sentir , são muito agudas , quando se ulcera, apparecem muitas vezes excrescencias. Este deposito se faz ordinariamen- te debaixo do periostio , e pôde cariar o osso , o que mo- tiva algumas vezes a perda de huma , eu duas phalanges. Hum bom cirurgião faz bem a abertura do deposito, e mes- mo muitas vezes a amputação do membro inteiro; mas des- truir não he curar. Se se concebesse a causa deste mal , não se recorreria a esta operação , tão dolorosa , como no- civa. Mais de huma vez tem accontecido fazer cessar esta dor, e destruir hum panaricio rrcente com huma só dose do vomitorio-purgante. Este feliz effeito he produzido , por- que a serosidade não havia tido tempo de foimur huma le- são na parte; porque também o vomitorio-purgante pela sua propriedade conhecida desloccu com a primeira dose essa. fluxão , e a evacuou. Logo he necessário empregar este re- «íedio alternadaraente cem o purgante, no principio do tra- tamento, que deve ser dirigido na fôrma do artigo 2, se todavia a violência da dor não exigir que se evacue pelo artigo 3. Se o panaricio he chronico, torna-se ulcera; neste caso deve tratar-se como este gênero de affecção , pelo arti- go 4. Feridas degeneradeis em ulceras. Toda a ferida feita por hum corpo cortante, picante, contundente , ou dislacerante , cuja cura não se opera como deve fazer-se a de huma chaga simples, he desde logo hu- ma affecção complicada com huma causa interna , ou humo- lal , e convém reconhecer, que. os humores do ferido estão Diais ou menos corrompidos. Ninguém o pôde duvidar huma ( 166 ) vcx que a suppuração he abundante , se ella se prolonga ^ se a for;da appresenta inflammação , s^ o £ rido tem febre, e se não enche as condições do quadro de saude. Neoíe caso deve purgar-se conforme o artigo da ordem do tratamento , que he applicavel á situação do doente, segundo a violência das suas dores , a antigüidade da feri- da ou da enfermidade interior. Por este meio se depurará o seo corpo das matérias, que dão lugar aos accidentes mencionados, e se destruirão os obstáculos, que impedindo a cicatriz d-r ferida , a fazem degenerar em ulcera , e po- dem mesmo provocar a gangrena. Ha ulceras chronicas , tanto das que vem em conseqüência de depósitos, como da- qneílas, que suecedem ás feridas, ou chagas degeneradas, cuja cura pôde exigir hum tratamento de muitos annos pa- ra poder destruir inteiramente a sua origem , quando he muito antiga , ou os humores são attacados de grande ma- lignidade. Para assentar hum pronosíico , deve-se fazer mui- to cnso da constituição fisíea dos doentes , do seo tempera- mento , da sua idade, do estado de saude ou de doença anterior a este gênero de affecção. As ulceras , que vertem agoa , são mais perigosas e mais diíficeis de cicatrizar, do que as que lanção pus; talvez mesmo seja hum sinal de incu- ráveis. Seria grande felicidade para os feridos , que todos os cirurgiões se penetrassem dos princípios deste methodo ; cer> tissimamente elles suppririao aos defeitos de sua theoria. Ha muito tempo que se sabe que he impossível cicatrizar sem inconveniente as ulceras e as chagas , que tem causa interna, eó curando-as exteriormente. He igualmente urgente reconhe- cer que se deve medicamentar utilmente por dentro , para destruir o principio das ulceras, que he o mesmo que o das outras enfermidades. (1) Grangrena, amputação. Somente por oceasião de huma ferida resultante , por exemplo, de huma baila, que ieva huma perna, ou hum (I) Quantos homens se conservarião, e que morrem em conseqüência de feridas ; emquanto elles somente suecumbem ao pezo da corrupção de seos humores, que se não havia© evacuado 1 . . ( 16? ) traço , ou de qualquer outra fractura co-n estilhaço , a amputação parece indispensável , porque neste caso convém rectificar homa amputação sem duvida mal feita. Sem fsta operação , a chaga não sararia , e o coto restante inconnuo- daria mais o ferido. Nas feridas degeneradas, da mesma sorte que nas ulceras , sobrevem algumas vezes a grangrena. Ella attaca também os ossos , e toma então o nome de ppha- celo. Crê-se ainda muito geralmente que esta podridão vem de fora , porque he huma espécie de axioma adoptado , que a amputação he necessária , para que a grangrena , fazendo mais progressos , não adiante rapidamente. Esta falsa máxima illude muita gente. Com rasão tem dito muitos prá- ticos judiciosos que a amputação pelo menos era inútil , por- que ou nunca se ha de curar a chaga , que fica depois de coitada , ou a que existe pôde curar-se. Ha huma sorte de desgraça inherente ao gênio dos partidistas da amputação j que persegue até a sua destreza , e torna illusoria sua habi- lidade ? Ponhamos de parte a solução deste problema , e fa- çamos sinceios votos para que se reconheça como huma ver- dade mais que provável , que a grangrena não pôde deixar de reproduzir-se. Não he bem doloroso que tantos infelizes percão os membros successivamente, e acabem por morrer desgraçadamente ? Se se quizesse reconhecer que a grangrena he causada pela serosidade , que dimana da bile negra , que passa á circulação , e que o sangue ajunta na parte enferma ; se se reconhecesse que he esta fluxão que põe logo a parte em mortificação , queimando , ou consumindo a carne , e mesmo os ossos, que torna fétidos, nunca se supporia a grangrena estranha á depravação interna. Logo que a chaga appresenta os primeiros indícios de grangrena , he necessário ter a sa- lutifera precaução de fazer sahir do corpo do enfermo a mas- sa de humores putrificados , que a produzirão. Convém atten- der ao lugar, aonde fez o arrojo, para usar do vomitorio. purgante, a que he necessário indispensavelmente recorrer , se he em alguma parte das primeiras vias. As doses de pur- gante devem ser determinadas de maneira que produzão abun- dantes evacuações A grangrena pôde alguma vez destruir-se por meio das evacuações praticadas na fôrma do artigo V.° da ordem do tratamento ; mas isto he quando não tem ainda muito grande malignidade. Ordinariamente deve evacuar se na fôrma do artigo 3.o; he a marcha mais cerm. Em ajuda deste tratamento, convém empregar huma embrecação, que tenha força ibu Eficiente para separar o morto do vivo, e per ( 163 ) conseqüência destacar a parte grangrenada (1). Depois quéT cahe a grangrena, o tratamento interno se dirige na fôrma do artigo 4.°; empregando os curativos indicados para as ulceras até sarar. CAPITULO XIX. Enfermidades Epidêmicas. Quando descrevemos no capitulo primeiro , a causa ge- ral das enfermidades , não podíamos fazer excepção de es- pécie alguma. Por tanto ficão comprehendidas naquelle capi- tulo as enfermidades mais graves, e de tal sorte mortíferas, que pelos estragos que fazem , assustão as mesmas Nações, assim como assombrão , e fazem perder o tino aos mais ar- dentes observadores e aos homens mais alitados. Esse pavor geral perderia muito da sua força, se a Medicina fosse o que não he , ou se fosse o que pôde ser. A cansa interna , ef- íiciente, immediaía,ou intrínseca das enfermidades epidêmi- cas , debaixo de qualquer denominação que se comprehen- dão , he a mesma que a de todas as outras enfermidades ; toda a differença consiste no augmento da sua intensi- dade e da sua malignidade. As causas occasionaes destas en- fermidades são também as mesmas, que em outras circuns- tancias , ou taes quaes são indicadas nos capítulos segundo e terceiro; mas então ellas exercem sobre os humores a mais enérgica acção corruptora que se pôde conceber. (2) Esta differença no caracter das causas occasionaes não produz ne- nhuma ncs remédios que se hão de oppor a estas enfermi- dades ; são absolutamente os mesmos, mas a sua applicação se regula particularmente no artigo 3.^ da ordem do trata- mento do nosso methodo. A rasão , allucinada pela experiên- cia nos diz que, se a enfermidade desenvolve extremo vigor no indivíduo , que attaca, devemos combatte-la ainda com mais vigor do que ella demonstra. Se houvermos notado (1) Chama-se embrocação toda a espécie de applicação de corpo fluido , emolliente , resolutivo , com que se banhão as partes enfermas , e que se embrulhão em compressos em- bebidos do liquido appropriado á espécie do mal. (2) Deixamos aos homens, que estão encampados dos re- gulamentos de saude, o cuidado de meditar sobre os meios de attenuar eátas causas, n>e não for possível evita-las. ( 169 ) que ella tem huma malignidade, ou huma acção mortífera, tal que no espaço de quarenta e oito horas , ou em menos tempo, possa roubar a existência aos doentes, devemos redo- brar de actividade, ou empregar quan.a podermos na mar- cha do tratamento , acerca do iudividuo attacado. Este meio prevenirá a causa da morte , que sempre accontece pela falta de expulsão das matérias putrificadas, ou pestilentes , qu^s por sua demora mui prolongada nas entranhas, exercem to- da a casta de lesões sobre a economia animal. Finalmente as pessoas, que tiverem a desgraça de ser attacadas de doen- ças pestilenciaes , endêmicas ou epidêmicas poderáõ achar a sua salvação na rigorosa applicação do artigo 3.