FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA THESE APRESENTADA Á Faculdade de Medicina da Bali ia Em 31 de Outubro de 1906 PARA SER DEFENDIDA POR Leovigildo Gonçalves de Carvalho Filho Filho leijilimo do Bacharel Leovigildo Gonçalves de Carvalho NATURAL DO ESTADO DA BAHIA AFIM DE OBTER 0 GRÁ0_DE DOUTOR EM MEDICINA DISSERTAÇÃO DAS PARALYSIAS ALTERNAS Cadeira de Clinica Psychiatrica e de Moléstias Nervosas PROPOSIÇÕES Tres soDre cada uma das cadeiras do curso de sciencias medicas e cirúrgicas BAHIA OFFICINAS DO «DIÁRIO DA BAHIA» 101— Praça Castro Alves—101 1906 FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA DIRECTOR— Dr. Alíredo Britto VIGE-DIREGTOR —Br. Manoel José de Araújo LENTES CATHEDRATICOS '§• matérias que i.ec.CIONam Dr. .!. Carneiro de Campos 1.* Anatomia descriptiva Dr. Carlos Freitas » Anatomia medico-cirurgica* Dr. Antonio Pacifico Pereira 2.* Histologia Dr. Augusto C. Vianna » Bacteriologia Dr. Guilherme Pereira Rebello. ... » Anatomia e Physiologia patho- logicas Dr. Manoel José de Araújo 3.’ Physiologia Dr. José Eduardo F. de Carvalho Filho . » Therapeutica Dr. Josino Correia Cotias 4.* Medicina legal e Toxicologia Dr. Luiz Anselmo da Fonseca .... » Hyglene Dr. Braz Hermenegildo do Amaral. . . 5.* Palhologia cirúrgica Dr. Fort.unato Augusto da Silva Júnior . » Operações e apparelhos Dr. Antonio Pacheco Mendes » Clinica cirúrgica, 1.* cadeira Pr. Ignacio Monteiro de Almeida Gouveia. » Clinica cirúrgica, 2.* cadeira Dr. Aurélio R. Vianna 6.* Palhologia medica Dr. Alfredo Britto * Clinica Propedêutica Dr. Anisio Circundes de Carvalho ...» Clinica medica, L* cadeira Dr. Francisco Braulio Pereira .... » Clinica medica, 2.* cadeira Dr. José Rodrigues da Costa Dorea. . . 7.* Historia natural medica Dr. A. Victorio de Araújo Falcão ... » Matéria medica. Pharmacologia e Arte de formular Dr. José Olympio de Azevedo » Chimiea medica Dr. Deocleciano Ramos 8.* Obstetrícia Dr. Climerio Cardoso de Oliveira ... » Clinica obstétrica e gynecologica Dr. Frederico de Castro Rebello. ... 9.* Clinica pediátrica Dr. Francisco dos Santos Pereira . . . -IO.* Clinica ophtalmologica Dr. Alexandre E. de Castro Cerqueira . 11.* Clinica dermathologica e syphi- ligraphica Dr. J. Tillemont Fontes 12.* Clinica psvchiatrica e de molés- tias nervosas Dr. João E. de Castro Cerqueira. ... » Em disponibilidade Dr. Sebastião Cardoso » » » LENTES SUBSTITUTOS Dr. José Affonso de Carvalho (interino) 1.* secção Dr. Gonçalo Moniz Sodré Aragào 2.* » Dr. Pedro Luiz Celestino 3.* » 4.* » Dr. Antonino Baptista dos Anjos (interino) ... 5.* » Dr. João Américo Garcez Fróes 6.’ » Drs. Pedro da Luz Carrascosa e J. J. de Calasans. 7.* » Dr. José Adeodato de Souza 8.* » Dr. Alfredo Ferreira de Magalhães 9.* » Dr. Clodoaldo de Andrade 10.* » Dr. Albino Arthur da Silva Leitão (interino) . . 11.■ » Dr. Luiz Pinto de Carvalho (interino) 12.* » SECRETARIO — Dr. Menandro dos Reis Meirelles SUB- SECRETARIO — Dr. Matheus Vaz de Oliveira A Faculdade não approva nem reprova as opiniões exaradas nas theses dos seus auctores. DISSERTAGAO «L> DAS PARALISIAS ALTERNAS (Estado succiuto da etiologia, symptomatologia e diagnostico dos svn- dromas de Webcr, Millard-Gubler e Benedikl) PROLOGO «Celui qui met au jour ses pensées «pour laire briller ses talents doit «s’attendre á lá severité de ses criti- « ques; mais celui qui n’écrit que pour «satisfaire a une obligation qui lui est «imposé a sans doute de grands droits « a 1’indulgence. » * (La Bruyère.) fk fosse o doutorando, por força de lei, obri- gado a apresentar uma tliese, afim de receber o gráo de Doutor em Medicina, certamente, não arriscaríamos a tão ardua empreza. Não é o vão desejo de conquistar louvores, quando somos os primeiros a reconhecer o nosso demerito, nem de fazer alarde de habilitações que bem quizeramos possuir, mas que em verdade não temos, o que nos leva a trazer á luz da publicidade este humilde e acanhadíssimo trabalho. O estudo que se segue só tem de merecimento o cumprimento de um dever, sentimos e profun- damente, não dispormos de vastos conhecimentos afim de desempenhar-nos, ainda que perfuncto- riamente, desse transcendente assumpto; comtudo resta-nos a intima convicção de termos envidado II todos os esforços para bem satisfazer as exigências da lei. Para melhor ordem no nosso estudo, dividi- remos este trabalho em quatro capítulos: no pri- meiro, faremos algumas considerações geraes e historico das paralysias alternas; no segundo, da- remos ligeiras noções anatomo-clinicas e etiolo- gicas; no terceiro, trataremos da sua symptoma- tologia; no quarto, estudaremos o seu diagnostico. Resente-se a nossa these de uma falta que seria imperdoável se não trouxéssemos uma justificativa acceitavel. Não tem ella observações pessoaes cm vista da falta absoluta de casos clinicos desta especie na cadeira de moléstias nervosas: todavia, no correr da nossa dissertação, algumas obser- III vações tomadas por pessoas de reconhecida proficiência. Ao collocarmos o ponto final na derradeira pagina, não nos sentimos contentés, porque a escassez do tempo e os labores do sexto anno medico impediram a confecção de um trabalho mais ou menos completo. Conscios do seu exiguo valor, com timidez nós o submettemos a apreciação dos illustrados mestres, servindo-nos de animação o lembrar-nos que os « doutos são tão indulgentes e generosos, quanto são impertinentes os zoilos e os ignorantes. Aos primeiros todo o nosso reconhecimento e respeito pelas censuras com que se dignarem de honrar-nos, a estes uma simples expressão de desdem. CAPITULO I Considerações geraes e historico f i m cios mais interessantes e delicados capí- tulos da pathologia nervosa é, sem duvida, o que diz respeito ao estudo das paralysias alternas. Sob a denominação de hemiplegia ou paralysia alterna, comprehende-se um conjuncto symptoma- tico que tem por caracter commum a coexistência de uma hemiplegia de um lado com a paralysia de um ou mais nervos craneanos do outro lado, de- pendentes de uma lesão unica. Segundo esta se manifesta mais ou menos acima da região pedunculo-bulbar, o aspecto clinico apre- senta-se differente. Alguns typos foram isolados, e, segundo a valiosa opinião do professor Gharcot — insigne chefe da escola da Salpétrière, recebem o nome do auctor ou dos auctores que pela primeira vez os estudaram de uma maneira methodica e pre- cisa, embora, algumas observações do mesmo ge- nero fossem anteriormente publicadas. 4 0 valor semiologico destas paralisias é muito importante, pois, sào ellas a manifestação clinica de lesões bulbo-ponto-peduneulares. Existem paralysias alternas motrizes e paralysias alternas sensitivas. Tres são as variedades mais frequentes: as para- lysias alternas superiores dos typos YVeber e Benedikt e aparalysiaalterna inferior do typo Mil lard-Gubler; é sob esse tríplice ponto de vista que versará o objecto do nosso minguado trabalho. 0 eminente professor Raymond, estudando as paralysias alternas assim se exprime: «O typo cli- nico de paralysia alterna superior ou syndroma de Weber ou melhor ainda syndroma peduncular, cara- cterisa-se por uma hemiplegia sensitivo motriz da face e dos membros do typo central, isto é, inte- ressando somente o facial inferior, associada a uma paralysia completa ou parcial do terceiro par do lado opposto. «0 typo clássico de paralysia alterna inferior ou syndroma de Millard-Gubler ou melhor ainda syn- droma protuberancial inferior, caracterisa-se por uma hemiplegia sensitivo-motriz dos membros asso- ciada á uma paralysia que attinge de uma parte o motor ocular externo com extrabismo interno, de outra parte o facial com todos os caracteres da pa- ralysia de origem nuclear ou troncular.» Do que acabamos de ver, cumpre-nos dividir as paralysias alternas em duas classes: as que depen- dem de uma lesão que se apresenta no trajecto das vias pyramidaes e da faixa de Reil ou feixe sensi- tivo ao nivel dos pedúnculos cerebraes (estas para- lysias accommettem as vezes o feixe pyramidal não 5 ainda entrecruzado e o nervo motor ocular commum na sua sahida do nevraxo); ellas trazem o nome do sabio allemão Weber, quem primeiro apresentou um exemplo de localisação única e perfeitamente nitida. Este distincto medico, em 1863, publicou sobre a pathologia do pedunculo cerebral uma magnifica memória, na qual assignalava a coexistência da he- miplegia de um lado do corpo com a paralysia do motor ocular commum do lado opposto. Em 1891, Charcot, em uma bellisima lição propoz a denominação de syndroma de Weber á paralysia alterna superior. Em 1894, porém, d’Astros, estabeleceu que este syndroma, quatro annos antes de Weber, fôra bem estudado por Gubler e propoz então a denominação de syndroma fte Gubler Weber. Na segunda* classe, são estudadas as paralysias produzidas por uma lesão bulbo-protuberancial. 0 syndroma protuberancial por excellencia é a paralysia alterna do tvpo Millard-Gubler ou syn- droma protuberancial inferior: paralysia facial total do lado da lesão com hemiplegia cruzada. Mas isto não pode ser realisado senão por uma lesão infe- rior ao entrecruzamento das fibras do facial, isto é, por uma lesão da metade inferior da protuberância. Se a metade superior é attingida, a hemiplegia é total e cruzada. Em outros termos, quando a lesão assesta-se na parte inferior ou bulbar da protuberância, o quadro clinico se revela por uma hemiplegia dos membros de um lado e uma paralysia da face do lado opposto. A hemiplegia dos membros, é mais ou menos accen- 6 tuadae apresenta de uma maneira gerai o aspecto das hemiplegias de origem cerebral; quanto a paralysia da face que observamos do lado opposto a hemi- plegia, é toda differente e apresenta nitidamente os caracteres das paralysias nucleares ou periphericas. Esse syndroma é devido a existência de uma lesão na protuberância, á altura do rmcleo do facial, lesão que interessa as vezes o núcleo ou as fibras radi- culares que delle provêm e as do feixe pyra- midal; supponhamos que esta lesão se asseste a esquerda da protuberância, a paralysia facial será á esquerda, a hemiplegia dos membros, ao contrario, será a direita, pois que as fibras do feixe pyramidal nas quaes se manifesta a lesão do lado esquerdo da protuberância sofYrem o entrecru- zamento no bulbo, graças ao qual ellas innervam os membros do lado direito. A paralysia facial, pois, sob o ponto de vista dos seus caracteres objectivos, da sua extensão e das suas reacções electricas, comporta-se como a paralysia facial peripherica. Não é raro ver coincidir com essa paralysia