Faculdade de Medicina da Bahi^ THESE APRESENTADA Á FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Em 26 de Outubro de 1906 POR evco Natural do Estado da Bahia (Cannavieiras) Pharmaceutico diplomado pela areSma Faculdade AFIM DE OBTER O GRÂO DE DOUTOR EM MEDICINA DISSERTAÇÃO Do estado mental neurasthenico (Cadeira de Pathologia Medica) PROPOSIÇÕES Tres sobre cada uma das cadeiras do curso de sciencias medicas e cirúrgicas y BAHIA ESCOLA TYP. SALESIANA 1906 FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA Director— Dr. ALFREDO BRITTO Vice-Director—Dr. MANOEL JOSÉ DE ARAETJO Lentes cathedraticos OS DRS. MATÉRIAS QUE LECCIONAM 1. a SECÇÃO J. Carneiro de Campos Anatomia descriptiva Carlos Freitas Anatomia medico-cirurgica. 2. a SECÇÃO Antonio Pacifico Pereira Histologia Augusto C. Vianna . Bacteriologia Guilherme Pereira Rebello .... Anatomia e Physiologia pathologicas 3-a SECÇÃO Manoel José de Araújo Physiologia José Eduardo F. de Carvalho Filho. . Therapentica 4_a SECÇÃO Luiz Anselmo da Fohseca Hygiene Josino Correia Cotias Medicina legal e Toxicologia 5-a SECÇÃO Braz Hermenegildo do Amaral . . . Pathologia cirúrgica Fortunato Augusto da Silva Júnior. . Operações e apparelhos Antonio Pacheco Mendes ..... Clinica cirúrgica. 1.- cadeira ignacio Monteiro de Almeida Gouveia. Clinica cirúrgica, 2.- cadeira 6.a SECÇÃO Aurélio R. Vianna Pathologia medica Alfredo Rritto. Clinica propedêutica Anisio Circundes de Carvalho. . . . Clinica-médica, 1- cadeira Francisco tíraulio Pereira. . . . . Clinica-medica, 2- cadeira 7-a SECÇÃO A. Victorio de Arau o Falcão .... Matéria medica, Pharmacologia e Arte de formular José Rodrigues da Costa Dorea . . . Historia natural medica José Olympio de AzeveMo Chimica medica. 8.a SECÇÃO Deocleciauo Ramos . Obstetrícia. Climerio Cardoso de Oliveira.... Clinica obstétrica e gynecologia. 9-a SECÇÃO Frederico de Castro Rebello .... Clinica pediátrica. 10. SECÇÃO Francisco dos Santos Pereira .... Clinica ophtainiologica. 11. SECÇÃO Alexandre E. de Castro Cerqueira . . Clinica dermatológica e syphiligraphica 12' SECÇÃO J. Tillemont Fontes Clinica psychiatrica e de moléstias nervosas João Evangelista de Castro Cerqueira \ p disnfmibili(Hdp Sebastião Cardoso j tln disponibilidade Lentes Substitutos OS DOUTORES José Affonso de Carvalho (interino) ... 1- secção Gkmçalo Moniz Sodré de Aragão .... 2- „ Pedro Luiz Celestino 3- „ Alfredo de Andrade (interino) 4- „ Antonio Baptista dos Anjos (interino) ... 5- „ João Américo Garcez Fróes 6- ,. Pedrp da Luz Garrascosa 7- „ J. Adeod.ato de Souza 8- ., Alfredo Ferreira de Magalhães 9- „ Clodoaldo .de Andrade 10 „ Albino A. S. Leitão (interino) ..... 11 Luiz Pinto de Carvalho 12 Secretario—DR. MENANDRO DOS REIS MEIRELLES Sub-secretarjo— DR. MATHEUS VAZ DE OLIVEIRA A Faculdade não Approva nem reprova as opiniões exaradas nas theses pelos sens auctorçs. INrRODUCÇSO Antes de entrarmos no estudo propriamente dito do ponto escolhido para dissertação do nossa humilde trabalho, seja-nos permittido dar umaidéa vaga, com o titulo de introducção, sobre esta affec- ção conhecida pelo nome de neurasthenia ou antes* mal de Beard, nome que devemos adoptar em home- nagem ao medico americano Beard, que fez desappa- recer do vasto quadro das entidades mórbidas: a, irritação spmhal de Frank, nevralgia geral de Vailleix, nevropathia cerebro—cardíaca de Krishaber, o estado nervoso de Sandras e a nevralgia proteiforme de Cerise; substituindo-as pela denominação mais apropriada de neurasthenia. De facto, a neurasthenia ou mal de Beard nã® é uma affecção nova; ella sempre existiu, embora, com varias denominações. Entidade mórbida, que pode simular muitas outras affecções, chegando mesmo a ser denominada irmã da hysteria, tal é, emfim, o modo pelo qual* * II ■estas duas nevróses simulam muitas outras mo- léstias. Não é raro encontrarmos as duas nevróses associadas e então o diagnostico destas affecções loma-se difficillimo; é o caso da hystero-neurasthe- nia que encontramos, geralmente, depois das gran- des catastrophes. Vastíssimas e variaveis são inegavelmente as causas que têm sido invocadas como provocadoras deste estado morbido: os excessos que caracterisam a vida deste ser pouco interessante e mais que ridículo que se chama o folgazão, são uma das causas predominantes da neurasthenia. Ao lado dos excessos estão estes outros facto- ces etiologicos: o jogo, a ociosidade o vicio, emfim. O jogador que procura adquirir fortuna, nas cartas e nos dados, pela concentração de todas as suas faculdades, pelas emoções, sobreexcitações porque passa, termina muitas vezes pelo nervosismo. III O tedio é o resultado inevitável da ociosidade e tem influencia moral importantíssima. Pessoas ricas, excêntricas, que vivem desoccupa- das, cheias de fatuidades em suas palavras e em; seus actos, tendo constantemente conversações fuieís. umas com as outras, attestam a falta de cultura de seus cerebros, praticam actos bizarros, o que cons- titue muitas vezes um estado mental devido á ociosidade acompanhada do vicio. Porem as pessoas que procuram viver metho- dicamente, tendo certa cultura intellectual, poderã© supportar os choques moraes e mesmo physicosa sem comtudo ficarem neurasthenicas, principalmente se estes indivíduos tem muita energia moral, então, a resistência á esta affecção é muito maior, ac9 passo que uma pessoa enfraquecida pelos excessos offerece resistência menor. Os filhos de paes doentes são geralmente ea~ fraquscidos e offerecem pouca resistência ao mal d'e IV .Beard, e a outras moléstias; é, podemos dizer, o iriste previlegio destes casamentos em que nâo se tem em mira as condições dos cônjuges. Infelizmente estes innocentes seres constituem o grande grupo dos degenerados, que serão mais tarde a genesis de todos os males, sem força mo- ral, sem saúde; não podem resistir á lucta insana pela vida e serão forçosamente vencidos. O surmenage intellectual é uma causa muito po- derosa, porem um homem são, que tem vivido me- thodicamente, pode executar um trabalho mental pro- digioso, sem comtudo tornar-se um doente, salvo se