° Corrobo- raremos talvez ainda estas asserções no titulo ??guinle. Virus em geral. Debaixo do titulo genérico de virus comprehendemos , com os virus propriamente chamados seorbutico , scrophuloso, canceroso , dartoso , sarnoso , venereo , hydrophobieo, todoj os resultados da depravação dos humores, á qual o Crea- dor, para complemento de seos desígnios , sujeitou a espécie humana , e á qual esta deve as affecções de todos os gêne- ros , que a afihgem. Fizemos conhecer , no Cap. I., sob a denominação de serosidade , ou fluxão , huma matéria nociva, e deletéria , que emana da massa dos humores ; e dissemos com rasão, que quanto mais subido he o giáo de corrupção, tanto mais malignidade contém em si esta matéria , e tanto mais terrível ella he." Serosideid-e e virus na nossa accepção , são duas palavras muitas vezes synonimas; e sempre os virus, quaesquer que sejão. os seos caracteres, são huma serosidade , mais ou menos nociva , conforme sua natureza, á saude , e á vida. Esta fluxão , como causa única efficiente de tudo o que he dor ou soffrimento , e que he como a arma, de que a corrupção se serve para destruir a vida, fulmina os doen- tes a milhares como se observa nas epidemias ; e em outras circunstancias os precipita na sepultura , muitas vezes no mes- mo momento , em que menos se teme o accontecimento; co- mo a apoplexia , a morte súbita.... A "experiência nos tem demonstrado que essas doutrinas tão gabadas como sublimes, por aquelles que as aceoliiem,, sem duvida com demasiada ligeireza, e to-h.s essas theorias, que no seo nascimento os mesmos homens assordhão dizendo, que são appoiadas sobre luzes certas , são indubitavelmente sempre falsas , e por conseqüência damnoisas. Ou ellas não ( "O ) livrão de morrer os doentes, que se poderião salvar, em- pregando meios mais em harmonia com a Natureza , e mais annlogos com a causa das doenças ; ou deixão aquelles, que não succumbirão, lutando com enfermidades de todo o gêne- ro , como em huns a epilepsia ; em outros a loucura ; e no maior numero encalhes , ulceras , affecções nervosas , dores , e toda a sorte de enfermidades , ao menos periódicas, se não são fixas , ou continuas. Indicámos francamente meios certos em seos effeitos, verificados pela pratica, fundados sobre fac- tos notórios e provados. Se não são constantemente infalliveis a respeito de todos os doentes , ou em todas as épocas da vida,' he porque não pôde haver meios que sejão sempre infalliveis pela única rasão , que a duração da existência tem hum termo, que a Natureza lhe poz, e que nenhum mortal he capaz de ultrapassar. Pela pratica , e pela observação se reconhece , que não ha espécie de substancia ou natureza de substancia , e tam- bém de corpos estranhos, que os humores não possão produ- zir pela corrupção , que ellas são susceptíveis de adquirir, e que effectivamente adquirem nos casos , que tem sido ob- jecto das observações, que fazemos nas diversas partes desta obra. Mas quantas cousas não se podem ainda observar ? Porque quanto mais viciados estão os humores , mais subs- tancias assombrosas se podem formar no corpo humano; fi- nalmente mais cousas novas , e raras , que se chamão phe- nomenos. Os curiosos , que cultivão as sciencias , os reco- lhem com desvelo. Mas fascinados de novidades , e em geral de tudo que he superficial , não fazem caso do solido ; e ordinariamente tudo he perdido para a utilidade real , ou para a saude dos doentes. Se se observar de perto, ou se se reflec- tir sobre nosso pensamento , ver-se-ha que não nos affastamos da verdade. Certamente , qualquer que seja o gênero ou a espécie da enfermidade , todo o doente tem necessidade de huma cu- i: radical , e que não lhe deixe nem restos, nem medo de re- eahida. Porém quão longe está elle de achar estas vantagens nos tratamentos , que se estribão no superficial da cousa ! Ora não pódc haver tenão superficialidade , huma vez que se não reconhece a causa interna das enfermidades. Que haverá mais superficial do que essas composições pharmaceuticas , frueto de analyses chimicas , que são antes hum objecto de cuiiosidadj para o sábio, do que hum alvo de utilidade real para os doentes? Forão os sábios, ao menos em apparato, que pozerão cm principio que os contrários se curão pelos (171 ) contrários ; e por huma conseqüência deste falso principio , como por hum rifáo que delle se deriva, se lem pretendido que as enfermidades podião ser destruidas por hum contrario. Por brevidade , citaremos hum caso entre o grande numero dos que existem , em que este mesmo principio tem applica- ção. Por exemplo , se o doente contém cm si hum calor excessivo ou ardente, que produz h«ima grande inflammação, dizem que se devem refrescar por meios análogos , po-lo em huma região glacial , e mesmo carrega-lo de neve.... Este principio he inteiramente falso , jporque este calor excessivo he huma matéria ; he produzido pelos humores então mui corrompidos ; esse calor he a mesma serosidaele, contra a qual debalde se empregão os refrigerantes ; estes não podem em- baraçar que o humor consumptivo, ou ardente ein extremo, peisibía no corpo, e o destrua, como ha de destruir tam- bém o calor natural do individuo , roubando-!he a existência. Se se tratasse de hum calor resultante da circulação accele- rada dos fluidos , e das fricções dos glóbulos , de que elles se compõe , como accontece depois de hum grande exercício de corpo , ou pela respiração de hum ar abrazador , ou pelo uso de alimentos carregados de partes salinas , acres , ou escaldan- tes , este principio poderia receber huma justa applicação, to- davia com prudência ; mas he abusivo confundir causas, que são tão distinetas, e cujos effeitos são sempre differentes. Esta equivocação , e as conseqüências funestas, que delia resultão, não terião lugar , se não fosse ignorada a causa das molés- tias, ou ao menos muitas vezes desprezada. Para curar , se devem empregar meios seguros com preferencia a essas futilidades do dia ; isto he , aquelles que a Natureza quer indicar. He necessário ( como ella requer ) praticar a evacuação dos humores , que não produzem virus ou serosidade viru/enta , senão em rasão de seo grão de podridão , ou corrupção. Deve preferir-se este meio a qual- quer outro processo , porque a corrupção, , que zomba de todas as combinações da chimica , não pôde atalhar-se eifi seos effeitos e pr ^ressos, senão livrando por via de purgan- tes aparte sã, ou a menos corruptível. Os purgantes, de que temos fallado, sublilisão todos os gêneros de serosidade ou vuus, e delles livrão seguramente os doentes, quando estes rc:orrem a ellas na época, em que os humores, e a fluxão não tem ainda adquirido hum caracter de tenacidade tal, que não se podem evacuar. Ha humores tão inveterados , e tão profundamente incrustados : da mesma sorte ha casos, em que a serosidade está igualmente infiltrada, e de tal sorte iden- 22 ii ( 172) isficada com o sangue , que resistem juntos á acção dos pur- gantes com huma eípecie de teima difficil de vencer. Então a cura se dilata , sem por isso tirar a esperança de hum res- tabelecimento certo. Huma pratica sustentada , e coroada por numerosos suc- cessos, exciue toda a duvida acerca da expulsão do virus em geral, e da cura dos doentes, que elle attaca. Mas excep- toaremos nas nossas asserções tudo que a experiência nos não íiouver confirmado. Não encontrámos oceasião de administrar o nosso methodo aos infelizes attacados do virus hydrophobico, nem depois da manifestação da raiva , nem mesmo antes Sem embargo , não hesitaremos ( tanta confiança temos em os nossos princípios) em dizer que purgando-se continuamente muitas semanas, se poderia, destruindo este virus de3 de a sua intromissão (1) , prevenir os accidentes , que são de te- mer neste caso. Também nos parece que se poderia, se fosse possível , e se não corressem perigo aquelles que adminis- trassem o remédio , applicar amplamente , e sem discontinua- ção, os mesmos purgantes, conforme o art. 3 ° Sobre este objecto abandonamos nossas idéas a quem as poder meditar, e illustrar-se pela experiência. Segundo a nossa convicção , dizemos , e repetimos que nunca se ha de curar senão separando a parte corrompida daqueÜa que ainda o não está, e expulsando a primeira pelos purgantes ; do contrario huma soffrerá a sorte da outra , e i vida será prematuramente destruída , como o será todas ■as vezes que se empregar muito tarde o tratamento deste me- tuodo. Não podemos recommendar muito aos enfermos , que s eguirem este- tratamento por causa de enfermidades virulen- isrvamente, se for pos- sível , até se acharem alliviados , e ri cobrarem o appetite , e o somno , se os tiverem perdido. Então suspendem a eva- cuação por oito dias , mais ou menos conforme sua situação* Mas se o allivio conseguido diminue antes de expirar este tempo, he necessário do momento, em que o conhecerem, que repitâo outra serie de evacuações , tomando as doses co- mo no principio, e continuem até conseguirem novo allivio. En- tão descansâo outra vez como fica dito , mesmo mais tempo , conforme se melhora sua situação , e *e athegão mais ao quadro da saude y que he o alvo de todo. o doente em cu- rativo. Entre huma enfermidade recente e huma enfermidade chronica ha esta differença , que contra a primeira se de- vem repetir as evacuações sem remissão nem interrupção, para assim dizer, até o restabelecimento; e que contra a enfermidade antiga este regimen, que he necessário no prin- cipio do tratamento para diminuir o volume da corrupção, e aüiviar os soffrimentos r se deve suspender , e continuar al- ternadamente, como fica dito ; e algumas vezes suspender por huma semana , hum mez inteiro , ou mais ainda , por- que se devem