do facial uma paralysia de outros nervos craneanos do mesmo lado, em particular do hypoglosso e do motor ocular externo. Aqui ainda a explicação desta hemiplegia é forne- cida pela anatomia da região, pelas relações que o feixe pyramidal, no seu trajecto bulbo-protube- rancial, affecta com os troncos dos nervos facial, hypoglosso e motor ocular externo ou abducens. Este syndroma de Miliard-Gubler, muitas vezes, complica-se de paralysia do sexto par e de perturba- ções da palavra com ou sem atrophia da metade 7 da lingoa. Ha casos, porém, em que vemos o trigemeo e o auditivo participarem do syndroma. Emfim, em alguns casos a lesão destes difierentes nervos, concomitante com uma hemiplegia dos membros do lado opposto, não coincide com uma paralysia facial: não se trata rnais do syndroma de Millard-Gubler, mas de uma hemiplegia alterna do motor ocular externo, do hypoglosso, etc. Raymond, nas suas monumentaes lições clinicas, publicou um caso deste genero (hemiplegia direita coexistindo com uma paralysia do motor ocular externo esquerdo). Este distincto professor verificou ainda um caso de paralysia alterna inferior assim constituida: hemiparesia sensitivo motriz direita, paralysia total do facial esquerdo, paralysia do motor ocular externo esquerdo e movimentos associados do recto interno, estreitamento da pupilla á esquerda, emfim uma paralysia do masseter deste mesmo lado. Finalmente, podemos as vezes observar certas modalidades clinicas, mui complexas, que são provocadas por lesões bilateraes da protuberância. Assim é que Sigerson apresenta a seguinte classi- ficação para estas paralysias alternas bilateraes: ci) À paralysia em X, constituida pela paralysia das duas metades da face, coincidindo com a dos membros dos dous lados do corpo. b) A paralysia em Y, constituida pela associação da paralysia das duas metades da face com a dos membros de um só lado. c) A paralysia em Y, invertido, cujos elementos são representados pela paralysia de uma metade da face e pela dos membros dos dous lados. 8 cl] A paralysia em V, que se reduz a paralysia das duas metades da face. 0 syndroma de Gubler-Weber caracterisa-se pela associação de uma hemiplegia motora ou sensitivo motora com a paralysia do nervo motor ocular commum do lado opposto; reconhece por causa urna affecção do pedúnculo cerebral. Este syndroma differe do de Milíard-Gubler, não só pela participação do nervo motor ocular commum que, nas lesões protuberanciaes não é attingido, mas ainda pelo facto da paralysia facial residir do mesmo lado que a dos membros e ter todos os cara- cteres da paralysia facial de origem cerebral, tal qual vemol-a commummente na hemiplegia vulgar. Para a realisàção do syndroma de Gubler-Weber, é preciso que uma lesão aífecte o núcleo ou as fibras de um dos nervos do terceiro par e as do feixe pyramidal ao nivel do pé do pedunculo cerebral. A paralysia do nervo motor ocular commum, neste syndroma, pode ser completa ou parcial; neste ultimo caso, o musculo mais ordinariamente affectado é o elevador da palpebra. Quando estamos em presença de uma paralysia incompleta do terceiro par, é muito provável que a lesão resida no andar superior do pedunculo e não occupe por consequência todos os núcleos do motor ocular commum; quando a paralysia é completa, notamos que a lesão assesta-se no pé do pedunculo e attinge o terceiro par no ponto em que as fibras provenientes dos differentes núcleos tendem a se reunir para formarem o tronco do motor ocular commum. Brissaud fez notar que as hemiplegias cruzadas 9 do syndroma de Gubler-Weber, nos casos de lesões em foco localisadas na parte interna do pednnculo, têm por caracter particular serem mais pronun- ciadas na face que nos membros. Uma outra variedade de hemiplegia alterna, é a que Gharcot propoz denominar syndroma de Be- nedikt; consiste na paralysia do nervo motor ocular commum de um lado e na hemiplegia com tremor do lado opposto. Resta-nos assignalar ainda uma variedade de hemiplegia alterna extremamente interessante, tanto sob o ponto de vista clinico como sob o da physio- logia pathologica do systema nervoso; não se trata mais em realidade de hemiplegia alterna, mas sim de hemianesthesia alterna. Os casos deste genero não são mui numerosos; é principalmente a uma licção do professor Raymond de 1896 que devemos o seu conhecimento; mais recentemente Benhardt publicou um novo caso. Esta hemianesthesia alterna manifesta-se ordinariamente pela perda da sensibili- dade á dor e á temperatura, óccupando de um lado do corpo um ou vários ramos do trigemeo e do outro lado uma porção mais ou menos extensa da superfície cutanea do tronco ou dos membros. Sob o ponto de vista anatomo pathologico, a lesão reside frequentemente na protuberância (uma lesão bulbar, segundo Senator, poderá dar nascimento igualmente a este syndroma). Esta lesão protuberancial occupa principal mente o andar superior, a calotte, e determina uma alteração, não só dos núcleos e das fibras radiculares do trigemeo como também de uma maior ou menor porção da faixa de Beil. Ora nos cortes da protu- 10 berancia vimos que a raiz ascendente do trigemeo (o nervo .sensitivo da face) está para traz e para dentro das fibras da faixa de Reil. Todas as fibras do trigemeo sensitivo emanam do ganglio de Gasser situado do lado correspondente, as impressões sensitivas que conduzem estas fibras vêm da metade homologa da face. Ao contrario, sabemos que o entrecruzamento das fibras sensitivas da faixa de Reil se processa ao nivel da região inferior do bulbo; as fibras desta faixa na protuberância soffrem a sua decussação e conduzem as impressões sensitivas vindas da metade opposta do corpo. Logo as lesões protuberanciaes que attingem a faixa de Reil nesta região visinha ás fibras radiculares do trigemeo, acarretam uma hemianesthesia alterna: anesthesia de uma metade da face situada do lado da lesão, anesthesia dos membros, da metade do pescoço e da metade do tronco do lado opposto. Tem-se accrescentado aos grupos precedentes uma ultima classe de hemiplegia alterna, cuja lesão se manifesta no bulbo ao nivel do corpo da oliva; eh a interessa o feixe motor correspondente, acima do seu entrecruzamento bem como accommette as fibras radiculares do nervo hypoglosso destinado ao lado attingido; com relação a lesão, a paralysia dos membros pertence ao typo alterno. Esta ultima categoria de alterações cruzadas traz o nome de hemiplegia alterna inferior ou paralysia alterna bulbar ou ainda svndroma de Revilliod-Gou- kousky; traduz-se em clinica por uma impotência dos membros de uma metade do corpo e por uma paralysia com atrophia e desvio da metade da lin- gua do lado opposto. 11 Este phenomeno tem a seguinte explicação: uma lesão interessando a medulla allongada no nivel do corpo da oliva, attinge a via motriz acima da decus- sação do seus feixes nervosos; accommette além disto a raiz espinhal do hypoglosso que já entre- cruzado dirige-se para a peripheria do mesmo lado; os membros serão pois paralysados do lado opposto da lesão, ao passo que deste mesmo lado, o com- promettimento do hypoglosso traduzir-se-á por uma atropina da metade da lingua addicionada a uma hemi-paralysia com desvio para a porção atrophiada. Estas perturbações do lado do 12.° par mostram que se trata de uma destruição nuclear e por conse- quência intra-bulbar das fibras radiculares do liypo- glosso pela própria lesão que altera a via pyramidal destinada a se entrecruzar mais abaixo. Terminado assim o rápido estudo das considera- ções geraes sobre as paralysias alternas, passemos a fazer resumidamente o historico dos seus diversos typos. Não faremos, porém, um quadro completo das phases porque têm passado, desde as épocas as mais remotas até hoje, mas sim um pallido esboço historico, pois nos fallecem forças no desempenho de tão árduo emprehendimento. A noção das paralysias alternas é relativamente antiga. Quando, em 1863, o sabio medico allemão Weber communicoii á sociedade real de cirurgia de Lon- dres, a observação de um individuo fallecido no seu serviço depois de ter apresentado no curso da sua existência e em toda sua pureza o syndroma clinico caracteristico das alterações pedunculares que mais 12 tarde devia trazer o seu nome, a noção da alternan- cia dos symptomas era desde então já admittida na sciencia. Já, com effeito, Andral em 1824, Gendrin em 1838 e outros notáveis pathologistas tinham notado que, nos casos de lesões dos pedúnculos a symptomato- logia das perturbações motoras e das alterações sensitivas se limitavam estrictamente ao lado do corpo opposto á lesão. Andral escrevia em 1824: «Uma paralysia com- pleta do terceiro par sobrevindo no curso de uma aílecção cerebral e coincidindo com uma hemi- plegia dos membros do lado opposto indica que a lesão se acha ao lado da paralysia ocular e no ponto onde o motor ocular commum passa muito perto e abaixo do pedúnculo cerebral.» Gendrin escrevia desde 1838, no seu excellente tratado de medicina: «0 derramamento de sangue no pedúnculo cerebral produz a suspensão da acção dos nervos que delle nascem, ao mesmo tempo que determina phenomenos de paralysia e de anesthesia do lado opposto pelo intermédio da pyramide.» Quatro annos antes de Weber, como já vimos no começo desle capitulo, o eminente professor Gubler, n’uma magnifica memória sobre as paralysias alternas, publicada na Gazetta Hebdomadària dos Hospitaes do mez de Janeiro de 1859, indicara com a maior precisão a localisaçâo da séde do processo pathologico nestes termos: «Sendo dado uma para- lysia do motor ocular commum esquerdo com uma hemiplegia total direita, dever-se-á diagnosticar uma lesão do pedunculo cerebral esquerdo.» Citava grande numero de observações, entre as 13 ' quaes é mister lembrar a de Luton, onde o syndroma era muito claro e attribuia a este complexo o nome de parai ysia alterna superior. Não pode subsistir a menor duvida sobre a pater- nidade real do syndroma peduncular. O mérito de ter fixado o tvpo clinico das paralysias do pedunculo cabe ao professor Gubler e d’Astros foi bem inspi- rado quando em 1894 revendicou para o illustre medico de Boujon a honra de ligar o seu nome ao syndroma peduncular alterno. No correr de nosso trabalho serviremos da deno- minação de syndroma de Gubler-Weber para desi- gnar o tvpo clinico cuja lesão se assesta no andar inferior do pedunculo cerebral, reservando a deno- minação de syndroma de Millard Gubler ás altera- ções do andar protuberancial inferior, segunda grande classe de syndroma alterno sobre a qual