elle trabalha como insensato; nestes casos poderá sentir du- rante certo tempo, fadiga, impressionabilidade ou ir- ritabilidade, sem ser por isto um neurasthenico; nes- tes casos bastam somente alguns dias de repouso para cural-o; ao contrario, o surmenage torna-se muito mais perigoso se é acompanhado de excessos. O trabalho intellectual em excesso e mal diri- V gido termina pelo enfraquecimento das faculdades inteilectuaes; porem o cerebro precisa de trabalho como os musculos, para a sua conservação e seu desenvolvimento e se não trabalha termina enfra- quecendo-se. Ao lado destes grandes factores etiologicos estão a literatura sentimental, a musica, os saraus theatro e os banquetes, onde o indivíduo é o rece- ptaculo de sobreexcitações de todas as especies: luz, perfumes, ruido, musica, e os taes vinhos finos terminam, quando estes são demasiadamente repe- tidos, por fatigar o indivíduo, dando-lhe certo esta- do de nervosidade. Tudo isto emfim, ha forçosamente de concor- rer para a modificação do caracter, enfraquecimento geral do indivíduo, dando-lhe certa predisposição para o estado neurasthenico propriamente dito. Então surge a neurasthenia com o seu vasto cortejo symptomatiço: fadiga, obsessões, abulia, im- VI pulsões, duvidas, manias, phobias, impressionabili- dade e irritabilidade, perturbações da memória, fun- ccionaes e sensoriaes, etc. Quanto a nós, o estudo scientifico, longe de excluir a crença das realidades do mundo moral, nos dá a crença neste universo bem ordenado, cheio de harmonia, de belleza e poesia de uma Providencia infinita. E somente assim, tendo esta crença enraígada em nossos espíritos, podemos supportar estoica- mente as numerosas injustiças e tristezas, que acompanham muitas vezes esta ingrata existência. ESTADO MENTAL N EURASTHENICO A -frente de todas as manifestações da vida es- tá o systenia nervoso; preside a todas as funcções do organismo, tanto as funcções da intelligencia, do movimento e da sensibilidade, como as funcções da nutrição. De facto existe uuu dependencia absoluta de todas as visceras, uma repercussão de suas perturba- ções funccionaes sobre o cerebro, e reciprocamente. E’ a influencia reciproca do physiço sobre o moral. E’ deste principio que nasceram as deferentes theqrias para expiiear-se a origem da neurasthenia. Alguns pensam que a psycologia do neurasthenico seja a cha. ve dos outros symptomas e que esta moléstia não é inais do que a creação de uni espirito doente; ou- tros, dizem que é urna psyco-nevrose subjectiva. {Fi- nalmente os partidários da theoria acima procuram na dyspepsia gastro-intestinal, o symptoma inicial, a genese de todos phenomenos nervosos e mentaes do maí de Beard. 4 D ovemos adoptar uma ou outra destas doutri- nas, ou então preferir uma terceira, em virtude de instituir a experiencia um tratamento verdadeiramen- te racional. As perturbações digestivas dos nevropathas pre- occupam bastante, não só o doente, mas também o proprio medico; sua precocidade, sua importância sua constância, sua tenacidade são taes, que mestres como Broussais, Breau e Bouchard, deram a dyspe- psia como mãe da nevrose. Os neurologistas teem uma tendencia em fazer depender, de modificações primeiro, do systema nervoso central todo conjuncto symptomatico, comprehendendo as perturbações dvs. pepticas. Gilbert Ba’let considera a myosthenia como uma perturbação puranente psychica. Tomando-se a questão sob este ponto de vista o mesmo podemos dizer da atonia gastro-intestinal, da asthenia genital, da placa cervical e da placa sacro. E’ certo que encontramos frequentemente na origem da nevrose, um surmenage de ordem intel- lectual; ou sentimental que a depressão psychica es- tá frequentemente em primeiro plano, como pheno- meno apparece, se aggrava ou melhora sem que seja sempre facil discernir exacta nente a razão suíficiente de uma tal instabilidade. De facto muito boas razões parecem militar em favor desta idéa: que se os neu~ rasthenicos não são doentes imaginários é de neces- 5 sidade dizer que elles sfio atacados de uma molés- tia de espirito e notadamente de uma paresia da vontade que goza de importante papel na genese dos menores accidentes. Gilles de la Tourette como Gilbert Ballet, pen- sa que apezar destes doentes não serem hypnotisa- veis, no sentido proprio da palavra, são entretanto susceptiveis do tratamento psyco-therapico. E’ evi- dente, com effeito, que, se a moléstia de Beard não é sinão uma creação puramente subjectiva do espi- rito, se torna inútil e verdadeiramente pueril passar longos dias a tonificar, electrisar, a fazer maçagein e a submetter as severidades da dieta, a um indiví- duo que, pela simples suggestão, podesse ficar res- tabelecido. Os meios que procuramos para combater este vasto conjuncto de depressão physica e intellectuai que nos mostra o neurasthenico, não são os mesmos para esta outra nevrose a hysteria. Graças aos magníficos trabathos de Pitres, Lepine, Gilles de la Tourette, Babinski e Pi- erre Janet sobre a hysteria, sabemos que é sempre uma idéa fixa, um estreitamento do campo da cons- ciência, uma concentração sob uma unica imagem de toda attenção que dá nascimento a tal paralysia a tal anesthesia a tal contractura. E tudo isto só desapparece, quando uma outra imagem mental a substitue, e é debaixo da influen- 6 cia da palavra do medico que podemos obter este resultado. Gilles de la Tourette e Gilbert Ballet collocam em primeiro lugar a cura psyco-therapica e dão a entender que ella não preenche toda a indicação. Para elles o estado mental goza papel predominan- te e governa todos os outros symptomas, porém não explicam como o espirito é vencido, nem tão pouco diz cousa alguma desta systematisação cerebral, que se reproduz fielmente entre os neurusthenicos com seu invariável cortejo de estigmas physicos e mentaes. Todo tratamento effectivo da hysteria se resu- me na suggestão mental. Nos neurasthenicos, a sensação da fadiga, o es- tado melancólico, alem de ser reaes, soffrem inais de um momento para outro, sob a influencia da fome, do repouso, do somno e das mudanças