combinar os purgantes com a obra da Natu- reza , com suas disposições mais ou menos favoráveis , para que a regeneração dos humores possa fazer-se da maneira, que se vai explicar. Durante a suspensão dos purgantes, o doente por seo sustento diário, recupera humores para sub- stituir á porção corrompida , que elle tem evacuado. Mas emquanto o total não estiver inteiramente attacado e expul- so , os antigos corrompem os novos. Por isto se devem re- petir as evacuações, suspende-las,, como fica dito, e conti- aiua-las, e suspende-las todas as vezes que for necessário, pa- ra effeituar em hum individuo doente a regeneração da mas- sa dos humores, de que depende a cura. O resultado pôde ser tardio, se a totalidade destas matérias está penetrada do vicio da degeneração, mormente se a doença he antiga,. e se provém de hum virus communicado, e segundo a enor- me quantidade de humores, que existe na composição do cor- po humano, como fizemos conhecer no capitulo IX, titulo? ( 189 ) volume dos humores. Todavia este resultado não pede dei- xar de conseguir-se , se o doente continuar seu tratamento por muito tempo , na maneira que fica determinada neste ar- tigo. Para que o doente se restabeleça, hc necessário que não haja no seo indivíduo parte alguma dos humores de- pravados , que alli existião no tempo da sua enfermidade, ou na época, em que emprehendeu o seo tratamento. He necessário renovar inteiramente estas matérias , o que signi- fica hunvi substituição de humores sãos a humores corrom- pidos e expulsados. Esta reforma, que se obra porque os no- vos humores tomão o lugar dos antigos, que se tem evacua- do , t rmina no momento , em que não existe mais germen corruptor na constituição humoral do sujeito. ' , Ha doenças chronieas tão inveteradas, tão tenazes , tão difíceis de destruir, e tão sujeitas a reproduzir se, que são precisos muitos annos para operar a cura radical; e por conseqüência he necessário hum grandíssimo numero de do- ses evacuantes. Não he de rigor , acerca destas sortes de enfermidades, que o tratamento para diante seja continuo, co- mo devera ser no seo principio; mas se elle se suspende momentaneamente , ou por mais ou menos tempo , deve re- petir-se em differentes épocas , que sempre são indicadas pela reproducção , ou pelo augmento das dores. A mocidade of- ferece ordinariamente grandes recursos; seguramente se o doen- te está em estado de crescer, ou ao menos, se não he mui- to idoso , e se as evacuações são bem dirigidas , bem coor- denadas com o estado de soffrimento e o trabalho da rege- neração dos humores, ha esperança fundada de conseguir a sua cura. Ao menos entre a generalidade dos doentes, que não são susceptíveis de huma cura inteira e radical , porque a Natureza nelles não tem a faculdade de depurar-se intei- ramente , ha muitos , que pelo uso variado dos purgantes , poderião prolongar sua existência , diminuir seos soffrimen- tos , ou retardar os seos progressos (I). (1) Façamos aqui huma comparação, que por mais singu- lar que pareça a certas pessoas , nós julgamos não só exa' ta, mas que convém perfeitamente a hum gênero de leitores , que ouvem melhor que outros a voz do bom senso. Tam- bém servirá para fazer comprehender a correlação das eva- cuações reiteradas com o alimento regenerador, da qual ro- culta o restabelecimento de humores sãos, e por huma con- seqüência evidente o da saude. O corpo de qualquer doca- (190) Obstáculos á cura dos doentes. A cura radical he o objecto da Medicina Curativa ; ella será o feliz resultado de sua applicação , todas as vezes que a enfermidade não se tornar causa da morte, como ana- lysámos a causa do fim dos entes , no eapitulo primeiro. Este methodo não pôde falhar de salvar a vida de hum en- te , ou recentemente ou de longo tempo attacado em con- seqüência das matérias estragadas ou corrompidas , que elle encerra, pôde comparar-se a hum tonnel, no qual se dei- xou hum resto de liquido , e que por estar corrompido, al- terou a vasilha , ou ao menos lhe deo muito máo cheiro. Para tirar-lho , e tornar o vaso capaz de conter, sem pe- rigo de alterar-se , hum liquido de boa qualidade, o tanoei- ro usa dos meios, que a rasão lhe suggere: imitemo-lo. Lan- ça agoa no seo tonnel , e depois de agitada a deita fora ; esta sahindo leva comsigo a parte grosseira da immundicia, que alli se continha. O mesmo accontece ao doente no principio do tratamento; evacua as matérias grosseiras , e a superfície dos humores, que se derrancão em suas entranhas. O tanoei- ro continua a lançar agoa; sacode de novo a vasilha , de- pois afaz sahir pela torneira; bem depressa a agoa, que sa- he, parece tão limpa como entrou , mas o tonnel não está ainda puro. O mesmo accontece ao doente; continua a pur- gar-se , já não deita matérias tão más, pôde estar alliviado; mas não está são , porque o seo corpo não está purificado, como não está o tonnel. O tanoeiro deixa demorar a agoa hum dia ou dois, o que lhe dá tempo de dissolver a parte, que está agarrada ás adoelas da vasilha. Da mesma sorte o doente suspende os purgantes por alguns dias ou algumas semanas , ás vezes mais ; os novos humores , que provém do seo sustento diário , dissolvem os antigos ; a mistura os ado- ça , e torna mais fáceis de evacuar. Durante esta suspensão o sangue , em favor e em rasão do vácuo resultante das evacuações precedentes, rarefaz a fluxão, que está nos va- sos, e a leva ao tubo intestinal pelos emunctorios, que exis- tem. O doente repete o purgante suspenso; evacua os novos humores com os antigos, que já tem corrompido os primei- ros. Faz como o tanoeiro, que despeja a agoa alterada pela parte corruptriz , que despegou das paredes internas do ton- ní»l, emquanto alli a deixou demotar. Repete o mesmo pro« ( 191 ) fermo , senão no caso, em que huma víscera, ou huma par- te orgânica de seo individuo estivessem airuinadas. Este obs- táculo só pôde ter lugar pela longa residência da putrefacção dos humores; o que mostra que deveria tentar-se mais cedo a cura do sujeito. Também pôde accontecer isto, só porque o doente está gasto pela velhice , agente natural,. e invencivel da cessação da vida. Todo o homem, que estiver penetrado. cesso , e deixa demorar a agoa maior intervalío dé tempo.. O mesmo deve fazer o doente ; deve suspender o purgante ainda por mais tempo, em rasão de experimentar allivio mais notável, e de ter appetite. Tomando mais alimento, faz-se maior massa de humores , que substituem os antigos, e pro- duzem a regeneração, de que falíamos. Finalmente o tanoei- ro para chegar a seos fins,, deve continuar o seo trabalho, até conhecer que a vasilha está limpa , e que se pôde com segurança confiar-lhe o melhor fluido. Faça o mesmo o doen- te até eslar certo de que o seo corpo já não contem germen de corrupção, para viciar os humores recuperados, e cau- sar huma recahida. Quanto mais tempo houver que a vasi- lha está estragada, mais deve trabalhar o tanoeiro. Repetin- do aqui o que dissemos no capitulo XIX, diremos que boa porção de doses tomadas em differentes épocas , sem necessi- dade sensível, não podem fazer mal aos doentes; huma vez de menos pôde causar lhes muito damno , porque ficaria ain- da nos fluidos huma parte de fermento destruidor, do que se deve desconfiar ,. mormente em respeito das affecções vi. rulentas ou contagiosas , e de todas as inveteradas. O resul- tado deste methodo he infallivel, como. o do tanoeiro. Para que huma e outra operação não aproveitassem , ou para que o, doente não sarasse, seria necessário que suas visceras, como as aduelas do tonnel, estivessem attacadas, estragadas,, ou podres por huma dilatada residência das matérias corrom- pidas. Sem duvida ha casos resultantes da antigüidade da enfermidade , ou da malignidade dos humores, que a produ- zem , ern que o continente se resente sempre , ou ao menos por muito tempo do vicio do que elle tem contido , tamhem ha casos , em que as entranhas e as visceras , dispostas a. receber a corrupção, como a communica-Ia depois , obrão tam- bém sobre os novos humores; mas o individuo, purgando-se suficientemente todas as vezes que perceba quebra na sua saude ordinária, ou que passe menos bem do que costuma^, prolonga seguramente sua existência. (192 ) desta verdade, como nós estamos, nunca hesifará, em qualquer cn>o de enfermidade, grave ou desesparada , em continuar o purgante , a fim de expellir do seo ser as matérias que re- conhece capazes de tirar-lhe a vida. Se suecumbir , ha de ser, quando a Natureza nelle não tiver mais recursos, e com. os mesmos meios, que o havião salvado em todos os casos, em que ainda ella poderia fazer alguma cousa em seo bene- ficio. A cura de hum doente pôde também ser embaraçada , quando a porção dos humores , que causa huma enfermidade a huma parte qualquer , não tem já mobilidade, e por con- seqüência não se pôde expellir. O mesmo accontecerá a aquel- le , cujo humor fôrma com a parte , que tem affectado, huma adherencia tal , que juntos fazem hum corpo. Por exemplo : não pôde restabelecer-se a vista, se o nervo óptico está para- lisado , ou destruído ; nem o ouvir , se o nervo acoustico estiver no mesmo estado ; não se pôde destruir huma affec- ção nervosa, se he antiga ou muito inveterada ; nem huma ankilose , se ha união perfeita dos dois ossos; e assim em outros casos , em que a causa he inseparável de effeito , que produzio , isto he