falaremos opportunamente. Na sua importante e conscienciosa memória, Gubler, menciona a these de Koechlin sobre um caso de tuberculose da região do pé do pedunculo com producção de hemiplegia; relata a observação de Luton em que se vê uma massa tuberculosa do pedunculo e da protuberância do lado direito occa- sionar uma paralvsia directa do motor ocular com- mum com uma hemiplegia cruzada dos membros. Quanto ao professor Weber o seu grande mérito é ter analysado com methodo e apresentado em toda sua pureza o typo absolutamente sehematico da paralvsia alterna por alteração peduncular; o seu nome deve, pois ficar legitimamente associado ao de Gubler. Desde a época do sabio medico Weber que as 14 observações de syndroma alterno peduncular se multiplicam e os casos já observados sào mui numerosos para achar guarida neste estudo. Ao lado do syndroma de Gubler—Weber, assi- gnalaremos uma outra variedade de syndroma pedunc-ular descripto por Benedikt de Vienna. O primeiro documento a respeito deste syndroma data de 1889. É uma memória em que o professor Benedikt, estudando o mecanismo e a pathogenia do tremor, relata tres observações que chamam a attenção pela natureza de um tremor intercurrente a pheno- menos singulares de paralysia, e fundamenta um syndroma até então desconhecido, que propõe de- nominar— uma hemi-paresia com paralysia cruzada do motor ocular commum e com tremor das partes paraivsadas. Permaneceram 'sob silencio estes factos divul- gados por Benedikt até Março de 1893, época em que appareceu o resumo de uma lição, que na Salpêtrière, fez o professor Gharcot sobre um caso, que, se lhe deparou em condições idênticas aos que Benedikt relatou na sua memória. Estudando o originai syndroma o conspícuo cory- pheu da pathologia nervosa apontou e sanecionou- Ihe o logar entre as paraiysias alternas; encarou-lhe a evolução clinica e a localisação anatómica; e, por fim, em honra ao auctor que primeiramente o descreveu, deu-lhe a denominação de syndroma de Benedikt. Depois, em Abril de 1900, secundado do pro- fessor Gharcot, publicou Gilles de la Tourette uma notável memória sobre o syndroma de Benedikt, á 15 qual acompanham duas observações inéditas. Estas, ainda que sem o testemunho da autopsia, fazem-lhe jus a documentos de valia; a natureza dos casos e as avisadas minúcias que as inteiram, são de notá- vel contingente á elucidação da historia clinica do syndroma. Realmente, o professor Gilies de la Tourette põe . em confronto ás suas observações, as de Benedikt e as de Charcot, examina-as e nellas se estribando, esboça o quadro clinico do syndroma de Benedikt, aborda-o por todas as suas faces. 0 historico dos syndromas alternos pedunculares ficaria incompleto se ao lado das observações de hemiplegia alterna por lesão peduncuiar real, não relatássemos os casos dos auctores que observaram a paralysia alterna verdadeira, simulada de todas as partes por alterações organicas ou mesmo por per- turbações puramente funccionaes, extranhos uns e outros a toda alteração do meso-mesencephalo. Nesta ordem de factos mencionaremos o caso de Idypocrates em que se vê uma simples suspensão do fluxo catamenial provocar numa joven nevro- patha a apparição de uma hemiplegia cruzada que cedeu aliás rapidamente antes da funcção momen- taneamente pertu rbada. Sem remontar a litteratura medica, vemos nos factos modernos, o primeiro caso serio de falsa paralysia peduncuiar alterna observada em 1873 por Jaekson. Trata-se de um caso de syndroma pedun- cuiar de Gubler-Weber simulado por dous focos distinctos de lesões syplii I iticas accommettendo o terceiro par direito e os membros do lado esquerdo. 16 Na autopsia encontrou-se d nas lesões independentes dos pedúnculos. Vem em seguida o facto de Morvaud, em 1870, em que duas esquirolas ósseas, provocaram por compressão encephalica o apparecimento de um falso syndroma alterno. O terceiro typo de syndroma alterno de que nos vamos occLipar, traz os nomes de Millard e Gubler. Quasi simultaneamente foi elle descripto em 1855 por Millard que chamou a attenção sobre este typo morbido e Gubler em 1856. Charcot assim se exprime: «Se o trabalho de Gubler é de alguns mezes posteriores ao de Millard, é mister reconhecer que Gubler achou o nome de paralysia que devia para o futuro lhe servir de signal e fixou definitivamente o syndroma por um complexo de observações apropriadas.» Andral, em 1848, no seu curso de pathologia medica, escreve: «Encontram-se observações extre- mamente raras em que a paralysia da face foi op posta a dos membros; é preciso admittir que nestes • casos existia uma dupla lesão.» Pelo que acabamos de ver, o iIlustre auctor não conjecturava o exacto limite topographico das lesões que produzem a paralysia alterna mesocephaliea; é, pois, a Millard e Gubler que a sciencia deve a loca- lisação, na protuberância, da variedade de hemiple- gia cruzada que traz o seu nome. Existe um outro typo de hemiplegia alterna pro- tuberancial estudado pelos professores Raymond e Cestan em 1903. Este syndroma é constituído por uma paralysia dos movimentes de lateralidade dos globos oculares, associada a uma hemiplegia que 17 àttinge mui ligeiramente a força motriz e se mani- festa, ao contrario, por perturbações da funeção da motilidade voluntária (incoordenação, hemiathetose, asynergia cerebellosa, tremor) e por perturbações mui profundas da sensibilidade subjectiva e obje- ctiva (formigamento, anesthesia cutanea e articular das extremidades, perda do sentido stereognostico). Este typo clinico recebeu o nome de syndroma de Raymond-Cestan ou syndroma protuberancial.supe- rior e tem o seu togar assignalado ao lado do syn- droma protuberancial inferior de Millard-Gubler. Ha na litteratura medica uma serie de observações simuladoras do syndroma de Millard-Gubler por lesões ou perturbações funccionaes estranhas á ponte de Yarole. Eis em ligeiros traços o que nos foi possível dizer a respeito deste capitulo. CAPITULO II Ligeiras noções anatomo clinicas e etiologicas % 0\Ão seria de boa norma,encetando este capitulo altamente interessante consentirmos, permanecesse no animo de quem nos lê, a minima confusão no tocante ao estudo anatomo-clinico da protuberância e dos pedúnculos cerebraes. Antes, porém, de entrarmos no seu desenvolvi- mento, julgamos conveniente fazer um summario topogrãphico do istbmo do encephalo. Sob esse nome comprehende-se uma porção de massa encephalica, que une o cerebello ao cerebro e este ao bulbo rachidiano. Repousa elLe na gotteira basilar do occipital, abaixo do cerebro, para diante do cerebello e acima do bulbo rachidiano. Visto por sua face inferior, o isthmo do encephalo nos apparece sob a forma de uma massa volumosa, a protuberância annular, da qual emergem quatro prolongamentos: dons lateraes que são os pedún- culos cerebellosos médios e dous anteriores que constituem os pedúnculos cerebraes. Se examinarmol-o, porém, por sua face superior, 20 observamos que elle é constituído: i.° para traz, por dous outros prolongamentos do cerebello, os pedúnculos cerebellosos superiores, os quaes são unidos um ao outro por uma delgada lamina de sub- stancia nervosa, a valvula de Vieussens; 2.° para diante, por quatro eminências arredondadas que recebem o nome de tubérculos quadrigémeos. Abaixo destes tubérculos, acha-se um canal de direcção antero-superior—canal ou aqueducto de Sylvius, o qual faz communicar o quarto ventriculo com o ventriculo médio do cerebro. Nos lados, emfim, o isthmo do encephalo apre- senta-nos um sulco antero-posterior, o sulco lateral do isthmo, que divide este orgào em dous planos ou andares, um inferior e outro superior. Do fundo deste sulco nasce uma lamina de sub- stancia branca, de forma triangular, a qual se dirige em seguida para cima e desapparece abaixo dos tubérculos quadrigémeos—é o feixe triangular do isthmo ou faixa de Reil. Vejamos agora o que diz respeito á constituição anatómica dos pedúnculos cerebraes e da protube- rância annular. Os pedúnculos cerebraes ou crura cerebri dos auctores inglezes e allemães, situados na parte mais anterior do isthmo do encephalo, constituem a porção das vias nervosas centraes que, divergindo sob a forma de duas columnas brancas, ligam a protuberância aos hemispherios cerebraes por in- termédio das camas opticas. Eiles levam, pois, ao cerebro feixes de fibras provenientes da mediilia, do bulbo, do cerebello, da protuberância annular. A região dos pedúnculos cerebraes é de summa 21 importância em clinica, pois liga os elementos nobres do encephalo a todos os outros departa- mentos do nevraxo. Elles deixam no seu afastamento um espaço an- gular— onde se vê, da face interna que limita esta loja, emergir o terceiro par ou nervo motor ocular counnum. No vertice deste angulo os dous nervos do terceiro par são estrictamente implantados na face interna do pé do pedunculo: o que explica que uma lesão accommettendo esta região, interesse con- junctamente as fibras do pyramidal e as fibras ou núcleos do motor ocular commum e produza uma paralysia alterna, constituída pela paralysia do motor ocular commum do lado da lesão e pela hemiplegia do lado opposto. Uma lesão do pé ou base do pedunculo, seja qual for a sua natureza, pode acarretar o syndroma de Weber, o que é facilmente explicado pelas relações do feixe pyramidal com o terceiro par craneano. Percebe-se, da mesma maneira que, em certos casos raros de tumores volumosos, os dous nervos possam ser compromettidos simultaneamente, con- stituindo uma dupla hemiplegia alterna. Quando se pratica sobre o pedunculo cerebral um corte transversal, pode-se distinguir, para diante dos tubérculos quadrigémeos, duas regiões bem distinctas: uma anterior, ventral ou pé do pedún- culo, a outra posterior, dorsal ou calotte. Estas duas regiões são separadas por uma substancia negra—o locus niger de Soemmering. No andar inferior ou região do pé, de dentro para fora, vêm-se o feixe geniculado ou feixe motor da face que se termina nos núcleos motores bulbo- 22 protuberanciaes depois da decussação e que é des- tinado aos nervos voluntários da face: mastigador, facial e hypoglosso; bem como o feixe pyramidal que das grandes cedidas do córtex cerebral ganha as cédulas dos cornos anteriores da medi ida, O feixe pyramidal é formado pelo conjuncto dos prolongamentos cydnder axis dos neuronios mo- tores corticaes que põem em relação o córtex cere- bral motriz com os cornos anteriores da medulla. Ede parte dos dons terços anteriores do braço pos- terior da capsula interna, passa pelo pé ou base