athmosphe- ricas. Para M. de Fleury a neurasthenia não é mais do que uma moléstia do systema nervoso com per- turbações secundarias da digestão e da nutrição. A- presenta fortes argumentos sustentando sua theoria e conclue affirmando: i. que os phenomenos nervo- sos da moléstia de Beard são primitivos, e que a dyspepsia os entretem ou os agrava, porém, não os cria: 2. que entretanto o estado mental do neu- rasthenico não é, como é no hysterico, creador de symptomas. Os symptomas da neurasthenia não Sãõ produzidos pela idéa fixa. 7 No nosso humilde modo de pensar achamos que M. de Fleury tem razão sufficiente para assim pensar. Os neurasthenicos são, geralmente, tristes, pessimis- tas, misanthropos, hesitantes, incapazes de qualquer esforço intellectual, timidos, sempre preoccupados com a sua moléstia, ora julgando que soffrem molés- tia do coração, estomago, pulmão, ora do cerebro, porque suas palpitações, suas más digestões, seu emmagrecimento e as perturbações mentaes de que elles teem consciência, muito os impressionam. Porem debaixo deste fundo monotono dé miséria psycologica se destacam episodios agudos de crises de cólera, de lagrimas, de tristeza e de agonia! Dizem geralmente que neurasthenia significa fraqueza irritável, e nada mais verdadeiro do què esta velha definição. A cólera neurasthenica é o typo desse genero de phenomenos: effeito de uma ascehçâo brusca, embo- ra seguida de uma depressão mais notada. A me- nor cousa os incommoda, cs irrita, chegando sua cóle- ra ao paroxysmo; geralmente evitam as discussões e tornam-se ante socialistas. No neurasthenico, a exaltação momentânea do cerebro é acompanhada de uma serie de modifica- ções soraaticas e interessantes'. Mostram-se impacientes e procuram os meno- res pretextos para encolérisar-se. 8 O que ha particularmente interessante neste es- tado de exaltação é que a emoção precede á idéa, o estado affectivo excede o estado intellectual. São expressões psycologas com as quaes os médicos começam a familiarizar-se. Elias significam sim- plesmente que, exaltados momentaneamente por uma excitação exterior poderosa, estes doentes se acham não exasperados por um motivo legitimo de iniigia- ção, porem tidos e paroxysticos; procuram todos oí pretextos, justificando por uma razão mais ou me- nos plausivel este estado de indignação. E’ um dos caracteristicos essenciaes do estado mental neurrs— th mio ao inverso do que se passa com a hysteria a idéa, longe de ser geradora da emoção, apparece por ultimo e por simples lógica, e nossa consciência tem necessidade de explicar racionalmente o estado de paroxysino. Cousa notável—a cólera neurasthenica, filha de um cerebro debil e por consequência irritável, é um impeto todo physico de energia. Muitas vezes, indifferentes aos motivos mais Legítimos de indignação, estes entes morbidos se tornam momentaneamente perversos, por ter bebido algumas gottas de álcool, por ter a cabeça nua e expos- ta aos raios do sol por algum momento, ou por qualquer outro facto; é habitual ver as mulheres ata- cadas desta nevrose tornarem-se irritáveis e intolerá- veis mesmo, no momento de suas regras, e profunda- 9 mente tristes depois de passado este periodo menstrual. Si a cólera representa a excitação motora, as la rimas representam uma outra forma de ser da ex- citação mental. Sabemos que os neurasthenicos são inclinados a crises de lagrimas debaixo do império da nevrose; vemos muitas vezes homens apresentando apparente- mente firmeza de espirito, chorar como se fossem verdadeiras creanças ou mulheres, sem o menor pre texto justificável. Donde concluimos ordinariamente que o facto de chorar é signal de fraqueza de espirito. As lagrimas como toda hyper-secreção são acom- panhadas invariavelmente de uma hypertensão cen- tral com vaso-dilatação peripherica; de modo que quasi todos os phenomenos somáticos da cólera se acham ahi, embora attenuados. Consideramos as lagri- mas como uma variedade da excitação cerebral; é a exaltação temperada pela consciência de sua impo- tência, que faz a enervação em vez de desfazer-se em contracções musculares, em gritos, em gestos, se nos apresenta debaixo da forma de uma secreção glandular. r* os deprimidos do systema nervoso, assim co- mo nos degenerados, a dor, a phobia não appare- cem como um symptoma exclusivamente psychico. A falsa angina pectoris\ a agoraphobia, claus- 10 trophobia, a anthropophobia e todas as phobias do mundo são da mesma natureza das verdadeiras. E’ um phenomeno essencialmcnte vascular, é um espasmo arterial. E’ devido, ou á anemia momentânea das coro- nárias ou á influencia de uma excitação ner- vosa de origem central: a arvore arterial se ontrahe, entretanto o coração augmenta a intensi- dade de sua impulsão, e deste modo a columna san- guínea, que lucta entre a resistência peripherica e a centra], enche a aorta thoraxica, a qual, despro- vida de tecido muscular e rica somente em fibras elasticas, distende dolorosamente o que se compre- hende facilmente attendendo aos plexos nervosos que a encerra de todos os lados. Deste modo, não somente podemos explicar, sa tisfazendo plenamente ao nosso espirito, de wrna par- te, o esfriamento das extremidades que acompanha invariavelmente o cingor neurasthenico, e, da outra parte, a exaltação mental, esta crença de morrer que têm os nevropathas sujeitos a estes symptomas. Vemos muitas vezes na pratica, estas falsas an- gina pcctoris cederem definitivamente a uma bóa hy- giene alimentar. O angor nevropathico não é siijão, secundariamente, um phenomeno psychico. Segundo a opinião de Lange Rebot, Georges Dumas e muitos outros p.syco-physiologistas moder- nos, a tristeza não é mais do que um symptoma de 11 empobrecimento da circulação e do retardameno da nutrição. Maurice de Fleury diz: a noticia da morte de uma pessoa de nosso conhecimento occasiona á nos- sos centros nervosos um violento e súbito surme— nage, produzindo perturbação grave da circulação sanguinea e uma diminuição geral da vitalidade; nosso espirito tem consciência, consciência vaga, confusa, e a que chamamos tristeza. Este mesmo