da parte , que ella attacou e destruio ; por- que neste caso se poderia de alguma sorte dizer que o ef- feito não tem causa. Des'as considerações se conhece que a Medicina Curativa , reclamada muito tarde, não tem objecto propriamente dito. Reflexões preliminares , e communs aos quatro artigos. Antes de emprehender a cura de hum doente , cuja en- fermidade seja inveterada , ou altamente reputada incurável ou mortal, o pratico chamado para este effeito , deve estar bem informado das circunstancias agravantes , que podem fa- zer duvidar do resultado da empresa. Estas circunstancias são : A antigüidade do principio da enfermidade , que de- generou em affecção chonica ; o risco , ou ausência to- tal de saude do enfermo em sua mocidade ; a freqüência dos diversos aHaques que a sua saude tiver recebido ; a evi- dencia da fraqueza do temperamento ou da constituição; o abuso , ou prejniso da sangria , das sanguexugas , dos ba- nhos; a observação prolongada da dieta; o uso de prepara- ções mercuriaes,. mormente em grandes Hoses , ou repetidas por muito tempo; finalmente se se tem sujeitado a todo , ou parte dos tratamentos , que com justiça reprovamos em rasão de sua acção nociva. Então , e no caso, em que o doente reunisse diversos signas de incurabilidadç , que he hum pratico C 193 ) seria muito felis em poder discernir se não seria prudente abandona-lo antes á medicina paliiativa , do que appHcnr-lhe sem proveito os remédios indicados no nosso methodo. Neste mesmo caso , vale mais, para reputação dó pratico , deixar obrar a Natureza, que emprehender hum tratamento , que seos antagonistas condemnariáo , só porque não teria aprovei- tado. Quando ao contrario se achão em hum doente as fun- ções naturaes soffnvelmenfe organisndas; se não está muito adiantado em idade; se a .sua constituição d'antes era boa; se finalmente se notão indícios de que a Natureza possa ser- íhe favorável, pôde entrever-se hum vislumbre de esperança, ou hum motivo de cura provável , ou de allivio notável. En- tão he necessário que o doente affirme que ha de ser cons- tante, e perseverante em tomar as dosei evacuantes , em tão grande numero, quanto poder ser necessário , e que afnance huma determinação resoluta para soffrer todos os seos effei- tos. Pôde accontecer que experimente alguns , de que não. possa dar-se exacta conta. Mas, qualquer que seja a impres- são no seo animo , nunca deve parar na carreira das eva- cuações. He impossível que se chegue a curar hum doenle, que perdeo a esperança de ser curado, ou que não mostra muito empenho em curar-se , que he cobarde , ou irresoluto ; que não tem huma determinação pronunciada assaz fortemente , nem hum juizo assaz illustrado para abraçar a verdade , que co- meçou a brilhar a seos olhos ; ou se se assemelha a esses filhos estimados da fortuna , que tem a fraqueza de crer que com prata e ouro se procura a saude, assim como se com- pra huma terra , huma fazenda rara , ou qualquer outro ob- jecto de grande valor ; similhante sujeito está em perigo. Se pelo contrario o doente di corre por principios : se funda a sua opinião nos do nosso metherio ; se toma como regra de sua condueta a que muitos doente? tem tido ; se fi- nalmente firme e resoluto , diz com sigo : eu hei de suecum- bir , se a Natureza em mim não tiver mais recursos, ou hei de salvar-me, se ella poder aju:.'ar o tratamento. Então bem convencido de que, transgredindo sua resolução , não tem uuio de sarar , combaterá vigorosamente a causa de sua enfermi- dade com a esperança de triumphar. Ha doentes que não experimentao allivio do tratamento evacuatorio , senão depois que cessa o purgante, ou no tem- po , em que o suspendem , conforme a ordem traçada noa quatro artigos. O allivio lhes provém do feliz effeito do vá- cuo, que o purgante produzio. Elles tem e-.pçranca de que ( 194 )• gúceêderá o mesmo depois , e que se curem , ou ao menos fiquem notavelmente aliiviados, Encontrão-se também doentes, cujos males se augméntão, emquanto se pratica o purgante. He o resultado do impulso dado á causa efficiente , que os prodw, e que apprescnta hum obstáculo invencível ; ao me- nos no momento da applicação do remédio. Com alguma sa- gacidade se distingue facilmente o caso, em que convém suspender por algum tempo o purgante , e deixar o^ fluidos assentarem , para depois guiasse pela observação , seja para perseverar na medicina curativa , seja para se restringir aos soccorros da medicina chamada paliiativa, ou aos meios, que geralmente se empregão. Quantos doentes , na cathegoria das enfermidades recen- tes , negarão talvez á medicina curativa a pieferencia , que merece com tão justo titulo, como só capaz de evitar longos soffrimentos! Prevenidos e enganados ,. presos mui fortemente a prejuízos velhos , julga-la-hão impossível , ou impraticável. JnsufTicienfes para julgarem por si mesmos, serão victimas de pérfidas suggestões. Se tomassem conselho dos factos, que tantas vezes tem coroado este methodo, o erro deporia a sua venda., e a inveja quebaria as assacaladas settas , que não cansa de disparar contra este modo de tratamento, apezar de que este seja fructo de huma experiência adquirida, e de- fendida pela progressão de seos felizes effeitos. Quantos outros, depois de haverem emprehendido o tra- tamento deste methodo , se desdirão subitamente, sem repa- rarem na inconsequencia, que vão commetter ! Vindo a sentir i-iuma sede ardente , hum calor abrazador por todo o corpo , huma febre violenta , dores agudas, todos os accidentes pos- síveis , muitos pelo effeito de huma influencia, ou de huma pusillanimidade igualmente prejudicial , se comprometterão a ponto de abrir mão do tratamento , emquanto nestes casos , em geral elle ha mister ser activado. Entretanto verão a urina summamente vermelha , calorosa , inflammada , turva pelas matérias, que pôde arrastar com sigo , e de que está carregada ; e ainda que a natureza nociva de seos humores seja também demostrada por forte, ardor que os faça sentir ao sahir pelo ânus ; ardor, que prova a sua acção mordicante nas entranhas , e por toda a economia animal , negarão ain- da a causa dos perigos, que ©s ameação , e a indispensável necessidade de expulsa-la. Desta sorte haverá pessoas ( ao menos he este o nosso receio ) que, esquecidas do principio fundamental do nosso methodo , ou desconhecendo-o, perece- rão , sem embargo de não lhes pouparmos os nossos cous©* ( 19$ ) lhos para se salvarem do perigo. Temos aprendido a descon- fiar da fraqueza humana , e de alguma cousa mais. Quantos homens, ao menos inconsiderados , não temos encontrado no exercicio de nossa pratica! Alguns baque, depois da sua cura inesperada , e mesmo somente depois de hum allivio notável , terião aberto as veias , e assígnado com o seo pró- prio sangue qualquer titulo authcntico , que lhes pedíssemos , tanto estavão elles maravilhados , ou grandemente satisfeitos de huma mudança., que tão longe estavão de esperar.^.. En- tretanto elles tem provado depois que a inconstância, e |i in- gratidão são o quinhão de huma grande porção da espécie humana! Poderáõ zombar de nossas reprehensÕes, mas não hão de rir-se , quando sentirem novos attaques de hurna en- fermidade, da qual não se destruio inteiramente o germen. Fortemente aflincados aos verdadeiros piincipios , os doen- tes prevenirião por meios reconhecidos e certos os longos sof- frimentos , que os ameação , e a morte prematura , que he a -conseqüência inevitável. Doses evacuantes que se devem tomar. A manhã he era geral o momento mais commodo, € também o mais vantajoso a muitas vistas para tomar as do- ses evacuantes. Mis ha muitos doentes ou enfermos , que por diversas considerações não se podem sujeitar a isto. Mui- tas vezes este estado de prisão os embaraça de prevenir gra- ves enfermidades, de qua mais tarde poderão ser victimas. Este methodo lhes offerece a este respsito recursos e vanta- gens muito importantes , e diariamente appreciaveis. Desen- volveremos algumas rasões para demostrar que as facilida- des, que dá, suo mesmo da natureza das cousas , e que esta. sorte de condescendência não he frueto de huma imaginação sjstematica. He hum principio fundamental no que respeita á digestão e a tomada de doses evacuantes, que depois que huma se faz, as outras se podem administrar , porque se fica no que se ehair.a jejum. Póde-se estar em jejum em qualquer momento do dia e da noite; seria pois hum erro crer-se sujeito para isto ao acordar ou levantar da manhã. He constante que, para tomar huma dose de purgante , hc sufHciente o espaço de seis horas depois da ultima comi- da , tomada com moderação ou sobriedade. Se acerca de al- gumas pessoas , aecGnteees.se o contrario, seria porque a co« «íida não fosse proporcionada ás faculdades digestivas ac- tuaes do seo estômago. O vomitorio- purgante requer ao me- 25 ii ( 196 ) nos daâs horas mais do que o purgante, para ser adminis- trado. A dirferença consiste nesta consideração , que este evaeuante, que deve produzir o vomito em menos de duas horas , não espera que a digestão esteja absolutamente aca- bada , em vez de que esta pode, sendo necessário, terminar du- rante algumas horas que o purgante emprega para correr .para as vias inferiore;. Com as condições requisitas para a digestão , os eva- cuarites podem tornar-se a toda a hora, quer do dia, quer da ooite. Hum doente, que o seo incommodo não