do pedúnculo cerebral correspondente do qual occupa tres quintas partes medianas; neste percurso o feixe pyramidal diminue de volume de cima para baixo, entrando na constituição dos núcleos de origem do motor ocular commum, do pathetico e da raiz motora do trigemeo. Quando a hemiplegia é depen- dente da lesão do feixe pyramidal neste ponto do mesencephalo, lia simultaneamente uma lesão do 3° par craneano; teremos um quadro clinico espe- cial representado pelo syndroma de Weber. Chegam as fibras motoras ao metencephalo, occu- pando a metade anterior da protuberância. Des- cendo nesta parte ventrai da ponte de Varole, as fibras eortico-protuberanciaes diminuem ainda de volume entrando na constituição do núcleo masti- gador do trigemeo, do motor ocular externo e do facial, fornecendo também numerosos ramos colla- teraes destinados aos núcleos da ponte. Uma lesão inferiormente collocada neste ponto do metencephalo, produzirá uma paralysia do braço e perna de um lado e da face do lado opposto; isso, porque, já houve cruzamento das fibras do nervo 23 facial e nào dos feixes pyramidaes. É o syndroma de Millard Gubler. Da protuberância annular, passam as fibras mo- toras para o myelencephalo formando um feixe espesso de cada lado da face anterior do bulbo; são as pyramides anteriores. Cada feixe pyramidal passando pela medulla allongada, diminue ainda de volume entrando na constituição do núcleo do hypoglosso, do núcleo ambiguo (núcleo de origem motor para o nervo glosso-pharyngeo) e do pneumogastrico. Chegadas á parte inferior da medulla allongada, as fibras motoras apresentam a decussação das pyramides. As fibras de cada pyramide dirigem-se para diante e para dentro, entrecruzam-se sobre a linha mediana no fundo da fissura mediana longitudinal anterior, com as fibras do lado opposto, checando ao cordão lateral da medulla espinhal, onde tomam a direcção longitudinal, constituindo o feixe pyrami- dal cruzado. O feixe pyramidal directo ou de Turck entrecru- za-se também com o do lado opposto no fim do seu trajecto pela commissura branca da medulla, de maneira que todas as fibras das cellulas corticaes chegam ás cel lulas radiculares dos cornos ante- riores do lado opposto. Na calotte, justaposta ao locus niger, notamos a faixa de Rei 1 ou feixe sensitivo; o núcleo rubro de Stilling; ao redor do aqueducto de Sylvius os nú- cleos do motor ocular comumm; e abordando a calotte, sob o pavimento do quarto ventrículo, os tubérculos quadrigémeos. 24 Estes tubérculos são em numero de quatro, dos quaes dous anteriores são as eminências nates e dons posteriores as eminências testes. Tem-se, por muito tempo, considerado os tubér- culos quadrigémeos como os núcleos de origem dos nervos opticos; admittia-se que a sua ablação unilateral acarretaria a cegueira do olho do lado opposto. Beaunis localisa nos tubérculos quadri- gémeos anteriores os centros de coordenação dos movimentos associados dos dous olhos. Assim Prus excitando pela electricidade os tubérculos quadrigémeos anteriores do cão, verifica os seguintes factos: a excitação da parte anterior ou da posterior de um tubérculo quadrigémeo não traz movimento algum do olho do lado correspon- dente, mas o do lado opposto se dirige para baixo e para dentro. Quando a excitação tem Jogar na parte interna de um dos tubérculos quadrigémeos, o olho do lado opposto se dirige para fóra. Quando se excita a parte externa dos tubérculos, os dous olhos se deslocam horizontal mente para o lado opposto. Pela excitação da parte media de um dos tubérculos quadrigémeos anteriores determina-se nystagmus e myosis. A mydriase, ao contrario, é as vezes observada na excitação da parte posterior ou lateral de um dos tubérculos quadrigémeos ante- riores. Toda excitação electrica de um dos tubérculos quadrigémeos posteriores traz o deslocamento dos dous olhos no sentido horizontal para o lado opposto com exõphtalmia e nystagmus. Prus diz que existem nos tubérculos quadrigémeos anteriores centros motores postos em acção por excitações 25 opticas. Bernheimer nega a existência de centros reflexos para os movimentos dos olhos nos tubér- culos quadrigémeos anteriores. Para von Bechterew, porém, estes tubérculos têm relações estreitas com a funcção visual; gosa prova- velmente o papel de centro reflexo por meio do qual as excitações visuaes podem actuar sobre a esphera motriz. As raizes do motor ocular commum originam-se de um núcleo de substancia parda, situado abaixo do aqueducto de Sylvius, junto do sulco mediano da parede inferior do quarto ventriculo. Desde que se origina, o nervo do terceiro par segue para diante, para cima e para dentro até aos lados das apophvses clinoides posteriores; perfura a dura-mater; penetra no seio cavernoso e na orbita pela parte mais larga da fenda esphenoidal, passando no armei de Zinn e divide-se em dous ramos, um superior e o outro inferior. Dos dous ramos, por que termina na orbita o motor ocular commum, o superior segue para cima e para dentro até a face inferior do musculo recto superior, fornecendo um ramo a este musculo e outro ao elevador da palpebra superior; o ramo inferior fornece t.res ramos ao recto interno, ao recto inferior e ao pequeno obliquo. Este ultimo apresenta a grossa raiz ou raiz motora do ganglio oplitalmico que vae innervar os musculos ciliar e constrictor da pupilla. Em summa, o nervo motor ocular commum preside aos movimentos de elevação da palpebra superior, a todos os movimentos de elevação e de convergência, a quasi totalidade dos movimentos 26 de abaixamento e a rotação do olho para fóra do seu eixo antero-posterior. Elle tem ainda sob a sua dependencia os movimentos do splhncter da pupilla e a funcção accommodativa. A lesão pode interessar a totalidade ou parte de suas fibras bem como a totalidade ou parte de seus núcleos; donde as paralysias do globo ocular sub- sequentes á implantação da lesão em um como em outro destes pontos. A circulação arterial dos pedúnculos ccrebraes foi estudada por Duret em 1873 e mais recentemente por Alezais e D’Astros em 1892 e por Schimmamura (de Tokio) em 1894. Com Testut, podemos classificar as artérias pe- dunculares em internas ou medianas e externas ou lateraes. As artérias pedunculares internas, medianas ou centraes (artérias super-pedunculares de Duret), continuam a serie das artérias medianas da protu- berância. Elias nascem, em parte, da extremidade anterior do tronco basilar, em parte, da porção inicial da cerebral posterior; algumas provêm da coininuni- cante posterior. Seguindo um trajecto ascendente, penetram peia maior parte nos buracos internos do espaço perfurado posterior ou espaço interp.edun- cular; outras (artérias radicu lares) desapparecem no sulco do motor ocular commum e seguem de baixo para cima o trajecto deste tronco nervoso. Chegadas á callotte peduncuiar, as artérias pe- dunculares internas distribuem-se ás diíferentes partes desta região, como sejam: a faixa de ReiI, ao pedunculo cerebellososuperior, ao núcleo rubro, 27 aos núcleos cie origem dos nervos motor ocular commum e pathetico. Segundo Scliimmamura, todas estas artérias per- tencem a categoria das artérias terminaes, isto é, não se anastomosam entre si, nem no seu trajecto nem na sua terminação. 0 núcleo cio motor ocular commum, em particular, tem uma circulação com- pletamente independente, não communicando nem com a dos tubérculos quadrigémeos nem com a cio núcleo opposto. As artérias pedunculares externas ou Jateraes, mui variaveis no seu volume e no seu trajecto, provem ás vezes cia cerebral posterior, cia çommu- nicanle lateral, cia choroidiana anterior e da cere- bellosa superior. Elias penetram no pedúnculo por sua face inferior e por sua face externa e se distri- buem á região do pé, bem como á região externa da calotte. Existe ainda um terceiro grupo arterial, artérias optieas, que, ganham a cama optica atravessando o pedúnculo; da sua ruptura pode resultar um foco hemorrhagico com producção do synclroma alterno. Entremos agora no estudo anatomo-clinico do mesocepbalo. A protuberância annular, também chamada meso- cephalo ou ponte de Varole, é a parte das vias nervosas centraes intermediária ao bulbo, aos pe- ei imculos cerebraes e ao cerebello. Apresenta-se sob o aspecto de uma massa branca, de fórrna cubica, repousando sobre a gotteira ba- silar. EI la é posta em communicação com o cere- bello por intermédio dos pedúnculos cerebellosos médios e occupa a parte central do plano inferior 28 do isthmo. Recebe este nome em virtude da dispo- sição especial das suas fibras que, indo de um lado ao outro, cobrem a maneira de uma ponte ou de um semi-annel, os feixes longitudinaes do bulbo e dos pedúnculos cerebraes que constituem as partes profundas do orgam. Podemos considerar, sob o ponto de vista ana- tómico, dous planos ou andares na protuberância annullar: um anterior ou ventral, o outro posterior ou região da calotte. No andar anterior, encontramos os diversos ele- mentos já estudados: o feixe geniculado ou motor da face, situado para traz e para dentro do feixe pvramidal; as próprias fibras pyramidaes que des- cidas dos pedúnculos prolongar-se-ão até as grandes cellulas dos cornos anteriores da medulla. Na calotte da protuberância, existem conjuncta- mente feixes ascendentes ou descendentes obser- vados na do pedúnculo. O rnais importante, a faixa de Reil ou feixe sensi- tivo, é collocado na parte anterior da calotte, perto da linha média. Os pedúnculos cerebellosos supe- riores ligam o cerebello ao córtex por intermédio dos tubérculos quadrigémeos, do núcleo rubro e da cama optica; emíim o feixe longitudinal posterior que representa a continuação do cordão antero- lateral da medulla liga uns aos outros os differentes andares da columna cinzenta. Nervos craneanos têm também a sua origem ou a sua terminação na protuberância annular. Assim é que, da parte inferior e ventral, perto da linha média, saé o tronco do 7.° par (facial); mais perto ainda da linha média toma nascimento o nervo do 29 0.° par (motor ocular externo ou abducens); mais acima e para fora apparece a origem do 5.° par (trigemeo). 0 facial tem seu núcleo de origem na protube- rância (sulco bulbo-protuberancial) abaixo do soal ho do qqarto ventrículo, entre a oliva superior que está para dentro e a raiz descendente do trigemeo que está para fóra. Convém notar que muitas vezes as lesões da protuberância attingem igUal mente o bulbo e que portanto a symptomatologia é' bulbo-protuberancial. As artérias da protuberância annular se distin- guem em medianas e lateraes. As artérias protuberanciaes medianas, nascem da face superior do tronco basilar e cercam a protu- berância na linha média; são os vasos nutritivos dos núcleos dos 5.