auctor considera muitos casos de lypemania como um estado grave do mal de Beard. De facto, a tristeza é um dos grandes sympto- mas que caracterizam a neurasthenia. Temos'observado doentes, que estando pro- fundamente tristes, inaptos para o trabalho, 'pessi- mistas pela manhã, se tornam mais optimistas e dispostos com a continuação do dia. Em alguns a melancolia depressiva attenúa, ou mesmo desapparece, como por encanto, sob a benefica influencia de um raio de sol. Mas, é porque certos agentes exteriores como a luz, o calor, tensão electrica da athmosphera e a altitude têm acção estimulante sobre o systema nervoso e é por isso que o estado mental neuras- thenico melhora' espontaneamente. Outros, porém, neste estado de melancolia, de- sanimados, se sentem impotentes para resistir a esta J. R. 2 12 lucta incessante pela existência e põem termo á sua preciosa existência tragicamente! Este estado de melancolia, de abatimento e pes- simismo, que caracterisa o estado mental dos neu— rasthenicos, não é mais do que o reflexo mental do estado physico antecedente e por isso não podemos considerar a neurasthenia ou mal de Beard como uma moléstia primitivamente psychica, quasi imaginaria. Dr. Cheron em seu notável estudo sobre a Neurasthenia utero-gastrica affirma que existe uma anatomia pathologica da neurasthenia. A idèa é um pouco confusa, porem o proprio Cheron a substituio por uma mais luminosa e mais exacta. Para elle o surmenage inicial é no cerebro. Sob a influencia de um excesso sensitivo ou motor ou ainda de uma intoxicação, as cellulas cin- zentas dos centros nervosos perdem sua vitalidade, sua influencia motora,, secretoria ou trophica; ha di- minuição de energia funccional em todos os orgãos da economia, quer se trate de fibras musculares ou de glandulas. O estomago distende-se e nos casos graves di- lata-se, ao mesmo tempo que sua secreção diminue, i. to é, ha hyposthenia. O intestinj mal sustentado j •(.)! uma parede abdominal fraca, relaxa, deixando encim r-se de gazes. O figado, l geiram nte hypertrophiado pelo arg- luc: to de trabalho forneci io pela sahida das toxinas 13 intestinaes, sahe de sua loja, vindo pesar sobre o rim direito que resvala para baixo e íluctua. Pela fadiga profunda resultante do enfraquecimento de seu tonus os musculos de fibras estriadas tem também sua for- ma de ptose; o do apparelho circulatório consiste no enfraquecimento contractil do myocardo e na disten- ção total da arvore arterial com hypoglobia apparen te e hypostensão; na mulher,os ligamentos suspensores do utero perdem também sua elasticidade e sua toni- cidade, o colo desce até ao contacto da parede pos- terior da vagina; cystocele, retocele são ptoses da mes- ma forma e podemos collocar na mesma categoria as varizes, a varicocele, moléstia produzida pela ruptu- ra de fibras elasticas e atonia das fibras musculares. Na maior parte dos homens neurasthenicos, o cremaster está no estado de flaccidez quasi constante. Esta atonia local ligada á atonia das paredes gás- tricas, a hypo-secreção orchitica produzem a hypope- sia. Finalmente podemos dizer que o estado mental neurasthenico não é outra cousa sinão a consciência obscura e perturbada desta baixa de funccionamento, desta diminuição vital de que cada musculo, cada gian- dula se resente. EJ na camada cinzenta do cerebro que terminam finalmente as fibras nervosas centripedas, vindas de todas as partes do corpo: estes neuronas sensitivos têm por missão principal levar perpetuamente ao cere- 14 bro, com as sensações musculares, tendinosas, apo~ nevroticas o gráo da intensidade vital do orgão. Assim é que, sinão temos consciência muito nítida pelo menos sub-consciencia perpetua da fa- diga ou da actividade de nosso corpo, da falta ou não de actividade de todos os apparelhos de nossa eco- nomia. Quando em um organismo ha diminuição, duran- te um certo tempo, no estado de vitalidade, tendo suas fibras musculares enfraquecidas, seu tecido elástico distendido, seus orgãos splanchnicos em pto- se, suas glandulas empobrecidas, seu coração fraco, suas artérias relaxadas, quando o corpo apparece pezado em virtude da ruptura da relação normal entre o peso bruto do corpo e a energia do syste- ma nervoso, que o mantém em pé, apparece como uma necessidade deste conjuncto symptomatico a modificação do caíacter e do espirito. Mantido por esta miséria physiologica um ce- rebro predisposto pelo nervosismo, não pode conser- var alegria natural nem tão pouco ter prazer em viver. O que será de um homem que vê sua facul- dade de querer desprovida de impulsão, e cuja personalidade soffre evidente diminuição? sinão um triste, sem animo de luctar pela existência?! Porem para fazermos uma idéa clara do estado 15 mental neurasthenico, não é mister suppor que o doente tem consciência de sua miséria intellectual. Os lypemaníacos, que são muito tristes, tèm consciência de sua fraqueza de espirito. Alguns auctores tèm observado que muitos epilépticos, depois de passados suas crises comiciaes, esta exaltação nervosa, tornam-se tristes; o que vem provar sendo exacto, que elles tèm consciência de seu estado. Todos auctores affirmam: que estes estados effectivos, manifestamente secundários, soffrem as os- cillações mais amplas, sob a influencia da mu- dança athmospherica, de um raio de sol, da mudan- ça de altitude, da approximação das regras etc: isto não é mais do que a excitação funccional do orga- nismo. O mecanismo do estado mental neurasthenico pode ser resumido do modo seguinte: primitiva- mente surmenage por excesso de trabalho, pdr ex- cesso de sensação ou por qualquer intoxicação; a substancia cinzenta fica collocada em um estado in- termediário, entre a actividade e o repouso, em se- mi-funccionainento, em hypo-vitalidade. Os conhecimentos actuaes sobre a estructura dos neuronas centraes nos permittem representar anatonicamente esta attitude semi-retrahida semi- despertada, dos prolongamentos da cellula nervosa. Resulta como consequência inevitável, que a 16 tonicidade de cada orgío, a actividade de suas secre- ções e a nutrição finalmente