retém no quarto, e que tem obrigações que desempenhar em horas fixas , pôde conciliar o seo exercicio com o seo curativo, tomando as doses a horas convenientes , para que os effei- tos tenhão terminado no momento , em que suas obrigações o chamão. Estas doses podem tomar-se igualmente á noite ; então deita-se hum instante depois de as ter bebido , obser- vando que acabeça e o peito devern ficar mais elevados da que he costume (l). Com o vomitorio-purgante, deve-se es- tar accordado até que não obre mais por cima; e como elle he susceptível de procurar evacuações por baixo , se pôde dormir, como depois de tomar o purgante, sem inquieta- rão. Estes evacuantes accordão para produzir os seos effei- sos. Nestes casos as evacuações podem ser menos numero- sas do que estando accordado ; porém de ordinário são mais abundantes. Esta abundância vem de que as primeiras ne- cessidades de evacuar não sendo assaz fortes para accordar , demorão-se no estado de somno , mas accumulando-se as matérias , as evacuações se determinão mais volumosas. Se tratando-se á noite, o somno ou o descauso se achão demasiadamente interrompidos , o doente , para em duas noi- tes ter huma boa, pôde tomar as doses de quarenta em quarenta e oito horas. Mas ha poucas enfermidades , que permittão esta marcha lenta de tratamento. Em conseqüên- cia, se os soffrimentos exigem evacuações mais prontas para o doente alliviar mais cedo, não pôde deixar entre cada dose mais intervalío que trinta e seis horas, e mesmo me- nos até que sua situação mude para melhor. Do que fica dito se segue que aquella pessoa, que tiver occupaçÕes, per exemplo desde pela manha alé meio dia , deve comer pela manhã, a hora conveniente para que a digestão esteja feita (I) Esta posição he a que devem ter as pessoas reduzi*. das a ficar de cama com receio de vomitar a dose. ( 197) ao meio dia , e então deve tomar huma dose , e assim das outras horas, que se poderão adoptar para tomar as doses, depois de acabada a digestão. Se hum individuo cabe subitamente doente , póde-se , e mesmo deve-se praticar logo a evacuação, e quanto fôr possível, attendendo á observação relativa á digestão; mas se immediatamente depois da comida , accontecer á pessoa algum accidente, que faça logo temer pela sua vida , não se deve esperar a digestão; deve-se evacuar com o vomitorio- purgante , como capaz de livrar o estômago do alimento , que se tornou corpo estranho e nocivo , e para abrir o cami- nho ao purgante, a fim de obrar depois para destruir o acciden- te sobrevindo, e restabelecer a saude do doente, conforme a ordem do tratamento , como se diz nos quatro artigos , que o compõe. Advertências sobre os evacuantes Os evacuantes, em geral , tanto os emeticos como 03 purgantes , qualquer que seja a classe de que se tirem , e ainda que tenhão todos a mesma natureza, não podem ter intrinsecamente o mesmo gráo de actividade ,. em rasão da diversidade de idade , e de sensibilidade interna dos doen- tes. Portanto não basta a differença de força nas doses ; em conseqüência estabelecemos , somente para os purgantes , diversos gráos de actividade y. e para os reconhecer , fazemos pôr nos letreiros as riscas abaixo figuradas , com a inscrip- ção de cada gráo. Acerca do vomitorio-purgante , pôde esta- belecer-se debaixo de hum só e único gráo de acção , por- que misturando a dose deste evaeuante com o chá, de qu<2 logo fatiaremos , se toma tão fraco quanto se julga conve. niente. — O primeiro gráo dos purgantes sendo o mais bran- do , convém aos meninos de seis a sete annos, e para bai- xo até a idade de hum anno (1). Convém também ás pes- soas de huma sensibilidade chamada nervosa, ás que são idosas ou enfraquecidas pela longa duração da sua enfermi- dade , que se duvida poder curar , ou que se quer tentar alliviar, e geralmente he applicavel a toda a pessoa reco- nhecida por ser , o que se suppÕe , muito fácil de abalar. (1) Para esta ultima idade, ou mais moços ainda, en- fraquece-se com o charope de senne, ou de chicória, ou de flores de pessegueiro, partes iguaes; ou menos charope , jpara limitar a dose a huma colher, se for possível. ( 198 ) ______O segundo gráo, sendo mais acfcivo que o pri- meiro , he próprio á quasi totalidade dos doentes de hum e de ouiro sexo, até as crianças de sete annos. Por este grão he que se deve começar o tratamento de todos os adul- tos , ou de todas as pessoas grandes , empregando porém o terceiro gráo depois como diremos. O segundo deve substituir o primeiro, em todos os casos, em que este, na dose gra- dualmente chegada a quatro colheres , não obrar o numero de evacuações , que adiante se determinará , nada embaraçando que ella se augmente quanto for necessário. _________O terceiro gráo só se pôde prescrever aos doentes em que se reconhecer, difnceis de abalar, ou a aquelles que não sentem já evacuações pela acção da 2.", ainda que a sua dose seja levada successivamente até quatro colheres, ou mais ; préscrcvendo-se porém o Sp gráo com mais de quatro colheres, se a esta dose se julgar insufficiente para produzir as evacuações exigidas. --------- — No caso em que o 3.° gráo se reconheça muito fraco na dose de quatro colheres, e depois de o ter verificado varias vezes , vem a ser necessário o ros , que a estorvão , pela rf-são de que o purgante por falta de acção sur.kdente , ou de huma dose assaz volumo- sa , não poicria penetrar o entulho , que existe , nem por cnnsequenciR filtrar-se nos vasos, e ainda menos no tecido das carnes. Portanto não se curaria,' porque não se des- truiria a causa das moléstias. Deve-se reconhecer que se restabelece nova plenitude no canal intestinal durante as suspensões de evacuação determi- t i ^ Empregando-se successivamente os gráos superiores, como a;>ui vão indicados. (207 ) nadas na ordem do tratamento , c qne rp^.nto mai? 'liMa- da foi a sua durarão , tanto maior cuidado merece, Por isso quando se repete novo cuiso de purgantes , deve-se to- mar a primeira dose hum pouco menos volumosa do que fo- ra a ultima do cur*o precedente. Muitas vezes até he neces- sário usar de hum grio de evaeuante menos activo que aquelle que antecedentemente se empregou. Esta medida he de rigor, quando se vê restabelecer a sensibilidade interna , destruída pela malignidade dos humores , como se dh>c no capitulo IX. titulo da opposição dos humores; da' fo porém ás'doses subsequentes a actividade exigida para a quantidade de evacuações determinada , á qual se deve fazer constante esforço para chegar. Nenhuma dose , quer de vomitorio-purgante , quer-pur- gante , he demasiadamente forte , qualquer que seja o seo volume , quando nío produz evacuações além do numero so- bredito. Repetir-se-ha aqui o que se disse em outro lugar , que, se o doente experimenta durante os effeitos de huma dose , ou depois que elles terminão , quer huma prisão , ou incommodo , quer hum augmento das dores, ou alguma af- fecção , que até então lhe era desconhecida, ou mesmo al- gum accidente grave , deve reconhecer que a má natureza dos seos humores , assim como entrarem estes em movimen- to , são a causa única , e conceber, que os remédios, que tem obrado ínnumeraveis curas, não podem huma só vez fazer mal a alguém. Este ca?o impõe muitas vezes a obrigação de activar o tratamento conforme o artigo 3., até que o doen- te allivie. Convém também observar que nunca talvez se re- produzio hum accidente igual ao primeiro no mesmo sujeito , que tem usado de perseverança. A ignorância, em que es- tão muitas pessoas a este respeito, produz hum mal incalcu- lável. Deixem-se pois instruir, e não calquem aos pés a ver- dade , para acabarem victimas de capciosas asserçÕes, ou de prevenções irreflectidas. Suppondo que huma dose tivesse si- do muito activa, porque se tornasse muito forte, ou em mui grande volume , a causa da enfermidade nem por isso se devia deixar de evacuar. Diminua-se a dose seguinte, se for necessário, como fica dito, e continue-se o tratamento; do contrario se exporão aos mais graves accidentes. Mas se huma dose se achar ser muito fraca para expulsar sufficiente- mente a plenitude humoral, que existe no momento do ac cidente experimentado , e de que ha pouco fizemos menção, o doente pode receber mais incommodo que se esta dose fos- se mais enérgica, e até hum pouco forte de mais. Neste ( 208 ) caso deve administrar-se outra mais activa e mais volu- mosa. Cores dos humores durante a evacuação. Todo o effeito tem causa: outra vez o dizemos para fixar ã attençao sobre huma verdade útil , e sempre mui pouco conhecida em medicina , ou no caso de en- fermidades. Assim como os humores, quando se corrompem , adquirem todo o calor ardente ou corrosivo, com o cheiro infecto , que se lhes acha em todos os estados ou períodos do estado do soffrimento, conforme a sua natureza explicada no Cap. I. ; da mesma sorte quando se depravão estas ma- térias , tomão as cores particulares a cada hum dos gráos da sua degeneração. A bile he o humor colorante. Sua cor na- tural no estado de saude , he hum amarello claro. Aqui se considerão os humores em massa. Na sua evacuação so no- tão as cores seguintes. No primeiro gráo de corrupção, ap- presentão huma tintura de amarello carregado , puchando pata verde carregado ; no terceiro gráo sabem de côr verde-escura, no quarto gráo se lanção escuras , ou denegridas ; no quinto são inteiramente negras. Nas primeiras edições não falíamos da bile azul. Esta côr então raras vezes notada , pôde co- mo as outras cores , estabelecer-se por effeito da corrupção. Muitos doentes a tem visto sahir de seo corpo, e eu mesmo já a vomitei. He muito símilhante á infusão de anil , em que as engomadeiras mettem o que chamão roupa para azul. Os doentes, que a tem vomitado, estavão attacados violentamente, e sabemos quanto soffriamos naquella época de moléstia, em que a lançámos : o que prova que he de muito má nature- za. Até agora tínhamos de alguma sorte duvidado da exis- tência desta cor, que pôde pertencer ao quarto gráo de corrupção. Se as duas primeiras cores não mostrao signaes de pe- rigo , não accontece o mesmo ás outras. As ultimas são te- míveis : são as cores da podridão, e da putrefação , mesmo contagiosa ou peslilente. Quasi sempre estas cures sahem mis- turadas do corpo enfermo que as evacua. Quando os doentes lanção as cores dos últimos gráos, não se deve suspender as evacuações , da mesma sorte que quando evacuão hum fedor, que incommoda gravemente os assistentes , e ainda menos quando os symptomas da enfermidade são graves; porque de- vem-se activar as evacuações, seguindo rigorosamente o arti- go 3.