°, 6.° e 7.° pares. Estas artérias constituem pela sua ruptura o foco de predilecção das hemorrhagias protuberanciaes. As artérias protuberanciaes lateraes, nascem igualmente da basilar e vêm perfurar a protuberância em pontos diversos da sua peripheria. Frequentemente vêm-se focos do mesocephalo espalhados fóra dos limites do orgão e o syndrorna realisado affecta o typo bulbo protuberância!; ás vezes mesmo a paraivsia alterna resulta de uma lesão pedunculo-protuberancia 1. Eis resumidamente, o que nos foi permittido dizer sobre a constituição anatómica dos pedúnculos eerebraes e da protuberância annular; passemos agora em revista o estudo da natureza das lesões productoras das paralvsias alternas. Varias são as causas ás quaes devemos imputar 30 a existência das hemiplegias alternas, pois sabemos não ser outra cousa mais que um conjuncto sympto- matico essencial mente adstricto a uma localisação anatómica. Para a boa comprehensão das perturbações cau- sadas pelas lesões dos pedúnculos cerebraes e da protuberância, podemos escudados nas observações accuradas e concludentes dos mestres, inscrever entre as causas mais frequentes, a tuberculose, a syphilis, focos de hemorrhagia e de amollecimento, tubérculos diversos, traumatismos e processos inflam matorios adstrictos aos orgãos que circumdam estas regiões. Realmente, as alterações mais frequentes são as hemorrhagias, os amollecimentos e os tumores. Dentre os focos hemorrhagicos distinguiremos não só os que provêm da ruptura de um dos vasos arteriaes destas regiões, bem corno os que resultam da diffusão do sangue na região visinha. Os fócos de amollecimento, na grande maioria dos casos, são devidos: as arterites chronicas, atheroma, arterio-esclerose, embolias, etc. A syphilis, que é um factor importante na genese das arterites cerebraes, é muitas vezes a causa pri- mitiva dos amollecimentos destas regiões. Todas as infecções e intoxicações que são capazes de produzirem a arterite cerebral podem ser encon- tradas nos antecedentes do doente. Os tumores dos pedúnculos e da protuberância são relativamente paros. Observa-se ás vezes gommas syphiliticas, tubérculos diversos, gliomas eglio-sar- comas. Dentre estes tumores, os mais frequentes são in- 31 contestavelmente os tubérculos e as gommas syphi- liticas. As lesões traumaticas destas regiões podem também dar origem as paraivsias alternas. D’Astros demonstrou que estes processos mór- bidos não são raros na pathologia do pedúnculo cerebral. Em summa, é muito difficil na maioria dos casos, poderíamos mesmo dizer na totalidade, apurar bem ao certo o papel que a cada uma destas causas cabe na genese da moléstia. Todos quantos se entregam á clinica das moléstias nervosas quotidianamente se esbarram contra esta resistência que ha para levantar a anamnese perfeita de um doente porta- dor de uma affecçao nervosa. Não será, portanto, para admirar que no estudo que emprehendemos se encontrem grandes la- cunas. CAPITULO III Symptomatologia n> (Tf ara methodisar o estudo da syndromatologia das paralysias alternas, devemos dividil-o em duas partes de accordo com a séde da lesão e teremos assim: a symptomatologia das paralysias peduncu- lares alternas e a symptomatologia das paralysias bulbo-protuberanciaes alternas. O conhecimento das lesões que interessam a região dos pedúnculos cerebraes, é de um certo valor pratico, porque muito nos auxilia a desvendar a semiologia das alterações pedunculares alternas. Considerou-se, por muito tempo, a pathologia desta região do mesencephalo como resumida no syndroma de Gubler-Weber. D’Astros, porém, demonstrou que ha dons typos symptomaticos extremos: o tvpo Gubler-Weber or- dinário, no qual a hemiplegia e aparalysia do motor ocular commum são completas e totaes e a lesão se assesta no andar inferior do pedúnculo ao nivel do bordo superior da protuberância; o tvpo Benedikt, 34 no qual as paraiysias são incompletas e podem acompanhar-se de tremor; a lesão se assesta no andar superior do pedúnculo e não actua senão por compressão e excitação das fibras pyramidaes. O syndroma mais frequente e caracteristico de lesão peduncular é, sem duvida, o de Gubler-Weber. Uma lesão do pé do pedúnculo, seja qual fòr a sua natureza, hemorrhagica, necrobiotica, syphilitica, etc., pode acarretar o syndroma de Gubler-Weber, o que é facilmente explicado pelas relações do feixe pyramidal com o terceiro par craneano. E’, portanto, este syndroma a expressão de uma paralysia directa do motor ocular commnm com uma hemiplegia dos membros do lado opposto. Quanto á hemiplegia nada diremos; á ella se appli- cam todas as considerações que dizem respeito a hemiplegia capsular. A paralysia do nervo motor ocular commnm pode ser completa e accommetter toda a musculatura in- terna e externa do olho (extrabismo externo, ptosis palpebral, mydriase, etc.), ou incompleta, apresen- tando-se muitas vezes sob a forma de uma ophtal- moplegia interna isolada. Ha casos em que a paralysia se limita aos musculos externos do olho ou sómente a alguns da musculatura externa, não sendo interessadas a iris e a pupilla, o que se verifica quando é respeitado o núcleo do motor ocular commum. Mais raramente observa-se uma ptosis palpebral isolada, com a qual quasi sempre coexiste uma paralysia do sexto par e uma paralysia total do facial. A ptosis é, com effeito, um facto frequente. 0 nys- 35 tagmus parai vtico ésusceptivel de observar-se assim como a neuro-retinite. Á esta paralysia ocular pôde, por sua vez, asso- ciar-se a paralysia do motor ocular commum do lado opposto, que poderá ser completa ou mais freqi lentemente incomp Ieta. O estado da prfpilla é variavel; ha ás vezes mv- driase, outras vezes mvosis; as reacções luminosas e accommodativas sào abolidas. A manifestação symptomatica póde duplicar-se, formando um syndroma duplo, o que se attribue a extensão progressiva da lesão causal; assim como provocar perturbações da sensibilidade, pois, já sabemos que a calotte peduncular encerra a faixa de Rei 1 ou feixe sensitivo que leva ao córtex as múltiplas impressões vindas da peripheria. Muitas vezes a lesão peduncular não traduz-se por uma hemiplegia e sim por uma hemiparesia cruzada com tremor. O sabio professor Benedikt estudando o mecanis- mo epathogenia do tremor em geral, assignalou pela primeira vez um conjuncto symptomatico caraçte- risado por uma paralysia do motor ocular commum e uma hemiparesia cruzada com tremor. A esse complexo morbido deu Charcot o nome de syndroma de Benedikt. O tremor que coexiste com a hemiparesia e cara- cterisa este syndroma, não é sempre um pheno- meno contemporâneo e immediato. Apparece quasi sempre com ella, mas casos ha em que só se apre- senta muito tempo depois. Raras são as observações desse syndroma, limi- tando-se ás de Benedikt que pela primeira vez o 36 distinguiu das outras formas da nosologia nervosa e ás duas do professor Cbarcot. Todavia, diz Gilles de la Tourette, a figura clinica do syndroma é excepcionalmente delineada, sendo a analyse anatómica das mais instmctivas em relação ás localisações da base do encepbalo. Benedikt estabeleceu baseado em tres obser- vações, das quaes uma com autopsia, que o syn- droma caracterisado pela paraiysia do motor ocular commum com hemiparesia cruzada e tremor das extremidades paraiysadas, é representado post- mortem por uma lesão localisada no pedúnculo cerebral, ao nivel da emergencia do terceiro par. Eis o syndroma de-Benedikt observado na clinica do professor Cbarcot: Um homem de 39 annos, de raça negra (Marti- nica), entrou para o serviço da clinica das moléstias do systema nervoso. Nada de particular nos seus antecedentes hereditários, a não ser uma iníecção variolica aos 15 annos de idade. A affecção começou ha dezeseis annos sem pro- dromos, por um ictus apdplectiforme súbito, vol- tando o doente a si no fim de tres dias. Apresenta uma hemiplegia direita completa, estra- bismo externo do olho esquerdo com ptosis da palpebra superior. Dysarthria muito accusada que torna a palavra quasi incomprehensivel. A hemiplegia á principio sem caracter especial, complicou-se ao fim de um anno de um tremor muito accentuado que appareceu de um modo progressivo, exagerando-se pouco a pouco. A força muscular está relativamente conservada. 37 no lado hemiplegico; não ha amyotrophia. Na face encontram-se os phenomenos denunciativos de um ataque ao facial inferior; os traços e a bo.cca des- viados para a esquerda, desvio esse que se accentua quando o doente fala ou ri. O tremor occupa todos os segmentos dos membros superior e inferior, não apresentando-se na face; durante o repouso adquire o caracter de movimentos athetosicos. Quando o doente quer executar um movimento, o membro em seu conjuncto e seus diversos segmentos apresentam abalos violentos, amplos e desordenados, sobre os quaes a vontade não tem a menor aeção. Marcha difíicil e só realisada com o auxilio de um bastão. Em repouso, sentado, em pé ou deitado, obser- va-se movimentos rytlimicos e lentos do tronco e do pescoço, havendo uma especie de balanço do corpo no sentido lateral. À sensibilidade geral está Intacta á esquerda. Do lado hemiplegico verifica-se ao nivel dos membros e do tronco a perda da sensibilidade táctil e thermica e ausência da funcção estereognostica. Analgesia. Ausência dosreílexos rotuliano e achiliano dos dous lados. Diminuição bem apreciável do reflexo do punho e do cotovello; reflexo cremasterino normal á es- querda e abolido á direita; não ha trepidação epileptoide. Olho esquerdo (lado opposto á hemiplegia): ptosis paralytica completa, estrabismo externo muito accusado, paralysia completa dos rectos interno, superior e inferior. Pupillapouco dilatada, mais larga 38 que a do olho direito, immovel á luz e á accom- modaçào. Diminuição da acuidade visual V=y7. Olho direito (lado hemiplegico): ligeira ptosis; os movimentos para dentro são limitados e acom- panhados de oscillações nystagniformes. Paraiysia completa do recto superior e incompleta dos rectos interno e inferior. Pupilla immovel á luz e á accom- modação. Ligeira diminuição da acuidade visual v=ya. A paraiysia da accommodação que existe dos dous lados data do’começo da moléstia; desde o ictus necessita o doente de fortes lentes convexas para a visão próxima. Nunca accusou diplopia por causa da occlusão permanente das palpebras do olho esquerdo. Não ha desvio da língua. Palavra escandida.