tomam parte da vitalidade; os nervos de sensibilidade dão conhecimento ao cerebro desta miséria funccional, desta falta de vida. Sendo a tristeza neurasthenica um phenomeno de cenesthesia, todo ser vivo que estivesse em es- tado de miséria physiologica deveria ser um neuras- thenico. Para ser neurasthenico no sentido proprio da palavra, é preciso, segundo a abalisada opinião de Maurice de Fleury, alem do surmenage, um certo gráo de herança nervosa, uma tara ligeira de dege- nerescencia. Os que sem herança são victimas de impor- tante fadiga não merecem outro nome senão o de deprimidos do systema nervoso: alem disso os sym- ptomas que elles offerecem á nossa observação não differem senão pela sua intensidade dos estigmas mentaes do syndroma de Beard. Todo ser humano extremamente enfraquecido por uma moléstia, estando em convalescença, tem tendên- cia á melancolia neurasthenica todas as vezes que a convalescença se prolongue, não havendo para o doen- te augmento de força nem de appetite. Assim é que alguns auctores têm observado na convalescença da influenza e de outras moléstias gra- ves os seus doentes não poderem escrever um sim- ples bilhete, tal a desharmonia que existe no seu es- tado mental. 17 Nas moléstias chronicasem que não podemos con- tar com o restabelecimento prompto de nossos doen- tes, a melancolia é de regra, principalmente nos tuber- culosos e cancerosos. O estado mental de um neurasthenico pode con- fundir-se com o estado mental de um tuberculoso, e a prova é que muitas vezes, os melhores clínicos, to- mam um bacillar por um simples nervoso, até o dia em que pelo exame bactereologico dos escarros e pelos signaes de auscultação a verdade apparece firmando o diagnostico. Tal é finalmente a genese da tristesa habitual dos nevropathas. Os outros estigmas mentaes da neu- rastbenia se explicam. Se o cerebro, se torna timido, inclinado somente á pensar em moléstias graves, é que elle tem consciên- cia da pouca resistência eífectiva que a pessoa de que elíe faz parte pode oppor aos microbios invasores e aos adversários na lucta constante pela existência. Ha uma regra de psycologia que diz: todo or- ganismo que vive pouco, não pensa sinão na morte, ao passo que um organismo cheio de vida não pode admittir a idéa de não-ser. Se o estado mental neurasthenico não é sinão a consequência necessária da fadiga organisada, basta um tratamentp tonico para reduzir a nada os estigmas psychiccs; ora, todos os clínicos de neurasthenicos têm observado que seus doentes permanecem pessimistas. 18 e entristecidos, ainda raesino que sua tensão arterial se eleve, que seu estomago funccione melhor, que seus musculos tenham adquirido sua tonicidade. Algumas vezes, o espado mental oppõe ao trata- mento ordinário uma resistência particularmente longa, parecendo differenciar do estado somático. E’ que, em certos casos antigos o estado psy- chico, depois de ter sido durante muito tempo o reflexo do estado dos orgãos, termina tomando uma existência pessoal, constituindo uma especie de in- dependência. Paulhan em uma serie de estudos aos quaes elle deu o nome de synthese mental, descreve com precisão as leis que regem a formação psycologica. O que para alguns era motivo de alegria, prazer emfim, para outros era objecto de tristeza e la- mentações. Maurice de Fleury observou em homens de sua clinica, sendo um—hysterico, e outro—neurasthe- nico, o facto seguinte: o hysterico, que era artista de grande talento e de muito merecimento, sentia profundo desgosto, porque via de ha muitos annos que as suas produções eram desconhecidas por parte da critica e do publico; sua nevrose tinha evidente- mente esta idéa, porem um dia viu que seus tra- balhos tinham obtido alta recompensa pelo jury e alguns de seus trabalhos foram vendidos por bom preço. 19 Isto somente bastou para cural-o, podemos di- zer eompletamente, de todos os symptomas aprecia- veis de sua nevrose. O neurasthenico era um magistrado de gran- de mérito, victima de duplo surmenage intellectual e sentimental. Um dia foi agraciado com o titulo de cava- lheiro da Legião de Honra pelo governo francez, em recompensa a seus bons serviços. Esta alta distincção que devia animal-o, pro- duzio-lhe profundo desgosto com abatimento geral e não cessava de fallar aos mais intimos do não merecimento da sua miserável pessoa. Em suinma, a hysteria é uma moléstia corporal produzida pela idéa, ao passo que a neurasthenía é uma moléstia de espirito nascida do funcciona- mento empobrecido do nosso organismo physico. Uma nos mostra o estreitamento da superfí- cie do campo de nossa consciência; a outra passa em oscillações verticaes ao longo da escala de nos- sas energias. Os neurasthenicos estão sujeitos ás suggestões, porem não são hypnotisaveis; ao passo que os hystericos são. A hysteria filha da idéa deve ser curada pela idéa; a neurasthenia filha da fadiga deve ser cura- da pela medicação tónica methodicamente appiicada» J- R- 3 TBATAMENTO As medidas de hygiene prophylatica são natu- ralmente tiradas do estudo das causas provocadoras d© surmenage. Impedir o surmenage moral, origem de múltiplo® casos de esgotamento nervoso, seria o ideal; infeliz- mente o surmenage é de alguma forma condição ne- cessária da vida de nossa epocha. A idade adulta que é a da lucta pela vida, está. fatalmente exposta ás múltiplas e diversas influen- cias productofas do surmenage: os dessocegos, as. paixões, as moléstias, emfim, são tantas as causas que a hygiene prophylaptica se torna impotente para supprimil-as. As regras prohibitivas que podíamos formular contra ellas não teriam valor pratico, porque estes elementos etiologicos fazem parte integrante da pró- pria vida. 22 Assim sendo, o meio mais util, seria preparar «3S homens pela educação para supportarem victo- iiosamente os choques. A influencia moral que pode exercer o medico eo tratamento das nevroses é inegavelmente um elemento capital no tratamento destes doentes. Por meio da suggestão podemos modificar o ertado mental dos pacientes, despertar sua energia, obter o desapparecimento das