° da ordem do tratamento. Em todos os casos, he sem- jpre prudente, qualquer artigo da ordem do tratamento quç '( 209 ) se siga, não affrouxar as evacuações , emquanfo as matérias nao se aproximão convenientemente ao seo estado natural por medo das recahidas ou crescimentos. Tal he o guia, que se deve seguir, e este guia nao engana, porque pelas matérias evacuadas, he que se presume da .natureza das que restão a expulsar : he propriamente falhando a amostra , pela qual se pode julgar da peça. (1) (1) No Cap. I. promettemos fallar largamente das exha- lações infectas e nocivas , que emanão dos corpos enfermos. Quantas testemunhas do tratamento deste methodo , não at- testarião terem sido obrigados , por oceasião das matérias infectas de que elle provocou a evacuação, a abrir, ainda com precipitação, portas, e janellas, estando quasi a ponto de serem suffocados pelas emanações destas nuterias; elles poderião também dizer o trabalho, que custou a desinfectar a câmara dos doentes. As mesmas testemunhas , que lerem esta nota, poderáõ aflirmar que não exageramos. Criamos conliecer toda a força , e todos os gráos de putrefacção, que podião existir , e o que suecedeu a este respeito , em 1821 , a hum ' dos nossos doentes, nos parece assombroso. Lançou matérias tão putreficadas, que corromperão carnes em huma casa de pasto visinha. Ainda não he tudo ; a agoa da fonte deste doente , corrompeo-se também. Sem se ter percebido poz-se a panella ao fogo : vio-se hum caldo negro , e não se vio nadar hum só glóbulo de gordura , como accontece ordinariamente. Qiial he a causa ? Como podia viver este doente? Na verdade seo físico appresentava grandes duvidas á sua cura } e se não fosse a sua denodada determinação , não teria usado do nosso methodo. O que não he menos para admirar do que a corrupção da água da fonte, he que sarou quando seo corpo encerrava símilhante podridão ! Lição para os hábeis dissertadores , para os sábios , para todos aquelles que ignorão , ou não querem reconhecer que a causa única das enfermidades são os humores m ;is ou menos corrompidos , que cumpre evacuar se se quer sarar , ou defender a exis- tência então ameaçada fortemente. Crer-se-ha que hum homem, que tem o. titulo de medi- co , disse em huma casa , a que foi chamado nesta qualida- de , que era por hum estratagema , ou com o soccorro de partes colorantes empregadas por mim , que ps doentes, de que lhe fallavão , tinhão lançado as cores , f>rços penosos , e que o doente se sinta mui- to cansado, he necessário ncsiecaso que beba em cada quar- to de hora, ou mais freqüentemente, huma chicara de chá, fraco, ou em falta de chá, agoa pura; huma e outro mor- nos, e com assucar , se se quizer. O chá he preferível , porque he hum precipitante, que ajuda as evacuações das vias^ inferiores , as quaes tendo lugar. allivião as vias superiores , como se disse no artigo dose do vomitorio-purgante. Como a bebida do chá só serve para enfraquecer a acção vomitava da do- se, e ajuda-la a obrar por baixo, como já se disse , não se deve beber quando obra lentamente e com brandura , porque não sendo activa de mais , não deve enfraquecer-se. Mas se sen- tir alteração durante os vômitos , bebe-se do mesmo chá de do cheiro infecto , que he procedido dos meos evacuantes ,. que corrompem os alimentos 7- Pois todas estas necedades fo- rão ditas ern casa de hum doente , em presença de muitas pessoas; e a maior parte, de queixo cabido, crêo na palavra do Doutor. Digamos agora , que entre os que escutavão , achou-se hum ente assaz soffredor para não tomar a palavra, emquanto o Doutor não acabou de fallar. Eu tenho empre- gado a Medicina Curativa, lhe disse elle, depois de ter es- gotado por muito tempo a sciencia de homens , que , como vós , possuião em alto gráo o talento da palavra. Des de o principio do tratamento evacuei matérias de todas as cores , e mais , ou menos infectas. Meo estado de saude me emba- raçava comer cousa alguma : logo os evacuantes, de que fallaes, não podiáo corrompe-la. Depois de lançar a parte mais cor- rupta de meos humores, lancei as depois com a côr amarella da bile, e com hum cheiro natural. Suspendi as evacuações para satisfazer ao appetite que chegou. Para acabar a minha cura , purguei-me com os mesmos evacuantes , e nunca lan- cei matérias símílhantes. Logo estas matérias causa vão a mi- nha enfermidade, porque apenas purguei o meo corpo, goza de huma boa saude. Eu vos faço esta declaração , Senhor , para que não me conteis no rol dos vossos crentes , e para que entendaes que sei julgar-vos. Se ejte medico era deboa>> fé, ao menos faltava-lhe bem útil experiência. Decida o lsitor. ( 211 ) quando em quando ; da mesma sorte que se pôde beber para enxagoar a boca, ou contra o máo gosto. Quando a dose deixa de obrar por cima . e a sede continua durante as eva- cuações por baixo, pôde beber o chá para humedecer, e sempre morno, como com o purgante. Seja por erro, ou por outra causa, que se tenha toma- do huma dose de vomitorio-purgante evidentemente muito for-» te , e que seja seguida de arrancos, ou vômitos excessivos, suspendem-se os effeitos por meio de huma, ou mais chica- ras de caldo muito gordo, ou em falta de caldo com algu- mas colheres de manteiga fresca, derretida, repetidas em alguma distancia, até ce-sar o excesso (1). Encontrão-se ás vezes doentes, cujos humores tem huma natureza , que os assemelha á do emetico , como se disse no Cap. XII. , titulo do Vomito. Neste caso a dose do vomi- torio-purgante não vale nada nos vômitos, que podem ter lu- gar ( o que he raro ) depois de acabados os seos effeitos. Convém facilitar a evacuação destas sortes de matérias pela continuação do tratamento evacuativo. Bebida com o purgante. Não somente o purgante não exige bebida alguma em- quanto obra , mas rejeita o seo uso , antes de haver produ- zido muitas evacuações , sob pena de expor-se ao vomito pela excesso de pezo, que o estômago sentisse. Basta meia canada de liquido pouco mais, ou menos; e essa mesma, deve to- rnar-se por muitas vezes, e somente para humedecer, quando o doente soffre sede , ou secura na boca. Esta bebida pôde eompor-se de chá muito fraeo , caldo de hervas, caldo tem- perado, soro de leite, água com assucar, água panada, co- rada com hum pouco de vinho, se quízerem, ou outras be- bidas , que se costumão : tudo morno durante a operação da dose. Ordinariamente depois que as doses do purgante tem acabado , ou quasi acabado suas operações, he que os doen« (1) He a propósito dizer aqui, para que todo o mundo saiba, que nenhum emetico, e nenhuma preparação de anti- monio são , nem podem ser venenos por sua natureza, por- que não tem caracter algum de eausticidade. Não podem fa- z-cx mal senão por huma dose muito forte ; nisto sua acção he commum com outras muitas substancias, principalmente as espirituosas eua geral. 27 ii ( 212 ) entes tem sede , quando a tem ; neste caso bebem á vonta- de , e se regulão como se dirá abaixo no titulo Regime (1). Regime. O regime, que devem seguir os doentes em tratamento segundo este methodo , he muito simples ; mas a sua sim- plicidade he perfeitamente coordenada , e de accordo com a Natureza , por mais que digão os exaltados partidistas da dieta. Se o doente, que se purga, tomasse alimentos antes que o seo estômago os podesse supportar , ou estivesse disposto * Recebe los , poderia este engeita-los. Mas com as condiç6e3 seguintes ; 1.° quando huma dose , quer vomitorio-purgante , quer purgante , tem produzido quasi os dois terços das eva- cuações , que se devem esperar por baixo, conforme o nu- mero , que havemos determinado; 2.° perto de cinco ou seis horas depois de tomar a dose , se ella tem obrado prontamen- te ; 8.° senão vem mais á boca, nem causa mais arrotos; 4.