•Sensi- bilidade gustativa abolida á direita e enfraquecida á esquerda. Olfacção e audição normaes. Devido aos movimentos desordenados do membro inferior, apresenta o doente varias escoriações nessa extremidade. Gomo vemos pelo que fica exposto, o syndroma de Benedikt apenas se differencia do syndroma de Weber pela existência do tremor no lado paralysado e com a observação relatada exemplificamos os dous factos. O começo destas duas aíTecções bem como o das paralysias protuberanciaes alternas, podem ser lentos, com cephalalgia premunitoria, formigamen- tos, zumbidos nos ouvidos, etc., ou súbito e imme- diato, com um ictus que pode arrastar o paciente a um coma susceptivel de deixal-o sem consciência durante alguns dias. o 39 Dito isto, passemos em revista o que ha sobre a symptomologia das paralysias bulbo-protuberan- ciaes alternas. Foi, em 1855, como vimos no começo deste tra- balho, que, Millarcl chamou a attenção sobre uma variedade de hemiplegia, da qual no anno seguinte Gubler fez um estudo completo sob o nome de hemi- plegia alterna. Realmente, ú a estes dons auctores que devemos o conhecimento das paralysias al- ternas. Não padece duvida também, que, quando um processo pathologico se assesta na parte inferior ou bulbar da protuberância, provoque a apparição de um typo de syndroma alterno caracterisado por uma hemiplegia dos membros de um lado do corpo e paralysia facial do lado opposto; é o syndroma de Millard-Gubler. Eis a razão anatómica deste syndroma: as fibras do facial se entrecruzam com as do lado opposto 11a espessura da porção bulbar da protuberância annular, ao passo que as fibras motoras destinadas aos membros não se -entrecruzam senão muito mais abaixo, nas pyramides. Ora uma lesão si tuada abaixo, desta decussação, determinará uma paralysia directa do nervo facial; mas, como ao mesmo tempo inte- ressa os feixes emanados do corpo estriado, que só se entrecruzam ao nivei das pyramides, haverá também uma hemiplegia do lado opposto. Nestes casos, como nas paralysias periphericas, a paralysia do facial é pois directa e completa. Demais, os musculos perdem a sua contractilidade electrica, o nervo se altera, sempre como nas para- lysias de origem peripherica. A razão disto está em 40 que no interior da protuberância o nervo já está constituído, promovendo a lesão a separação de seu centro troplrico, de seu núcleo de origem. Como muito bem faz notar Grasset, não é mais o centro e sim o conductor que é compromettido, sendo a paralysia alterna uma paralysia cerebral para os membros e peripherlca para a face. Nas lesões cerebraes com hemiplegia, a paralysia do nervo do septimo par, nunca é tão completa como no caso em que lia uma paralysia traumatica ou rheumatismal do nervo ou quando a paralysia depende de uma lesão da protuberância acompa- nhada da paralysia cruzada dos membros. Na hemiplegia alterna devida á lesão da região bulbar da protuberância, a paralysia facial é tão completa, tão absoluta como se houvesse uma secção transversal ou uma destruição por com- pressão do nervo. Assim lesado, perde a sua exci- tabilidade própria, sofírendo a degeneração secun- daria. Ao fim de alguns dias as excitações electricas não actuam com tanta intensidade sobre os nu is- cados, ao passo que nas parai vsias cerebraes esta excitabilidade persiste sem haver amyotrophia. Conjunctamente com a paralysia facial, podemos observar na hemiplegia alterna inferior o compro- mettimento do motor ocular externo, do ramo motor do trigemeo, do grande hypoglosso e do auditivo. De facto, a visinliança dos núcleos do facial e do • motor ocular externo explica que o sexto par pode participar da paralysia, sendo que muitas vezes este nervo será interessado isoladamente sem a partici- pação do facial. 41 A paralysia alterna, ao envez de limitar-se a uma hemiplegia de um lado e a uma paralysia facial peripherica do lado opposto, com ou sem partici- pação do motor ocular externo, pode interessar igualmente o hypoglosso do mesmo lado que o nervo do septimo par. 0 distincto neuropathologista Raymond, nas suas interessantes lições clinicas apresenta um grandís- simo numero de casos de paraiysias alternas infe- riores: a) Paralysia do motor ocular externo associada a uma hemiplegia dos membros do lado opposto. b) Anesthesia da face de um lado associada a uma anesthesia dos membros e do tronco do lado opposto. c) Paralysia alterna limitada ao domínio de inner- vação dos nervos craneanos. d) Juxtaposição de uma paralysia alterna motora e de uma paralysia alterna sensitiva. Gilbert Ballet apresentou á Sociedade de Neuro- logia de Paris um homem attingido de paralysia alterna e dissoçiada da sensibilidade (esquerda para a face, direita para os membros) associada a uma paresia motora esquerda. Prissaud nas suas preciosas lições clinicas relata um caso de paralysia alterna muito interessante e raro: o corpo era atrophiado de um lado com inte- gridade da face; do lado opposto a atrophia attingia o rosto. Oppenheim observou um caso no qual a impo- tência motora do lado opposto á lesão se combinava a paralysia do motor occular externo e do ramo mastigador do trigemeo. 42 Gellé demonstrou que a hemiplegia alterna póde ainda realisar-se por uma paralysia de um lado do corpo, associada ao compromettimento do nervo ou núcleo acústico do lado opposto. Grasset descreve um typo especial de paralysia alterna caracterisado pela paralysia dos membros á esquerda e pela paralysia do facial total e do hypoglosso á direita e do hemioculo-motor dex- trogyro. É o typo Foville do syndroma de Millard- Gubler: a lesão tem sua séde na parte inferior da protuberância. Trata-se de um indivíduo de dezeseis annos de edade, pertencente a uma família de nevropathas, o qual não apresenta accidente algum anterior de interesse. Em fins de Janeiro de 1900, em perfeita saúde, uma manhã, ao levantar-se, sente-se fraco do lado esquerdo. Esta paresia se accentúa progressivamente, ao tempo em que appa- rece a paralysia facial do lado direito e torna-se a palavra embaraçada. Em 31 de Maio, notava-se uma paralysia dos membros á esquerda,, marcha difficil, arrastando a perna, necessidade de apoio;, braço esquerdo ao longo do corpo; o dynamometro marca 10áesquerda e 30 á direita; reflexos rotulianos exaggerados dos dons lados; não ha perturbações da sensibilidade. A face é desviada: a commissura labial direita é menos elevada que a esquerda; a metade direita do rosto fica immovel quando elle ri ou fala; os traços são menos pronunciados á direita; os líquidos es- capam pela commissura labial direita. Ao mesmo tempo, o olho direito parece mais largamente aberto e mais saliente que o esquerdo; epiphorado mesmo lado; o indivíduo não pode fechar o olho direito 43 quer isoladamente quer ao mesmo tempo que o esquerdo; o véo do paladar é flácido, abaixado e desigual. Ma, pois, paralysia accentuada do facial superior e inferior direitos. O hypoglosso do mesmo lado é igualmente paralysado e a lingua desviada á direita. «Mas nosso doente, diz Grasset, apresenta demais um symptoma ordinário, mas que denota interesse: se lhe ordeno seguir meu dedo com os dons olhos, sem virar a cabeça, observo que o.s dous olhos seguem muito bem o dedo para a esquerda do indi- víduo; mas para a direita nào ultrapassam nem um nem outro a linha media (os movimentos de eleva- ção e de abaixamento dos dous olhos são normaes). Então ha paralysia do motor ocular externo direito e do ramo do recto interno do motor ocular connnum esquerdo.» Neste caso e nos outros vê Grasset um typo especial ligado ao syndroma de Millard-Gubler e admitte a existência de um e outro prendendo-se a paralysia alterna superior. E’ o typo Foville do syndroma de Gubler-Weber. Aqui fazemos ponto e julgamo-nos dispensados de maiores considerações em virtude da amplidão que demos no começo do nosso humilde trabalho. CAPÍTULO IV Diagnostico çjL difficuldades de que se acerca o diagnostico das moléstias nervosas sào numerosas e perfeita- mente reconhecidas por todos os homens que se dedicam ao estudo da neuropathologia. E tão eloquente e ao mesmo tempo tão sincera a linguagem com que o illustrado Dr. Torres Homem descreve essas difficuldades, que o melhor é deixal-o falar. Oueamol-o: «O diagnostico das affecções do systema nervoso, é sem duvida alguma, a parte mais difficil da clinica, representa o escolho em que naufragam frequentemente o estudo, a iliustração e a experiencia dos mais abalisados práticos. É, sobretudo, nas enfermarias de um hospital, onde o diagnostico passa mais tarde pelo cadinho depu- rador das necropsias, que devemos guardar muitas reservas nas opiniões que omittirmos para deste modo evitarmos constantes decepções. Quantas vezes guiado, pelos preceitos que a Physiologia ensina e a observação clinica tem sanccionado, o medico estabelece um diagnostico e entretanto o vê desmentido pela autopsia? 46 Quantas vezes os symptomas se apresentam tão desconnexos, tão tumultuarios, tão anarchicos e desparatados.que é impossível formar um diagnos- tico mesmo de presumpção?» É, pois, mui timidamente que nos vamos oceupar de tão transcendente e complicado assumpto. A hemiplegia alterna, seja qual fôr a sua variedade, offerece em geral, sob o ponto de vista do diagnostico da sede e da natureza da lesão, grandes difíiculdades. A investigação de uma paralysia alterna implica, de uma maneira pouco mais ou menos constante, a existência de uma lesão organica do bulbo, da protuberância ou do pedunculo. Estas parai ysias têm um valor semiologico importante, porque segundo os nervos craneanos paralysados podemos deduzir a séde das lesões. Com effeito, a presença de uma hemiplegia asso- ciada a uma paralysia do motor ocular commum ou do facial do lado opposto, implica quasi sempre a existência de uma affecção peduncular ou bulbo- protuberancial. Lesões organicas e mesmo a hysteria podem, entretanto, simular os diversos syndromas de paralysia alterna como veremos no correr deste capitulo. Todo o processo pathologico que se manifesta no pedunculo, ao uivei das fibras do motor ocular commum ou do núcleo de origem, isto é, perto do entrecruzamento e que attinge de outra parte a via pyramidál antes da sua decussação, determinará a apparição de um svndroma especial, o syndroma de Gubler-Weber, caracterisado, como já vimos, por uma hemiplegia de um lado do corpo associada a queda da palpebra do lado opposto. 