preoccupações, obses- sões, crises de anciedades, melhorando profunda- mente seu estado physico. Para obter bons resultados com este trata- mento psychico, é de necessidade que o medico procure ganhar a confiança absoluta de seus doentes. Porém, não acreditamos na cura absoluta do estado mental neurasthenico, unica e exclusivamente pela suggestão; ella apenas serve como elemeçito auxiliador; servindo também como elemento de diag- nostico differencial do estado mental hysterico. As funcções digestivas dos neurasthenicos são regulares para uns e irregulares para outros. Alguns tem bom appetite, sua digestão esto- macal se faz sem encommodo. Iefelizmente estes doentes são raros e nestes casos devemos deixal-os seguindo o regimen ali- mentar acostumado, supprimindo as bebidas fer- mentadas e os excitantes. Cs outros, que são muito numerosos, apresen- 23 Iam as perturbações próprias da forma ligeira de atonia gastro-intestinal. Estes symptomas persistem durante o trabalho da digestão. Finalmente a analyse chimica do sueco gástrico mostra que a secreção soffre pequena mo- dificação qualitativa, existindo um pequeno gráo de hypochlorhydria, Nestes casos, certos auctores aconselham um regimen especial e que o tratamen o geral dirigi- do contra a neurastheni? é sufficiente para produzir a cessação das perturbações dyspepticas. Ha effectivamete formas ligeiras de neurasthe- nia, que melhoram rapidamente sob a influencia de am tratamento precoce e bem dirigido. Vemos muitas vezes o syndroma dyspeptico desapparecer cora todas as outras perturbações fun- ccionaes. Porém, nem sempre as cousas se passam assim. Muitas vezes o estado neurasthenico persiste; as perturbações dyspepticas? ligeiras no começo, se accentuam de mais a mais e a neurasthenia termi- na passando do primeiro gráo á forma severa de atonia gastro-intestinal; os phenomenos de extasè gastrica apparecem e a nutrição do indivíduo se acha muitas vezes seriamente compromettida. Ha neurasthenicos que ficam francamente im- pressionados, devido exclusivamente á tenacidade de suas perturbações dyspepticas. Elles se julgam 24 atacados de grave lesão do esto mago, de cancro por exemplo, sempre preoccupados com seu estado gástrico, ficam tristes e desanimados e seu estada neurasthenico augmenta de mais a mais. Nestes casos devemos impor uma dieta alimen- tar apropriada ao estado e não prescrever, coma fazem muitos, vinhos eupépticos, etc. A alimentação deve ser regrada para preve- nir o desenvolvimento das perturbações digestivas dando ao doente materiaes de reparação sufficientes para auxiliar a restauração da força nervosa. A quantidade de alimentos deve ser mantida na taxa normal e augmentar conforme a necessida- de do doente. Sabemos que muitos neurasthenicos com o es- tômago ainda em condições de digerir se habituam a comer pouco. Nestes casos convém augmentar, não brusca- mente, porém, lenta e progressivamente, a dose quotidiana dos alimentos. O regimen deve ser mixto, porque os regime as exclusivos, são todos nocivos, excepto para alguns casos especiaes. Devemos aconselhar aos doentes atacados de dyspepsia atonica, simples alimentos de digestão facil, contendo em menor volume maior quantidade de substancias nutritivas. 25 As perturbações que acompanharem a digestão serão assim attenuadas. Durante as refeições as bebidas deverão ser moderadas para não tornar a digestão estomacal mais difficil, em virtude da deluição do sueco gás- trico pela grande quantidade de liquido ingerido. Finalmente devemos aconselhar uma bôa masti- gação; condemnar as bebidas alcoólicas e os excitantes em geral; regrar a alimentação, não somente sob o ponto de vista da quantidade e da escolha dos alimen- tos, como também das horas das refeições. Sendo a hydrotherapia um dos melhores agen- tes physicos de que dispõe a therapeutica, pode pres- tar relevantes serviços no tratamento do estado men- tal neurasthenico. A acção estimulante e tónica, que as applicações frias exercem sobre os centros nervosos e por inter- médio destes centros sobre todo o organismo, collo- cou a hydrotherapia no quadro dos agentes poderosos no tratamento da neurasihenia. Entretanto, nem todos os processos de hydro- therapia devem ser applicados indiíferentemente no tratamento da neurasthenia. Em geral os neurasthenicos supportam mal as excitações violentas e as baixas de temperatura muito pronunciadas. O trio rigoroso e o calor excessivo os im- 26 pressionam desagradavelmente e sr*o egualmente des- favoráveis. Muitos neurasthenicos sentem melhoras durante as estações intermediárias, agravando seus sympfco— mas durante o inverno e o estio. EJ necessário aconselharmos aos neurasthenicos o abandono de seus domicilios durante alguns me- zes consecutivos, mandando-os para estações tempe radas em virtude de serem as que melhor lhes con- vém, aconselhando os climas das montanhas de accordo com as estações, devido á pressão athmos- pherica ser relativamente baixa, a temperatura me- nos elevada, produzindo effeitos physiologicos parti- culares: modificações da respiração, do iythmo cardíaco, da temperatura central, melhorando sensi- velmente o estado psychico destes indivíduos. O exercício muscular, sendo convenientemente ad optado, activa a circulacão sanguínea, modifica a respiração; excita, embora indirectamente, o funecio- namento de todos os orgãos, eleva a nutrição geral dos tecidos, emfim provoca a contração dos múscu- los das paredes abdominaes, produz uma especie de maçagem dos orgãos situados nesta cavidade, podendo facilitar a circulação das matérias que elles contem. Alem destes effeitos locaes ou geraes, os exer- cícios do corpo produzem sobre os centros nervosos uma serie de excitações, cujo valor hygienico e tbe- 27 rapeutico não pode ser contestado e devem ser por conseguinte utilizados no tratamento dos neurasthe- nicos. Porem não devemos prescrever o exercício mus- cular de uma maneira vaga, deixando ao doente a escolha do genero e a dose de exercício que lhe convem. Muitas vezes vemos agravar o estado do pa- ciente devido exclusivamente ao trabalho muscular excessivo