°' mais seguramente ainda, se a disposição do estômago para receber mantimento se faz sentir; reunindo estas quatro con- dições o doente pôde tomar hum caldo de vaca. Se elle se sente em estado de tomar huma sopa em lugar de caldo , compõe-se conforme seo gosto ; deixa hum intervalío entre o caldo e a sopa. Quasi huma hora depois do caldo e da sopa, e ainda sem deixar intervalío algum , se o doente es- tá bem disposto, pôde fazer uso da espécie de alimento, de que gostar ; se tiver appetite , satisfaça-o ; coma de tudo com prudência e discrição , mas de tudo que está costuma- do a comer; multiplique antes as comidas do que tome de huma vez grande quantidade de alimentos. He indispensável huma nutrição sã. Os bons alimentos são preferíveis a aquel- les, que tem poucas partes nutritivas ; os legumes , as frutas j as selladas , o peixe em geral são deste numero. Entretanto não se impõe ao doente a obrigação de so privar delles, quando o gosto os pede , ou não tem outro alimento. As frutas cozidas e cruas lisongeáo o gosto do (1) Toda a dose, que deixa muita sede depois de seos effeitos , indica por isso a necessidade de outra, ao menos no outro dia , porque esta forte secura he causada pelo calor ar* dente dos humores ; o mesmo que faz sotfrer a moléstia, co<* mo se demostrou no decurso deste methodo. ( 213 ) dbente ; estas bem maduras não são cruezas nocivas. Os ali- mentos acres , muito salgados, ou picantes ; os que são re- conhecidos escandescentes , irritantes , e os indigestos devem ser proscriptos. Propriamente fallando , este methodo não re- quer para a generalidade dos doentes senão a olha; mas pôde se dizer que a exige imperiosamente, porque, com poucas excepções todo o mundo se dá bem com hum cal- do de vaca. O uso moderado do vinho não pôde fazer mal , salvo se hum humor ácido no estômago, e de que se falhou no capitulo XII., titulo dos Azedumes, excitado por este es- pirituoso, incommoda a pessoa que se cura ; sem embargo recommenda-se hum pouco de bom vinho acerca de quasi todos os doentes. Mas deve altcnder-se ao effeito, que produs o vinho no systema em geral. Sabe-se , e he sensível , que os vinlíosos como os espirituosos obrão sobre os fluidos, que vigorão a fibra , que dão tom. Portanto he conforme ás re- gras da prudência usar delles com moderação, quando oa fluidos são de má qualidade, podendo ser hum pouco me- nos circunspecto quando tiver evacuado o vicio. Todo o homem de juízo conceberá que , sendo os fluidos corrompidos a causa da dor , devem augmenta-la , á medida que são ex- citados por qualquer agente. Geralmente fallando , os estimu- lantes, como o caffé ou os licores fortes, convém pouco ás pessoas de huma saude frágil. Também não convém aos que estão magros , ou sem gordura sóffrivel : e menos ain- da a aquelles, que soffrem insomnias , ou qualquer outro ef- feito incommodo de qualquer maneira que seja. Quando ha huma causa interna capaz de prodü2Ír hu- ma sede ardente, ordinariamente se faz sentir no momento da comida, como para o fim dos effeitos da dose evaeuante,, e esta sede hc tão forte, quanto a causa indicada, que o produz, pôde ser calorosa, ou ardente. Depois de ter comi^ do, o doente nao he mais sujeito a dar á sua bebida o lige ro gráo de calor , que se recomenda fortemente durante o? effeito<= das doses : todavia muitos podem achar-se bem com beber a«roa morna. Bebe agoa com hum pouco de vi- »ho , ou enTfalta de vinho , sua bebida ordinária■; ou abas afroa panada pura, ou misturada quer com esta mesma be- bída/quer com vinho ; e finalmente toma com prudência toda a bebida, com que se costuma saciar a sede. Depois de comer, o doente, que se acha em estado de cuidar em seos negócios, pôde fazedo : pôde salur de casa,, tomando, cautelas contra os dois extremos da tempera. ( 211 ) tuva. Em fiirlo deve ser prudente e reservado. Depois da comida , ainda pôde ter algumas evacuações , conseqüência dos effeitos da dose, que tomou precedentemente. Não gostando de alimentos sólidos , ou não tendo appe- tite , como accontece nas doenças graves, mormente no prin- cipio do tratamento ; quando a dose , de que acima falíamos , tem produzido, como se disse , hum numero de evacuações tal que o estado do estômago faça conhecer que ella está filtrada nas vias inferiores , o doente deve tomar para sus- tentar se o caldo gordo , forte e substancial, sem temer que o excesso deste lhe faça mal , porque além de conservar as forças, mitiga a acrimonia dos humores , que falta evacuar. Tomará mais , e quanto poder, sopas de gordo ou de ma- gro , ou chocolate se gostar; sem todavia despresar as pri- meiras, que são preferíveis. Em todos os casos , em que os alimentos sólidos, ou somente líquidos, tomados muito cedo, forem vomitados, dever/iÕ repetir-se algum tempo depois , na esperança que •estes não seráõ rejeitados, porque accontece raras vezes que o sejão na segunda tentativa. Se o doente , gravemente at- tacado , expeúmenta alguma alteração forte , ou de longa du- ração, o caldo gordo temperado, o caldo dehervas, a mes- ma agoa panada, são preferíveis a essas tisanas debilitantes usadas de sobra durante as enfermidades. Regime para o artigo 4.° Os doentes , nos quaes as doses produzem prontamente seos effeitos , como no espaço de seis a oito horas , e que por conseqüência podem fazer duas comidas no dia ; ordi- nariamente estão em estado de repetir as doses muitos dias seguidos antes de suspender o purgante. Pelo contrario aquel- les , em quem as doses , ainda reforçadas, obrão lentamen- te , estão longe de ser tão favorecidos. Temos visto doses gastar o dobro do tempo e mais , e consentir muito pouco alimento, para que fosse possível repeti-las no cabo de vin- te e quatro horas. Os primeiros, que podem accelerar a mar- cha do tratamento, se curão mais depressa que os outros. Estes são obrigados a conduzir-se mais de vagar , e deixar Correr trinta horas, e ainda mais, de huma dose á outra r porque o seo individuo não tem menos necessidade de sub- stancia (It> que se fossem mais fáceis de abalar. Convém pri- meiro que tudo attender a esta função principal , primeira base da existência. Entretanto não se deve confundir a au- { 215 ) sencia do appetite, que provem da agitação da massa dos hu- mores e do fastio, que as matérias corrompidas produzem, com esta mesma falta de appetite , que pôde resultar da longa duração da enfermidade. No primeiro caso , se restabe- lecerá o appetite, expulsando prontamente a causa , que o produzio ; e no segundo se reproduzirá com o tempo neces- sário ao restabelecimento da sua saude. Regime para o artigo 3.Q Quando hum doente he obrigado a repetir as doses evacuantes, como se disse no artigo 3.° da ordem do trata- mento , devem-se aproveitar todos os momentos ; de maneira que tome os mais alimentos que poder , sem embaraçar o andamento das evacuações. Quanto mais leve for a comida, menos tempo he ordinariamente necessário para a digestão , e mais cedo se deve repetir a dose evaeuante. Quando hum doente toma só hum ligeiro caldo, podem bastar duas ho- ras, e pôde repelir a dose. Se comeo huma ligeira sopa, bastão três horas , e pôde tomar a dose. Se a comida for mais forte , deve regular-se eomo se disse no artigo da tomw da das doses. Cuidados geraes dos doentes. Em todos os casos, os doentes se conservarão em muito" asseio. Respeitar.se ha o seo sono natural , que se protegerá com todas as cautelas análogas. Assim recuperarão aquelle , que a enfermidade , ou a marcha activa do tratamento lhes fizesse perder. Evite se tudo que possa affectar seu moral ; animem se; consolem-se; procure-se dar-lhes a satisfação pos- sível , por alguns divertimentos úteis , sem os fatigar era cousa alguma. Renove-se muitas vezes o ar de sua habitação, tomando as medidas convenientes pnra que os não incommode. Mude-se muitas vezes a roupa, e isto se faça com todas as cautellas do costume. Affastem-se de sua câmara as dejecçÕes, e geralmente tudo que possa infectar o ar. Esta medida he recommendada, tanto por amor dos assistentes , como do doente. Lembrem-se que ella he conforme com o que se disse acerca das causas corruptrizes dos humores , no Cap. II., e jpelas mesmas rasões , que alli se deduzem , devem sempre estar sós em suas camas. ( 216 ) » Observação final. Aqui termina a abbreviaçâo , ou a pratica do tratamento curativo, á qual appliquei cuidados particulares , taes que posso dizer com persuasão equivalente á certeza , que com- parada com o principio , em que se funda a Medicina Cu- rativa, e ao desenvolvimento do tratamento, que he conse- qüência do mesmo, esta mesma abbreviaçâo , tal qual he , dá todas as facilidades desejáveis; e que basta lê-la outravez quando for necessário , para fazer cessar todas as difliculda- des, que ficassem depois de huma só leitura. Atrevo-me a dizer outro tanto desta obra. A distribuição do seo plano, a narração simples , e posso dizer clara , e precisa de minhas dissertações , estão ao alcance de todos os leitores. Todos os dias eu recebia muitas cartas , pelas quaes, e segundo o seo texto, se me offerecião questões totalmente insoluveis , ainda que perfeitamente resolvidas no meo metho- do ; o que me fez dizer mais de huma vez que ha pessoas, que não reparão que o tempo, que gastão em escrever huma carta mais ou menos insignificante , seria mais bem emprega- do em reler huma obra , que pelos detalhes de que se compõe , pôde satisfazer á intelligencia menos cultivada. No momento , em que fiz apparecer a minha sexta edição, á qual íiz addições , que illuminão a marcha do tratamento curati- vo , achei-me alliviado de hum pezado fardo , que me era impossível sustentar por mais tempo. Accrescentei-as nas edi- ções sétima, oitava, nona, décima, e nesta undecima, na qual a classe enferma achará quanto posso offerecer-lhe , e fazer em seo beneficio. O publico, e os homens da arte estão habituados a hu- ma linguagem tão differente daquella , que se adopta nesta obra , que em huns poderá ofrender os prejuizos recebidos , em outros produzirá hum effeito extraordinário. Porém , na Medicina , como em todas as outras cousas , não se de- vem preferir resultados numerosos , e verificados a theoiias abstractas , que nascerão no campo das conjecturas ? Será nunca tarde para levar a luz ás trevas, substituir a verdade ao erro , a instrucção á ignorância, a pi atica á inexperiên- cia ? Tanto pôde haver prescripção contra documentos úteis , como contra a mesma verdade. Se alguns homens vivem dç a terem cativa , todos lucrão em que ella seja conhecida. Encarei a utilidade geral; e se para consegui-la cumpre que sof- fra novos dissabores, empenhar-me-hei em achar força par.