47 Esto syndroma offerece notável analogia com o syndroma de Benedikt, sendo que este apenas se differencia do primeiro pela existência do tremor no lado paralysado. O tremor é caracteristico, repre- sentando um intermediário entre o da hemi-choréa e o da hemi-athetose; parece-se ás vezes com o tremor da paraiysia agitante ou da escleroseem pla- cas, exagerando-se sempre com os movimentos inteneionaes. Fácil é o diagnostico differencial do syndroma de Benedikt com as hemiplegias ordinárias acompa- nhadas de tremor, pela ausência da parai ysia do nervo motor ocular comraum. Desse modo excluimos facilmente a hemi-choréa e a hemi-athetose post-hemiplegicas, com as quaes o tremor peduneuiar apresenta muitas analogias. Do mesmo modo fazemos a distincção clinica com a esclerose em placas, principalmente quando apre- senta a forma hemiplegica. O eminente professor Benedikt, procurando pre- cisar a natureza dos tremores que se observam na parai ysia agitante e na esclerose em placas, os quaes notável analogia apresentam com a congenere per- turbação motora que se nota no syndroma de Be- nedikt, assim se exprime: «Na moléstia de Parkinson, os movimentos volun- tários interrompem, ao menos em principio, ou moderam o tremor, emquanto que na esclerose em placas esses movimentos provocam e exageram o tremor. Essas differenças symptomatícas caracte- risticas indicam evidentemente um mecanismo diffe- rente. Num caso o movimento voluntário excita um apparelho moderador do tremor, no outro ou bem 48 este movimento paralvsa este apparelho mode- rador ou bem excita um outro apparelho provo- cador do tremor». A paralysia alterna do tvpo Millard-Gubler pode, num exame superficial, apresentar alguma analogia com a hemiplegia vulgar. É o que acontece nos casos de tumores múltiplos do cerebro ou das meninges, e também em algumas hemiplegias quando ha contractura facial. Nestes casos, porem, pelo exame do doente notamos desvio da face para o lado são, com franca tortura-oris; ausência do sulco naso-labial do lado parai ysado e accentuacão do lado opposto; lingua desviada com a ponta diri- gida para o lado parai ysado, etc. Não ha amvotro- phias e a contractibilidade electrica permanece normal ou sem modificação sensível, o que não acontece com o syndroma de Millard-Gubler, visto ser caracterisado por uma paralysia facial periphe- rica, alternando-se com uma hemiplegia cruzada em relação á lesão. Passemos agora a indicar os caracteres que per- mittirão distinguir a paralysia facial de origem peri- pherica da que affecta o typ.o central; esta ultima é dissociada, ao passo que a paralysia facial pheri- pherica é total e accommette não só os músculos animados pelo facial inferior, como também os innervados pelo ramo superior (orbicular das pál- pebras, superciliar, frontal). Demais a paralysia é cruzada em relação ao foco çncephalico. inversa- mente a paralysia facial peripherica é dirccta e se manifesta no proprio lado da lesão. Em ultimo logar a reacção electrica dos mús- culos innervados pelo facial, ás diversas formas da 49 corrente, não sofíre modificação alguma. Ao con- trario, no caso de paralysia peripherica ou parai vsia infra nuclear, a reacção electrica dos museu los faciaes, á corrente faradica, desapparece ou diminue, ao passo que a sua excitabilidade galvanica au- gmenta de intensidade. A parai ysia alterna descri pta pelo professor Grasset sob o nome de typo Foville (paraiysia dos membros de um lado, do facial total, do hypoglosso e do hemioculomotor rotador dos olhos do outro ) , apresenta alguma semelhança com a paralysia supe- rior ou syndroma de Gubler-Weber. A analogia com o syndroma protuberancial infe- rior é evidente e o proprio professor Grasset chama-o typo Foville do syndroma de Millard-Gubbler, visto como foi aquelle auctor quem primeiramente o des- creveu com clareza e precisão. Aqui o diagnostico em qualquer dos typos não offerece difíiculdade; basta dizermos que no typo de Millard-Gubler a paralysia dos membros alterna com a facial e lheé homologa a paralysia ocular; no typo Foville do syndroma de Gubler-Weber, se a paralysia dos membros alterna com a ocular e lhe é homologa a paralysia facial, o nervo attingido é o motor ocular externo e não o motor ocular commurn. Ha na litteratura medica alguns casos isolados de paralysias alternas de origem hysterica. Vejamos o que nos dizem as observações a este respeito. A primeira observação de syndroma de Gubler- Weber de origem hysterica, pertence ao iIlustre professor Charcot, a quem nós de vemos a maior parte 50 das acquisições da pathologia nervosa; esta obser- vação fez parte de uma brilhante lição clinica do preclaro professor, inserta nos archivos de neuro- logia de Julho de 1891, a qual se refere a um caso de hvsteria simuladora do syndroma de Gubler- Weber. Trata-se de uma joven rapariga de 18 annos de edade, que apresentava, ha muitos annos, uma queda da palpebra superior do lado esquerdo, asso- ciada a paralysia completa dos membros do lado opposto, acompanhada de hemianesthesia. Demon- strou Charcot que não se tratava de uma paralysia organica, mas de um caso de hvsteria. Os músculos rectos interno, superior e inferior e o pequeno obliquo eram intactos. A queda da palpebra era urna falsa ptosis, umblepliaropasmo hvsterico; disto deram-nos testemunho o supercilio correspondente que é abaixado e não levantado, como soe acontecer para a ptosis de natureza organica e a anesthesia da cornea que acompanha o blepharopasmo. Além disto os caracteres tanto extrínsecos como intrínsecos encaminham perfeitamente o diagnostico da nevrose. Assim é que neste caso devemos recorrer a verificação dos estigmas da nevrose, aos antece- dentes nevropathicos e a evolução da moléstia. Higier, em 1893, relata uma observação de falso syndroma de Gubler-Weber, no seu trabalho sobre a gagueira hysterica. Geraud e Remlinger, em 1897, apresentaram uma observação, na qual um soldado sem antecedentes hereditários nem pessoaes nevropathicos, apre- sentou no curso de uma febre typhoide de forma pouco grave, diagnosticada pela sero-reacção de Widal, um syndroma de Gubler-Weber cuja natureza 51 hysterica foi provada por uma crise convulsiva typica, por contrações rythmicas nos musculos paralysados, augmentando quando o doente se sentia observado e pelo desapparecimento rápido do syndroma. Assim, conhece-se hoje, que, desde os trabalhos notáveis de Guinon sobre os agentes provocadores da hysteria, a influencia das infecções e das intoxi- cações é de grande interesse nas manifestações liysterieas. 0 saturnismo, a syphilis e o paludismo podem também favorecer o apparecimento da nevrose. A autopsia mostrou uma integridade absoluta da região bulbo-ponto-peduiucular. Bichelonne e Boucarut publicaram uma obser- vação do syndroma de Gubler-Weber, cuja origem parecia dever ser ligada a hysteria. O syndroma de Millard-Gubler pode também ser simulado pela hysteria—o Proteo, que na plirase do grande Sydenham, pode apresentar-se sob tantas formas quanto o cameleâo. O primeiro facto deste genero foi observado por Michant em 1890. Trata-se de um homem de 85 annos de edade, que, em consequência de uma perda súbita do conhecimento, sobrevinda sem motivo, apresentou uma hemiplegia sensitivo motriz, associada a paralysia facial do lado opposto. Debove, Rendu e Gouraud observaram e publi- caram alguns casos, nos quaes existia antes hemi- spasmo facial do lado da paralysia. dos membros que uma paralysia facial do lado opposto; havia, pois, simulação de uma paralysia alterna de aspecto hvsterico. 52 Ravmond fez publicar em -1802, na these de seu discípulo Tournant, uma observação de paralysia alterna, na qual a paralysia motriz dos membros de um lado era associada a uma paralysia facial do lado opposto. Grocq e Marlow apresentaram um caso semelhante. O diagnostico, portanto, das falsas paralysias alternas de origem hvsterica será sobretudo basea- do na verificação dos estygmas da nevrose, na evolução da moléstia e nos signaes clinicos apon- tados pelo professor Babinsld para a differenciaçào entre a hemiplegia organica e a hysterica. Além destas paralysias podemos observar em clinica, outras que não são produzidas por lesões intra-pedunculares ou intra-protuberanciaes, isto é, hemiplegias independentes de lesões-bulbo-pon- to-pedun culares. Assim é que um hemiplegico por lesão cerebral pode, por exemplo, ter do lado opposto a sua hemi- plegia uma paralysia facial p.eripherica. Rendu observou uma paralysia alterna (paralysia do terceiro par á esquerda e dos membros do lado direito) que era devida a uni foco de amollecimento da circumvolução marginai e a exsudatos compri- mindo o nervo motor ocular commum. Perroud descreve uma paralysia alterna produzida por um amollecimento do hemispherio esquerdo e por um tubérculo da orbita esquerda. Jackson assignala, em 1873, um caso manifesto de syphilis intra craneana, na qual houve hemiplegia esquerda por lesão cerebral direita e paralysia do terceiro par direito de onde ptosis deste mesmo lado. Vigouroux e Vignier, em 1899, apresentaram uma 53 observação produzida por uma pachymeningite sup- purada, simulando o syndroma de Gubler-Weber, sobrevinda n’um alcoolata no curso de uma erysipela da face. Menetrier e Bloch estudaram um caso de syn- droma de Gubler-Weber, no qual o pedunculo era intacto e onde existia um volumoso tumor canceroso, occupando a região infero interna do lobo temporal, recalcando as circmnvol uções temporaes inferiores e vindo fazer luz entre o chiasma do nervo optico para diante e o pedunculo cerebral para traz. Este tumor comprimia o motor ocular commum, ao passo que em cima recalcava a capsula interna. Tratava-se de um cancro secundário, consecutivo a um epithelioma mammario atypico. Num caso de Joffroy, uma paralysia do facial infe- rior do lado direito coincidia com uma hemiplegia llacida do lado esquerdo; á autopsia, verificou-se a existência de um tubérculo no hemispherio direito e de outro no hemispherio esquerdo. William CeeiI Bosanquet relata uma observação na qual existia uma paralysia alterna typica, tudo fazia crer numa lesão da protuberância; á autopsia, ella estava intacta, mas existia num hemispherio um amollecimento limitado e no outro tumores secun- dários a um thoracico. Podemos, em fim, juntar aqui um caso observado por Sclierb, no qual o doente tinha, de uma parte, uma hemiplegia cerebral, da outra, lesões esclero- gommosas da base englobando o facial e o trigemeo. Eis quanto podemos dizer em relação ao ponto que nos aprouve escolher para ser o assumpto da dissertação da nossa these. 