e mal dirigido. A escolha do exercício e o modo pelo qual deve ser feito é um elemento importante no tratamento da neurasthenia, exigindo todo cuidado do medico. Deve variar naturalmente de accordo com o estado geral do doente e com o gráo e a forma de sua affecção. Mesmo nos indivíduos emmagrecidos devido as perturbações gastro-intestinaes não devemos dei— xal-os em enercia muscular nem tão pouco obrf- gal-os a um trabalho exaggerado e sim a um traba- lho lento e methodicamente applicado. E’ de grande utilidade, em muitos casos graves de neurasthenia, afastarmos os doentes do meio crea- dor de sua moléstia, durante algumas semanas, man- dando os para um estabelecimento de hydro-therapia. Não somos partidários do isolamento para todos os casos de neurasthenia porque muitos doentes quan- do estão separados de suas famílias peoram extraor- dinariamente. J. R- 4 28 Porem devemos acceitar o isolamento para os casos de neurasthenia profunda, de melancolia depres- siva ou anciosa, ou de hysterc-neurasthenia. Os casos de neurasthenia simples podemos tratar sem a intervenção do isolamento. Em resumo não somos partidários do regimen alimentar, nem da maçagem, do exercido, da elec- triddade, das injecções salinas ou de sôro artifi- cial, do repouso systematico, do trabalho intellec- tual graduado e muitos outros meios isolados, po- rem de todo o conjuncto destes processos utilizados, conforme a predominância deste ou d’aquelle sym- ptoma, que o medico inteiligente deve lançar mão no momento opportuno para combater tal ou tal symptoma. No tratamento do estado mental neurasthenico, principalmente nos casos em que ha hypertensão, r devemos collocar em primeiro lugar o regimen alimentar. Supprimir ao neurasthenico o álcool, todas as bebidas fermentadas, todos os alimentos de diges- tão difficíl, impedir no momento das refeições a diluição do sueco gástrico, fazendo beber abundan- temente nas horas em que o estomago está vasio para lavar o rim e o figado, é, podemos dizer, res- tituir a clareza de suas ideas, a lucidez de suas expressões. Aquelles que procuram no estomago a origem 29 da neurasthenia tirara destes resultados constantes e verdadeiros, vantagens para sua doutrina e affir- mam que o tratamento do syndroma de Beard está no regimen alimentar. Indubitavelmente o regimen alimentar melhora o estado mental neurasthenico, supprime quasi sem- pre os phenomenos de excitação psychica, as cóle- ras, as lagrimas, as crises de agonia, as phobias etc. Porem não tem acção sobre a fadiga e a tris- teza verdadeira, a timidez, a inércia e a abulia, que não desapparecem sinão pelo restabelecimento pro gressivo e methodico da energia vital. EJ preciso dar lenta e progressivamente ener- gia ás cellulas nervosas e por seu intermédio a to- das as funcções de movimento, secreção e nutrição. Desde que as cellulas fiquem restabelecidas, o cerebro adquire vigor, confiança e firmeza, devido unica e exclusivamente á incitação constante destas cellulas, que dão ao cerebro a noção da força como dão a noção do empobrecimento funccional. O regimen alimentar, o repouso, depois a esti- mulação methodica da energia vital, tal é, em sum- ma, o tratamento mais racional e efficaz muitas ve- zes do estado mental neurasthenico, nos casos de menor gravidade. Nos casos mais rebeldes devemos adoptar a isolamento, o repouso e a superalimentação. Anatomia descriptiva I O nervo trigemeo ou trifacial nasce de duas Taízes: uma sensitiva e outra motora constituindo o ganglio de Gasser. II O ganglio de Gasser dá trez ramos: o supe- rior, ramo ophtalmico de Willis; o medio, nervo maxillar superior, e o ramo inferior, nervo maxillar inferior. III O ramo ophthalmico de Willis nasce na parte anterior e interna do ganglio de Gasser e dá trez ramos: ramo externo, ou nervo lacrimal; ramo medio ou nervo frontal, ramo interno ou nervo nasal. Anatomia medico-cirurgica I A cavidade craneana contem o encephalo e seus envolucros. 34 II A massa encephalica está dividida em trez partes: cerebro, cerebello e isthmo do encephalo. III O encephalo está separado da caixa craneana e de suas trez partes por membranas denominados meninges Histologia I A pelle é formada pela epiderme e derma. II A epiderme está separada da derma por uma membrana hyalina. m A derma é formada por duas camadas: camada papillar ou superficial e camada reticular ou profunda. Bactereologia I A grippe ou influenza, é uma moléstia infecto- 35 contagiosa, cujo agente pathogeno é o bacillo de Pfeiffer. II O bacillo de Pfeiffer é encontrado em grande abundancia nos escarros, associados a germens sa- prophitas. III E muito commum o desenvolvimento da neu- rasthenia durante a convalescença da influencia. Anatomia e physiologia pathologicas I As dilatações do estomago podem ser dividi- das em dilatações de causas organicas e dilatações de causas funccionaes. II Nas dilatações de origem organica, encontra- mos lesões do musculo gástrico, representadas ots pela destruição de grande numero de seus feixes, ou pela degenerescencia gordurosa ou colloide das fibras musculares. J. R.5 36 III Er muito commum nos neurasthenicos a dilata- ção do estorna go. Physiologia I A funcção da digestão tem por fim principal transformar os alimentos em substancias absorviveis e assimiláveis. II Os alimentos são tirados dos 3 grandes reinos da natureza: mineral, vegetal e animal. III No tratamento dos neurasthenicos tem grande Talor a escolha das substancias de reconstituição. Tfier&pisiítica I A hydro-therapia tem sido preconisada no tra- tamento de diversas moléstias do systema nervoso. 37 II A agua tem acção sobre o organismo pela sua temperatura e pelo choque, produzindo uma acção directa, acompanhada de uma reacção. III O emprego da hydro-therapia tem sido aconse- lhado no tratamento de muitos casos de neuras- thenia. Hygiene I O papel principal da hygiene é prevenir as moléstias. II A falta de educação physica e moral, obede- cendo aos modernos preceitos da hygiene, muito tem concorrido para o desenvolvimento de certas e determinadas moléstias. III Os neurasthenicos são filhos, geralmente, desta, falta de educação physica e moral. 