* ( 217 ) supporta-los no exemplo desses homens, que soffrerao por ter proclamado verdades úteis. Não me faltão ma'triaes, e ainda me poderão fornecer mais para augmentar o quadro das per- seguições , que se acha no charlatanismo desmascarado , obra que já citei. Disse na minha nona edição , que podia ajuntar huma massa de provas , para fazer triunfar a verdade, que importa aos doentes curados pelo meo methodo defender juntos com migo. Cumpri a palavra, dando a Medicina Curativa pro- vada e justificada pelos factos, e que fôrma a segunda parte desta obra. Trato de fazer apparecer o segundo tomo desta collecção de factos de pratica , que não se lera com menos interesse que o primeiro. Elle formará a terceira parte do meo methodo. Homens sempre prontos a marear com seo bafo escumo- "so o espelho, que reflecte ao natural todas as feições das paixões, que os devorão, e que jul^ão com esta nevoa ema- nada da sua cloaca pulmonar , roubar estas feições á vista dos observadores, tem procurado fazer crer que a minha col- lecção era feita de propósito para servir meos interesses , cevar minha cobiça, e aíém disto, pozeráo em duvida a veracida- de daquellas, que são assignadas somente com a letra inicial dos nomes dos seos authores. Tenho provado o meo desinteresse para com a sociedade, dando-lhe a composição dos medicamentos, tos nomes, até importantes , ignorados na primeira parte. Com que pois os máos , ou a malevolencia , supprirão a ar- ma , todavia mais sua favorita do que perigosa , que vai ser quebrada em suas mãos ? Deverão cansar-se sobre a veraci- dade , ou não veracidade daquellas attestações ? Pois então querem usar deste meio , entre outros , de conhecer a verda- de ? Apostem 100 soldos, eu apostarei 100 francos. Eu os espero.... . Os homens judiciosos reconhecerão mmnas vistas , e ap- preciarão minhas intenções ; elles verão que por esta Collec- ção de cartas circunstanciadas , ponho todos os entes soflre- dores em presença de hum granie numero de doentes, que fbrão; isto he superior, quanto he possível, á falta de hu- ma reunião em hum vasto sallão, em que qualquer doente podesse perguntar ao que esteve no mesmo caso, o que fez, que difficuldades achou , que obstáculos venceo , em fim tudo >s em sonhos agitados, como accon- tece a muitos enfermos, i O primeiro que communicou esta en- fermidade , onde a adquirio, senão na origem que acabamos de indicar ? Esta enfermidade se communica de muitos modos , e ato pela respiração. A copula he o meio mais ordinário e certo para contrahi-la com os symptomas , que se manifestão no membro viril; mas não duvidarei dizer , porque tenho disto experiência, que a simples tentativa da copula , os approches inadvertidamente sem contacto sensível eqüivalem ás vezes ao eoito consummado. _ O que se chama virus he huma serosidade tão subtu, qus penetra, e se transmitte pelo mais leve contacto, e tem tanta acrimonia, que produz dores violentas, e outros incommodos provenientes do contagio venereo, como se ob- serva. Em huns são conimentos , irritação, inílammaçuo ; em outros ulceras , excrescencias , encordios , depósitos , &c. A malignidade dos symptomas característicos he propor- cional á do virus communicado ; mas pôde proceder também em parte da corrupção ou indisposição, em que se achao os humores do individuo , quando contraído o virus. Os que não s:osavão saude , ou padecião alguma enfermidade, sãq ° S8 ii '( 220 )' os mais expostos a funestas conseqüências , e difficeís dè curar: tem necessidade urgente de hum methodo, que não só o;, cure do mal venereo , como também da causa de suas an- tigas queixas; e tal he o nosso. Se o virus venereo , que provem do coito, não proce- desse da corrupção dos humores fluidos , corrupção que se transmitte depois pelo virus communicado, se deveria attri- buir ao virus, somente a causa das dores , e mais acciden- tes, que os acompanhão ; isto he , que o virus obraria então como corpo extranho, e sua presença se faria sentir, huma vez introduzido , e ainda ao introduzir-se nas partes da ge- í\;.ção, em cujo caso he innegavel que produziria as dores no mesmo momento , em que se insinua nas vias que o rece- bem , e por onde transita. Pelo contrario sabe-se que se passão muitos dias, e ainda semanas, entre o coito , e a ap- parição do primeiro symptoma, ou da primeira dor , prova evidente de que o virus precisa tempo para corromper os humores, e para que a serosidade, que se converte em vi- Jms no individuo, que adquirio o virus, e em quem se mani- festão os seos symptomas característicos , se forme da cor-. rupção com a homogeneidade do virus adquirido. Antes de fallar dos meios curativos , lancemos hum golpe de vista sobre os que se empregão ordinariamente. O tratamento desta enfermidade he o palliatívo ou curativo ; «nalysemos hum e outro, para examinarmos seos resultados. Tem-se reconhecido que he pai liar a enfermidade curando-a com sangrias, tisanas diureticas, banhos, e alguns adstrin- gentes para supprimir os corrimentos. Estes meios, ainda que próprios para diminuir a acrimonia do vírus , forão abandonados , como insufíicieníes. Tem-se adoptado os sudori- ficos na esperança de expulsar o virus pela transpiração» Devcr-se-hia observar que o mais certo he que estes ( os sudorificos ) o fazem filtrar no tecido da parte carnosa, 3 que o podem chamar á pelle , ou introduzi-lo nos ossos , onde produz exostoses , erupções , enfartes , depósitos, ba- bões, &c. Finalmente tem se adptado o que se chama o grande remédio ; e se acredita ter-se achado o remédio cu- rativo. Consiste este em fricções de mercúrio sem prepara- ção alguma , ou combinado com a banha de porco. Come- ça-se por huma das extremidades, seguindo pelas demais partes do corpo até que o enfermo babe, ou salive abundan- temente. Huma cega confiança o faz crer que aproveitou huma cura radical ; mas o tempo lhe dá muitas vezes a Certeza do contrario. (221 ) Parece que se deve aos antagonistas deste uso do mer- cúrio a administração deite interiormente preparado , e dul- éificado de differentes modos. Possível he que estes remédios facão menos mal do que as fricções; comtudo provocão a salivação , abalão , e fazem eahir os dentes, fazem dores de eabeça , de estômago , e differentes accidentes, que mostrão que o mercúrio de qualquer modo preparado e combinado não he próprio, ao homem, nem meio de sua cura, nem menos nocivo do que applicado em fricções. Conforme as ohservaçÕes dos partidistas do mercúrio em fricção , e a julgar pelo que dizem , estes meios não cor- rigem o virus como aquelle ; mas os seos adversários bem atrevidamente possão do sublimado doce , ao sublimado corro- sivo , sem recear administrar interiormente hum tal cáustico . que em cirurgia se emprega para cauterisar as carnes fungo- sas das ulcera?. Applicão-o coni leite , ou fazendo que os en- fermos o bebão sobre elle. Depois se compozerão liquores, co- mo os do Barão Wanswieten a quem, segundo dizem , se deve o uso interno do mais violento de todos os venenos chi- micos. Alguns gráos do sublimado dissolvidos em hum quar- tinho de agoa assim disfarçada fazem hum especifico, que se deve chamar liquor vegetal, porque precisa de hum nome; o charope se deverá chamar charope antivenereo ; bem como o suco clarificado de qualquer planta se chamara rob anti-sifili- tico. He hum erro crer que o mercúrio e suas preparações possão curar as enfermidades venereas. Os humores viciados pelo virus não serão nem menos ardentes, nem menos cor- rompidos , ainda que estejão combinados com o mercúrio , ou ainda com qualquer outro absorvente, que não seja nocivo, e he pelo contrario bem certo que os estragos, que podem pro- duzir estas matérias assim alteradas, se augméntão também com estas preparações, sern duvida insuficientes e perigosas por seo effeito cáustico, ou pelo menos mui acre, como se nota em differentes casos. O mercúrio he hum mineral summa- mente frio ; he o maior inimigo do calor natural , e por isso muito prejudicial. Introduzido pelos poros penetra até á cir- culação ; com a sua frialdade abranda o ardente calor do vírus ; mas não o evacua , e daqui se vê a sua insuffi- ciencia. Susceptível de reunir-se nos vasos , como se pôde dividir para os penetrar ? Não pode com sua reunião em glóbulos mais ou menos grossos parar repentinamente a cir- culação do sangue , e causar a morte ? Se se não temem estes accidentes possíveis , he provavelmente porque suece- A rt&-~-" J P* .^x %, ^°^v NATIONAL 0327i4flrjfl a NLM032748082