54 Aqui, pois, terminamos o nosso humilde trabalho, que se acha eivado de erros e imperfeições que não duvidamos reconhecer; mas resta-nos a intima con- vicção de que não poupamos esforços para superar os obstáculos que se nos antepuzeram em tão arclua tarefa: pelo que entregamol-o a criteriosa apreciação dos nossos illustrados mestres e competentes juizes e sejam estas as nossas ultimas palavras: feci qui potui. PROPOSIGOES ò PROPOSICOES *L> ANATOMIA DESCRIPTIVA I No cerebro ternos as artérias lenticulo estriadas e as lenticulo opticas, snb-divisão das artérias es- triadas externas. II As lenticulo-estriadas vão principalmente aos dons terços anteriores da capsula interna e ao núcleo lenticular. III As lenticulo-opticas vão ao núcleo lenticular e a cama optica, assim como ao terço posterior da ca- psula interna. ANATOMIA MEDICO-CIRURGICA I Tres pares craneanos contribuem para a motili- dade do globo ocular: 3.°, 4.° e 6.° pares. II O nervo motor ocular commum innerva os se- guintes musculos: recto superior e elevador da pal- 58 pebrasuperior, porseuramo superior; rectointerno, recto inferior e pequeno obliquo por seu ramo inferior. \ III O nervo motor ocular externo innerva o musculo recto externo, bem como o pathetico innerva o grande obliquo. HISTOLOGIA I A medulla espinhal compõe-se de duas partes: a substancia branca e a substancia cinzenta. II A substancia cinzenta é formada de fibras ner- vosas* e de cellulas nervosas. III A substancia branca é unicamente formada de fibras nervosas, que se dispõem em cordões: ante- rior, lateral e posterior, havendo também um grupo de libras chamadas collateraes dos cordões. BACTERIOLOGIA I 0 bacillo de Nicolaier é o elemento pathogeno do tétanos. II O bacillo de Nicolaier é, devido aos seus esporos, assás resistente aos agentes de destruição. 59 III Esse bacillo actua por intermédio das toxinas que elle segrega. ANATOMIA E PHYSIOLQGIA PATHOLOGICAS I Hvperemia é o áccumulo, nos vasos de um orgão ou de uma região qualquer, de uma quantidade de sangue superior a normal. II As hvperemias dividem-se em dous grandes grupos: hyperemias activas ou arteriaes e hype- remias passivas ou venosas. ui A causa mais frequente das hyperemias activas são as perturbações vaso-motoras. PHYSIOLOGIA I O coração é innervado pelo grande sympathico e pneumogastrico. II O grande sympathico é geralmente considerado como um excitador dos movimentos cardiacos. 60 III Sendo os ganglios intra-cardiacos o centro e a origem da acção rhythmica do coração, é incon- testável que o grande sympathico tem uma acção manifesta sobre os movimentos cardiacos. THERAPEUTICA I Anesthesic.os são agentes que têm a propriedade de abolir a sensibilidade. II Elles podem ser divididos em locaes e geraes. III Entre os anesthesicos geraes o mais empregado é o cloroformio. HYGIENE I As aguas impuras têm uma acção nociva sobre o organismo dos individuos que delias fazem uso. II As moléstias contagiosas e infectuosas podem ser transmittidas por intermédio destas aguas. III Entre as moléstias transmittidas por estas aguas estão o cholera-morbns e a febre typhica. 61 MEDICINA LEGAL I 0 indivíduo que cae ou é lançado n’agua pode morrer por asphyxia, por syncope ou por uma congestão cerebral. II A pallidez geral do corpo, uma grande quantidade de agua no estomago, a presença de uma espuma branca nas vias respiratórias, o estado de fluidez do sangue e a maior quantidade deste liquido nas cavidades direitas do coração, a cor viôlacea, a dureza e crepitação dos pulmões, a bocca semi- aberta, excoriações dos dedos e areia debaixo das unhas, são os principaes svmptomas de asphyxia por submersão. III As excoriaçõas dos dedos provam que o indivíduo lutou contra a morte e estava vivo antes de cahir n’agua, porém, é um signal que depende da locali- dade em que a submersão teve logar, assim como a ausência de areia debaixo das unhas não prova que o indivíduo não morreu afogado. PATH0L0G1A CIRÚRGICA I Ferimentos por armas de fogo são soluções de continuidade produzidas por projectis postos em movimento, pela deflagração da polvora. 62 II Os accidentes mais frequentes destes ferimentos são a febre traumatica, a gangrena, o tétanos e a septicemia. III A exploração dos ferimentos por arma de fogo deve ser feita com máximo cuidado, afim de serem extrahidos os corpos extranhos que possam emba- raçar a sua cicatrisação. CLINICA CIRÚRGICA (l.a CADEIRA) I A situação dos pedúnculos cerebraes explica que as feridas desta região são raras. II Nas feridas por armas de fogo, podemos verificar- ás vezes lesões dos pedúnculos cerebraes, coexis- tindo com despedaçamentos osseos mais ou menos importantes. III As lesões dos pedúnculos cerebraes mais inte- ressantes são produzidas por um traumatismo intra- orbitario. CLINICA CIRÚRGICA (2.11 CADEIRA) I Os tumores dos pedúnculos cerebraes são relati- vaníente raros, não obstante poderhos observar gornmas syphiliticas, gliomas e glio-sarcomas. 63 II Os tumores dos pedúnculos mais frequentes são incontestavelmente os tumores tuberculosos. III 0 numero e o volume destes tumores variam segundo os casos. OPERAÇÕES E APPARELHOS I A trepanação è uma operação que consiste em perfurar um osso, tirando-lhe uma rodei la por meio de uma serra circular chamada corôa de trépano. II Esta operação é uma verdadeira resecção. III Não differe das resecções senão pela forma da exerese. PATHOLOGIA MEDICA I A hemiplegia é um syndroma clinico essencial- mente caracterisado pela abolição mais ou menos completa da motilidade voluntária em uma metade do corpo. II Quando a lesão assesta-se no córtex ou quando o feixe pyramidal é comprido ou destruído em 64 seu trajecto encephalico, a hemiplegia é chamada cerebral. III De todas as lesões encephalicas, é a hemorrhagia cerebral em cujo quadro morbido se patenteia a hemiplegia mais completa. CLINICA MEDICA d.» CADEIRA) I A hemiplegia de origem encephalica corresponde á uma lesão situada no hemispherio do lado opposto. II A hemiplegia é completa e total quando occupa simultaneamente a face e os membros de um mesmo lado. IÍI É incompleta e parcial, quando limita-se a uma ou a duas das partes que elia accommette na forma commum. CLINICA MEDICA (2.a CADEIRA) / I O diagnostico exacto da hemorrhagia cerebral é muitas vezes difficil, porque alguns de seus sym- ptomas primitivos (apoplexia, hemiplegia) e muitos dos secundários (contracturas, espasmos, etc..) são communs a outras moléstias cerebraes. 65 II A interpretação destes phenomenos requer um conhecimento profundo da anatomia do cerebro e da circulação dos seus diAferentes territórios. III Nas hemiplegias organicas grande é o valor semió- tico do exaggero dos reflexos tendinosos. CLINICA PROPEDÊUTICA I A auscultação é de grande importância para o diagnostico de muitas moléstias, especialmente para as moléstias do pulmão e coração. II A auscultação póde ser mediata ou immediata, segundo é feita ou não com o uso do sthetoscopio. m Para que uma auscultação seja bem feita é neces- sário, além de outros requisitos, que o medico tenha o ouvido educado na arte de auscultar. MATÉRIA MEDICA, PHARMACOLOGIA E ARTE DE FORMULAR I Chama-se vinho medicinal todo aquelle que tem em dissolução um ou mais princípios medica- mentosos. 66 II Os principaes vinhos empregados na preparação dos vinhos medicinaes são os brancos, os tintos e os espirituosos. III O melhor processo de preparação dos vinhos medicinaes e o mais empregado é o da maceração; porém, quando o emprego do vinho é immediato ou que elle se altera facilmente, prefere-se preparabo derramando a tintura sobre elle. HISTORIA NATURAL MEDICA I Os vermes intéstinaes que mais commummente se encontram nas caeanças são: o ascarides lombri- coides e o oxyurus vermiculares, pertencentes á classe dos nematoides. II O ascarides lombricoides habita o intestino del- gado e algumas vezes o grosso intestino e o recto. III Estes vermes quando em grande quantidade podem determinar accidentes sérios. CHIMICA MEDICA 1 O ar atmospherico é uma mistura e não uma combinação. 67 . II Contem oxygeno, azoto, gaz carbonico, argonio, vapores de agua, etc. III E’ por meio do ar atmospherico que chega á respiração, o oxygeno, elemento indispensável a vida. OBSTETRÍCIA I A eclampsia é um dos accidentes mais graves que podem accommetter a uma parturiente. li Podemos dividir o ataque de eclampsia em tres periodos: periodo de invasão, período de convulsões tónicas; periodo de convulsões clonicas. III As causas da eclampsia têm sido divididas em dous grupos pelos auctores clássicos: causas pre- disponentes e occasionaes. CLINICA GYNECOLOGICA E OBSTÉTRICA I A albuminúria é um signal prodromico de alto critério clinico da eclampsia. 68 m II A terminação da eclampsia pode ter logar pela cura, por moléstias consecutivas ou pela morte. III O tratamento da eclampsia pode ser prophylatico ou curativo. CLINICA PEDIÁTRICA I À syphilis hereditária é uma das causas mais poderosas do rachitismo. II Existe rachitismo fetal. III O diagnostico do rachitismo não oíTerece difílcul- dades serias. CLINICA OPHTALIOLOGICA I A cataracta é constituída pela opacidade do crystallino, quer total, quer parcial. II Ella pode ser lenticular ou capsular. 69 III As creancas poclem nascer com a opacidade do crystalUno, tendo assim a cataracta congénita. CLINICA DERMATOLÓGICA E SYPHILIGRAPHICA I O cancro duro é o accidente inicial da svphilis adquirida. II Manifesta-se em qualquer parte do organismo ao nivel do ponto de inoculação da substancia virulenta. III A sua séde mais frequente é nas partes genitaes. CLINICA PSYCHIATRICA E DE MOLÉSTIAS NERVOSAS I A pathologia do svstema nervoso tem tomado grande desenvolvimento, graças ao estudo das loca- lisações cerebraes. II A clinica mais que a experimentação tem concor- rido para este resultado. III O diagnostico topographico das moléstias cere- braes, só nos podem ser fornecido com o seu conhecimento. ERRATA A’ pagina 4, linha 32, onde se lê —estas paralysias accom- mettem as vezes o feixe pyramidal, etc., leia-se — estas paralysias são produzidas por lesões que accommettem con- junctamente o feixe pyramidal, etc. A' pagina 0, linha 8, onde se lè —que interessa as vezes o núcleo, etc., leia-se — que interessa ao mesmo tempo o núcleo., etc. A’ pagina 13, linha 8, onde se lè — revendiam, leia-se — reivin- dicou. ; A’ pagina 34, linha 28, onde se lè — núcleo do motor ocular cornmum, leia-se — núcleo superior do motor ocular commum. Zzzz z/rz <jZzz&zz£/&zz/& zÁzzzrizz z/zz J?Z z/z z/& /z?<?ó‘. •<J> jbECI^ETAI^IO, S)r. tJCnandro- íVj 3%ei* i^tureâL.