38 Medicina legal I Ha inegavelmente no neurasthenico diminuição geral do valor intellectual e moral, caracterisado pela ausência da vontade. II Porem o neurasthenico não é um irresponsável, mesmo porque elle eomprehende bem a noção do bem e do mal. III Collocar o neurasthenico no numero dos irres- ponsáveis seria abrir a porta ao crime. Pathologia cirúrgica I Traumatismos são affecções locaes produzidas instantaneamente, por meio de agentes mecânicos, phy- sícos ou chimicos, caracterisando-se pela destruição dos elementos anatómicos. II Conforme o grão ou intensidade das lesões traumaticas ellas podem provocar perturbações para © lado do cerebro. 39 III O traumatismo tem sido invocado como factor etiologico da neurasthenia. Pathologia medica I A tuberculose é moléstia extraordinariamente contagiosa e tem como factor etiologico o bacillo de Koch, II O bacillo de Koch é encontrado nos escarros tuberculosos e tem grande virulência. UI Er muito commum confundir-se um tubercu- loso, no principio de sua affecção, com um neu- rasthenico. Operações e apparelhos I Em todas as operações cirúrgicas devemos obedecer “as leis da assepsia. 40 II A falta de assepsia nas operações cirúrgicas pode produzir a morte do operado, sendo o unico responsável o cirurgião. m Quando ha assepsia rigorosa não pode haver infecção. Historia natural medica I O jaborandi é um arbusto da familia das ruta- ceas. II E’ encontrado em grande abundancia em nosso paiz e tem i a 2 metros de altura. III Devido ás suas propriedades sudorificas tem grande emprego em medicina. Cliimica medica I A nicotina é um alcaloide que se encontra nas 41 differentes variedades de tabaco, na forma de citra- to e de malato. II A nicotina sendo veneno temivel, é um dos agentes excitantes do cerebro, da medulla spinhal e da medulla alongada. III O habito de fumar é funesto á saude e o fumo deve ser condemnado, principalmente para os neu- rasthenicos. Matéria medica, pliarmasologia e arte de formular I Na associação dos medicamentos o medico deve ter em mira as incompatibilidades. II Ha incompatibilidade entre medicamentos que fazem parte da mesma forma, quando resulta da sua união uma mistura defeituosa, seja pela formula, seja pelos effeitos physiologicos que ella poderá produzir. III As incompatibilidades podem ser: pharmaceu- iícas, physiologicas, chimicas e physicas. 42 Clinica cirúrgica (2.a cadeira) I A masturbação sem limites produz perturba- ções graves em todo o organismo. II As inflainmações da urethra, produzindo mui- tas vezes o estreitamento urethral, são em muitos casos consequência da masturbação. III ( Masturbação é uma das causas da neurasthenia. Clinica cirúrgica (l.a cadeira) I Os tumores malignos tem tendencia á invasão dos tecidos circumjacentes, devido á actividade neon formadora. II O tratamento ma's racional e efficaz dos tu- mores malignos é a sua extirpação. III Na extirpação dos tumores malignos o cirur- gião deve ter em mira a séde do tumor, procuran- 43 do extirpar todos os ganglios visinhos para evitar a reprodução. Clinica propedêutica I A dôr tem grande valor no exame prope- dêutico. II Este signal clinico pode ser reconhecido pela pressão e palpação combinadas. II A séde da dor guia o medico no exame clí- nico: Nos neurasthenicos é muito commum ace- phalargia. Clinica medica (l.a cadeira) I A intoxicação produzida pelo abuso do tabaco modifica o systema nervoso. J. R. 6 44 II Para o lado do systema circulatório, age per- íubando o rythmo cardiaco, provocando palpitações e intermittencias. III No tubo digestivo ella determina inflamações ctrronicas, anorexia, etc. Clinica medica (2.a cadeira) I A pneumonia é uma moléstia infectuosa, cujo agente responsável é o pneumococcus. II O pneumococcus é caracterisado pela sua viru- lência ephemera. III A infecção dos orgãos afastados pelo pneum o- coccus constitue as complicações da pneumonia. 45 Obstetricia I A menstruação é um corrimento sanguíneo periodico, que indica a aptidão sexual da mulher- il A apparição do primeiro corrimento varia muito, de accordo com um conjuncto de circuns- tancias, dentre os quaes convém salientar o clima. III Nas mulheres neurasthenicas a approximação da menstruação é geralmente annunciada por um periodo de cólera; desapparecendo logo apóz o pri- meiro escoamento sanguíneo. Clinica obstétrica e gynecologica I A applicação do fórceps deve ser indicada era certas e determinadas circunstancias, dependentes da parturiente e do feto. 46 n Estando o feto morto, convém prescrever o fórceps, mesmo porque sem o interesse da vida do feto não se deve traumatisar a parturiente. III Nestes cases, deve ser preferida a embryo- tomia. Clinica pedri&tica I A dent ição produz, geral mente, uma serie de perturbações mais ou menos graves. II As convulsões infantis manifestam-se ordinari- amente no periodo da dentição. III Ha geralmente uma tendencia em encarar as convulsões infantis como manifestações de degene- rescencia. 47 Clinica ophtalmologica I A ophtalmia purulenta, sendo de origem infec- tuosa, tem tendencia a generalisar-se a todo appa- relho visual. II As conjunctivas e depois a cornea, são geral- mente as primeiras partes que são invadidas. III A ophtalmia purulenta pode ser a origem de infecções outras. Clinica dermatológica e sypliiligraphica I A syphilis é uma moléstia, que desde os tem- pos remotos vem anniquilando a humanidade. II O diagnostico da syphilis é difficilimo e pode confundir com outras moléstias. 48 m O tratamento mais efficaz e racional da syphi- lis, ligado á uma bôa hygiene, é por meio de mer- cúrio ou iodureto de potássio. Clinica psychiatrica e de moléstias nervosas I O diagnostico das moléstias nervosas torna-se difficil em virtude da semelhança symptomatica qne existe entre si. n A neurasthenia pode ser confundida com um grande numero d’ellas. m A hysteria e a paralysia geral, são os que mais se confundem com a neurasthenia. Visto. Secretaria da Faculdade de Medicina da Bahia 26 de Outubro de 1906. O SECRETARIO Dr Menandro dos Reis Meirelles